Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
6760/19.8T8GMR-A.G1
Relator: JOSÉ AMARAL
Descritores: ARRESTO
JUNÇÃO DE DOCUMENTOS COM O RECURSO
GESTÃO PROCESSUAL
DIREITO AO CONTRADITÓRIO
LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 03/19/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
1. Ofende o direito ao contraditório do requerente de providência cautelar de arresto decretado sem audição do requerido, negar-lhe, no início da audiência final, prazo suficiente, por si requerido, para se pronunciar sobre a oposição deduzida, em que foi pedida a sua condenação como litigante de má-fé e com a qual foram juntos múltiplos documentos, uma vez que, até àquele momento, nunca deles fora notificado.

2. A requerida litigância de má-fé deve ser apreciada e decidida na sentença. Não é legítimo separar tal questão, no início da audiência, das que constituem o objecto do processo, e relegar o seu conhecimento para momento posterior, a pretexto de aligeirar o exercício do contraditório quanto ao articulado de oposição em que aquela foi pedida (e respectivos documentos), tanto mais que os factos respectivos não são cindíveis.

3. Não se tendo assegurado à parte requerente/apelante o exercício efectivo do seu direito ao contraditório quanto ao articulado de oposição, documentos juntos e especialmente quanto à litigância de má-fé que naquele lhe foi imputada, conheceu-se do mérito da impugnação ao arresto decretado sem que estivessem reunidas as condições indispensáveis para tal (excesso de pronúncia) e não se conheceu, como devia ter acontecido uma vez garantido também quanto a ela aquele direito, da questão da litigância de má-fé a pretexto, legalmente inadmissível, de a relegar para ulterior momento (omissão de pronúncia).

4. Por isso, a sentença é nula – artº 615º, nº 1, alínea d), CPC.
Decisão Texto Integral:
Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães:

I. RELATÓRIO

J. C. instaurou, em 03-10-2019, no Tribunal de Guimarães, providência cautelar, requerendo o arresto de móveis e equipamentos de escritório e de um saldo bancário pertencentes à sociedade X – Projectos de Engenharia Civil e Arquitectura, Ldª, com fundamento em, alegadamente, ser titular de um crédito, já vencido, por serviços prestados de advocacia, que esta se recusa a pagar-lhe, sendo que receia perder a garantia patrimonial dele uma vez que a devedora colocou na porta do seu estabelecimento (gabinete de trabalho) um anúncio a publicitar a venda do respectivo recheio, não lhe conhecendo mais bens para além desses equipamentos e de um eventual crédito (ainda litigioso) [1].

Juntou documentos.

Com base nestes [2], em declarações de parte do próprio requerente e no depoimento testemunhal de um seu colega e amigo, por decisão de 16-10-2019, foram, sem audiência do requerido, julgados sumariamente provados os factos [3], verificados os pressupostos do arresto e decretada a providência.

Esta realizada e citada a requerida, apresentou-se a mesma (em 25-11-2019) a deduzir oposição, pedindo a revogação da referida decisão e o consequente levantamento do arresto ou sua redução apenas ao saldo bancário e, ainda, a condenação do requerente, em multa e indemnização, como litigante de má-fé.

No seu longo articulado, sustentou que nada deve e que o requerente, dolosamente, falseou os alegados factos e ocultou outros essenciais com único intuito de lograr o decretamento do arresto. Referiu que também, no âmbito da sua actividade, lhe prestou serviços (relativos a edificação, projecto e licenciamento). Ele, na respectiva demanda judicial e por acórdão da Relação, foi já condenado a pagar-lhos (12.000€ e juros). Antes de tal condenação ter transitado em julgado e a pretexto de reclamação que apresentou, notificou-a judicialmente para lhe pagar o crédito que aqui invoca, para se eximir à sua obrigação.
No decurso da subsequente execução e para garantia do crédito da ali exequente (e ora requerida) foi penhorado o crédito do executado (ora requerente), no valor de 15.570,53€, correspondente ao saldo de uma sua conta bancária. O crédito exequendo é o ora arrestado. Na execução, foi deduzida oposição com fundamento na compensação da dívida com o aqui alegado crédito do requerente, de modo a extingui-la. Porém, na respectiva sentença, foi ordenado o prosseguimento da execução para pagamento da quantia de 10.364,36€ e juros vencidos e vincendos (tendo sido julgada improcedente a apelação dela interposta [4] e indeferido o requerimento de revista excepcional, mesmo após reclamação para o STJ). Tudo isso, juntamente com a presente providência nesse entretanto instaurada, são manobras dilatórias com que o requerente/executado visou obstar (e obstou) à efectiva cobrança, pela requerida/exequente, do seu crédito, na execução, por via da penhora efectuada.
O crédito aqui alegado carece, pois, de ser ainda declarado numa acção, quando muito há apenas probabilidade de ele existir, sendo o mesmo litigioso e, por isso, incorrecta a afirmação do requerente de que não logrou recebê-lo.
Impugna, por ser falso, que alguma expressão tivesse proferido, nas circunstâncias alegadas, no sentido de que nunca o pagaria. Acrescenta que é uma empresa séria, reconhecida, nada deve a quem quer que seja e nunca se viu envolvida em litígios judiciais. Mesmo a provar-se o crédito alegado, este representaria uma “migalha” no seu volume de facturação, não seria por isso que ia fechar. A sua actividade social desenvolve-se normalmente e em pleno, paga pontual e escrupulosamente a trabalhadores e colaboradores, nada deve ao Fisco ou à Segurança Social. Disfruta de saúde financeira. Está certificada. Nega que tivesse tentado vender os seus activos para se furtar a eventual pagamento e para tal colocado qualquer suposto anúncio, aliás jamais ali visto por quem quer que fosse. A foto do mesmo anexa à petição foi tirada à noite e, para a obter, foi colado o papel pelo exterior, de modo a que o requerente pudesse, depois, com ela instruir os autos, o que é resultado de artimanha sua, encenada para instruir esta providência. Não existe justo receio. Os bens arrestados excedem o necessário, pois bastava o crédito da requerida que ao requerente foi penhorado na execução (valor, condição e circunstâncias que ocultou).
Finalizou, alegando que o requerente litiga de má-fé, falseando conscientemente a verdade factual, sabendo não ter razão e ocultando intencionalmente todas as descritas circunstâncias, nomeadamente o seu débito e a apreciação já antes feita da pretendida compensação. O requerente mente para prejudicar a requerida e para, habilidosamente, se furtar ao pagamento da quantia em que foi condenado. Por isso, deve ser sancionado com multa e indemnização, a fixar pelo Tribunal.

Juntou documentos (no total de 21, alusivos à acção em que o requerente foi condenado e à pretendida demonstração da sua situação financeira e no mercado).

Por despacho subsequente de 27-11-2019, designou-se para 11-12-2019 a audiência final.

Entretanto, tendo sido dada, pelo requerente, notícia da instauração da acção principal, foi ordenada a remessa destes autos para apensação à mesma e dada sem efeito a data designada, disto tendo as partes sido notificadas por expediente elaborado e inserto no Citius em 06-12-2019.

Feita a apensação, por despacho de 09-12-2019 [5], nessa data notificado a ambas as partes, remarcou-se logo a audiência final. [6]

O articulado de oposição não foi, porém, notificado “entre mandatários”, nem através da Secretaria (artºs 221º e 575º, CPC), ao requerente.

Na acta da audiência (11-12-2019), lê-se o seguinte:

“Iniciada a audiência à hora marcada, pela Ilustre Mandatária do Requerente foi pedida a palavra e, sendo-lhe concedida no seu uso disse que não ter sido notificada da Oposição apresentada pela Requerida, requerendo prazo para análise da mesma e da documentação junta. [7]

De imediato [8], pela Mm.ª Juiz foi proferido o seguinte [9]:
DESPACHO:

Face ao alegado e requerido, o Tribunal neste momento procede à notificação da oposição deduzida e documentos apresentados ao Requerente.
Tratando-se de processo urgente, o Tribunal suspende a audiência pelo prazo estritamente necessário à análise do requerimento de oposição e documentos apresentados, considerando-se suficiente e adequado para o efeito o prazo de 30 minutos para que a parte analise os mesmos, o que se concede. Em conformidade com o acabado de deferir, suspende-se a presente audiência, retomando-se a mesma pelas 11:00 h.
Notifique.
Do Despacho proferido foram os presentes notificados, os quais declararam ficar cientes.
Findo aquele prazo, retomada a audiência, gravando-se os requerimentos, despachos e depoimentos, nos termos do disposto no art.º 155.º, n.ºs 1 e 2 do C.P.C., a Mm.ª Juiz colocou a ata à disposição das Il. Mandatárias, tendo a Il. Mandatária do Requerente apresentado requerimento oral, que se encontra gravado, alegando a necessidade de mais prazo para exercer o contraditório quanto à oposição e documentos. [10]
Dada a palavra à Il. Mandatária da Requerida, a mesma disse nada ter a opor. [11]

De seguida, a Mm.ª Juiz proferiu DESPACHO, que se encontra gravado, determinando a suspensão da audiência até às 12:00h, para que a Il. Mandatária do Requerente possa melhor a analisar da Oposição e documentos apresentados pela Requerida. [12]
Do Despacho proferido foram os presentes notificados, os quais declararam ficar cientes.
Findo aquele prazo, retomada a audiência, pela Il. Mandatária do Requerente foi pedida a palavra e, sendo-lhe concedida, no seu uso apresentou requerimento oral, que se encontra gravado, alegando a nulidade dos autos e da decisão que venha a ser proferida por violação do princípio do contraditório.
Logo após, pela Mm.ª Juiz foi proferido DESPACHO, que se encontra gravado, indeferindo o requerido [13].
Do Despacho proferido foram os presentes notificados, os quais declararam ficar cientes.
De imediato, a Mm.ª Juiz deu a palavra à Il. Mandatária do Requerente para, querendo, responder à Oposição apresentada pela Requerida.
De seguida, a Mm.ª Juiz deu início à produção da prova declarativa e testemunhal…”.

No prosseguimento da audiência, foram então ouvidos, instados pela Mª Juíza [14], o legal representante da requerida e três testemunhas por esta arroladas.

Após, com data de 18-12-2019, foi proferida a sentença.

No respectivo relatório, afirma-se que “Os meios de prova indicados foram admitidos e produzidos em audiência, com contraditório do requerente, conforme se afere da respectiva acta” [15] e que “relegando-se para ulterior momento a análise da questão quanto à litigância de má fé, dado à parte visada ainda ser possível responder e/ou apresentar meios de prova para o efeito”.

Culminou ela na seguinte decisão:

“Pelo exposto, julga-se procedente a oposição ao procedimento cautelar e, em consequência:
a) determina-se a revogação da providência decretada e, por via disso, o levantamento do arresto decretado.
Mais se decide condenar os Requerentes no pagamento das custas que sejam devidas pelo presente procedimento, na proporção de 100% (sem prejuízo de isenção ou dispensa de que possa beneficiar) (art.ºs 527.º e 539.º n.º1 do CPC). ”

O requerente, inconformado, apelou a este Tribunal, rematando as suas extensas alegações com as seguintes conclusões:

“1 - Na decisão dos autos, nem uma única referência é feita à prova produzida nos autos e oferecida pelo requerente, o que claramente revela que a mesma não foi, em absoluto, ponderada, e muito menos compatibilizada com a matéria de facto adquirida em sede de oposição ao arresto, pelo que, e nessa medida, e porque não efectua a compatibilização de toda a matéria de facto (abstendo-se em absoluto de, sequer, conhecer uma parte importante dela), acaba por não especificar (todos) os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, o que constitui causa de nulidade da sentença prevista na aI. b) do n" 1 do art" 615° do CP.C.
2 - Na decisão dos autos, não foram resolvidas todas as questões submetidas à apreciação do Juiz (art" 608°, n" 2 do CPC), verificando-se assim e também, para além da nulidade prevista na aI. b) do n" 1, a nulidade da sentença prevista na aI. d), ambas do n" 1 do art" 615° do CPC;
3 - A Mma Juiz, na diligência dos autos, foi muito além do poder/ dever de gestão processual plasmado e que lhe é conferido no art" 6° do CPC violando, em simultâneo, várias disposições legais processuais nomeadamente o art" 6°, n" 1, 4°, 7°, nOs 1 e 4, 9°, e até mesmo, como se verá, o art" 516°, n" 3 todos do CPC violações essas que, por contenderem com princípios de igualdade e do contraditório, com a aquisição de factos ou com a admissibilidade de meios probatórios, são sindicáveis em sede de recurso, já que, indubitavelmente influíram no exame e na decisão da causa (cfr. ficheiro áudio 20191211120508 aos minutos 2/30 e 5/43/28 a 37).
4 - Ao não ordenar a notificação, aquando da notificação da data para audiência de julgamento, ao requerente, do articulado da oposição e bem assim dos documentos que a acompanham, fazendo-o apenas aquando da realização da própria audiência, e em reacção à informação de que tal lapso teria ocorrido, concedendo à parte apenas alguns minutos para se inteirar do conteúdo do articulado, dos documentos que o acompanham e que formam um conjunto com mais de trezentas páginas, impediu a Mma juiz o requerente de, na prática, exercer o direito ao contraditório que sempre haveria de lhe ser concedido, violando em simultâneo não só as citadas disposições legais como ainda os princípios da cooperação, da igualdade das partes e até o dever de recíproca cooperação (cfr. ficheiro áudio 20191211112229 e 201912111120109 nos minutos iniciais)
5 - Foi violado o regime previsto no art" 516°, n" 3 do CP.C, pela Mma Juiz a quo, em sede de inquirição do representante legal da requerida, facto que aliás resulta inequívoco da prova gravada;
6 - A violação do regime do depoimento referida, e bem aSSIm dos demais princípios atrás referidos, acabou por, agravar, de forma exponencial, os efeitos da violação do princípio do contraditório, já que, se tivesse sido concedida a oportunidade de o recorrente se defender, certamente este teria conseguido, como agora demonstra, que o representante legal da requerida mente descarada e despudoradamente quer nestes autos quer nos autos que antecederam estes e que opõem as mesmas partes, pelo que, e nessa medida se impõe seja conferida a possibilidade ao recorrente de lançar mão da possibilidade que lhe é conferida pelos aros 425° e 651° do CP.C, admitindo-se a junção, com as presentes alegações, de vários documentos aptos a fazer a contraprova do alegado pela requerida, dessa forma reequilibrando a posição das partes (junção de does. nOs 1 a 6 ao presente articulado de recurso))
7 - Deveria pois a MMa Juiz a quo, considerando todos os dados carreados para os autos, ter feito uma apreciação crítica da prova produzida e, no final considerar como provados ou não provados os factos postos em crise, nos termos que supra se referem, aplicando o direito em função dessa resposta;
8 - Deverá considerar-se que não só ocorrem as nulidades invocadas, como ainda se justifica que este Digníssimo Tribunal da Relação altere tal decisão sobre a matéria de facto constante nos pontos 2, 4, 5, 8, lO, 11, 12 e 14, ( Docs. nOs 1 a 6 ora juntos, ficheiro áudio n° 2019106101907 ao minuto 4,34; ficheiro áudio n° 2019106101907 ao minuto 2,55; ficheiro áudio n° 2019106102905 ao minuto 4,15; ficheiro áudio n° 20191211120508 ao minuto 24,47), o que se requer, (considerando o preceituado no art" 662, n" 1 do CP.C) de forma a fazer constar tais factos como provados ou não provados nos termos ora requeridos, aplicando o direito em conformidade;
9 - Padece pois a decisão dos autos também de nulidade por violar a disposição constante do n" 1, aI. b) do art" 615° do CP.C dado que não especifica convenientemente os fundamentos que sustentaram a decisão da matéria de facto;
10 - É ainda a decisão em crise nula dado que não foram resolvidas todas as questões submetidas à apreciação do Juiz (art" 608°, n" 2 do CPC), verificando-se assim e também, a nulidade da sentença prevista na aI. d), ambas do n" 1 do art" 615° do CP.C;
11 - Foram flagrantemente violadas várias normas processuais, nomeadamente o art" 6°, n" 1, art" 4°,7°, nOs 1 e 4,9° e 516°, n" 3, todos do CPC

Nestes termos e nos mais de Direito que V.as Ex.ts doutamente suprirão, deve o presente recurso merecer provimento, e em consequência alterar-se a matéria de facto e de direito nos termos e pelos fundamentos supra expendidos, revogando-se a douta decisão em crise, e substituindo-a por outra que mantenha o arresto ordenado, com as legais consequências.
Fazendo-se, desta forma, a costumada JUSTIÇA.”

