Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
144/21.5YRGMR
Relator: MARGARIDA GOMES
Descritores: AÇÃO DE ANULAÇÃO DE SENTENÇA ARBITRAL
PRAZO DE OPOSIÇÃO
FORMULAÇÃO DE CONCLUSÕES
FUNDAMENTOS
NULIDADE DE SENTENÇA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/27/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I. Sendo a indicação do prazo para a contestação elemento imprescindível do ato de citação, e isto porque, a sua não observância tem efeitos processuais, designadamente, a revelia, regulada nos artº 566º a 568º do Código de Processo Civil, não pode, sob pena de ser o seu destinatário prejudicado, deixar de prevalecer o prazo indicado no ato de citação, desde que o mesmo seja o que legalmente se encontra estabelecido, ou seja um prazo de defesa superior ao legal (neste caso, com base no disposto no nº 6 do artº 157º do Código de Processo Civil.
II. A ação de anulação de decisão arbitral é uma ação especial regulada pela LAV sendo que da leitura dos preceitos legais que a regulam, a saber, do artº 46º, nº 2, resulta não haver aquando da proposição da ação de anulação de decisão arbitral perante um Tribunal da Relação, a necessidade da apresentação de conclusões, como em sede recursória.
III. A impugnação da decisão arbitral somente se pode fazer “através do pedido da sua anulação, e nos estritos e taxativos fundamentos do artigo 46.º da Lei da Arbitragem Voluntária, os quais se assumem como vícios ou irregularidades “a latere” do objeto/mérito do litígio.
IV. Deste modo, em sede de impugnação da sentença arbitral, está vedada a apreciação do mérito, não comportando a presente ação de anulação a reapreciação da prova produzida com vista à alteração da decisão sobre a matéria de facto.
Decisão Texto Integral:
Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães:

I. RELATÓRIO:

A 21 de junho de 2020, AA apresentou uma reclamação de consumo tendo em vista o seguinte efeito: “pretende o Requerente que as Requeridas demonstrem o consumo real efetuado entre o período de 02-12-2019 até à presente data (portanto, até 21 de junho de 2020) e corrijam a faturação de acordo com o consumo real verificado, bem como creditem o valor global de €42,75 de CAV, por estar convicto de que não foi atingido os 400 Kwh de consumo” – conforme resulta do documento que junta sob o número 1, que se dá por inteiramente reproduzido, que é a reclamação apresentada pelo Reclamante.

A esse processo foi atribuído o número ...20.

Citada veio a E... – apresentar a sua contestação, alegando, designadamente, que:

a. O contrato de fornecimento de energia elétrica foi celebrado entre o Reclamante e as Reclamadas em 30 de maio de 2008, sendo um contrato provisório de obras,
b. Desde então e até ao dia 12 de dezembro de 2019 esteve instalado um contador que nesta data foi substituído por estar desparametrizado,
c. O novo contador passou a fazer o registo dos consumos realizados no prédio já identificado, sem registo de qualquer anomalia, apesar da reclamação apresentada pelo Reclamante, a que corresponde a ordem de serviço n.º ...09,
d. Os consumos médios realizados pelo Reclamante no prédio identificado aumentaram gradualmente desde 16 de abril de 2019 até fevereiro de 2020,
e. Todas as leituras registadas pelos contadores são leituras reais, recolhidas pelos técnicos da E...,
f. O período de aumento dos consumos corresponde às estações de outono e inverno, que demandam maiores consumos energéticos, nomeadamente, com aquecimento,
g. Não é à E... que incumbe a faturação da energia consumida,
A Requerida juntou documentos visando demonstrar o alegado e pugnando pela improcedência da reclamação apresentada pelo Reclamante.

Realizada a audiência, foi proferida sentença no dia 6 de junho de 2021, remetida às partes no dia 9 de junho de 2021, a qual declarou, em sede de dispositivo, que:

“1)Julgo improcedente a exceção dilatória de incompetência material alegada pelas partes, reconhecendo-se este Tribunal competente para apreciar a questão;
2)Julgo improcedente a exceção dilatória de ilegitimidade passiva alegada pela Requerida2 E...;
3)Julgo parcialmente procedente a presente demanda, condenando a Requerida E... a proceder à retificação das leituras reais referentes ao local de consumo em crise no período entre 02/12/2019 e 10/02/2020, por as julgar como não devidas;
4)Absolvendo as Requeridas em tudo o mais peticionado”.

Posteriormente à notificação da sentença, a Reclamada E... requereu ao tribunal arbitral o esclarecimento da sentença arbitral (que se junta como documento ..., que se dá por reproduzido e integrado na totalidade), uma vez que:

a. A E... juntou com a contestação documento que demonstra que o contador instalado na propriedade do Requerido se encontrava com leitura inicial zero – documento ...;
b. A E... juntou com a contestação documentos que demonstram que procedeu à comunicação ao Requerente do propósito de verificação do contador a 2 de dezembro de 2019, para a mesma morada para a qual eram enviadas as faturas dos consumos de energia elétrica – documentos ... e ...;
c. O requerente rececionou todas as faturas enviadas por correio, para a mesma morada para onde foi enviada a comunicação de intenção de verificação do contador de 2 de dezembro de 2019;
d. O contador instalado foi substituído no dia 2 de dezembro de 2019, por desparametrização;
e. O novo contador instalado a 2 de dezembro de 2019 começou a contagem com leitura inicial 0;
f. As leituras correspondem a consumos reais, e foram esses valores que foram comunicados à E... – e, por consequência, faturados ao Reclamante;
g. Pelo que, não é possível corrigir as leituras.

Após contraditório do Requerente, a Mm.ª Juiz-Árbitro veio proferir despacho no dia 21 de julho de 2021, decidindo, em suma, pelo indeferimento da pretensão de prolação de pedido de esclarecimento adicional de sentença arbitral, pois que a E... havia confundido o pedido de esclarecimento do artigo 45.º, nºs 2 e 3 da LAV com a impugnação da matéria de facto, o que extravasa a jurisdição do Tribunal Arbitral – art.º 44.º, n.º 3 da LAV (que se junta como documento ..., que se dá por reproduzido e integrado na totalidade).

Veio então a E... – Distribuição de Eletricidade, S.A. propor contra AA, ação anulação de sentença arbitral, nos termos e para os efeitos consignados no artº 46º, nºs 1, 2, e 3, alínea a), subalíneas v) e vi) e no artº 42º, n.º 3 da LAV, o que faz com os seguintes fundamentos:

1. O CIAB – Tribunal Arbitral de Consumo, enquanto Tribunal Arbitral, é um órgão de soberania independente, competente para administrar a justiça em nome do povo, estando apenas sujeito à lei, designadamente à CRP, à Lei n.º 144/2015, de 08 de setembro, ao seu próprio Regulamento, a Lei da Arbitragem Voluntária (LAV) e ao CPC.
2. O R. é proprietário do prédio urbano sito na Rua ..., ... (...), tendo celebrado com a E..., S.A. o fornecimento de energia elétrica no identificado prédio.
3. A A. E... exerce, em regime de concessão de serviço público, a atividade
de distribuição de energia elétrica em alta, média e baixa tensão no concelho ... (cf. art.os 31.º, 35.º, 70.º e 71.º do DL n.º 29/2006, de 15/02, alterado pelo DL 215-A/2012, de 08/10, e art.os 38.ºe 42.º do DL n.º 172/2006, de 23/08, alterado pelo DL 215-B/2012, de 08/10, e no art.º 1.º do DL n.º 344-B/82 de 1/09),
4. Sendo responsável pelo abastecimento de energia elétrica, instalação do equipamento de medição – contador – e leitura das grandezas registadas e medidas nesses equipamentos de medição no prédio identificado em 2. e por força do contrato a que este número alude.
5. Em 21 de junho de 2020, o R. apresentou uma reclamação de consumo tendo em vista o seguinte efeito: “pretende o Requerente que as Requeridas demonstrem o consumo real efetuado entre o período de 02-12-2019 até à presente data (portanto, até 21 de junho de 2020) e corrijam a faturação de acordo com o consumo real verificado, bem como creditem o valor global de €42,75 de CAV, por estar convicto de que não foi atingido os 400 Kwh de consumo” – conforme resulta do documento que junta sob o número 1, que se dá por inteiramente reproduzido, que é a reclamação apresentada pelo Reclamante.
6. A esse processo foi atribuído o número ...20.
7. A A. – E... – apresentou a sua contestação, alegando, designadamente, que:
a. O contrato de fornecimento de energia elétrica foi celebrado entre o Reclamante e as Reclamadas em 30 de maio de 2008, sendo um contrato provisório de obras,
b. Desde então e até ao dia 12 de dezembro de 2019 esteve instalado um contador que nesta data foi substituído por estar desparametrizado,
c. O novo contador passou a fazer o registo dos consumos realizados no prédio já identificado, sem registo de qualquer anomalia, apesar da reclamação apresentada pelo Reclamante, a que corresponde a ordem de serviço n.º ...09,
d. Os consumos médios realizados pelo Reclamante no prédio identificado aumentaram gradualmente desde 16 de abril de 2019 até fevereiro de 2020,
e. Todas as leituras registadas pelos contadores são leituras reais, recolhidas pelos técnicos da E...,
f. O período de aumento dos consumos corresponde às estações de outono e inverno, que demandam maiores consumos energéticos, nomeadamente, com aquecimento,
g. Não é à E... que incumbe a faturação da energia consumida,
8. Juntando documentos que o demonstram e pugnando pela improcedência da reclamação apresentada pelo R. – tudo conforme melhor resulta do documento que ora junta sob o número 2, que se dá por integralmente reproduzido, que corresponde à contestação e documentos apresentados pela E....
9. Realizada a audiência, foi proferida sentença (que se junta como documento ..., que se dá por reproduzido e integrado na totalidade) no dia 6 de junho de 2021, remetida às partes no dia 9 de junho de 2021, a qual declarou, em sede de dispositivo, que:
“1) Julgo improcedente a exceção dilatória de incompetência material alegada pelas partes, reconhecendo-se este Tribunal competente para apreciar a questão;
2) Julgo improcedente a exceção dilatória de ilegitimidade passiva alegada pela Requerida2 E...;
3) Julgo parcialmente procedente a presente demanda, condenando a Requerida E... a proceder à retificação das leituras reais referentes ao local de consumo em crise no período entre 02/12/2019 e 10/02/2020, por as julgar como não devidas;
4) Absolvendo as Requeridas em tudo o mais peticionado”.
10. Posteriormente à notificação da sentença, a A. requereu ao tribunal arbitral o esclarecimento da sentença arbitral (que se junta como documento ..., que se dá por reproduzido e integrado na totalidade), uma vez que:
a. A E... juntou com a contestação documento que demonstra que o contador instalado na propriedade do Requerido se encontrava com leitura inicial zero – documento ...;
b. A E... juntou com a contestação documentos que demonstram que procedeu à comunicação ao Requerente do propósito de verificação do contador a 2 de dezembro de 2019, para a mesma morada para a qual eram enviadas as faturas dos consumos de energia elétrica – documentos ... e ...;
c. O requerente rececionou todas as faturas enviadas por correio, para a mesma morada para onde foi enviada a comunicação de intenção de verificação do contador de 2 de dezembro de 2019;
d. O contador instalado foi substituído no dia 2 de dezembro de 2019, por desparametrização;
e. O novo contador instalado a 2 de dezembro de 2019 começou a contagem com leitura inicial 0;
f. As leituras correspondem a consumos reais, e foram esses valores que foram comunicados à E... – e, por consequência, faturados ao Reclamante;
g. Pelo que, não é possível corrigir as leituras.
11. Após contraditório do R., a Mm.ª Juiz-Árbitro veio proferir despacho no dia 21 de julho de 2021, decidindo, em suma, pelo indeferimento da pretensão de prolação de pedido de esclarecimento adicional de sentença arbitral, pois que a E... havia confundido o pedido de esclarecimento do artigo 45.º, n.os 2 e 3 da LAV com a impugnação da matéria de facto, o que extravasa a jurisdição do Tribunal Arbitral – art.º 44.º, n.º 3 da LAV (que se junta como documento ..., que se dá por reproduzido e integrado na totalidade).
12. Identifica a A. os seguintes vícios quanto a esta sentença arbitral:
a. não é exequível;
b. condenou em objeto diverso do pedido;
c. conhece questões de que não podia tomar conhecimento;
d. deixou de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar;
e. foi proferida com violação do requisito estabelecido no n.º 3 do artigo 42.º da LAV.
Da não exequibilidade da sentença arbitral
13. E não é exequível, porque deflui da sua fundamentação que “resulta provada a ausência de qualquer anomalia no equipamento de contagem substituído a 02/12/2019 (a par da sua desparametrização), pelo que, provando-se que as Requeridas prestaram os aludidos serviços de fornecimento e distribuição de energia elétrica, na quantidade exata que consta daquela fatura junta aos autos, pois que não foi abalado o documento/faturação, início de prova, no que às leituras reais se reportam (...) o Tribunal só poderá conhecer dos consumos a partir da data de substituição do equipamento ou seja 02/12/2019) (...) Pelo que, e no que a esta fatura se refere há que improceder a pretensão do Requerente.”
14. As leituras são reais, ou seja, correspondem a consumo efetivo.
15. As causas do aumento desse consumo efetivo podem ser várias, desde a passagem de um consumo de obras – bastante menos “gastador” –, para um consumo de habitação, que demanda mais energia elétrica, para alimentação, designadamente, de eletrodomésticos de utilização permanente, mesmo que o contrato se tenha mantido o mesmo.
16. E isto vale mesmo tratando-se de uma segunda habitação.
17. Há um problema de base na sentença que a torna impossível de executar pela E...: as leituras são reais, que é o que equivale a dizer que estão corretas,
18. E é isso mesmo resulta dos documentos juntos aos autos.
Da condenação em objeto diverso do pedido
19. O pedido do R. era o seguinte: “pretende o Requerente que as Requeridas demonstrem o consumo real efetuado entre o período de 02-12-2019 até à presente data (portanto, até 21 de junho de 2021) e corrijam a faturação de acordo com o consumo real verificado, bem como creditem o valor global de €42,75 de CAV, por estar convicto de que não foi atingido os 400 Kwh de consumo”.
20. Portanto, o Tribunal Arbitral, a ter considerado procedente a reclamação apresentada pelo R. – então Requerente –, só podia ter condenado as Requeridas – uma das quais a ora A. – à demonstração do consumo real efetuado no lapso temporal em causa e à correção da faturação em função desse consumo real verificado.
21. E não foi o que aconteceu, tendo condenando a E... – ora A. – à retificação das leituras, julgando-as não devidas (“julgo parcialmente procedente a presente demanda, condenando a Requerida E... a proceder à retificação das leituras reais referentes ao local de consumo em crise no período entre 02/12/2019 e 10/02/20200 por as julgar como não devidas”),
22. Pelo que, atento o princípio dispositivo – art.º 3.º. n.º 1 do CPC –, o tribunal arbitral não poderia ter declarado que não eram devidas as quantias faturadas relativas ás leituras reais referentes ao local de consumo em crise no período entre 02/12/2019 e 10/02/2020,
23. Porque tal não foi pedido.
Do conhecimento de questões de que não podia conhecer
24. Em consequência, se o tribunal arbitral não condena as Reclamadas – uma das quais a A. – no peticionado pelo então Reclamante – o ora R. – (“demonstrem o consumo real efetuado entre o período de 02-12-2019 até à presente data”), também não tem forma de saber se efetivamente esses consumos são adulterados ou não e, portanto, também não pode considerar que as quantias cobradas são devidas ou não.
25. Até porque o R. não peticionou que o tribunal arbitral declarasse que as quantias não fossem devidas, mas apenas que as Reclamadas esclarecessem as leituras.
26. Pronunciando-se também de matéria não alegada pelo R.: o direito de informação.
27. O que o R. diz na sua reclamação é que não pediu a instalação de um novo contador, não diz que o contador foi instalado sem que o consumidor tivesse sido informado: “Em 2 de dezembro de 2019, a 2.ª Requerida, por sua iniciativa e sem qualquer pedido por parte do Requerente, procede à substituição do contador – Doc. ... – conforme consta da fatura n.º ...53”.
28. Fá-lo a título informativo (não pediu e o contador foi instalado) e não a título de causa de pedir ou de pedido.
29. E nem se diga que o tribunal poderia fazê-lo porque não está vinculado à conformação legal que as partes façam da ação; podia, mas teria que haver causa de pedir, e na reclamação nem pedido, nem causa de pedir há quanto ao direito de informação – que, aliás, é um direito e não um dever (cfr. ponto 20 do Guia de Medição, Leitura e Disponibilização de Dados de Energia Elétrica para Portugal Continental, oportunamente citado na sentença arbitral em crise) e que foi cumprido, conforme resulta do documento ... junto com a contestação.
30. Ora, o tribunal arbitral decidiu que «Nos termos do disposto no ponto 20 do Guia de Medição, Leitura e Disponibilização de Dados de energia Elétrica para Portugal Continental, aprovado pelo Despacho 4591-A/2007 de 13/03 da ERSE, “as entidades com direito de acesso aos equipamentos de medição [aqui incluindo o Consumidor] têm direito a ser informados das alterações realizadas no sistema de medição e das consequências associadas, nas situações em que se verifiquem impactes na faturação dos clientes. Adicionalmente, deverão ser deixadas no local Notas de Visita nas situações de substituição ou alteração da parametrização de contadores.” Aflorando-se assim o dever de informação a que os prestadores de serviços essenciais se encontram vinculados nos termos do artigo 4º da Lei n.º 23/09 de 26 de Julho, e que inquina toda a relação de consumo nos termos do artigo 8º da LDC (Lei n.º 24/96 de 31 de Julho).
Dúvidas não restam, que este dever de informação não foi cumprido nos presentes autos, pois que não resulta provado que ao Requerente foi remetida missiva/ou rececionada por este, sob o assunto “manutenção do contador de eletricidade”, para que o Consumidor, querendo, pudesse zelar pela sua presença no momento de substituição do equipamento de contagem instalado na sua habitação».
31. Não apresenta, não suscita, nem sustenta qualquer pretensão quanto ao dever de informação – até porque, não pode bastar a qualquer Reclamante a alegação de um facto negativo para se servir de uma inversão do ónus da prova, para depois o tribunal arbitral considerar que, apesar dos documentos que demonstram a expedição de uma missiva a comunicar a intenção de proceder à alteração do contador, a regra do art.º 224.º, n.º 2 do CCivil.
32. Tanto mais que dos factos provados (“com interesse para a demanda arbitral”) e não provados não há qualquer referência à notificação do ora R. acerca da instalação do novo contador.
33. Ora, se, “com interesse para a demanda arbitral”, o único facto relevante na decisão quanto ao direito de informação pode ser o facto não provado 1. (“A Requerida E... notificou o consumidor do propósito de verificação do equipamento de contagem a 02/12/2019” – não do propósito de substituição do contador), mal se compreende porque é que na fundamentação de direito a instalação do novo contador releva para assacar responsabilidade à E....
34. Pelo que, atento o princípio dispositivo, o tribunal arbitral não poderia ter conhecido da alegada violação de um direito de informação que não foi invocada pelo R. e que não consta da factualidade relevante, sob pena de se afastar do normativo constante do art.º 3.º n.º 1 do CPC.
Da falta de pronúncia sobre questões que devia apreciar
35. Além disso, o pedido do R. refere-se ao lapso temporal que decorreu desde 02/12/2019 e “a presente data” – conforme resulta da reclamação já junta como documento n.º ... – ou o dia 21 de Junho de 2020.
36. Em momento algum o tribunal arbitral aprecia o pedido no que se reporta ao momento temporal ocorrido entre o dia 10 de Fevereiro de 2020 – data em que termina o período do consumo faturado em 1 de Abril de 2020, com a fatura n.º ...83 e o dia 21 de Junho de 2020.
37. Veja-se que da sentença arbitral consta a análise da matéria controvertida
“3.3.3.A) Do Contador Substituído – fatura n.º ...53 no valor de €200,66”,
“3.3.3. B) Do contador Substituto – fatura n.º ...83 no valor de €354,10”,
“3.3. Da C.A.V.”, mas quanto ao resto do pedido até à “presente data” nada se diz.
38. Pelo que, não há dúvidas que também nesta parte a sentença arbitral é nula, por violação do princípio dispositivo do art.º 3.º, n.º 1 do CPC, tendo o tribunal arbitral a resolvido parcialmente a questão submetida à sua apreciação.
Da violação do requisito estabelecido no n.º 3 do artigo 42.º da LAV
39. As decisões dos tribunais arbitrais são, conforme dispõe o artigo 205.º da CRP, “fundamentadas na forma prevista na lei.”
40. Assim, o n.º 1 e 3 do artigo 42.º da LAV, refere que a sentença, além de reduzida a escrito e assinada pelo árbitro deve ser devidamente fundamentada, mesmo não necessite do rigor de uma sentença judicial.
41. E a obrigação de fundamentação há-de ter por base os artigos 608.º e 615.º do CPC.
42. No caso, a fundamentação da sentença arbitral é obtusa, não permitindo às partes perceber o iter lógico que foi percorrido pelo tribunal arbitral.
43. A matéria controvertida é, segundo a reclamação inicial balizada num lapso temporal (de 2.12.2019 até “à presente data”) e versa essencialmente sobre a contagem de consumos feita por um contador: o que foi instalado no dia 2 de Dezembro de 2019.
44. Na decisão arbitral a matéria em causa é dividida entre
“3.3.3. A) Do contador Substituído – fatura n.º ...53 no valor de €200,66”
e “3.3.3. B) Do Contador Substituto – fatura n.º ...83 no valor de €354,10”.
45. A fatura n.º ...53 abrange os consumos do período compreendido entre o dia 27.11.2019 e o dia 29.1.2020 e, algures durante esse interregno, no dia 2.12.2019 o contador é substituído.
46. Ou seja, de 27.11.2019 a 1.12.2019 as contagens são feitas pelo contador substituído, e de 2.12.2019 a 29.1.2020 contagens feitas pelo contador substituto.
47. A fatura n.º ...83 só se refere a consumos contados pelo contador substituto.
48. Em termos simplistas, o que resulta da sentença é que: as leituras da fatura n.º ...53 estão certas, mesmo sendo parcialmente contabilizadas pelo contador “novo”; as leituras da fatura n.º ...83 estão erradas, sendo totalmente contabilizadas pelo contador “novo”.
49. Segundo o tribunal arbitral, quanto à fatura n.º ...53 – contador substituído+contador substituto – não assiste razão ao Reclamante, quer porque o contador substituído não tinha qualquer anomalia, quer porque a fatura se reporta a serviços efetivamente prestados pelas Reclamadas – entre elas, a A.
50. Já quanto à fatura n.º ...83 – que se reporta unicamente ao contador substituto – o caminho argumentativo que o tribunal arbitral seguiu foi o de que havia violação do direito (não dever) de informação, que não há prova de que o contador novo estivesse “a zero” – o que, apesar de ser matéria de facto, não pode deixar de dizer-se que é falso, tal como deveria ter resultado provado pelo documento ... junto com a contestação da E... –, pelo que é parcialmente procedente o pedido do R.
51. E, além disso, tal fundamentação nunca seria suficiente, porque não permite às partes perceber o iter lógico que foi percorrido pelo tribunal arbitral:
52. A sentença parte da alegada violação do direito de informação – que, além de não alegada pelo Reclamante, é falsa, porquanto foi expedida missiva a informar da intenção de verificação do contador antigo, com possibilidade de substituição do contador, para a mesma morada para a qual eram enviadas as faturas e que sempre foram recebidas pelo consumidor... com exceção da comunicação relativa ao contador – passa pelo alegado facto de o contador substituto não ter iniciado “a zero” a contagem da energia elétrica fornecida – sendo certo que resulta dos documentos juntos aos autos que o contador estava “a zero” quando foi instalado – para afirmar que as leituras estão erradas e que o valor de €354,10 não é devido.
53. Foi, por isso, violado o artigo 608.º n.º 2 do CPC, o que fundamenta a nulidade da sentença nos termos do artigo 46.º, n.º 3, al. a), subalínea vi) e do artigo 42.º, n.º 3 da LAV, e do artigo 615.º n.º 1 al. d) do CPC.
54. Aliás, lê-se no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 09.01.2018, proferido no processo n.º 191/17...., que a decisão arbitral tem de enunciar “de forma perfeitamente inteligível e apreensível pelos respetivos destinatários, os fundamentos factuais e normativos da decisão, tornando percetível o iter lógico jurídico seguido na resolução do litígio.”
55. No caso, tal não aconteceu, como se demonstrou, porque a fundamentação da sentença arbitral que ora se impugna, seja a nível factual, seja a nível normativo, não permite às partes entender o percurso lógico realizado entre o litígio submetido a apreciação do tribunal arbitral e a decisão proferida,
56. Porque o que está em causa são os efeitos da instalação de um contador nos consumos energéticos, havendo uma confusão entre direito de informação com consumos efetivos e leituras reais.
57. Até porque a sentença arbitral desconsidera por completo toda a prova documental carreada para os autos pela E..., que tem valor processual e cuja genuinidade não foi posta em causa – de acordo com o mecanismo do artigo 444.º e seguintes do CPC – tornando-se impossível à A., tendo em conta os fundamentos factuais e os fundamentos normativos alegados, perceber o percurso realizado pelo tribunal arbitral para chegar quer à imputação da responsabilidade E..., quer à afirmação de que o R. não deve aqueles valores da fatura n.º ...83.
58. Face a todos os descritos vícios, quer ao nível do processo arbitral, quer ao nível da sentença arbitral, impõe-se a anulação da mesma com os efeitos inerentes a essa anulação.
59. As partes são legítimas,
60. E estão em prazo para a propositura da presente acção.
61. Já que dispõem de 60 dias para lançarem mão do pedido de anulação da sentença arbitral, contados, no caso, desde o momento em que, nos termos do art.º 45.º, o tribunal arbitral tomou uma decisão sobre o requerimento de retificação apresentado pela A. (junto como doc. ...).
62. Como decorre do doc. ... junto com a presente petição inicial, a decisão sobre o requerimento de retificação foi tomada no dia 21 de julho de 2021, donde, a A. poderia propor a presente ação até ao dia 21 de setembro de 2021.
63. O processo é o próprio, de acordo com o art.º 46.º da LAV.
64. O tribunal é o competente, em conformidade com o que resulta das disposições conjugadas dos artigos 59.º, n.º 1, al. g) da LAV (“o Tribunal da Relação em cujo distrito se situe o lugar da arbitragem (...) é competente para decidir sobre: (...) g) A impugnação da sentença final proferida pelo tribunal arbitral, de acordo com o artigo 46.º;”), 32.º e anexo I da LOSJ, uma vez que a arbitragem se situa no distrito ....
65. Razões de Direito: artigos 46.º, n.os 1, 2, e 3, alínea a), subalíneas v) e vi) e no artigo 42.º, n.º 3 da LAV, 444.º e seguintes, 608.º e 615.º do CPC.

Termos em que, e nos demais de Direito, se requer a V.as Ex.as ordenar a citação do R. para, querendo, contestar, devendo o processo seguir os ulteriores termos e, a final, julgar-se procedente, por provada a presente ação de anulação de decisão arbitral e, em consequência, anular-se a sentença arbitral, com os efeitos consignados no artigo 46.º, n.º 10 da LAV.

Por despacho de 21 de setembro de 2021 ordenou-se a citação o Requerido nos termos e para os efeitos do disposto na al. b), do nº 2, do artº 46º da Lei 63/2011, de 14/12 (LAV), citação que ocorreu a 27 de setembro de 2021, conforme resulta do aviso de recepção.

Veio a 28 de outubro de 2021 o reclamante e requerido nos autos de ação de anulação apresentar, como advogado em causa própria, nos termos e para os efeitos do disposto na al.b), do nº 2, do artº 46º da Lei 63/2011, de 14/12 (LAV) contra alegações nos seguintes termos:.

