Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
130145/17.5YIPRT.G1
Relator: MARIA DOS ANJOS NOGUEIRA
Descritores: PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS
RESCISÃO/REVOGAÇÃO DO CONTRATO
EFICÁCIA EX NUNC
EXCEPÇÃO DE NÃO CUMPRIMENTO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/14/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I- À luz do regime jurídico do contrato de mandato é possível fazer cessar o contrato por vontade unilateral provinda do mandante ou do mandatário e independentemente da apresentação de qualquer motivo justificativo (n.º 1 do artigo 1170.º do Código Civil). Trata-se de uma faculdade que excepciona a regra constante do n.º 1 do artigo 406.º do mesmo diploma (inserindo-se, pois, na ressalva constante da parte final desse preceito).
Decisão Texto Integral:
ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES

I – Relatório

A Autora instaurou acção declarativa sob a forma de processo comum, iniciada como injunção, pedindo a condenação da Ré no valor de € 32.287,97, sendo € 31.619,60 relativamente ao valor do capital, € 515,37 quanto a juros de mora vencidos e € 153 de taxa de justiça.
Alegou, em síntese, que no exercício da sua actividade, em 12 de Julho e 28 de Agosto de 2016 apresentou à Ré, a solicitação desta, duas propostas de prestação de serviços, uma de consultoria estratégica em processos de negócios e outra de acções e orçamento de informática, que a mesma aceitou; passou a prestar os serviços mencionados em primeiro lugar e à implementação de software “Silex”, tendo emitido e enviado onze facturas, com vencimento a 30 dias, no valor global de € 32.619,60, que a Ré recebeu, mas devolveu apenas tendo pago o montante de € 1.000 por conta de uma delas; instou-a diversas vezes, sem resultado.
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A Ré contestou contrapondo que, em Junho de 2016, solicitou à Autora uma proposta de serviços para “digitalização da empresa”, a fim de modernizar os processos de fabrico, introduzir maior automação nas linhas de produção, reduzir custos, maximizar procedimentos administrativos no fabrico e dar maior celeridade às entregas, o que era essencial para a sua actividade devido ao seu crescimento e necessidades; em Julho, a Autora apresentou uma proposta de projeto que deveria estar desenvolvido e instalado até 12 meses, a contar da data da sua adjudicação, prevendo que os desenvolvimentos seriam implementados de forma a que cada bloco de funcionalidade não demorasse mais de 8 semanas entre a concepção e a disponibilização para os utilizadores, mediante o pagamento da quantia de € 1.470/mês, acrescida de IVA, durante 12 meses, o que aceitou em 2 de Setembro seguinte; em 29 de Agosto do mesmo ano, no seguimento de um relatório, em complemento da anterior proposta, por ser essencial à sua execução, a Autora enviou um email com uma outra proposta, a executar de imediato, para implementar medidas de eliminação de erros de stock, definir política de gestão destes, com estabelecimento de datas de entrega, elaboração de planos de manutenção autónoma e preventiva, lista de pendentes, avaliação de dependências estratégicas de pessoas e máquinas, entre outros, a executar em 12 meses, com mensalidade de € 2.580 durante 18 meses.
Porém, apesar de ter pago as facturas mensais até Abril de 2017, no valor de € 33.505, o projecto para desenvolvimento de software não estava a ser implementado, apenas foi apresentado em 21 de Junho de 2017, tendo constatado que o programa “Silex” não executa os pontos referidos no “relatório do projeto de consultoria estratégica em processos de negócios”, nem na respetiva proposta, aos níveis da interface do utilizador e das funcionalidades, não apresenta possibilidades de ser utilizado sem graves danos à sua atividade, não apresenta quadro ou relatório que permita efetuar um controlo operacional ou de gestão dos processos e a sua utilização implicaria um retrocesso na sua operacionalidade e modernização; conclui que a Autora não chegou a executar qualquer desenvolvimento informático nem cumpriu os prazos.
Dando por reproduzidos os factos alegados, deduziu reconvenção pedindo a condenação da Autora a pagar-lhe a importância de € 25.128,75, acrescida dos juros de mora vencidos e vincendos, à taxa de juros comerciais, desde a notificação do articulado até integral e efectivo pagamento ou, caso venha a determinar-se que os serviços prestados pela Autora correspondem a mais de 25% do valor que lhe foi pago por si, que aquela seja condenada a pagar-lhe a importância que se vier a apurar, correspondente aos serviços contratados, que não foram prestados, a liquidar em execução de sentença.
Acrescentou que aquele montante corresponde aos serviços contratados que a Autora não executou e que lhe pagou, que estima em 75%.
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A Autora replicou argumentando que a proposta solicitada pela Ré visava a digitalização dos processos de negócios da empresa e que a introdução de maior automação das linhas de produção nunca esteve no âmbito dos objetivos do projeto; a disponibilização do servidor e dos componentes e a rede informática eram da responsabilidade da Ré, o primeiro, que era essencial para o desenvolvimento do projecto, apenas foi disponibilizado em 28 de Fevereiro de 2017, tendo a 9 de Março seguinte feito a apresentação, que seguiu o que lhe fora solicitado e não mereceu qualquer reparo; durante Abril e Maio desenvolveu a componente de planeamento e deu formação em várias componentes do sistema, que lhe foi solicitado de forma repentina; as acções deveriam ser executadas pela Ré, com a sua colaboração, com o objectivo de melhorar a prestação operacional e preparar o desenvolvimento do projecto e instalação do sistema informático, mas a Ré não implementou a recepção de materiais em tempo real, apesar de ter condições para o fazer desde Setembro de 2016; a definição da política de gestão de stocks iniciou-se em Setembro de 2016 e durou até Julho de 2017; refere que a Ré falhou na sua tarefa de transmissão de informação do seu negócio e a validação da mesma, tendo aceitado as fichas técnicas em 10 de Julho de 2017, assim como o planeamento, sem qualquer nota de reparo, pedindo desculpas pelo atraso.
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Dispensada a realização de audiência prévia, foi proferido despacho saneador que definiu o objecto do litígio, com enunciação dos temas da prova, após o que se procedeu a julgamento com a subsequente prolação da sentença que julgou a acção parcialmente provada e procedente, condenando a Ré X Material Eléctrico, Ld.ª a pagar à Autora Y Consultores, Ld.ª a quantia de € € 25.272,80, acrescida de juros à taxa legal resultante da aplicação do artigo 2º nº 2 da Portaria nº 277/2013 de 26 de Agosto, por referências às datas de vencimento das faturas identificadas no ponto 23) b) a i) da fundamentação de facto e ao montante de € 808,19 relativamente à data de vencimento da factura F 2017A/37, identificada em 23) a), até integral e efectivo cumprimento, e improcedente a reconvenção, absolvendo a Reconvinda Y Consultores, Ld.ª do pedido formulado pela Reconvinte X Material Eléctrico, Ld.ª.
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II. O Recurso

Não se conformando com a decisão proferida veio a Ré/reconvinte apresentar recurso, nele formulando as seguintes conclusões:

