Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
404/13.9TBBRG-A.G1
Relator: LÍGIA VENADE
Descritores: TÍTULO EXECUTIVO
DOCUMENTO
PROVA DA FALSIDADE
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 09/26/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
Sumário (da relatora):

-Não obstante o meio idóneo para verificar a autenticidade da assinatura ser o exame pericial, esse meio de prova deve ser ponderado em conjunto com os outros meios de prova constantes dos autos.

-O artº. 375º, nº. 2, do Código Civil encerra duas hipóteses: pode provar-se a falsidade do reconhecimento e não obstante serem a letra e assinatura verdadeiras; ou pode provar-se que a assinatura é falsa e neste caso tal acarreta ou arrasta a falsidade do reconhecimento.
Decisão Texto Integral:
Acordam os Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães:

I. RELATÓRIO.

(…) LDA.,
Rua (..) Braga, NIF (…)
exequente/embargada intentou execução contra
(…)
Lugar de (…), Vila Verde, NIF (…)
executado/embargante

Apresentando como título executivo o documento denominado Contrato de Confissão de Dívida com Garantia de Avalista e Fiador, conforme doc. junto a fls. 75 a 78 destes autos.

Citado, este apresentou embargos à execução alegando em síntese que não teve qualquer intervenção na elaboração do documento particular, denominado ‘Contrato de Confissão de Dívida com Garantia de Avalista e Fiador’, oferecido à execução, nem tampouco o assinou, pelo que a letra e assinatura que constam do mesmo não foram efetuadas, nem redigidas pelo seu punho, sendo totalmente falsas.

Pede que sejam julgadas totalmente procedentes, por provadas, e, em consequência, seja (…) determinada a imediata extinção da execução, com o consequente cancelamento de todas as penhoras dos seus depósitos e bens, a exclusiva expensas do exequente.
Foi recebida a oposição à penhora e a oposição à execução apresentada por meio de embargos, tendo-se determinado a notificação da embargada/exequente para, querendo, contestar.

Notificada a exequente para contestar os embargos, alegou que nenhuma razão assistir ao embargante/executado nos fundamentos que invoca em sede de oposição.
Termina pedindo improcedência da oposição (à penhora e à execução) deduzida.
Foi proferido despacho saneador, admitiram-se os requerimentos probatórios apresentados e designou-se data para realização da audiência final.
Procedeu-se à realização da audiência final.
Foi proferida sentença que julgou totalmente procedente a oposição à execução por embargos deduzida pelo embargante/executado (…) contra a embargada/exequente (…) LDA.” e, em consequência, determinou a extinção da instância executiva de que os presentes autos constituem apenso, assim como o levantamento da(s) penhora(s) que incida(m) sobre bem/bens sua pertença e/ou direito(s) de que seja titular.

Inconformada, a embargada/exequente “(…) LDA.” apresentou recurso, terminando as suas alegações com as seguintes

