Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
212/16.5T8PTL.G1
Relator: AFONSO CABRAL DE ANDRADE
Descritores: RECURSO
QUESTÃO NOVA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 11/08/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
1. Quando um recorrente vem colocar perante o Tribunal superior uma questão que não foi abordada nos articulados, não foi incluída nas questões a resolver, e não foi tratada na sentença recorrida, então estamos perante o que se costuma designar de questão nova.

2. Por definição, a figura do recurso exige uma prévia decisão desfavorável, incidente sobre uma pretensão colocada pelo recorrente perante o Tribunal recorrido, pois só se recorre de uma decisão que analisou uma questão colocada pela parte e a decidiu em sentido contrário ao pretendido.

3. A única excepção a esta regra são as questões de conhecimento oficioso, das quais o Tribunal tem a obrigação de conhecer, mesmo perante o silêncio das partes.

4. Não sendo uma situação de conhecimento oficioso, não pode o Tribunal superior apreciar uma questão nova, por pura ausência de objecto: em bom rigor, não existe decisão de que recorrer. É um caso de extinção do recurso por inexistência de objecto.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

Sumário: 1. Quando um recorrente vem colocar perante o Tribunal superior uma questão que não foi abordada nos articulados, não foi incluída nas questões a resolver, e não foi tratada na sentença recorrida, então estamos perante o que se costuma designar de questão nova. 2. Por definição, a figura do recurso exige uma prévia decisão desfavorável, incidente sobre uma pretensão colocada pelo recorrente perante o Tribunal recorrido, pois só se recorre de uma decisão que analisou uma questão colocada pela parte e a decidiu em sentido contrário ao pretendido. 3. A única excepção a esta regra são as questões de conhecimento oficioso, das quais o Tribunal tem a obrigação de conhecer, mesmo perante o silêncio das partes. 4. Não sendo uma situação de conhecimento oficioso, não pode o Tribunal superior apreciar uma questão nova, por pura ausência de objecto: em bom rigor, não existe decisão de que recorrer. É um caso de extinção do recurso por inexistência de objecto.


I- Relatório

“X Estruturas Metálicas, Lda.”, NIPC ..., com os sinais dos autos, intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra “Y – Sociedade Construções Compra e Venda de Propriedades, Lda.”, NIPC ..., também com os sinais dos autos, pedindo a condenação da ré no pagamento da quantia de € 10.879,43, relativa a capital e juros vencidos, bem como juros vincendos.

Para o efeito, alega que prestou serviços de fornecimento e colocação de caixilharia numa obra que a ré tinha adjudicado à sociedade “TC & Filhos, Lda.”, no valor de € 13.500,00, apenas tendo sido pagos € 4.050,00.

Citada a ré, contestou para alegar a sua ilegitimidade passiva, na medida em que nada negociou com a autora e sempre contactou com a referida “TC & Filhos, Lda.”, a quem adjudicou a obra mediante orçamento chave na mão.

Impugnou o alegado e deduziu reconvenção para pedir uma indemnização por litigância de má-fé.

A autora replicou para manter o alegado na petição inicial e pugnar pela inadmissibilidade legal da reconvenção.

Foi proferido despacho saneador, que julgou improcedente a excepção dilatória, não admitiu a reconvenção, fixou o objecto do processo e temas da prova, não tendo sido apresentada qualquer reclamação.

Realizou-se a audiência de julgamento mediante a observância das legais formalidades.

A final, foi proferida sentença que julgou a acção totalmente improcedente e absolveu a ré de todos os pedidos formulados pela autora.

Inconformada com esta decisão, a autora dela interpôs recurso, que foi recebido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo (artigos 629º, 631º, 638º, 644º,1,a, 645º,1,a e 647º,1, todos do Código de Processo Civil).