1. A sentença sob recurso rejeitou a defesa por exceção invocada pela recorrente, porquanto considerou que esta, ao resolver o contrato, “limitou-se a informar que o fazia ao abrigo da cláusula do contrato de consultoria que lhe permitia desvincular-se em qualquer momento”.
2. O facto de a recorrente não ter invocado fundamento para pôr termo à relação contratual, não pode, no entender da recorrente, ser impedimento para que esta possa alegar, em sua defesa e como justificação para o não pagamento das faturas reclamadas pela recorrida, a excepção de não cumprimento e, muito menos, para que o Tribunal não tome conhecimento dessa mesma excepção, como se impunha que tivesse feito.
3. Entende a recorrente ser legítima a invocação, em sua defesa, da excepção de não cumprimento, e o consequente dever do Tribunal dela tomar conhecimento, o que manifestamente não fez, razão pela qual a sentença recorrida enferma da nulidade prevista no artigo 615.º, n.º 1, alínea d), primeira parte do Código de Processo Civil.
4. Para além de não existir qualquer disposição legal que obrigue a recorrente, aquando a rescisão do contrato, a invocar os motivos que determinaram o não pagamento das facturas emitidas pela recorrida, a rescisão e a excepção de não cumprimentos são, de facto e de direito, questões distintas.
5. Uma traduz-se na possibilidade da recorrente, voluntariamente, poder rescindir o contrato em qualquer momento da sua vigência, sem necessidade de invocar qualquer razão ou motivo para o efeito.
6. Outra, na possibilidade de se opor ao pagamento, invocando, de acordo com a lei e em sua defesa, a exceptio non adimpleti contractus, em caso de incumprimento ou cumprimento defeituoso por parte da recorrida.
7. Ficou provado nos autos que:
- A interface do utilizador do software desenvolvido pela recorrida deveria ser de fácil utilização e intuitivo de modo a permitir agilidade na sua utilização, o que não sucedeu no software que foi apresentado pela recorrida;
- A interface apresentada pelo software desenvolvido pela recorrida implicava a utilização de dispositivos com ecrãs de grandes dimensões para a execução do programa para o respetivo visionamento de forma legível em ecrã completo ou a realização de skroll para aceder à totalidade da informação, nada consentâneo com a realidade tecnológica atual, na qual as aplicações informáticas são preparadas para poderem ser utilizadas em qualquer dispositivo, nomeadamente, smartphones, tablets, computadores portáteis, entre outros;
- A interface desenvolvida pela recorrida era inadequada à utilização pelos funcionários do sector produtivo da recorrente;
- A Aplicação desenvolvida pela recorrida não apresenta qualquer descrição aquando da selecção do código num universo de 11.000 artigos, o que implicaria a memorização dos descritivos correspondentes a cada código pelos utilizadores ou a execução dos comandos copiar a partir da base de dados e colar no software quando estivesse em causa uma operação de planeamento;
8. Ficou igualmente provado que a recorrente necessita de software que permita efectuar de forma intuitiva, prática, eficaz, rápida e eficaz as seguintes operações: - plano de abastecimento; - planeamento; - ordens de produção; - execução de produção; - gestão de compostos; - gestão de produções; - gestão de armazéns/logística; - gestão de stocks; - manutenção; - montagem.
9. Resultou também demonstrado que os administradores da recorrente chegaram à conclusão que a introdução do software desenvolvido pela recorrida, constituiria um retrocesso na operacionalidade, obstaria à modernização de empresa, com efeitos nefastos para a sua actividade.
10. Conforme expressamente referiu a sentença sob recurso é certo ter a recorrente “razões de insatisfação (…)”, face aos factos atrás referidos, todos dados como provados na instância.
11. A recorrente solicitou uma proposta de serviços de digitalização dos processos de negócio da empresa com o “fim modernizar a sua fábrica sita em ..., Oeiras”, com o intuito de “reduzir custos, maximizar os procedimentos administrativos no fabrico e dar maior celeridade às entregas.” (facto dado como provado sob o n.º 3), com os objectivos estratégicos e operacionais referidos, respectivamente, nos pontos 7 e 8 dos factos dados como provados.
12. Os serviços apresentados pela recorrida não cumpriam, nem de perto, nem de longe, com os objetivos que determinaram a recorrente a contratar os serviços daquela, referidos no número anterior.
13. Ao invés de apresentar um software para modernização da empresa, a recorrida apresentou um software – Silex - que se provou “nada consentâneo com a realidade tecnológica atual”, cujo “interface era inadequado à utilização pelos funcionários do sector produtivo da ”, não sendo de fácil utilização nem intuitivo, que não apresenta qualquer descrição aquando da selecção do código num universo de 11.000 artigos.
14. O Tribunal “a quo” condenou a recorrente no pagamento da totalidade das facturas emitidas pela recorrida até à data em que a recorrente procedeu à rescisão do contrato, como se a recorrida tivesse realizado na perfeição a totalidade dos serviços a que se obrigou, o que como evidenciado nos autos não sucedeu.
15. Impunha-se ao Tribunal “a quo” o conhecimento da excepção de não cumprimento, e, consequentemente, a absolvição da recorrente do pedido, bem como a condenação da recorrida a pagar àquela a importância reclamada em sede de reconvenção, por não corresponderem a quaisquer serviços prestados pela recorrida ou a serviços defeituosamente prestados.
16. Ou, caso assim não entendesse, reduzir a contraprestação a efetuar pela recorrente, nos termos do disposto no artigo 802.º do Código Civil.
17. Caso o Tribunal “a quo” considerasse não ser possível averiguar o valor exacto dos danos (art.º 566.º n.º 3 do Código Civil), à falta de outros elementos, deverá a redução da prestação fazer-se de acordo com a equidade (art.º 4.º alínea a) do Código Civil).
18. Ao decidir como fez na sentença recorrida o Senhor Dr.Juiz a quo violou o disposto nos artigos 615.º, nº.1, alínea d) do Código de Processo Civil e 4º, alínea a) do Código Civil, e fez errada apreciação da prova que produzida foi nos autos assim como interpretou e aplicou erradamente o disposto no artigo 802.º do Código Civil.
19. Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, revogar-se a sentença recorrida, substituindo-se a mesma por acórdão que julgue a dita acção improcedente por não provada, absolvendo-se a recorrente do pedido contra ela formulado, e, ainda, julgar procedente por provada a reconvenção e, em consequência, condenar a recorrida no pagamento da importância reclamada, assim se fazendo correcta e exacta interpretação e aplicação da lei, se fazendo em suma JUSTIÇA.
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A A. apresentou as suas contra-alegações, concluindo nos seguintes termos:

1. Em 27 de Outubro de 2017, a Ré comunicou à Autora que rescindia os dois acordos; instada a revelar o motivo, a Ré limitou-se a informar que o fazia ao abrigo da cláusula do contrato de consultoria que lhe permitia desvincular-se em qualquer momento.
2. Ré/Recorrente, nunca denunciou qualquer incumprimento, nunca em tempo algum alegou defeitos, incumprimentos parciais ou totais, utilizando apenas esta tese de argumentação apenas para se escusar de pagar um serviço que sabe que foi efetivamente prestado.
3. É imprescindível para o reconhecimento e efectiva aplicação desta “exceptio”, que a Ré/recorrente tivesse denunciado os defeitos relativamente aos quais se queria prevalecer com uma tal invocação.
4. Concluiu o tribunal a quo, na sentença recorrida, a Ré optou por não invocar qualquer fundamento para pôr termo à relação contratual, e como tal não existe fundamento para se escusar ao pagamento de todas as facturas emitidas pela Autora relativamente aos serviços prestados até ao final de Outubro de 2017, pois se invocasse válidos fundamentos para resolver o contrato poderia aplicar-se o regime previsto no artigo 434.º n.º 2 do Código Civil.
5. Considerou ainda o tribunal a quo que tão pouco resultou que tivesse havido incumprimento de prazos e objectivos, na medida em que, além do mais, os atrasos na implementação do segundo contrato estiveram relacionados com a aquisição do servidor.
6. O tribunal a quo pronunciou-se e fundamentou a sua decisão, referindo eficazmente que os atrasos na implementação do segundo contrato estiveram relacionados com a aquisição do servidor, que os erros no software desenvolvido se deveram a falha na transmissão de informação que a Ré estava obrigada prestar no âmbito da colaboração prevista.
7. Assim, entende a Autora/Recorrida, que andou bem o tribunal a quo quando considerou que uma vez que a Ré/Rrecorrente rescindiu os dois acordos ao abrigo da cláusula do contrato de consultoria que lhe permitia desvincular-se em qualquer momento, não alegando para tal qualquer incumprimento, ainda que tivesse sido instada para tal, não existe fundamento para se escusar ao pagamento de todas as faturas emitidas pela Autora relativamente aos serviços prestados.
8. A recorrida não pode concordar com a tese exposta pela Recorrente, uma vez que entende sem margem para duvidas que o tribunal a quo tomou conhecimento de todas as questões, fundamentando-as devidamente, quer factualmente quer a nível de Direito.
9. Pelo, que deve ser mantido in totum, a decisão recorrida pelo Douto Tribunal ad quem.

Assim decidindo farão V. Exas., Venerandos Desembargadores, a costumada JUSTIÇA!
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O recurso foi recebido como de apelação, com subida imediata e efeito devolutivo.
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Foram colhidos os vistos legais.
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III-O Direito

Como resulta do disposto nos arts. 608.º, nº. 2, ex vi do artº. 663.º, n.º 2, 635.º, nº. 4, 639.º, n.os 1 a 3, 641.º, n.º 2, alínea b), todos do Código de Processo Civil (C.P.C.), sem prejuízo do conhecimento das questões de que deva conhecer-se ex officio, este Tribunal só poderá conhecer das que constem das conclusões que definem, assim, o âmbito e objecto do recurso.
Deste modo, e tendo em consideração as conclusões acima transcritas cumpre decidir sobre a nulidade arguida e se, não procedendo a mesma, pode a excepção de não cumprimento ser oposta à A./recorrida.
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Fundamentação de facto

Factos provados

1. A Autora dedica-se, com intuito lucrativo e carácter habitual, à formação e consultoria em logística, qualidade, ambiente e gestão; à formação e consultoria em sistemas e à revenda de material informático [resposta ao artigo 1º da injunção].
2. A Ré, por sua vez, dedica-se, com intuito lucrativo e por forma habitual, ao fabrico e comercialização de material elétrico de baixa tensão [resposta aos artigos 2º da injunção e 3º da contestação].
3. Com o fim de modernizar a sua fábrica sita em ..., Oeiras, em Junho de 2016, a Ré solicitou à Autora, uma proposta de serviços para “digitalização dos processos de negócio da empresa” com o intuito de reduzir custos, maximizar os procedimentos administrativos no fabrico e dar maior celebridade às entregas [resposta aos artigo 5º da contestação].
4. A referida “digitalização dos processos de negócio da empresa” mostrava-se e mostra-se essencial à actividade da Requerida, face ao seu crescimento, com maior número de encomendas, vendas e necessidades de entregas mais rápidas, bem como ao desenvolvimento que se assiste a nível mundial no campo da robótica e inteligência artificial [resposta ao artigo 6º da contestação].
5. Era e é imperioso para a Ré, a fim de salvaguardar a sua atividade, crescimento e posicionamento no mercado, a nível nacional e internacional, manter-se a par do desenvolvimento que se verifica a nível mundial em termos informáticos, técnicas de fabrico e produção. [resposta ao artigo 7º da contestação].
6. Na sequência de tal pedido, a Requerente veio a apresentar à Requerida, em Julho de 2016, uma “Proposta de Consultoria Estratégica em Processos de Negócio” [resposta aos artigos 3º da injunção, 8º da contestação, 17º da réplica].
7. A proposta identificada em 6) tinha como objectivos estratégicos:
“ 1. Digitalização dos processos de negócio. Eliminando todos os papéis sempre que possível, criando condições para a transversalidade de toda a informação na empresa, ultrapassando as barreiras físicas e processuais inerentes à informação residente em suporte em papel.
2. Compressão de Tempo dos Processos de Negócio. Permitindo a sua execução mais rápida e ágil, por orientação e assistência às pessoas que executam os processos, respondendo necessariamente mais rapidamente a agilmente aos clientes.
3. Eficiência dos Processos de Negócio. Procurando que não seja necessário trabalho adicional para obter informação já disponível em outro âmbito da empresa e que não seja necessário repetir desnecessariamente passos ou informações em vários processos da empresa de modo redundante.
4. Redução de Recursos Necessários. Procurando que com a assistência da digitalização os processos de negócio consigam ser executados com menos recursos – e com menos custos, necessariamente” [resposta ao artigo 9º da contestação].
8. A proposta indicava como objetivos operacionais:
“1. Controlo integral e Permanente dos Subcontratados. Mantendo uma informação do que foi entregue e devolvido por estes.
2. Controlo Permanente de Stocks. Mantendo informação em tempo real de todos os tipos de stock, matérias primas, intermédias e produto acabado.
3. Registo Rigoroso da Produção. Feito em tempo real, detalhando cada centro de trabalho de cada pessoa.
4. Integração do Planeamento. Dando suporte à elaboração do planeamento, alocação de máquinas, pessoas e stocks.
5. Controlo de Estado das Ordens de Produção. Dando informação em tempo real sobre o andamento de cada uma delas.
6. Serviços de Encomendas de Clientes. Feito em tempo real sobre os stocks de produto acabado e com a utilização plena de leitores de códigos de barras.
7 Registo de Controlo de Qualidade. Feito em tempo real e sobre cada centro de trabalho e de cada pessoa.
8 Disponibilização de Informação de Gestão. Feito em tempo real, revelando o verdadeiro estado de evolução da produção e serviço de encomendas dos clientes” [resposta ao artigo 10º da contestação].
9. A proposta referia que o projecto estaria “desenvolvido e instalado até 12 meses a contar da data da sua adjudicação” [resposta aos artigos 11º, 48º da contestação].
10. No que diz respeito à metodologia, na parte respeitante a consultoria, a proposta previa que fosse realizada através de sessões de trabalho de dois dias com periodicidade quinzenal no início do projeto e mensal na parte final, num total de 36 dias de trabalho, com a seguinte proposta de acções:
“1. visita das instalações: passo já executado, poderá ser reforçado;
2. auscultação das chefias de primeira linha: a ser executado na próxima visita. Primeira linha e “ajudantes”, se for possível;
3. elaboração do plano estratégico de acção: na semana subsequente. Pressupõe reunião de discussão e aprovação;
4. aprovação do plano: a partir de Setembro, nos moldes referidos” [resposta ao artigo 12º].
11. Ainda a nível da metodologia a proposta referia “os desenvolvimentos informáticos são essenciais para o desenvolvimento do projeto, propõe-se que sejam implementados de forma a que cada bloco de funcionalidade não demore mais de 8 semanas entre a conceção e a disponibilização para os utilizadores, criando ciclos de avanço concretos e rápidos” e que “os blocos funcionais seriam listados por ordem de prioridade de implementação” [resposta ao artigo 12º da contestação].
12. No item “valorização da Proposta”, referia “considerando a metodologia e a funcionalidade acima exposta propõe-se o valor de € 1.470,00/mês durante 12 meses”, acrescido de IVA, a corresponder a emissão de fatura mensal, considerando-se o inicio do projeto como a data de auscultação das chefias de primeira linha, com prazo de pagamento de 30 dias [resposta ao artigo 13º da contestação].
13. A proposta previa que, no caso de o projeto ser adjudicado, se em qualquer momento a Ré decidisse não prosseguir com ele, por um qualquer motivo, desde que não especificado nem previsto na proposta e nem imputável à Autora, seria faturado na totalidade o mês em curso que se consideraria automaticamente completo [resposta ao artigo 50º da contestação].
14. A Ré aceitou a referida proposta [resposta ao artigo 14º da contestação].
15. Em Agosto de 2016, após a realização de entrevistas, a Autora elaborou “relatório do projeto de consultoria estratégica em processos de negócio” que remeteu à Ré, no qual identificou problemas, causas e consequências, oportunidades e elencou recomendações [resposta aos artigos 22º, 47º da contestação].
16. Por email de 29 de Agosto de 2016 a Autora remeteu à Ré “proposta de acções imediatas” elencando como “principais funcionalidades do sistema de chão de fábrica”:
- controlo integral de entradas e saídas de matérias primas, componentes, produtos intermédios e produtos acabados com PDA’s (em tempo real);
- planeamento integrado de produção;
- registo de produção em tempo real;
- abastecimento de linhas de produção com PDA’s; - gestão de rastreabilidade dos lotes;
- custeio de produção;
- execução do autocontrolo de qualidade;
- registo de pedidos de retirada de produto acabado; - execução de autocontrolo de manutenção;
- controlo de manutenção curativa;
- gestão e controlo da manutenção preventiva;
- integração com o portal B2B no que fiz respeito à colheita e processamento de encomendas e disponibilização de fichas técnicas;
- controlo de serviço de encomendas (níveis de serviço) [resposta aos artigos 3º da injunção, 15º da contestação, 17º da réplica].
17. No email referido em 16) a Autora propôs que o prazo de execução seria de cerca de 12 meses propondo uma mensalidade a ser paga durante 18 meses, com duas opções:
1. A - registo oficial de stocks e sua localização feita no PHC: € 2.240;
2. B - registo oficial de stocks e sua localização feita no chão de fábrica: € 2.580 [resposta ao artigo 17º da contestação].
18. Em anexo ao email identificado em 16), tendo por referência alguns dos problemas elencados no relatório identificado em 15), a Autora apresentou à Ré “proposta de ações de projeto de consultoria estratégica em processos de negócio” recomendando executar de imediato ações em três grupos designados:
a) “eliminação de erros de stock”;
b) “serviço de encomendas”;
c) “avulsos” [resposta ao artigo 16º da contestação].
19. No grupo identificado em 18) a) referia “trazer rigor aos stocks é determinante e como tal este grupo deverá avançar desde já:
1. implementar a recepção de materiais de fornecedores em tempo real (ação líder)
2. implementar o controlo em tempo real dos subcontratados (ação líder)
3. implementar um sistema de abastecimento à produção baseado em PDA´s
4. implementar o registo da produção em tempo real
5. localizar todo o stock da empresa.

