Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
963/10.8TBPRG-D.G1
Relator: MARIA EUGÉNIA PEDRO
Descritores: IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
INSUFICIÊNCIA DOS BENS PENHORADOS
MEDIDA DA INSUFICIÊNCIA
PENHORA NOUTROS BENS
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 06/15/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I. O art. 752º, nº1 do CPC estabelece a obrigatoriedade de nas execuções por dívidas com garantia real sobre bens do devedor a penhora se iniciar pelos bens onerados com essa garantia.
II. Porém, reconhecida pelo agente de execução a insuficiência dos bens sobre as quais incide a garantia, a penhora pode recair noutros bens do devedor sujeitos à execução.
Decisão Texto Integral:
Acordam os Juízes da 1ª Secção do Tribunal da Relação de Guimarães:

I. Relatório

M. F., executada nos autos principais de execução nº 863/10.8TBPRG, deduziu em 6.11.2020 oposição à penhora dos seguintes bens: um sexto de uma quota da Sociedade Agrícola Quinta ..., Lda., no valor de € 149,64; uma quota da mesma sociedade, no valor de €2.344,35, de que é titular, e a parte penhorável da sua pensão, na qualidade de beneficiária da Caixa Geral de Aposentações.

A fundamentar a sua pretensão, alegou, em síntese, que:

- Foram penhorados 5/6 do prédio misto, sito no Lugar …, freguesia de ..., Peso da Régua, inscrito na matriz predial rústica da freguesia de ... sob o artigo ….º B e na matriz predial urbana da freguesia de ... sob o artigo ...º, descrito na CRP sob o n.º …”; o valor de mercado desse prédio é de € 598.740,00 e a dívida exequenda, acrescida das despesas prováveis, é de € 406.915,35, pelo que o valor do imóvel penhorado é capaz de cobrir a quantia Exequenda; A exequente indicou juros contratuais e moratórios vencidos e despesas judiciais que não aceita, pois não têm qualquer cabimento legal.
- A agente de execução em funções penhorou 1/6 de uma quota que detém na “Sociedade Agrícola Quinta ..., Lda”, no valor de € 149,64, bem como outra quota da mesma sociedade que lhe pertence por inteiro, no valor de € 2.344,35; a penhora dessas participações sociais é desproporcionada, visto que o valor do imóvel penhorado é suficiente para pagamento da quantia exequenda, pelo que não tem aplicação o disposto no n.º 1, in fine, do art.º 752.º CPC, vd. n.º 3, art.º 735.º CPC;
- A penhora de outros bens está dependente de prévio reconhecimento por parte da agente de execução da insuficiência do bem onerado e já penhorado, mediante pedido expresso da exequente nesse sentido; da decisão da agente de execução deve constar o limite do valor a penhorar, que será o valor em dívida deduzido do valor expectável do bem; nem a agente de execução, nem a exequente cumpriram com os referidos requisitos legais e o pagamento da dívida encontra-se garantido com a penhora dos 5/6 do imóvel hipotecado.
*
Regularmente notificada, a Exequente/Oponída veio contestar, aduzindo, em suma, que:

- O valor do imóvel penhorado é insuficiente para satisfação integral do crédito exequendo e a competência para formular o juízo relativo ao reconhecimento da insuficiência dos bens onerados para garantir o fim da execução pertence ao agente de execução, o qual em 05.12.2020 reconheceu expressamente a insuficiência desse imóvel para pagamento da quantia exequenda, determinando a prossecução da penhora sobre outros bens dos executados, concretamente, sobre as participações sociais da opoente na “Sociedade Agrícola Quinta ..., Lda”, sendo que, o reconhecimento da insuficiência desse imóvel para pagamento da quantia exequenda, foi precedido de pedido prévio da exequente nesse sentido em 25/09/2018, pelo que, quer a agente de execução, quer a exequente cumpriram com todas as exigências legalmente previstas no caso concreto.
- Em 09.10.2018 e 01.10.2020, a agente de execução manifestou o seu parecer no sentido de deverem ser penhorados outros bens dos executados por insuficiência do imóvel hipotecado na satisfação do crédito da exequente e, em cumprimento do despacho de 23.11.2020, proferiu decisão onde apurou o valor atualmente em dívida, que ascende à quantia de € 781.414,29, ou seja, o valor da quantia exequenda ultrapassa largamente o real valor do imóvel penhorado nos autos, sendo este manifestamente insuficiente para satisfazer o pagamento da quantia exequenda.
- A avaliação do imóvel penhorado constante dos autos foi realizada pela exequente há mais de 7 anos, sendo que, atualmente, esse imóvel encontra-se, substancialmente degradado e a necessitar de profundas obras de restauro e manutenção, sendo o seu real valor de mercado seguramente inferior ao apurado na dita avaliação, efetuada há mais de 7 anos e tanto assim é que, em 09.10.2018, tinham já decorrido mais de trinta meses sem que se verificasse qualquer perspetiva de venda do mesmo, salientando que, a única proposta efetuada para aquisição desse imóvel se cifrou no valor de apenas € 127.750,00.
- A penhora recaiu apenas sobre 5/6 do imóvel e não a totalidade do mesmo o que, para além de diminuir o valor transacionável do imóvel em causa, dificulta também a sua venda.
- A Opoente tem a perfeita consciência dessa insuficiência, no entanto, não se inibe de alegar factos que bem sabe serem falsos e cuja falsidade é facilmente comprovada pelos elementos constantes da execução, sendo a intenção do Oponente apenas o protelar indefinidamente a satisfação integral do crédito da exequente, atuando em juízo de forma manifestamente reprovável, eventualmente subsumível a uma verdadeira litigância de má-fé, tanto assim é, que vem o oponente invocar a alegada cobrança de juros indevidos quando bem sabe que o valor dos respetivos juros estão englobados na quantia exequenda e só podiam ter sido postos em causa na oposição à execução, mediante embargos de executado e não na presente oposição à penhora, cujos fundamentos encontram-se previstos no art.784.º do CPC.
Concluiu pugnando pela improcedência da oposição e pela manutenção das penhoras realizadas.
*
Seguindo os autos os seus termos, teve lugar a audiência de julgamento e, em 30.12.2021, foi proferida sentença que julgou totalmente improcedente a oposição.
*
Inconformada, a executada/opoente apresentou o presente recurso, terminando as suas alegações, com as seguintes conclusões que se transcrevem:

A. O presente recurso vem interposto por conta da douta sentença de referência eletrónica 36270483 que, em suma, julgou improcedente a oposição à penhora apresentada pela Opoente / Recorrente, na sequência da penhora da sua pensão de reforma e das quotas sociais, sua pertença, da sociedade comercial “Sociedade Agrícola Quinta ..., Lda.”.
B. Salvo o devido respeito, que é muito e merecido, a Opoente / Recorrente não pode conformar-se com o teor da douta sentença; tanto mais que entenda que a mesma há incorrido em erro de apreciação da prova processual / documental considerada nos presentes autos; pelo que, assim, a impugna, como supra se disse e infra mais bem se dirá.
C. Os presentes autos executivos tiveram o seu início por conta de um contrato de mútuo celebrado entre a Opoente / Recorrente e os seus filhos, Executados, na qualidade de mutuários, e a Oponída / Recorrida; mútuo esse, a par do qual foi celebrada hipoteca voluntária incidente sobre 5/6 de um prédio misto, propriedade de todos os Executados, a fim de garantir o pontual e normal cumprimento das obrigações assumidas.
D. Desta feita, tendo sido dado início a estes autos executivos, a Senhora Agente de Execução principiou – e bem – pela penhora do referido prédio misto, nos termos do disposto na primeira parte do artigo 752.º, número 1 do Código de Processo Civil.
E. Assim, volvidos alguns anos sem que conseguisse efetivar-se a venda do aludido prédio misto, a Oponída / Recorrida veio aos autos, através de comunicação à Senhora Agente de Execução, datada de 25 de outubro de 2018 e com referência eletrónica 1742519, requerer que a Senhora Agente de Execução procedesse a penhoras de outros elementos patrimoniais dos Executados, nomeadamente da Opoente / Recorrente.
F. A esta comunicação, a Senhora Agente de Execução respondeu, no dia 09 de outubro de 2018, através de resposta a solicitação de tribunal de referência eletrónica 1755890, em que dava conta das dificuldades sentidas na venda judicial já em curso; solicitando, por tal, à Meritíssima Juiz do Tribunal a quo, informações acerca da possibilidade de proceder a eventuais novas penhoras.
G. Perante isto, a Oponída / Recorrida, no dia 10 de outubro de 2018, apresentou comunicação à Senhora Agente de Execução, de referência eletrónica 1757303, em que, em suma, peticionava que esta procedesse a penhoras “de outros bens de todos os executados”.
H. Os autos foram seguindo o seu curso e, no dia 01 de outubro de 2020. A Senhora Agente de Execução apresentou resposta a solicitação de Tribunal de referência eletrónica 2385394, através da qual requer que seja dado “deferimento ao requerimento junto aos autos no dia 09 de outubro de 2018”.
I. No dia 09 de outubro de 2020, através de requerimento para outras questões de referência eletrónica 239074, a Oponída / Recorrida expõe que deveria, o Tribunal a quo, permitir que a Senhora Agente de Execução procedesse à penhora da pensão de reforma da Opoente / Recorrente, das suas quotas sociais e de outros eventuais bens ou direitos; acrescentando, ainda, que o requerimento anteriormente apresentado pela Senhora Agente de Execução se mostrava “totalmente desnecessário, para além de dilatório”.
J. Perante isto, no dia 12 de outubro de 2020, a Senhora Agente de Execução procedeu, através de comunicação de referência eletrónica 2393789, a um pedido de penhora da pensão de reforma da Opoente / Recorrente, dirigido à Caixa Geral de Aposentações; que acabou por vir a efetivar-se no dia 30 de outubro de 2020, como consta do Auto de Penhora, junto em anexo a requerimento de referência eletrónica 2416218, de 31 de outubro de 2020.
K. E, no dia 24 de outubro de 2020, a Senhora Agente de Execução procedeu à penhora das quotas da sociedade comercial “Sociedade Agrícola Quinta ..., Lda.”, infra mais bem identificadas.
L. A par disto, no dia 23 de novembro de 2020, foi proferido douto despacho, de referência eletrónica 34958150, através do qual a Meritíssima Juiz do Tribunal a quo ordenou a notificação da Senhora Agente de Execução para “proferir decisão sobre a (in)suficiência dos bens penhorados para a satisfação da quantia exequenda e demais acréscimos legais.”.
M. A isto, respondeu a Senhora Agente de Execução, no dia 05 de dezembro de 2020 – porque instada –, através de decisão de referência eletrónica 2451893, em se reconheceu “a insuficiência do bem sobre o qual impende a garantia, pelo que vai a Execução prosseguir com a penhora de outros bens que sejam identificados”.
N. Quando, em bom rigor, já as penhoras haviam sido – em larga medida – feitas!
O. Por tudo isto, não pode aceitar-se, qua tale, o elenco dos factos dados como provados e relevados para a decisão da causa.
P. Assim, antes do mais, a Opoente / Recorrente entende que a factualidade julgada como provada e elencada sob a alínea K) foi erradamente considerada; antes devendo, sem mais, ser retirada de tal elenco.
Q. Já que, nos requerimentos de 09 de outubro de 2018 e 01 de outubro de 2020, supra mais bem identificados, a Senhora Agente de Execução não faz qualquer menção à suficiência, ou insuficiência da quota-parte do imóvel penhorado nos autos.
R. Apenas emitindo decisão de insuficiência no dia 05 de dezembro de 2020, através da decisão supra mais bem identificada, porque, para tanto, instada pela Meritíssima Juiz do Tribunal a quo.
S. Até então, a Senhora Agente de Execução há dado conta das dificuldades e delongas na venda, nomeadamente por não se tratar da totalidade do imóvel; das diligências de penhora de outros bens e / ou direitos já iniciadas; mas não há, em momento algum, dito que o valor do imóvel, ou da fração penhorada do mesmo, não se mostraria passível de pôr cobro à dívida exequenda e demais despesas inerentes.
T. Tanto mais que termina pedindo, à Meritíssima Juiz do Tribunal a quo, que se digne dar instruções sobre novas penhoras a levar a cabo; e tanto mais, ainda, que se pudesse considerar-se que naquelas referidas datas – constantes da alínea K) – a Senhora Agente de Execução se tivesse pronunciado pela insuficiência, não faria qualquer sentido a prolação do douto despacho de 23 de novembro de 2020, a solicitar tal pronúncia da Senhora Agente de Execução e, bem assim, a ulterior resposta – nos termos em que foi dada, pela Senhora Agente de Execução, no dia 05 de dezembro de 2020. (!!)
U. Por tal – reforça-se – a Opoente / Recorrente entende que a alínea K) do elenco dos factos julgados como provados não deveria, pois, e sem mais, constar daquele elenco, já que impropriamente julgada, salvo o devido respeito que é muito e merecido.
V. A par disto, e considerando tudo quanto supra se disse, a Opoente / Recorrente é a considerar, ainda, que no elenco dos factos dados como provados, relevantes para a tomada da decisão recorrida, deveriam ser feitos integrar, alfabeticamente, os seguintes factos:
E.1) No dia 24 de outubro de 2020, a Senhora Agente de Execução elaborou Auto de Penhora relativo a 1/6 de uma quota da sociedade comercial “Sociedade Agrícola Quinta ..., Lda.”, pertencente à Opoente / Recorrente, no valor nominal de € 149,64 (cento e quarenta e nove euros e sessenta e quatro cêntimos), e uma quota da mesma sociedade comercial, pertencente à Opoente / Recorrente, com o valor nominal de € 2.344,35 (dois mil, trezentos e quarenta e quatro euros e trinta e cinco cêntimos). Auto, esse, que fez juntar aos presentes autos, como anexo de requerimento de referência eletrónica 2408981, datado do mesmo dia 24 de outubro de 2020.
E.2) No dia 30 de outubro de 2020, a Senhora Agente de Execução elaborou Auto de Penhora relativo à parte legalmente permitida da pensão de reforma da Opoente / Recorrente. Auto, esse, que fez juntar aos presentes autos, como anexo de requerimento de referência eletrónica 2416218, datado de 31 de outubro de 2020; e cujo pedido havia, já, sido formulado no dia 12 de outubro de 2020, através de comunicação dirigida à Caixa Geral de Aposentações, através de comunicação de referência eletrónica 2393789.
W. Isto posto, não se olvida que, por conta do disposto no artigo 601.º do Código Civil, à partida, todo o património da Opoente / Recorrente responderia pelas suas dívidas.
X. Da mesma forma que não se olvida que quotas de sociedades comerciais e (parte de) pensão de reforma não se assumem, à partida, como absolutamente impenhoráveis, nos termos do disposto nos artigos 736.º e 737.º do Código de Processo Civil.
Y. Porém, reforça-se que devido à hipoteca voluntária celebrada nos presentes autos, nos termos do disposto nos artigos 752.º, número 1, segunda parte do Código de Processo Civil e 697.º, primeira parte do Código Civil, as diligências de penhora a efetuar teriam que, inelutavelmente, se iniciar pelo imóvel objeto do direito de garantia real.
Z. Resultando, ainda, das referidas normas legais que antes de poderem ser levadas a cabo quaisquer diligências de penhoras de outros bens e / ou direitos do património de qualquer um dos devedores (como, por exemplo, a pensão de reforma ou as quotas sociais da Opoente / Recorrente) seria necessário reconhecer expressa e fundamentadamente a insuficiência do bem imóvel realmente garantido.
AA. O que bem se compreende atenta a necessária humanização do processo executivo, que impede a satisfação do direito dos credores a qualquer custo, mormente o da dignidade dos devedores; que se traduz na proibição da execução incriteriosa do património destes.
BB. Assim, considerando principalmente o avultado número de vezes (para além das referidas, atente-se, ainda, no disposto no artigo 751.º, número 5, alínea b) do Código de Processo Civil) que o legislador expressamente refere a necessidade daquele expresso reconhecimento prévio de insuficiência, não pode, sem mais, desconsiderar-se tal imposição, como a douta sentença recorrida acabou por fazer.
CC. Em face do exposto, bem se vê que não pode, por forma alguma, haver lugar a penhoras ulteriores sem aquele expresso e fundamentado reconhecimento de insuficiência que, no caso dos presentes autos, aconteceu cerca de um mês e meio depois de terem sido penhoradas as quotas sociais e a pensão de reforma da Opoente / Recorrente.
DD. Nunca tendo sido, em momento anterior e por qualquer forma ou via, expressado qualquer juízo de insuficiência: não basta, pois, referir a dificuldade na efetivação da venda ou a ausência de propostas para que se conclua que o um bem penhorado não tem valor bastante para cobrir a dívida exequenda e as despesas inerentes.
EE. Tanto mais que, até àquele dia 05 de dezembro de 2020 e a decisão da Senhora Agente de Execução então proferida, era, mais ou menos, assente nos presentes autos que o valor do imóvel penhorado nos autos se fixava em € 598.740,00 (quinhentos e noventa e oito mil, setecentos e quarenta euros), por conta de uma avaliação promovida pela Oponída / Recorrida, ao passo que a dívida exequenda, à data da propositura, se cifrava em € 387.358,43 (trezentos e oitenta e sete mil, trezentos e cinquenta e oito euros e quarenta e três cêntimos).
FF. Não podendo, em face do exposto – e sem mais –, concluir-se pela insuficiência daquele imóvel e, bem assim, legitimar a ocorrência de novas penhoras.
GG. Aqui chegadas, bem se vê que a Opoente / Recorrente dispunha de fundamento para a apresentação de oposição à penhora, nos termos do disposto no artigo 784.º, número 1, alínea b) do Código de Processo Civil; já que este se assume como o meio de sindicar os casos em que a subsidiariedade da penhora é beliscada, como aqui sucedeu, uma vez que as referidas penhoras não foram precedidas daquele expresso e fundamentado reconhecimento.
HH. Reconhecimento, este, que não pode ser considerado, já que completamente intempestivo e instado pela Meritíssima Juiz do Tribunal a quo, por sinal, em momento posterior ao das referidas penhoras; desconsiderando, então, a Senhora Agente de Execução, a legalidade vigente, na ânsia de atender à sofreguidão da Oponída / Recorrida em penhorar todo o património de todos os Executados, a todo o custo.
II. Em face do exposto, tendo por referência a alteração ao elenco dos factos provados e, bem assim, as ilações jurídicas daí decorrentes, bem se vê que as penhoras supra mais bem identificadas foram francamente ilegais, atentando grosseiramente contra as normas jurídicas vigentes e dos princípios supraordenadores.
JJ. Por tudo isso, entende-se, salvo o devido respeito, que deve, a douta sentença recorrida, ser revogada e, em sua substituição, ser proferido acórdão que ordene o cancelamento das penhoras supra referidas, com as consequências que daí advêm, nomeadamente a devolução dos montantes da pensão de reforma da Opoente / Recorrente retidos mensalmente ou dos dividendos societários que pertenceriam à Opoente / Recorrente por força da titularidade daquelas quotas; julgando-se, assim, procedente a pretensão da Opoente / Recorrente ora formulada.