Finda as suas alegações com a formulação das seguintes conclusões:

1. Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida nos autos do processo acima identificado, que julgou a acção totalmente improcedente, determinando a absolvição da ré.
2. No entendimento da recorrente, o tribunal recorrido, diante de certos factos carreados a juízo, essenciais para a descoberta da verdade material e da justa composição do litigio, não os valorou correctamente, o que obstou ao acolhimento da pretensão da recorrente.
3. Na verdade, mal andou o tribunal recorrido ao considerar como provado o facto elencado no item 10, este último na parte em que se considera que o pagamento que a ré realizou, no montante de €4.050,00, foi a pedido da “TC & Filhos Lda.”
4. Ademais, o tribunal recorrido apenas teve em consideração o facto de os depoimentos conduzirem a uma prestação de serviços, na modalidade de contrato de empreitada, efectuada pela autora, ora recorrente, à sociedade TC.
5. Sendo que dos autos não consta nenhuma prova documental nesse sentido, isto é, nem a proposta de adjudicação.
6. Ainda assim, o tribunal recorrido, após a produção de prova em audiência de julgamento, desconsiderou determinados factos, que na consideração da recorrente, importariam uma decisão diferente.
7. Com efeito, da análise da prova produzida em sede de audiência e discussão de julgamento, nomeadamente do depoimento da testemunha M. C. e do representante legal da ré, B. B., resulta a existência de dificuldades económicas na empresa TC.
8. Resulta, também, da prova produzida nos autos que a recorrente solicitou um adiantamento em face dos serviços solicitados.
9. No entanto, a empresa TC sempre negou tal pagamento, em virtude das dificuldades supra aludidas. E, perante isto, a recorrente solicitou o pagamento do montante em questão à recorrida.
10. Efectivamente, foi a empresa TC que solicitou este pagamento à ré, no entanto, tal só ocorreu a pedido da recorrente. Pedido esse que foi feito, de forma reiterada, pela recorrente.
11. E que, consequentemente, esta sociedade fez o pedido de pagamento à ré, ora recorrida.
12. Não resta, assim, qualquer dúvida que foi a recorrente quem, ainda que indirectamente, efectuou o pedido de pagamento à recorrida, pelo que o facto elencado sob o item 10º não deveria ter sido dado como provado, uma vez que tal pedido não foi efectuado, de forma livre e espontânea, pela sociedade TC à recorrida.
13. Desta feita, a prova produzida nestes autos implicaria que outros factos fossem considerados para a decisão sobre o mérito da causa.
14. Tal qual prevê a al. b), n.º 2 do artigo 5º do CPC “Os factos que sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa, desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciar.”
15. Tais factos justificam a causa de pedir e seriam enquadráveis numa figura jurídica, a da sub-rogação, prevista nos artigos 606º a 609º do CC.
16. A sub-rogação consente que um credor possa exercer contra terceiro direitos de conteúdo patrimonial, designadamente contra o devedor daquele que na relação jurídica ocupa a posição de devedor.
17. Assim, conforme melhor se explana nas alegações supra, a sub-rogação do subempreiteiro contra o dono da obra é reconhecida e admitida na jurisprudência e na doutrina e depende da verificação de determinados requisitos.
18. Os quais, na presente lide, estão verificados.
19. Ainda assim, o Tribunal a quo não apreciou esta matéria.

A recorrida contra-alegou, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:

O Recurso ora apresentado pela Recorrida tem por finalidade alterar a matéria de facto dada como não provada sob o item 10º.
Ora nas suas alegações a Recorrente não indica os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados (al. a) do n.º 1 do cit. art. 685.º-B, do CPC) e não refere os concretos meios probatórios, constantes do processo, que – na sua perspectiva - imporiam decisão de facto diversa da recorrida (al. b) do n.º 1 do mesmo art.º 685.º-B), tendo descurado de o fazer, nos termos do art. 522º, nº 2, do CPC (com menção expressa e precisa das passagens da gravação em que se funda – como o exige o nº 2 do cit. art. 685º-B).
Aliás as passagens transcritas nas alegações, salvo o devido respeito, vêm ainda mais reforçar a correcção e acerto da decisão recorrida.
Porque efectivamente a Meritíssima Juiz a quo, analisou de forma adequada a prova documental vasta e elucidativa junta pelas partes, tendo-a conjugado com a prova testemunhal produzida em juízo para chegar à conclusão de que efectivamente jamais a Recorrida contratou com a Recorrente.
Como aliás, indirectamente vem agora a Recorrente admitir, tentando fazer valer, em sede de alegações de recurso, de forma que apetece apelidar de desesperada, um suposto direito de sub-rogação, sem qualquer possibilidade e viabilidade, nos termos do disposto no nº 1 do art. 606º do CCIV.
Isto porque, a sub-rogação pressupõe que o devedor não tenha exercido o seu direito, o que não aconteceu in casu, uma vez que o empreiteiro não é credor da Recorrida, porque esta nada lhe deve.
A decisão recorrida, não tem por isso qualquer erro, quer quanto à matéria de facto, quer de direito.
Ficando, salvo o devido respeito, claro que a Recorrente litiga de má-fé, ao continuar a alegar factos que sabe serem falsos, e alegar factos que refere terem ficado provadas que não estão.
Aliás, uma análise à prova documental constante dos autos é suficiente para se compreender o acerto da decisão recorrida indevidamente, não passando o presente recurso, salvo o devido respeito de mais uma tentativa da Recorrente de cobrar um montante que sabe que não lhe é devido pela recorrida.
10º Deve pelo exposto, a decisão recorrida ser confirmada integralmente, porque o item referido sob o nº 10, foi convenientemente julgado pela decisão recorrida, não se vislumbrando qualquer erro quanto a esse facto.

II
As conclusões das alegações de recurso, conforme o disposto nos artigos 635º,3 e 639º,1,3 do Código de Processo Civil, delimitam os poderes de cognição deste Tribunal, sem esquecer as questões que sejam de conhecimento oficioso. Assim, e, considerando a natureza jurídica da matéria versada, as questões a decidir são as seguintes:

a) eventual erro de julgamento na matéria de facto;
b) apreciação da questão da sub-rogação

III
A decisão recorrida considerou provados os seguintes factos:

1. A autora dedica-se ao fabrico e montagem de estruturas metálicas, portas janelas e elementos similares, entre outros.
2. A autora forneceu e colocou caixilharia em alumínio, cor inox, com vidro duplo laminado, numa obra que se encontrava adjudicada pela ré à sociedade “TC & Filhos, Lda”.
3. A ré emitiu um cheque a favor da autora, com o número …, sacado sob o Banco A, agência de Paços de Ferreira, no valor de € 4.050,00 (quatro mil e cinquenta euros).
4. Após o fornecimento e a colocação da caixilharia, de que não houve reclamação, a autora emitiu uma factura no valor global de € 13.500,00 (treze mil e quinhentos euros), tendo sido deduzida a quantia de € 4.050,00 (quatro mil e cinquenta euros).
5. A sociedade “TC & Filhos, Lda.” veio a ser declarada insolvente.
6. A autora interpelou a ré para pagar, o que esta não fez.
7. A autora sempre contactou com a sociedade “TC & Filhos Lda.”, com sede no lugar ..., Ponte de Lima.
8. A ré acordou com a “TC & Filhos Lda.” a construção de um prédio na freguesia da ..., Ponte de Lima.
9. A Notificação Judicial Avulsa efectuada a 20 de Março de 2014 e notificada a 14 de Abril de 2014, junta com a petição inicial, foi objecto de resposta pela ré, no dia 17 de Abril de 2014, conforme documentos nº 4 e 5 juntos com a contestação.
10. O pagamento que a ré realizou no montante de € 4.050,00 foi por si a pedido da “TC & Filhos Lda”.
11. A ré pagou a quantia de € 4.050,00, por cheque sacado sob o Banco A com o nº … emitido em 6-10-2013, pago no dia 8-11-2013.
12. A ré solicitou nessa mesma data uma declaração no sentido do vertido em 9) à “TC & Filhos, Lda.”.
13. A “TC & Filhos, Lda.” emitiu factura que a ré pagou, conforme documentos nº 6, 7 e 8 juntos com a contestação e documento nº 3 junto na petição inicial.
14. A ré não adjudicou a obra à autora.
15. A autora não negociou com a ré.