A requerida respondeu mediante não menos extensas alegações e conclusões, estas do teor seguinte:

“1. Entende a aqui Requerida/Recorrida que não assiste qualquer razão ao Recorrente pois não foram violados pelo Tribunal a quo quaisquer principio nem praticados quaisquer actos nulos.
2. A Recorrida não encontra na douta Sentença qualquer violação de quaisquer disposições legais ou erro de julgamento que importem a alteração da matéria de facto e de direito no caso vertente nos autos, pelo que, entende que a douta sentença proferida pelo Tribunal de Primeira instância não merece qualquer reparo.
3. E entende, também, não ser de retirar conclusões diversas de toda a matéria de facto dada como provada, concordando integralmente com o teor da douta sentença proferida pelo Tribunal a quo.
4. Não se verificou a violação do principio do contraditório, pois, tal como consta da respectiva acta e da gravação da audiência, o Tribunal facultou à Ilustre Mandatária do Requerente, por duas vezes, (e não pelo período de 10 minutos como a mesma alega) a possibilidade desta se pronunciar acerca da oposição deduzida pela Requerida bem como dos documentos juntos com tal articulado, contudo, a mesma optou por não exercer o contraditório pois o que, na realidade, pretendia era que o Tribunal lhe permitisse apresentar um articulado de resposta à oposição deduzida pela Requerida, articulado esse que é legalmente inadmissível, já que, a lei não permite que o Requerente do procedimento cautelar apresente articulado de resposta à oposição deduzida pelo Requerido.
5. Pretendia ainda o Requerente indicar nova prova testemunha, o que, também é inadmissível.
6. Uma das características dos procedimentos cautelares é o facto de se tratarem de processos urgentes e ser necessário celeridade na tramitação processual.
7. A faculdade prevista no n.º 3, do artigo 3.º do C.P.C. não se pode nunca confundir com o direito de apresentar articulado de resposta à oposição, como pretende o Requerente.
8. Também cabe dizer que quer o articulado de oposição quer os documentos juntos com o mesmo são de fácil e rápida análise, já que como referiu o Tribunal de primeira instância muito mais de metade de tal articulado se resumia a invocar factos já do conhecimento do Requerente (ocultados ao tribunal aquando da interposição do procedimento cautelar) mais concretamente sentenças e acórdãos proferidos no âmbito de processos judiciais dos quais forma partes quer o Requerente quer a Requerida, sendo que, em todos esses processos o Requerente foi sempre representado pela mesma Ilustre mandatária: a Sra. Dra. G. G..
9. É por demais evidente que o Requerente, mais uma vez, à semelhança do que tem vindo a fazer nos processos que tem com a Requerida, o que pretendia era claramente adiar os trabalhos e, assim, uma decisão judicial, ou seja, mais uma vez não se coibiu de utilizar manobras dilatórias com o único intuito de atrasar os pressentes autos e, assim, impedir a Requerida de receber a quantia exequenda a que tem direito a receber no processo executivo n.º 3584/18.3T8GMR pelo Juízo de Execução de Guimarães – Juiz 2 (já que o arresto recaiu exactamente sobre quantia que a aqui Requerida /Recorrida havia penhorado ao Requerente /Recorrente, facto esse que, curiosamente o Requerente ocultou deliberadamente sempre ao Tribunal).
10. A aqui Requerida e a mandatária subscritora ficaram verdadeiramente estupefactas e incrédulas com a versão que o Requerente, na pessoa da sua Ilustre Mandatária, apresentou nas suas alegações de recurso quanto ao modo como decorreu a audiência e ainda mais, quanto ao facto de afirmarem que a Meritíssima Senhora Juiz do Tribunal a quo violou o dever de urbanidade e correcção para com a Ilustre Mandatária do Requerente!
11. Nunca, em momento, algum a aqui mandatária subscritora presenciou a Sra. Juiz do Tribunal de Primeira instância a projectar com violência contra a secretária as cópias do articulado de oposição e respectivos documentos ao memo tempo que gritava: “ Está aqui o articulado e os documentos – Está notificada – a diligência iniciar-se-á dentro de 10 minutos”!
12. Nunca a aqui mandatária subscritora viu a Sra. Juiz tratar a Ilustre mandatária do Requerente com falta de urbanidade, sendo, bastante graves todas as considerações e afirmações que o Requerente faz em relação ao comportamento e postura adoptada pela Meritíssima Sra. Juiz ao longo da audiência!
13. Com o devido respeito, afigura-se-nos que não assiste nenhuma razão ao Requerente e que, se alguém violou o dever de cooperação foi o próprio Requerente que a todo o custo pretendia que a audiência não se realizasse!
14. Mas mais, é nosso entendimento que no que à questão de litigância de má fé diz respeito, tratando-se de um procedimento cautelar, afigurasse-nos que andou bem a Meritíssima Sra. Juiz em deixar o juízo definitivo acerca dessa questão para os autos principais.
15. É que, a invocada litigância de má fé do Requerente (que se traduz na omissão intencional de factos ao Tribunal com o intuito de dessa forma convencer o Tribunal de factos por si habilidosamente montados e que bem sabe serem falsos como única de forma de se tentar furtar ao pagamento da quantia a que foi condenado a pagar à Requerida por sentença judicial), referindo-se a factos que hão-de ser objecto de apreciação mais profunda e segura na acção principal, afigurasse-nos, pois, como mais prudente e sensato deixar para aquela acção o juízo definitivo sobre a existência ou não da má fé indiciada.
16. Pelo que, também não cometeu o Tribunal a quo a este respeito, qualquer nulidade, muito menos a invocada pelo Requerente.
17. Também basta ouvir as declarações de parte do Representante legal da Requerida para se constatar que o Tribunal a quo não lhe fez questões sugestivas, o que a Meritíssima Senhora juiz fez foi empenhar-se em alcançar a verdade material o que, como se constata incomodou o Requerente ao ponto de imputar ao Tribunal a quo a violação de inúmeros principio legais e inúmeras nulidades.
18. O representante legal da Requerida não mentiu e prova disso é a contestação que apresentou nos autos principais, não se vislumbrando em que em acções anteriores tenha dito algo que contrarie a versão ora por si apresentada. Aliás, as declarações do representante legal do Requerida foram, na sua maioria, corroboradas com a demais provas produzidas.
19. Mas, mais, mesmo que o Tribunal entendesse que o crédito do Requerente existe tal não era suficiente para manter o arresto decretado!
20. Acresce que, também não se vislumbra em todo o texto da decisão recorrida a violação do disposto na alínea b) do artigo 615.º do C.P.C., muito pelo contrário, a Meritíssima Juiz específica, e bem, todos os fundamentos e as provas que sustentaram a decisão.
21. No caso concreto, é evidente não se detectar essa nulidade, visto que a decisão recorrida elenca os factos provados e enuncia devidamente os fundamentos de direito que justificam essa decisão.
22. Nos presentes autos resultou clara e suficientemente provado, atendendo a toda a prova produzida, e sem que tal prova fosse produzida com violação de quaisquer princípios, da inexistência por parte da Requerida de qualquer comportamento que levasse com segurança a dizer que a Requerida encetou uma actuação de venda dos seus bens (recheio do seu estabelecimento/gabinete de arquitectura e Engenharia), tendo resultado, também, suficientemente provado que a mesma não se encontra numa débil e deficitária situação económica.
23. Determina a lei que o receio deve ser fundado, ou seja, apoiado em factos que permitam afirmar, com objectividade e distanciamento a seriedade e actualidade da ameaça e a necessidade de serem adoptadas medidas tendentes a evitar o prejuízo. Não bastam, pois, simples dúvidas, conjecturas ou receios meramente subjectivos ou precipitados assentes numa apreciação ligeira da realidade.
24. O Justo receio de perda de garantia patrimonial, que constitui requisito essencial do procedimento cautelar de arresto, deve ser apoiado em factos que permitam afirmar, objectivamente, a seriedade e actualidade da ameaça e a necessidade de serem adoptadas medidas tendentes a evitar o prejuízo.
25. Ora, os factos indiciados em 2, 3, 4, 5, 6, 8, 10, 11, 12 e 14 da douta sentença e contra os quais o Requerente se insurge ficaram suficientemente provados atento os documentos juntos aos autos, nomeadamente certidão de não divida à segurança social e certidão de não dívida às Finanças, certificado PME e elementos contabilísticos da empresa, nomeadamente IES, balancetes, etc. Mas também, para além das declarações de parte do representante legal da Requerida atendeu o Tribunal ao depoimento da testemunha D. P. (cujo depoimento foi prestado das 12:44:57 às 13:08:44 e que se encontra gravado no ficheiro áudio n.º 20191211124455) contabilista da Requerida, que faz a contabilidade desta há vários anos e que explicou, com rigor, ao Tribunal a estável situação económica da mesma e a ausência de dividas para com terceiros; a mesma se encontrar a laborar; não ter dívidas aos trabalhadores, ao fisco nem à segurança social nem a ninguém; ser uma empresa certificada PME bem conceituada e muito conhecida na cidade de Guimarães; ter disponibilidade económica imediata para pagar um montante como o peticionado pelo Requerente; que se necessitasse de crédito bancário reunia todas as condições para lhe ser concedido; ser falso que pretendeu ou pretende vender todo o recheio das suas instalações e que algum dia tenha publicitado tal facto, nomeadamente com a colocação de um anúncio/ panfleto no vidro das suas instalações ; R. T., Topografo (cujo depoimento foi prestado das 13:09:24 às 13:21:19 e se encontra gravado no ficheiro áudio n.º 201912111) que realiza os levantamentos topográficos dos clientes da Requerida e que se desloca diariamente às instalações da mesma e que conhece, com algum rigor, o funcionamento desta e o volume de trabalho que a Requerida teve e tem, o qual confirmou que nunca teve conhecimento de que a Requerida estivesse a vender ou pretendesse vender o recheio do gabinete; que a mesma se encontra em pleno funcionamento; que é um dos gabinetes com mais trabalho da cidade de Guimarães; e C. G. (cujo depoimento foi prestado das 13:21:46 às 13:27:59 e que se encontra gravado no ficheiro áudio n.º 20191211132144) esteticista, que exerce a profissão num gabinete situado ao lado das instalações da Requerida e que afirmou que nunca viu afixado nos vidros das instalações da Requerida qualquer panfleto a anunciar que esta estaria a vender todo o recheio e que lhe dissessem que a Requerida o faria que ficava bastante surpreendida. Que a Requerida se encontra em funcionamento e que nunca ouviu ninguém, nomeadamente na zona ou clientes comuns, a dizer que a Requerida estava vender todo o seu recheio. Todos estes depoimentos foram aprestados de forma clara, espontânea e coerente – tal como resulta, aliás da audição das respectivas gravações – e como tal, mereceram toda a credibilidade do Tribunal.
26. Toda a prova produzida, levou a que o Tribunal concluísse que a Requerida goza de regular (se não mesmo boa, tal como refere a douta sentença recorrida) saúde financeira, tem liquidez e capacidade de, querendo ou tendo que o fazer, nomeadamente na sequencia de uma decisão judicial que condenasse a Requerida a fazer tal pagamento, pagar de imediato uma quantia como a reclamada nos presentes autos pelo Requerente sem que isso implicasse que a Requerida falhasse outras obrigações financeiras nem perigar a sua situação económica ou/e património.
27. Tal como consta, também, da douta sentença, só o próprio recheio da Requerida ronda, no mínimo, cerca de € 20.000,00 (vinte mil euros).
28. Logrou também a Requerida provar que nunca teve intenção de proceder à venda do seu recheio, nunca colocou qualquer anúncio nos vidros das suas instalações anunciado a venda do recheio e que se encontra a laborar normalmente como sempre fez, sendo um gabinete com muito trabalho e bem conceituado na cidade de Guimarães.
29. Assim, atendendo a toda a prova produzida, que mereceu a credibilidade do tribunal, a Meritíssima Sra. Juiz considerou, e bem, que as garantias existentes à data da constituição do pretenso crédito existem e desde há muito tempo, não tendo sofrido qualquer diminuição a ponto de se poder recear pela sua capacidade de satisfazer montantes como os Reclamados pelo Requerente.
30. O procedimento cautelar de arresto, para a prova do requisito de “justo receio” da perda da garantia patrimonial, não basta a alegação de meras convicções, desconfianças, suspeições de carácter subjectivo. É preciso que haja razões objectivas, convincentes, que aconselhem uma decisão cautelar imediata, como factor potenciador da eficácia da acção declarativa ou executiva.
31. Tendo «em conta que o tribunal formou a sua convicção inicial sem o contraditório prévio do requerido, nada obsta a que, ao abrigo do princípio da livre apreciação da prova (art. 607º, nº 5) e depois da apresentação da oposição em juízo, o julgador dê como provada matéria de facto contrária à que foi dada como provada na fase inicial do procedimento cautelar, sem que daí decorra qualquer oposição de julgados (art. 625º), qualquer vício da sentença - designadamente por contradição entre os fundamentos de facto e a decisão [art. 615º, nº 1, al. c)] - ou qualquer violação do princípio da extinção do poder jurisdicional ou de caso julgado» (Marco Carvalho Gonçalves, Providências Cautelares, 2ª edição, Almedina, Fevereiro de 2016, p. 362 e 388, nota 1334).
32. Na apreciação da prova o tribunal é livre de formar a sua convicção e no presente caso esta não contrariou as regras comuns da lógica, da razão, das máximas da experiencia e dos conhecimentos científicos, por referência ao homem médio suposto pela ordem jurídica.
33. Assim, tendo em conta que o Requerente pretende alterar a matéria de facto pela via da revogação do princípio da livre apreciação da prova, já que o que alega traduz simplesmente a divergência de convicção, contrapondo à do Tribunal a sua pessoal apreciação das provas, que sempre lhe hão-se parecer insuficientes e incorrectamente julgadas, deve o presente recurso ser rejeitado.
34. Não foi assim, também, cometido pelo tribunal a quo qualquer erro na apreciação das provas, sendo por isso de manter inalterada a factualidade Termos em que, e pelos fundamentos expostos, devem V.Exas. negar provimento ao presente recurso e, em consequência, confirmar a douta sentença proferida pelo tribunal a quo pois assim farão V.Exas. JUSTIÇA! ”.

