Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
99/12.7TCGMR.G1
Relator: ANA CRISTINA DUARTE
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
DANO BIOLÓGICO
DANOS PATRIMONIAIS
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 09/15/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: 1 - A uma perda de ganho efetiva equivale, para efeitos de indemnização, como dano patrimonial, o esforço suplementar que as vítimas de incapacidade têm que desenvolver para realizar o seu trabalho.
2 - A afetação da pessoa do ponto de vista funcional, ainda que não se traduza em perda de rendimento de trabalho, releva para efeitos indemnizatórios – como dano biológico/patrimonial – porque é determinante de consequências negativas ao nível da atividade geral do lesado e, especificamente, também, da sua atividade laboral.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

I. RELATÓRIO
D.. e L.. deduziram ação declarativa contra Companhia de Seguros.., SA, pedindo a condenação da ré a pagar ao autor D.. a quantia de € 41.399,90 e ao autor L.. a quantia de € 51.211,35, em virtude de danos patrimoniais e não patrimoniais por ambos sofridos quando eram transportados gratuitamente em viatura que sofreu acidente de viação (despiste) provocado com culpa exclusiva pelo seu condutor e cuja responsabilidade civil se encontrava transferida para a ré.
A Segurança Social deduziu pedido de condenação da ré a pagar-lhe a quantia de € 978,35, pagos a L.. a título de subsídio de doença.
A ré contestou, aceitando a existência do seguro e a responsabilidade do seu segurado e impugnando os danos e os seus valores.
Dispensada a audiência preliminar, foi proferido despacho saneador e definidos os factos assentes e a base instrutória, que se fixaram sem reclamações.
Entretanto, a requerimento dos autores, foi apensada uma outra ação (proveniente do mesmo acidente de viação), que corria na 1.ª Vara, em que J.., também transportado no veículo acidentado, pede a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de € 118.116,45, ação essa já contestada (nos mesmos moldes) e saneada.
Teve lugar a audiência de julgamento, após o que foi proferida sentença que condenou a ré a pagar ao autor D.. a quantia de € 32.714,74, ao autor L.. a quantia de € 31.639,65 e ao autor J.. a quantia de € 60.649,80, valores aos quais acrescem juros, desde a citação até efetivo e integral pagamento, condenando ainda a ré a pagar ao Instituto de Segurança Social IP, Centro Distrital de Braga, a quantia de € 978,35.
Discordando da sentença, dela interpuseram recurso os autores, tendo finalizado as suas alegações com as seguintes
Conclusões:
1ª Os demandantes J.., D.. e L.. eram passageiros do veículo ..-AT-.., propriedade de A.., Lda e conduzido por A.., encontrando-se a responsabilidade civil decorrente da circulação daquele veículo para a Companhia de Seguros.., mediante o contrato de seguro obrigatório automóvel titulado pela apólice nº 208096731.
2ª O demandante J.. sofreu traumatismo do ombro direito com fractura do colo do fémur, fractura de troquiter, traumatismo do punho direito, com fractura do escafóide , e traumatismo do ombro esquerdo, com contusão.
3ª Foi submetido a uma intervenção cirúrgica ao escafóide (punho direito); fez tratamento fisiátrico em 45 sessões; ficou com limitação da mobilidade do ombro direito: - na abdução de 0º - 110º e na flexão 0º - 110º; limitação da mobilidade do punho direito, na flexão 0º e 25º, na extensão 0º a 20º e no desvio radial 0º a 10º, sequelas que lhe determinaram uma incapacidade parcial permanente de 12 pontos.
4ª Teve um período de défice funcional temporário total de 3 dias e um período de défice funcional temporário parcial de 302 dias, sendo o período de repercussão temporário na actividade profissional total de 305 dias.
5ª As lesões sofridas e os tratamentos a que foi submetido provocaram-lhe dores físicas intensas, incómodo e mal estar que o vão acompanhar para toda a vida e que se exacerbam com as mudanças de tempo.
6ª O demandante, que tinha 43 anos à data do acidente e que era saudável, fisicamente bem constituído, dinâmico e trabalhador, sendo comerciante de produtos alimentares por conta própria, auferindo mensalmente, 12 vezes por ano, o rendimento líquido de 2.750 €.