Factos não provados:

Não se provou que:

1. A ré dedica-se ao ramo da construção civil.
2. No desenvolvimento da referida actividade a autora foi contactada pela ré, com vista ao fornecimento das caixilharias referidas em 2 dos factos provados.
3. Inicialmente a ré solicitou que a factura fosse emitida em nome da sociedade “TC & Filhos, Lda.”
4. Acrescentando que seria para melhor fluxo e gestão de tesouraria.
5. Quando na realidade visava esquivar-se ao pagamento.
6. Foi a ré, na pessoa dos legais representantes, quem solicitou os serviços da autora.
7. O cheque referido em 3 dos factos provados era a título de sinal e adiantamento do
preço, acordado com a ré.
8. Era a ré quem efectuava os pagamentos à autora.
9. A autora nunca contactou com a ré.
10. A ré não solicitou que a autora emitisse factura em nome da “TC & Filhos Lda.”.
11. A ré adjudicou a obra à “TC & Filhos, Lda” na modalidade chave na mão.
12. A autora reclamou e viu os seus créditos reconhecidos no processo de insolvência da “TCs & Filhos, Lda.”.

IV
Conhecendo do recurso.

Em primeiro lugar importa apreciar o recurso sobre a matéria de facto.

E o primeiro passo é sempre averiguar se esse recurso cumpre os requisitos legais.
É sabido que o legislador fez constar do art. 640º CPC os trâmites a seguir pelo recorrente que pretenda impugnar a decisão do Tribunal sobre matéria de facto.

É importante fazer uma distinção entre: a) os requisitos formais de admissibilidade do recurso sobre matéria de facto; b) o mérito do recurso apresentado sobre matéria de facto.

Quanto ao primeiro aspecto, escreve Abrantes Geraldes (Recursos, 2017, fls. 158) o seguinte:

“a rejeição total ou parcial do recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto deve verificar-se em algumas das seguintes situações:

a) falta de conclusões sobre a impugnação da decisão da matéria de facto (arts. 635º, nº 4 e 641º, nº 2, al. b);
b) falta de especificação, nas conclusões, dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorrectamente julgados (art. 640º, nº 1, al. a);
c) falta de especificação, na motivação, dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados (vg. documentos, relatórios periciais, registo escrito, etc);
d) falta de indicação exacta, na motivação, das passagens da gravação em que o recorrente se funda;
e) falta de posição expressa, na motivação, sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação”.

Ora, da leitura das alegações da recorrente resulta uma situação atípica, em que por um lado não existe um respeito cabal dos requisitos formais da impugnação da decisão de facto previstos nas alíneas c) e d) supra citadas, mas por outro existe uma aparência de terem sido cumpridos esses requisitos. Importa dizer que esta Relação entenderá sempre que, na dúvida, se deve conhecer do recurso da matéria de facto, por uma questão de prevalência da substância sobre a forma.

Porém, a atipicidade que supra referimos emerge de ser a própria recorrente a cair em contradição quanto ao alegado erro de julgamento da matéria de facto. Com efeito, a recorrente começa por afirmar que quer impugnar o facto que o Tribunal deu como provado sob o nº 10, quando escreve: “na verdade, mal andou o tribunal recorrido ao considerar como provado o facto elencado no item 10, este último na parte em que se considera que o pagamento que a ré realizou, no montante de €4.050,00, foi a pedido da “TC & Filhos Lda”.

E recordemos que o facto provado nº 10 é este: “o pagamento que a ré realizou no montante de € 4.050,00 foi por si a pedido da “TC & Filhos Lda”.

Porém, na mesma peça processual, é a mesma recorrente quem escreve: “efectivamente, foi a empresa TC que solicitou este pagamento à ré, no entanto, tal só ocorreu a pedido da recorrente”.

Ou seja, é a própria recorrente que, ao mesmo tempo que afirma que o Tribunal não podia ter dado como provado que o pagamento que a ré realizou no montante de € 4.050,00 foi a pedido da “TC & Filhos Lda, afirma também que efectivamente, foi a empresa TC que solicitou este pagamento à ré.

Contradição frontal.

E não é o facto de acrescentar que “no entanto, tal só ocorreu a pedido da recorrente” que suaviza essa contradição. Basta pensar que o núcleo duro deste litígio consiste em saber se o contrato de fornecimento e colocação de caixilharia em alumínio foi celebrado entre a autora e a ré, como afirma a autora, ou entre a autora e sociedade “TC & Filhos, Lda”, como afirma a ré.