Em face disto, a Mª Juiz recorrida, sobre o requerimento de interposição do recurso, proferiu o seguinte despacho:

“Por a decisão ser recorrível, por ser tempestivo e ter sido apresentado por quem tem legitimidade e interesse em agir para o efeito e, ainda, ter sido autoliquidada a respectiva taxa de justiça, admite-se o recurso interposto pelo Requerente da decisão final proferida a 18.12.2019, que mereceu a resposta (contra-alegações) do Requerido (ref.ª 9801148), também ela tempestiva e legal, recurso esse que é de apelação, com subida imediata e nos próprios autos e com efeito suspensivo da decisão, tudo nos termos e ao abrigo do disposto nos art.ºs 629.º, n.1, 638.º, 644.º, n.º1, al. a), 645.º, n.º1, al. a) e d) parte final, e 647.º, n.º3 al. d), do Código de Processo Civil.”

Concomitantemente, acrescentou, em vista do disposto nos artºs 617º, nº 1, e 641º, nº 1, CPC, apenas que:

“Mais considera-se não haver nulidades a suprir à decisão proferida a 18.12.2019.
Notifique.”

Uma vez na Relação, no despacho liminar, entendeu-se dispensável a baixa dos autos para conhecimento das nulidades. Corridos os Vistos legais e submetido o caso à apreciação e julgamento colectivo, cumpre proferir a decisão, uma vez que nada a tal obsta.

II. QUESTÕES A RESOLVER

Como resulta da lei – artºs 5º, 608º, nº 2, 609º, 635º, nº 4, 637º, nº 2, e 639º, nºs 1 e 2, do CPC – e é entendido pacificamente na Doutrina e na Jurisprudência, é pelas conclusões que, sem prejuízo dos poderes oficiosos do tribunal, se fixa o thema decidendum e se definem os respectivos limites cognitivos.

Olhando ao teor daquelas que, em número de onze, aqui foram apresentadas pelo recorrente e com que este termina pedindo a revogação da decisão recorrida, delas resulta que as questões e sub-questões a apreciar são:

a) Admissibilidade da requerida junção de vários documentos – conclusão 6.
b) A notificação apenas, no decurso da audiência, do articulado de oposição e documentos com ele juntos e o período de tempo para a parte requerente deles se inteirar violou, além das demais disposições a seguir referidas, o direito ao contraditório, gerando a nulidade da sentença (artº 3º) – conclusão 4.
c) Indo além dos seus poderes/deveres, a Mª Juiz, na audiência, violou o disposto nos artºs 4º (igualdade das partes), 6º, nº 1 (gestão processual), 7º, nºs 1 e 4 (cooperação) e 9º (correcção) e com isso mais agravou a violação do direito ao contraditório – conclusões 3, 6 e 11.
d) Houve violação, na forma como foram questionados os depoentes (representante legal da requerida e suas testemunhas), da regra do artº 516º, nº 3.
e) Nulidade da sentençapor não especificar (todos) os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão” ou não os especificar “convenientemente” – artº 615º, nº 1, alínea b), CPC – conclusões 1 e 9.
f) Nulidade da sentença por não resolver todas as questões submetidas à apreciação do Juiz – artº 615º, nº 1, alínea d) – conclusões 2 e 10.
g) Alteração da decisão da matéria de facto provada quanto aos pontos 2, 4, 5, 8, 10 a 12 e 14 “de forma a fazer constar tais factos como provados ou não provados nos termos ora requeridos, aplicando o direito em conformidade” – conclusão 8.
h) Revogação da sentença.

III. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

O tribunal recorrido, na questionada sentença, considerou relevantes e decidiu julgar como provados os seguintes factos:

“1. A Requerida é uma sociedade comercial que foi constituída no ano de 1998
2. A Requerente sempre cumpriu com as suas obrigações financeiras, pautando a sua conduta por nada dever a terceiros.
3. É uma empresa conhecida e conceituada na cidade de Guimarães.
4. O único conflito judicial que tem é com o aqui Requerente, que não lhe satisfez, até ao momento, o crédito judicialmente reconhecido de € 12.000,00.
5. O pretenso crédito do Requerente não tem significância em relação à faturação anual da aqui Requerida.
6. A Requerida não tem dívidas nem ao fisco nem a segurança social.
7. A Requerida é uma empresa com certificado PME – Micro empresa.
8. A Requerida não se encontra numa situação económica difícil, antes tem actualmente com um grande volume de projectos de engenharia e arquitectura de clientes em curso, os quais, muitos deles, só estarão findos no ano de 2020 e em 2021
9. A Requerida paga pontual e escrupulosamente os vencimentos aos seus trabalhadores e colaboradores.
10. Nunca a Requerida nem o seu representante legal levaram a cabo actos que se consubstanciam numa apressada tentativa transmissão dos ativos da empresa, nomeadamente com o objectivo de se furtar ao pagamento dos seus créditos.
11. Nunca a Requerida ou o seu legal representante elaboraram nem afixaram nas suas instalações o anúncio que foi junto pelo Requerente com a sua p.i. sob n.º 4 a anunciar a venda, com urgência, do recheio do seu estabelecimento.
12. Nunca a aqui Requerida teve intenção de vender o recheio do seu estabelecimento nem muito menos publicitou tal facto, anunciando-o
13. A Requerida está e sempre esteve em funcionamento, tendo as suas portas abertas ao público.
14. A Requerida não foi interpelada várias vezes extrajudicialmente para proceder ao pagamento do crédito reclamado pelo Requerente.”

Para tal, expôs a seguinte motivação [16]

“A formação da convicção positiva do tribunal fundou-se, principalmente e quando conjugado com as regras da experiência comum -, na análise critica da prova junta pela Requerida - documental (certidão de matrícula, elementos contabilísticos da empresa, certidão de dívida à Segurança Social e/ou ao Fisco, certificado PME), declarativa (declarações do legal representante) e testemunhal (composta por três pessoas que se identificaram como conhecedoras da empresa e sua atividade e/ou do local físico onde a mesma labora) e, bem assim, na sua conjugação desta prova com a prova já então produzida nos autos e oferecida pelos Requerentes.
Assim e relativamente aos factos articulados em sede de oposição e concretizado em 1. o mesmo ficou a dever-se ao que se extrai da certidão de matrícula junta aos autos, que não mereceu nem merece reparo quanto à sua genuinidade, autoria e conteúdo.
Os factos indicados em 2., 3. e 4. foram assim respondidos atentas as declarações do seu legal representante, J. N., e do depoimento de D. P., contabilista de formação e profissão que faz a contabilidade da empresa há já vários anos, meios de prova que se revelaram espontâneos, coerentes e congruentes, merecedores, portanto, de credibilidade e que corroboraram a verificação da factualidade referida.
Estes mesmos meios de prova, em especial o depoimento esclarecido, detalhado e objetivo de D. P., bem como o depoimento de R. T., topógrafo de profissão e que presta serviços a clientes da Requerida (revelando, por esta via, conhecer a dinâmica da Requerida e sua carteira de clientes), e, bem assim, os elementos de contabilidade juntos aos autos (IES, Balancete, certidões de dívida, …), pela sua espontaneidade e objetividade, coerência e congruência, não contrariados, aliás, por qualquer meio de prova anteriormente produzido e devidamente contraditados em audiência pela parte contraria, serviram para convencer o tribunal da verificação da realidade vertida em 5. a 9., razão pela qual o tribunal deu resposta positiva à mesma.

Relativamente à resposta positiva à factualidade inserta de 10. a 13., a mesma estribou-se quer nas declarações do legal representante da Requerida, prestadas de forma muito espontânea e verosímil e que negou qualquer expressão ou ato no sentido de pretender alienar o recheio do estabelecimento da Requerida, como no depoimento das três testemunhas inquiridas em juízo, que, de forma genuína e segura, corroboraram o sentido das declarações daquele: ora porque com a empresa está bem financeiramente a ponto de não se justificar qualquer ato de alienação, ora porque nunca esteve fechada em horário normal e publicitado de expediente, ora porque nunca viram exposto o papel junto aos autos ora porque nunca tal hipótese de alienação foi conhecida ou comentada pelo local e arredores…acresce que quer a testemunha D. P. como a testemunha R. T. indicaram desconhecer o numero de telemóvel indicado no dito anúncio, identificando e de forma coincidente (e para as mesmas inesperada), outro numero ao gerente da Requerida (de notar que o gerente da Requerida afirmou que o número indicado no anúncio era do conhecimento do Requerente mas que já não é utilizado pela empresa há mais de um ano).
Estes meios de prova, conjugados com a fotografia junta aos autos do anúncio, donde se pode extrair com alguma segurança que tal aviso foi aposto do lado de fora da porta do estabelecimento da Requerida, leva-nos a suspeitar do sentido e da oportunidade da sua colocação…
Finalmente, a matéria respondida positivamente em 14. ficou assim a dever-se à valoração das declarações do legal representante da Requerida que foram igual e suficientemente espontâneas nesse sentido, revelando-se, ainda, a sua verosimilhança com as regras da normalidade quando afirmou que está em litigio com o Requerente há algum tempo a propósito de contas que têm de fazer a modos de não se falarem…, o que dificulta de facto, a nosso ver, a existência de várias interpelações extrajudiciais invocadas.“

IV. APRECIAÇÃO

Questão primeira: junção de documentos

Com as suas alegações de recurso, o apelante anexou vários documentos que compõem fls. 91 a 150 do processo físico (frente e verso).

Apesar de deficientemente identificados/numerados, parecem referir-se a correspondência trocada, a diversas peças processuais e a um Laudo da Ordem dos Advogados respeitantes à alegada prestação de serviços de advocacia à apelada e de trabalhos de arquitectura/engenharia por esta àquele.

A pretendida junção, naquela peça processual, após crítica à actuação do Tribunal recorrido e discordância com a decisão da matéria de facto, foi justificada nestes termos:

“É notório, nas transcrições efectuadas, que, pela forma como é feita a inquirição, ao depoente é sugerida uma hipótese de resposta que este, mesmo tendo inicialmente referido que “nem era gratuita” (aos 3,18m) do mesmo depoimento, acaba por aproveitar a deixa e defender a tese da gratuitidade dos serviços.
A violação do regime do depoimento referida, e bem assim dos demais princípios atrás referidos, acabou por, agravar, de forma exponencial, a os efeitos da violação do princípio do contraditório, já que, se tivesse sido concedida a oportunidade de o recorrente se defender, certamente este teria conseguido, como irá agora, demonstrar que o representante legal da requerida mente descarada e despudoradamente quer nestes autos quer nos autos que antecederam estes e que opõem as mesmas partes, como se demonstrará de seguida.
A propósito do que vem de dizer-se, e porque não foi, pelas razões alegadas, conferida a possibilidade ao recorrente de, na 1ª instância, demonstrar por documentos, que o representante legal da requerida esteve, durante todo o seu depoimento, a mentir, a enganar e a manipular o tribunal, impõe-se que o recorrente, lançando mão da possibilidade que lhe é conferida pelos arºs 425º e 651º do C.P.C., seja admitida a junção, com as presentes alegações, de vários documentos que retratam fielmente que não só é falsa a versão apresentada nos presentes autos como ainda que a requerida tem a desfaçatez de apresentar múltiplas versões sobre os mesmos factos essenciais, ou seja quanto à prestação dos serviços que estão na base do crédito do recorrente e quanto à sua não gratuitidade”.

E, ainda mais adiante, depois da transcrição de uma parcela do depoimento do legal representante da apelada, acrescentou a apelante:

“Ou seja, das declarações transcritas, resulta, de forma clara que, relativamente às notas de honorários existentes nos autos, o representante legal da requerida nega peremptoriamente que a maioria deles lhe tenham sido prestados, garantindo ao tribunal que terão sido prestados directamente a terceiros!!!!!!
Sucede porém que a mentira tem perna curta e tais mentiras já poderiam ter sido desmontadas se, como atrás se alega, tivesse sido dada oportunidade efectiva de o recorrente exercer o contraditório; Bastaria, para o efeito que recorrente juntasse os documentos que ora pretende juntar para desmontar toda a trama montada da requerida. Vejamos:
Refere o representante da requerida (ao minuto 29) que o Sr. J. H. era um cliente seu que encaminhou para o recorrente para este resolver um litígio com o empreiteiro! Falso! Esse assunto foi tratado pelo recorrente e dizia respeito a uma cobrança solicitada pela requerida contra o referido cliente, como se comprova pelo doc. ora junto e que se considera reproduzido – Doc. nº 1;
Refere ainda aquele ao minuto 34,50 que o J. R. era um cliente a quem tinha feito um projecto e que foi o empreiteiro que meteu uma execução contra o cliente!!!!!! Mais uma vez é falso e aquele bem sabe disso e mente conscientemente; Aquela execução foi instaurada pela requerida contra aquele J. R. e o mandatário da requerida naquela acção foi o aqui recorrente, como se comprova pelo doc. ora junto e que se considera reproduzido – Doc. nº 2;
Acresce ainda que, também em sede judicial, e sobre os mesmos factos, a requerida apresentou ainda outra versão, desta feita, reconhecendo que os serviços foram prestados, embora há já alguns anos, alegando o seu pagamento e invocando mesmo a prescrição presuntiva – Docs. nº 3 e 4.
É pois evidente que a requerida mente de forma despudorada, tenta manipular e mesmo aldrabar tudo e todos, até o tribunal, não se inibindo de prestar falsas declarações perante magistrado judicial! Urge pois pôr cobro a este tipo de condutas que não dignificam antes denigrem a imagem da justiça!