Nestes termos e no melhor de Direito,
Deve o presente recurso merecer provimento, revogando-se a douta sentença recorrida, e proferindo-se outra, em sua substituição, que julgue procedente a oposição à penhora e, por tal, ordene o cancelamento das penhoras supra mais bem identificadas, em harmonia com o alegado e, bem assim, as antecedentes conclusões.
Pois só assim decidindo farão, V./s Ex.cias, INTEIRA JUSTIÇA!
*
A exequente/ recorrida apresentou contra-alegações que terminam com as conclusões a seguir transcritas:

1.ª - A recorrente apenas impugnou a alínea k) da matéria de facto provada, pelo que, as demais alíneas da matéria de facto provada na sentença recorrida consideram-se definitivamente provadas, nomeadamente:

i)em 25.09.2018, a recorrida requereu a penhora das quotas da recorrente na «Sociedade Agrícola Quinta ..., Lda». (…)”
ii)em 09.10.2018, a agente de execução consignou que se demonstravam decorridos mais de 30 meses sem existir qualquer perspetiva de venda do bem penhorado
iii)em 25.09.2018, a agente de execução requereu ao tribunal recorrido que a informasse sobre se poderia proceder à penhora de outros bens, entre outros, da recorrente
iv)em 23.11.2020, o tribunal “a quo” notificou a agente de execução para proferir decisão sobre a (in)suficiência dos bens penhorados para satisfação da quantia exequenda e demais acréscimos legais
v)em 05.12.2020, a agente de execução decidiu que a quantia exequenda ascendia a € 781.414,29, o valor patrimonial do imóvel penhorado era de € 44.867,66, o valor de mercado desse imóvel não era superior ao valor patrimonial, apenas se encontravam penhorados 5/6 desse imóvel e que o mesmo era insuficiente para pagamento da quantia exequenda
vi)a agente de execução determinou o prosseguimento da execução com a penhora de outros bens, entre outros, da recorrente
vii)a avaliação realizada ao imóvel penhorado nos autos foi efetuada há mais de 7 anos atrás e, hoje, esse imóvel encontra-se degradado e a necessitar de obras de restauro e manutenção
viii)o valordos5/6do prédio penhorado nos autos é insuficiente para satisfação do crédito da recorrida
ix)essa quota-parte desse imóvel foi adjudicado à recorrida pelo valor de apenas € 280.000,00
- cfr. als. a), b), c), f), g), m), n) e o) da matéria de facto provada da sentença recorrida
2.ª - Os 5/6 do prédio penhorado nos autos foi adjudicado à recorrida por um valor muito inferior ao da dívida exequenda
3.ª - A agente de execução em funções e o tribunal “a quo” cumpriram todos os trâmites legais e processuais exigíveis in casu
4.ª - A recorrente tinha o ónus de impugnar a decisão relativa à matéria de facto e, não o tendo feito, aceitou em definitivo o valor da quantia exequenda, a insuficiência do bem penhorado para satisfação da mesma e o prosseguimento da execução sobre outros bens - vd. art.º 640.º CPC
5.ª - A matéria de facto provada pelo tribunal “a quo”, bem como a não impugnada pela recorrente, tem como consequência a improcedência da oposição por si deduzida e a improcedência do recurso a que ora se responde
6.ª - A recorrente limita-se a impugnar a alínea k) dos factos provados da sentença recorrida de forma genérica e abstrata, não especificando os concretos meios probatórios que impunham decisão diferente, o que não é legalmente admissível
- vd. a contrario sensu, al. b), n.º 1, art.º 640.º CPC
7.ª - A alínea k) dos factos provados da sentença recorrida resulta demonstrada pelo teor dos documentos n.ºs 2 e 3 juntos à contestação da recorrida, não existindo razões, nem fundamentos para a mesma ser excluída da sentença impugnada
8.ª - O aditamento dos pontos “E.1” e “E.2” à matéria de facto provada foi peticionada pela recorrente de forma geral e abstrata, o que não é legalmente admissível
9.ª - A recorrente não invocou quaisquer meios de prova que sustentam esse aditamento, nem especificou os motivos pelos quais tais pontos deveriam ser aditados aos factos provados na sentença recorrida
10.ª - A recorrente não demonstrou justificadamente a correlação entre determinados meios probatórios e a decisão que, no seu entender, deveria ter sido proferida, ou seja, incumpriu com o ónus legalmente previsto para o efeito- vd. n.º 1, art.º 640.º CPC
11.ª - Pelo cumprimento da obrigação respondem todos os bens do devedor suscetíveis de penhora- vd. art.º 601.º CC
12.ª - A recorrente não demonstrou quaisquer factos que permitissem concluir pela existência de excesso de penhora
13.ª - Pertence ao agente de execução a competência para aferir sobre a (in)suficiência dos bens onerados para garantir o fim da execução
- vd. n.º 1, art.º 719.º CPC
- vd. Ac. TR Évora de 19.05.2016, proc. n.º 4428/14.0TBCSC-A.E1 - cfr. matéria de facto provada na sentença recorrida
14.ª - A agente de execução em funções cumpriu com todos os seus deveres e com todos os condicionalismos exigíveis no caso concreto
15.ª - A agente de execução reconheceu expressamente a insuficiência do prédio penhorado para satisfação da dívida exequenda, determinando a prossecução da penhora sobre outros bens, entre outros, da recorrente
- vd. n.º 1, art.º 752.º CPC
- cfr. doc. n.º 6 junto à contestação de oposição à penhora da recorrida - cfr. al. g) dos factos provados da sentença recorrida
16.ª - O valor da quantia exequenda é muito superior ao real valor do imóvel penhorado nos autos, que se demonstra manifestamente insuficiente para satisfazer o pagamento da quantia exequenda, pelo que, a penhora poderia recair sobre outros bens sujeitos à execução
- vd. n.º 1, art.ºs 735.º e 752.º CPC
- vd. Ac. TR Évora de 19.05.2016, proc. n.º 4428/14.0TBCSC-A.E1
17.ª - O reconhecimento da insuficiência do prédio misto penhorado nos autos para pagamento da quantia exequenda foi precedido de pedido prévio da recorrida - cfr. pontos 32.º e 33.º da petição inicial de oposição à penhora
- cfr. docs. n.º 1 a 4 juntos à contestação de oposição à penhora da recorrida - cfr. ref.ª Citius 30195730
18.ª - A agente de execução manifestou o seu parecer no sentido de deverem ser penhorados outros bens nos autos, por insuficiência do imóvel hipotecado
- cfr. al. k) da matéria de facto provada na sentença recorrida
19.ª - A avaliação do imóvel penhorado nos autos foi efetuada há mais de 7 anos, sendo que, atualmente, o mesmo encontra-se degradado e a necessitar de profundas obras de restauro e manutenção
- cfr. al. m) dos factos provados da sentença recorrida
20.ª - Sobre a quantia exequenda vencem-se, diariamente, juros capitalizáveis e demais encargos processuais e contratuais, vendo a recorrida seriamente agravada a possibilidade de satisfação integral do seu crédito pelo normal decorrer do tempo
21.ª - Em razão de utilidade pública, em 1995, a Câmara Municipal de … expropriou 2.860m² do prédio penhorado nos autos, pelo que, o mesmo tem, atualmente, apenas a área de 3.575m², o que reduz o seu valor de mercado
- cfr. doc. n.º 7 junto à contestação da oposição à penhora da recorrida
22.ª - Encontram-se apenas penhorados 5/6 desse imóvel, o que diminui o seu valor transacionável e dificulta a sua venda - cfr. al. n) dos factos provados da sentença recorrida
22.ª - A penhora das participações sociais e de parte da pensão de reforma da recorrente demonstra-se proporcionada e adequada a garantir o fim da execução
23.ª - A intenção da recorrente consiste apenas em protelar indefinidamente a satisfação integral do crédito da recorrida

EM CONFORMIDADE COM AS RAZÕES EXPOSTAS DEVE NEGAR-SE PROVIMENTO À APELAÇÃO CONFIRMANDO-SE A DOUTA SENTENÇA PROFERIDA.
*
Foram colhidos os vistos legais.
*
Nada obstando ao conhecimento do recurso, cumpre decidir:

II. Delimitação do objecto do recurso

Face ao disposto nos artºs 608º, nº2, 609º, nº1, 635º, nº4 e 639º do CPC, o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, sem prejuízo das questões que o tribunal deva conhecer oficiosamente.

Assim, tendo em conta as conclusões da recorrente, as questões a decidir são:

1ª - Apurar da correção da fixação da matéria de facto, ou seja, apreciar a impugnação de tal decisão.
2ª- Apurar se face à penhora de 5/6 do imóvel objecto de hipoteca inicialmente penhorado é legal a penhora de novos bens, designadamente das quotas sociais da executada oponente Sociedade Agrícola Quinta ... e da parte penhorável da sua pensão.

III. Fundamentação

Quanto à impugnação da matéria de facto, antes de mais, cumpre verificar se a recorrente observou os requisitos de ordem formal necessários para que este Tribunal reaprecie a decisão da matéria de facto.

Tais requisitos constam do art.640º do C.P.Civil que preceitua:
1- Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2. No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.