Todo este grupo está fortemente condicionado pela existência de uma aplicação de chão de fábrica que realmente funcione e, como tal, implica desenvolver e assentar a base da aplicação de chão de fábrica” (…) tendo a seguinte funcionalidade prevista:

1. recepção de matérias primas
2. aviamento de produtos para a produção com cálculo integrado das formulações quando aplicável
3. registo de produção, contemplando em simultâneo a produtividade de cada máquina e de cada operador
4. registo de pedido de abastecimento à produção
5. registo de pedidos de retirada de produto acabado
6. envio e recepção de produto para os subcontratados, com o controlo simultâneo de pagamento de serviços
7. entrada de produção no armazém de produto acabado
8. expedição para os clientes [resposta ao artigo 16º da contestação].
20. Relativamente ao grupo identificado em 18) b) referia que “agrega as acções relacionadas com o serviço de encomendas, onde se recomenda:
1. Definir uma Politica de Gestão de Stocks da Empresa (acção líder)
2. Estabelecer uma Data de Entrega da cada Encomenda (acção líder)
Estas duas ações irão permitir aumentar a rapidez e o rigor com que as encomendas dos clientes são servidas.”
21. No grupo identificado em 18) c) referia agrega os aspetos avulso que não impliquem qualquer tecnologia ou desenvolvimento informático e que podem ser iniciados desde já. Inclui também as ações secundárias:
1. elaborar planos de manutenção autónoma e preventiva. Para posterior carregamento e integração na aplicação de gestão do chão de fábrica. 2. elaborar documentação e procedimentos. Idem
3. elaborar a lista de pendentes PHC. Irá permitir fechar os assuntos e os erros sistematicamente.
4. avaliar as dependências estratégicas de pessoas ou de máquinas, identificando-as e propondo um plano de contingência.
5. adquirir vasilhame de suporte de semi-acabados. A produção está a parar por este motivo em certos momentos.
6. avaliar a continuidade do Primavera. Menos um sistema para manter quer tecnicamente quer em termo de licenças.
7. avaliar a oportunidade de uma máquina de testes. Estudar a oportunidade operacional e económica desta opção [resposta ao artigo 16 da contestação].
22. A Ré aceitou a proposta identificada em 16) a 21) em Setembro de 2016, referente à opção B [resposta ao artigo 18º da contestação]
23. A Autora emitiu em nome da Ré as seguintes facturas, com IVA incluído:
a) nº F 2017A/37, emitida em 28.04.2017, com vencimento em 28.05.2017, no montante de € 1.808,10;
b) nº F 2017A/40, emitida em 17.05.2017, com vencimento em 17.06.2017, no montante de € 3.173,40;
c) nº F 2017A/42, emitida em 29.05.2017, com vencimento em 29.06.2017, no montante de € 1.808,10;
d) nº F 2017A/43, emitida em 20.06.2017, com vencimento em 20.07.2017, no montante de € 3.173,40;
e) nº F 2017A/44, emitida em 17.07.2017, com vencimento em 17.08.2017, no montante de € 1.808,10;
f) nº F 2017A/45, emitida em 27.07.2017, com vencimento em 27.08.2017, no montante de € 3.173,40;
g) nº F 2017A/51, emitida em 11.10.2017, com vencimento em 11.11.2017, no montante de € 1.808,10;
h) nº F 2017A/52, emitida em 11.10.2017, com vencimento em 11.11.2017, no montante de € 3.173,40;
i) nº F 2017A/54, emitida em 30.10.2017, com vencimento em 30.11.2017, no montante de € 6.346,80;
j) nº F 2017A/57, emitida em 16.11.2017, com vencimento em 16.12.2017, no montante de € 3.173,40;
k) nº F 2017A/59, emitida em 13.12.2017 com vencimento em 13.01.2018, no montante de € 3.173,40 [resposta ao artigo 6º da injunção].
24. Todas as faturas identificadas em 23) foram enviadas pela Autora à Ré na data de emissão, tendo esta procedido à sua devolução [resposta aos artigos 7º e 8º da injunção].
25. A primeira fatura (nº F 2016A/38) referente ao acordo identificado em 6) a 13), no montante de € 1.808,10, foi emitida em 8 de Setembro de 2016 [resposta ao artigo 24º da réplica].
26. A primeira fatura referente ao acordo identificado em 16) a 21), no montante de € 3.616,20 (nº F 2016A/54), foi emitida em 13 de Setembro 2016 [resposta ao artigo 24º da réplica].
27. Em Abril de 2017 a Ré tinha pago à Autora o valor global de € 33.505 [resposta ao artigo 24º da contestação].
28. Em Agosto de 2017 a Ré pagou à Autora o valor adicional de € 7.346,80, sendo € 1.000 referente à factura identificada em 23) a) [resposta aos artigos 9º da injunção, 51º da réplica].
29. A disponibilização do servidor, dos seus componentes e da rede informática estavam a cargo da Ré [resposta ao artigo 6º da réplica].
30. Apesar do referido em 29), a Autora colaborou com a Ré prestando informação para a aquisição de um novo servidor que oferecesse condições de segurança e com características que permitissem o funcionamento do software que a demandante ia criar [resposta aos artigos 7º, 9º da réplica].
31. O servidor referido em 30) apenas foi disponibilizado em 28 de Fevereiro de 2017 [resposta ao artigo 8º da réplica].
32. Em 9 de Março de 2017, a Autora realizou reunião com os administradores da Ré e dois quadros superiores desta, tendo o seguinte programa definido previamente, sem objecção:
1, apresentação do protótipo, acerto do que eventualmente fosse necessário e aprovação do protótipo;
2- implementação do interface com o PHC quanto à parte do controlo da produção (em paralelo com o ponto anterior);
3- arranque do controlo de produção em paralelo com o PHCM – em 2 a 4 semanas incluindo:
3.1. formulação de compostos ou utilização direta de matéria prima (situação em secção de metais e componentes de montagem);
3.2. plataforma de seção de injeção com respetiva ligação a plataforma de formulação; 3.3. plataforma de extrusão com respetiva ligação a plataforma de formulação;
3.4. plataforma de fabrico de componentes metálicos; 3.5. plataforma de montagem;
3.7. subcontratação de mão de obra – envio, receção e gestão;
3.8. módulos periféricos de inventário de moldes, ferramentas, manutenção, etc (parte, mediante o andamento do projeto);