Dispõe o art. 425º do C.P.C., sob a epígrafe “Apresentação em momento posterior” que “Depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento”; Por seu turno, o art. 651 do C. P. Civil, sob a epígrafe “Junção de documentos e de pareceres”, estabelece que: “1 — As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excepcionais a que se refere o artigo 425.º ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1.ª instância;
É pois notório, face às razões aduzidas, que é legítima e se impõe a admissão dos documentos ora juntos pois que, só dessa forma será possível repor a verdade e fazer justiça, o que se requer.”

Vejamos.

Dispõe-se, no nº 1, do artº 423º, do CPC, que os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da acção ou da defesa, devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os respectivos factos.

Assim como, no nº 5, do artº 588º, que é com os articulados eventualmente supervenientes que todas as provas são oferecidas.

O nº 2, do artº 423º, estabelece que, se não forem juntos com o articulado respectivo, os documentos podem, ainda, ser apresentados até 20 dias antes da data da realização da audiência final, com ou sem sanção (multa), conforme se prove, ou não, a impossibilidade de o terem sido com aquele.

Depois daquele limite temporal, só são admitidos os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até esse momento, bem como aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária por virtude de ocorrência posterior – artº 423º, nº 3.

Além disso, depois do encerramento da discussão, só são admitidos – mas no caso de recurso – os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até aí – artº 425º.

Por seu turno, o artº 651º, regulador da apresentação das alegações nesta fase de recurso, estabelece, no nº 1, que, com elas, as partes apenas podem juntar documentos nas situações excepcionais a que se refere o artº 425º – documentos cuja junção não tenha sido possível até ao encerramento da discussão em 1ª instância – e no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento ali proferido.

No que especificamente diz respeito às providências cautelares, o artº 293º, nº 1, aplicável ex vi do artº 365º, nº 3, estabelece que é com o requerimento inicial e com o articulado de oposição que as partes devem oferecer o rol de testemunhas e requerer os outros meios de prova (prova esta sempre “sumária” bastando-se com o nível da “probabilidade séria” quer relativamente ao fumus boni iuris quer ao periculum in mora).

Ora, na situação aqui em apreço, com contornos cuja peculiaridade haverá de reconhecer-se em face do relatório inicial deste acórdão, estando em causa a oposição deduzida pela requerida à providência cautelar de arresto na qual não só alegou factos de sentido contrário aos alegados pelo requerente e produziu novos meios de prova até então não considerados em ordem a afastar os fundamentos daquela mas também lhe imputou censurável conduta processual, por contrária à boa-fé e pediu, por isso, a respectiva condenação.

Com efeito – recorde-se –, na oposição, a requerida alegou que o requerente falseou dolosamente os factos por ele alegados, ocultou intencionalmente outros, nomeadamente o seu débito e a apreciação já antes dele feita quanto à pretendida compensação, sabendo que não tem razão e que mente para prejudicar a requerida e para, habilidosamente, se furtar ao pagamento da quantia em que foi condenado por sentença.

Apesar disso, logo se avançou para a marcação da audiência final, sem dar a conhecer à parte contrária tal oposição e sem lhe conceder, antes da diligência, a oportunidade de se defender.

A notificação e entrega à respectiva Mandatária do articulado que consubstancia a referida oposição e pedido e dos documentos com ela juntos só foram feitas no acto da referida audiência e com a concessão de um (curto) período de tempo no seu início para exame dos mesmos e respectiva pronúncia, eventualmente contraditória.

Conquanto, pois, os presentes documentos sejam juntos apenas com as alegações de recurso a pretexto da pretendida alteração da decisão de vários pontos da matéria de facto e, sobretudo, a propósito da visada análise crítica do depoimento prestado pelo legal representante da requerida e impugnação, o certo é que não só com eles o recorrente visa mostrar que aquele não tem credibilidade nem merece o valor probatório que lhe foi atribuído e assim impugnar a apreciação dele feita pelo tribunal de 1ª instância, mas também que, ao depor, “mente descarada e despudoradamente”, esteve durante todo o depoimento “a enganar e a manipular o tribunal”, tendo tido “a desfaçatez de apresentar múltiplas versões sobre os mesmos factos essenciais” e, que por isso, o seu comportamento poderá ser censurado [17], ao contrário do seu.

Deste modo, o requerente e ora apelante não só “ataca”, apontando para litigância de má-fé da própria requerida, como “defende”, procurando sustentar e documentar a sua boa-fé posta – aliás, em termos graves, se provada a matéria alegada – em causa. Isto além de reiterar o mérito e bondade da sua versão e pretensão e refutar a da parte contrária.

E mais.

Alega também o requerente/apelante que, além de ter sido, com o dito procedimento relativo à notificação tardia da oposição e documentos e escassez de tempo necessário para se pronunciar sobre os mesmos, violado o princípio do contraditório, “A violação do regime do depoimento referida, e bem assim dos demais princípios atrás referidos, acabou por, agravar, de forma exponencial, os efeitos da violação do princípio do contraditório, já que, se tivesse sido concedida a oportunidade de o recorrente se defender, certamente este teria conseguido, como irá agora, demonstrar que o representante legal da requerida mente descarada e despudoradamente quer nestes autos quer nos autos que antecederam estes e que opõem as mesmas partes”.

Do mesmo passo, acrescentou que “…a mentira tem perna curta e tais mentiras já poderiam ter sido desmontadas se, como atrás se alega, tivesse sido dada oportunidade efectiva de o recorrente exercer o contraditório; Bastaria, para o efeito que recorrente juntasse os documentos que ora pretende juntar para desmontar toda a trama montada da requerida.”

Daí que acabe, então, por invocar o disposto no artº 425º - admissão de documentos cuja apresentação não tenha sido possível até ao encerramento da audiência de discussão – e 651º - situações excepcionais a que aquela norma se refere e junção tornada necessária em virtude do julgamento proferido em 1ª instância.

Se a junção se referisse a documentos obtidos depois, apesar de existentes, e apenas porque tal não foi diligenciado por ela oportunamente ou se confinasse somente a ilustrar a impugnação da decisão da matéria de facto proferida após julgamento efectuado mediante a concessão de todas as garantias de efectivo contraditório e possibilidade de pleno exercício deste e, portanto, credibilizar ou descredibilizar outros meios de prova nela ou antes dela já produzidos nos autos, seria caso de manifesta inadmissibilidade já que tal extravasa o âmbito normativo das citadas disposições.

Como a tal respeito refere o STJ, “Quando o acesso ao documento está ao alcance da parte, a instrução do processo com a sua apresentação é um ónus, devendo desconsiderar-se a inacessibilidade que seja imputável à falta de diligência da parte, sob pena de se desvirtuar a relação entre a regra e a excepção ditada, nesta matéria, pelo legislador.”[18].

Se a invocada necessidade de junção de tais provas visasse apenas colmatar o fracasso da prova ou da contraprova da parte em 1ª instância, igualmente não poderia a junção ser atendida.

Como também diz o Supremo, tal requisito só se verifica se “pela fundamentação da sentença, ou pelo objeto da condenação, se tornou necessário provar factos com cuja relevância a parte não poderia razoavelmente contar antes de a decisão ter sido proferida.” [19]

Na verdade, “No que toca à necessidade do documento, os casos admissíveis estão relacionados com a novidade ou imprevisibilidade da decisão, não podendo aceitar-se a junção de documentos quando ela se revele pertinente ab initio, por tais documentos se relacionarem de forma directa e ostensiva com a questão ou as questões suscitadas nos autos desde o primeiro momento.” [20]

Não é esse o caso, porém, ao que julgamos.

Como se viu, a audiência estava aprazada para as 9,50h. Conforme acta e gravação reproduzidas no relatório deste, só no seu início se procedeu à notificação da oposição e documentos e só, após requerimento da Mandatária do requerente, se concedeu um primeiro prazo - fixado em “30 minutos” pelo Tribunal a quo – e depois um segundo, “até às 12 horas” [21].

Em face disto, considerando sobretudo a escassez de tempo verificada entre a notificação e o encerramento da audiência [22] e, mais ainda, dos prazos concedidos, para a Mandatária do requerente analisar o articulado e documentos com ele juntos e preparar a sua contradição ou a contraprova, mediante contacto com o seu constituinte e para buscar e reunir os documentos que para tal considera relevantes e ora em causa dos quais não dispunha certamente no acto nem cuja necessidade era, normalmente, de perspectivar, concede-se que a mesma não só se viu impossibilitada de deles se munir e de os oferecer até ao encerramento da audiência como também que a sua necessidade se robusteceu com o decurso desta e em função do resultado do julgamento proferido no qual é patente o relevo que, predominantemente, foi dado à prova apresentada pela requerida com resultado totalmente oposto ao da decisão inicial que julgou verificados os pressupostos legais do arresto e o decretou, o que, como alegado, tem de se admitir, em espírito de boa fé e de lealdade, que poderia não ter sido assim caso a possibilidade de confronto efectivo da sua tese e dos meios apresentados mediante a pretendida junção dos documentos tivessem sido efectivamente garantidas naquela oportunidade.[23]

Pelo exposto e tendo ainda em conta que a apelada não se opôs à requerida junção, admite-se a mesma.

Questão segunda: violação de diversas regras e princípios, entre estes o do contraditório, e nulidades da sentença

Agrupam-se aqui, dada a forma interligada como foram alegadas e a sua efectiva conexão, as questões acima elencadas nas alíneas b) a f).

O direito ao contraditório, enquanto princípio geral emanado do direito ao processo equitativo consagrado no nº 4, do artº 20º, da CRP, está inscrito no artº 3º, CPC, embora dele se encontrem diversas outras normas concretizadoras em diversas disposições ao longo desse compêndio.

Deve o juiz observá-lo e fazê-lo cumprir, ao longo de todo o processo, não lhe sendo lícito decidir questões de facto ou de direito sem que as partes tenham tido possibilidade de sobre elas se pronunciarem – diz a norma.

Ao lado do princípio da igualdade previsto no artº 4º, o princípio traduz-se num direito de influenciar, activa e positivamente, em cooperação leal e de boa-fé, a decisão, no pressuposto de que, sendo esta o culminar da discussão dialéctica, ela é melhor e mais justa. Manifesta-se ao nível dos factos, das provas (especialmente da sua produção) e da aplicação do direito. Não basta que seja formalmente garantido. É necessário que seja efectivamente assegurado em qualquer fase. Mesmo, no caso dos procedimentos cautelares, na fase da oposição deduzida pelo requerido depois de decretada a providência sem sua audição prévia, o que implica notificação do articulado, bem como dos respectivos documentos e adequada ponderação do prazo para pronúncia sobre os mesmos, maxime no caso de tal ser requerido.

Como se refere, em síntese, no Acórdão desta Relação de Guimarães, de 19-04-2018 [24]:

“1- Existe, presentemente, uma conceção ampla do princípio do contraditório, a qual teve origem em garantia constitucional da República Federal Alemã, tendo a doutrina e jurisprudência começando a ligar ao princípio do contraditório ideias de participação efetiva das partes no desenvolvimento do litígio e de influência na decisão, passando o processo visto como um sistema, dinâmico, de comunicações entre as partes e o Tribunal;
2- Cabe ao juiz respeitar e fazer observar o princípio do contraditório ao longo de todo o processo, não lhe sendo lícito conhecer de questões sem dar a oportunidade às partes de, previamente, sobre elas se pronunciarem;
3- Com o aditamento do nº 3, do art. 3º, do CPC, e a proibição de decisões-surpresa, pretendeu-se uma maior eficácia do sistema, colocando, com maior ênfase e utilidade prática, a contraditoriedade ao serviço da boa administração da justiça, reforçando-se, assim, a colaboração e o contributo das partes com vista à melhor satisfação dos seus próprios interesses e à justa composição dos litígios;
4- Contudo, o dever de audição prévia só existe quando estiverem em causa factos ou questões de direito suscetíveis de virem a integrar a base de decisão;
5- A inobservância do contraditório constitui uma omissão grave, representando uma nulidade processual sempre que tal omissão seja suscetível de influir no exame ou na decisão da causa, sendo nula a decisão (surpresa) quando à parte não foi dada possibilidade de se pronunciar sobre os factos e respetivo enquadramento jurídico.”

Assim:

“O princípio do contraditório, visto como direito de influenciar a decisão, é uma garantia de participação efetiva das partes no desenrolar de todo o litígio, mediante a possibilidade de as mesmas influenciarem em todos as dimensões - factos, provas e direito – a decisão, garantindo-se a ambas condições de igualdade.
O objetivo principal do princípio do contraditório deixou de ser a defesa, no sentido negativo de oposição ou de resistência à atuação da parte contrária, para passar a ser a influência positiva, construtiva e ativa na decisão, ou seja, passou a ser visto como o direito de intervir - com argumentos quer factuais, incluindo provas dos factos, quer os jurídicos - para provocar uma decisão favorável.
Deste modo, o princípio do contraditório passou a ter um sentido amplo que abarca quer o direito ao conhecimento e pronuncia sobre todos os elementos suscetíveis de influenciar a decisão carreados para o processo pela parte contrária (contraditório clássico ou horizontal) quer o direito de ambas as partes intervirem para influenciarem a decisão da causa, assim se evitando decisões surpresa (contraditório vertical).” [25]

É entendimento pacífico na jurisprudência constitucional que nenhuma prova deve ser aceite na audiência sem que o tribunal assegure uma ampla e efectiva possibilidade do sujeito a quem ela for oposta de se lhe contrapor, isto é, de responder, discutir, contestar e sustentar a valorização que entender merecida.

A oposição ao procedimento cautelar, mesmo quando ele já tenha sido decretado sem audição do requerido, é uma nova fase processual em que o princípio do contraditório tem de ser garantido. Pressupondo ela a alegação de novos factos e apresentação de novos meios de prova, ele pressupõe implica a notificação do requerente para, primeiro, deles se inteirar com conhecimento pleno, e, depois, em igualdade e não obstante aquilo que inicialmente tenha alegado e as provas que tenha produzido, discutir e contraprovar (pelo menos ao longo da audiência final), a nova factualidade com vista a (pelo menos) pô-la em dúvida ou a afastá-la e a sustentar a preservação ou mesmo a consolidação da já antes sumariamente julgada provada em contrário e a favor da providência requerida.

Como resulta dos artºs 372º, nºs 1, alínea b), e 3, e 367º e 368º, e no fundo é regra geral do processo declarativo, não está previsto um terceiro articulado.