Da norma transcrita resulta que a reapreciação da decisão da matéria de facto pelos tribunais da Relação está subordinada ao cumprimento de diversos ónus pelo recorrente, cuja explicitação tem vindo a ser feita, nomeadamente pelo STJ que no acórdão de 21-03-3019, relatado por Rosa Tching, disponível in www.dgsi.pt, a este propósito, decidiu o seguinte:
“Para efeitos do disposto nos artigos 640º e 662º, nº1, ambos do Código de Processo Civil, impõe-se distinguir, de um lado, a exigência da concretização dos pontos de facto incorretamente julgados, da especificação dos concretos meios probatórios convocados e da indicação da decisão a proferir, previstas nas alíneas a), b) e c) do nº1 do citado artigo 640º, que integram um ónus primário, na medida em que têm por função delimitar o objeto do recurso e fundamentar a impugnação da decisão da matéria de facto.
E, por outro lado, a exigência da indicação exata das passagens da gravação dos depoimentos que se pretendem ver analisados, contemplada na alínea a) do nº 2 do mesmo artigo 640º, que integra um ónus secundário, tendente a possibilitar um acesso mais ou menos facilitado aos meios de prova gravados relevantes para a apreciação da impugnação deduzida.
Na verificação do cumprimento dos ónus de impugnação previstos no citado artigo 640º, os aspetos de ordem formal devem ser modelados em função dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.
Nesta conformidade, enquanto a falta de especificação dos requisitos enunciados no nº1, alíneas a), b) e c) do referido artigo 640º implica a imediata rejeição do recurso na parte infirmada; já quanto à falta ou imprecisão da indicação das passagens da gravação dos depoimentos a que alude o nº 2, alínea a) do mesmo artigo, tal sanção só se justifica nos casos em que essa omissão ou inexatidão dificulte, gravemente, o exercício do contraditório pela parte contrária e/ou o exame pelo tribunal de recurso.”
*
Analisando as alegações de recurso, verificamos que a recorrente cumpriu os referidos ónus, pois identifica os pontos de facto que considera incorrectamente julgados e indica a decisão que em seu entender deve proferida, sendo no presente caso os meios probatórios relevantes apenas as peças processuais que a mesma menciona.
Para um melhor enquadramento elencaremos toda a matéria de facto considerada como provada Tribunal a quo identificando a impugnada:

FACTO PROVADOS:

A) - Em 25.09.2018, a Exequente requereu junto da agente de execução, com relevância, o seguinte: “(…), exequente (…), vem a esses autos, requerer a penhora das quotas dos executados na «Sociedade Agrícola Quinta ..., Lda». (…)”.
B) Em 09.10.2018, a agente de execução requereu o seguinte: “(…) Decorridos que se mostram mais de 30 meses sem que exista qualquer perspetiva de venda do bem penhorado, encontra-se, neste momento, a Exequente a diligenciar no sentido de conseguir a penhora de outros bens, que se mostrem suscetíveis de promover a quantia exequenda e juros em dívida, aos quais acrescem as custas e despesas processuais (…)
C) Por Requerimento junto aos autos no dia 25 de setembro de 2018, com a referência 30195730, veio a Exequente requerer a penhora das quotas dos executados na “Sociedade Agrícola Quinta ..., Lda”. (…) Ora, encontra-se estabelecido no artigo 752.º do Código de Processo Civil que: “(…)”. E o que se encontra estatuído neste preceito legal foi escrupulosamente cumprido pela Agente de Execução signatária que, não levou a efeito qualquer tipo de diligência de penhora de outros bens até que se tenham esgotado as expectativas de conseguir a venda do imóvel dentro do prazo razoável de manutenção do Processo Executivo sem qualquer outro tipo de procedimento processual, para além das diligências conducentes à sua alienação. (…). No entanto, verifica-se que os executados continuam a locupletar-se com o uso do bem imóvel penhorado, em prejuízo da exequente, retirando do mesmo todos os benefícios e vantagens que se encontram afetos ao seu uso comum. Desta forma, verifica-se que não pode ser colocada em causa a realização da prestação que consta do título executivo, (…). (…) Então, temos um imóvel penhorado e que se encontra na fase da venda desde o ano de 2016 e nada mais se pode fazer que não passe pelo aguardar que o mesmo seja vendido para ser finalizado o presente Processo Executivo? Para além de que, aquilo que se encontra penhorado e em fase de venda não é a totalidade de um bem, mas sim parte dele, mais precisamente 5/6 do mesmo, com todas as dificuldades de venda que daqui advêm. (…), requer-se, muito respeitosamente, a V. Ex.cia que se digne ordenar a notificação da agente de execução subscritora no sentido de ser a mesma informada acerca de se pode dar lugar à elaboração dos competentes autos de penhora e à sua notificação aos executados. (…)”.
D) Em 01.10.2020, a agente de execução requereu o seguinte: “(…) vem, muito respeitosamente requerer a V.Ex.cia que se digne dar deferimento ao requerimento junto aos autos no dia 09 de outubro de 2018 (…)”.
E) Em 09.10.2020, na execução, a exequente reiterou o seu pedido de penhora das quotas dos executados na “Sociedade Agrícola Quinta ..., Lda”, alegando a insuficiência do bem hipotecado/penhorado para fazer face ao pagamento da quantia exequenda e demais encargos.
F) Em 23.11.2020, na execução, este tribunal decidiu, em síntese, o seguinte: “(…), notifique a AE para (…), a final, proferir decisão sobre a (in)suficiência dos bens penhorados para satisfação da quantia exequenda e demais acréscimos legais.
G) Em 05.12.2020, na execução, a agente de execução proferiu decisão nos seguintes termos: “(…) DECISÃO: Veio a exequente nos autos de execução comum supra identificados requerer a penhora de outros bens alegando, em suma, que o bem sobre o qual detém garantia real não é suficiente para assegurar a recuperação do crédito exequendo. Ascende o valor atualmente em dívida a 781.414,29 €. O valor patrimonial do imóvel é de 44.867,66€, não se vislumbrando que o valor de mercado seja superior, com a agravante de que o que se encontra penhorado a favor dos autos é uma quota-parte de 5/6, sendo esta a única propriedade dos executados e hipotecada a favor da exequente. Nestes termos, ao abrigo do disposto na última parte do número 1 do artigo 752.º do Código de Processo Civil, reconhece-se a insuficiência do bem sobre o qual impende a garantia, pelo que vai a execução prosseguir com a penhora de outros bens que sejam identificados, até ao limite do diferencial entre o valor expectável do bem e o valor em dívida [781.414,29 € - 44.867,66 € = 736.546,63 €], sem prejuízo de posterior revisão (…).”
H) Em 15.12.2020, na execução, a executada M. F. apresentou reclamação contra essa decisão da agente de execução.
I) Em 29.12.2020, a exequente apresentou a respetiva resposta.
J) Em 09.01.2021, a exequente foi notificada pela agente de execução da receção de uma proposta de aquisição do imóvel penhorado à ordem da execução principal, no valor de € 127.750,00.
K) Em 09.10.2018 e 01.10.2020, a agente de execução manifestou o seu parecer no sentido de deverem ser penhorados outros bens dos executados por insuficiência do imóvel hipotecado na satisfação do crédito da exequente.
L) Em cumprimento do despacho de 23.11.2020, proferiu decisão onde apurou o valor atualmente em dívida, no valor de € 781.414,29.
M) A avaliação realizada pela exequente foi efetuada há mais de 7 anos, sendo que, atualmente, esse imóvel encontra-se degradado e a necessitar de obras de restauro e manutenção.
N) Encontram-se penhorados apenas 5/6 desse imóvel e nunca a totalidade do mesmo o que, para além de diminuir o valor transacionável do imóvel em causa, dificulta também a sua venda, sendo que o valor dos aludidos 5/6 é insuficiente para satisfação do crédito da Exequente.
O) Em 07 de julho de 2021, na diligência de abertura de propostas realizada nos autos principais de execução, foi deferido o requerido pela Exequente, tendo-lhe sido adjudicado, pelo valor de 280.000,00€ (por não haver proposta de valor superior) os 5/6 dos bem imóvel penhorado nos autos executivos.
P) Em 15/11/2021, a AE juntou aos autos um ofício onde se pode ler, para além do mais, o seguinte: “(…) Em cumprimento do determinado no douto Despacho Judicial estabelecido, informa o AE subscritor que, de acordo com o preceituado na douta sentença proferida no Apenso B com a referência 35404003de 19 de Abril de 2021, foi considerado como Capital em dívida o valor de 322.385,58€, acrescida das despesas, imposto de selo e comissões, no valor total de 337.496,34€, tendo-se contabilizado os respetivos juros à taxa de 10% (6% + 4%), sobre o capital de 322.385,58€, desde 18 de Março de 2015 até à presente data de 13 de Novembro de 2021. O valor das despesas e Honorários devidos à AE, acrescidos dos Honorários devidos ao Encarregado da Venda e dos Honorários da Delegação de Actos pagos diretamente pela Exequente, ascende ao montante global de 7.837,11€ (…)”.
*
Analisemos as modificações pretendidas
1ª alteração
Pretende a recorrente que os factos constantes da alínea K) dos factos provados sejam dados como não provados, sustentando que só em 5.12.2020, a agente de execução expressou uma decisão de insuficiência dos bens, limitando-se no requerimento de 9.10.2018 a dar conta das dificuldades da venda dos 5/6 do imóvel penhorado, sem afirmar que o produto da venda não bastaria para cobrir a dívida exequenda.

É o seguinte o teor da al. K):
- Em 09.10.2018 e 01.10.2020, a agente de execução manifestou o seu parecer no sentido de deverem ser penhorados outros bens dos executados por insuficiência do imóvel hipotecado na satisfação do crédito da exequente.