- CONCLUSÕES –

I. Em primeiro lugar, o presente recurso estriba-se, ao abrigo do artigo 640.º do CPC (Código de Processo Civil), na impugnação da matéria de facto dada como provada ínsita no ponto 8, maxime, por não conseguir aferir-se em que prova produzida se estribou o Tribunal para dar como provada tal facticidade, vale dizer, que a rubrica e/ou assinatura do executado/Recorrido J. A., por um lado, não foi aposta pelo seu punho e, por outro lado, não foi reconhecida presencialmente pela Advogada M. B..
II. Efectivamente, do elenco dos meios probatórios produzidos, certo é que existem duas conclusões de perícias – uma inconclusiva e outra que atribui um grau de probabilidade compreendido entre 30% e 50% de ser pouco provável que a rubrica e assinatura tenham sido apostas pelo punho do Recorrido, isto é, muito no limiar do “pode ter sido” que corresponde a 50%, isto para além de que a assinatura do Embargante/Recorrido foi reconhecida presencialmente pela Advogada Drª M. B., facto esse PEREMPTORIAMENTE atestado em julgamento pela própria.
III. Posto isto, e em suma, a Apelante considera, face à prova produzida, por um lado, que o facto vertido no aludido ponto 8.” – o nome do mencionado J. A., seja sob a forma de rubrica, seja sob a forma de assinatura, não foi aposto pelo seu punho – deverá ser dado como não provado e/ou, caso assim se entenda, deverão os autos baixar à 1.ª instância, para que seja realizada nova perícia e, por outro lado, com reflexo na redação a imprimir a tal facto dado como provado nos seguintes termos:
o nome do mencionado J. A., seja sob a forma de rubrica, seja sob a forma de assinatura não foi reconhecido presencialmente pela aludida M. B. – deverá ser alterada para a afirmativa, isto é, deverá constar que foi reconhecida presencialmente pela aludida M. B..
IV. Acerca do facto provado vertido em “8.” da Sentença, nomeadamente, que o nome do mencionado J. A., seja sob a forma de rubrica, seja sob a forma de assinatura, não foi aposto pelo seu punho, alicerçou o Tribunal “a quo” a sua fundamentação, desde logo, na perícia grafológica realizada, cujo relatório consta a fls. 162-176, dos presentes autos.
V. Contudo, do confronto entre o relatório pericial da perícia realizada nos presentes autos e o relatório da perícia realizada no âmbito do processo crime que correu seus termos no DIAP de Vila Verde, sob o Processo n.º 392/13.1TAVVD, em que era Ofendido J. A., que aqui vale como prova documental, resulta a seguinte conclusão: ambos deixam margens para dúvidas.
VI. Na verdade, se no que especificamente tange à segunda daquelas, e como bem referiu o Tribunal “a quo” implica que, num juízo de probabilidade, haja 50% de hipótese de a escrita suspeita ter sido ou não ter sido efetuada pelo punho do embargante/executado, a que foi realizada nos presentes autos também não fica muito aquém daquela, pois concluíram os Srs. Peritos atribuir um grau de significância compreendido entre >30% - <50% sem, no entanto, determinar, em concreto, o valor percentual, o que leva a Apelante concluir que o mesmo pode ser 49,9% ou, até mesmo, de 30,1%. Ou seja, a perícia realizada nos autos, não obstante concluir pelo “pouco provável”, o certo é que, uma coisa é “pouco provável” muito próximo do “muito pouco provável”, outra coisa distinta será “pouco provável” muito próximo de “pode ter sido”, tudo conforme a tabela de significância referida no corpo das alegações do presente recurso.
VII. Acresce, ainda, que ambas as provas são contraditórias entre si: na perícia realizada nos presentes autos concluiu-se que existem diferenças significativas entre a assinatura aposta no título executivo e a assinatura realizada pelo próprio punho executado/recorrido; ao passo que, na perícia realizada no inquérito, concluiu-se que há uma reduzida quantidade e qualidade das semelhanças e diferenças registadas no confronto da assinatura aposta no, aqui, título executivo, com a do autógrafo do executado/recorrido J. A..
VIII. Desta sorte, mal se compreende porque motivo o julgador “a quo” entendeu “optar” pela prova pericial em detrimento da prova, reitera-se, ainda que apreciada enquanto simples documento – não podendo obnubilar-se, contudo que esta segunda corresponde igualmente a uma outra perícia realizada com o mesmo objeto e finalidade... – junta aos presentes autos.
IX. Nestes termos, e porque ambas as provas, analisadas simultaneamente, não permitem chegar a conclusão alguma, entende a Recorrente que o Tribunal de 1.ª Instância não tinha elementos suficientes para dar como provado o facto vertido em “8.” da sentença, isto é, que o nome do mencionado J. A., seja sob a forma de rubrica, seja sob a forma de assinatura, não foi aposto pelo punho, mas outrossim e ao invés, deveria ter considerado como não provado.
X. Nesta decorrência, mercê de tudo quanto vem de referir-se deverá ser alterada, neste ponto, a matéria de facto dada como provada e nessa estrita medida aditada a seguinte alínea à matéria de facto dada como NÃO provada: o nome do executado/oponente J. A., seja sob a forma de rubrica, seja sob a forma de assinatura, não foi aposto pelo seu punho.
XI. Desta sorte, a obscuridade adensa-se no que respeita ao segmento da parte final do facto considerado provado do ponto 8.” da sentença vindo de referir-se o nome do mencionado J. A., seja sob a forma de rubrica, seja sob a forma de assinatura, [não] foi reconhecido presencialmente pela aludida M. B..
XII. Contudo, não pode a Apelante aceitar tal decisão no que a este conspecto concerne, uma vez que, cristalina se nos afigura que foi feita prova em sentido inverso sobre a factualidade ora em crise, ou seja, ficou cabalmente demonstrado nos presentes que o nome de J. A., seja em forma de rubrica, seja sob a forma de assinatura, foi reconhecido presencialmente pela advogada Drª M. B., desde logo, conforme decorre da prova documental junta aos autos – reconhecimento de assinaturas com menções especiais presenciais.
XIII. Este reconhecimento é perfeitamente válido, mesmo considerando que a testemunha M. B. tenha dito que o acto não se encontrava terminado por faltar o respetivo termo, conquanto, tal tipo de reconhecimento não implica, necessariamente, a obrigatoriedade de termo independente, podendo o mesmo fazer parte do documento que comprova o registo on-line do acto, no campo observações” – cfr. disposições conjugadas dos artigos 155.º e 46.º, ambos do DL n.º 207/95, de 14 de Agosto, com o disposto no artigo 38.º do DL n.º 76.º-A/2006, de 29 de Março.
XIV. Destarte, face às normas expostas, resta-nos debruçar sob o documento junto a fls. (...) dos presentes autos e verificar se o mesmo integra todos os requisitos exigidos para que, validamente, possa ser considerado como reconhecimento de assinaturas com menções especiais presenciais.
XV. Com efeito, no documento é possível constatar o seguinte: i) o nome da signatária
– M. B.; (ii) a forma como verificou a identidade dos interessados – através dos respetivos documentos de identificação; (iii) menção do documento exibido – encontra-se identificado o “Contrato de Confissão de Dívida”, composto por 3 páginas;
(iv) designação do dia, mês, ano e lugar – 21 de Novembro de 2011, na Av. … Vila Verde.
XVI. Posto isto, andou mal o Tribunal recorrido ao ter considerado que o documento ficou incompleto, porquanto, o termo encontra-se inserido no campo “observações”, não havendo necessidade de elaboração de termo avulso. E, certamente, a testemunha fez alguma confusão, pois nunca os interessados teriam de assinar tal termo – ao contrário do que sucede numa autenticação de documento -, mas sim, unicamente, a autora da realização do acto de reconhecimento.
XVII. Não obstante, o certo é que resulta, igualmente, da prova testemunhal, conforme declarações prestadas pela testemunha, a advogada Drª M. B., na sessão de audiência de julgamento de terça-feira, 20/03/2018 (CD/registo fonográfico: faixa 20180320101452_2123009_2870553), nos seguintes intervalos de tempo: de 04:33 às 05:31 e 08:31 às 09:54, para as quais expressamente se remete supra.
