Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
3320/10.2TBBRG-A.G1
Relator: ANA CRISTINA DUARTE
Descritores: ACÇÃO EXECUTIVA
INÉRCIA DAS PARTES
EXTINÇÃO DA INSTÂNCIA
AGENTE DE EXECUÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 09/29/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: 1 – Num processo de execução, estando em curso diligências de penhora requeridas pelo exequente e não tendo este sido notificado da sua impossibilidade, para indicar outros bens, não pode a execução ser julgada extinta, pelo simples decurso do prazo de três meses a que se refere o artigo 750.º, n.º 1 do CPC.
2 – Aliás, no Novo Código de Processo Civil, não só não há lugar à prolação de uma sentença de extinção da execução, como se verifica que o processo pendente é extinto, automaticamente, na sequência de comunicação electrónica do agente de execução, sem intervenção do juiz.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

I. RELATÓRIO
Na presente ação executiva para pagamento de quantia certa, no valor de € 18.121,05, com sentença condenatória como título executivo, que “Banco…, SA” move a P… e em que foi requerida a penhora de bens móveis existentes na residência do executado, bem como o veículo automóvel do mesmo, vem o exequente interpor recurso do despacho que julgou extinta a execução, tendo finalizado a sua alegação com as seguintes
Conclusões:
1 – O despacho recorrido violou o disposto no artigo 849.º do Código de Processo Civil na medida em que não aguardou o resultado da penhora levada a efeito nos bens que guarnecem a residência do executado e da penhora no veículo automóvel identificado no requerimento executivo e, consequentemente, também o disposto no artigo 750.º do Código de Processo Civil.
2 – Deve, assim, o presente recurso ser julgado procedente, por violação do disposto nos artigos 849.º e 750.º do Código de Processo Civil e substituir-se o despacho recorrido por Acórdão que ordene o normal e regular prosseguimento da presente execução, desta forma se fazendo Justiça.

Não houve contra alegações.
O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente nos próprios autos, com efeito meramente devolutivo.
Foram colhidos os vistos legais.

A única questão a resolver traduz-se em saber se a execução, no estado em que se encontrava, podia ser declarada extinta.

II. FUNDAMENTAÇÃO
Com interesse para a decisão importa fixar os seguintes factos:
1 – No requerimento executivo, o exequente requereu a penhora de “todo o mobiliário, aparelhos eletrodomésticos, televisão, telefonia e demais recheio que guarnecem a residência do executado”, bem como o seu veículo automóvel.
2 – A 13/06/2013, o agente de execução deslocou-se à morada do executado e, confirmando que ele aí residia, não conseguiu efetuar a penhora de bens móveis, em virtude de as portas se encontrarem fechadas.
3 – A 25/06/2013, o agente de execução requereu a emissão de despacho que determine a requisição do auxílio de força pública, bem como arrombamento, em virtude de a porta estar fechada e haver a certeza que o executado ali reside.
4 – A 27/06/2013 foi proferido despacho a deferir o requerido.
5 – A 22/04/2014 foi proferido o despacho recorrido, do seguinte teor:
“Na presente execução é exequente Banco…, SA, sendo executado P…, tendo a execução dado entrada em juízo em 27/02/2012.
Desde então realizaram-se diversas diligências de busca de bens penhoráveis não tendo sido localizados bens suficientes para o pagamento da quantia exequenda e custas do processo.
Pelo exposto, ao abrigo do disposto nos artigos 6.º, n.º 1 da Lei 41/2013 de 26/06; 750.º e 849.º, n.º 1, alínea c), ambos do CPC (atual redação), julgo extinta a presente execução.
Custas pelo executado – artigo 536.º, n.º 3 do CPC (atual redação).
Registe e notifique – artigo 849.º, n.º 2 do CPC (atual redação) – sendo o agente de execução para proceder em conformidade com o disposto no artigo 717.º, n.º 2, alínea b) do CPC (atual redação).”
6 - Já após despacho de remessa dos autos a este Tribunal, foi junto expediente vário, que dá conta da tramitação do pedido de penhora do veículo automóvel.