Todavia, tal como nesta, mesmo às excepções deduzidas pode a parte contrária responder na audiência prévia ou, não a havendo, no início da audiência final – artºs 3º, nº 4. Aliás, nas hipóteses do artº 597º, o juiz deve assegurar o exercício do contraditório quanto às excepções não debatidas “consoante a necessidade e a adequação”, sendo que o próprio artº 547º prevê que “o juiz deve adoptar a tramitação processual adequada às especificidades da causa e adaptar o conteúdo e a forma dos actos processuais ao fim que visam atingir, assegurando um processo equitativo”.

No caso, além de terem sido alegados factos novos na oposiçãonovos na medida em que diametralmente opostos aos do requerimento inicial e julgados sumariamente provados em fundamento do arresto decretado, foram juntos 21 documentos, de volume muito significativo (a apelante computa-os em mais de 300 páginas).

Relativamente a estes, prevê expressamente o artº 427º que, quando oferecidos com o último articulado, a sua apresentação é notificada à parte contrária, resultando dos artºs 444º e 446º, em consonância aliás com a regra geral do artº 149º - que não estabelecem excepções para os processos urgentes – que é de 10 dias o prazo para o exercício de qualquer poder processual, como a impugnação destes.

No que concerne, ainda, à litigância de má-fé, embora nada de específico se preveja nas disposições atinentes – artºs 542º e sgs –, é óbvio que a parte dispõe do prazo de 10 dias para sobre o pedido contra si deduzido se pronunciar contraditoriamente e defender.

Conquanto a demonstração dos factos alegados na oposição, tal como os da petição, mais não exija que uma prova indiciária, sumária, perfunctória, temos por claro que, devendo a já produzida e consequentemente os factos assim julgados como fundamentadores do arresto, ser conjugados com os da oposição e consequentemente as provas desta com as daqueles, tem de reconhecer-se ao requerente o direito a contraprovar esses novos factos e a contraditar as novas provas como forma de questionar a eficácia – no formação do novo juízo a emitir pelo tribunal – da oposição deduzida e de se bater pela manutenção do sentido da primeira decisão, quiçá em termos e por meios que para esta não previu como necessários mas que aquela tornou exigíveis.

Sobre isto, explanou-se no Acórdão do STJ, de 31-10-2017 [26]:

“Estamos em sede de providência cautelar de arresto, procedimento este cuja principal especialidade consiste em que o seu eventual decretamento é sempre feito sem a audição da parte contrária, como decorre do normativo inserto no artigo 393º, nº1 do CPCivil.
A primeira asserção a retirar deste ínsito, tendo em atenção o iter processual assente, é a de que, tendo o Tribunal de primeira instância, numa primeira fase , indeferido o arresto, apenas o Requerente, aqui Recorrido, poderia ter interposto recurso de tal decisão, tendo o processo continuado até à subsequente decisão da Relação, à revelia da Requerida, a qual só tomou conhecimento da providência decretada, após a sua efectivação de harmonia com o disposto no artigo366º, nº6 do CPCivil.
Nessa altura, ofereciam-se à Requerida duas opções: ou recorria, nos termos gerais do despacho de decretamento do arresto; ou deduzia oposição, alegando factos que no seu entendimento afastariam os fundamentos da providência e/ou determinariam a sua redução, cfr artigo 372º, nº1, alíneas a) e b) do CPCivil, tendo a Requerida/Recorrente, enveredado pela dedução de oposição, como cabia na especie.
Processada que foi a oposição, veio a ser produzida decisão, a julga-la improcedente e, dessa decisão cabe impugnação recursiva, como inequivocamente deflui do nº3 do artigo 372º do CPCivil ao dispor «No caso a que se refere a alínea b) do nº1, o juiz decide da manutenção ou revogação da providência anteriormente decretada, cabendo recurso desta decisão[,]qualquer das decisões constitui complemento e parte integrante da inicialmente proferida».
A Lei ao estabelecer que por via da oposição que possa ocorrer, o Tribunal se venha a (re)pronunciar sobre a providência anteriormente decretada, está a permitir que possa existir um novo juízo, sobre aquela primeira decisão, constituindo estoutra um seu complemento e parte integrante, peça autónoma, contudo, para efeitos de ulterior interposição de recurso, o qual poderá ser suscitado por qualquer das partes, cfr Lebre de Freitas, Montalvão Machado, Rui Pinto, Código De Processo Civil Anotado, vol 2º, 40/46.
Quer isto dizer que esta decisão última, de manutenção, redução ou revogação do arresto, tem como substracto para além da apreciação dos requisitos justificativos daquela providência, a apreciação dos factos e das provas que justifiquem, ou possam afastar e/ou reduzir a mesma, mas como estamos em sede de oposição, é a decisão desta que será objecto de recurso e, não como enteu o segundo grau, a primeiramente tomada, embora se possa fazer apelo à fundamentação da mesma, como é óbvio, já que o próprio procedimento de oposição visa a se o seu contraditório subsequente, cfr Ac STJ de 13 de Março de 2001 (Relator Garcia Marques), in SASTJ.
Assim sendo, podemos conluir que, tendo a oposição ao arresto como finalidade a alegação de factos e/ou produzir meios de prova que não tenham sido levados em conta pelo Tribunal na decisão que o decretou, como impõe a alínea b) do nº1 do artigo 372º do CPCivil, embora a fixação da matéria de facto anteriormente consignada não seja posta em causa, a mesma deverá ser conjugada com os novos factos alegados, daí se extraindo a manutenção, redução ou revogação do arresto anteriormente decretado.”.

Assim, como se referia já no Acórdão da Relação de Évora, de 19-12-2006 [27]:

“I - Apesar de estar vedada a resposta em articulado, o requerente do procedimento cautelar pode responder à oposição do requerido na audiência que se segue à dedução da oposição, com a faculdade de discutir matéria de excepção que, eventualmente, tenha sido levantada na oposição.
II – Nos procedimentos cautelares toda a prova produzida é meramente indiciária, seja a produzida pelo requerente, seja a produzida pelo requerido, em sede de oposição, pelo que não se exige a prova segura do facto, como sucede no processo declarativo, bastando o juízo de mera probabilidade.

Por isso, os indícios trazidos pelo requerente do procedimento cautelar podem ser afastados por indícios de sinal contrário carreados pelo requerido. E é a ponderação do conjunto da prova indiciária que permite ao julgador manter a providência decretada, afastar os seus fundamentos ou determinar a sua redução, constituindo esta nova decisão complemento e parte integrante da inicialmente proferida, como vem estabelecido no artigo 388°, n° 2 do CPC”.

Ora, o apelante, nas suas alegações de recurso, depois de historiar a marcha dos autos, manifestou o seu desagrado com a dinâmica da audiência [28] e inconformismo com a subsequente decisão proferida, ilustrando os pretensos vícios e erros de julgamento com ásperas críticas repetidas à postura da Srª Juíza, assumida durante a mesma.

Apenas cabe à Relação e no âmbito do recurso pronunciar-se sobre aqueles. Jamais ao comportamento de qualquer dos sujeitos processuais. [29]

Queixa-se o recorrente de não lhe ter sido notificado aquando da convocatória para a audiência, a oposição ao arresto e documentos nem de lhe ter sido concedida oportunidade para, de forma efectiva, exercer o contraditório (artº 3º, nº 3) quanto aos novos factos e meios de prova juntos com tal articulado – o que teria dado azo à prevalência apenas da tese unilateral e falsa da requerida e inquinado a decisão neles baseada – e, bem assim, quanto à litigância de má-fé, defendendo implicitamente que a apreciação desta deveria ter sido feita simultaneamente com a daquela, nos termos do artº 608º, nº 2.

Queixa-se, além disso, porque teriam sido violados os princípios da audiência contraditória na admissão e produção de provas (artº 415º, nºs 1 e 2), de ter sido ultrapassado o poder/dever de gestão processual (artº 6º), e, ainda, do princípio da igualdade de partes (artº 4º), da cooperação (artº 7º, nºs 1 e 4) e 9º (dever de recíproca correcção).

Queixa-se, finalmente, de não ter sido respeitado, na instância levada a cabo pela Mª Juíza, o regime do depoimento das testemunhas e do legal representante da requerida, constante do artº 516º, nº 3, por aquele ter sido orientada com perguntas/afirmações sugestivas.

Tudo isso, teria confluído essencialmente na violação do contraditório, influenciado o exame e decisão da causa, e, assim, gerado a consequente nulidade processual, bem como da sentença, esta, designadamente, nos termos da alínea d), do nº 1, do artº 615º.

Ora, devemos, antes de mais, começar por discernir se, como foi dito em despacho e se assume na sentença, efectivamente o Tribunal recorrido “não precisa de apreciar a questão da litigância de má-fé no âmbito da apreciação da oposição”.

Disso depende, no caso, o âmbito do direito ao contraditório e o grau de exigibilidade, maior ou menor, do respectivo exercício.

É que, para justificar a realização célere e imediata da audiência final e a concessão de apenas dois curtos períodos (primeiro um de 30 minutos e, depois, outro “até ao meio dia”, que o recorrente computa em 20 minutos [30]) e, assim, aligeirar o exercício do contraditório, o tribunal a quo diferenciou o respeitante ao articulado de oposição e documentos (parte da matéria de facto concernente aos fundamentos do arresto), do imposto pela alegada litigância de má fé e pedido de condenação a esse título.

Nesta senda, segundo consta da sentença (que não da acta da audiência, nem da gravação respectiva, não se percebendo bem se tal foi efectivamente decidido no seu decurso ou apenas naquela), foi relegada “para ulterior momento a análise da questão quanto à litigância de má-fé, dado à parte visada ainda ser possível responder e/ou apresentar meios de prova para o efeito”.

Contudo, fica-se sem saber se algum prazo pretendeu fixar-se e foi fixado para exercício do contraditório ou se simplesmente se entendeu aberto o prazo geral de 10 dias mas, nesta hipótese, a partir de que momento.

Ora, a litigância de má-fé, conformando embora, enquanto tema a decidir, questão incidental autónoma, não pode ser espartilhada do objecto do processo nem deixar de ser apreciada e julgada com ele “logo” na própria sentença. Apenas na hipótese de, então e aí, não dispor ainda o tribunal de elementos para fixar a importância da indemnização é que esta pode ser fixada “depois”. A apreciação e a avaliação da conduta da parte e o consequente juízo de subsunção da factualidade apurada aos pressupostos do artº 542º, seja de censura seja de absolvição da mesma, como litigante de má-fé, devem ser feitas na mesma peça e conjuntamente com o do litígio.

Ressalvamos, apenas, o caso de o processo terminar por desistência ou por transacção, admitindo que ele pode prosseguir apenas, depois de homologada a mesma, apenas para julgamento da questão da má-fé da litigância.

É o que resulta claramente da lei – artº 543º, CPC.

Bem assim, da jurisprudência.

Como se diz no Acórdão desta Relação de Guimarães, de 02-06-2016 [31]:

“1. Assumindo a conduta processual da parte, na pendência da causa e até à prolação da sentença, contornos que a permitam qualificar como litigância de má-fé, tem o juiz que o afirmar e proferir a consequente decisão de condenação da parte, enquanto litigante de má-fé, na sentença, ali fixando, ainda, a multa que julgue mais adequada, fixando-a sempre em quantia certa.
2. Não é consentido ao juiz, salvo casos excepcionais (de incidentes ou factos supervenientes à sentença), relegar tal decisão quanto à litigância de má-fé para momento posterior à sentença, por a tanto se oporem os limites do seu poder jurisdicional, que cessa com a prolação da mesma.
3. Apenas quanto à indemnização a arbitrar a favor da parte contrária (e se esta se mostrar pedida) é consentido ao juiz relegar a sua quantificação para momento posterior à sentença e se os autos não contiverem elementos que o habilitem a fazer, desde logo, na sentença, essa quantificação.
4. Todavia, essa quantificação só é viável se, previamente e na sentença, o juiz tiver proferido decisão no sentido de declarar e condenar a parte como litigante de má-fé, ali fixando a multa processual devida em quantia certa.
5. Se tal não tiver sucedido, o poder jurisdicional do tribunal quanto a essa matéria mostra-se esgotado, não sendo lícito reabrir a instância para tal fim.
6. O despacho proferido, após o esgotamento do poder jurisdicional do juiz do processo, à luz do disposto no art. 615º, n.º 1 al. d)- do CPC. e de acordo com a sua interpretação extensiva, é nulo por excesso de pronúncia.”. [32].

Tem de ser assim porque, como o caso é disso exemplo paradigmático, os factos relativos ao litígio em si dificilmente são espartilháveis e susceptíveis de avaliação isolada dos da conduta das partes litigantes, sem risco de lesão de princípios básicos, como o da economia e da celeridade, ou mesmo da regra do caso julgado. A apreciação posterior da conduta para esse efeito e o juízo conclusivo sobre ela facilmente podem resvalar e colidir com os expendidos já sobre a decisão do mérito da causa se porventura esta for proferida antes e se alhear daquela.

Se, no caso aqui em apreço, os fundamentos da alegada litigância de má-fé imputada ao requerente representam o culminar dos invocados também em fundamento da oposição deduzida contra a sua pretensão de ver decretado (e mantido) o arresto, no sentido de que são alegadamente falsos, mentirosos, mero estratagema consciente para obter a providência sabendo-a sem motivo verdadeiro, se, portanto, radicam na imputação de que o requerente falseou os factos relativos ao alegado crédito e ao alegado justo receio enquanto requisitos do arresto, não se nos afigura legalmente correcto nem justamente adequado, seguro e coerente, que a apreciação da realidade da conduta processual daquele e a consequente decisão sobre se ela deve ser sancionada sejam levadas a cabo separadamente da apreciação da plausibilidade dos factos integradores dos pressupostos da providência ou seu indeferimento. É que, além de tudo o mais, o juízo a empreender e a convicção a formar sobre uma questão não pode deixar de ter reflexos nos implicados pela outra.

A litigância de má-fé, quando alegada pela parte ou quando suscitada oficiosamente pelo próprio tribunal, não é mais nem menos, portanto, que uma daquelas questões que, por força do artº 608º, nº 2, CPC, devem ser resolvidas pelo juiz na sentença, nada o legitimando para a separar e relegar para momento posterior, ainda que a pretexto de se estar, como no caso, em processo de natureza urgente, uma vez que esta não permite alterar os timings processuais (ainda que a coberto do princípio de gestão), menos ainda para aligeirar, senão atropelar, o exercício pleno e efectivo de direitos, como o do contraditório.

No caso, constata-se que os autos prosseguiram e subiram agora em recurso sem que, afinal, quanto a tal matéria, haja neles qualquer desenvolvimento e muito menos decisão.

Isto dito, importa, desde já e antes de voltarmos ao contraditório, afirmar que, relativamente à alegada nulidade da sentença por falta de fundamentação de facto e de direito – alínea b), do nº 1, do artº 615º -, é óbvia a sua improcedência.