XVIII. Destarte, decorre do depoimento prestado pela testemunha Drª M. B., Advogada, autora do reconhecimento de assinaturas, que no seu escritório compareceram duas pessoas, A. J. e J. A., tendo esta afirmado e identificado como sendo o Sr. J. A. o executado, aqui Recorrido, ao que acresce que a testemunha afirmou que no que concerne à realização/elaboração do acto, não lhe surgiu qualquer dúvida, maxime, no que especificamente tange à identificação e comparência dos respetivos intervenientes, onde se destaca o aqui Embargante/Apelado!
XIX. Mais esclareceu a este propósito a testemunha M. B., nas declarações prestadas em sede de discussão e audiência de julgamento de terça feira, 20/03/2018 (CD/registo fonográfico: faixa 20180320103553_2123009_2870553), nos seguintes intervalos de tempo: de 00:09:59 às 00:11:00; de 00:11:33 às 00:12:03; de 00:14:01 às 00:14:18; de 00:16:16 às 00:17:03; de 00:20:10 às 00:20:49; de 00:28:13 às 00:28:43 e de 00:29:47 às 00:30:27, excertos esses que se deixaram transcritos supra no corpo das presentes Alegações e para os quais expressamente se remete V. Exªs.
XX. Nesta decorrência, em súmula, dos preditos trechos, inequívoco nos parece que, resulta provada das declarações da testemunha Drª M. B., a seguinte factualidade: que no seu escritório compareceram duas pessoas, tendo esta identificado, através da exibição dos respetivos cartões de identificação de cada um, como sendo o Sr. A. J. e o Sr. J. A., os quais apuseram as suas assinaturas, perante a testemunha, no documento que lhe foi exibido e intitulado de “Contrato de Confissão de Dívida” e que sobre tais factos a testemunha não tem quaisquer dúvidas.
XXI. No modesto entendimento do aqui Apelante, o Meritíssimo Juiz do Tribunal “a quo” não procedeu a uma correcta ponderação e valoração dos diversos meios probatórios carreados e/ou produzidos nos autos, tendentes à formação da convicção que desembocou no desacerto da decisão respeitante à matéria de facto provada (ponto 8) e não provada (alínea e)), cuja modificação aqui se pretende, na estrita medida em que fez prevalecer para além dos já apontados juízos de inconclusividade/mera probabilidade que podem ser assacados quer na perícia grafológica realizada, cujo relatório consta a fls. 162-176, dos presentes autos, quer a cópia certificada do relatório pericial de fls. 124-127, respeita a uma perícia realizada no Inquérito n.º 392/13.1TAVVD, que correu termos nos Serviços do Ministério Público de Vila Verde, em que era ofendido/lesado o, aqui, embargante/executado J. A., e arguido o mencionado A. J. (cfr. fls.121) sendo certo que nenhum dos peritos que os realizaram foi interveniente na elaboração do documento, rectius: assinaturas objeto da perícia, assentando unicamente, portanto, em meros juízos de (in)verosimilhança e conclusões teóricas.
XXII. Tudo, em detrimento de uma testemunha que foi interveniente direta na elaboração do documento, rectius: assinaturas objeto da aduzida perícia, vale dizer, a advogada, Drª M. B., que foi a autora do reconhecimento presencial de assinaturas sob apreciação nestes autos, que sem qualquer margem para ambiguidades atestou a respetiva realização, ou seja, o conhecimento demonstrado acerca de tais factos não é indireto e assente unicamente em meros juízos de (in)verosimilhança e conclusões teóricas, sendo outrossim e o invés imediato e direto, em sentido que contende e colide de modo inconciliável com os resultadosdo relatório pericial junto aos autos!
XXIII. Nesta decorrência, e sem necessidade de considerações adicionais, mercê de tudo quanto vem de referir-se, deverá ser determinada a modificação da matéria de facto dada como provada e nessa estrita medida passar a ser a redacção do ponto 8.” A seguinte: Sucede, porém, que sem prejuízo do que se refere em 2., 3., 4., 5., 6. e 7., o nome do mencionado J. A., seja sob a forma de rubrica, seja sob a forma de assinatura, foi reconhecido presencialmente pela aludida advogada, Drª M. B..
XXIV. Na medida inversa e no que concerne à resposta dada à alínea e) da matéria de facto dada como não provada, atenta a circunstância de consubstanciar a “contraface da mesma moeda” do ponto 8 da matéria assente vindo de referir-se, dando aqui por reproduzido tudo o quanto se deixou aventado supra sobre a modificabilidade da matéria de facto provada, facilmente concluímos que andou mal o Tribunal “a quo” ao ter dado como não provada tal factualidade, porquanto, ressuma de modo inequívoco, que o executado/Recorrido teve intervenção na subscrição do documento “Contrato de Confissão de Dívida” perante, à data, Advogada-Estagiária M. B., que o identificou através do seu Bilhete de Identidade e reconheceu a sua assinatura aposta no mencionado documento – tal factualidade resulta tanto da prova documental, como da prova testemunhal produzida nos presentes autos.
XXV. Destarte, os elementos probatórios existentes nos autos permitem a alteração nos termos ora propostas, ou seja, ter-se por provado que o embargante/executado J. A. teve intervenção na subscrição do documento Contrato de Confissão de Dívida”, havendo, portanto, de proceder-se à impetrada modificação da matéria de facto nos exactos termos que se propugnaram supra.
XXVI. Finalmente, sem prejuízo de tudo quanto até aqui se esgrimiu, e salvo o devido respeito por melhor entendimento, a Apelante não concorda in totum com a desajustada interpretação/aplicação do direito efetuada na douta sentença recorrida, designadamente, aplicação ao caso decidendo do artigo 374.º do CC (Código Civil), no que à validade e eficácia do título executivo diz respeito, ao invés da aplicação do disposto no artigo 375.º do CC, na medida em que a alteração da matéria de facto dada como provada, bem como a considerada como não provada, permitirá concluir que houve um reconhecimento presencial, e a consequente, indevida aplicação da inversão do ónus de prova, nos termos do artigo 374.º, n.º 2 e 342.º, n.º 1 do CC, devendo, outrossim, terem sido aplicados o n.º 2 do artigo 375.º e 344.º, ambos do CC.
XXVII. Nesta sede, no modesto entendimento da Apelante e nos termos que se deixaram antevistos em sede de impugnação da matéria de facto, não cabia à embargada/Recorrente o ónus de provar a autoria da assinatura aposta no documento, uma vez que essa assinatura foi devidamente reconhecida por alguém com competência para tal. Resulta, portanto, sem margem para dúvidas, que o título dado à execução, ou seja, o “Contrato de Confissão de Dívida com Garantia de Avalista e Fiador”, teve as correspetivas assinaturas de ambos os devedores reconhecidas presencialmente.
XXVIII. Ora, em consequência de tal reconhecimento, há lugar à inversão do ónus da prova, gozando, inclusive, tal documento de uma “presunção de veracidade”.
XXIX. O disposto no n.º 2 do artigo 375.º lança o ónus da prova da falsidade do reconhecimento presencial da letra e assinatura, ou só da assinatura, não sobre o apresentante do documento, mas sobre a parte que argui a falsidade, ou seja, “in casu” o Executado/Recorrido.
XXX. Mercê de tudo quanto se deixou aventado, forçosamente se conclui que andou mal o Tribunal recorrido ao aplicar no caso sub judice o disposto no artigo 374.º do Código Civil.
XXXI. Com efeito, tal preceito, concretamente, o seu n.º 2, tem o seu campo de aplicação em se tratando de um documento particular sem assinaturas reconhecidas presencialmente, circunstancialismo que, conforme se concluiu, não se verifica no caso em apreço.
XXXII. Desta feita, cabia ao executado/Recorrido a prova de que a assinatura aposta no documento não foi feita pelo seu punho, dando-se aqui por reproduzido tudo quanto se alegou supra (impugnação da matéria de facto) acerca da prova pericial e documental (perícia realizada no âmbito do processo crime e reconhecimento presencial de assinaturas), provas essas juntas aos presentes autos.
XXXIII. Posto isto, e como será bom de ver, andou mal o Tribunal “a quo”, tendo feito uma incorreta interpretação e aplicação do Direito, pugnando a Apelante pela alteração da sentença recorrida.
*
O executado/embargante J. A. respondeu às alegações, apresentando as seguintes