E pretender apenas a revogação do facto provado nº 10, ainda que tal pretensão merecesse provimento, não iria alterar em nada a solução final da acção, pois continuariam provados os factos 14 (a ré não adjudicou a obra à autora) e 15 (a autora não negociou com a ré), e não provados os factos 2 (No desenvolvimento da referida actividade a autora foi contactada pela ré, com vista ao fornecimento das caixilharias referidas em 2 dos factos provados), 3 (Inicialmente a ré solicitou que a factura fosse emitida em nome da sociedade “TC & Filhos, Lda”), 4 (Acrescentando que seria para melhor fluxo e gestão de tesouraria), e 6 (Foi a ré, na pessoa dos legais representantes, quem solicitou os serviços da autora).

O facto nº 10 é o que se pode chamar um facto indiciário: ou seja, não preenche nenhum dos elementos da causa de pedir normativa apresentada pela autora, e só por si é irrelevante para esse desiderato. A sua função seria a de, conjugado com outros factos circunstanciais ou indiciários, permitir chegar à prova, ou, no caso concreto, contraprova, dos factos estruturantes da causa de pedir.

Assim, considerando que o único “erro” que é apontado à sentença recai sobre o facto provado nº 10, e que nessa parte a recorrente cai em contradição insanável pois afirma uma coisa e o seu contrário, esta Relação conclui que não estão reunidos os requisitos para conhecer do recurso no que à matéria de facto diz respeito.

Finalmente, não custa acrescentar que da leitura da matéria de facto provada e não provada e da respectiva fundamentação não resulta qualquer contradição que pudesse pôr em causa a validade substancial de tal decisão. Pelo contrário, estamos perante um silogismo judicial simples e escorreito.

Consideramos assim definitivamente assente a matéria de facto.

E, aqui chegados, a última questão que vem colocada pela recorrente é a da sub-rogação, prevista nos artigos 606º a 609º do CC.

E, como é penosamente óbvio, esta Relação não poderá conhecer da mesma, porque se trata de questão nova, que não foi apreciada pela primeira instância.

Explicando melhor, essa questão não faz parte do objecto do processo, pois não foi incluída na petição inicial / contestação / réplica, não foi incluída nas questões a resolver, e não foi tratada na sentença recorrida.

É uma nova questão que o recorrente se lembrou de trazer agora em sede de recurso.

Ora, por definição, a figura do recurso exige uma prévia decisão desfavorável, incidente sobre uma pretensão colocada pelo recorrente perante o Tribunal recorrido. Só se recorre de uma decisão que analisou uma questão colocada pela parte e a decidiu em sentido contrário ao pretendido.

Escreve a propósito Abrantes Geraldes (ob cit, fls. 109): “a natureza do recurso, como meio de impugnação de uma anterior decisão judicial, determina outra importante limitação ao seu objecto, decorrente do facto de, em termos gerais, apenas poder incidir sobre questões que tenham sido anteriormente apreciadas, não podendo confrontar-se o Tribunal ad quem com questões novas”.

A única excepção a esta regra, como bem se compreende, são as questões de conhecimento oficioso, das quais o Tribunal tem a obrigação de conhecer, mesmo perante o silêncio das partes.
Não sendo uma situação de conhecimento oficioso, não pode o Tribunal superior apreciar uma questão nova, por pura ausência de objecto: em bom rigor, não existe decisão de que recorrer. É um caso de extinção do recurso por inexistência de objecto.

Assim, este Tribunal da Relação não irá conhecer dessa questão, por impossibilidade legal.

E assim, concluímos pela total improcedência do recurso.

V- DECISÃO

Por todo o exposto, este Tribunal da Relação de Guimarães decide julgar o recurso totalmente improcedente e confirma na íntegra a decisão recorrida.

Custas pela recorrente (art. 527º,1,2 CPC).

Data: 8/11/2018

Relator

(Afonso Cabral de Andrade)

1º Adjunto
(Alcides Rodrigues)

2º Adjunto
(Joaquim Boavida)