7ª Como o demandante esteve 305 dias sem poder trabalhar o Tribunal condenou a demandada, a este título em 27.500 €.
* *
8ª O demandante D.. apesar dos tratamentos a que se submeteu ficou a padecer definitivamente de traumatismo do ombro e região dorsal direita, de omalgia residual à direita; rigidez moderada do ombro direito com limitação da mobilidade:
- na abdução entre 0º e 130º;
- na antepulsão entre 0º e 130º;
- na rotação interna entre 0º e 40º/50º;
- na rotação externa entre 0º e 60º;
- cicatriz distrófica de 6 cm de extensão, alargada, localizada na face anterior do ombro direito,
9ª sequelas que lhe determinam uma incapacidade parcial permanente de 10 pontos. As lesões sofridas provocaram-lhe dores físicas tanto no momento do acidente como no decurso do tratamento, sendo que as sequelas de que ficou a padecer definitivamente continuam a provocar-lhe dores físicas, incómodo e mal estar que o vão acompanhar durante toda a vida e que se exacerbam com as mudanças de tempo, apesar de ter feito 45 sessões de fisioterapia.
10ª Na altura do acidente o demandante tinha 44 anos de idade e era saudável, fisicamente bem constituído, dinâmico, alegre, trabalhador e jovial.
11ª O demandante era motorista da Câmara Municipal de Guimarães com o salário de 665 € por mês, 14 vezes por ano. E nas horas fora do seu horário de trabalho fazia jardinagem, em clientes já de há muito tempo, auferindo, em média, 400 € por mês, 11 vezes por ano, o que significa que tinha um rendimento mensal de cerca de 13.710 €, tendo estado 179 dias incapacitado de trabalhar.
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12ª O demandante L.. em consequência do acidente sofreu:
1. – traumatismo da face com:
a) – fractura do malar direito com envolvimento do pavimento da órbita, sem restrição dos movimentos oculares e sem diplopia;
b) – fractura da arcada zigomática direita;
c) – fractura dupla da mandíbula com:
- fractura do ramo horizontal à esquerda – fractura subcondiliana direita;
2. – traumatismo do punho direito, com fractura da apófise estilóide do rádio e
3. – traumatismo da mão esquerda, com contusão ao nível da articulação metacarpo/falângica do 3º dia.
13ª O demandante L.. foi seguido na Consulta Externa de Cirurgia Plástica e Maxilo-facial do Hospital de S. João – Porto, tendo-lhe sido feita a aplicação de dois implantes dentários; ficou a padecer definitivamente de dor ao nível da articulação têmporo-mandibular direita, nomeadamente aquando da mastigação de alimentos duros, com uma ligeira rigidez do punho direito, com limitação da mobilidade na flexão dorsal entre 0º e 50º, na flexão palmar entre 0º e 50º, sequelas que lhe determinam um défice funcional permanente de integridade físico psíquica de 12 pontos e um período de repercussão temporária na actividade profissional de 160 dias.
14ª O demandante L.. tinha à data do acidente 34 anos e era saudável, fisicamente bem constituído, dinâmico, alegre, jovial e trabalhador.
15ª O demandante L.., quer no momento do acidente, quer no do tratamento a que teve de se submeter provocaram-lhe dores físicas intensas e um profundo mal estar que o vão acompanhar durante toda a vida.
16ª Segundo o douto acórdão do S.T.J. de 24.4.2013 a indemnização deve englobar os prejuízos estéticos, os sociais, os derivados da não possibilidade de actividades agradáveis e outros, devendo a sua fixação não ser meramente simbólica, miserabilista ou arbitrária, norteando-se por um critério de equidade, sendo de afastar a situação financeira do sinistrado, por violação do princípio constitucional de igualdade, com violação dos artigos 13º e 266º da Constituição Portuguesa.
17ª Ficou-nos o cabelo em pé quando lemos na sentença em recurso que dos factos dados como provados não resultou que para os AA. tivesse existido uma diminuição da capacidade de ganho
18ª e que, dimensionada a questão por este vector é manifesto, para nós (Sr. Juiz), que tal implica que a questão seja perspectivada do ponto de vista não patrimonial.