-CONCLUSÕES-

I- O Tribunal Recorrido decidiu bem ao julgar totalmente procedente a oposição à execução por embargos deduzida pelo embargante/executado J. A. contra a embargada/exequente X- Comércio de Automóveis, Unipessoal, Lda, e em consequência, determinou a extinção da instância executiva de que os presentes autos constituem apenso, assim como o levantamento das penhoras que incidiram sobre bens da sua pertença e/ou direito de que seja titular, condenado a embargada/exequente em custas em ambas as ações (cfr. artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil).
II- Da retificação da sentença: o Recorrido/executado/embargante, foi notificado da sentença proferida, sendo que aquando da sua análise, detetou dois erros quanto à sua identificação, tendo havido um manifesto lapso de escrita.
III- Na verdade, resulta do ponto 5 dos factos provados que, “No escrito referido em 2. consta, também, um “Reconhecimento com menções especiais presenciais” dos “interessados” J. A. e A. J..”. (destacado nosso). Para além disso, no parágrafo 22 da motivação, consta que “(…) que teve intervenção no “Reconhecimento com menções especiais presenciais” dos “interessados” J. A. e A. J..” (destacado nosso). Acontece que o nome do Autor/Recorrido não é J. A.”, mas sim J. A.”.
IV- Assim, e ao abrigo do disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 614.º do Código de Processo Civil, requer-se, muito respeitosamente, a V. Ex.ª se digne a retificar os erros de escrita, por lapso manifesto, verificados no ponto 5 dos factos provados e na motivação da sentença, devendo os mesmos serem corrigidos por simples despacho.
V- Quanto à resposta propriamente dita: a exequente/embargada intentou uma execução, em 17 de janeiro de 2013, no valor total de €27.985,37 (vinte e sete mil, novecentos e oitenta e cinco euros e trinta e sete cêntimos), tendo por base uma confissão de dívida em que o capital correspondia a €27.696,00 (vinte e sete mil, seiscentos e noventa e seis euros), correspondendo o restante montante, a juros de mora (vencidos e vincendos) até efetivo e integral pagamento.
VI- Por sua vez, citado para o efeito, J. A., enquanto executado nos autos principais e embargante no presente apenso, deduziu oposição à penhora e à execução, mediante embargos à execução intentada por X- Comércio de Automóveis, Unipessoal, Lda, pedindo, a final que as mesmas fossem consideradas totalmente procedentes, por provadas e em consequência que fosse determinada a imediata extinção da execução com o consequente cancelamento de todas as penhoras dos seus depósitos e bens, a exclusivas expensas do exequente.
VII- Após a audiência de julgamento, foi proferida a sentença, considerou o douto tribunal a quo a oposição à execução por embargos deduzida pelo embargante/executado totalmente procedente e em consequência determinou a extinção da instância executiva bem como o levantamento as penhoras que incidiam sobre os bens e/ou direitos pertencentes ao executado.
VIII– A Exequente/Recorrente/Embargada pretendia com o recurso sindicar a decisão proferida, recorrendo da matéria de facto e de direito, bem sabendo que o Tribunal recorrido decidiu corretamente e não incorreu em qualquer erro de julgamento e, como tal, a sentença não merece qualquer tipo de censura.
IX- A factualidade dada como provada e não provada foi corretamente apreciada, fundamentada, decidida e apreciada na sua globalidade de acordo com os princípios da livre apreciação da prova, da imediação, oralidade, sendo insuscetível de qualquer tipo de correção, alteração ou censura.
X- O Tribunal apreciou livremente as provas, decidindo o Meritíssimo Juiz a quo segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto.
XI - O princípio da imediação concretiza a relação de proximidade comunicante entre o Tribunal e os participantes no processo, de modo tal que aquele possa obter uma perceção própria do material que haverá de ter como base da sua decisão.
XII - Só com os princípios da oralidade e imediação se permite o indispensável contacto vivo e imediato com as partes e testemunhas, a recolha da impressão deixada pelas suas personalidades e, por outro lado, avaliar o mais corretamente possível da credibilidade das declarações prestadas por todos os participantes processuais.
XIII-- No caso em apreço, houve gravação dos depoimentos prestados em audiência de julgamento, e ainda prova documental e pericial, o que permitiu ao Tribunal Recorrido decidir acerca dos factos provados e não provados e proferir a decisão agora posta em causa, a qual, em nossa opinião, não merece qualquer tipo de censura, pois o Juiz aprecia a prova na sua globalidade e não de uma forma parcelar e estanque, sendo que de acordo com os mencionados princípios não poderia esperar-se outra decisão daquela que foi proferida.
XIV- A prova pericial produzida merece uma referência especial, que se afigura de extrema importância, já que foi efetuada uma perícia grafológica e que consta a fls.162-176 dos autos, de onde consta a seguinte conclusão: "A análise comparativa entre os caracteres aposto no documento considerado questionado (Contrato) com os caracteres fidedignos manuscritos pelo punho de J. A. mostra diferenças significativas entre si o que permite afirmar que é pouco provável que tenham sido todos manuscritos pelo mesmo punho a que corresponde um grau de significância compreendido entre 30% e 50%."- destacado nosso.
XV- Para além disso, aos diversos quesitos apresentados ao Sr. Perito, foram dadas respostas no sentido de que a assinatura aposta no Contrato de Confissão de Dívida com Garantia de avalista e Fiador, atribuída ao executado/oponente J. A., tinha diferenças significativas com a assinatura realizada pelo próprio punho deste, que era pouco provável que a assinatura constante do título executivo que serviu de base à execução atribuída ao executado/oponente J. A., tenha sido aposta pelo seu punho, que a assinatura se demonstrava falsificada por imitação servil, e ainda que era pouco provável que a letra e assinatura que constam do título executivo (documento particular junto com o requerimento executivo sob o nº 1) fossem da autoria do executado J. A..
XVI- Acresce ainda que o resultado da perícia realizada, conjuntamente com a prova testemunhal produzida, nomeadamente o depoimento da testemunha M. B., levaram a que o Meritíssimo Juiz a quo concluísse que o nome do executado aposto na "Confissão de Dívida", quer sob a forma de rubrica, quer sob a forma de assinatura, apresentada à execução, não foi aposto pelo punho do mencionado J. A., nem reconhecido presencialmente pela Dr.ª M. B..
XVII- Sendo certo que esta testemunha referiu que foi o A. J. quem lhe apresentou o documento dado à execução, e não identificou o executado como sendo a pessoa que acompanhava o mesmo. Referiu ainda que não lavrou o respetivo termo de autenticação pois esta segunda pessoa saiu muito rapidamente sem o ter assinado.
XVIII- Assim, do depoimento desta testemunha não resultou que o executado J. A. estivesse presente no seu escritório para o referido acto, o que conjuntamente com a prova pericial não permite que tal tivesse sido dado como provado.
XIX- Como tal, o reconhecimento de assinatura realizado não foi presencial, e dessa forma foi devidamente aplicado ao caso dos autos a inversão do ónus da prova, pelo que era a exequente/embargada quem tinha o ónus de provar a veracidade da assinatura, o que não logrou conseguir.
XX- Pelo que, não se poderia esperar outra decisão daquela que foi proferida. XXI- A lei exige que a prova indicada no recurso infirme ou invalide a decisão que foi tomada e determine, de modo inequívoco e inabalável a apreciação proposta pelo impugnante.
XXII- No entanto, entende o Recorrido que tal desiderato não foi atingido no recurso da Recorrente, ou seja, a prova indicada não impõe que se considerem provados os factos questionados, mas antes acontece que a impugnação assenta na apreciação pessoal e subjectiva da prova, por parte da Recorrente, o que não basta para impor a alteração do decidido.
XXIII- Assim, as alegações apresentadas pela Recorrente não passam de uma mera tentativa de alteração da prova produzida que não lhe foi favorável, o que não é legalmente possível, pois, o Tribunal da Relação é, neste caso, um Tribunal de Recurso e não de Julgamento.
XXIV- Pelo que, uma vez mais, a decisão recorrida não merece qualquer tipo de censura, pois não se poderia esperar outra decisão daquela que foi proferida.
XXV- Pelo que, a matéria de facto dada como provada e não provada é insuscetível de qualquer tipo de censura ou alteração, devendo o recurso improceder e a douta sentença manter-se inalterada.
XXVI- Face ao supra exposto, o Tribunal Recorrido decidiu bem ao julgar totalmente procedente a oposição à execução por embargos deduzida pelo embargante/executado J. A. contra a embargada/exequente X- Comércio de Automóveis, Unipessoal, Lda, e em consequência, determinou a extinção da instância executiva de que os presentes autos constituem apenso, assim como o levantamento das penhoras que incidiram sobre bens da sua pertença e/ou direito de que seja titular, condenado a embargada/exequente em custas em ambas as ações.
XXVII - Face ao exposto, o Tribunal Recorrido decidiu corretamente, devendo a sentença manter-se inalterada.
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Após os vistos legais, cumpre decidir.
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II QUESTÕES A DECIDIR.