Estes os factos e, com base neles, torna-se evidente a procedência do recurso.
Com efeito, não pode uma execução ser julgada extinta, quando estão em curso diligências de penhora de bens que haviam sido requeridas pelo exequente, sem que lhe tenha sido dado conhecimento da impossibilidade de as levar a cabo, ou sequer haja conhecimento nos autos da inviabilização das mesmas.
Vejamos.
O artigo 849º do Código de Processo Civil diz-nos quando há lugar à extinção da execução, referindo que tal ocorre nas seguintes situações:
a) Logo que se efetue o depósito da quantia liquidada, nos termos do artigo 847º;
b) Depois de efetuada a liquidação e os pagamentos, pelo agente de execução, nos termos do Regulamento das Custas Processuais, tanto no caso do artigo anterior como quando se mostre satisfeita pelo pagamento coercivo a obrigação exequenda;
c) Nos casos referidos no nº 3 do artigo 748º, no nº 2 do artigo 750º, no nº 6 do artigo 799º e no nº 4 do artigo 855º, por inutilidade superveniente da lide;
d) No caso referido na alínea b) do nº 4 do artigo 779º;
e) No caso referido no nº 4 do artigo 794º;
f) Quando ocorra outra causa de extinção da execução.
É em face destas situações que se poderá declarar extinta a execução.
No caso dos autos, o despacho do Sr. Juiz remete para a alínea c) do supra citado artigo e para o artigo 750.º do CPC.
O que verificamos é que não se encontra preenchida nenhuma das situações previstas no referido artigo 750.º do CPC, designadamente naquele n.º 2, que se reporta a situações em que nem o exequente nem o executado indicam bens penhoráveis no prazo de 10 dias.
Também aqui não se aplica o prazo de três meses a que se refere o n.º 1 do artigo 750.º do CPC, uma vez que, no caso dos autos, ainda estavam em curso diligências para penhora dos bens que haviam sido indicados pelo exequente no requerimento executivo – havia sido despachado favoravelmente o requerimento para recurso à força pública e arrombamento a fim de entrar em casa do executado para proceder à penhora de bens móveis e, relativamente ao veículo automóvel, estavam em curso diligências para reverter uma condenação de perda a favor do Estado, em processo crime.
Logo, estando em curso tais diligências, não pode, simplesmente dizer-se que a execução se extingue por ter decorrido o prazo de três meses sem terem sido encontrados bens penhoráveis (quando até já tinham passado mais de dois anos sobre a data do requerimento executivo).
À semelhança do que sucede com o regime plasmado no artigo 281.º do Código de Processo Civil, que determina a deserção da instância, também este dispositivo é inspirado pela ideia de presunção de abandono da instância processual pelas pessoas oneradas com o impulso processual e pelo interesse público da não duração indefinida dos processos, em face da constatada, reiterada e prolongada inércia das partes em promover o seu andamento.
Dúvidas, no entanto, não podem restar de que, à semelhança do que sucede com a deserção da instância – que também opera pelo decurso do tempo - para que estejamos perante esta causa de extinção da instância executiva - por falta de impulso processual -, necessário se torna também que se conclua pela existência de revelada incúria de modo que as partes possam verificar, inequivocamente, que ocorreu no processo este desleixo na acção e que a parte a quem se atribui este descuido merece a punição prescrita na lei – veja-se, neste sentido, Acórdão desta Relação de 24/10/2013 (processo n.º 224/09.5TBBRG.G1), in www.dgsi.pt.
Ora, como já vimos, no caso de que nos ocupamos, o exequente foi surpreendido pelo despacho que julga extinta a execução quando estava à espera da concretização das penhoras que havia requerido ou de informação acerca da sua inviabilidade, nunca tendo sido notificado para indicar outros bens à penhora.
Do que fica dito resulta, salvo o devido respeito, que não se pode extrair a conclusão de inércia em promover o andamento do processo, por parte do exequente, passível de alicerçar o incumprimento de um ónus de impulso processual com que estivesse onerado ou que sobre ele impendesse decorrente da verificação de uma presunção de abandono da instância processual, não só porque estavam em curso diligências para a penhora dos bens indicados em primeiro lugar, como porque nunca o exequente foi notificado de que tais penhoras não eram possíveis, devendo indicar outros bens em sua substituição.

Aliás, tendo em conta que a intervenção do juiz nos processos de execução está balizada pelo disposto no artigo 723.º do CPC, onde não se refere o despacho de extinção de execução e que a competência do agente de execução é residual, no sentido de que lhe compete efetuar todas as diligências no processo executivo que não estejam atribuídas à secretaria ou não sejam da competência do juiz, forçoso será concluir que a competência para declarar a extinção da execução é do agente de execução e não do juiz – artigo 719.º, n.º 1 do CPC – o que, também, sempre resultaria do facto de o artigo 849.º, n.º 3 do CPC determinar que a extinção da execução é comunicada, por via eletrónica, ao tribunal, sendo assegurado pelo sistema informático o arquivo automático e eletrónico do processo, sem necessidade de intervenção judicial ou da secretaria.
Veja-se, também, o decidido pelo Tribunal da Relação de Évora, Ac. de 17/10/2013, (proc. nº 3304/11.3TBLLE.E1), in www.dgsi.pt: “ (…) e no seguimento da legislação anterior, temos que não existe uma sentença de extinção nem, menos ainda, o juiz tem competência para a proferir “, assim se “compreendendo”, aliás, que, não obstante a decisão proferida pelo Sr. Juiz a 22/04/2014, tenha, posteriormente, a 17/07/2014, o processo prosseguido com a tramitação relativa à penhora do veículo.
Em face de tudo o supra referido, impõe-se portanto a procedência da apelação, considerando-se a instância executiva pendente até que seja efectuada a comunicação a que alude o nº3, do artº 849º, do CPC.

Sumário:
1 – Num processo de execução, estando em curso diligências de penhora requeridas pelo exequente e não tendo este sido notificado da sua impossibilidade, para indicar outros bens, não pode a execução ser julgada extinta, pelo simples decurso do prazo de três meses a que se refere o artigo 750.º, n.º 1 do CPC.
2 – Aliás, no Novo Código de Processo Civil, não só não há lugar à prolação de uma sentença de extinção da execução, como se verifica que o processo pendente é extinto, automaticamente, na sequência de comunicação electrónica do agente de execução, sem intervenção do juiz.

III. DECISÃO
Em face do exposto, decide-se julgar procedente a apelação, revogando-se a decisão recorrida e ordenando-se a ulterior, normal e regular tramitação do processo.
Sem custas.
Guimarães, 29 de setembro de 2014
Ana Cristina Duarte
Fernando F. Freitas
Purificação Carvalho