A. ENQUADRAMENTO
1. Vem o recurso interposto da decisão do Tribunal Arbitral do Consumo de ... – CIAB que julgou a ação parcialmente procedente e, em consequência, condenou a Requerida E... a proceder à retificação das leituras reais referentes ao local de consumo em crise no período entre 02/12/2019 e 10/02/2020 por as julgar como não devidas e, subsequentemente, condenar a Requerida S... ELETRICIDADE a retificar a fatura n.º ...83 de 01/04/2020.
2. A douta decisão recorrida de fls. deve ser mantida. Crê-se que o tribunal percecionou a real dimensão e o real alcance da relação material controvertida, o que culminou numa correta e rigorosa aplicação do Direito. Com o que, alcançou a justiça material do caso concreto que constitui o fim último da realização do Direito.
3. Com efeito, o Tribunal recorrido, na apreciação da factualidade e, por conseguinte, na análise e aplicação do Direito, adotou uma posição atenta da realidade subjacente à situação jurídica concreta. Data venia!
B. DA REJEIÇÃO DO RECURSO POR FALTA DE CONCLUSÕES.
4. O Recurso interposto pela E... não obedece aos formalismos legais, pelo que se impõe a sua rejeição.
Analisemos o quadro legal, respeitante a esta matéria,
5. Expressa o art.º 637.º n. 2 do CPC: “O requerimento de interposição do recurso contém obrigatoriamente a alegação do recorrente, em cujas conclusões deve ser indicado o fundamento específico da recorribilidade; (…)”.
6. Conjugando com o preceituado no art. 639.º n.º 1 do CPC, “o Recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão”.
7. O Recurso interposto pela E... não apresenta conclusões!
8. Impõe-se, assim, a observância do estipulado no art. 641.º n. 2, al. b) do CPC:
“2 - O requerimento é indeferido quando:
b) Não contenha ou junte a alegação do recorrente ou quando esta não tenha conclusões.” - Negrito nosso.
9. Nestes termos, deve o Recurso em causa ser rejeitado, conforme, aliás, é preconizado nos seguintes acórdãos:
“a falta de conclusões a que se refere a alínea b), parte final, do n.º 2 do artigo 641.º do CPC, como fundamento de rejeição do recurso, dever ser interpretada num sentido essencialmente formal e objetivo”. – Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, Proc. 2817/18.0T8PNF.P1.S1, de 16/12/2020.
Tribunal da Relação de Coimbra Processo nº 158/11.3TBSJP.C1 de 10 de novembro de 2015:
“A interposição de um recurso em processo civil sujeita o recorrente a dois ónus: o de apresentar a sua alegação de recurso pelo qual deverá expor de modo circunstanciado as razões de direito e de facto da sua divergência relativamente ao julgado; e o de finalizar essa peça, com a formulação de conclusões, contendo a indicação resumida dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão.
A falta absoluta de alegações ou de conclusões gera o indeferimento do recurso (artigo 641º, nº2, al. b), do NCPC). Com a reforma do regime dos recursos introduzida pelo DL nº 303/2007, de 24 de Agosto, a falta de conclusões passou, a par da ausência de alegações, a constituir fundamento de rejeição de recurso (artigo 685º-C, nº2, al. b), do CPC, na redação anterior à Lei nº 41/2013). Assim, onde anteriormente se admitia o convite ao recorrente para suprimento daquela falta de conclusões, agora tal convite só ocorre quando as conclusões sejam deficientes, obscuras complexas ou quando nelas não se tenha procedido às especificações previstas no nº 2 do artigo 639º.
Quanto ao sentido a dar à “omissão absoluta” de conclusões, para o efeito de o juiz proceder ao convite ao aperfeiçoamento ou, desde logo, à pura e simples rejeição do recurso, afirma António Abrantes Geraldes: “Estabelecendo o paralelismo com a petição inicial, tal como esta está ferida de ineptidão quando falta a indicação do pedido, também as alegações destituídas em absoluto são “ineptas”, determinando a rejeição do recurso, sem que se justifique a prolação de qualquer despacho de convite à sua apresentação.”

C. DA EXEQUIBILIDADE DA DECISÃO
10. Vem a Recorrente, em sede de alegações, propugnar pela não exequibilidade da decisão recorrida, arguindo, para tanto, o seguinte:
“As leituras são reais, ou seja, correspondem a consumo efetivo.”
E ainda,
“As causas do aumento desse consumo efetivo podem ser várias, desde a passagem de um consumo de obras – bastante menos “gastador” -, para um consumo de habitação, que demanda mais energia elétrica, para alimentação, designadamente, de eletrodomésticos de utilização permanente, mesmo que o contrato se tenha mantido o mesmo.”
11. Tese que não pode proceder!
12. Desde logo porque tal como decorre das regras de experiência comum, um consumo de energia elétrica para efeito de obras é maior do que um consumo de índole doméstico, que, in caus, trata-se de uma segunda habitação, pouco utilizada.
13. E, por outro lado, a legislação aplicável ao caso concreto (Lei dos Serviços Públicos – Lei 23/96, de 26 de julho) é inequívoca nesta matéria:
Diz o artigo 11.º da referida Lei 23/96, de 26 de julho:
“1 - Cabe ao prestador do serviço a prova de todos os factos relativos ao cumprimento das suas obrigações e ao desenvolvimento de diligências decorrentes da prestação dos serviços a que se refere a presente lei.
14. Consta da matéria de facto dada como provada, que alicerçou a decisão do Tribunal Arbitral, no ponto 3.2 da sentença:
“Em sede de Declarações de parte, o requerente (…) esclareceu é uma habitação de tipologia T1, tem só um frigorífico e tem 4-5 lâmpadas LED embutidas no teto, não tendo sequer TV. (…) Tem-se deslocado muito poucas vezes ao local, e quando vai, vai durante o dia e vem à noite, não pernoitando no mesmo. Não tem qualquer outro tipo de eletrodomésticos e a única fonte de consumo de eletricidade será o frigorífico de classe A+ e os focos de luz.”
“A testemunha inquirida (…) que se mostrou isento e coerente, disse conhecer o prédio (…) tem apenas um quarto um corredor que liga para a sala, uma kitchenette e tem uma casa de banho. Questionado sobre quais os utensílios elétricos na habitação, disse que no quarto tem dois focos de luz led, outro no corredor e wc, na sala tem outros dois focos de luz e existe um frigorífico na cozinha – classe A+.
De resto não tem mais, o fogão é a gás, o forno também o é, nem sequer há TV e também já lá não vai há muito tempo. O aquecimento no inverno é feito por uma salamandra a lenha (…) nunca chegou a passar lá grandes temporadas (…) lembra-se que o uso que se fazia da casa era um fim-de-semana ou outro, esporadicamente.”
15. Dúvidas não restam que a habitação em causa apenas conta com um eletrodoméstico de utilização permanente de Classe energética A+, pelo que a tese de que o consumo doméstico, neste caso, é mais gastador do que um consumo de obras, não tem fundamento.
16. Apesar de caber à E... o ónus da prova de todos os factos relativos ao cumprimento das suas obrigações, esta não efetivou prova alguma sobre esta matéria e tenta agora, com argumentos falaciosos, colmatar a falta de prova dos factos por si alegados nos autos.
17. Verifica-se, ao invés, que o consumidor realizou prova bastante de que as leituras não corresponderem a um consumo efetivo, motivo pelo qual, terão que ser retificadas.
18. Acresce ao referido que não resultou provado que a E... notificou o consumidor do propósito de verificação do equipamento de contagem a 02/12/2019, e,
19. Não resultou igualmente provado que o contador instalado a 02/12/2019 no local de consumo em questão, apresentava como leitura inicial zero.
20. Aliás, a E... não logrou sequer arrolar como testemunha nenhuma das pessoas que supostamente estiveram no local aquando da instalação do contador em 02/12/2019.
21. Ao invés, a E... quer fazer prova com a junção de um mero documento interno, por si emitido, sem qualquer controle de terceiras entidades, como se de um documento autêntico se tratasse!
22. Pretender firmar que as leituras do contador são reais quando não resulta provado que o contador substituído a 02/12/2019 apresentava como leitura inicial zero; é insidioso.
23. A fórmula para resolver anomalias dos aparelhos de consumo está perfeitamente explicada no Guia de Medição, Leitura e Disponibilização de Dados.
24. Acresce que, sobre esta matéria, e salvo o devido respeito, ao Tribunal ad quem está vedado a apreciação do mérito da sentença, mesmo na vertente da fixação dos factos, a sua anulação por falta de fundamentação fáctica ou jurídica, apenas sendo de considerar se esta, de todo, inexistir, ou não for percetível, o que não é o caso. Com efeito, o juiz fixou os factos provados, invocou a prova e decidiu de forma adequada. Por este motivo, não cumpre ao Tribunal ad quem apreciar a bondade dos factos provados e não provados.

D. DA CONDENAÇÃO EM OBJETO DIVERSO DO LITÍGIO
25. O Requerente pugna pela demonstração o consumo real efetuado e a correção da faturação de acordo com o consumo real.
26. Subsume-se o pedido formulado pelo Requerente à pretensão de que as Requeridas demonstrem e comprovem o consumo real efetuado entre o período de 02/12/2019 até à data da submissão da reclamação junto do Tribunal Arbitral de Consumo – CIAB e corrijam a faturação de acordo com o consumo real verificado (…).
27. Do pedido deflui que o Requerente considera que os consumos que os valores faturados são excessivos e não espelham o consumo real, sendo, portanto, indevidos.
28. Aliás, na reclamação apresentada pelo consumidor, este refere expressamente: “Ora, o Requerente não pode concordar com tal valor, já que não espelha a realidade dos consumos reais” e “o Requerente não aceita que tal faturação espelhe os seus consumos efetuados”.
29. Atenta a impossibilidade dos aparelhos instalados no local de consumo despenderem tamanha quantidade de eletricidade, no pedido requer-se às requeridas a comprovação do consumo real efetuado, o que tem subjacente a divergência sobre os valores faturados com a realidade dos consumos realizados e a inerente retificação das leituras e da faturação, caso tal consumo não seja inequivocamente demonstrado. Obviamente que a não comprovação dos valores faturados pelas requeridas tem subjacente, no pedido formulado, a correção dos valores das faturas e a inerente anuência de que tais valores não são devidos.
30. Que outro propósito poderia ter o pedido formulado pelo requerente?!
31. Se o pedido formulado pelo requerente se esgotasse na mera demonstração, pelas requeridas, do consumo real efetuado entre o período de 02-12-2019 até 21-06-2021, de que serviria e que efeito útil teria a reclamação?
32. E como poderia o Tribunal a quo ordenar a correção da faturação (pedida pelo Requerente) sem ordenar que a E... proceda à retificação das leituras reais referentes ao local de consumo? Não são uma e outra o verso e o reverso da mesma medalha?
33. Não podendo como tal proceder tudo quanto foi alegado pela Recorrente neste ponto, pelo que não existe qualquer condenação em objeto diverso do pedido.
34. Note-se que a decisão foi no sentido e enquadramento do pedido, respeitando desse modo o princípio do dispositivo, previsto e regulado no art. 3.º n.º 1 do CPC.

E. DO CONHECIMENTO DE QUESTÕES DE QUE NÃO PODIA CONHECER
35. A Recorrente afirma que quanto ao dever de informação, (no que concerne à missiva a alertar o consumidor de que iriam proceder à substituição do contador) ao qual estava vinculada, o Requerente no processo arbitral: “não apresenta, não suscita, nem sustenta qualquer pretensão quanto ao dever de informação – até porque, não pode bastar a qualquer Reclamante a alegação de um facto negativo para se servir de uma inversão do ónus da prova”.
36. Na verdade, o Reclamante não se limitou a alegar um facto negativo, pois fez prova daquilo que por si foi alegado.
37. Senão vejamos na douta sentença (ponto 3.1.2) que consta dos factos NÃO PROVADOS, que: “A Requerida E... notificou o consumidor do propósito de verificação do equipamento de contagem a 02/12/2019”.
38. Chegou o ilustre tribunal a tal resultado, por prova testemunhal como se demonstrou na inquirição à testemunha arrolada pelo Requerente que, no ponto 3.2, refere o seguinte:
“Confrontado com o documento ... da contestação da E... (aviso de manutenção de contador) disse desconhecer o documento (…) embora tenha afirmado que recebe a correspondência, e nunca rececionou aquelas missivas.”.
39. A afirmação da Recorrente de que o Réu se limita a alegar um facto negativo sem produzir prova é falsa.
40. Pelo que também não colhe o argumento de que o tribunal a quo não podia ter conhecido desta questão, essencial para o resultado da demanda.

F. DA FALTA DE PRONÚNCIA SOBRE QUESTÕES QUE DEVIA APRECIAR
41. É errado dizer-se que o tribunal não aprecia o pedido no que se reporta ao momento temporal ocorrido entre o dia 10 de fevereiro de 2020 e o dia 21 de junho de 2020.
42. Basta ler na decisão da sentença no ponto 4): “Absolvendo as Requeridas em tudo mais peticionado.”
43. Significa isto que, no período em crise que é entre 02/12/2019 e 10/02/2020, o Tribunal considera (e bem) ter havido cobrança de valores que não são devidos.
44. Todo o restante lapso temporal o Tribunal considerou não haver incorreções na faturação pelo que agiu em conformidade e coerência, absolvendo, nesse particular, as Requeridas.

G. DA VIOLAÇÃO DO REQUISITO ESTABLECIDO NO N.º 3 DO ART. 42.º DA LAV.
45. Pugna a Recorrente pela violação do requisito estabelecido no n.º3 do art. 42.º da LAV:
“A sentença deve ser fundamentada, salvo se as partes tiverem dispensado tal exigência ou se trate de sentença proferida com base em acordo das partes, nos termos
do artigo 41.º”
46. Refere ainda que, “a fundamentação da sentença arbitral é obtusa, não permitindo às partes perceber o iter lógico que foi percorrido pelo tribunal arbitral.”
Vejamos,
47. A sentença está fundamentada e contém em si todos os elementos legalmente exigidos e é perfeitamente inteligível.
48. A sentença versa sobre todas as questões com interesse para a demanda.
49. Está bem estruturada, permitindo a sua compreensão, pois veja-se que faz a devida separação das faturas em crise, analisando-as separadamente e em detalhe, no ponto 3.3.3A) – contador substituído - e 3.3.3ªB) – contador substituto.
50. Referindo que, quanto ao período de faturação no qual as leituras foram feitas pelo contador substituído – no ponto 3.3.3A): “resulta provada a ausência de qualquer anomalia no equipamento de contagem substituído a 02/12/2019. (…) Pelo que, e no que a esta fatura se refere há que improceder a pretensão do Requerente.”
51. Já quanto às leituras efetuadas pelo contador substituto – no ponto 3.3.3B): “Nem tão pouco resulta provado o estado do novo equipamento de contagem instalado no local de consumo (…) encontrando-se desta forma abalada esta primeira leitura real do contador substituído, por inexistência de elementos probatórios juntos aos autos que pudessem permitir a este Tribunal afirmar que equipamento fora instalado a zero (…).”
52. Assim, não se provando que as Requeridas prestaram os aludidos serviços de fornecimento e distribuição de energia elétrica, na quantidade exata (…) pois que não resulta provado o estado inicial do equipamento substituto (a sua leitura a zero), há que proceder, ainda que parcialmente, a pretensão do Requente, afirmando que o mesmo não deve os montantes imputados a título de consumo real na fatura n.º ...83 de 01/04/2020, devendo a mesma ser retificada nos termos do disposto no artigo 12º LSPE.”.
53. Dúvidas não podem restar de que a douta sentença é perfeitamente inteligível, fundamentada e bem estruturada, pelo que obtusos são os argumentos com que se tenta atacar uma decisão alicerçada na lógica e que é irrepreensivelmente apreensível, falecendo, assim, as considerações da Recorrente.