Decorre da conjugação do disposto nos artºs. 608º, nº. 2, 609º, nº. 1, 635º, nº. 4, e 639º, do Código de Processo Civil (C.P.C.) que são as conclusões das alegações de recurso que estabelecem o thema decidendum do mesmo. Impõe-se ainda ao Tribunal ad quem apreciar as questões de conhecimento oficioso que se resultem dos autos.

Impõe-se por isso no caso concreto e face às elencadas conclusões decidir se:

-deve ser alterada a decisão sobre a matéria de facto que consta dos pontos dos factos provados e dos pontos dos factos não provados, designadamente no sentido proposto pela recorrente;
-se foi bem aplicado o direito, concretamente se a questão da falsidade invocada deve ser resolvida pela aplicação do artº. 374º, nº. 2, ou do artº. 375º, nº. 2, do C.C..
***
III IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO.

Nenhuma questão de ordem formal obsta à apreciação deste item, uma vez que a recorrente cumpriu os requisitos da impugnação, nomeadamente indica os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões; especificação na motivação dos meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados que, no seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos; fundando-se a impugnação em parte na prova gravada, indica na motivação as passagens da gravação relevantes; sugere ainda, subsidiariamente, a produção de novo meio de prova; apreciando criticamente os meios de prova, expressa na motivação a decisão que no seu entender deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas; tudo conforme resulta do disposto no artº. 640º, nºs. 1 e 2, do Código Processo Civil (C.P.C.) e vem melhor mencionado na obra de Abrantes Geraldes “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 4ª Edição, pags. 155 e 156.

Apreciando.

Insurge-se a recorrente no que se refere à matéria dada como provada e constante do ponto 8 do elenco dos factos, bem como a constante da alínea e) da matéria não provada. Invoca erro de julgamento e pretende a inversão do seu teor, ou seja, o que foi considerado provado no primeiro segmento do ponto 8 devia ser dado como não provado, e provado o inverso do segundo segmento, e o que foi dado como não provado na alínea e) devia ser dado como assente, e caso assim não se entenda, pede que os autos baixem à 1ª instância para realização de nova perícia.

Fundamenta-se no depoimento da Drª M. B., bem como em diferente análise da perícia grafológica realizada e constante de fls. 162 a 176, e ainda do relatório de exame pericial realizado pela PJ e constante a fls. 124 a 127 dos autos.

Dispõe o artº. 662º, n.º 1, do C.P.C. que “A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.” A Relação usa do princípio da livre apreciação da prova com a mesma amplitude de poderes da 1ª instância, nos termos que resultam do nº. 5 do artº. 607º do C.P.C.. Assim, após análise conjugada de todos os meios de prova produzidos, a Relação deve proceder a reapreciação da prova, de acordo com a própria convicção que sobre eles forma, sem quaisquer limitações, a não ser as impostas pelas regras de direito material. A propósito refere também Abrantes Geraldes na mesma obra, pag. 273, "(…) a Relação deve alterar a decisão da matéria de facto sempre que, no seu juízo autónomo, os elementos de prova que se mostrem acessíveis determinem uma solução diversa, designadamente em resultado da reponderação dos documentos, depoimentos e relatórios periciais, complementados ou não pelas regras de experiência”. E a pags. 274 (…) “a Relação tem autonomia decisória, competindo-lhe formar e formular a sua própria convicção, mediante a reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes ou daquelas que se mostrem acessíveis e com observância do princípio do dispositivo no que concerne à identificação dos pontos de discórdia”.

Relativamente ao primeiro segmento do ponto 8, ou seja, “…o nome do mencionado J. A., seja sob a forma de rubrica, seja sob a forma de assinatura, não foi aposta pelo seu punho…”, assume particular relevo a perícia realizada nos autos.
De acordo com o disposto no artº. 388º do Código Civil (C.C.), a prova pericial tem por fim a perceção ou apreciação de factos por meio de peritos, quando sejam necessários conhecimentos especiais que os julgadores não possuem ou quando os factos, relativos a pessoas, não devam ser objecto de inspeção judicial.
Por outro lado, determina o artº. 389º do mesmo Código que "a força probatória das respostas dos peritos é fixada livremente pelo tribunal." Face a essas especiais exigências, o julgador somente se deve afastar do parecer dos peritos com base em razões de desconfiança quanto à sua pessoa ou conteúdo da perícia ou com base em meios de prova alternativos e com idêntica relevância probatória. Seguindo a exposição do Acórdão desta Relação de 25/10/2018 (publicado em
www.dgsi.pt) “Deste entendimento sobre o valor da prova pericial deriva uma conclusão: sempre que entenda afastar-se do juízo técnico ou científico, o Tribunal deve motivar com particular cuidado a divergência, indicando as razões pelas quais decidiu contra essa prova ou, pelo menos, expondo os argumentos que o levaram a julgá-la inconclusiva, dever esse que deve ser cumprido com particular escrúpulo no tocante a juízos científicos dotados de especial densidade técnica ou obtidos por procedimentos cuja fiabilidade científica seja universalmente reconhecida [cfr. Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, 1979, Coimbra Editora, pág. 263 e 264 e acórdão da RC de 10/02/2015, proc. nº. 927/03.8TBFND-A, acessível em www.dgsi.pt).