3.9. simulação de integração do Silex com o PHC gestão;
4. preparação do arranque da funcionalidade de gestão de armazéns e stock (em paralelo com 3);
5. aceitação do funcionamento do controlo de produção;
6. arranque da funcionalidade de controlo de gestão de armazéns e stocks
7. aceitação do funcionamento da funcionalidade de gestão de armazéns e stocks [resposta ao artigo 11º da réplica].
33. Na reunião referida em 32), sem fazer reparo quanto ao que foi apresentado pela Autora, a Ré solicitou a mudança de metodologia para implementação gradual e progressiva do projeto pelo planeamento, passando, de seguida, para o controlo de produção e, posteriormente, para a gestão de stocks [resposta aos artigos 13º, 35º, 44º da réplica].
34. Em 14 de Março de 2017 a Autora apresentou à Ré a proposta de método de planeamento [resposta ao artigo 26º da réplica].
35. Em Abril e Maio de 2017 a Autora desenvolveu a componente de planeamento [resposta ao artigo 14º da réplica].
36. A definição da política de gestão de stocks iniciou-se em Setembro de 2016 e durou até Julho de 2017 [resposta ao artigo 20º da réplica].
37. A Autora apresentou propostas de metodologias e evolução do projecto [resposta ao artigo 27º da réplica].
38. A Autora deu formação a um funcionário e a uma das administradoras da Ré, via telefone [resposta ao artigo 28º da réplica].
39. Em 9 de Junho de 2017 a Ré aprovou a importação da informação relativa às fichas técnicas [resposta aos artigos 29º, 36º da réplica].
40. A Ré não transmitiu à Autora informações relativas à existência de fichas técnicas alternativas, serviços de fretes, bases de dados de moldes, o que deu origem a erros na execução do projeto pela Autora, corrigidos após prestação da informação omitida [resposta ao artigo 30º da réplica].
41. A Ré analisou e reviu o planeamento sem ter apresentado reparo e, em 20 de Outubro de 2017, depois de pedir desculpa pelo atraso, propôs a realização de teste por dois dos seus administradores e a engenheira informática da Autora [resposta ao artigo 37º da réplica].
42. As acções identificadas em 18) a 21) implicavam a colaboração mútua entre Autora e Ré com o objectivo de melhorar a prestação operacional da segunda e preparar o desenvolvimento do projeto e instalação do sistema informático [resposta ao artigo 18º da réplica].
43. A Autora desenvolveu o software a implementar na Ré a partir da sua sede por telefone e email e através de reuniões presenciais do seu gerente na sede da demandada [resposta ao artigo 28º da contestação, 39º da réplica].
44. A realidade da Ré e as suas metodologias de trabalho implicam que o desenvolvimento de soluções informáticas para o planeamento e controlo de chão de fábrica seja mais eficaz com a presença permanente de técnico informático com competências de programação [resposta ao artigo 29º da contestação].
45. A interface do utilizador do software desenvolvido pela Autora deveria ser de fácil utilização e intuitivo de modo a permitir agilidade na sua utilização [resposta ao artigo 33º da contestação].
46. A interface apresentada pelo software desenvolvido pela Autora implicava a utilização de dispositivos com ecrãs de grandes dimensões para a execução do programa para o respetivo visionamento de forma legível em ecrã completo ou a realização de skroll para aceder à totalidade da informação [resposta ao artigo 36º da contestação].
47. Na realidade tecnológica atual as aplicações informáticas são preparadas para poderem ser utilizadas em qualquer dispositivo, nomeadamente, smartphones, tablets, computadores portáteis, entre outros [resposta ao artigo 37º da contestação].
48. A interface referida em 46) era inadequada à utilização pelos funcionários do sector produtivo da Ré [resposta ao artigo 38º da contestação].
49. A aplicação desenvolvida pela Autora não apresenta qualquer descrição aquando da selecção do código num universo de 11.000 artigos, o que implicaria a memorização dos descritivos correspondentes a cada código pelos utilizadores ou a execução dos comandos copiar a partir da base de dados e colar no software quando estivesse em causa uma operação de planeamento [resposta aos artigos 43º da contestação, 46º da réplica].
50. A Ré necessita de software que permita efectuar de forma intuitiva, prática, eficaz, rápida e eficaz as seguintes operações:
- plano de abastecimento – planeamento
- ordens de produção
- execução de produção - gestão de compostos
- gestão de produções
- gestão de armazém/logística - gestão de stocks~
- manutenção
- montagem [resposta ao artigo 40º da contestação].
51. A funcionalidade do software desenvolvido pela Autora permite navegar por cliques, como é vulgar em qualquer browser [resposta ao artigo 46º da réplica].
52. Em 27 de Outubro de 2017 a Ré comunicou à Autora que rescindia os acordos identificados em 6) a 14) e ) 16) a 22) [resposta ao artigo 56º da contestação].
53. Em 9 de Novembro de 2017 a Ré reiterou essa comunicação, por carta, informando que o fazia ao abrigo da cláusula identificada em 13) [resposta aos artigos 57º, 58º da contestação].
54. No momento referido em 52) os administradores da Ré chegaram à conclusão que a introdução do software desenvolvido pela Autora constituiria um retrocesso na operacionalidade, obstaria à modernização da empresa, com efeitos nefastos para a sua atividade [resposta aos artigos 26º, 35º, 46º da contestação].
55. A conclusão referida em 53) foi consequência do referido em 45) [resposta ao artigo 45º da contestação].
*
Fundamentação de direito

A Ré/Recorrente invoca que o tribunal a quo violou o disposto no art. 615.º, n.º 1, al. d), do Cód. Proc. Civil, ao ter decidido como o fez.
A sentença, como acto jurisdicional, pode atentar contra as regras próprias da sua elaboração e estruturação ou contra o conteúdo e limites do poder à sombra da qual é decretada, tornando-se, nessa medida, passível de nulidade, nos termos do artigo 615.º, n.º 1 do Código de Processo Civil.