Tal fundamentação consta nela – vejam-se os pontos II.A e II.B.

Dessa forma mostra-se cumprido o disposto no nº 4, do artº 607º.

A questão a este respeito invocada de não ter sido feita uma única referência à prova produzida pelo requerente e de não ter sido ponderada e compatibilizada, mesmo que tal fosse verdade – e não é – não integra aquele vício.

Tal ponderação – não importa para o caso, se correcta ou incorrecta – está visivelmente referida na motivação em três passos: o primeiro quando se diz, após menção da prova produzida na sequência da oposição, que ela foi analisada “na sua conjugação desta prova com a prova já então produzida nos autos e oferecida pelos requerentes”; o segundo, quando se refere que os novos meios de prova “não contrariados, aliás, por qualquer meio de prova anteriormente produzido”; e o terceiro a propósito da questão da fotografia do anúncio que havia sido junto com o requerimento inicial e foi discutido na audiência final, mencionada expressamente na sentença como um, de entre os demais meios de prova, “conjugados”.

Essa falta de rigor do apelante repercute-se, ainda, na esgrimida falta de compatibilização da matéria de facto. Esta, com efeito, é preconizada no nº 4, do artº 607º.

No entanto, na peculiar situação da oposição ao arresto, em que necessariamente há duas decisões e a segunda – precisamente por incidir sobre factos contrários e visar impugnar e afastar os da primeira –, pode divergir destes, tal compatibilização exigível refere-se apenas ao elenco dos factos vertidos na segunda decisão.

Quando muito, os da primeira, ou melhor, as provas e juízo sobre elas expendido ainda sem o contraditório do requerido e sem se dispor dos meios por ele oferecidos, deverão ser balanceados em ordem a apurar o juízo final.

Isso, porém é problema da motivação da decisão de facto, de julgar os factos como provados ou não provados. Não de compatibilização entre a matéria de facto, com o sentido de coerência e sequência lógica pretendido na aludida norma.

Ainda assim, se, pelas razões expostas, a nulidade da sentença com tal fundamento, não procede, já o mesmo entendemos que não acontece com a decorrente da violação do princípio do contraditório e não conhecimento da litigância de má-fé, em vista do excesso/omissão de pronúncia a que se refere a alínea d), do nº 1, do artº 615º, CPC.

Deve assinalar-se que, analisado tudo quanto foi requerido e despachado no decurso da audiência, em particular no seu início, fruto do ambiente notoriamente acelerado em que ela decorreu, não se percebe bem se aí e então realmente foi, pelo requerente e pelo Tribunal, formalmente arguida e decidida a nulidade por violação do direito ao contraditório.

A expressão dele, a dado passo, de que invoca “a nulidade da decisão que venha a ser decidida, que venha a ser proferida, nulidade esta prevista no artº 195º”, a mera referência en passant, mais em tom de comentário do que de assertiva apreciação/decisão, no meio de longo despacho e à mistura com outras afirmações, de que “não se julga verificado nulidade alguma quanto à preterição do contraditório” e a expressão da Exmª Mandatária do requerente, ao ser-lhe dada a palavra para alegações finais, de que “reitero todo o conteúdo dos meus requerimentos iniciais e, portanto, que considero que os presentes autos estão feridos de nulidade”, induzem que tal não se verificou efectivamente.

Porém, mesmo a considerar-se ter havido decisão, quiçá implícita, e consequentemente ter sido indeferida a reclamada nulidade, sempre tem se entender o presente recurso como visando também a impugnação da mesma.

Posto isto, recorde-se que, como resulta do relato inicial, tendo sido decretado o arresto, a sociedade requerida deduziu-lhe oposição. Simultaneamente, nos termos veementes já referidos, imputou ao requerente litigância de má-fé, dizendo que ele alegou factos conscientemente falsos apenas com o propósito de obter a providência. O articulado alonga-se por 30 páginas, é composto por 78 artigos e com ele foram juntos 21 documentos, cuja extensão não conseguimos quantificar no Citius, sendo que não se encontram todos impressos no processo físico, mas o requerente calcula em 340 páginas.

Marcada a audiência final para 11 de Dezembro, pelas 14,30h, dela foi notificado o requerente no dia 02, sem que, contudo e ao contrário do que impunha a circunstância de ter sido alegada a má-fé, de terem sido juntos documentos e de, em todo o caso, sempre dever ser-lhe dado conhecimento do articulado para, no mínimo, poder preparar a sua participação no acto, ter sido notificado da peça, seus anexos e sem envio da cópia.

Tendo, entretanto, sido dada sem efeito a marcação e os autos sido remetidos para apensação à acção principal, ainda no mesmo dia, pela Mª Juíza titular desta, foi mantida a mesma data que acabara de ser dada sem efeito e antecipada a hora para as 9,50.

Apesar de avisados telefonicamente, a notificação da nova data também não se fez acompanhar do articulado nem dos documentos.

No dia da audiência final, sem que se saiba o que se passou nos seus momentos preliminares uma vez que não existe prova do que o requerente a tal propósito refere de negativo nas alegações, este, após a sua abertura, referiu que nem sequer teve tempo de ler o articulado e de preparar a posição a tomar sobre ele, os documentos e a litigância de má-fé, defendeu que a audiência não deveria realizar-se, invocando a preterição do princípio do contraditório e aludindo à nulidade prevista no artº 195º.

A partir daí, foi-lhe concedido um primeiro período de 30 minutos, depois um outro “até ao meio dia”, que o apelante computa ter sido de 20 minutos.

O tom, os termos e consequentemente o clima em que tais requerimentos e despachos foram verbalizados percebem-se do relato inicial e, ainda melhor, ouvindo a gravação.

Sendo certo que, só no início do acto, consta ter sido notificado do articulado de oposição, com pedido de condenação como litigante de má-fé, e dos 21 documentos juntos – embora estranhamente, conforme resulta na nota 13 supra, só após requerimentos e despachos e quando se aprestava o início da produção de prova, ter sido feita a entrega do duplicado do articulado – é notória, por parte do requerente, a persistência em que a audiência fosse adiada para análise, contacto com o cliente e exercício cabal do contraditório, e, por parte da Mª Juíza, a resolução de avançar e de a realizar de imediato.

Na sua motivação, considerou a natureza urgente do processo, referiu que cuidou de explicar e indicar os três concretos pontos a que, em seu entender, se resumia o articulado, a opinar que mal seria se a Srª Advogada “não fosse capaz de ler e de entender”, no período de tempo concedido e julgado suficiente, o seu conteúdo, tanto mais que parte do alegado nele e dos documentos se referia a matéria, a seu ver, clara, simples e efectivamente conhecida de outro processo envolvente das partes.

Mais entendeu que “o Tribunal não precisa de apreciar a questão da litigância de má-fé no âmbito da apreciação da oposição”, que, aliás, aquilo que a tal propósito foi alegado se resume a meia dúzia de artigos, que, tanto o requerente como a sua Mandatária, são “dois ilustres advogados” e “com capacidade para responder”, que, de todo o modo, “o Tribunal pode dar oportunidade à parte, se assim o desejar e se entender” para exercício do contraditório e que, enfim, o tempo concedido para o mais foi suficiente.

Julgamos, porém, que, salvo o devido respeito, a natureza urgente do processo, aliás tramitado até ali com extrema celeridade, jamais justifica qualquer limitação, prejuízo ou perturbação do exercício, pleno e efectivo, do contraditório. Mais ainda quando estava em causa longo articulado, múltiplos e volumosos documentos e a imputação de factos graves a título de litigância de má-fé.

O empenho do Tribunal em, por si e segundo a sua perspectiva, seleccionar e explicar os concretos pontos tidos como mais relevantes; a sua afirmada crença na capacidade de a Mandatária do requerente ler, entender e responder de pronto – naturalmente muito variáveis de advogado para advogado, como de juiz para juiz, sobretudo nas circunstâncias propiciadas na audiência então em curso; e mesmo o argumento, de índole subjectiva, de que boa parte da matéria já era conhecida do outro litígio, não justificam tão drástico encurtamento do prazo.

Nem sempre o que parece suficiente e claro a um sujeito processual é percepcionado, compreendido e acatado de igual modo pelo outro.

Ainda que imbuída pelo espírito de eficácia e de brevidade, nas circunstâncias descritas, em face das peças processuais e daquilo que estava em causa, não se encontra justificação relevante para sobrepor tais objectivos e a visão própria da Mª Juíza aos da parte, quando o respectivo patrono afirma pretender exercer o contraditório, necessitar de tempo para exame daquelas e de contactar o seu patrocinado para o efeito.

Os poderes de gestão do processo e de direcção da audiência (artºs 6º, 150º e 602º), não excluem os de cooperação salutar e de auxílio sério à parte na remoção de obstáculos que se lhe deparem (como no caso) condicionantes do exercício dos seus direitos indeclináveis, sempre em vista da justa composição do litígio ou da justa decisão da causa (artºs 7º, nºs 1 e 4, 9º e 602º, nº 1).

Excluem, sim, qualquer tentativa, fora desse quadro definido pelas regras e aplicadas estas segundo critérios de razoabilidade e de proporcionalidade, de guiá-la, substituí-la, ou de condicionar a sua postura e estratégia processual – desde que real e efectivamente sustentada –, enfim, de, em concreto, simplificar e minimizar a sua alegada necessidade de preparar, com tempo e tranquilidade, o exercício do contraditório.

A parte, enquanto sujeito processual com estatuto próprio, não tem que se orientar, menos ainda que se subordinar, pelo entendimento do Juiz sobre o estado do litígio, nem sobre as perspectivas dele quanto ao desenvolvimento ou ao desfecho do mesmo. O Tribunal, aliás, não deve exprimi-las fora do contexto da decisão, muito menos manifestar incómodo perante qualquer estratégia processual que, com enquadramento na lei, se lhe afigure, todavia, desnecessária.

De resto, a preconizada separação da questão da litigância de má-fé do objecto do processo, como se viu já, não nos parece justificável nem legalmente possível, quer porque ela deve ser apreciada na sentença quer porque os factos à mesma respeitantes não são cindíveis dos do objecto do processo.

Como, afinal, se verifica neste caso, o almejado objectivo de economia, celeridade e simplificação acabou comprometido, pois, nesta altura, ainda nada foi decidido a tal propósito, com o risco de, persistindo tal orientação, se dar azo a tramitações e até a recursos paralelos.

Logo, até por aí a partição do contraditório pode redundar em prejuízo da parte e, bem vistas as coisas, sem nenhum ganho significativo para a Justiça.

Argumentou, ainda, o Tribunal recorrido que, relativamente à oposição estritamente considerada, não pode o requerente do arresto indicar novos meios de prova mas limitar-se a contraditar os apresentados no decurso da audiência.

Ora, mesmo que assim seja, a verdade é que jamais tal contradição pode ser feita de modo efectivo e eficaz, em termos plenamente satisfatórios do princípio subjacente, se a parte não tiver tido tempo bastante para analisar e ponderar, detalhada e detidamente, o articulado que lhe foi oposto e os documentos de suporte ao mesmo e de preparar a sua participação activa como entender, em função do seu interesse e estratégia processual, nos quais ninguém se pode imiscuir.

Considera-se mesmo, aliás, que a necessidade de conferência entre Mandatário e a parte (embora sejam ambos advogados), dada a manifesta falta de atempada notificação do articulado e dos documentos e a evidente escassez de tempo para seu exame, complementada com a informação de que, embora ainda tentada telefonicamente, não foi conseguida, não podem ser suplantadas pelo desígnio de imediata realização e conclusão da audiência.

Como é sabido, a Justiça raramente se alcança pelo caminho mais curto.

Compreende-se, pois, em face do exposto, ponderado o ambiente veloz e trepidante em que tudo decorreu, bem perceptível na gravação, designadamente o desperdício de tempo com a discussão sobre a necessidade de prazo para análise e contraditório e a concessão de curtos períodos compassados para o efeito, bem como a subsequente produção de prova ultimada às 13,29h, essencialmente dominada pela instância levada a cabo pela Srª Juíza ao legal representante da requerida e às suas testemunhas, compreende-se, dizíamos, que a Srª Advogada do requerente se tivesse limitado a, apenas, no fim, ao ser-lhe dada a palavra para alegações, reiterar os seus requerimentos iniciais e a considerar os autos feridos de nulidade.

Aí se perscruta um claro efeito inibidor da decisão tomada quanto ao exercício do direito ao contraditório negativamente condicionante do contributo que positivamente também da sua parte seria normalmente de esperar e devia ter sido assegurado, quiçá ao longo da produção de prova na audiência que a lei deseja ocorra em permanente e efectiva dialéctica, com vista a influenciar o resultado e, assim, mediante processo real e efectivamente equitativo, o alcance da boa e justa decisão da causa.

Como refere o sumário do Acórdão do STJ, de 09-11-2017 [33], “O art. 3.º do CPC não introduz no nosso sistema o instituto da proibição de decisões surpresa tal como foi configurado no direito alemão, mas apenas como a possibilidade de, em plena igualdade, as partes influírem em todos os elementos (factos, provas, questões de direito) que se encontrem em ligação com o objecto da causa e que apareçam como potencialmente relevantes para a decisão.”

Não existem elementos que permitam, ab initio, suspeitar, na atitude do requerente, de qualquer intuito meramente dilatório ou impertinente, pelo que o desígnio da gestão processual não comporta tão activa e vigorosa aceleração dos autos, muito menos à custa do exercício efectivo do contraditório, que se deseja permanentemente tão seguro quanto sereno e em ambiente de elevação, postando-se o Juiz como seu garante indefectível, sempre acima e além do calor do litígio que apenas nas partes se compreende em função dos respectivos interesses contrapostos.

Sem necessidade, pois, de se invocarem os princípios decorrentes da igualdade, da correcção recíproca, da cooperação e, enfim, os da audiência contraditória e da objectividade na produção dos depoimentos de partes e testemunhas, conclui-se – ponderados embora a opinião diversa da apelada e os seus argumentos – que foi violado o princípio do contraditório e, por isso, prejudicado o direito do requerente, entendimento a que não obsta o facto de, no relatório da sentença recorrida, se referir que os meios de prova “foram admitidos e produzidos em audiência, com contraditório do requerente, conforme se afere da respectiva ata” ou “devidamente contraditados em audiência pela parte contrária”, uma vez que nenhuma actividade contraditória consta na acta nem se ouve na gravação que tenha sido exercida por esta, no seguimento de tudo o atrás descrito.
*
Como consequência, o recorrente, sem ser claro e preciso, ora enquadra tal vício no regime de nulidade processual (artº 195º) ora no da nulidade de sentença (artº 615º, nº 1, alínea d), CPC), designadamente por não só ter sido preterido o contraditório quanto à oposição e documentos mas também por, quanto à litigância de má-fé, o exercício daquele ter sido considerado cindível e, assim, se ter acabado por proferir a sentença sem que quanto a esta questão ela se pronunciasse.