Neste caso dos autos tal como no analisado no citado Acórdão, face à posição assumida pelo executado/embargante nos presentes autos, impugnando a autoria da assinatura do título executivo, suscitou-se a necessidade de determinar se a mesma lhe pertence, ou seja, se aquele documento foi assinado por ele. “O meio idóneo para verificar a autenticidade daquela assinatura é a prova pericial: a submissão do escrito ao exame de pessoas especializadas no trabalho do reconhecimento da genuinidade da letra, a fim de que digam se a letra é do punho da pessoa a quem se imputa. Essa perícia obedece, em regra – e obedeceu no caso - a esta metodologia: o perito ou peritos comparam a letra que se pretende reconhecer com outra que se saiba – comprovadamente – pertencer a pessoa a quem aquela é atribuída. É, portanto, pelo confronto das duas letras que os peritos podem emitir o seu juízo sobre a veracidade ou falsidade da letra ou assinatura. É claro que pode dar-se o caso de se estabelecer judicialmente a autenticidade da letra independentemente da perícia. É a hipótese de o escrito ou a assinatura terem sido feitos na presença de pessoas que, interrogadas, afirmem perentória – e convincentemente – terem visto assinar o documento à pessoa a quem a assinatura é imputada. Fora esta hipótese, o meio idóneo para verificar a autenticidade da assinatura é o exame pericial (cfr. acórdão da RC de 10/02/2015 acima referido).

Assim, em primeiro lugar e com valor preponderante face ao exposto, temos o resultado do exame pericial realizado nos autos, tal como considerou a primeira instância. Neste conclui-se que a análise comparativa entre os caracteres aposto no documento questionado –contrato- com os caracteres fidedignos manuscritos pelo punho do executado/embargante mostra diferenças significativas entre si o que permite afirmar que é pouco provável que tenham sido todos manuscritos pelo mesmo punho a que corresponde um grau de significância compreendido entre 30% e 50%. Mais se respondeu concretamente ao objeto da perícia que a assinatura aposta no Contrato de Confissão de Dívida com Garantia de avalista e fiador, atribuída ao executado, tem diferenças significativas com a assinatura realizada pelo punho deste, e ainda que é pouco provável que a assinatura constante do sobredito título executivo que serve de base à presente execução atribuída ao executado tenha sido aposta pelo seu punho; e ainda à pergunta se tal assinatura se demonstra falsificada respondeu-se que tal assinatura demonstra-se falsificada por imitação servil; e por último que é pouco provável que a letra e assinatura que constam do título executivo sejam da autoria do executado; tudo conforme vem devidamente destacado na motivação constante da sentença proferida.

É certo que de acordo com a tabela de significância temos um intervalo para o pouco provável entre os >30 - <50%. Note-se que os (=) 50% significa que pode ter sido. Assim, se de facto o intervalo é grande e não sabemos, porque não é assim que está determinado, se nos aproximamos mais dos 30 ou dos 50, do relatório encerra contudo um juízo de falsidade quanto à imputação da autoria da assinatura ao executado.

Relativamente à ponderação do exame pericial realizado pelo LPC, cujo relatório se encontra junto a fls. 124 a 127 extraído do Inquérito nº. 392/13.1TAVVD (no qual é ofendido o executado e arguido A. J.), a mesma foi feita em sede de motivação na sentença proferida, constatando-se que o mesmo assume nestes autos a faceta de prova documental e não pericial –e de facto assim é desde logo por não se verificar a sua junção dentro do circunstancialismo previsto no artº. 421º, nº. 1, do C.P.C.; e, ainda assim, aí se afirmou não ser possível obter resultados conclusivos. Concorrendo para as dúvidas, acaba por ir ao encontro da perícia realizada nos autos, uma vez que tal como se refere na sentença nos coloca num juízo de probabilidade na ordem dos 50% de hipótese de a assinatura ter sido ou não efetuada pelo executado. Não há qualquer contradição entre um e outro elemento, há antes avaliações mais ou menos aproximadas.

Também não se denota qualquer fragilidade na prova produzida que leve à necessidade de produção de nova perícia, uma vez que não há qualquer dúvida fundada sobre a prova realizada, como veremos –artº. 662º, nº. 2, b), do C.P.C..
A prova científica - para apurar a veracidade da autoria dessa assinatura –foi, e conforme motivação feita na sentença sob recurso, coadjuvada por prova testemunhal.
Entramos então na análise do depoimento da testemunha M. B., meio de prova de que se serviu o Tribunal recorrido para formar a sua convicção, e que serve de coadjuvante ao recorrente para a impugnação da matéria de facto.
Ouvido o depoimento da testemunha, a mesma efetivamente não identificou de forma clara e sem manifestar dúvidas, antes hesitando, a pessoa que acompanhava o aludido A. J., nomeadamente como sendo o executado/embargante ali presente.
E no seu depoimento colocou em crise a autenticidade do carimbo de fls. 75 verso, 76 verso, 77 verso e 78, e bem como da sua própria letra/assinatura de fls. 75 verso, 76 verso e 77 verso.
O circunstancialismo que a Drª M. B. descreveu e que rodeou o ato (o pedido de reconhecimento foi-lhe feito pelo A. J., a dúvida quanto à ligação da assinatura que reconheceu à pessoa do executado, a sua saída rápida e a falta de conclusão do termo, bem ou mal analisada a questão pela mesma Drª M. B.), conjugado com a prova pericial e documental já mencionada, levou o Tribunal “a quo” a formar a sua convicção no sentido que consta da globalidade do ponto 8 dos factos provados. O Tribunal considerou o seu depoimento sério, linear e credível.
Efetivamente e reproduzido na globalidade o seu depoimento, a Drª M. B. apenas afiançou que recebeu duas pessoas que exibiram os documentos de identificação correspondentes aos segundo e terceiro outorgantes, e essas pessoas assinaram o contrato á sua frente. Resulta do seu depoimento que a mesma não se questionou na altura se a pessoa que ali estava, junto com o A. J. que conhecia bem, era de facto o executado, uma vez que estava de boa fé; por isso na altura não teve dúvidas quanto a tal, mas hoje e perante todo o desenrolar de acontecimentos, não pode garantir que que a pessoa que se apresentou a assinar o documento era o efetivamente o J. A., refere mesmo que hoje tem dúvidas que na altura não teve; refere ainda que o J. A. só entrou no escritório para assinar, ou quem o A. J. levou para o efeito.
Afirma esta testemunha que sabia quem era o executado (pessoa conhecida na terra e co quem já tinha falado socialmente por uma vez), conhece o outro irmão, presume que não tem nenhum gémeo, tudo a levando a crer, acha, que foi o sr. que lá esteve, na altura não lhe suscitou dúvidas, o próprio irmão (A. J.) não desmentiu que era ele, referiu-o como irmão; o outro sr. que assinou parece-lhe ser o que está presente…, foi-lhe exibido o bilhete de identidade, em que termos ou como o obteve isso não sabe (!); estava lá essa (uma) pessoa, com quem nem falou, que assinou e a assinatura estava conforme o bilhete de identidade, pelo menos a “olho nú”.
As dúvidas que hoje a Drª M. B. tem e o contexto dos factos tal como o descreve, adensam a convicção de que não foi o executado que se apresentou a assinar o documento, convergindo no sentido do juízo que resulta do relatório pericial.
Portanto, a testemunha que teve intervenção direta no caso, não confirma que foi o executado a assinar, e ao não fazê-lo (e o contexto que descreve) reforça a conclusão no sentido da falsidade que está expressa no relatório pericial. Pode pois concluir-se com a necessária segurança pela prova do facto elencado no ponto 8. A prova de um facto não exige que se tenha uma certeza absoluta e inabalável sobre a veracidade do facto; deve ser dado como provado se existir um grau de certeza suficiente que vá além dos meros indícios ou probabilidades de ser verdadeiro.
Cremos porém que a segunda parte do ponto 8, quando se diz que “nem foi reconhecido presencialmente pela aludida M. B.”, deve ser alterado.
De facto, em sede de articulados não é levantada qualquer questão, vício ou falsidade relativamente ao ato praticado pela Drª M. B.. Quando se refere na oposição que a assinatura do executado não foi reconhecida presencialmente pela aludida M. B. quer com tal afirmação reforçar que a assinatura não foi por si aposta, logo a sua assinatura não foi reconhecida presencialmente –cfr. artigos 16, 17 e 21 da oposição. Quanto à validade formal do ato não foi suscitado qualquer incidente.
Em sede de audiência de julgamento foram abordadas questões relativas à validade formal ou incompletude do ato, questão (bem ou mal) analisada pela Drª M. B.: a mesma nega que tenha colocado o carimbo (chegando a referir que terá sido habilidosamente feito), nega que tenha certificado (até refere que costuma colocar um visto na assinatura), não lavrou o termo porque o documento lhe suscitou dúvidas e porque quem se identificou como J. A. já se tinha ausentado, apenas a assinatura da parte do reconhecimento da letra é dela (-a pag. 3 do documento foi assinado pelo segundo e quem se intitulou como terceiro outorgante na sua presença), logo a própria considera que o reconhecimento não vale como tal. A Drª M. B. refere aliás que devia ter retido o documento precisamente porque no seu entender ele não estava feito, mas tal só aconteceu porque o A. J. referiu que teria de o elaborar novamente e voltaria para repetir o acto. Estas vicissitudes servem para contextualizar a elaboração do ato, reforçando a convicção da falsidade da assinatura. Mas quanto ao reconhecimento propriamente dito não foi alegada a sua falsidade e não foram retiradas consequências do depoimento da Drª M. B.. Por isso essa matéria ficaria, quando muito, duvidosa.
Posto isto, cremos que o ponto 8 dos factos provados se deve manter, mas fazendo a ligação entre a parte que refere que a rubrica e assinatura não foram apostas pelo punho do executado e por isso não foi a sua rubrica e assinatura reconhecida presencialmente pela aludida M. B.. É este o sentido alegado, e nada mais se provou.
Tal como, pelos mesmos motivos se deve manter como não provada a matéria constante da alínea e) dos factos não provados, apesar de redundante, ou seja, que o executado teve intervenção na subscrição desse escrito.
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Cabe previamente retificar a matéria e motivação de facto relativamente a lapsos de escrita suscitados nas contra-alegações do recorrido (porque de facto se trata de mero lapso como decorre com clareza do texto, e portanto este Tribunal pode sanar e ultrapassar), e que consiste na referência a João em vez de José no ponto 5 dos factos, e o mesmo lapso no parágrafo 22 da motivação.
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IV MATÉRIA DE FACTO.