CONCLUSÕES
a) O recurso interposto pela Recorrente não contém conclusões, pelo que deve ser rejeitado liminarmente.
b) A sentença não sofre de qualquer dos vícios apontados pela Recorrente.
c) A sentença é exequível e condena nos precisos termos peticionados.
d) A Recorrente tem forma de proceder à correção dos valores faturados, bastando para o efeito socorrer-se das orientações constantes do Guia de Medição, Leitura e Disponibilização de Dados.
e) Após a mudança do contador pela E..., aqui Recorrente, sem prévio aviso e, consequentemente, sem conhecimento por parte do consumidor, verificou-se que as leituras dos consumos aumentaram desmesuradamente.
f) O consumidor não foi informado da substituição do equipamento de contagem, vulgo contador, instalado na sua habitação e não pode verificar qual a contagem que o mesmo exibia.
g) O aumento das leituras coincidiu, precisamente, com a altura do ano em que o local de consumo quase não é utilizado, não gerando consumos de eletricidade (o único eletrodoméstico existente no local – frigorifico classe A+ - permanece desligado).
h) A partir da mudança do contador a faturação aumentou excessivamente, para valores nunca alcançados anteriormente.
i) A Recorrente, apesar de ser seu ónus, não logrou provar que o contador apresentava uma leitura inicial igual a zero.
j) A Recorrente, apesar de ser seu ónus, não logrou provar as leituras que refletem o valor inserto nas faturas.
k) O consumo de energia elétrica no local de consumo não sofreu aumento.
l) Os valores faturados não são devidos.

ASSIM, MANTENDO A DECISÃO RECORRIDA ESTARÃO V.AS EX.AS A REALIZAR JUSTIÇA!

Na mesma data, veio o reclamante e requerido nos autos de ação de anulação apresentar, através de I. Mandatário, OPOSIÇÃO

“O que faz nos termos e com os seguintes fundamentos:
A. ENQUADRAMENTO
1. Insurge-se a Requerente contra a decisão do Tribunal Arbitral do Consumo de ... – CIAB que julgou a ação parcialmente procedente e, em consequência, condenou a Requerida E... a proceder à retificação das leituras reais referentes ao local de consumo em crise, no período entre 02/12/2019 e 10/02/2020 por as julgar como não devidas e, subsequentemente, condenar a Requerida S... ELETRICIDADE a retificar a fatura n.º ...83 de 01/04/2020.
2. A douta decisão, cuja anulação foi pedida, deve ser mantida. Crê-se que o Tribunal percecionou a real dimensão e o real alcance da relação material controvertida, o que culminou numa correta e rigorosa aplicação do Direito. Com o que, alcançou a justiça material do caso concreto que constitui o fim último da realização do Direito.
3. Com efeito, o Tribunal recorrido, na apreciação da factualidade e, por conseguinte, na análise e aplicação do Direito, adotou uma posição atenta da realidade subjacente à situação jurídica concreta. Data venia!

B. DA REJEIÇÃO DO PEDIDO DE ANULAÇÃO POR FALTA DE CONCLUSÕES.
4. O Recurso interposto pela E... não obedece aos formalismos legais, pelo que se impõe a sua rejeição.
Analisemos o quadro legal, respeitante a esta matéria:
5. Desde logo, conforme refere o art.º 46.º, n.º 2, al. e) da Lei da Arbitragem Voluntária: “Segue-se a tramitação do recurso de apelação, com as necessárias adaptações”.
6. Expressa o art.º 637.º n. 2 do CPC: “O requerimento de interposição do recurso contém obrigatoriamente a alegação do recorrente, em cujas conclusões deve ser indicado o fundamento específico da recorribilidade; (…)”.
7. Conjugando com o preceituado no art. 639.º n.º 1 do CPC, “o Recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão”.
8. O pedido de anulação apresentado pela E... não apresenta conclusões!
9. Impõe-se, assim, a observância do estipulado no art. 641.º n. 2, al. b) do CPC:
“2 - O requerimento é indeferido quando:
b) Não contenha ou junte a alegação do recorrente ou quando esta não tenha conclusões.” - Negrito nosso.
10. Nestes termos, deve a ação de anulação em causa ser rejeitada, conforme, aliás, é preconizado nos seguintes acórdãos:
“a falta de conclusões a que se refere a alínea b), parte final, do n.º 2 do artigo 641.º do CPC, como fundamento de rejeição do recurso, dever ser interpretada num sentido essencialmente formal e objetivo”. – Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, Proc. 2817/18.0T8PNF.P1.S1, de 16/12/2020.
Tribunal da Relação de Coimbra Processo nº 158/11.3TBSJP.C1 de 10 de novembro de 2015:
“A interposição de um recurso em processo civil sujeita o recorrente a dois ónus: o de apresentar a sua alegação de recurso pelo qual deverá expor de modo circunstanciado as razões de direito e de facto da sua divergência relativamente ao julgado; e o de finalizar essa peça, com a formulação de conclusões, contendo a indicação resumida dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão.
A falta absoluta de alegações ou de conclusões gera o indeferimento do recurso (artigo 641º, nº2, al. b), do NCPC). Com a reforma do regime dos recursos introduzida pelo DL nº 303/2007, de 24 de Agosto, a falta de conclusões passou, a par da ausência de alegações, a constituir fundamento de rejeição de recurso (artigo 685º-C, nº2, al. b), do CPC, na redação anterior à Lei nº 41/2013). Assim, onde anteriormente se admitia o convite ao recorrente para suprimento daquela falta de conclusões, agora tal convite só ocorre quando as conclusões sejam deficientes, obscuras complexas ou quando nelas não se tenha procedido às especificações previstas no nº 2 do artigo 639º.
Quanto ao sentido a dar à “omissão absoluta” de conclusões, para o efeito de o juiz proceder ao convite ao aperfeiçoamento ou, desde logo, à pura e simples rejeição do
recurso, afirma António Abrantes Geraldes: “Estabelecendo o paralelismo com a petição inicial, tal como esta está ferida de ineptidão quando falta a indicação do pedido, também as alegações destituídas em absoluto são “ineptas”, determinando a rejeição do recurso, sem que se justifique a prolação de qualquer despacho de convite à sua apresentação.”
C. DA EXEQUIBILIDADE DA DECISÃO
11. Vem a Requerente E... propugnar pela não exequibilidade da decisão do Tribunal Arbitral, arguindo, para tanto, o seguinte:
“As leituras são reais, ou seja, correspondem a consumo efetivo.”
E ainda,
“As causas do aumento desse consumo efetivo podem ser várias, desde a passagem de um consumo de obras – bastante menos “gastador” -, para um consumo de habitação, que demanda mais energia elétrica, para alimentação, designadamente, de eletrodomésticos de utilização permanente, mesmo que o contrato se tenha mantido o mesmo.”
12. Tese que não pode proceder!
13. Desde logo, porque tal como decorre das regras de experiência comum, um consumo de energia elétrica para efeito de obras é maior do que um consumo de índole doméstico, que, in caus, trata-se de uma segunda habitação, pouco utilizada.
14. E, por outro lado, a legislação aplicável ao caso concreto (Lei dos Serviços Públicos – Lei 23/96, de 26 de julho) é inequívoca nesta matéria:
Diz o artigo 11.º da referida Lei 23/96, de 26 de julho:
“1 - Cabe ao prestador do serviço a prova de todos os factos relativos ao cumprimento das suas obrigações e ao desenvolvimento de diligências decorrentes da prestação dos serviços a que se refere a presente lei.
15. Consta da matéria de facto dada como provada, que alicerçou a decisão do Tribunal Arbitral, no ponto 3.2 da sentença:
“Em sede de Declarações de parte, o requerente (…) esclareceu é uma habitação de tipologia T1, tem só um frigorífico e tem 4-5 lâmpadas LED embutidas no teto, não tendo sequer TV. (…) Tem-se deslocado muito poucas vezes ao local, e quando vai, vai durante o dia e vem à noite, não pernoitando no mesmo. Não tem qualquer outro tipo de eletrodomésticos e a única fonte de consumo de eletricidade será o frigorífico de classe A+ e os focos de luz.”
“A testemunha inquirida (…) que se mostrou isento e coerente, disse conhecer o prédio (…) tem apenas um quarto um corredor que liga para a sala, uma kitchenette e tem uma casa de banho. Questionado sobre quais os utensílios elétricos na habitação, disse que no quarto tem dois focos de luz led, outro no corredor e wc, na sala tem outros dois focos de luz e existe um frigorífico na cozinha – classe A+.
De resto não tem mais, o fogão é a gás, o forno também o é, nem sequer há TV e também já lá não vai há muito tempo. O aquecimento no inverno é feito por uma salamandra a lenha (…) nunca chegou a passar lá grandes temporadas (…) lembra-se que o uso que se fazia da casa era um fim-de-semana ou outro, esporadicamente.”
16. Dúvidas não restam que a habitação em causa apenas conta com um eletrodoméstico de utilização permanente de Classe energética A+, pelo que a tese de que o consumo doméstico, neste caso, é mais gastador do que um consumo de obras, não tem fundamento.
17. Apesar de caber à E... o ónus da prova de todos os factos relativos ao cumprimento das suas obrigações, esta não efetivou prova alguma sobre esta matéria e tenta agora, com argumentos falaciosos, colmatar a falta de prova dos factos por si alegados nos autos.
18. Verifica-se, ao invés, que o consumidor realizou prova bastante de que as leituras não corresponderem a um consumo efetivo, motivo pelo qual devem ser retificadas.
19. Acresce ao referido que não resultou provado que a E... notificou o consumidor do propósito de verificação do equipamento de contagem a 02/12/2019, e,
20. Não resultou igualmente provado que o contador instalado a 02/12/2019 no local de consumo em questão, apresentava como leitura inicial zero.
21. Aliás, a E... não logrou sequer arrolar como testemunha nenhuma das pessoas que supostamente estiveram no local aquando da instalação do contador em 02/12/2019.
22. Ao invés, a E... quer fazer prova com a junção de um mero documento interno, por si emitido, sem qualquer controle de terceiras entidades, como se de um documento autêntico se tratasse!
23. Pretender firmar que as leituras do contador são reais quando não resulta provado que o contador substituído a 02/12/2019 apresentava como leitura inicial zero; é insidioso.
24. A fórmula para resolver anomalias dos aparelhos de consumo está perfeitamente explicada no Guia de Medição, Leitura e Disponibilização de Dados.
25. Acresce que, sobre esta matéria, e salvo o devido respeito, ao Tribunal ad quem está vedado a apreciação do mérito da sentença, mesmo na vertente da fixação dos factos, a sua anulação por falta de fundamentação fáctica ou jurídica, apenas sendo de considerar se esta, de todo, inexistir, ou não for percetível, o que não é o caso. Com efeito, o Juiz fixou os factos provados, invocou a prova e decidiu de forma adequada. Por este motivo, não cumpre ao Tribunal ad quem apreciar a bondade dos factos provados e não provados.
D. DA CONDENAÇÃO EM OBJETO DIVERSO DO LITÍGIO
26. O ora Requerido pugna pela demonstração o consumo real efetuado e a correção da faturação de acordo com o consumo real.
27. Subsume-se o pedido formulado pelo Requerido à pretensão de que as Requerentes demonstrem e comprovem o consumo real efetuado entre o período de 02/12/2019 até à data da submissão da reclamação junto do Tribunal Arbitral de Consumo – CIAB e corrijam a faturação de acordo com o consumo real verificado (…).
28. Do pedido deflui que o Requerido considera que os consumos que os valores faturados são excessivos e não espelham o consumo real, sendo, portanto, indevidos.
29. Aliás, na reclamação apresentada pelo consumidor, este refere expressamente: “Ora, o Requerente não pode concordar com tal valor, já que não espelha a realidade dos consumos reais” e “o Requerente não aceita que tal faturação espelhe os seus consumos efetuados”.
30. Atenta a impossibilidade dos aparelhos instalados no local de consumo despenderem tamanha quantidade de eletricidade, no pedido requer-se às requeridas a comprovação do consumo real efetuado, o que tem subjacente a divergência sobre os valores faturados com a realidade dos consumos realizados e a inerente retificação das leituras e da faturação, caso tal consumo não seja inequivocamente demonstrado. Obviamente que a não comprovação dos valores faturados pelas requeridas tem subjacente, no pedido formulado, a correção dos valores das faturas e a inerente anuência de que tais valores não são devidos.
31. Que outro propósito poderia ter o pedido formulado pelo Requerido?!
32. Se o pedido formulado pelo Requerido se esgotasse na mera demonstração, pela Requerente, do consumo real efetuado entre o período de 02-12-2019 até 21-06-2021, de que serviria e que efeito útil teria a reclamação?
33. E como poderia o Tribunal a quo ordenar a correção da faturação (pedida pelo Requerido) sem ordenar que a E... proceda à retificação das leituras reais referentes ao local de consumo? Não são uma e outra o verso e o reverso da mesma medalha?
34. Não podendo como tal proceder tudo quanto foi alegado pela Requerente neste ponto, pelo que não existe qualquer condenação em objeto diverso do pedido.
35. Note-se que a decisão foi no sentido e enquadramento do pedido, respeitando desse modo o princípio do dispositivo, previsto e regulado no art. 3.º n.º 1 do CPC.

E. DO CONHECIMENTO DE QUESTÕES DE QUE NÃO PODIA CONHECER
36. A Requerente, quanto ao dever de informação ao qual está vinculada perante o reclamante (no que concerne à missiva a alertar o consumidor de que iriam proceder à substituição do contador), afirma: “não apresenta, não suscita, nem sustenta qualquer pretensão quanto ao dever de informação – até porque, não pode bastar a qualquer Reclamante a alegação de um facto negativo para se servir de uma inversão do ónus da prova”.
37. Na verdade, o Reclamante não se limitou a alegar um facto negativo, pois fez prova daquilo que por si foi alegado.
38. Senão vejamos na douta sentença (ponto 3.1.2) que consta dos factos NÃO PROVADOS, que: “A Requerida E... notificou o consumidor do propósito de verificação do equipamento de contagem a 02/12/2019”.
39. Chegou o Tribunal a tal resultado, por prova testemunhal como se demonstrou na inquirição à testemunha arrolada pelo Reclamante que, no ponto 3.2, refere o seguinte:
“Confrontado com o documento ... da contestação da E... (aviso de manutenção de contador) disse desconhecer o documento (…) embora tenha afirmado que recebe a correspondência, e nunca rececionou aquelas missivas.”.
40. A afirmação da Requerente de que o Requerido se limita a alegar um facto negativo sem produzir prova é falsa.
41. Pelo que também não colhe o argumento de que o tribunal a quo não podia ter conhecido desta questão, essencial para o resultado da demanda.

F. DA FALTA DE PRONÚNCIA SOBRE QUESTÕES QUE DEVIA APRECIAR
42. É errado dizer-se que o Tribunal não aprecia o pedido no que se reporta ao momento temporal ocorrido entre o dia 10 de fevereiro de 2020 e o dia 21 de junho de 2020.
43. Basta ler na decisão da sentença no ponto 4): “Absolvendo as Requeridas em tudo mais peticionado.”
44. Significa isto que, no período em crise que é entre 02/12/2019 e 10/02/2020, o Tribunal considera (e bem) ter havido cobrança de valores que não são devidos.
45. Todo o restante lapso temporal o Tribunal considerou não haver incorreções na faturação, pelo que agiu em conformidade e coerência, absolvendo, nesse particular, as Requeridas.

