Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
839/12.4TBGMR-C.G1
Relator: CONCEIÇÃO BUCHO
Descritores: AVAL
LIVRANÇA EM BRANCO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/21/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: Mantém-se a responsabilidade decorrente da prestação de aval em livrança entregue em branco para garantia do bom cumprimento de um contrato de locação financeira, ainda que à data da do vencimento da livrança, o contrato de locação financeira já se encontre extinto por entretanto o locatário ter adquirido o bem.
Decisão Texto Integral: Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães.

Proc. n.º 839/12.4TBGMR-C.G1

I - Por apenso à execução comum, para pagamento de quantia certa, que lhe move a sociedade Banco, S. A., veio o aí co-executado C…deduzir os presentes embargos de executado.
Para tanto alegou, em primeiro lugar, a iliquidez e inexigibilidade da obrigação exequenda.
Em seguida, alegou, em síntese e remetendo para os argumentos expostos na oposição à execução apresentada pela executada D…, que nada deve à exequente, visto que o contrato de locação financeira subjacente ao título dado à execução foi rescindido antecipadamente pela sociedade E…, Lda., a qual pagou a penalização devida e até já se encontra liquidada.
Concluiu que o aval já caducou, tendo a livrança sido preenchida abusivamente.
A exequente ofereceu articulado de contestação, impugnando os factos articulados pela executada.
Confirmou a factualidade referente ao contrato de locação e sua rescisão antecipada.
Expôs, que, no período compreendido entre 1997 e 2000, a E…, Lda., deveria ter pago o imposto de contribuição autárquica referente ao imóvel mencionado no contrato de locação financeira.
Mais alegou que remeteu ao representante da E…,Lda. as guias de pagamento do imposto, para que esta a reembolsasse, o que não aconteceu e desembocou no preenchimento da livrança.
Concluiu, pugnando pela improcedência dos embargos de executado.


Os autos prosseguiram e, efectuado o julgamento, foi proferida sentença na qual se decidiu:
Pelo exposto, julgo improcedentes os presentes embargos de executado intentados por C…contra a sociedade Banco, S. A..

Inconformado o executado interpôs recurso, cujas alegações terminam com as seguintes conclusões:

1) Por sentença datada de 18.05.2015 o tribunal “a quo” julgou improcedentes os embargos de executado intentados pelo Recorrente C…contra a sociedade B…, S.A..
2) O tribunal “a quo” formou a sua convicção com base na prova documental
junta ao processo mormente nos autos de oposição intentados pela executada D…, e na prova testemunhal produzida em sede de audiência de discussão e julgamento.
3) Em sede de audiência de discussão e julgamento apenas foi ouvida a testemunha Delfim, funcionário da exequente no departamento da gestão de recuperação de crédito.
4) O tribunal “a quo” valorou o depoimento prestado pela testemunha acima referida sempre numa perspectiva exígua e não valorizou importantes factos resultantes do seu depoimento.
5) No seu depoimento esta testemunha confirma expressamente que o capital que era devido pelo ora Requerente ao banco, ora Requerido, foi efectivamente liquidado e consequentemente o contrato de locação financeira foi cumprido e extinto.
6) O tribunal “a quo” deveria ter valorado o depoimento da testemunha numa
perspectiva ampla e dado como provado que o Recorrente nada deve à Recorrida.
7) Resulta do teor da escritura de compra e venda celebrada em 20.12.2000, no 5º Cartório Notarial do Porto, entre a dita sociedade “E…” e o F… S.A., bem como resulta do teor da escritura de compra e venda celebrada também no dia 20.12.2000, no mesmo 5º Cartório Notarial do Porto, entre a mesma sociedade “E., Lda.” e a sociedade “G…, S.A. (anteriormente denominada H… , S.A.), que o contrato de locação financeira celebrado em 19.12.1997 se considerou extinto por força da aquisição do imóvel objecto da locação.
8) A livrança executada foi subscrita, à data de 19.12.1997, como CAUÇÃO AO
CONTRATO DE LOCAÇÃO FINANCEIRA Nº 1102758.9) Considerado extinto tal contrato de locação financeira desde aquela data de 20.12.2000, o mesmo deixou de produzir quaisquer efeitos.
10) Extinguindo-se a obrigação principal resultante da locação financeira, ficou automaticamente extinto o aval prestado pelos co-executados.
11) O aval é uma garantia que se reporta à dívida cambiária, não pretendendo o avalista vincular-se ao pagamento como obrigado principal. Daí que o aval se encontre dependente da sorte da obrigação avalizada (suposto que esta não esteja ferida de nulidade estranha a um vício formal), e, assim, extinguindo-se a obrigação do devedor também se extinguirá a do avalista.
12) Extinta que foi a obrigação da “E…, Lda.” assumida no contrato de locação financeira, entretanto revogado pelas partes em 20.12.2000, o aval assumido pelos co-executados C… ora Recorrente, e D… também se extinguiu, perdendo automaticamente a sua razão de ser.
13) Mostrando-se extinto o contrato de locação financeira em causa e tendo a
livrança subscrita pela “E… Lda.” e avalizada pelos co-executados C…, ora Recorrente, e D… sido emitida como caução de tal contrato, a mesma deixou de valer como título executivo a partir daquela data de 20.12.2000, não podendo servir de base à execução que está na origem presentes embargos de executado intentados pelo ora Recorrente.
14) O preenchimento da referida livrança, nos termos expostos, viola o acordado.
15) O contrato foi cumprido, tal como foi expressamente dito pela testemunha Delfim Lacerda, pelo que não podia a ora Requerida preencher a referida livrança por não se ter verificado o incumprimento do dito contrato.
16) Não é possível concluir-se, em face da matéria de facto provada (Sentença
II. Fundamentação - A) Factualidade Provada), conjugada com a matéria de facto que deve agora também ser dada como provada (Sentença - II. Fundamentação - B) Factualidade Não Provada, ponto 1), pela improcedência dos embargos de executado intentados pelo ora Requerente, como erradamente o fez o tribunal “a quo”.
17) Não se pode considerar que o Recorrente ainda deva algo à Recorrida, uma vez que se verificou o cumprimento do contrato de locação e a respectiva extinção, com a consequente extinção do aval.
18) Não se justifica que os embargos intentados pelo Recorrente tenham sido
julgados improcedentes pelo tribunal “a quo”, devendo ser os mesmos ora julgados procedentes.
19) A decisão recorrida faz uma errada interpretação do disposto nos artigos 32º e 47º, ambos da Lei Uniforme e nos artigos 236º e 514º, nº 1, ambos do Código Civil, o que equivale a dizer que viola os referidos dispositivos legais.
20) Não se pode considerar que o Recorrente ainda deva algo à Recorrida, uma vez que se verificou o cumprimento do contrato de locação e a respectiva extinção, com a consequente extinção do aval.