Ora, apesar de nos casos típicos de nulidade da decisão não constarem literalmente os vícios relativos à prática de actos processuais legalmente não admitidos ou à omissão de actos ou formalidades que a lei prescreva, uma vez que, designadamente na referida alínea, a omissão ou excesso de pronúncia são geralmente conexionados como consequência da inobservância do preceituado nos artºs 608º e 609º, CPC, tem sido entendido, na Doutrina e na Jurisprudência, que nela cabem os casos em que o acto/omissão afectados de nulidade se encontram cobertos por despacho/sentença subsequente.

Como se decidiu no Acórdão da Relação do Porto, de 27-01-2015 [34]

“I - A violação do princípio do contraditório é geradora da nulidade processual prevista no art. 195º nº 1 do Novo CPC se influir no exame ou na decisão proferida.
II - Quando o acto afectado de nulidade se encontra coberto por decisão que se lhe seguiu, tal nulidade pode ser objecto de recurso e pode ser declarada pelo Tribunal da Relação.”

No caso aí apreciado, verificou-se também não ter sido cumprido o princípio do contraditório, com influência na decisão da causa.

Aí se refere, consequentemente:

“A violação deste princípio só é geradora da nulidade processual prevista no art. 195º nº 1 do Novo CPC se influir no exame ou na decisão proferida. E, no caso, influiu.
[…]
Daqui se constata, portanto, que a omissão do contraditório, por si e porque levou à omissão de outras diligências que a ele poderiam/deveriam seguir-se, influiu, directa e necessariamente, na decisão que foi proferida e que é objecto deste recurso, constituindo nulidade processual enquadrável no nº 1 do citado art. 195º.
Aqui chegados há, no entanto, que questionar se esta nulidade podia ser suscitada por via recursória e colocada directamente a este Tribunal da Relação, ou se, em vez disso, devia ter sido primeiramente invocada perante o Tribunal onde foi cometida [1ª instância] e só da respectiva decisão poderia, depois, ser interposto recurso para esta 2ª instância.
Isto porque, como é sabido, em princípio, das nulidades cabe reclamação e não recurso [daí o postulado tradicional: dos despachos recorre-se, contra as nulidades reclama-se”] e a reclamação é, também em princípio, dirigida ao Juiz do tribunal que cometeu ou onde foi cometida a nulidade.

Apesar destas duas regras básicas, o Prof. Alberto dos Reis [in Código de Processo Civil Anotado, vol. V, 1984, reimpr., pg. 424] ensinava que “A reclamação por nulidade tem cabimento quando as partes ou os funcionários judiciais praticam ou omitem actos que a lei não admite ou prescreve; mas se a nulidade é consequência de decisão do tribunal, se é o tribunal que profere despacho ou acórdão com infracção de disposição de lei, a parte prejudicada não deve reagir mediante reclamação por nulidade, mas mediante interposição de recurso. É que, na hipótese, a nulidade está coberta por uma decisão judicial e o que importa é impugnar a decisão contrária à lei; ora as decisões impugnam-se por meio de recursos (…) e não por meio de arguição de nulidade de processo”.

Também o Prof. Manuel de Andrade [in Noções Elementares de Processo Civil, 1979, pg. 183] entendia que “se a nulidade está coberta por uma decisão judicial que ordenou, autorizou ou sancionou, expressa ou implicitamente, a prática de qualquer acto que a lei impõe, o meio próprio para a arguir não é a simples reclamação, mas o recurso competente a interpor e a tramitar como qualquer outro do mesmo tipo. Trata-se em suma da consagração do brocardo: «dos despachos recorre-se, contra as nulidades reclama-se».”

Igual entendimento perfilham os Profs. Antunes Varela [in Manual de Processo Civil, 1985, pg. 393] e Anselmo de Castro [in Direito Processual Civil Declaratório, vol. III, 1982, pg. 134]. O primeiro, refere que “se entretanto, o acto afectado de nulidade for coberto por qualquer decisão judicial, o meio próprio de o impugnar deixará de ser a reclamação (para o próprio juiz) e passará a ser o recurso da decisão”. O segundo, diz que “tradicionalmente entende-se que a arguição da nulidade só é admissível quando a infracção processual não está, ainda que indirecta ou implicitamente, coberta por qualquer despacho judicial; se há um despacho que pressuponha o acto viciado, diz-se, o meio próprio para reagir contra a ilegalidade cometida, não é a arguição ou reclamação por nulidade, mas a impugnação do respectivo despacho pela interposição do competente recurso (…)”.
«In casu», não há dúvida alguma que o acto afectado de nulidade se encontra coberto pela decisão que se lhe seguiu – a decisão recorrida -, daí resultando, em conformidade com os ensinamentos doutrinais que ficaram enunciados, que tal nulidade podia ser objecto do recurso em apreço, como foi, e que a mesma pode ser declarada por este Tribunal da Relação [neste sentido, veja-se o Ac. da Relação de Lisboa de 11/01/2011, proc. 286/09.5T2AMD-B.L1, disponível in www.dgsi.pt/jtrl e o Ac. desta Relação do Porto de 24/04/2012, proc. 10336/11.0TBVNG-B.P1, disponível in www.dgsi.pt/jtrp, relatado pelo aqui relator, embora relativo a processo de insolvência].”

Na linha desse entendimento, seguiu o Acórdão da mesma Relação, de 08-10-2018 [35], em cujo sumário se lê:

“A omissão de uma formalidade de cumprimento obrigatório, como ocorre com o respeito pelo princípio do contraditório destinado a evitar “decisões-surpresa”, configura a nulidade da sentença/despacho, por omissão de pronúncia, nos termos do art. 615º/1 d) CPC.”.

Vejamos os respectivos fundamentos:

“A omissão do exercício do contraditório constitui uma nulidade processual.
As nulidades processuais “[…] são quaisquer desvios do formalismo processual prescrito na lei, e a que esta faça corresponder – embora não de modo expresso – uma invalidade mais ou menos extensa de aspetos processuais“[8].
Atento o disposto nos art. 195º e seg. CPC, as nulidades processuais podem consistir na prática de um ato proibido, omissão de um ato prescrito na lei ou realização de um ato imposto ou permitido por lei, mas sem o formalismo requerido.
Porém, como referia o Professor ALBERTO DOS REIS há nulidades principais e nulidades secundárias, que presentemente a lei qualifica como “irregularidades“, sendo o seu regime diverso quanto à invocação e quanto aos efeitos[9].
As nulidades principais estão previstas, taxativamente, nos art. 186º a 194º e 196º a 198º do CPC e por sua vez as irregularidades estão incluídas na previsão geral do art. 195º CPC e cujo regime de arguição está sujeito ao disposto no art. 199º CPC.
A omissão do exercício do contraditório não constitui uma nulidade principal, pois não consta do elenco das nulidades previstas nos art. 186º a 194º e 196º a 198º do CPC.
Representa, pois, a omissão de um ato ou formalidade que a lei prescreve, que cai na previsão do art. 195º CPC e por isso, configura uma irregularidade que só determina a nulidade do processado subsequente àquela omissão se influir no exame e decisão da causa, estando o seu conhecimento dependente da arguição, nos termos previsto no art. 199º CPC.
Neste sentido se pronunciaram, entre outros, o Ac. STJ 02 de julho de 2015, Proc. 2641/13.7TTLSB.L1.S1, Ac. STJ 29 de janeiro de 2015, Proc. 531/11.7TVLSB.L1.S1 (todos acessíveis em www.dgsi.pt).
A lei não fornece uma definição do que se deve entender por “irregularidade que possa influir no exame e decisão da causa.
No sentido de interpretar o conceito o Professor ALBERTO DOS REIS tecia as seguintes considerações:“[o]s atos de processo têem uma finalidade inegável: assegurar a justa decisão da causa; e como a decisão não pode ser conscienciosa e justa se a causa não estiver convenientemente instruída e discutida, segue-se que o fim geral que se tem em vista com a regulação e organização dos actos de processo está satisfeito se as diligências, atos e formalidades que se praticaram garantem a instrução, a discussão e o julgamento regular do pleito; pelo contrário, o referido fim mostrar-se-á prejudicado se se praticaram ou omitiram atos ou deixaram de observar-se formalidades que comprometem o conhecimento regular da causa e portanto a instrução, a discussão ou o julgamento dela“[10].
Daqui decorre que uma irregularidade pode influir no exame e decisão da causa, se comprometer o conhecimento da causa, a instrução, discussão e julgamento.
Tal omissão tinha de ser arguida logo que conhecida, e no prazo previsto no art. 149º/1 CPC, ou seja, a partir da data em que as partes foram notificadas da sentença.
O recurso de apelação não constitui o meio processual próprio para conhecer das infrações às regras do processo quando a parte interessada não arguiu a nulidade perante o tribunal onde aquela alegadamente ocorreu, conforme resulta do regime previsto nos art. 196º a 199º CPC.
Contudo, no caso concreto, o apelante apesar de nas conclusões de recurso fazer expressa alusão ao regime das nulidades processuais, termina por pedir a declaração de nulidade da sentença.
A nulidade processual é distinta da nulidade da sentença, uma vez que a nulidade por falta de pronúncia, a que alude o art. 615º/1 d) CPC está diretamente relacionada com o comando do art. 608º/2 do mesmo Código, reportando-se ao não conhecimento das questões (que não meros argumentos ou razões) relativas à consubstanciação da causa de pedir e do pedido[11].
Nos termos do art. 615º 1 / d) CPC a sentença é nula, quando “o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”.
O vício em causa está relacionado com a norma que disciplina a “ordem de julgamento” – art. 608º/2 CPC.
Com efeito, resulta do regime previsto neste preceito, que o juiz na sentença: “deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras”.
Não ignoramos que dentro de certa linha de entendimento [12] se tem considerado que a “omissão de uma formalidade de cumprimento obrigatório, como ocorre com o respeito pelo princípio do contraditório destinado a evitar decisões-surpresa”, configura a nulidade da sentença/despacho, por omissão de pronúncia. Nestas circunstâncias o juiz está a tomar conhecimento de questão não suscitada pelas partes, sem prévio exercício do contraditório.
Esta interpretação revela-se coerente com a atual conceção do principio do contraditório, entendido como “garantia de participação efetiva das partes no desenvolvimento de todo o litígio, mediante a possibilidade de, em plena igualdade, influírem em todos os elementos (factos, provas, questões de direito) que se encontrem em ligação com o objeto da causa e que em qualquer fase do processo apareçam como potencialmente relevantes para a decisão”[13]. O direito de influir no êxito da ação, mais não será do que mais uma emanação do principio da tutela jurisdicional efetiva previsto no art. 20º CRP.

No caso presente verificando-se a omissão do prévio exercício do contraditório, perante uma questão de direito, suscitada oficiosamente e que ditou o fim da ação, a sentença é nula, nos termos do art. 615º/1 d) CPC.”

Não se tendo assegurado à parte requerente/apelante o exercício efectivo do seu direito ao contraditório quanto ao articulado de oposição, documentos juntos e especialmente quanto à litigância de má-fé que naquele lhe foi imputada, conheceu-se do mérito da impugnação ao arresto decretado sem que estivessem reunidas as condições indispensáveis para tal (excesso de pronúncia) e não se conheceu, como devia ter acontecido uma vez garantido também quanto a ela aquele direito, da questão da litigância de má-fé a pretexto, legalmente inadmissível, de a relegar para ulterior momento (omissão de pronúncia).

É, pois, a sentença nula, nos termos do artº 615º, nº 1, alínea d), CPC.

Evidentemente, as circunstâncias em apreço não são de molde a que esta Relação possa substituir-se ao Tribunal a quo e a decidir o objecto da apelação ao abrigo do artº 665º.

Por isso, julgando-se nesta parte procedente o recurso, deve declarar-se nula a sentença, determinar-se a baixa dos autos ao tribunal de 1ª instância para aí ser proferido despacho a ordenar a notificação do requerente para exercício do contraditório, no prazo legal, quanto aos documentos e à litigância de má-fé, após o que se repetirá a audiência final e proferirá nova sentença em que, além do mais, se aprecie e decida conjuntamente a questão da referida litigância.

Ficam, assim, prejudicadas as demais questões recursivas, enunciadas designadamente em g) e h).

V. DECISÃO

Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os juízes desta Relação em julgar procedente, em parte, o recurso e, em consequência, dando parcial provimento à apelação:

a) Declaram nula a sentença recorrida.
b) Determinam que, uma vez baixados os autos ao Tribunal de 1ª Instância, aí se profira despacho a ordenar a notificação do requerente para exercício do contraditório, no prazo legal, quanto aos documentos juntos com o articulado de oposição e à questão da litigância de má-fé, após o que se repetirá a audiência final e proferirá nova sentença em que, além do mais, se aprecie e decida, conjuntamente, a referida questão.
c) No mais, fica prejudicada a apreciação do objecto deste recurso.
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Custas da apelação pela apelada – (artºs 527º, nºs 1 e 2, e 529º, do novo CPC, e 1º, nºs 1 e 2, 3º, nº 1, 6º, nº 2, referido à Tabela anexa I-B, 7º, nº 2, 12º, nº 2, 13º, nº 1 e 16º, do RCP).
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Notifique.
Guimarães, 19 de Março de 2020

Este Acórdão vai assinado digitalmente no Citius, pelos Juízes-Desembargadores:

Relator: José Fernando Cardoso Amaral
Adjuntos: Helena Maria de Carvalho Gomes de Melo
Eduardo José Oliveira Azevedo