G. DA VIOLAÇÃO DO REQUISITO ESTABLECIDO NO N.º 3 DO ART. 42.º DA LAV.
46. Pugna a Requerente pela violação do requisito estabelecido no n.º3 do art. 42.º da LAV:
“A sentença deve ser fundamentada, salvo se as partes tiverem dispensado tal exigência ou se trate de sentença proferida com base em acordo das partes, nos termos do artigo 41.º”
47. Refere ainda que, “a fundamentação da sentença arbitral é obtusa, não permitindo às partes perceber o iter lógico que foi percorrido pelo tribunal arbitral.”
Vejamos,
48. A sentença está fundamentada e contém em si todos os elementos legalmente exigidos e é perfeitamente inteligível.
49. A sentença versa sobre todas as questões com interesse para a demanda.
50. Está bem estruturada, permitindo a sua compreensão, pois veja-se que faz a devida separação das faturas em crise, analisando-as separadamente e em detalhe, no ponto 3.3.3A) – contador substituído - e 3.3.3B) – contador substituto.
51. Referindo que, quanto ao período de faturação no qual as leituras foram feitas pelo contador substituído – no ponto 3.3.3A): “resulta provada a ausência de qualquer anomalia no equipamento de contagem substituído a 02/12/2019. (…) Pelo que, e no que a esta fatura se refere há que improceder a pretensão do Requerente.”
52. Já quanto às leituras efetuadas pelo contador substituto – no ponto 3.3.3B): “Nem tão pouco resulta provado o estado do novo equipamento de contagem instalado no local de consumo (…) encontrando-se desta forma abalada esta primeira leitura real do contador substituído, por inexistência de elementos probatórios juntos aos autos que pudessem permitir a este Tribunal afirmar que equipamento fora instalado a zero (…).”
53. Assim, não se provando que a Requerente prestou os aludidos serviços de fornecimento e distribuição de energia elétrica, na quantidade exata (…) pois que não resulta provado o estado inicial do equipamento substituto (a sua leitura a zero), há que proceder, ainda que parcialmente, a pretensão do Requerido, afirmando que o mesmo não deve os montantes imputados a título de consumo real na fatura n.º ...83 de 01/04/2020, devendo a mesma ser retificada nos termos do disposto no artigo 12º LSPE.”.
54. Dúvidas não podem restar de que a douta sentença é perfeitamente inteligível, fundamentada e bem estruturada, pelo que obtusos são os argumentos com que se tenta atacar uma decisão alicerçada na lógica e que é irrepreensivelmente apreensível, falecendo, assim, as considerações da Requerente.

CONCLUSÕES
a) A Ação de anulação interposta pela Requerente não contém conclusões, pelo que deve ser rejeitado liminarmente.
b) A sentença não sofre de qualquer dos vícios apontados pela Requerente.
c) A sentença é exequível e condena nos precisos termos peticionados.
d) A Requerente tem forma de proceder à correção dos valores faturados, bastando para o efeito socorrer-se das orientações constantes do Guia de Medição, Leitura e Disponibilização de Dados.
e) Após a mudança do contador pela E..., aqui Requerente, sem prévio aviso e, consequentemente, sem conhecimento por parte do consumidor, verificou-se que as leituras dos consumos aumentaram desmesuradamente.
f) O consumidor não foi informado da substituição do equipamento de contagem, vulgo contador, instalado na sua habitação e não pode verificar qual a contagem que o mesmo exibia.
g) O aumento das leituras coincidiu, precisamente, com a altura do ano em que o local de consumo quase não é utilizado, não gerando consumos de eletricidade (o único eletrodoméstico existente no local – frigorifico classe A+ - permanece desligado).
h) A partir da mudança do contador a faturação aumentou excessivamente, para valores nunca alcançados anteriormente.
i) A Requerente, apesar de ser seu ónus, não logrou provar que o contador apresentava uma leitura inicial igual a zero.
j) A Requerente, apesar de ser seu ónus, não logrou provar as leituras que refletem o valor inserto nas faturas.
k) O consumo de energia elétrica no local de consumo não sofreu aumento.
l) Os valores faturados não são devidos.

ASSIM, MANTENDO A DECISÃO ARBITRAL ESTARÃO V.AS EX.AS A REALIZAR JUSTIÇA!

Notificada a reclamada veio arguir o seguinte:
“Questão prévia: da apresentação de articulado sem constituição de mandatário
1. Deram entrada nos presentes autos dois articulados de defesa do R.: um apresentado pelo próprio, outro apresentado pela sua ilustre mandatária.
2. Sem prejuízo do que se dirá adiante, a verdade é que, nos termos do art.º 40.º do CPCivil,
“1 - É obrigatória a constituição de advogado: c) Nos recursos e nas causas propostas nos tribunais superiores.”
3. Será de concluir, uma vez que a ilustre mandatária do R. veio mais tarde a submeter articulado idêntico ao do seu constituinte, que, não se verificando os efeitos consignados no art.º 41.º do CPCivil, a oposição junta aos autos pelo próprio R. terá que ser desentranhada.

II. Da extemporaneidade da contestação
4. Ambos os articulados foram submetidos fora de prazo.
5. De facto, no art.º 46.º, n.º 2, alíneas a) a d) da LAV encontra-se regulado o requerimento, a oposição e a resposta nas ações de anulação de decisão arbitral.
6. Porém, como essa disposição não fixa um prazo para o oferecimento da oposição por parte do R.,
7. Deve observar-se o prazo supletivamente fixado pelo art.º 149.º, n.º 1, do CPCivil, de 10 dias (neste sentido, veja-se Lei da Arbitragem Voluntária Anotada, Associação Portuguesa de Arbitragem, 5.ª Ed., Revista e Atualizada, p. 180).
8. Ora, a petição inicial deu entrada no dia 17 de setembro de 2021.
9. O R. foi citado no dia 27 de setembro de 2021.
10. Pelo que, o prazo de 10 dias se completava no dia 11 de outubro de 2021.
11. Mas o R. (em qualquer dos dois articulados que deram entrada nos autos) apresentou a sua contestação apenas no dia 28 de outubro de 2021.
12. Assim, sendo extemporânea, a contestação apresentada pelo R. deve ser desentranhada do processo, com as consequências que se extraem do art.º 567.º, n.º 1 do CPCivil.
Sem prejuízo de, ainda assim, se deixar igualmente alegada
III. A falta de pagamento da taxa de justiça
13. Mesmo que se considerasse que não era obrigatória a constituição de advogado, sempre caberia dizer que o R. apresentou a sua contestação (em nome próprio) sem que tenha procedido ao pagamento da taxa de justiça correspondente.
14. Não tendo apresentado a oposição em tempo, nem regularizado tal pagamento, deve, nos termos do artigo 570.º, números 3 a 6 do CPCivil, o seu articulado ser desentranhado, com as consequências resultantes do art.º 567.º, n.º 1 do CPCivil, o que desde já se deixa alegado.
Sem conceder, e por mera cautela de patrocínio,
IV. Da improcedência da invocada exceção (da falta de conclusões)
15. Crê a A. que o R. assenta a sua defesa por exceção num lapso: considera que a presente lide é um Recurso.
16. Não é.
17. De facto, trata-se de uma ação de impugnação de decisão arbitral, um processo especial regulado no termos dos artigos 546.º e 549.º do CPCivil, com a especialidade de ser tramitada, em primeira instância, nos tribunais da Relação.
18. Portanto, só pelo facto de ser uma ação declarativa nova, a petição inicial obedeceria à estrutura prevista no art.º 552.º do CPCivil.
19. Mas, além disso, a LAV é clara quando prescreve, no seu art.º 46.º, que “2 - O pedido de anulação da sentença arbitral, que deve ser acompanhado de uma cópia certificada da mesma e, se estiver redigida em língua estrangeira, de uma tradução para português, é apresentado no tribunal estadual competente, observando-se as seguintes regras, sem prejuízo do disposto nos demais números do presente artigo:
a) A prova é oferecida com o requerimento;
b) É citada a parte requerida para se opor ao pedido e oferecer prova;
c) É admitido um articulado de resposta do requerente às eventuais excepções;
d) É em seguida produzida a prova a que houver lugar;
e) Segue-se a tramitação do recurso de apelação, com as necessárias adaptações;”
20. Ou seja, os trâmites da apelação aplicam-se apenas após a produção de prova nos termos da citada alínea d).
21. Se assim não fosse, nem sequer o demandado seria citado, mas notificado.
22. Donde, em tudo o que não seja especialmente regulado acerca do processo especial em causa, e conforme dispõe o art.º 549.º, n.º 1 do CPCivil, aplicam-se as regras previstas para as acções que corram sob a forma de processo comum.
23. Disso não há dúvidas, quer pela leitura da lei, quer pelo entendimento prático corrente que a doutrina bem expõe em Lei da Arbitragem Voluntária Anotada, Associação Portuguesa de Arbitragem, 5.ª Ed., Revista e Atualizada, p. 181 e, concretamente, em Lei da Arbitragem Voluntária Comentada, Coleção Vieira de Almeida e Associados, Sociedade de Advogados, R.L., Almedina, pp. 575 e 576: “O pedido de anulação da sentença arbitral é deduzido através de petição da qual devem constar:
• a identificação do tribunal a quem o pedido é dirigido;
• a identificação do autor e do réu (sem ser por referência aos sinais dos autos, pois que o processo arbitral não sobe);
• a junção da convenção de arbitragem e da sentença ou decisão recorrida;
• a identificação do objecto do processo impugnatório;
• a fundamentação de facto e de direito;
• os documentos probatórios e o requerimento de outras provas;
• a assinatura por advogado (com procuração nos autos, junção da procuração ou protesto respectivo);
• os duplicados legais e para recibo de entrada”.
24. Não há, portanto, qualquer fundamento que a lei preveja ou que a prática reconheça para a necessidade de concluir como em sede recursória, pelo que, aplicando a norma do citado art.º 552.º do CPCivil – como fez – a A. deu início à presente ação de forma regular.
25. Quanto ao demais alegado pelo R., a A. mantém o que verteu na sua P.I., sublinhando apenas que, contrariamente ao que entende o R. na contestação apresentada pela sua ilustre mandatária (ponto 25), a pretensão da A. não é a reapreciação da matéria de facto, mas apenas aquela que verteu na sua petição inicial.
26. Mesmo que, como é reconhecido pela comunidade jurídica, o sentido da sentença arbitral seja indiretamente (mas apenas indiretamente) colocado em causa, porque contém erros formais que inquinam as questões materiais que decide.
27. De resto, o efeito prático que a A. pretende é, como é evidente, o expurgo da decisão em crise da ordem jurídica e não a reapreciação de fundo.
Pelo que, deverá ser julgada improcedente a exceção invocada pelo R., devendo os presentes autos seguir os demais trâmites previstos na lei processual,
Sempre com base na falta de constituição de advogado, na extemporaneidade da oposição apresentada pelo R. e na falta de pagamento da taxa de justiça (que conduzem ao desentranhamento da peça processual)”.

Veio AA responder à questão prévia e exceções alegadas, nos seguintes termos:

I. QUESTÃO PRÉVIA
1. Por contacto telefónico foi verificada a inadmissibilidade da remessa, via e-mail, para o Tribunal, do articulado apresentado pelo Réu.
2. Atento tal facto, foi solicitada o desentranhamento do requerimento remetido pelo Réu e a sua substituição por novo requerimento apresentado oportunamente pela sua ilustre mandatária.
3. Assim não pode proceder a posição da Autora, quanto a esta matéria, por o Réu ter mandatário constituído.

II. PRAZO DA OPOSIÇÃO
4. Alega a Autora que deve observar-se o prazo supletivamente fixado pelo artigo
149.º, n.º 1 do CPC, que são 10 dias, para o Réu deduzir oposição.
5. Tal entendimento é minoritário na doutrina, por ser um prazo manifestamente exíguo.
6. Na verdade, conferir 10 dias ao Réu para contestar, atenta contra um dos princípios basilares de todo o Processo Civil, mormente o princípio da igualdade das partes.
7. Vejamos neste sentido Lei da Arbitragem Voluntária, Associação Portuguesa de Arbitragem, 5.ª Ed., Revista e Atualizada, p.181: “têm-se pronunciado várias vozes, nomeadamente a de Mariana França Gouveia, António Sampaio Caramelo e Armindo Ribeiro Mendes, os quais sustentam que o prazo para responder ao pedido de anulação deverá ser o de 30 dias, idêntico ao prazo para contestação nas ações declarativas comuns reguladas no Código de Processo Civil (cfr. Art. 569.º, n.º 1). Os defensores desta tese sustentam que o prazo de 10 dias é demasiado exíguo para apresentar defesa contra o pedido de anulação, mostrando-se violado o princípio da igualdade entre as partes”.

ACRESCE QUE,
8. Na citação efetuada ao Réu consta o seguinte:
“Nos termos do disposto no art. 228.º do Código de Processo Civil, fica V. Ex.ª
citado para, no prazo de 30 dias, deduzir oposição e oferecer prova, querendo ação acima identificada”.
9. Ainda que o entendimento fosse outro, consta expresso na citação que o Réu tem 30 dias para contestar, pelo que a oposição deduzida pelo Réu é tempestiva.

SEM PRESCINDIR,

III. TAXA DE JUSTIÇA
10. O Réu, no requerimento remetido ao Tribunal pela ilustre mandatária (ref. ...43), fez constar que a prática do ato era feita ao abrigo do disposto no artigo n.º 139 n.º 5 a) do CPC.
11. Para o efeito, liquidou a título de multa o correspondente a 10% da taxa de justiça devida.
12. Assim, a prática o ato ocorreu dentro do prazo legal.

DE TODO MODO,
13. Mesmo que o réu não tivesse pagado a taxa de justiça devida pela prática do ato, aplicar-se-ia necessariamente o disposto no n.º 3 do artigo n.º 570 do CPC:
“Na falta de junção do documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça devida ou de comprovação desse pagamento, no prazo de 10 dias a contar da apresentação da contestação, a secretaria notifica o interessado para, em 10 dias, efetuar o pagamento omitido com acréscimo de multa de igual montante, mas não inferior a 1 UC nem superior a 5 UC”.
14. O que só não aconteceu, uma vez que o Réu já havia juntado comprovativo do
pagamento da taxa de justiça.
Pelo exposto, devem as exceções alegadas pela Autora, no requerimento com a referência ...00, serem declaradas improcedentes, com as legais consequências.