O recorrido apresentou contra-alegações nas quais pugna pela manutenção do decidido.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

II – É pelas conclusões do recurso que se refere e delimita o objecto do mesmo, ressalvadas aquelas questões que sejam do conhecimento oficioso – artigos 635º e 639º Código de Processo Civil -.


O recorrente impugna a matéria de facto dos pontos sob os n.ºs 1 a 3 dos temas de prova que conduziu aos pontos n.ºs 9 a 13 e 23 da sentença.
Nos termos do n.º 1 do art.º 662º do CPC, a decisão do Tribunal de 1ª instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
Por seu turno, o artigo 640º do mesmo diploma estabelece:
1. Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2. No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes.
Para além disso, nos termos do disposto no n.º 2 do art. 662 “A Relação deve ainda, mesmo oficiosamente:
a) Ordenar a renovação da produção da prova quando houver dúvidas sérias sobre a credibilidade do depoente ou sobre o sentido do seu depoimento;
b) Ordenar, em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada, a produção de novos meios de prova;
c) Anular a decisão proferida na 1.ª instância, quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta;´
d) Determinar que, não estando devidamente fundamentada a decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa, o tribunal de 1.ª instância a fundamente, tendo em conta os depoimentos gravados ou registados.
Além disso, com a alínea c) do n.º 1 do artigo 640º, o recorrente deve expressamente especificar, ao impugnar a decisão sobre determinado facto, se entende que o mesmo deve considerar-se provado, não provado ou parcialmente provado e, neste caso, em que termos (cfr. A. Martins, C.P.Civil Anotações práticas, Almedina, 2013, pág. 295).
A reapreciação da matéria de facto, pela Relação, no âmbito dos poderes conferidos pelo artº 662 do CPC, não pode confundir-se com um novo julgamento, destinando-se essencialmente á sanação de manifestos erros de julgamento, de falhas mais ou menos evidentes na apreciação da prova”
A impugnação da matéria de facto não gera a realização de um novo julgamento integral em segunda instância (cfr., a título de exemplo, António Santos Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, II Vol., 2ª edição revista e ampliada, p. 263 e 264), constituindo antes um meio de sindicar a decisão da primeira instância quanto à decisão da matéria de facto, relativa a determinados pontos concretos, pelo que não envolve a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida (sem prejuízo de o tribunal, se assim o entender, proceder à audição de todos os depoimentos), incidindo sobre pontos determinados da matéria de facto, que ao recorrente compete identificar, indicando em complemento os concretos meios probatórios que, em seu entender, justificam uma diversa decisão.
É entendimento dominante na jurisprudência que a convicção do julgador, firmada no principio da livre apreciação da prova (artº 607 n.º 5 do Código de Processo Civil), só pode ser modificada pelo tribunal de recurso quando fundamentada em provas ilegais ou proibidas ou contra a força probatória plena de certos meios de prova, ou então quando afronte as regras da experiência comum.
No caso em apreço, o recorrente pretende que a matéria de facto que foi dada como não provada no n.º 1 dos factos não provados, passe a ser dada como provada.
Indica a testemunha Delfim como elemento de prova que conduziria a uma resposta diversa.
Alega o recorrente que este depoimento não foi devidamente valorado.
Conforme consta da sentença recorrida o tribunal fundamentou a sua convicção nos documentos juntos aos autos, bem como nos depoimentos ouvidos em audiência, ou seja no depoimento da referida testemunha.
Ouvido todo o depoimento da testemunha resulta que a Contribuição Autárquica que não foi paga pela locatária diz respeito aos anos de 1997, 1998, 1999 e 2000.
Resulta também que a apresentação para pagamento ocorreu em Dezembro de 2007.
Também resulta que foi o recorrido quem efectuou o pagamento daquela contribuição e posteriormente solicitou o reembolso. Assim como o mesmo referiu que efectivamente existiu antecipação de pagamento quanto ao capital, mas o imposto não foi pago sendo devido nos referidos anos, o que foi comunicado também aos avalistas.