Salvo o devido respeito por diferente entendimento, cremos que esta alínea encerra um juízo valorativo sobre os requerimentos apesentados pela agente de execução no processo executivo naquelas datas. E na fase da decisão da matéria de facto não devem ser feitos juízos valorativos que já contendem com o objecto da questão de direito a apreciar e decidir nos autos. Por conseguinte, na matéria de facto ficará a constar o teor de tais requerimentos e na fundamentação de direito far-se-á a respectiva interpretação, equacionando-se a sua relevância para a questão de direito objecto dos autos.

Assim, a alínea B) dos Factos Provados, onde consta uma transcrição parcial do reqto de 9.10.2018, passa a ter a seguinte redacção:

B) Em 9.10.2018, a agente de execução apresentou no processo executivo um relatório sobre o estado da execução, que terminava requerendo ao Tribunal instruções sobre a penhora ou não de novos bens dos executados, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

E a alínea K dos factos provados passa a ter o seguinte teor:
K) em 1.10.2020, a agente apresentou no processo executivo novo requerimento, solicitando o deferimento do requerimento apresentado no dia 9.10. 2018, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
*
2ª Alteração
Pretende a recorrente que sejam dados como provados os seguintes factos:
- No dia 24 de outubro de 2020, a Senhora Agente de Execução elaborou Auto de Penhora relativo a 1/6 de uma quota da sociedade comercial “Sociedade Agrícola Quinta ..., Lda.”, pertencente à Opoente / Recorrente, no valor nominal de € 149,64 (cento e quarenta e nove euros e sessenta e quatro cêntimos), e uma quota da mesma sociedade comercial, pertencente à Opoente / Recorrente, com o valor nominal de € 2.344,35 (dois mil, trezentos e quarenta e quatro euros e trinta e cinco cêntimos). Auto, esse, que fez juntar aos presentes autos, como anexo de requerimento de referência eletrónica 2408981, datado do mesmo dia 24 de outubro de 2020.
- No dia 30 de outubro de 2020, a Senhora Agente de Execução elaborou Auto de Penhora relativo à parte legalmente permitida da pensão de reforma da Opoente / Recorrente. Auto, esse, que fez juntar aos presentes autos, como anexo de requerimento de referência eletrónica 2416218, datado de 31 de outubro de 2020; e cujo pedido havia, já, sido formulado no dia 12 de outubro de 2020, através de comunicação dirigida à Caixa Geral de Aposentações, através de comunicação de referência eletrónica 2393789.
Estes factos correspondem aos actos de penhora que motivaram a presente oposição, que a opoente devia ter descrito no requerimento inicial e não o fez, referindo apenas as datas dos autos de penhora.
Porém, mostrando-se conformes aos elementos constantes do processo executivo, defere-se o respectivo aditamento aos factos provados, passando a constituir as alíneas R) e S).

Assim, os factos provados a atender na decisão são as constantes da decisão recorrida, com as alterações que se vêm de referir que, por brevidade aqui damos por reproduzidos.
*
Do Mérito do Recurso

Como vimos, a questão a decidir consiste em saber se face à penhora inicial dos 5/6 dos executados no imóvel objecto de hipoteca foi legal a penhora de novos bens, designadamente das quotas sociais da executada/opoente Sociedade Agrícola Quinta ... e da parte penhorável da sua pensão, efectuadas em outubro de 2020.
Na oposição deduzida, a executada alegou que o valor de mercado do imóvel penhorado (5/6) era suficiente para garantir o pagamento quantia exequenda e despesas prováveis, e impugnou os juros peticionados (cf. arts 21º, 22º e 23º) concluindo pela ilegalidade da penhora dos novos bens, sustentando não haver lugar aplicação do art. 752º, nº1 do CPC, dado a suficiência daquele bem primeiramente penhorado (art.24º).
E, por outro lado, alegou que a penhora de novos bens só podia ser realizada depois de reconhecida pelo agente de execução, após requerimento do exequente que devia ser notificado ao executado, insuficiência do bem hipotecado, o que não sucedeu (arts 28º a 35º), enquadrando a oposição deduzida na al. a) do do nº1 do art. 784º do CPC, porquanto a extensão da penhora realizada, em seu entender, é atentatória do princípio da proporcionalidade.

Na decisão recorrida julgou-se improcedente a oposição, mantendo-se as penhoras realizadas, com a seguinte fundamentação:
“A Executada/Opoente M. F. deduziu oposição à penhora alegando, em síntese, que o valor do imóvel penhorado é capaz de cobrir a quantia exequenda e que a penhora de 1/6 da quota da “Sociedade Agrícola Quinta ..., Lda”, no valor de € 149,64 e outra quota dessa mesma sociedade, no valor de € 2.344,35, detidas pela Oponente é excessiva e desproporcionada, visto que o valor do imóvel penhorado é suficiente para pagamento da quantia exequenda.
A regra basilar relativamente à garantia geral do cumprimento das obrigações é a de que por esse cumprimento responde o património do devedor, integrado pelos bens que sejam suscetíveis de penhora (artigo 601.º, do Código Civil). Sabido que pela penhora, o direito do executado é esvaziado dos poderes de gozo que o integram, que passam para o tribunal (no caso de penhora de coisa móvel ou imóvel, esta transferência de poderes importa a transferência da própria posse) que, normalmente, os exercerá através de um depositário, as regras regulamentadoras deste acto processual estão enformadas por um princípio de proporcionalidade, tendente ao equilíbrio entre o valor dos bens penhorados e o do crédito exequendo.

Nos termos do disposto no artigo 784º, do Código de Processo Civil, são três as situações que podem fundar a oposição do executado à penhora:
- Inadmissibilidade da penhora dos bens do executado concretamente apreendidos ou da extensão com que ela foi realizada;
- Imediata penhora de bens do executado que só subsidiariamente respondiam pela dívida exequenda;
- Incidência da penhora em bens do executado que, não respondendo, nos termos do direito substantivo, pela dívida exequenda, não deviam por ela ter sido atingidos.