Apesar de por informação veiculada pela Secção deste Tribunal se concluir que feitas inúmeras averiguações, nomeadamente, junto da Secção central, não foi encontrado nenhum requerimento que tenha sido apresentado pelo Réu - AA, para além do e-mail enviado, no dia 27/10/2021, às 16:21 ("contra-alegações de recurso", ordenou-se a notificação do mesmo, para em dez dias, vir aos autos, informar qual o requerimento de oposição deve ser apreciado, isto sob pena de se entender apreciar o primeiro que deu entrada em Tribunal, tendo este informado dever ser apreciado o requerimento que foi apresentado pela mandatária em 28-10-2021 com a ref.ª ...91, uma vez que este substituí na íntegra o requerimento anteriormente apresentado pelo próprio.

A Secção informou ainda, relativamente aos DUcs indicados no formulário do requerimento datado de 28 de outubro de 2021 que consultado o sistema das custas judiciais constatou-se que, os DUcs (a taxa de justiça como a referida multa - artigo n.º 139 n.º 5 a) do CPC), já se encontram registados no processo, sendo certo que, apenas no dia 04-11-2021, foram lançados automaticamente no seu conta-corrente.

Colhidos os vistos cumpre decidir.
*

II. QUESTÕES A DECIDIR.

Na presente ação de anulação de decisão arbitral importa conhecer das seguintes questões:

1.Questões prévias:
a)da regularidade e tempestividade da oposição apresentada;
b)da observância dos requisitos formais da PI, a saber, da necessidade de formulação de conclusões;

2.Da ação propriamente dita:
a) se a decisão não é exequível;
b) se a decisão condenou em objeto diverso do pedido;
c) se a decisão conhece questões de que não podia tomar conhecimento;
d) se a decisão deixou de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar;
e) se a decisão foi proferida com violação do requisito estabelecido no n.º 3 do artigo 42.º da LAV.
*

III. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO:

Com interesse para a decisão a proferir, há a atender à factualidade constante do relatório supra, que aqui damos por reproduzida.
Factos julgados provados na sentença os seguintes factos:

1.O Requerente é proprietário do prédio urbano sito na Rua ..., Lugar ..., ..., ..., o qual destina a habitação de férias e lazer;
2.A Requerida 1 S... ELECTRICIDADE é titular da licença de comercialização de energia elétrica, estando sujeita às obrigações de serviço universal, consistindo a comercialização na compra e venda de eletricidade a clientes, incluindo revenda;
3.A Requerida 2 E..., exerce em regime de concessão de serviço público a atividade de distribuição de energia elétrica em alta, média e baixa tensão no concelho ...;
4.O Requerente celebrou com a Requerida 1, a 30/05/2018, um contrato provisório de fornecimento de energia elétrica com vista a alimentar uma instalação de obras do prédio supra identificado ao qual foi atribuído CPE ..., com faturação bimensal, com potência contratada de € 3,45 KvA, tendo como morada de faturação Rua ..., BB, ...;
5.O referido contrato de fornecimento de energia elétrica para instalação de obras tem vindo a ser renovado sucessivamente até aos dias de hoje;
6.O contador encontra-se localizado fora da habitação, com acesso do exterior;
7.No período compreendido entre Setembro de 2018 e 25 de julho de 2019, a faturação bimensal foi no valor de € 31,95, € 28,48, € 23,54 e € 23,07, conforme as faturas nº ...86, ...91, ...30, ...79 e ...09, compreendendo as leituras reais datadas de 06/08/2018, 26/10/2018, 29/01/2019 e 16/04/2019;
8.A 25/09/019 foi emitida e enviada pela Requerida 1 ao Requerente, que pagou, a fatura nº ...05, correspondente ao período de faturação compreendido entre 26/07/2019 e 25/09/2019, resultante de uma leitura real efetuada a 24/09/2019, no valor de € 214,73;
9.A 26/11/2019 a Requerida 1 emitiu e enviou ao Requerente, que pagou, a fatura nº ...68, baseada na leitura real datada de 24/09/2019, referente ao consumo estimado no período compreendido entre 26/09/2019 e 26/11/019, no valor de € 42,88;
10.Até 02/12/2019 no local de consumo esteve instalado o contador nº ...26;
11.Nessa data, chegados ao local, os técnicos da Requerida 2 depararam-se com o contador desparameterizado, isento de qualquer anomalia;
12.A 02/12/2019 a Requerida 2 substutuiu o equipamento de mediação instalado no local de consumo em crise, pelo contador nº ...74 de marca ...;
13.A Requerida 1 emitiu e enviou ao Requerente, que não pagou, a 29/01/2020, a fatura nº ...53, referente ao consumo real no período entre 25/09/2019 e 01/02/2019 e o consumo estimado no período de 02/12/2019 e 29/01/019, no valor de € 200,66;
14.O Requerente apresentou de imediato reclamação relativamente a fatura referenciada no ponto anterior.
15. A 01/04/2020 a Requerida 1 emitiu e enviou ao Requerente, que não pagou, a fatura nº ...83, baseado em leitura real a 10/02/2020, correspondente ao período entre 02/12/2019 e 10/02/2019 e o consumo estimado no período de 11/02/2020 e 29/03/020, no valor de € 354,10;
16.Por conta dos consumos referidos, ao Requerente passou a ser imputada CAV (Contribuição Audio Visual):
a. Ft ...05, de 25/09/2019, é cobrado a título de CAV o montante de € 25,65;
b. Ft ...68, de 26/11/2019, é cobrado a título de CAV o montante de € 5, 70;
c. Ft ...53, de 29/01/2020, é cobrado a título de CAV o montante de € 5, 70;
d. Ft ...83, de 01/04/2020, é cobrado a título de CAV o montante de € 5, 70.

Factos não provados:

1.A Requerida E... notificou o consumidor do propósito de verificação do equipamento de contagem a 02/12/2019.
2.O contador instalado a 02/12/2019 no local de consumo em questão apresentava como leitura inicial zero.
*

IV – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO:

Aqui chegados importa antes de mais e porque a decisão de tais questões pode pôr em causa a apreciação das demais, verificar, como pretende a autora E..., se se mostra irregular e intempestiva a oposição apresentada e, como pretende o réu, da inobservância dos requisitos formais da PI, a saber, da falta de formulação de conclusões.

a) da regularidade e tempestividade da oposição apresentada.

1.A este propósito vem a autora alegar que deram entrada nos presentes autos dois articulados de defesa do réu um apresentado pelo próprio, outro apresentado pela sua ilustre mandatária.
Ora, nos termos do artº 40º do Código de Processo Civil, é obrigatória a constituição de advogado nos recursos e nas causas propostas nos tribunais superiores, pelo que será de concluir, uma vez que a ilustre mandatária do réu veio mais tarde a submeter articulado idêntico ao do seu constituinte, que, não se verificando os efeitos consignados no artº 41º do Código de Processo Civil, a oposição junta aos autos pelo próprio réu terá que ser desentranhada.

Vejamos:
Efetivamente, atentos os preceitos atrás citados, a apresentação da presente ação neste Tribunal da Relação está sujeita à constituição obrigatória de advogado, sob pena de absolvição da instância.
Acontece que nos presentes autos, notificado o réu, para em dez dias, vir aos autos, informar qual o requerimento de oposição deve ser apreciado, isto sob pena de se entender apreciar o primeiro que deu entrada em Tribunal, veio o mesmo informar dever ser apreciado o requerimento que foi apresentado pela mandatária em 28-10-2021 com a ref.ª ...91, uma vez que este substituí na íntegra o requerimento anteriormente apresentado pelo próprio.
Assim sendo, fica a questão da regularidade da oposição, no que à constituição de mandatário diz respeito, regularizada, ordenando-se o oportuno desentranhamento da primeira oposição apresentada pelo réu.

2.Vem a autora arguir a extemporaneidade da contestação apresentada uma vez que devendo observar-se o prazo supletivamente fixado pelo nº 1 do artº 149º, do Código de Processo Civil, de 10 dias 8. Ora, a petição inicial deu entrada no dia 17 de setembro de 2021, tendo o réu sido citado no dia 27 de setembro de 2021, completava-se o prazo de 10 dias no dia 11 de outubro de 2021, sendo certo que o mesmo só a 28 de outubro de 2021 apresentou a sua contestação.
Conclui que a contestação apresentada pelo réu deve ser desentranhada do processo, com as consequências que se extraem do nº 1 do artº 567º, do Código de Processo Civil.
Pronunciou-se o réu sobre a invocada extemporaneidade da oposição apresentada pugnando, não só, que deve observar-se o prazo de 30 dias, idêntico ao prazo para contestação nas ações declarativas comuns reguladas no Código de Processo Civil, mas também que foi o mesmo citado pelo Tribunal sendo-lhe concedido o prazo de 30 dias para, querendo, deduzir oposição e oferecer prova, querendo ação acima identificada.

Vejamos.
Conforme resulta do disposto nos nºs 1 e 2, al. b) do artº 46º da Lei da Arbitragem Voluntária (LAV), instaurada junto de Tribunal da Relação, ação anulatória de sentença arbitral, ação declarativa com processo especial regulado na referida lei, a parte requerida é citada para a ação, concretamente para se opor ao pedido e oferecer logo a sua prova.
Ora, da leitura de tal preceito resulta que a LAV não estabelece o prazo de oposição, nem do articulado de resposta do autor a eventuais exceções que o réu venha a deduzir, o que tem dado origem a duas posições doutrinárias, a saber, a que defende o prazo de dez dias atendendo a que “(…) se tratar de uma ação que pertence à jurisdição judicial ou administrativa (…)”, como defende Manuel Pereira Barrocas, in Lei de Arbitragem Comentada, 2º edição, pág.178, Almedina e a que defende o prazo de trinta dias, como se refere na Lei da Arbitragem Voluntária, Associação Portuguesa de Arbitragem, 5.ª Ed., Revista e Atualizada, pág 181 (citado no requerimento de pronuncia sobre a intempestividade apresentado pelo réu) segundo o qual “têm-se pronunciado várias vozes, nomeadamente a de Mariana França Gouveia, António Sampaio Caramelo e Armindo Ribeiro Mendes, os quais sustentam que o prazo para responder ao pedido de anulação deverá ser o de 30 dias, idêntico ao prazo para contestação nas ações declarativas comuns reguladas no Código de Processo Civil (cfr. Art. 569.º, n.º 1). Os defensores desta tese sustentam que o prazo de 10 dias é demasiado exíguo para apresentar defesa contra o pedido de anulação, mostrando-se violado o princípio da igualdade entre as partes”.
No caso sub judice e sem nos pronunciarmos sobre qual o prazo para a apresentação da oposição, resulta dos autos, que foi o réu citado, por este Tribunal, nos seguintes termos:
“Nos termos do disposto no art. 228.º do Código de Processo Civil, fica V. Ex.ª citado para, no prazo de 30 dias, deduzir oposição e oferecer prova, querendo ação acima identificada”.
Ou seja, independentemente do prazo legalmente fixado para a apresentação da oposição, a verdade é que, foi o réu citado pelo Tribunal para a apresentar no prazo de trinta dias.
Conforme decorre do nº 1 do artº 219º do Código de Processo Civil, “a citação é o ato pelo qual se dá conhecimento ao réu de que foi proposta contra ele determinada ação e se chama ao processo para se defender;(…)”, resultando daqui que a citação constitui meio privilegiado para a concretização do principio do contraditório. Como referem os Drs Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Pires de Sousa, in Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, 2ª edição, pág 265, Almedina “num processo de natureza dialética, como é o processo civil, é a citação do réu que determina o início da discussão necessária a iluminar a resolução do conflito de interesses, com vista à justa composição do litígio. É pelo ato de citação que se dá conhecimento do réu da petição ou do requerimento inicial, propiciando-lhe a faculdade de deduzir oposição”.
E continuam os citados Autores “O especial relevo do ato de citação e os efeitos suscetíveis de desencadear na esfera jurídica do visado servem de justificação para a sua pormenorizada regulamentação. O rigor que é imposto na sua realização e na verificação posterior da sua regularidade (artºs 196º e 566º) torna o réu ciente de que a posterior evolução processual e os efeitos que possam produzir-se dependerão, em larga medida, da sua reação processual (…)”.
Uma das concretizações do referido rigor na regulamentação do ato de citação, encontra-se no artº 227º do Código de Processo Civil onde são elencados os elementos a transmitir, obrigatoriamente, ao citando, sendo que, conforme resulta do nº 2 do referido preceito “no ato de citação, indica-se ainda ao destinatário o prazo dentro do qual pode oferecer a defesa, a necessidade de patrocínio judiciário e as cominações em que incorre em caso de revelia”.
Ora, se a indicação do prazo para a contestação é elemento imprescindível do ato de citação, e isto porque, a sua não observância tem efeitos processuais, designadamente, a revelia, regulada nos artº 566º a 568º do Código de Processo Civil, não pode, sob pena de ser o seu destinatário prejudicado, deixar de prevalecer o prazo indicado no ato de citação, desde que o mesmo seja o que legalmente se encontra estabelecido, ou seja um prazo de defesa superior ao legal (neste caso, com base no disposto no nº 6 do artº 157º do Código de Processo Civil.
Assim sendo e, como atrás referimos, sem nos pronunciarmos sobre o prazo legalmente aplicável, tendo o réu sido citado a 27 de setembro de 2021, para apresentar o seu articulado no prazo de trinta dias e tendo o réu apresentado a sua oposição a 28 de outubro de 2021, mostra-se a mesma tempestiva.
Assim sendo, indefere-se, nesta parte, o requerido pela autora.

3.A falta de pagamento da taxa de justiça
Vem ainda o autor, perante a apresentação pelo réu do seu requerimento de oposição, arguir que mesmo que se considerasse que não era obrigatória a constituição de advogado, o réu apresentou a sua contestação (em nome próprio) sem que tenha procedido ao pagamento da taxa de justiça correspondente, pelo que, nos termos dos nºs 3 e 6 do artº 570º, do Código de Processo Civil, o articulado apresentado deve ser desentranhado, com as consequências resultantes do nº 1 do artº 567º do mesmo diploma legal.
Conforme atrás se decidiu, e face à declaração do réu de que o articulado de oposição a ser apreciado nos presentes autos, deveria ser o apresentado pelo seu I. Mandatário, o articulado oferecido pelo réu e por si elaborado, foi mandado desentranhar, pelo que, quanto a este, nada se oferece dizer quanto à taxa de justiça.
Quanto ao articulado apresentado pelo seu I. Mandatário, conforme atrás se referiu é o mesmo tempestivo.
Acresce que, conforme informação da Secção e que resulta do supra relatório, relativamente aos DUcs indicados no formulário do requerimento datado de 28 de outubro de 2021, consultado o sistema das custas judiciais constatou-se que, os DUcs (a taxa de justiça como a referida multa - artigo n.º 139 n.º 5 a) do CPC), já se encontram registados no processo, sendo certo que, apenas no dia 04-11-2021, foram lançados automaticamente no seu conta-corrente.
Nestes termos, julga-se improcedente, nesta parte, a questão prévia suscitada pela autora.

b)da inobservância dos requisitos formais da PI, a saber, da falta de formulação de conclusões.
Vem o réu arguir que o Recurso interposto pela E... não obedece aos formalismos legais, impondo-se a sua rejeição e isto porque, conforme refere o art.º 46.º, n.º 2, al. e) da Lei da Arbitragem Voluntária: “Segue-se a tramitação do recurso de apelação, com as necessárias adaptações”, sendo que, de acordo com o nº 2 do art.º 637º do Código de Processo Civil “O requerimento de interposição do recurso contém obrigatoriamente a alegação do recorrente, em cujas conclusões deve ser indicado o fundamento específico da recorribilidade; (…)” e ainda no nº 1 do artº 639º do mesmo diploma legal, “o Recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão”.
Ora, não apresentando o pedido de anulação apresentado pela E... não conclusões, deve o mesmo, nos termos da al. b), do nº 2 do artº 641º do mesmo diploma legal, ser indeferido.