19ª Para não deixar expresso o nosso sentimento de alma, porque não sairia em português suave, diremos que ficamos estarrecidos.
20ª Qualquer um dos pontos que nos chocou vai frontalmente contra a jurisprudência esmagadoramente maioritária quer quanto ao que disse, quer quanto ao que se transcreveu tanto na conclusão 17ª como da 18ª.
21ª E com isso também nos abriu caminho para podermos dizer que a sentença recorrida violou o direito constitucional, designadamente os artigos 13º e 266º da Constituição da República Portuguesa.
22ª Como inconstitucional é também o Dec.-Lei nº 352/2007 que no anexo I V tabela nacional de incapacidades para acidentes de trabalho e doenças profissionais, enquanto o anexo II é a tabela de avaliação de incapacidades permanentes em direito civil e que, para a mesma lesão, valoriza-a de modo completamente diferente.
23ª Já há muito tempo que não deparávamos com um total desprezo pela jurisprudência que resulta de muito trabalho e muito saber, para suavizar a vida dos lesados e, jamais, para os empurrar para as portas das igrejas a pedir esmolas para não morrerem de fome.
24ª Ocorre perguntar se a equidade está de férias sabáticas… sendo certo que o montante dos pedidos era razoável e adequado, devendo fixar-se.
25ª A sentença recorrida violou o disposto nos artigos 483º, 494º, 562º e 566º todos do Cód. Civil e os artigos 13º e 266º da Constituição Portuguesa.
Pelo exposto, revogar a sentença recorrida de acordo com as conclusões formuladas, será fazer justiça.

Contra alegou a ré, pugnando pela manutenção da sentença recorrida.
O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo.
Foram colhidos os vistos legais.

A única questão a resolver traduz-se em saber se foram corretamente fixadas as indemnizações devidas aos autores.

II. FUNDAMENTAÇÃO
Na sentença foram considerados provados os seguintes factos:
FACTOS ASSENTES
1. Cerca das 02h30 do dia 25.4.2009 ocorreu um acidente de viação na rua da Ribeira – Santo Estevão de Briteiros – Guimarães, em que interveio o veículo ligeiro de passageiros ..-AT-.., propriedade de A.., Lda. e conduzido por A.., sob a direcção efectiva daquela e no interesse daquela.
2. A Rua da Ribeira tem casas de habitação e de comércio de um e do outro lado da estrada e está dentro de uma localidade.
3. O referido veículo circulava pela Rua da Ribeira, no sentido Santa Eufémia de Prazins – Santo Estêvão de Briteiros, pela metade direita da faixa de rodagem, atento o referido, mas o seu condutor fazia-o completamente distraído, sem atenção à sua condução, ao traçado da via naquele local e ao restante trânsito, com uma velocidade superior a 50 Kms por hora e com a mais completa falta de cuidado, de prudência, de respeito, de consideração, de diligência, de habilidade e de destreza.
4. Por tudo isso, ao descrever uma curva para a sua esquerda, o A.. perdeu o controlo do veículo que conduzia, despistando-se para a sua direita, com o que invadiu a berma do seu lado direito, onde acabou por embater com a parte da frente do lado direito do veículo ..-AT-.. num môrro de terra ali existente desse lado, acabando por se imobilizar fora da faixa de rodagem.
5. Os AA. D.. e L.. eram passageiros do veículo ..-AT-.., transportados gratuitamente.
6. Em consequência do acidente, o A. D.. sofreu traumatismo do ombro e região dorsal direita, com a) – contusão, omalgia e incapacidade funcional do ombro; b) – rotura da coifa dos rotadores, envolvendo: - a rotura completa dos tendões: - supra espinhoso, sub-escapular e o tendão conjunto; - a rotura quase completa do tendão infra-espinhoso.
7. Do local do acidente foi imediatamente transportado para o S.U. do Centro Hospitalar do Alto Ave – Guimarães.
8. A partir do mês de Maio de 2009 transitou para os Serviços Clínicos a cargo de demandada na Clínica de Santo António – Braga e no dia 27.5.2009 foi submetido a R.M. do ombro direito que revelou a existência das lesões da coifa dos rotadores descritas em 6.