1. Crédito da sociedade requerida esse que, sendo objecto deste arresto, já foi, por sua vez, penhorado na execução pela mesma movida contra o aqui requerente – que, nela, figura como devedor/executado.
2. Nota de honorários, factura, interpelação e foto do alegado anúncio.
3. Factos seguintes: “1. O Requerente é advogado na comarca de Guimarães. 2. A Requerida, conferiu ao autor, em procuração bastante, os necessários poderes para a representar em juízo na ação que, com o nº 1619/06.1TBGMR, correu termos no 1º Juízo Cível do Tribunal judicial da comarca de Guimarães, tendo aí assumido a posição de Exequente. 3. No âmbito do referido processo e fora dele, o Requerente prestou à Requerida os serviços descritos na nota de honorários, no valor de € 13.601,10 (treze mil seiscentos e um euros e dez cêntimos).4. O Requerente não recebeu da Requerida qualquer quantia a título de provisão por conta de despesas e honorários, verificando-se ainda um saldo a favor do Requerente, relativo a despesas, no valor de € 169,50 (cento e sessenta e nove euros e cinquenta cêntimos). 5. O requerente, após ter emitido a referida nota de honorários, procedeu à emissão da fatura nº 1000004, emitida em 15.03.2018, tendo remetido a mesma à requerente e procedido à sua interpelação para pagamento mediante notificação judicial avulsa executada em 23.03.2018.6. A Requerida, apesar de ter sido interpelada judicialmente e várias vezes extrajudicialmente para proceder ao pagamento, não pagou qualquer quantia ao aqui Requerente.7. Não obstante os valores em dívida serem elevados, tem vindo o requerente a, por diversos meios, tentar convencer a requerida a proceder ao pagamento, tendo inclusive solicitado a intervenção de amigos comuns, visando convencer a requerida a proceder aos pagamentos devidos, evitando dessa forma o recurso à via judicial.8. A Requerida vem recusando a efetuar qualquer pagamento, tendo mesmo o seu sócio-gerente – J. N. - de forma ostensiva referido, que “nunca pagará ao Requerente, nem que para isso tenha que fechar a empresa!” 9. Com efeito, teve o Requerente conhecimento nos últimos dias que, recentemente, a requerida tinha feito anunciar a intenção de alienar todo o recheio do estabelecimento que explora no local da sua sede, tendo mesmo colocado, na porta do mesmo, um anúncio dando conta dessa intenção. 10. Perante o alerta dado por um cliente seu, que bem conhece a requerida, deslocou-se o requerente às instalações desta, onde pode constatar que, de facto, a requerida se aprestava a alienar todo o recheio do estabelecimento. 11. O património que, ao que se conhece, resume-se a este recheio do gabinete de arquitetura e engenharia que existe no interior do estabelecimento que explora no local da sua sede. 12. Para além dos equipamentos que constituem o imobilizado da Requerida, e de um eventual crédito (ainda litigioso), não conhece a Requerente quaisquer outros bens ou direitos propriedade da Requerida.”
4. Tendo-se considerado, no respectivo acórdão, que o alegado crédito do executado, cuja compensação pretendia, é controvertido, por incerto, indeterminado e ilíquido, não se verificando os pressupostos da compensação.
5. Do seguinte teor: “Tomei conhecimento da apensação do procedimento cautelar de arresto aos autos de ação principal. Nessa conformidade e atendendo ao alegado em sede de oposição, julga-se relevante a realização de audiência final para produção de prova quanto à matéria alegada em tal articulado. Destarte e porque as partes estiveram até à passada 6f ou até ao dia de hoje com a data de 11.12.2019 reservada para o efeito, designa-se esse mesmo dia 11.12.2019, pelas 09h50 para a realização da audiência final. Notifique e d.n., pela via mais expedita”.
6. Nos autos, lê-se também uma cota consignada pela Secretaria referindo que os mandatários das partes foram ambos notificados da data agendada, por via telefónica.
7. O teor integral de tal requerimento, valendo-nos, agora e adiante, das transcrições apresentadas pelo recorrente nas suas alegações, cuja fidedignidade – ressalvada qualquer passagem inaudível ou por nós mal percebida – verificámos e corrigimos ouvindo a gravação respectiva, é o seguinte: “atendendo a que o requerente apenas foi notificado do termo de oposição apresentada pelo requerido no dia de hoje, às 10 e um quarto, a qual está composta por 78 artigos e 21 documentos, não é possível ao requerente tomar posição sobre o respetivo conteúdo de forma responsável e tanto mais que também é requerida a litigância de má fé, a qual é infundada e exige prova pelo requerente, prova essa que para ser apresentada teria que ser indagada da possibilidade das pessoas que seriam chamadas a fazer a contra prova. E daí que considera não existirem condições para a apresentação de uma pronúncia consistente e cabal sobre todos os factos e documentos alegados e juntos aos autos pelo requerido, uma vez que sequer teve tempo de o ler o respetivo articulado. Em face do exposto, invoca o requerente a nulidade da decisão que venha a ser decidida, que venha a ser proferida. Nulidade esta prevista no art. 195º, no CPC, com o fundamento na preterição do princípio do contraditório, previsto no n.º 3 do art. 3º do CPC e visto que tal vicio é suscetível de influir decisão que venha a ser tomada” [sublinhados por nós apostos].
8. Não foi de imediato, mas sim depois de ouvida a parte contrária, que se pronunciou opondo-se ao requerido, como é audível na gravação.
9. Da gravação ouvida, colhe-se que foi o seguinte o teor do despacho subsequente (as reticências exprimem as pausas no ditar do mesmo): “Despacho! Os autos estavam agendados... A diligência do dia de hoje foi agendada para as 9:50h. Ás 10:00h a sra. Juiz chamou a... ao gabinete os ilustres mandatários dado que tinha sido requerida a … sua... que a mesma os recebesse. A ilustre mandatária da ora requerente, mencionou exatamente não ter sido notificada da oposição já... até à data de hoje. Entretanto, então o tribunal, de forma cordial e com vista ao exercício do contraditório …. explicou que se trata de um procedimento cautelar que tem celeridade. Por outro lado então, dispôs-se na presença da ilustre mandatária da requerida a indicar, como assim efetivamente o fez, quais os três concretos pontos apresentados em sede de oposição … o requerimento de oposição é de facto extenso mas serve apenas e mal corria se ás 11 e um quarto da manhã uma senhora Advogada não fosse capaz de ler e de entender cerca de, e esclarecemos, 78 artigos, em que a maioria deles, se não mais de três quartos do mesmo são referentes a menção de todo o processo declarativo … que esteve subjacente e que já é do conhecimento mais que …conhecido, para não dizer outra coisa, do requerente do presente arresto. E …. voltamos também a continuar e a dizer, como também são conhecidos os documentos que foram juntos a esse propósito. Concretamente, e daí o incómodo no tom de voz da sra. Juiz, porque a partir do momento em que se diz artigo 1º até... falamos que foram 76 …até… ao documento, até… perdão peço desculpa…até ao 64º é mera repetição do alegado pelo requerente no próprio requerimento de inicial de arresto e a referência ao processo executivo do qual o requerente já foi condenado em primeira instância, recorreu, foi condenado pela Relação, recorreu, reclamou, foi condenado pelo STJ e é então não foi invocada qualquer nulidade do conhecimento de toda essa matéria. Portanto, está efetivamente conhecedor do mesmo. Relativamente à matéria do 66 a 70 é sobre o excesso de bens arrestados. É muito simples, o auto de arresto foi… fez arresto de dois conjuntos de bens. Lote 1 bens móveis valor de 20.000€; Lote 2 – o total de crédito penhorado no âmbito da ação de que o agora arrestante é conhecedor e faz menção no seu processo, no seu requerimento inicial de arresto. Há excesso ou não há excesso é uma questão de ver o documento do auto de arresto para conferir se é ou não é. Litigância de má fé: o tribunal não precisa de apreciar a questão de litigância de má fé, no âmbito da apreciação da oposição, pelo que relativamente a prova, a contraditório quanto à litigância de má fé, o tribunal pode dar oportunidade à parte, se assim o desejar e se entender que a litigância de má fé que se resume a 75 artigos, o 76... não é 75 artigos, é 71,72,73,74,75,76 é meramente conclusivo que diz que simplesmente o requerente omitiu toda esta situação da compensação de créditos para de alguma forma iludir o tribunal e que entende que isso é litigância de má fé…portanto, são quatro artigos, que desde as 09:50 ou melhor das 10 até ás 11 e um quarto me parece cabal a dois ilustres advogados, seja o requerente que é advogado, seja a sua ilustre representante, capacidade para responder. Quanto aos demais documentos que foram juntos e que não se reportam diretamente aquilo que já é do sobejo conhecimento do requerente dos autos de procedimento, o tribunal entende que o tempo necessário concedido era suficiente. Porém, se assim entende não ainda ser capaz o tribunal interrompe a diligência até ao meio dia para que a sra. Dra… então tenha a capacidade de os analisar mais cabalmente. Assim sendo, interrompe-se a presente diligência até ao meio dia para que a ilustre mandatária do requerente, querendo, analise a demais documentação da contabilidade, que quanto que…quanto à sua clareza o tribunal também entende ser tempo suficiente para a mesma. Assim sendo, estamos com os trabalhos suspensos até ao meio dia.”
10. O teor desse requerimento recolhido da gravação ouvida é: “Após concessão de novo prazo, de 20 minutos, para tomar posição sobre o conteúdo da oposição apresentada pelo arguido, a aqui mandatária procurou contacto telefónico com o seu constituinte, o que não conseguiu obter por indisponibilidade do mesmo. Entende a mandatária que a tomada de posição por parte do seu constituinte, em face da extensa matéria e dos documentos juntos na oposição, exige o contacto pessoal com o seu constituinte e a ponderação do contraditório, seja por mera alegação ou para indicação de outros meios de prova considerados necessários. Daí que, M.ma. Juiz, com o devido respeito, pela posição da sra. Dra. e da colega, mantenho… o anteriormente alegado quanto à necessidade de obter um prazo mais alargado para me pronunciar quanto ao conhecimento desta matéria”.
11. Não consta da gravação ouvida no Citius.
12. Eis o teor de tal Despacho, recolhido da gravação áudio: “Despacho! A fase processual em que nos encontramos visa a apreciar a oposição e meios de prova apresentados com vista a aferir se se mantém ou não a providência do decretado arresto. Não pode, de acordo com a fase processual que nos encontramos, a requerente indicar novos meios de prova quanto aos apresentados, pode sim contraditá-los em sede de audiência para a produção dos mesmos, que é o caso, para o qual foi designado o dia de hoje. Mais uma vez o tribunal refere que relativamente à documentação a pronúncia também tem que ser feita na presente audiência de julgamento, claro está e compreendendo havendo a necessidade de, se assim for o caso, para... prazo para o tempo estritamente necessário para a sua análise e contradição. Assim sendo, e pela última oportunidade, não sim…antes até dizendo que não se julga verificado nulidade alguma quanto à preterição do exercício do contraditório, dado que já se deu essa oportunidade, e por último, e então concede-se oportunidade à parte para querendo exercer o contraditório da audiência quanto aos documentos…Aos demais meios de prova, neste caso, testemunhas ou declarativos, poderá …assim que forem produzidos. Sr. Dra. tem a instância para querendo exercer o contraditório aos documentos.”
13. Não se encontra na gravação qualquer outro despacho oralmente proferido – notando-se a falta de sincronia do teor da acta escrita com o da gravação –, sendo que, após o transcrito na precedente nota 12 e depois de, segundo depreendemos pelo tom de voz e pela sequência lógica, pela mandatária do requerente ter sido dito “não tenho nada a requerer”, a audiência prosseguiu, tendo a mesma apenas “requerido”, nessa altura, que lhe fosse entregue o duplicado do articulado da oposição, ouvindo-se-lhe verbalizar, para o efeito, a justificação de que só lhe tinham sido dados os documentos e percebendo-se que, de imediato, foi determinada pela Mº Juíza a entrega daquele.
14. Como resulta da gravação ouvida, foi escassa a intervenção da Srª Mandatária da requerida e nenhuma se percebe que tenha havido da do requerente.
15. Foi para percebermos como se facultou e exerceu efectivamente, no acto, o contraditório, e em razão das queixas do recorrente que fundamentam o recurso, que ouvimos integralmente a gravação da audiência e a reproduzimos aqui.
16. Sublinhados por nós apostos.
17. Como se sabe, a litigância de má-fé é de conhecimento oficioso e, apesar de apenas ser aqui imputada ao requerente, nada impede que o tribunal também aprecie a da requerida.
18. Acórdão do STJ, de 30-11-2019, processo nº 22946/11.0T2SNT-A.L1.S2.
19. Acórdão do STJ, de 06-11-2019, processo nº 1130/18.8T8FNC.L1.S1.
20. Acórdão de 30-04-2019, processo nº 22946/11.0T2SNT-A.L1.S2, já atrás referido.
21. O desfasamento entre a acta e a gravação não permite verificar se foi realmente de 20 minutos, como diz o apelante, a duração do segundo prazo embora se deduza que foi necessariamente inferior a 45.
22. Tal encerramento ocorreu, segundo a acta, às 13.29h do mesmo dia.
23. Referimo-nos a mera probabilidade, uma vez que aqui não cabe analisar, menos ainda afirmar, a valia probatória de tais documentos e do resultado do confronto.
24. Processo nº 533/04.0TMBRG-K.G1.
25. “O Exercício do Contraditório nos Procedimentos Cautelares”, Eugénia M. M. Marinho da Cunha, in Revista Jurídica Portucalense, nº 21, Universidade Portucalense, Porto, 2017, páginas 11 e 12. Aqui pode encontrar-se uma panorâmica sobre a origem e caracterização do princípio. Nesta matéria, pode ver-se também “O Arresto Como Meio de Garantia Patrimonial – Uma Perspectiva Substantiva e Processual”, Paulo Silva Campos, Revista de Direito das Sociedades, VIII (2016), 3, págs. 743-776
26. Processo nº 32262/15.3T8LSB.L3.S1.
27. Processo nº 2169/06-2.
28. Cujos passos retratámos no relato inicial deste acórdão.
29. Algo parece não estar bem e ser de lamentar quando, na peça processual, se qualifica a postura da Srª Juíza, por exemplo, como “incorrecta, arrogante, prepotente” ou “pouco isenta, preconceituosa e pouco ponderada”. Porém, a não ser na estrita medida em que de tais referências se encontre nas questões que nos compete decidir qualquer eventual reflexo susceptível de relevar na apreciação do respectivo mérito, alheamo-nos de qualquer juízo, menos ainda de imputação, sobre a responsabilidade e a justeza de tais afirmações.
30. No final do último despacho transcrito na precedente nota 12, consta ainda, sobre o exercício do contraditório: “…já se deu essa oportunidade, e por último, e então concede-se oportunidade à parte para querendo exercer o contraditório da audiência quanto aos documentos…Aos demais meios de prova, neste caso, testemunhas ou declarativos, poderá …assim que forem produzidos. Sr. Dra. tem a instância para querendo exercer o contraditório aos documentos.” Porém, além de mal se perceber o teor verbal respectivo, apesar de várias vezes ouvido, menos se percebe ainda o sentido e utilidade de tal concessão, a não ser enquanto mero fruto do clima instalado no decurso da sessão.
31. Processo nº 128/12.4TBVLN.G2.
32. Sobre isso, pode ver-se, ainda, o Acórdão da Relação de Coimbra, de 11-12-2012, processo nº 2198/12.6TBLRA.C1; da Relação do Porto, de 26-09-2013, processo nº Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 26-09-2013, processo nº 4351/08.8TBVNG.P2; de 11-07-2017, processo nº 388/12.0TBVLN.G3.
33. Processo nº 233/2000.C2.S1.
34. Processo nº 1378/14.4TBMAI.P1.
35. Processo nº 721/12.5TVPRT.P1.