Estabelece o nº 1 do artº 46º da LAV que “Salvo se as partes tiverem acordado em sentido diferente, ao abrigo do nº 4 do artigo 39º, a impugnação de uma sentença arbitral perante um tribunal estadual só pode revestir a forma de pedido de anulação, nos termos do disposto no presente artigo”.

Por outro lado, estabelece o nº 1 do artº 546º do Código de Processo Civil que “o processo pode ser comum ou especial”, sendo que, nos termos do nº 2 do mesmo preceito se estabelece que “o processo especial aplica-se aos casos expressamente designados na lei;”.
Estabelece ainda o nº 1 do artº 549º do Código de Processo Civil que “os processos especiais regulam-se pelas disposições que lhes são próprias e pelas disposições gerais e comuns; em tudo o quanto não estiver prevenido numas e noutras, observa-se o que se acha estabelecido para o processo comum”.
Ou seja, consagrado o princípio da legalidade da forma processual, a delimitação do processo comum resulta de um critério residual, abarcando todos os litígios a que não corresponda expressamente alguma das formas de processo especial previstas no Código de Processo Civil ou em diplomas avulsos.
O principio da especialidade e da legalidade das formas processuais implica que a tramitação dos processos especiais obedeça sucessivamente à regulamentação específica, às normas gerais e às do processo declarativo comum.
Resulta pois, da leitura destes preceitos que a ação anulatória de sentença arbitral é uma ação declarativa com processo especial regulado na LAV e instaurada perante o Tribunal da Relação em cujo distrito se situa o lugar de arbitragem (al. g), do nº 1 do artº 59º da referida lei).
Ora, de acordo com o nº 2 do artº 46º da LAV “O pedido de anulação da sentença arbitral, que deva ser acompanhado de uma cópia certificada da mesma e, se estiver redigida em língua estrangeira, de uma tradução para português, é apresentado no tribunal estadual competente, observando-se as seguintes regras, sem prejuízo do disposto nos demais números do presente artigo:
a)A prova é oferecida com o requerimento;
b) É citada a parte requerida para se opor ao pedido e oferecer prova;
c)É admitido um articulado de resposta do requerente às eventuais exceções;
d) É em seguida produzida a prova a que houver lugar;
e) Segue-se a tramitação do recurso de apelação, com as necessárias adaptações;
f) A ação de anulação, entra, para efeitos de distribuição, na 5ª espécie”.
Assim, da leitura do preceito atrás citado resulta, aliás como o refere o autor, na resposta às exceções invocadas pelo réu, que os trâmites da apelação aplicam-se apenas após a produção de prova nos termos da citada alínea d), sendo que, caso contrário, não haveria lugar à citação do réu mas sim à sua notificação.
Neste sentido veja-se a Lei da Arbitragem Voluntária Comentada, Coleção Vieira de Almeida e Associados, Sociedade de Advogados, R.L., Almedina, págs 575 e 576, onde se refere “O pedido de anulação da sentença arbitral é deduzido através de petição da qual devem constar:
• a identificação do tribunal a quem o pedido é dirigido;
• a identificação do autor e do réu (sem ser por referência aos sinais dos autos, pois que o processo arbitral não sobe);
• a junção da convenção de arbitragem e da sentença ou decisão recorrida;
• a identificação do objecto do processo impugnatório;
• a fundamentação de facto e de direito;
• os documentos probatórios e o requerimento de outras provas;
• a assinatura por advogado (com procuração nos autos, junção da procuração ou protesto respectivo);
• os duplicados legais e para recibo de entrada”.
Resulta pois da LAV e dos preceitos legais atrás citados, não haver aquando da proposição da ação de anulação de decisão arbitral perante um Tribunal da Relação, a necessidade da apresentação de conclusões, como em sede recursória.
Diga-se ainda, em relação aos Acordãos invocados pelo réu no seu requerimento, a saber, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, Proc. 2817/18.0T8PNF.P1.S1, de 16/12/2020 e Acordão do Tribunal da Relação de Coimbra Processo nº 158/11.3TBSJP.C1 de 10 de novembro de 2015, ambos disponíveis em www.dgsi.pt, que os mesmos não se referem a qualquer ação de anulação de decisão arbitral, regulada pela LAV, mas antes a recursos de sentenças proferidas no âmbito de ações de processo comum, proferidas pelos Tribunais de 1ª instância.
Nestes termos, julgo improcedente a invocada exceção.

c)da invocada nulidade da sentença

Pugna a autora pela nulidade da sentença, nos termos do nº 3 do artº 46º, da Lei da Arbitragem Voluntária a saber porque:

a) se a decisão não é exequível;
b) se a decisão condenou em objeto diverso do pedido;
c) se a decisão conhece questões de que não podia tomar conhecimento;
d) se a decisão deixou de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar;
e) se a decisão foi proferida com violação do requisito estabelecido no n.º 3 do artigo 42.º da LAV.

Vejamos.

Dispõe o nº 3 do artº 46º, nº 3, da LAV, que a sentença arbitral só pode ser anulada pelo tribunal estadual competente se:
a) A parte que faz o pedido demonstrar que:
i) Uma das partes da convenção de arbitragem estava afectada por uma incapacidade; ou que essa convenção não é válida nos termos da lei a que as partes a sujeitaram ou, na falta de qualquer indicação a este respeito, nos termos da presente lei; ou
ii) Houve no processo violação de alguns dos princípios fundamentais referidos no n.º 1 do artigo 30.º com influência decisiva na resolução do litígio; ou
iii) A sentença se pronunciou sobre um litígio não abrangido pela convenção de arbitragem ou contém decisões que ultrapassam o âmbito desta; ou
iv) A composição do tribunal arbitral ou o processo arbitral não foram conformes com a convenção das partes, a menos que esta convenção contrarie uma disposição da presente lei que as partes não possam derrogar ou, na falta de uma tal convenção, que não foram conformes com a presente lei e, em qualquer dos casos, que essa desconformidade teve influência decisiva na resolução do litígio; ou
v) O tribunal arbitral condenou em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido, conheceu de questões de que não podia tomar conhecimento ou deixou de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar; ou
vi) A sentença foi proferida com violação dos requisitos estabelecidos nos nºs 1 e 3 do artigo 42º; ou
vii) A sentença foi notificada às partes depois de decorrido o prazo máximo para o efeito fixado de acordo com ao artigo 43º ; ou
b) O tribunal verificar que:
i) O objecto do litígio não é susceptível de ser decidido por arbitragem nos termos do direito português;
ii) O conteúdo da sentença ofende os princípios da ordem pública internacional do Estado português.
Da leitura deste preceito resulta serem taxativamente fixados os casos em que a sentença proferida pelo Tribunal Arbitral pode ser anulada, sendo que, dessa mesma leitura resulta que os fundamentos da alínea a) carecem de alegação e prova pela parte que os venha a invocar e os fundamentos da alínea b) são do conhecimento oficioso do Tribunal da Relação.
São pois, fundamento de anulação:
a)ser uma das partes da convenção incapaz no momento da sua celebração;
b)a convenção de arbitragem não é válida por outro motivo diferente do da incapacidade;
c)a violação no processo arbitral de algum dos princípios fundamentais do processo consignados no nº 1 do artº 30º da LAV;
d)a sentença arbitral ter-se pronunciado sobre um litígio não abrangido pela convenção de arbitragem;
e)conter a sentença decisões que ultrapassem o âmbito desta;
f)ser a composição do tribunal arbitral ou o processo arbitral não conformes com a convenção das partes;
g)ter o tribunal arbitral condenado em quantidade superior ou objeto diverso do pedido ou conhecido questões de que não podia tomar conhecimento;
h)ter o tribunal arbitral deixado de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar;
i)ter a sentença sido proferida com violação do estabelecido nos nºs 1 e 3 do artº 42º;
j)ter a sentença sido notificada às partes fora do prazo máximo por estas concedido ou determinado pela lei;
l)o tribunal estadual ter concluído que o litígio não é arbitrável;
m)o tribunal estadual concluir que o conteúdo da sentença ofende os princípios da ordem pública internacional do estado português.

Apreciemos pois cada um dos vícios imputados à sentença arbitral invocados pela autora.

1.a decisão não é exequível.
Alega a autora para o efeito que, a decisão não é exequível, porque deflui da sua fundamentação que “resulta provada a ausência de qualquer anomalia no equipamento de contagem substituído a 02/12/2019 (a par da sua desparametrização), pelo que, provando-se que as Requeridas prestaram os aludidos serviços de fornecimento e distribuição de energia elétrica, na quantidade exata que consta daquela fatura junta aos autos, pois que não foi abalado o documento/faturação, início de prova, no que às leituras reais se reportam (...) o Tribunal só poderá conhecer dos consumos a partir da data de substituição do equipamento ou seja 02/12/2019) (...) Pelo que, e no que a esta fatura se refere há que improceder a pretensão do Requerente.”
Alega ainda que as leituras são reais, ou seja, correspondem a consumo efetivo; as causas do aumento desse consumo efetivo podem ser várias, desde a passagem de um consumo de obras – bastante menos “gastador” –, para um consumo de habitação, que demanda mais energia elétrica, para alimentação, designadamente, de eletrodomésticos de utilização permanente, mesmo que o contrato se tenha mantido o mesmo; e isto vale mesmo tratando-se de uma segunda habitação.
Há um problema de base na sentença que a torna impossível de executar pela E...: as leituras são reais, que é o que equivale a dizer que estão corretas e é isso mesmo resulta dos documentos juntos aos autos.

Diga-se, antes de mais, que o fundamento invocado pela autora não cabe no âmbito das causas de anulação da sentença proferida por Tribunal arbitral e atrás enunciadas.
E, se tal bastaria para se não pronunciar este Tribunal sobre a questão invocada, acresce que, conforme resulta da leitura do nº 9, do artº 46º da LAV, e é referido in Lei da Arbitragem Comentada, de Manuel Pereira Barrocas, 2ª edição, pág. 193, Almedina, “Em nenhum caso em que a arbitragem, seja em processo de anulação da sentença arbitral ou noutro, com exceção do recurso que é tratado no número seguinte, o tribunal estadual pode conhecer do mérito da questão ou das questões decididas pelo tribunal arbitral”.
Apenas está legalmente autorizado a anular a sentença arbitral e nada mais do que isso.
(…)
Mas pergunta-se, não pode o juiz da execução ou do reconhecimento procurar o sentido da decisão arbitral? Pode, a nosso ver, mas apenas no que respeita aos efeitos concretos e objetivos da decisão e do seu alcance, por forma a delimitar o pedido da execução. Não pode em tudo o mais, ou seja, no que diz respeito à fundamentação e ao sentido útil da decisão de mérito, mesmo que seja a errada a interpretação dos factos e errados os fundamentos jurídicos ou as expressões utilizadas. Qualquer exercício interpretativo dos tribunais estaduais sobre este domínio em sentido contrário pode significar uma alteração da decisão de mérito proferida pela sentença arbitral e isso viola o disposto no artigo 46º, número 9”.
Ora, mais do que a não exequibilidade da sentença - Julgo parcialmente procedente a presente demanda, condenando a Requerida E... a proceder à retificação das leituras reais referentes ao local de consumo em crise no período entre 02/12/2019 e 10/02/2020, por as julgar como não devidas;- pretende a autora que este Tribunal aprecie e interprete os factos apurados e extraia dos mesmos conclusão distinta da alcançada pelo Tribunal Arbitral.
A tal nos encontramos impedidos e assim sendo, improcede, nesta parte, a ação.

2.Da condenação em objeto diverso do pedido:
Vem a autora alegar que sendo o pedido do réu - “pretende o Requerente que as Requeridas demonstrem o consumo real efetuado entre o período de 02-12-2019 até à presente data (portanto, até 21 de junho de 2021) e corrijam a faturação de acordo com o consumo real verificado, bem como creditem o valor global de €42,75 de CAV, por estar convicto de que não foi atingido os 400 Kwh de consumo” e tendo a sentença, em sede de decisão julgado parcialmente procedente a presente demanda, condenando a Requerida E... a proceder à retificação das leituras reais referentes ao local de consumo em crise no período entre 02/12/2019 e 10/02/2020, por as julgar como não devidas, condenou em objeto do diverso do pedido pois que condenou a E... – ora A. – à retificação das leituras, julgando-as não devidas.
Ora, será que, como pretende a autora, a sentença se pronunciou, para além do que lhe era pedido?
É que, conforme resulta do ponto v), da al. a), do nº 3 do artº 46º da LAV, a sentença arbitral pode ser anulada pelo tribunal estadual competente se condenou em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.
Vejamos.
Da leitura do requerimento inicial apresentado ao Tribunal Arbitral resulta pugnar o ali requerente pela demonstração do consumo real efetuado e a correção da faturação de acordo com o consumo real.
Pretende-se assim que as ali requeridas demonstrem e comprovem o consumo real efetuado entre o período de 2 de dezembro de 2019 até à data da submissão da reclamação junto do Tribunal Arbitral de Consumo – CIAB e corrijam a faturação de acordo com o consumo real verificado (…), ou seja, do pedido formulado resulta que o requerente considera que os consumos que os valores faturados são excessivos não espelhando o consumo real, sendo, portanto, indevidos.
Da reclamação apresentada pelo consumidor, este refere expressamente: “Ora, o Requerente não pode concordar com tal valor, já que não espelha a realidade dos consumos reais” e “o Requerente não aceita que tal faturação espelhe os seus consumos efetuados”.
Assim sendo, deflui do pedido formulado aquele propósito, a saber, a demonstração do consumo real efetuado entre o período de 2 de dezembro de 2019 até 21 de junho de 2021, e a consequente correção das faturas, correção essa que apenas pode ter lugar, face a uma incorreta leitura efetuada.
Nestes termos, entende-se que a sentença condenou no pedido formulado pelo ali requerente e assim sendo, improcede, nesta parte, a ação.