Estão assim provados os seguintes factos:

1. No âmbito do processo de execução com o nº404/13.9TBBRG – de que os presentes autos constituem apenso –, instaurado no dia 17 de Janeiro de 2013, a embargada/exequente “X” reclama do embargante/executado J. A. o pagamento da quantia total de €27.985,37 (vinte e sete mil, novecentos e oitenta e cinco euros e trinta e sete cêntimos), correspondendo o valor de capital à quantia de €27.696,00 (vinte e sete mil, seiscentos e noventa e seis euros), a que acrescem juros de mora (vencidos e vincendos), até efectivo e integral pagamento.
2. A embargada/exequente fundou a execução num escrito particular, denominado ‘Contrato de Confissão de Dívida com Garantia de Avalista e Fiador’, celebrado, alegadamente, no dia 21 de Novembro de 2012, em Braga.
3. No escrito referido em 2. consta que aquela “X” – na qualidade de primeiro outorgante –, A. J. – na qualidade de segundo outorgante – e o embargante/executado J. A. – na qualidade de terceiro outorgante –, estipularam, além do mais, que:
(…)
CLAUSULA PRIMEIRA
No exercício da sua actividade, a primeira outorgante devolve á segunda outorgante a viatura Porsche chassi … que lhe comprou pelo valor de 45000€, e que já tinha pago 27696€.
CLAUSULA SEGUNDA
Pelo presente contrato, o segundo outorgante confessa-se devedor á primeira outorgante do valor de 27696€ (vinte e sete mil seiscentos e noventa e seis euros).
CLAUSULA TERCEIRA
Que a referida quantia será paga pelo segundo outorgante ao primeiro em sete prestações, a primeira prestação do montante de 4200€ (quatro mil e duzentos euros) no dia 05 de Dezembro de 2012, as restantes seis prestações iguais e sucessiva no montante de 3916€ (três mil novecentos e dezasseis euros) cada uma, vencendo-se a segunda no dia 20 de Dezembro de 2012 e cada uma das restantes em igual dias dos meses seguintes.
CLAUSULA QUARTA
O não pagamento, por parte do segundo outorgante, de qualquer das prestações estipuladas, importará o imediato vencimento de toda a dívida e a sua imediata exigibilidade.
CLAUSULA QUINTA
Todos os outorgantes concedem ao contrato força de título executivo.
CLAUSULA SEXTA
O presente contrato não é passível, por qualquer forma, da alteração ou anulação, no todo ou em parte, excepto por documento escrito e assinado por todas as partes, sendo ineficazes quaisquer comunicações, declarações ou acordos verbais.
CLAUSULA SÉTIMA
O terceiro outorgante constitui-se pela presente avalista e fiador do principal pagador de todas as obrigações assumidas e decorrentes desta declaração pela segunda outorgante, renunciando expressamente ao benefício da excussão prévia.
(…)
Declaram os outorgantes que estão de acordo com as condições estipuladas no presente contrato, pelo que vão assiná-lo em três exemplares valendo todos como originais, por estar conforme a vontade das partes, vão assinar:
(…)
4. Nesse escrito consta o nome, sob a forma de rubrica e sob a forma de assinatura, do embargante/executado.
5. No escrito referido em 2. consta, também, um ‘Reconhecimento com menções especiais presenciais’ dos ‘interessados’ J. A. e A. J..
6. No campo ‘Observações’ do reconhecimento referido em 5. fez-se constar: (…) No uso das competências reconhecidas pelo DL 76-A de 29 de Março, reconheço as assinaturas e rubricas constantes DO CONTRATO DE CONFISSÃO DE DÍVIDA, composto por 3 páginas, outorgadas por A. J. e de J. A., portadores do CC … e BI …, respectivamente, os quais verifiquei, efectuadas por ambos na minha presença.
7. Do reconhecimento referido em 5. consta, ainda, que, alegadamente, foi executado no dia 21 de Novembro de 2012, pelas 15 horas e 49 minutos, foi registado nesse mesmo dia pelas 15 horas e 53 minutos e foi realizado por M. B., Advogada, titular da cédula profissional nº …, com domicílio profissional na Avenida … Vila Verde.
8. Sucede, porém, que, sem prejuízo do que se refere em 2., 3., 4., 5., 6. e 7., o nome do mencionado J. A., seja sob a forma de rubrica, seja sob a forma de assinatura, não foi aposto pelo seu punho e por isso não foi reconhecida presencialmente pela aludida M. B..
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Factos não provados