9. Por isso, no dia 29.6.2009 foi submetido a uma intervenção cirúrgica ao ombro direito na Clínica S. Lázaro – Braga, a cargo da demandada, ali permanecendo internado até ao dia 1.7.2009, altura em que teve alta hospitalar.
10. Posteriormente efectuou tratamento fisiátrico na Clínica Fisioguima durante 45 sessões, tendo registado evolução favorável, no que diz respeito ao ombro direito.
11. No dia 15.10.2009 foi-lhe dada alta definitiva dos Serviços Clínicos a cargo da demandada, na Clínica de Santo António, em Braga.
12. Na altura do acidente, o demandante D.. tinha 44 anos de idade.
13. O demandante D.. é motorista na Câmara Municipal de Guimarães.
14. Em consequência do acidente, o demandante L.. sofreu 1. – traumatismo da face, com: a) – fractura do malar direito com envolvimento do pavimento da orbita, sem restrição dos movimentos oculares e sem diplopia; b) – fractura da arcada zigomática direita; c) – fractura dupla da mandíbula com: - fractura do ramo horizontal à esquerda, - fractura subcondiliana direita; 2. – traumatismo do punho direito, com fractura da apófise estilóide do rádio e 3. – traumatismo da mão esquerda, com contusão ao nível da articulação metacarpo/falângica do 3º dedo.
15. Do local do acidente foi imediatamente transportado para o S.U. do Centro
Hospitalar do Alto Ave – Guimarães, após o que foi transferido para o S.U. do Hospital de S. João – Porto, onde ficou internado no Serviço de Cirurgia Maxilofacial/Cirurgia Plástica.
16. No dia 5.5.2009 foi ali submetido a uma intervenção cirúrgica para redução fechada da fractura do malar e arcada zigomática direitas e a redução fechada das fracturas da mandíbula.
17. No dia 7.5.2009 teve alta hospitalar, medicado.
18. Posteriormente, manteve-se em observação e “follow-up” no Centro Médico de Santo António – Braga, a cargo da demandada, de onde acabou por ter alta definitiva no dia 1.9.2009.
19. Na altura do acidente, o demandante L.. tinha 34 anos de idade.
20. O I. S. Social pagou ao demandante L.., a título de subsídio de doença, a quantia de € 978,35 (novecentos e setenta e oito euros e trinta e cinco cêntimos), correspondente ao período de 26 de Abril a 19 de Julho de 2009.
21. Por contrato de seguro titulado pela apólice nº 90.28096731 (antiga Companhia de Seguros..) a Ré assumiu a responsabilidade civil emergente da circulação do veículo ligeiro de passageiros ..-AT-.., propriedade de A.., Lda. – cfr. documento de fls.68 (cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
22. J.. era passageiro do veículo ..-AT-.., transportado gratuitamente.
23. Em consequência do acidente o demandante sofreu:
a. – traumatismo do ombro direito, com:
b. - fractura do colo do úmero;
c. - fractura do troquiter;
d. – traumatismo do punho direito, com fractura do escafóide e
e. – traumatismo do ombro esquerdo, com contusão.
24. Do local do acidente foi imediatamente transportado para o SU do CH do
Alto Ave, onde foi submetido a estudo radiológico, após o que foi sujeito a imobilização do ombro com “Velpeau”.
25. Foi-lhe administrado um analgésico endovenoso, após o que teve alta hospitalar, recolhendo a sua casa.
26. O A. passou a ser seguido pelos Serviços Clínicos a cargo da demandada na Clínica de Santo António, em Braga.
27. No dia 29.6.2009 foi submetido a uma intervenção cirúrgica ao escafóide (punho direito) na Clínica de S. Lázaro – Braga pelo sr. Dr. Àlvaro Gil, a cargo da demandada.
28. No que diz respeito às fracturas do úmero direito foi mantido o tratamento conservador, a imobilização com “Velpeau” que já lhe tinha sido colocada anteriormente no CH do Alto Ave.