A este respeito, estipula-se no apontado normativo, sob a epígrafe de “Causas de nulidade da sentença”, aplicável aos despachos ex vi do artigo 613º nº 3 do mesmo diploma que:

“1- É nula a sentença:
a)- Quando não contenha a assinatura do juiz;
b)- Quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c)- Quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.
d)- Quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e)- Quando condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido.....”.

Os vícios determinantes da nulidade da sentença correspondem, portanto, a casos de irregularidades que afectam formalmente a sentença a provocam dúvidas sobre a sua autenticidade, (falta de assinatura do juiz), ou ininteligibilidade do discurso decisório por ausência total de explicação da razão por que decide de determinada maneira (falta de fundamentação), quer porque essa explicação conduz, logicamente, a resultado oposto do adoptado ou é manifestamente ambígua ou obscura (contradição entre os fundamentos e a decisão, ou decisão ininteligível), ou o uso ilegítimo do poder jurisdicional em virtude de se pretender conhecer questões de que não podia conhecer (excesso de pronúncia) ou por não tratar de questões de que deveria conhecer (omissão de pronúncia).
Reconduz-se a nulidade invocada, na enumeração de J. CASTRO MENDES, Direito Processual Civil, II vol., 793 a 811, i.e., a vício que enferma a própria decisão judicial em si, nos fundamentos, na decisão, ou nos raciocínios lógicos que os ligam, que tem de ser aferida tendo em consideração o disposto no artigo 608.º, n.º 2 do CPC.
Não pode, na verdade, o Tribunal conhecer senão das questões suscitadas pelas partes, excepto se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento de outras, pelo que a referida nulidade tem de resultar da violação do referido dever.
As questões a que alude a alínea em apreciação, como bem esclarece A. VARELA, RLJ, Ano 122.º, pág. 112, embora reportado ao anterior regime processual civil, mas que nesta parte se mantém inalterável são “(...) todas as pretensões processuais formuladas pelas partes que requerem decisão do juiz, bem como os pressupostos processuais de ordem geral e os pressupostos específicos de qualquer acto (processual) especial, quando realmente debatidos entre as partes …”.
Esclarece M. TEIXEIRA DE SOUSA, Estudos sobre o novo Processo Civil, Lex, 1997, 220 e 221, que está em causa “o corolário do princípio da disponibilidade objectiva (art. 264.º, n.º 1 e 664.º 2.ª parte) o que significa que o tribunal deve examinar toda a matéria de facto alegada pelas partes e analisar todos os pedidos formulados por elas, com excepção apenas das matérias ou pedidos que forem juridicamente irrelevantes ou cuja apreciação se tornar inútil pelo enquadramento jurídico escolhido ou pela resposta fornecida a outras questões “.
Como escreve ALBERTO DOS REIS, CPC Anotado, Vol. V, 143, a propósito da omissão de pronúncia, “são, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte”.
E, refere ainda ALBERTO DOS REIS, ob. cit., 54, a propósito do que deverá entender-se por “questões suscitadas pelas partes”, que “para caracterizar e delimitar, com todo o rigor, as questões postas pelas partes, não são suficientes as conclusões que elas tenham formulado nos articulados; é necessário atender também aos fundamentos em que elas assentam. Por outras palavras: além dos pedidos propriamente ditos, há que ter em conta a causa de pedir. Na verdade, assim como uma acção só se identifica pelos seus três elementos essenciais (sujeitos, objecto e causa de pedir), ..., também as questões suscitadas pelas partes só ficam devidamente individualizadas quando se souber não só quem põe a questão (sujeitos) e qual o objecto dela (pedido), senão também qual o fundamento ou razão do pedido apresentado (causa de pedir)”, mais esclarecendo que: “uma coisa é tomar em consideração determinado facto, outra conhecer de questão de facto de que não podia tomar conhecimento; o facto material é um elemento para a solução da questão, mas não é a própria questão”.
Salienta-se, por outro lado, no Ac. do STJ de 06.05.04 (Pº 04B1409), acessível na Internet, no sítio www.dgsi.pt, a propósito da omissão de pronúncia, que “(...) terá o julgador que identificar, caso a caso, quais as questões que lhe foram postas e que deverá decidir. (....) E se, eventualmente, o juiz, ao decidir das questões suscitadas, tem por assentes factos controvertidos ou vice-versa, qualifica juridicamente mal uma determinada questão, aplica uma lei inapropriada ou interpreta mal a lei que devia aplicar, haverá erro de julgamento, mas não nulidade por omissão de pronúncia ”.
In casu, a Apelante diz que o tribunal a quo fez uma errada interpretação e aplicou erradamente o disposto no art. 802.º, do Cód. Civil, o que em nosso entender contende com um hipotético erro de julgamento e não com uma falta de pronúncia.
Pois, tendo-se considerado verificar-se uma revogação lícita do acordo celebrado entre as partes, com a consequente obrigação de pagamento das facturas emitidas pela A./Recorrida relativamente os serviços prestados até à data da extinção do vínculo existente entre as partes, acrescido dos respectivos juros desde a data do seu vencimento, não se vislumbra ocorrer o vício que aponta a Recorrente à sentença ao julgar-se improcedente a reconvenção que se baseava na invocação da alegada excepção de não cumprimento, sem a apreciação dessa excepção, face ao respectivo enquadramento jurídico dos factos.
Como tal, tem de se considerar não se verificar a nulidade arguida, antes sendo de apreciar as questões colocadas como consubstanciando o alegado erro de julgamento.
A questão a decidir terá por base a qualificação jurídica do contrato celebrado entre as partes como de prestação de serviço (artigo 1154.º do Código Civil), tal como o entendeu o tribunal a quo e é comumente aceite pelas partes, em conformidade com o que resulta, aliás, dos factos provados.
É sabido que tal contrato não dispõe de regime próprio e que lhe são aplicáveis, com as devidas adaptações, as disposições do contrato de mandato (artigo 1156.º do Código Civil).
Com efeito, o regime do mandato é subsidiário para todas as modalidades de prestação de serviços não reguladas legalmente (cf. Ana Prata (org.), Código Civil Anotado, I Vol., p. 1428).
À luz do regime jurídico do contrato de mandato é possível fazer cessar o contrato por vontade unilateral provinda do mandante ou do mandatário e independentemente da apresentação de qualquer motivo justificativo (n.º 1 do artigo 1170.º do Código Civil). Trata-se de uma faculdade que excepciona a regra constante do n.º 1 do artigo 406.º do mesmo diploma (inserindo-se, pois, na ressalva constante da parte final desse preceito).
Como aí se preceitua, o mandato é revogável por qualquer das partes, não obstante convenção em contrário ou renúncia ao direito de revogação. Trata-se de um norma imperativa que não pode ser afastada por convenção em contrário das partes. «A norma imperativa actua num plano que está para além das estipulações negociais, pois vale independentemente delas e apesar delas» - Carvalho Fernandes, Teoria Geral do Direito Civil, vol. II, 1996, p. 310. Nas palavras de A. Varela e Pires de Lima, Código Civil Anotado, Vol. II, p. 729, «A revogação unilateral de um contrato só é admitida, nos termos do artigo 406º, nos casos excepcionais previstos na lei. Este, de revogação do mandato, quer gratuito, quer oneroso (cf. Art. 1172º, alínea c)), é um deles.» A explicação para esta revogabilidade «(…) justifica-se pela já aludida configuração do mandato como contrato de gestão, em que a actividade gestória do mandatário é programada pelo mandante, com a consequente alienidade da actividade desenvolvida, da operação económica no seu conjunto e, logo, nos seus resultados; a livre revogabilidade pelo mandato tem, assim, por fundamento o seu interesse, o facto de o mandante ser o dominus do acto ou da actividade a desenvolver pelo mandatário» - Januário da Costa Gomes, Contrato de Mandato, 1990, pp. 120-121. Em sentido confluente, Irene de Seiça Girão, “Mandato de interesse comum”, in Comemorações dos 35 Anos do Código Civil e dos 25 Anos da Reforma de 1977, Vol. III, p. 381, afirma que: «Se o mandante recorre à cooperação do mandatário tendo em vista um determinado resultado que só a si respeita interessa, não faria sentido mantê-lo vinculado ao negócio quando, por qualquer motivo, perca o interesse na sua obtenção.»