a) que a embargada/exequente “X”, no âmbito da sua actividade comercial, adquirisse a A. J., uma viatura da marca “Porsche”, modelo “911 Carrera”, de matrícula alemã …, de cor branca, chassis nº …, pelo preço ajustado de €45.000,00 (quarenta e cinco mil euros), tendo pago logo parte desse montante, no valor de €27.696,00 (vinte e sete mil, seiscentos e noventa e seis euros);
b) que nesta sede, volvido algum tempo e mercê de problemas detetados no motor do sobredito veículo mutuamente reconhecidos por ambas as partes, fosse acordado pelas mesmas anular o negócio e nessa decorrência proceder à devolução da viatura por parte da embargada/exequente e à restituição da quantia de €27.696,00 (vinte e sete mil, seiscentos e noventa e seis euros) por parte do, então, vendedor A. J.;
c) que tendo a embargada/exequente procedido à entrega da viatura e atenta a circunstância de o mencionado A. J., em tal momento, não possuir disponibilidade financeira para reembolsar na íntegra o valor de €27.696,00 (vinte e sete mil, seiscentos e noventa e seis euros), decidissem titular a existência dessa dívida, bem assim como a definição de um plano prestacional tendo em vista o cumprimento dessa obrigação;
d) que o escrito particular, referido sob o nº2, dos factos provados, fosse elaborado nas circunstâncias descritas em a), b) e c);
e) que o embargante/executado J. A. tivesse intervenção na subscrição deste escrito.
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V O MÉRITO DO RECURSO.

Não tendo sido apontada nenhuma nulidade de sentença, e feita a retificação suscitada pelo embargado, cumpre apreciar a aplicação do direito.

Em primeiro lugar, cabe verificar se o reconhecimento da assinatura do executado enquanto ato formal está correto, uma vez que daí depende a aplicação do artº. 374º, nº. 2, do C.C., ou 375º do mesmo –ou seja, daí resulta a distribuição do ónus da prova, havendo que aferir se aquele relativamente ao qual o mesmo impendia provou o facto respetivo.

Põe-se, na realidade, a questão de saber sobre quem recai o ónus da prova no caso de o executado negar, em oposição à execução, que a assinatura feita no título dado à execução seja do seu punho. Se na oposição à execução por embargos de executado é posta em causa a validade do título executivo e este é um documento particular, é ao embargado que incumbe fazer a prova dos factos constitutivos do seu direito, ou seja, de que o título é válido e a relação jurídico material que lhe deu causa corresponde à realidade dos factos. Já ao embargante cumpre fazer a prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos.
Equivale isto a dizer que, à partida caberia ao embargado/exequente provar a veracidade da assinatura posta em crise para desse modo sustentar o título dado à execução.

Conclui-se, deste modo, que o Recorrente tinha que provar a validade do título, atento o disposto no nº. 1 do artº. 342º e nº. 2 do artº. 374º do C.C.. Veja-se nesta matéria o Ac. desta Relação de 10/11/2016, publicado igualmente em www.dgsi.pt.
Só assim não será se a assinatura estiver efetivamente reconhecida, uma vez que nesse caso caímos antes no campo de aplicabilidade do artº. 375º do C.C. -assinatura reconhecida presencialmente nos termos das leis do notariado.
O reconhecimento não encerra qualquer irregularidade que pudesse ser de conhecimento oficioso, obedecendo aos requisitos exigidos pelo artº. 155º, do Código Notariado, conjugado com o artº. 46º, nº. 1, a), e ainda com o previsto no Decreto-lei nº. 76-A/2006 de 29/3 no que concerne à atribuição da competência ao advogado, nomeadamente porque daí não resulta ser necessário que os outorgantes assinem o termo.
De qualquer modo essa é uma “falsa” questão na medida em que as circunstâncias que rodearam a realização do reconhecimento apenas relevaram para a formação da convicção do Tribunal.
Mas uma coisa é a sua validade formal, outra coisa é a sua validade material.
Estando por isso a assinatura nele aposta e atribuída ao aqui executado J. A. reconhecida presencialmente, cabia a este provar que o reconhecimento presencial da assinatura é falso, ou que a assinatura é falsificada, o que arrasta a falsidade do seu reconhecimento, de acordo com o disposto no artº. 375º do C.C., nº. 2.
O artº. 375º do C.C. encerra mais do que uma situação: pode dar-se o caso de ser falso o reconhecimento e verdadeira a assinatura, ou de ser falsa a assinatura o que acarreta a falsidade do reconhecimento pois o seu objeto é falso (assinatura), com as consequências legais; é perante este último caso que nos encontramos, limitada a questão pela arguição feita em sede de oposição –o reconhecimento é falso não por força dos vícios apontados em sede de audiência de julgamento (que levantariam pelo menos dúvidas quanto aos termos da sua elaboração) porque essa matéria nem foi alegada em sede de oposição, nem dela foi retirada qualquer consequência, mas por força do facto de não ter sido o executado a realizar a assinatura. Veja-se sobre a matéria os Acs. da Rel. de Lisboa de 24/01/2019 e de 29/06/2017, ambos publicados na dgsi.pt.
Ora, face à redação do ponto 8 dos factos provados, o executado/embargante logrou cumprir esse ónus (ao contrário de ter ficado dúbio, como pretendia o recorrente para desse modo se prevalecer do incumprimento do ónus probatório que passaria a caber à outra parte).
Por isso e embora por caminho diverso, conclui-se, tal como na sentença proferida, que a embargada/exequente não dispõe de título que sustente a presente execução, devendo proceder a oposição à execução.
***
VI DISPOSITIVO.

Pelo exposto, acordam os juízes do Tribunal da Relação em julgar o recurso improcedente e, em consequência, negam provimento à apelação e confirmam a douta sentença recorrida.
Custas do recurso pela recorrente.
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Guimarães, 26 de setembro de 2019.
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Os Juízes Desembargadores
Relator: Lígia Paula Ferreira Sousa Santos Venade
1º Adjunto: Jorge dos Santos
2º Adjunto: Heitor Pereira Carvalho Gonçalves

(A presente peça processual tem assinaturas eletrónicas)