Analisados tais fundamentos, verifica-se que a primeira parte da citada alínea a) se refere aos casos de impenhorabilidade processual, quer absoluta, quer relativa (artigos 736.º e 737.º do Código de Processo Civil), e a segunda parte aos casos de impenhorabilidade parcial (artigo 738.º do Código de Processo Civil).
Esta alínea contempla ainda casos de penhora de uma parte especificada de bens indivisos ou de bens compreendidos num património comum ou duma fracção de qualquer deles, em execução apenas movidas contra algum ou alguns dos contitulares (artigo 743.º do Código de Processo Civil), bem como, em caso de penhora de imóveis, a sua extensão a frutos expressamente excluídos ou sobre os quais exista algum privilégio (artigo 758.º, n.º 1 do Código de Processo Civil).
A propósito da citada alínea a) do art. 863.º-A do Código de Processo Civil (atual art.784 do NCPC), escreve Lebre de Freitas, in Código de Processo Civil Anotado, Volume 3.º, Coimbra Editora, pág. 486, que “… a alínea a) visa as causas de impenhorabilidade enunciadas na lei processual, giram elas situações de impenhorabilidade absoluta e total, de impenhorabilidade relativa ou de impenhorabilidade parcial (artigos 822.º, 823.º, 824.º e 824.º-A): o apelo à extensão da penhora aponta para os casos de impenhorabilidade parcial; constituem bens concretamente impenhoráveis, não só os que não podem ser em caso algum, mas também aqueles que só o podem ser por determinadas dívidas ou em determinadas circunstâncias”.
No mesmo sentido vai Amâncio Ferreira, o qual refere que a segunda parte da alínea a) do art. 863.º-A do Código de Processo Civil (atual art.784 do NCPC), se reporta aos casos de impenhorabilidade parcial (art. 824.º). Diz este autor que poderia fundamentar oposição à execução a penhora de metade do vencimento do executado, em infração ao disposto no art. 824.º, n.º 1, alínea a), do Código de Processo Civil (Curso de Processo de Execução, 5.ª Edição, pág. 239, nota de rodapé 451).
No que concerne à alínea b), nas palavras de Amâncio Ferreira, in Curso de Processo de Execução,200, 13ª edição, pág. 284/285 tem-se em vista situações de penhorabilidade subsidiária, tanto na vertente pessoal como na vertente real, tal como se encontram caracterizados no art. 828.º do Código de Processo Civil. Na primeira vertente, é de atender à oposição que pode ser suscitada pelo fiador e pelos sócios da sociedade comercial em nome coletivo e da sociedade civil, por ainda se não encontrarem penhorados e alienados os bens do devedor principal, desde que invoquem o benefício da excussão prévia, quer na ação executiva (art. 828.º, n.º 1, 2 e 4 do Código de Processo Civil), quer na ação declarativa, com a condenação nesta ação a revelar a subsidiarização das suas responsabilidades (art. 641.º do Código Civil), quanto à fiança.
No que respeita à segunda vertente, atente-se na oposição do devedor por, em caso de dívida com garantia real sobre bem próprio, a penhora ter incidido sobre outros bens, sem previamente se ter verificado a insuficiência daquele (art. 752.º, n.º 1 do Código de Processo Civil), ou, então, em execução movida contra marido e mulher por dívidas por que são responsáveis ambos os cônjuges, se terem penhorado bens próprios de um deles, quando os comuns garantem o pagamento da dívida (art. 1695.º, n.º 1 do Código Civil).
Finalmente, a alínea c) alude a casos de impenhorabilidade, nos termos do direito substantivo, de determinados bens, por não responderem pela dívida exequenda.
Conforme adverte Amâncio Ferreira (ob. cit., pág. 285), sendo inadequada a oposição à penhora para o executado questionar os termos em que ela ocorreu, pode ele reclamar para o juiz do ato praticado pelo Agente de Execução.
Sendo aqueles três, como se referiu, os únicos fundamentos de oposição à penhora, são irrelevantes, neste momento e neste apenso, as alegações da Executada/Opoente no que concerne aos juros contratuais peticionados pela Exequente/Oponida nos autos executivos, bem como as questões relacionadas com os atos/omissões praticados pela AE na fase de penhora/venda no processo executivo, designadamente se da decisão da agente de execução deve constar, ou não, o limite do valor a penhorar ou se a AE, processualmente, cumpriu todos os formalismos na penhora de novos bens, caso o bem imóvel penhorado seja insuficiente para pagamento da quantia exequenda, pois estes fundamentos não se integram no disposto no art.784.º do CPC e, por outro lado, tais atos/omissões, alegadamente, praticadas pela AE na execução foram, oportunamente, objeto de impugnação por parte da Executada, tendo sido proferido despacho de admissão dos respetivos recursos, os quais ainda não foram apreciados pelo Venerando Tribunal da Relação de Guimarães.
Os fundamentos da presente oposição centram-se na questão de saber se o bem imóvel (5/6) penhorado nos autos é suficiente para pagamento da quantia exequenda e demais acréscimos legais ou se, pelo contrário, há excesso de penhora com a concretização da penhora de novos bens (de 1/6 das participações sociais que a Opoente detém na Sociedade Agrícola Quinta ..., Lda).
Ora, como resulta da factualidade supra enunciada, a Executada não logrou demonstrar como lhe competia, factos que nos permitam concluir pela existência de excesso de penhora.
Na verdade, produzida a prova, apurou-se que em 25.09.2018, a Exequente requereu junto da agente de execução, com relevância, o seguinte: “(…), exequente (…), vem a esses autos, requerer a penhora das quotas dos executados na «Sociedade Agrícola Quinta ..., Lda». (…)”; que em 09.10.2018, a agente de execução requereu, em suma, o seguinte: “(…) Decorridos que se mostram mais de 30 meses sem que exista qualquer perspetiva de venda do bem penhorado, encontra-se, neste momento, a Exequente a diligenciar no sentido de conseguir a penhora de outros bens, que se mostrem suscetíveis de promover a quantia exequenda e juros em dívida, aos quais acrescem as custas e despesas processuais (…).
Também se provou que por Requerimento junto aos autos no dia 25 de setembro de 2018, com a referência 30195730, veio a Exequente requerer a penhora das quotas dos executados na “Sociedade Agrícola Quinta ..., Lda”. (…) Ora, encontra-se estabelecido no artigo 752.º do Código de Processo Civil que: “(…)”. E o que se encontra estatuído neste preceito legal foi escrupulosamente cumprido pela Agente de Execução signatária que, não levou a efeito qualquer tipo de diligência de penhora de outros bens até que se tenham esgotado as expectativas de conseguir a venda do imóvel dentro do prazo razoável de manutenção do Processo Executivo sem qualquer outro tipo de procedimento processual, para além das diligências conducentes à sua alienação. (…). No entanto, verifica-se que os executados continuam a locupletar-se com o uso do bem imóvel penhorado, em prejuízo da exequente, retirando do mesmo todos os benefícios e vantagens que se encontram afetos ao seu uso comum. Desta forma, verifica-se que não pode ser colocada em causa a realização da prestação que consta do título executivo, (…). (…) Então temos um imóvel penhorado e que se encontra na fase da venda desde o ano de 2016 e nada mais se pode fazer que não passe pelo aguardar que o mesmo seja vendido para ser finalizado o presente Processo Executivo? Para além de que, aquilo que se encontra penhorado e em fase de venda não é a totalidade de um bem, mas sim parte dele, mais precisamente 5/6 do mesmo, com todas as dificuldades de venda que daqui advêm. (…), requer-se, muito respeitosamente, a V. Ex.cia que se digne ordenar a notificação da agente de execução subscritora no sentido de ser a mesma informada acerca de se pode dar lugar à elaboração dos competentes autos de penhora e à sua notificação aos executados. (…)”.
Ficou demonstrado também que em 01.10.2020, a agente de execução requereu, o seguinte: “(…) vem, muito respeitosamente requerer a V.Ex.cia que se digne dar deferimento ao requerimento junto aos autos no dia 09 de outubro de 2018 (…)” e, em 09.10.2020, na execução, a exequente reiterou o seu pedido de penhora das quotas dos executados na “Sociedade Agrícola Quinta ..., Lda”, alegando a insuficiência do bem hipotecado/penhorado para fazer face ao pagamento da quantia exequenda e demais encargos.
Por outro lado, ficou também provado que em 15/11/2021, a AE juntou aos autos um ofício onde se pode ler, para além do mais, o seguinte: “(…) Em cumprimento do determinado no douto Despacho Judicial estabelecido, informa o AE subscritor que, de acordo com o preceituado na douta sentença proferida no Apenso B com a referência 35404003de 19 de Abril de 2021, foi considerado como Capital em dívida o valor de 322.385,58€, acrescida das despesas, imposto de selo e comissões, no valor total de 337.496,34€, tendo-se contabilizado os respetivos juros à taxa de 10% (6% + 4%), sobre o capital de 322.385,58€, desde 18 de Março de 2015 até à presente data de 13 de Novembro de 2021. O valor das despesas e Honorários devidos à AE, acrescidos dos Honorários devidos ao Encarregado da Venda e dos Honorários da Delegação de Actos pagos diretamente pela Exequente, ascende ao montante global de 7.837,11€ (…)”
Por último, ficou provado que, em 07 de julho de 2021, na diligência de abertura de propostas realizada nos autos principais de execução, foi deferido o requerido pela Exequente, tendo-lhe sido adjudicado, pelo valor de 280.000,00€ (por não haver proposta de valor superior) os 5/6 dos bem imóvel penhorado nos autos executivos.
Dos autos resulta que a AE iniciou a penhora de bens nos termos legalmente impostos, ou seja, começou por penhorar o bem imóvel dado à Exequente em hipoteca e daí que tenha procedido à penhora de 5/6 desse mesmo bem.
Por outro lado, e salvo o devido respeito, dúvidas não podem subsistir que os 5/6 do bem imóvel penhorado nos autos, cujo produto da venda atingiu apenas a quantia de 280.000,00€ oferecidos pela Exequente através do pedido de adjudicação que formulou nos autos e lhe foi deferido, não são suficientes para pagamento da quantia exequenda e demais acréscimos legais que atingem uma quantia, neste momento, superior a 345.000,00€ e, por isso, forçoso é concluir que não há excesso de penhora.
Note-se que os autos executivos se encontram em fase de venda desde o longínquo ano de 2015, ou seja, há mais de 6 anos, sem que tenha existido nos autos qualquer proposta superior a 127.750,00€, motivo pelo qual a Exequente não teve outra solução que não fosse requerer a adjudicação dos 5/6 do imóvel penhorado nos autos e ficar com o bem para pagamento, parcial, do seu crédito.
Veja-se que a Exequente não é uma sociedade imobiliária que se dedique à promoção e venda de bens imóveis, mas sim uma instituição bancária que concedeu financiamento aos Executados e não foi ressarcida, até ao presente momento, de qualquer montante, nem parcialmente, dos valores mutuados pois os Executados não procederam a quaisquer pagamentos dos que se encontram reclamados em sede executiva.
Assim sendo, fácil é concluir que se verifica uma situação de insuficiência de bens penhorados para pagamento da quantia exequenda e demais acréscimos legais, o que legitima a penhora de novos bens, designadamente, a penhora das participações sociais (1/6) que a Executada/Opoente M. F. detém na Sociedade Agrícola Quinta ..., Lda.
Ora, o predito é suficiente para concluirmos que não há qualquer excesso de penhora que justifique o levantamento da penhora concretizada sobre as participações sociais supra referidas.
Deste modo e porque a Oponente M. F. não demonstrou a existência de quaisquer factos impeditivos ou extintivos do direito da Exequente, sem necessidade de mais considerações, haverá que julgar improcedente a presente oposição à penhora.”