A revogação do mandato, no caso em análise, é de caracterizar como uma manifestação de vontade discricionária que não está subordinada à invocação de qualquer fundamento (cfr. José Carlos Brandão Proença, A Resolução do Contrato no Direito Civil - Do enquadramento e do regime, Coimbra, págs. 48 a 51), embora se lhe reconheça uma eficácia extintiva meramente ex nunc, o que significa que não se extinguem os direitos da parte a quem é imposta a revogação, sendo-lhe, consequentemente, inaplicável a disposição do artigo 433.º do Código Civil, preceito que equipara os efeitos da declaração resolutiva aos efeitos da anulabilidade (artigo 289.º do mesmo diploma).
Torna-se, pois, claro que a revogação unilateral não é passível de ser confundida com a resolução do contrato, apesar de a resolução operar, em regra, também por um acto jurídico unilateral (n.º 1 do artigo 436.º do Código Civil).
Na verdade, a resolução contratual apenas é admitida nos casos previstos no contrato ou na lei (n.º 1 do artigo 432.º do mesmo código), sendo indistintamente atribuída a qualquer uma das partes contratantes e assenta, em regra, num poder vinculado, porquanto o autor da declaração resolutiva tem de alegar e demonstrar o fundamento resolutivo que suporta a destruição retroactiva da relação contratual.
Por outro lado, a atribuição de eficácia retroactiva à declaração resolutiva visa repor, para o contraente cumpridor, a situação de que era titular aquando da celebração do contrato através da restituição do que prestou. A atribuição da eficácia retroactiva à resolução está indissociavelmente ligada à função recuperatória-liberatória desse mecanismo, o que ajuda a perceber as limitações à eficácia retroactiva, nomeadamente, a consagrada no n.º 2 do artigo 432.º do Código Civil.
Acresce que, como é sabido, a extinção unilateral de qualquer relação contratual pode efectuar-se mediante figuras jurídicas, conceitualmente distintas, tais como a resolução ou rescisão, a revogação e a denúncia.
Considerando que a terminologia legal não é unívoca, quando se está perante relações contratuais duradouras em que há prestações de cumprimento diferido no tempo ou quando do contrato emerjam obrigações de execução continuada ou periódica, há que estabelecer alguns aspectos distintivos entre essas figuras jurídicas – v. a propósito J. BATISTA MACHADO, RLJ, Ano 118, 276 e ss., em anotação ao Ac. STJ de 08.11.1983.
A denúncia é uma forma de extinção privativa de contratos de execução duradoura, em regra por tempo indeterminado, que opera pela comunicação de uma parte à outra de que não deseja a manutenção do contrato, produzindo-se os respectivos efeitos extintivos do contrato apenas para o futuro.
Por seu turno, a resolução traduz-se também numa forma de extinção dos contratos, por vontade unilateral de um dos contraentes, mas vinculada a um fundamento legal ou convencional – uma perturbação na execução do contrato que afecta o interesse do credor. Distingue-se também da denúncia visto, em princípio, ter efeitos retroactivos, tudo se passando como se o contrato resolvido tivesse sido declarado nulo ou anulado, salvo se tal contrariar a vontade das partes ou a finalidade da resolução.
Finalmente, na revogação, a extinção da relação contratual por manifestação de vontade do seu autor é, em regra, discricionária, podendo derivar também do acordo das partes. Tratando-se de um meio de extinção ex nunc, os efeitos decorrentes desta forma de extinção de um negócio jurídico são, em regra, apenas para o futuro.
No contrato de mandato avulta a especificidade da desvinculação unilateral operada pela vontade de um único contraente, tratando-se de uma faculdade discricionária, que não depende de qualquer fundamento para ser eficaz e que não opera retroactivamente, e, nesse sentido, aproxima-se da denúncia.
No caso em apreço, a prestação de serviços em causa é onerosa. Mas, não está demonstrada a existência de uma diversidade de relações jurídicas, tudo se passando no âmbito da mesma relação contratual que se mostra submetida ao regime do mandado, pelo que se entende não ter aplicação o nº 2 do artigo 1170º do C.C.
Já quanto à excepção invocada, a jurisprudência tem entendido que “A exceptio non adimpleti contractus vale tanto para a falta integral de cumprimento como para o cumprimento parcial ou defeituoso.” - Cfr. Ac. da Rel. de Coimbra de 06-03-2007, proc. nº 971/03.5TBFND.C1, acessível em www.dgsi.pt/jtrc; em igual sentido se sustentou no Ac. da Rel. de Coimbra de 11-09-2007, proc. nº 5670/04.8TBLRA.C1, igualmente acessível em www.dgsi.pt/jtrc.
No 1º dos arestos refere-se que: «Nos termos do artigo 428.º, n.º 1, do Código Civil, «Se, nos contratos bilaterais não houver prazos diferentes para o cumprimento das prestações, cada um dos contraentes tem a faculdade de recusar a sua prestação enquanto o outro não efectuar a que lhe cabe ou não oferecer o seu cumprimento simultâneo». Os pressupostos da excepção de não cumprimento do contrato são: a existência de um contrato bilateral, a não existência da obrigação de cumprimento prévio por parte do contraente que invoca a excepção, não cumprimento ou não oferecimento do cumprimento simultâneo da contraprestação; não contrariedade à boa fé.
Esta excepção é o meio de assegurar o respeito pelo princípio do cumprimento simultâneo das obrigações sinalagmáticas – (cf. Dr. José João Abrantes, A excepção de não cumprimento do contrato, 1986, págs. 39 e seguintes). Como se referiu no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 11 de Dezembro de 1984, onde se citam diversos elementos da doutrina, “A excepção de inadimplência «é um reflexo do sinalagma funcional», «um corolário da interdependência das obrigações sinalagmáticas». Correspondendo a «uma concretização do princípio da boa fé», «é um meio de compelir os contraentes ao cumprimento do contrato e de evitar resultados contraditórios com o equilíbrio ou equivalência das prestações que caracteriza o contrato bilateral». Apesar de a lei apenas prever a hipótese de não haver prazos diferentes para o cumprimento das prestações, entende-se comummente que a excepção pode ser invocada ainda que haja vencimentos diferentes, por aquele dos contraentes cuja prestação deva ser feita depois da do outro; só não poderá opô-la o contraente que devia cumprir primeiro” – (cf. Bol. Min. da Justiça, n.º 342, págs. 355 e seguintes, nomeadamente, pág. 357).»
Recorde-se que a exceção de não cumprimento do contrato tem por função obstar temporariamente ao exercício da pretensão do contraente, consistindo numa recusa provisória de cumprir a sua obrigação por parte de quem alega, sem que acarre a extinção do direito de crédito de que é titular o outro contraente – cfr. JOSÉ JOÃO ABRANTES, in “A excepção de não cumprimento do contrato no Direito Civil Português, Conceito e Fundamento”, Almedina, Coimbra, a págs. 128.
Sendo, assim, uma excepção material dilatória: o excipiens não nega o direito do autor ao cumprimento nem enjeita o dever de cumprir a prestação; pretende tão só um efeito dilatório, o de realizar a sua prestação no momento (ulterior) em que receba a contraprestação - Cfr., neste sentido, CALVÃO DA SILVA, in “Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória”, Coimbra, 1987, a págs. 333 e segs.