3.se a decisão conhece questões de que não podia tomar conhecimento;
Vem o autor invocar como causa de anulação da sentença proferida pelo Tribunal Arbitral que a mesma toma conhecimento de questões não suscitadas, como seja, que o ali autor não peticionou ao Tribunal que declarasse as quantias como não devidas, e ainda quanto ao direito à informação.
Ora, apreciaremos apenas a segunda das questões pois entendemos que a primeira se encontra já atrás apreciada e dirimida.
Vejamos.
A Requerente, na reclamação apresentada em sede de Tribunal Arbitral alegou que a 2 de dezembro de 2019, a 2ª requerente, por sua iniciativa e sem qualquer pedido por parte da requerente, procedeu à substituição do contador.
Em sede de resposta apresentada pela ali 2ª requerida, a ora autora, alegou, a saber, nos artºs 24º e 25º do seu articulado, que a 2 de dezembro de 2019, gerou uma ordem de serviço para verificação do equipamento tendo notificado o reclamante por carta (doc nº 3).
Ora, salvo o devido respeito por contrária opinião, resulta aqui invocado, o dever de informação, tanto assim é que a ali 2ª requerida e aqui autora, arguiu a notificação do ali requerente e aqui réu, da ordem de serviço para verificação do contador.
É assim com base nestes factos que a douta sentença, sob o ponto 3.1.2, dá como facto não provado, que: “A Requerida E... notificou o consumidor do propósito de verificação do equipamento de contagem a 02/12/2019”.
Nestes termos entendemos que, também por aqui, se julga improcedente a ação.

4. se a decisão deixou de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar;
Invoca ainda a autora como causa de anulação da sentença proferida pelo Tribunal Arbitral o facto de o mesmo não se ter pronunciado sobre o período ocorrido entre 10 de fevereiro de 2020 – data em que termina o período do consumo faturado a 1 de abril de 2020 – e o dia 21 de junho de 2020.

Vejamos.
A 21 de junho de 2020, AA apresentou uma reclamação de consumo tendo em vista o seguinte efeito: “pretende o Requerente que as Requeridas demonstrem o consumo real efetuado entre o período de 02-12-2019 até à presente data (portanto, até 21 de junho de 2020) e corrijam a faturação de acordo com o consumo real verificado, bem como creditem o valor global de €42,75 de CAV, por estar convicto de que não foi atingido os 400 Kwh de consumo” – conforme resulta do documento que junta sob o número 1, que se dá por inteiramente reproduzido, que é a reclamação apresentada pelo Reclamante.
Realizada a audiência, foi proferida sentença no dia 6 de junho de 2021, remetida às partes no dia 9 de junho de 2021, a qual declarou, em sede de dispositivo, que:
“1)Julgo improcedente a exceção dilatória de incompetência material alegada pelas partes, reconhecendo-se este Tribunal competente para apreciar a questão;
2)Julgo improcedente a exceção dilatória de ilegitimidade passiva alegada pela Requerida2 E...;
3)Julgo parcialmente procedente a presente demanda, condenando a Requerida E... a proceder à retificação das leituras reais referentes ao local de consumo em crise no período entre 02/12/2019 e 10/02/2020, por as julgar como não devidas;
4)Absolvendo as Requeridas em tudo o mais peticionado”.
Ora, da leitura desta decisão resulta que, no período em crise que é entre 2 de dezembro de 2019 e 10 de fevereiro de 2020, o Tribunal considera ter havido cobrança de valores que não são devidos, sendo que, relativamente ao restante lapso temporal o Tribunal considerou não haver incorreções na faturação pelo que agiu em conformidade e absolveu, nesse particular, as Requeridas.
Assim sendo, não resultando da sentença não ter o Tribunal Arbitral deixado de se pronunciar sobre aquele lapso temporal, improcede, também aqui a ação.

5.se a decisão foi proferida com violação do requisito estabelecido no nº 3 do artº 42º da LAV.
Conforme decidiu o Acordão da Relação de Guimarães de 4 de outubro de 2018, in www.dgsi.pt, reportando-se ao artº 615º do Código de Processo Civil, mas que se mostra pertinente para a concreta nulidade invocada na presente impugnação, “nulidades da sentença são vícios formais e intrínsecos de tal peça processual e encontram-se taxativamente previstos no normativo legal “supra” citado. Os referidos vícios, designados como “error in procedendo”, respeitam unicamente à estrutura ou aos limites da sentença. As nulidades da sentença, como seus vícios intrínsecos, são apreciadas em função do texto e do discurso lógico nela desenvolvidos, não se confundindo com erros de julgamento (“error in judicando”), que são erros quanto à decisão de mérito explanada na sentença, decorrentes de má perceção da realidade factual (“error facti”) e/ou na aplicação do direito (“error júris”), de forma que o decidido não corresponde à realidade ontológica ou normativa, com a errada aplicação das normas jurídicas aos factos, erros de julgamento estes a sindicar noutro âmbito”.
Ora, no caso em apreço, alega a autora que a sentença arbitral deve ser anulada porquanto de acordo com o disposto nos nºs 1 e 3 do artº 4.º da LAV, a sentença, além de reduzida a escrito e assinada pelo árbitro deve ser devidamente fundamentada, mesmo não necessite do rigor de uma sentença judicial, sendo que tal fundamentação há-de ter por base o disposto nos artºs 608º e 615º do Código de Processo Civil.
Alega ainda que, no caso, a fundamentação da sentença arbitral é obtusa, não permitindo às partes perceber o iter lógico que foi percorrido pelo tribunal arbitral e isto porque, a matéria controvertida é, segundo a reclamação inicial balizada num lapso temporal (de 2.12.2019 até “à presente data”) e versa essencialmente sobre a contagem de consumos feita por um contador: o que foi instalado no dia 2 de Dezembro de 2019.
Na decisão arbitral a matéria em causa é dividida entre
“3.3.3. A) Do contador Substituído – fatura n.º ...53 no valor de €200,66”
e “3.3.3. B) Do Contador Substituto – fatura n.º ...83 no valor de €354,10”.
A fatura n.º ...53 abrange os consumos do período compreendido entre o dia 27.11.2019 e o dia 29.1.2020 e, algures durante esse interregno, no dia 2.12.2019 o contador é substituído, ou seja, de 27.11.2019 a 1.12.2019 as contagens são feitas pelo contador substituído, e de 2.12.2019 a 29.1.2020 contagens feitas pelo contador substituto.
A fatura n.º ...83 só se refere a consumos contados pelo contador substituto.
Em termos simplistas, o que resulta da sentença é que: as leituras da fatura n.º ...53 estão certas, mesmo sendo parcialmente contabilizadas pelo contador “novo”; as leituras da fatura n.º ...83 estão erradas, sendo totalmente contabilizadas pelo contador “novo”.
Segundo o tribunal arbitral, quanto à fatura n.º ...53 – contador substituído+contador substituto – não assiste razão ao Reclamante, quer porque o contador substituído não tinha qualquer anomalia, quer porque a fatura se reporta a serviços efetivamente prestados pelas Reclamadas – entre elas, a A.
Já quanto à fatura n.º ...83 – que se reporta unicamente ao contador substituto – o caminho argumentativo que o tribunal arbitral seguiu foi o de que havia violação do direito (não dever) de informação, que não há prova de que o contador novo estivesse “a zero” – o que, apesar de ser matéria de facto, não pode deixar de dizer-se que é falso, tal como deveria ter resultado provado pelo documento ... junto com a contestação da E... –, pelo que é parcialmente procedente o pedido do R.
E, além disso, tal fundamentação nunca seria suficiente, porque não permite às partes perceber o iter lógico que foi percorrido pelo tribunal arbitral:
A sentença parte da alegada violação do direito de informação – que, além de não alegada pelo Reclamante, é falsa, porquanto foi expedida missiva a informar da intenção de verificação do contador antigo, com possibilidade de substituição do contador, para a mesma morada para a qual eram enviadas as faturas e que sempre foram recebidas pelo consumidor... com exceção da comunicação relativa ao contador – passa pelo alegado facto de o contador substituto não ter iniciado “a zero” a contagem da energia elétrica fornecida – sendo certo que resulta dos documentos juntos aos autos que o contador estava “a zero” quando foi instalado – para afirmar que as leituras estão erradas e que o valor de €354,10 não é devido.
Foi, por isso, violado o artigo 608.º n.º 2 do CPC, o que fundamenta a nulidade da sentença nos termos do artigo 46.º, n.º 3, al. a), subalínea vi) e do artigo 42.º, n.º 3 da LAV, e do artigo 615.º n.º 1 al. d) do CPC.

Vejamos.
Decorre do nº 3 do artº 42º da LAV, por remissão da subalínea vi), al. a), do nº 3 do artº 46º daquela mesma lei que “A sentença deve ser fundamentada, salvo se as partes tiverem dispensado tal exigência ou se trate de uma sentença proferida com base no acordo das partes, nos termos do artigo 41º”.
Este preceito permite concluir que a sentença proferida deve ser fundamentada, sendo cominada com a nulidade caso não o seja.
Importa, no entanto, aferir em que consiste a fundamentação.
Como refere Manuel Pereira Barrocas, in Lei da Arbitragem Comentada, obra já atrás citada, a pág. 162, “Não é basicamente diferente do conceito da fundamentação da sentença judicial. Deverá dizer em que factos e razões de direito se baseia e que a justifica (cfr. artigo 659º, numero 2, do CPC). (…)
A nulidade da sentença arbitral não deve, porém, ser vista à luz do regime da sentença judicial fixado no CPC, não podendo, de modo algum ser atacada senão por violação do dever de fundamentação de uma sentença de tipo arbitral e conforme as características do processo arbitral, despido assim do formalismo rígido da sentença do tribunal estadual”.
Lida a sentença arbitral e o seu percurso lógico jurídico, não parece que se possa considerar verificada a nulidade de sentença invocada.
Efetivamente, tal sentença começa por delimitar, em termos consistentes e inteligíveis, o objecto do processo, enunciando as pretensões das partes e respectivos fundamentos e especificando a matéria de facto tida por assente, na sequência da audiência de discussão e julgamento e a sua motivação.
De seguida, aborda o acórdão arbitral as excepções deduzidas, considerando, com os fundamentos que aduz – e são perfeitamente inteligíveis – afastada, quer a incompetência material alegada pelas partes, reconhecendo o Tribunal competente para apreciar a questão, quer a ilegitimidade passiva alegada pela Requerida2 E... (decisões que a Requerida 2 e ora autora não põe em causa) e apreciando ainda as demais questões que enunciou como sendo o objeto do litígio, a saber, se as faturas refletem o consumo real do local de instalação, devendo ou não ser retificadas e se as requeridas devem ou não restituir ao requerente os montantes que hajam cobrado a mais, questões estas de fundo.
Assim a decisão condenatória proferida – e cujo mérito não cabe sindicar nos presentes autos - encontra-se suficientemente fundamentada, nos planos factual e jurídico, sendo perfeitamente perceptível o iter lógico jurídico que nela se seguiu para a dirimição do litígio, cumprindo consequentemente, em termos satisfatórios, as exigências legais e constitucionais do dever de fundamentação das decisões judiciais.
Neste sentido vejam-se os Acordãos da Relação de Lisboa de 15 de março de 2016, Proc.º nº 871/15.6YRLSB-7, in www.dgsi.pt e do Supremo Tribunal de Justiça de 15/05/2007, Proc.º nº 07..., in www.dgsi.pt, referindo este último que “A falta ou insuficiência da fundamentação da decisão da matéria de facto não constitui vício susceptível de ser qualificado como falta de fundamentação do acórdão arbitral, não determinando a sua nulidade nos termos dos artºs 23º, nº 3, e 27º, nº 1, al. d), da Lei da Arbitragem Voluntária (Lei nº 31/86, de 29/08). Nulidade do acórdão arbitral haveria, sim, se nele não tivessem sido descritos os factos tidos por provados.
A operada indicação dos factos provados e dos meios de prova que serviram de sustentáculo a cada um deles satisfaz o imperativo constitucional e processual da fundamentação da decisão (artºs 205º, nº 1 da Constituição da República Portuguesa e 158º, nº 1 do CPC), tanto mais que, no caso concreto, a recorrente só não pôde pedir que os Árbitros procedessem à análise crítica das provas, porque renunciou antecipadamente ao recurso quanto ao mérito do acórdão, confiando aos Árbitros a realização de um julgamento ex aequo et bono.”


Ainda no mesmo sentido, segundo se nos afigura, pode ver-se Dário Moura Vicente (coordenador), Armindo Ribeiro Mendes, José Miguel Júdice, José Robin de Andrade, Nuno Ferreira Lousa, Pedro Metello Nápoles, Pedro Siza Vieira e Sofia Martins, in ‘Lei da Arbitragem Voluntária Anotada, 2º Edição. Revista e atualizada, 2015, Almedina’, a pgs. 111, onde esses autores, enquanto associados da Associação Portuguesa da Arbitragem, escrevem: ‘A necessidade de fundamentação da sentença consta também da Lei-Modelo (artº 31º), da Lei Alemã (§1054, nº 2), da Lei Espanhola (artigo 37, n. 4) e da Lei Francesa (artigo 1482), e constava já do nº 3 do artº 23º da LAV de 1986. Não se exige qualquer tipo específico de fundamentação nem se impõe que sejam expressamente considerados todos os argumentos jurídicos invocados pelas partes. A tendência jurisprudencial claramente dominante é no sentido de que o grau de fundamentação exigido seja menor do que é a prática corrente nas sentenças judiciais... É prudente inserir alguma fundamentação para evitar riscos de anulação ou de recusa de exequatur’.
A págs. 125 escrevem ainda “A subalínea vi) – do artº 46º, nº 3 – tem por fonte o artº 27º, nº 1, al. d), da LAV 1986 e visa sancionar faltas formais graves da sentença: a falta das assinaturas devidas e a falta de fundamentação, quando devida, tendo em conta, no primeiro caso, o nº 1, e, no segundo caso, o nº 3 do artº 43º. ... A jurisprudência dos tribunais estaduais a respeito do artº 27º, nº 1, alínea d), da Lei 31/86 considera que só a falta absoluta de fundamentação - e não a mera insuficiência da mesma – conduz à anulação de decisão arbitral. No entanto, em face do disposto no artº 205º, nº 1 do Constituição, deve entender-se que falta a fundamentação se não forem intelegíveis as concretas razões de facto e de direito da decisão, ...’.
Nestes termos, julgamos, também aqui improcedente a presente ação de anulação de sentença arbitral, por não verificação de fundamentos para a requerida anulação, tanto mais que, conforme supra exposto, a decisão sobre os factos dados como provados se encontra fundamentada na sentença, assim como o está a questão de direito.
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V. DECISÃO

Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente a presente ação/impugnação, confirmando-se a sentença arbitral.
Custas pela impugnante
Guimarães, 27 de abril de 2023

Relatora: Margarida Gomes
Adjuntas: Conceição Bucho
Raquel Rego