Mantém-se assim a matéria de facto tal como a mesma consta da sentença que é a seguinte:

a) Banco…S. A., intentou ação executiva comum, para pagamento de quantia certa, contra E… Lda., C… e D…, para destes haver o pagamento da quantia global de € 5.399,16, a título de capital e juros e imposto de selo vencidos, acrescida dos vincendos.
b) Banco…, S. A., fundou a execução mencionada em a) no facto de ser legítima portadora de um escrito, datado de 1997-12-19 e com vencimento em 2011-05-19, do qual consta que E…Lda., declarou que “No seu vencimento pagarei(emos) por esta única via de livrança à H… S. A., ou à sua ordem a quantia de cinco mil e setenta e cinco euros e três cêntimos”..
c) Do verso do escrito, a seguir aos dizeres “Dou o meu aval à firma subscritora”, encontram-se apostas as assinaturas de C… e D… – tudo cfr. documento de fls. 7-8 dos autos de execução, cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
d) Aos 19-12-1997, entre a sociedade H…, S. A., e a sociedade E… Lda., foi celebrado um escrito denominado “Contrato de Locação Financeira Imobiliária nº 102.758”, nos termos dos quais a primeira declarou ceder à segunda, mediante o pagamento da renda mensal de Esc. 1.323.797$00, durante doze anos, o gozo do prédio identificado na cláusula I das condições particulares.
e) Estabelece a cláusula V das condições gerais do escrito aludido em d) que:
“(…) a Locatária fica obrigada:
(…)
h) Cumprir todas as prescrições legais, administrativas ou de qualquer natureza (…)”.
f) Prevê a cláusula VIII das condições Gerais do escrito descrito em d) : “A Locatária efectuou a subscrição de uma livrança em branco a favor da Locadora, avalizada por C… e D…, cujo preenchimento a Locadora está autorizada a efectuar, nos termos da respectiva autorização de preenchimento, cujo original fica em poder da Locadora”- tudo cfr. documento de fls. 42-68 dos autos de oposição à execução, cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
g) Aos 20-12-2000, a sociedade G…, S. A., anteriormente designada H…, S. A., declarou vender antecipadamente à sociedade E… Lda., o prédio identificado e objeto do escrito descrito em d) - tudo cfr. documento de fls. 29-34 dos autos de oposição à execução, cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
h) Aos 20-12-2000, a sociedade E…, Lda., declarou vender à sociedade F… A, e esta declarou ceder o gozo, por “locação financeira”, à sociedade I…, Lda., o prédio identificado e objeto do escrito descrito em d) ”- tudo cfr. documento de fls. 24-28 dos autos de oposição à execução, cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
i) Correram termos nos Serviços de Finanças de Braga os processos de execução fiscal nºs 0418200201050508 e 0418200201012398, instaurados em nome da sociedade E… Lda., e cujo autuação data de 2002-05-10, e que aos 13-12-2007 foi objeto de reversão contra J…, S.A., tendo por objeto o imposto de Contribuição Autárquica dos períodos de 1998 a 2000, no valor global de €5.075,03, e cujo pagamento foi efetuado pela última aos 28-12-2007 - tudo cfr. certidões de fls. 139-145 e 157-178 dos autos de oposição à execução, cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
j) Na Conservatória do Registo Comercial de Guimarães, encontra-se matriculada, sob o nº 3619/910117, a sociedade E…,s, Lda., cujo encerramento da sua liquidação ocorreu aos 30-12-2004 - tudo cfr. certidão de matrícula junta aos autos de oposição à execução a fls. 198-201, cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
k) No período compreendido entre 1998 e 2000, a E…, Lda., deveria ter pago o imposto de contribuição autárquica.
l) A embargada remeteu ao representante da E…, Lda., as guias de pagamento do imposto mencionado em i), para que esta a reembolsasse.
m) O que não aconteceu.
o) Tendo sido preenchido o escrito mencionado em b).
*