Isto é, oposta a excepção, o excipiens vê suspensa a exigibilidade da sua prestação, suspensão que se manterá enquanto se mantiver a posição de recusa do outro contraente que deu causa à invocação da exceptio.
Trata-se, assim, de uma recusa temporária do devedor, perante um credor que também ainda não cumpriu, que, por essa via, retarda legitimamente o cumprimento enquanto a outra parte no sinalagma contratual também não realizar a prestação a que está adstrita - neste sentido, vide o acórdão do STJ de 13-12-2007, no proc. nº 07A4040, disponível em www.dgsi.pt/jstj.

Ora, in casu, em 27.10.2017, a Ré/Recorrente comunicou à A/Recorrida que rescindia os acordos entre ambas celebrados (cfr. ponto 52, dos factos provados), reiterando essa comunicação a 9.11.2017, informando que o fazia ao abrigo da cláusula prevista na proposta apresentada pela A. em Julho de 2016, de que, se em qualquer momento a Ré decidisse não prosseguir com o projecto, por um qualquer motivo, desde que não especificado, nem previsto, nem imputável à A., seria facturado na totalidade o mês em curso que se consideraria automaticamente completo (cfr. pontos 6 e 13, dos factos provados).
Pese embora não tivesse indicado qualquer motivo, como resulta da factualidade constante do ponto 54, dos factos provados, no momento da primeira comunicação, tal deveu-se ao facto dos administradores da Ré terem chegado à conclusão que a introdução do software desenvolvido pela A. constituiria um retrocesso na operacionalidade, obstaria à modernização da empresa com efeitos nefastos para a sua actividade.

Por outro lado, é certo que a Ré tinha razões de insatisfação, na medida em que se provou que:

- a interface apresentada pelo software desenvolvido pela Autora implicava a utilização de dispositivos com ecrãs de grandes dimensões para a execução do programa para o res-petivo visionamento de forma legível em ecrã completo ou a realização de skroll para aceder à totalidade da informação, o que, por um lado, não corresponde às mais modernas característi-cas das aplicações informáticas, que podem ser utilizadas em dispositivos com ecrãs de pe-quenas dimensões, como acontece com os smartphones, os tablets e os computadores portáteis e, por outro, era inadequada à utilização pelos funcionários do sector produtivo da Ré;
- o software desenvolvido pela Autora não apresenta qualquer descrição aquando da seleção do código num universo de 11.000 artigos, o que implicaria a memorização dos des-critivos correspondentes a cada código pelos utilizadores do chão de fábrica visto que a exe-cução dos comandos copiar a partir da base de dados e colar no software só se tornava viável quando estivesse em causa uma operação de planeamento devido ás características do hard-ware disponível.
Contudo, o facto é que na comunicação enviada à contraparte, nada disso foi invocado, alegado e apontado como fundamento para a extinção dos acordos celebrados.
Sendo manifesta a falta de invocação pelo autor de um fundamento legal para a “rescisão” do contrato, a dita comunicação configura uma revogação unilateral, permitida pelo artigo 1170.º n.º 1 do Cód. Civil (ex vi do art. 1156.º) e não uma verdadeira “rescisão” (resolução) do contrato.
Ao comunicar a rescisão do contrato, manifestou de forma inequívoca que pretendia desligar-se em definitivo dos compromissos assumidos com a A., de por termo ao contrato, o que lhe era permitido fazer.
Por outro lado, como evidenciado na decisão proferida, do segundo acordo de implementação de acções não constava expressamente a cláusula de denúncia.
De qualquer das formas, perante a inexistência de qualquer cláusula em contrário, a Ré poderia revogar livremente o segundo contrato de prestação de serviços, nos termos já supra referenciados.
Assim, extinta, por essa forma e via, a relação contratual estabelecida entre as partes, pela comunicação efectuada a 27.10.2017, impossível se torna atender à excepção que a Ré veio só no âmbito da acção invocar, quando não o fez no tempo e momento próprio.
Pois, a invocação da exceptio non adimpleti contractus pressupõe a existência de um contrato bilateral que já não existia quando essa execepção foi invocada.
Como tal, também não se pode considerar ter-se a prestação tornado impossível, ainda que parcial, por forma a possibilitar a exigência de um qualquer cumprimento do que for possível, com redução da contraprestação, nos termos a que se alude no art. 802.º, n.º 1, do Cód. Civil, quer porque os factos apurados não permitiriam o seu enquadramento nesse preceito, quer por inexistir já qualquer relação contratual vigente.
A atender-se a essa excepção apenas após a propositura da acção intentada pela autora, sempre se teria de entender estar-se perante o exercício abusivo do direito, por parte da ré, na modalidade da supressio.
É que, na verdade, efectuada tal declaração de revogação, por aquele a quem era prestado o serviço – a ora apelante - os efeitos do contrato de prestação de serviços têm-se por cessados desde o momento em que a declaração operou.
Trata-se de um caso de responsabilidade objectiva por factos lícitos, que pode derivar da vontade das partes, como já sobejamente referido.

Nestes termos, tem de se entender ter o tribunal a quo feito a correcta e precisa interpretação e aplicação da lei, pelo que é de manter a decisão proferida, com a consequente improcedência do recurso.
*
V – Decisão

Pelo exposto, nos termos supra referidos, os Juízes da 2.ª Secção Cível, deste Tribunal da Relação de Guimarães acordam em julgar, o recurso interposto improcedente, mantendo, em consequência, o decidido.
Custas pela recorrente.
Registe e notifique.
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Guimarães, 14 de Maio de 2020
(O presente acórdão foi elaborado em processador de texto pela primeira signatária e assinado electronicamente pelo colectivo dos infra indicados Juízes Desembargadores)

Maria dos Anjos S. Melo Nogueira
Desembargador José Carlos Dias Cravo
Desembargador António Manuel Antunes Figueiredo de Almeida