Desde já adiantamos que, no essencial, concordamos com a decisão recorrida, sendo que a presente oposição colhe fundamento na al. b) do nº1 do art. 784º do CP.Civil, pois, considerando os factos alegados, o que está em causa é apurar se foram indevidamente penhorados bens da executada que só respondem subsidiariamente pela dívida exequenda, ou seja, depois dos bens onerados com a hipoteca, mostrando-se correcta a conclusão de que a executada/opoente não demonstrou, como lhe competia, a suficiência do imóvel onerado para pagamento da quantia exequenda. No sentido de que compete ao executado/ opoente o ónus de alegação e demonstração dos factos integram a causa de pedir- cfr. Rui Pinto, Manual da Execução e Despejo, Coimbra Editora, 1ª ed. 2013, p.727.
Aliás, atentando, nas alegações de recurso, vemos que a recorrente não questiona a insuficiência dos bens onerados que é manifesta face aos factos provados. A sua argumentação para pedir o levantamento das penhoras assenta em argumentos de ordem formal.
Sustenta, em síntese, que a insuficiência dos bens onerados só foi reconhecida pela agente de execução por decisão de 5.12.2020, sendo as penhoras das suas quotas sociais Sociedade Agrícola Quinta ..., Lda, e da parte penhorável da pensão, ilegais porque foram realizadas em data anterior, outubro de 2020.
Antes de nos debruçarmos sobre os factos provados, analisemos o nº1 do art. 752º do CPCivil, que é o principal preceito legal aplicável e estatui o seguinte: “Executando-se dívida com garantia real que onere bens pertencentes ao devedor, a penhora inicia-se pelos bens sobre que incida a garantia e só pode recair noutros quando se reconheça a insuficiência deles para conseguir o fim da execução.”
Este normativo consagra uma excepção à regra do nº1do art. 751ºdo CPC, estabelecendo a obrigatoriedade de no caso de a dívida exequenda gozar de garantia real sobre bens do devedor, a penhora começar pelos bens onerados, indo ao encontro do estatuído no art. 697º do C.Civil segundo o qual “o devedor que for dono da coisa hipotecada tem o direito de se opor não só a que outros bens sejam penhorados na execução enquanto se não reconhecer a insuficiência da garantia, mas ainda a que, relativamente aos bens onerados, a execução se estenda além do necessário à satisfação do direito do credor.”
Assim, é indubitável que respeitando a execução a dívida com garantia real, a penhora deve iniciar-se pelos bens onerados.
Mas já suscita controvérsia saber se o reconhecimento da insuficiência do bem onerado para o fim da execução pode ocorrer antes de se haver executido o referido bem, ou seja, antes da respectiva venda.
Em termos rigorosos, a medida da insuficiência dos bens onerados só é conhecida com exactidão após a respectiva venda. Sucede, porém, muitas vezes, que mesmo antes da realização desta já é possível prognosticar que os bens hipotecados e penhorados são insuficientes para satisfazer os fins da execução, que consistem na satisfação do crédito do exequente. Essa insuficiência resulta da própria tramitação da execução, no decurso da qual se vai apurando, quer o valor dos bens, quer o montante do crédito exequendo, no caso de serem deduzidos embargos, e eventuais créditos reclamados.
Assim, vários autores, vêm defendendo que nº1 do art 752º do C.Civil, deve ser interpretado no sentido de permitir o reconhecimento da insuficiência dos bens onerados antes da venda. Abrantes Geraldes e outros, in CPCivil Anotado, Almedina, 2020, Vol II, pág. 136, defendem que a decisão sobre a insuficiência dos bens penhorados para satisfazer os fins da execução pode ser tomada antes da respectiva venda, sendo esta a interpretação que realiza de modo mais amplo o equilíbrio entre os dois interesses antagónicos entre si do exequente e do executado. Obrigar o exequente a esperar pela venda poderia implicar, nalguns casos, que o executado desencaminhasse bens penhoráveis e frustrasse as finalidades da execução.
No mesmo sentido F. Amâncio Ferreira, Curso de Processo de Execução, 8ª ed., pág. 208, refere que na subsidiariedade real não se exige a prévia excussão dos bens que respondem prioritariamente, mediante a realização das vendas ou adjudicações, para se poderem penhorar os bens que respondem um último lugar.
Também J. Lebre de Freitas, in CPCivil Anotado, 2003, Vol. 3º, pág. 399, escreve que a verificação da insuficiência não tem de esperar a consumação da venda, acrescentando que essa regra de penhorabilidade cessa quando, por forma válida segundo a lei civil, tenha lugar a renúncia à garantia real constituída, caso em que o exequente pode, desde logo, fazer incidir a penhora noutros bens.
E essa tem sido esta igualmente a posição seguida em vários acórdãos, nomeadamente, no Ac. RP de 11.05.2006 (Relator Fernando Amaral), no Ac. RC de 9-10-2018 (Relator Alberto Ruço) e no Ac. RE de 19-05-2016 (Relatora Albertina Pedroso), todos disponíveis in dgsi.pt.
Este último, pronunciando-se a favor da não obrigatoriedade da excussão prévia dos bens onerados, decidiu pela legalidade da penhora de outros bens do executado( depósitos bancários) realizada pelo agente de execução em virtude de resultar da certidão predial referente ao imóvel em questão que sobre o mesmo incindiam várias hipotecas e penhoras cujo montante total excedia o valor da avaliação do imóvel penhorado, permitindo desde logo concluir pela insuficiência deste para conseguir o fim da execução. E equacionou à luz do CPC actual como deve ser reconhecida a insuficiência dos bens onerados, da seguinte forma: “Atentas as alterações entretanto introduzidas no regime do processo executivo, entendemos que no regime actualmente vigente já não será necessário que o exequente indique à penhora logo no requerimento executivo outros bens do executado para além do onerado com garantia real e promova a penhora dos que hão-de responder subsidiariamente, para que outros bens do executado possam ser penhorados antes da excussão, caso se reconheça a insuficiência daquele.
De facto, antes da reforma da ação executiva, cabia às partes (o executado, em primeiro lugar; o exequente, subsidiariamente; desde logo, o exequente no processo sumário) nomear os bens à penhora, ao que se seguia um despacho judicial a ordenar a penhora (ou recusá-la, sendo ilegal ou excessiva). No direito oriundo da reforma, deixou de haver nomeações e despacho. Efectivamente, por força do disposto nos artigos 719.º, n.º 1, 749.º, n.º 1, e 855.º do CPC, no regime actualmente vigente, é ao agente de execução que está cometida a tarefa de realizar a penhora e, previamente à realização da mesma, efectuar as diligências que considere úteis à identificação ou localização de bens penhoráveis, devendo considerar-se que assim é, não só quando o exequente não indique bens no requerimento executivo (artigo 748.º, n.º 3, do CPC), como quando aqueles que indica ou que a lei determina como tendo prioridade, são insuficientes para satisfazer o crédito exequendo. Em suma, “quem pode o mais pode o menos”, sendo ao agente de execução que actualmente incumbe efectuar todas as consultas e diligências prévias para identificar bens penhoráveis do executado tendentes a conseguir o fim da execução.
Assim, no caso dos autos, iniciando-se necessariamente a penhora pelo imóvel onerado, como se iniciou, e reconhecendo-se a insuficiência do mesmo para a satisfação do devido, a prioridade estabelecida no artigo 752.º, n.º 1, não significa que não possam em absoluto ser penhorados outros bens pertencentes ao executado previamente à excussão daquele. Ponto é que se reconheça a insuficiência dos bens onerados para garantir o fim da execução.
Somos assim chegados a outra questão: a de saber quem tem competência para reconhecer a referida insuficiência.
Entendemos que, em face do actual regime do processo executivo, a competência para formular o juízo relativo ao reconhecimento da insuficiência dos bens onerados para garantir o fim da execução, pertence ao agente de execução a quem, como dissemos, incumbem por via do disposto no artigo 719.º, n.º 1, do CPC, as diligências do processo executivo relativas à penhora, uma vez que não existe disposição expressa que confira essa competência ao Juiz e se mostra prevista na lei a possibilidade de oposição à penhora mesmo que não seja deduzida oposição à execução, ou seja, quando aquela ocorra por via de incidente. Encontra-se, portanto, sempre salvaguardada a possibilidade de o executado contraditar em juízo a actuação do agente de execução, alegando e provando a verificação de algum dos fundamentos de oposição à penhora taxativamente previstos no artigo 784.º do CPC ou, mesmo sem deduzir oposição à penhora, louvando-se, para tanto, no disposto nas alíneas c) e d) do n.º 1 do artigo 723.º do CPC, o executado pode sempre, em simples requerimento dirigido ao juiz, invocar a questão do excesso da penhora.(…)
Na verdade, tratando-se de uma situação excepcional, em conformidade com o disposto na parte final do n.º 1 do artigo 752.º do CPC, só quando se mostre reconhecida a insuficiência do imóvel sobre o qual incide a garantia, e pelo qual a penhora necessariamente se inicia, conforme previsto na primeira parte do preceito, a penhora pode recair noutros bens que nos termos dos artigos 735.º, n.º 1, estejam sujeitos à execução, sem que se verifique qualquer ilegalidade da mesma, por violação do primeiro dos indicados preceitos.
Concordamos com o entendimento de que atribuindo a lei ao agente de execução a competência para todas as diligências relativas à penhora dos bens e inexistindo norma expressa a conferir competência ao Juiz para o reconhecimento da insuficiência dos bens onerados, face ao disposto no nº1 do art. 719º do CPC, tal decisão compete ao agente de execução, sem necessidade de pedido prévio do exequente, embora o possa formular.
Analisando agora, o caso dos autos, vemos que, a agente de execução, em 9.10.2018, apresentou nos autos um relatório/requerimento, no qual, começa por relatar as diligências levadas a cabo até essa data em ordem à venda dos 5/6 do imóvel hipotecado, diligências essas infrutíferas pois nenhuma proposta de aquisição havia sido apresentada desde 2016, e informando que a exequente lhe havia solicitado a penhora de outros bens, nomeadamente das quotas dos executados na Sociedade Agrícola da …, Lda, requer ao Tribunal instruções sobre a penhora desses novos bens.
Por razões que se desconhecem, tal requerimento não foi objecto de despacho, tendo a agente de execução em 1.10.2020 apresentado novo requerimento a solicitar o deferimento do anterior, sendo que, apenas por despacho datado de 23.11.2020, é ordenado à agente de execução que profira a decisão de reconhecimento da insuficiência dos bens onerados, por ser da sua competência, o que a mesma faz em 5.12.2020.
Entrementes, face ao requerimento apresentado pela exequente em 9.10.2020, alegando a insuficiência do bem hipotecado/ penhorado, dada a inexistência de qualquer proposta de aquisição, e reiterando o pedido de penhora de novos bens dos executados, sustentando ser desnecessário e dilatório o requerimento apresentado pela agente de execução, pois nada de ilegal lhe havia sido solicitado, esta em 24.10.2020 e 30.10.2020, elaborou respectivamente, os autos de penhora das quotas da executada na Sociedade Agrícola Quinta ..., Lda, e da sua pensão.
E, como vimos, é pelo facto de tais penhoras terem sido realizadas antes da decisão proferida em 5.12.2020 pela agente de execução na sequência do despacho judicial que a opoente/ recorrente defende que tais penhoras são ilegais, alegando que não houve um reconhecimento expresso prévio da insuficiência dos bens onerados, acrescentando ainda que, não basta a ausência de propostas para se concluir que um bem não tem valor bastante para cobrir a dívida exequenda e as despesas inerentes.
Por seu turno, a recorrida sustenta que a agente de execução cumpriu todos os requisitos legais, pois, em 9.10.2018 e 1.10.2020, manifestou o seu parecer no sentido da necessidade de penhora de novos bens por insuficiência do imóvel penhorado e na sequência do despacho judicial proferiu decisão expressa nesse sentido, acrescentando que o valor do imóvel penhorado é manifestamente insuficiente para pagamento da quantia exequenda e a que a recorrente mais não quer do que protelar indefinidamente a satisfação integral do seu crédito.