A questão a decidir é a de saber se o aval caducou e se a livrança foi abusivamente preenchida.
Resulta provado dos documentos juntos aos autos que a locatária teria de efectuar o pagamento da contribuição autárquica, o que não aconteceu, tendo sido o recorrido que teve que efectuar esse pagamento.
O que veio a acontecer em processo de execução fiscal, conforme resulta provado.
Conforme resulta da matéria de facto provada, o aval foi prestado em 19/12/97, e também resulta que o contrato não foi integralmente cumprido.
Como resulta do artigo 10º da LULL, a obrigação cambiária do avalista da letra ou livrança em branco surge com a aposição das respectiva assinatura nessa qualidade e com a emissão do título, numa palavra, com a dação do aval.
Ao dar o aval ao subscritor de livrança em branco, fica o avalista sujeito ao direito potestativo do portador preencher o título nos termos constantes do contrato de preenchimento, assumindo mesmo o risco de esse contrato não ser respeitado e de ter de responder pela obrigação constante do título como ela estiver efectivamente configurada – artigos 10º e 32º da LULL.
Sendo a livrança em branco ( 10º e 70º da LULL) uma vez que não faz sentido que a livrança seja preenchida se não houver incumprimento da obrigação subjacente o preenchimento tanto podia ocorrer no momento do incumprimento como no momento em que o recorrido quisesse obter coercivamente a obrigação.
A livrança em branco é, claramente, admitida nos artigos 77º e 10º da L.U.L.L., disposição que estabelece que “se uma letra (livrança) incompleta no momento de ser passada tiver sido completada contrariamente aos acordos realizados, não pode a inobservância desses acordos ser motivo de oposição ao portador, salvo se este tiver adquirido a letra de má fé ou, adquirindo-a, tenha cometido uma falta grave”. Deste artigo resulta que não é indispensável que a letra/livrança contenha, logo de princípio, todos os requisitos a que alude o art. 75º da L.U.. Do confronto entre os artigos 75º e 76º da L.ULL (em que, respectivamente, se estabelecem os elementos que a livrança deve conter e em que se demarcam os requisitos, cuja falta determina a invalidade do título como letra), por um lado, e o artigo 10º, por outro, concluiu-se que o momento decisivo para se determinar a validade da letra não é o da emissão, mas sim o do vencimento.
Depois da emissão, poderá o título vir a ser dotado dos elementos necessários para que possa produzir efeitos como livrança, sendo necessário, porém, que esses requisitos constem nela na altura do seu vencimento. Se, neste momento, a livrança se não encontrar preenchida, então, nos termos dos artigos 75º e 76º, não poderá produzir efeitos como livrança.
Na ausência de violação do contrato de preenchimento, ou de outro pacto posterior, o preenchimento do título tem de considerar-se, em princípio, legítimo, dele decorrendo a perfeição da obrigação cambiária incorporada na letra e a correspondente exigibilidade, nomeadamente em relação aos avalistas do aceitante que se apresentam como que «co-aceitantes» e, com ele, responsáveis solidários (cfr. FERRER CORREIA, , 526) ( Lições de Direito Comercial, Vol. III, 1966
Quanto ao preenchimento da livrança de forma abusiva, que o Recorrente imputam ao Recorrido, incumbia-lhe provar os factos dos quais se extrai abuso, o que não lograram fazer, apesar de tal ónus de prova sobre elas recair, nos termos do artigo 342º, nº 2, do Código Civil, pois como se decidiu no Acórdão da Relação de Coimbra, de 21-03-2006, in www.dgsi.pt “a inexistência da dívida titulada pela letra e o preenchimento abusivo desta são factos impeditivos do direito invocado pelo exequente, pelo que, nos termos do artigo 342º, nº 2, do C. Civil, o respectivo ónus da prova compete ao executado, ou seja àquele contra quem o direito é invocado”.
Improcede, deste modo, o recurso.

III – Pelo exposto, acordam os Juízes desta Secção em julgar a apelação improcedente e, em consequência confirmam a sentença recorrida.
Custas pelo apelante.

Guimarães, 21 de Abril de 2016.