29. Posteriormente foi-lhe dada indicação para efectuar tratamento fisiátrico, o
que veio a realizar na Clínica Horizonte em Guimarães num total de 45 sessões.
30. No dia 23.2.2010 teve alta definitiva dos Serviços Clínicos a cargo da demandada no Centro Médico de Santo António – Braga.
31. Ainda mantém o material de osteosíntese no osso escafóide do punho direito.
32. Em consequência das lesões e sequelas resultantes do acidente, o A. ficou a padecer definitivamente de uma incapacidade parcial permanente de 12 pontos.
33. O A. nasceu no dia 16.08.1965.
34. O A. recebeu da R. a quantia de € 1.850,20.
FACTOS PROVADOS
35. O A. D.. foi submetido a estudo radiológico do tórax, ombro e coluna dorsal que não terá revelado a existência de lesões recentes, quer da parede torácica, quer lesões pleuro-pulmonares, quer lesões de fractura do úmero e omoplata direitas.
36. Acabou por ter alta medicado com indicação para fazer repouso no leito e aplicação de gelo nas regiões contundidas.
37. Apesar dos tratamentos a que se submeteu o demandante ficou a padecer definitivamente do traumatismo do ombro e região dorsal direita: a) – omalgia residual à direita.
38. Rigidez moderada do ombro direito com limitação da mobilidade: - na abdução entre 0º e 130º.
39. Na rotação interna entre 0º e 45º.
40. Na rotação externa entre 0º e 60º.
41. Cicatriz distrófica de 7 cm de extensão localizada na face anterior do ombro direito.
42. Sequelas que lhe determinaram um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 9 (nove) pontos.
43. Lhe provocaram um quantum doloris de grau 4 numa escala de 1 a 7.
44. Lhe determinam um dano estético de grau 1 numa escala de 1 a 7.
45. Lhe determinaram um período de repercussão temporária na actividade profissional total de 179 dias.
46. As lesões sofridas provocaram-lhe dores físicas.
47. Tanto no momento do acidente, como no decurso do tratamento.
48. As sequelas de que ficou a padecer definitivamente continuam a provocar-lhe dores físicas, incómodo e mal estar.
49. Que o vão acompanhar durante toda a vida.
50. E que se exacerbam com as mudanças de tempo.
51. À data do embate, o demandante D.. era saudável, fisicamente bem constituído, dinâmico, alegre, trabalhador e jovial.
52. O demandante D.. ganha, por mês, a quantia de € 665,00.
53. 14 vezes por ano.
54. Dedica-se à manutenção de jardins de particulares.
55. De 2ª a 6ª feira e aos sábados, por tempo variável.
56. Ganhando uma quantia mensal de € 400,00.
57. 12 vezes por ano.
58. Por causa das lesões sofridas e dos tratamentos a que teve de se submeter esteve sem poder trabalhar desde o acidente até meados do mês de Outubro de 2009.
59. O A. D.. gastou 220,00 € em honorários médicos.
60. 36,60 € em taxas moderadoras.
61. 28,19 € em medicamentos.
62. 9,95 € em transportes para receber tratamento.
63. 20,00 € numa certidão de nascimento.
64. O A. L.. passou a ser seguido na Consulta Externa de Cirurgia Plástica e Maxilo-Facial do Hospital de S. João – Porto.
65. Foi-lhe feita a aplicação de 2 implantes dentários.
66. O A. L.. ficou a padecer, definitivamente, de dor ao nível da articulação têmporo-mandibular direita, nomeadamente quando da mastigação de alimentos sólidos.
67. Ligeira rigidez do punho direito, com limitação da mobilidade: na flexão dorsal entre 0º e 50º.
68. Na flexão palmar entre 0º e 75º.
69. Sequelas que lhe determinam um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 12 pontos.
70. Lhe provocaram um período de repercussão temporária na actividade profissional total de 160 dias.
71. Lhe determinaram um quantum doloris de grau 5 numa escala de 1 a 7.
72. E lhe provocam um dano estético de grau 1 numa escala de 1 a 7.
73. As lesões sofridas provocaram-lhe dores físicas.
74. Tanto no momento do acidente, como no decurso do tratamento.
75. As sequelas de que ficou a padecer definitivamente continuam a provocar-lhe dores físicas, incómodo e mal estar.
76. Que o vão acompanhar durante toda a vida.
77. E que se exacerbam com as mudanças de tempo.
78. À data do acidente, o demandante L.. era saudável, fisicamente bem constituído, dinâmico, alegre, trabalhador e jovial.