Vejamos
Como já dissemos, a insuficiência dos bens onerados há-de resultar da própria tramitação da execução, tem de ser patente face aos factos evidenciados pelo processo. A decisão da agente de execução destina-se a condensar e expressar os factos que revelam tal insuficiência.
E lendo integralmente o relatório/ requerimento apresentado pela agente de execução em 9.10.2018, vemos que nele a mesma descreve as diligências feitas em ordem à venda dos 5/6 dos executados no imóvel hipotecado e penhorado, referindo, nomeadamente, que para o efeito já havia sido substituído o encarregado da venda, mas que até aquela data, decorridos mais de 30 meses, nenhuma proposta havia sido apresentada. E, mais adiante, referindo expressamente o art. 752º do CPC diz que” tal preceito foi escrupulosamente cumprido não tendo levado a efeito qualquer diligência de penhora de outros bens até se terem esgotado as expectativas de conseguir a venda do imóvel dentro de um prazo razoável de manutenção do processo executivo sem qualquer tipo de procedimento para além das diligências conducentes à sua alienação”.
Depois, acrescenta, além do mais, que o processo estava na fase de venda do imóvel desde 2016 e que o facto de o mesmo não estar penhorado na totalidade acarretava muitas dificuldades na venda, e referindo que a exequente lhe solicitou a penhora das quotas dos executados na Sociedade Agrícola Quinta ..., Lda., mas o executado L. M., nos dias 2 e 4 de outubro lhe dissera que caso não fossem suspensas imediatamente todas as penhoras até ser executido o bem hipotecado ou verificada a sua insuficiência para a satisfação do crédito seria “ obrigado a participar à Ordem dos Agentes de Execução” terminou requerendo ao Tribunal informação sobre os procedimentos a adoptar quanto às penhoras que lhe foram requeridas pela exequente.
Ora, apesar de neste relatório/ requerimento a agente de execução não ter proferido uma decisão de reconhecimento da insuficiência do bem onerado para garantir o pagamento da quantia exequenda, tendo optado por pedir instruções ao Tribunal, não restam dúvidas de que o mesmo contém os factos processuais reveladores de tal insuficiência e de que no entender da agente de execução deviam ser penhorados os novos bens.
E cremos que, ao invés do alegado pela recorrente, a ausência de propostas durante um período de 30 meses é suficiente para se concluir que o valor de mercado do bem hipotecado não era o valor da avaliação (€ 598.740,00) e que com muita probabilidade seria insuficiente para satisfazer a quantia exequenda.
Com efeito, o nº 3 do art. 751º, do CPC, autoriza a penhora de bens imóveis de valor superior à quantia exequenda desde que a penhora de outros bens, presumivelmente não permita a satisfação integral do credor no prazo de 6 meses. E a alínea a) do nº4 do mesmo preceito legal até permite a penhora da habitação própria permanente do executado em execução de valor igual ou inferior ao dobro do valor da alçada do tribunal de primeira instância, se a penhora de outros bens presumivelmente não permitir a satisfação integral do credor no prazo de 30 meses.
Ora, se estes preceitos legais permitem a penhora de novos bens inicialmente não penhoráveis quando seja de presumir que os bens penhorados não vão permitir a satisfação integral do credor num prazo razoável, sendo que para além dos 30 meses até a penhora da habitação própria permanente é permitida, também no caso das dívidas com garantia real em que penhora inicial recai obrigatoriamente sobre bens onerados o decurso de um prazo de 30 meses sem a apresentação de qualquer proposta de aquisição, tem de legitimar o reconhecimento da insuficiência dos bens onerados e a penhora de outros bens dos executados.
Destarte, entendemos que no caso em apreço, a situação processual em 8.10.2018, já evidenciava a insuficiência dos bens onerados para conseguir o fim da execução, sendo essa a posição expendida pela agente de execução no relatório/ requerimento apresentado Juízo.
Assim, apesar de nessa data a agente de execução não ter reconhecido/ declarado tal insuficiência como podia e devia, optando por solicitar instruções ao Tribunal, vindo a declará-la expressamente apenas em 5.12.2020 em resposta ao despacho de 23.11.2020, o certo é que esta decisão se limitou a confirmar a realidade processual que já remontava a 2018 e permaneceu, pelo que à data da realização das penhoras aqui em apreço se verificava o pressuposto material para a penhora de novos bens dos executados com vista à satisfação da quantia exequenda.
Reconhece-se, no entanto, que formalmente ocorreu uma irregularidade, pois a decisão expressa de insuficiência dos bens penhorados só ocorreu em 5.12.2020 e, em rigor, devia ser anterior à penhora dos novos bens.
Como é sabido, a lei prevê nulidades processuais que são desvios do formalismo processual seguido, em relação ao formalismo processual prescrito na lei, a que esta faça corresponder – embora não de modo expresso – uma invalidação mais ou menos extensa dos actos processuais, na medida em que os atos processuais são atos instrumentais que se inserem na complexa unidade de um processo, de tal sorte que cada ato é, em certo sentido, condicionado pelo precedente e condicionante do subsequente, repercutindo-se mais ou menos acentuadamente no ato terminal do processo, pondo em risco a justiça da decisão.
Porém, como refere Alberto dos Reis, in Comentário ao Código de Processo Civil, Vol. 2º, Coimbra Editora, 1945, pp. 484/485, há nulidades principais e nulidades secundárias, que presentemente a lei qualifica como “irregularidades “, sendo o seu regime diverso quanto à invocação e quanto aos efeitos.
As nulidades principais (tipificadas ou nominadas) estão previstas, taxativamente, nos arts. 186º a 194º e 196º a 198º do CPC e, por sua vez, as irregularidades (nulidades secundárias, atípicas ou inominadas) estão incluídas na previsão geral do art. 195º do CPC.
Atento o disposto no art. 195º e segs. do CPC, as nulidades processuais podem consistir na prática de um ato proibido, omissão de um ato prescrito na lei ou realização de um ato imposto ou permitido por lei, mas sem a observância do formalismo requerido.
Tais irregularidades só determinam a nulidade do processado a) quando a lei assim expressamente o declare ou b) quando o vício cometido possa influir no exame ou na decisão da causa (ou seja, quando se repercutem na sua instrução, discussão ou julgamento ou, no processo executivo, na realização da penhora, venda ou pagamento).
E se o primeiro caso não levanta dúvidas, no segundo caso é ao tribunal que compete, no seu prudente arbítrio, decretar ou não a nulidade, conforme entenda que a irregularidade cometida pode ou não exercer influência no exame ou decisão da causa.
Este sistema remete o juiz para uma análise casuística, suscetível de só invalidar o ato que não possa, de todo, ser aproveitado, sendo certo que a nulidade de um ato acarreta a invalidação dos atos da sequência processual que daquele dependam absolutamente.
A verificação dos pressupostos da nulidade processual não se basta com uma apreciação em abstrato, deve ser aferida em função das circunstâncias do caso concreto, de modo a poder concluir-se que a irregularidade verificada era suscetível de influir no exame ou na decisão da causa.
Ora, na vertente situação, o facto da decisão expressa de reconhecimento da insuficiência dos bens onerados ter sido proferida depois das penhoras em apreço não acarretou prejuízo para a executada, pois, como vimos, à data da realização das penhoras aqui em análise, já se verificava a situação de insuficiência dos bens onerados que legitimava a sua realização.
E apesar de ser exigível à agente de execução rigor no cumprimento das formalidades que a lei prescreve, a verdade é que, no concreto circunstancialismo, não se vislumbram interesses atendíveis da executada que devam ser salvaguardados, sendo certo que, que a formalidade omitida já foi, entretanto, cumprida. Por conseguinte, revelando-se a irregularidade verificada inócua, não há que proceder à anulação de qualquer acto.
Em síntese, verificando-se que a execução começou pela penhora do bem onerado e que a executada não logrou demonstrar como lhe incumbia que o valor daquele bem era bastante para conseguir o fim da execução, abalando o juízo de insuficiência subjacente às penhoras realizadas, conclui-se pela legalidade das mesmas.
Termos em que se impõe a confirmação da sentença recorrida, improcedendo a apelação.
*

IV- Decisão

Pelo o exposto, os Juízes deste Tribunal da Relação de Guimarães acordam em julgar improcedente o recurso de apelação apresentado pela apelante, confirmando a decisão recorrida.
*
As custas do recurso, são integralmente da responsabilidade da recorrente, atento o seu integral decaimento (art. 527º do CPC), sem prejuízo da decisão do apoio judiciário.
Notifique.
*
Guimarães, 15 de Junho de 2022.

Relatora: Maria Eugénia Pedro
1º Adjunto: Pedro Maurício
2º Adjunto: José Carlos Duarte