79. O demandante L.. é trolha.
80. Com um rendimento mensal de, pelo menos, € 567,00
81. 14 vezes por ano.
82. Por causa das lesões sofridas e dos tratamentos a que teve de se submeter o demandante esteve sem poder trabalhar até ao fim do mês de Agosto de
2009.
83. Deixando de ganhar a quantia de, pelo menos, € 2268,00.
84. O demandante L.. gastou € 350,00 em honorários médicos.
85. O A. J.. teve fractura proximal do úmero em três partes.
86. Foi submetido a controlo radiológico das fracturas nos dias 2 e 9 de Maio de 2009, tendo-se constatado uma boa redução das fracturas.
87. No dia 20.5.2009 foi observado pela última vez na Consulta Externa de Ortopedia do CH do Alto Ave.
88. Depois de ter recolhido a sua casa manteve-se em repouso.
89. O A. sofreu as seguintes sequelas no membro superior direito:
a. limitação de mobilidade do ombro, na abdução 0-110º e na flexão 0-110º;
b. limitação da mobilidade do punho, na flexão 0-25º, na extensão 0-20º
e no desvio radial 0-10º; e
c. cicatriz plana hipocrómica com cinco centímetros, vertical, situada ao nível da face anterior do punho.
90. As lesões sofridas provocaram-lhe dores físicas, tanto no momento do acidente, como no decurso do tratamento.
91. E as sequelas de que ficou a padecer definitivamente continuam a provocar-lhe dores físicas, incómodo e mal estar que o vão acompanhar durante toda a vida.
92. E que se exacerbam com as mudanças de tempo.
93. Na altura do acidente, o A. era saudável, fisicamente bem constituído, dinâmico, alegre e trabalhador.
94. O A. é comerciante de produtos alimentares por conta própria.
95. Vende, por mês, 12 vezes por ano, cerca de 600 frangos, 800 coelhos e 4.400 dúzias de ovos.
96. Aufere mensalmente, 12 vezes por ano, um rendimento líquido mensal de 2.750 €
97. Por causa dos ferimentos sofridos e dos tratamentos a que teve de se submeter o A. esteve sem poder trabalhar 305 dias, o que implicou que deixou de auferir, pelo menos, 27.500 €.
98. A data de consolidação médico-legal das lesões é fixável em 23.2.2010
99. O período de défice funcional temporário total é de 3 dias.
100. O período de défice funcional temporário parcial é fixável em 302 dias.
101. O período de repercussão temporária na actividade profissional total é de
305 dias.
102. O quantum doloris é de 4 em 7.
103. O défice funcional permanente da integridade físico-psiquica é de 12 pontos.
104. As sequelas são, em termos de repercussão permamente na actividade profissional, compatíveis com o exercício da actividade habitual, mas implicam esforços suplementares.
FACTOS NÃO PROVADOS
Não se provou que:
105. D.. tivesse recolhido a sua casa após as altas hospitalares e lá se tivesse mantido em repouso.
106. Tivesse ficado com limitação do ombro direito na antepulsão entre 0º e 130º.
107. Lhe tivesse sido descontada a quantia de € 665,94 no salário.
108. O A. D.. tivesse ficado, em consequência do acidente, com umas calças inutilizadas, no valor de € 45,00; uma camisola inutilizada, no valor de € 50,00; um casaco inutilizado, no valor de 100 €.
109. A R. Seguradora tivesse assumido os custos da aplicação dos implantes dentários.
110. O A. D.. tivesse ficado a padecer de hipostesia ao nível da região malar e naso-geniana por afectação de ramos do nervo trigémio.
111. De ligeira rigidez, na mão esquerda, da articulação metacarpo-falângica do 3º dedo.
112. O A. L.. tivesse gasto € 125,00 em transportes para receber tratamento.
113. Em consequência do acidente, o demandante L.. ficou com um casaco inutilizado, no valor de € 125,00; umas calças inutilizadas, no valor de € 50,00; e uns sapatos inutilizados, no valor de € 45,00.
114. O repouso de J.. tivesse sido de um mês.
115. J.. apresente atrofia dos músculos do braço de 2 cm e atrofia dos músculos do antebraço de 1,5 cm;
116. Ao RX apresenta:
a. fractura do escafóide consolidada e mantém o material de osteosíntese;
b. irregularidade das superfícies articulares do escafóide e do rádio, com arrancamento de pequeno fragmento ósseo da apófise estilóide do rádio.
117. O défice funcional permanente da integridade físico-psiquíca reduz a capacidade futura de ganho do A. na proporção de 12%.
118. O demandante teve outros prejuízos, tendo gasto:
119. 350,00 € em honorários médicos;
120. 20,00 € numa certidão de nascimento; e
121. 125,00 € em transportes para receber tratamentos.
122. Em consequência do acidente, o demandante ficou com umas calças, uma camisola e um casaco inutilizados e que valiam, respectivamente, 45 €, 60 € e 175 €.
Analisadas as alegações de recurso dos apelantes, ressalta que os mesmos apenas discordam da caracterização como dano não patrimonial do chamado “dano biológico”, a que a sentença se refere, acabando mesmo por não explicitar quais os valores que entendem que deveriam ser fixados a título de dano patrimonial para cada um deles (nas conclusões nada referindo para nenhum e no corpo das alegações limitando-se a referir o caso do recorrente J..). Concluímos que entendem que os valores justos são os peticionados na petição inicial, ou seja, de € 25.224,22 para o D.. (partindo de uma incapacidade de 10 pontos, quando apenas se provou 9 pontos), de € 27.073,90 para o L.. e de € 76.691,65 para o J.. (partindo de uma incapacidade de 13 pontos, quando apenas se apurou ser de 12 pontos e, estranhamente, agora já com 12 pontos, aumentando esse valor, no recurso, para € 93.857,38).
A questão é, portanto, a de saber como avaliar o dano biológico.
Na sentença sob recurso entendeu-se perspetivar a questão do dano biológico sob o ponto de vista do dano não patrimonial.
Os apelantes discordam.
Vejamos.

Nos termos do disposto no artigo 562.º do Código Civil, quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação, e esta obrigação só existe, nos termos do artigo 563.º do mesmo Código, em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão, sendo a indemnização fixada em dinheiro, sempre que a restituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa para o devedor (artigo 566.º, n.º 1, também do CC).
Ficando provado – como é o caso - que os lesados ficaram afetados com sequelas e com uma incapacidade permanente parcial, não há dúvida de que este dano biológico determina uma alteração na sua vida, sendo a sua situação pior depois do evento danoso, pelo que esta alteração tem de forçosamente relevar para efeitos de atribuição de indemnização.
Se a incapacidade permanente parcial tiver reflexos na remuneração que o lesado vai deixar de auferir, não há dúvida que a respectiva indemnização se enquadra nos danos patrimoniais – danos futuros – a que se refere o artigo 564.º, n.º 2 do Código Civil.
Contudo, pode a IPP não determinar nenhuma diminuição do rendimento do lesado, quer porque a sua atividade profissional não é especificamente afetada pela incapacidade, quer porque embora afetado pela incapacidade, o lesado consegue exercer a sua atividade com um esforço complementar, quer porque o lesado está desempregado, quer porque o lesado é uma criança ou um jovem que ainda não entrou no mercado de trabalho.
Em todos estes casos, pode-se discutir se a IPP constitui um dano patrimonial ou um dano não patrimonial.
No caso dos autos, não se verificaram reflexos na remuneração em concreto auferida por nenhum dos três lesados, apesar de terem ficado com IPG de 9, 12 e 12 pontos, respetivamente, a qual dificulta o cabal exercício das suas actividades.
Nestas situações, a uma perda de ganho efetiva equivale, de alguma forma, para efeitos de indemnização, o esforço suplementar que as vítimas de incapacidade têm que desenvolver para realizar o seu trabalho.
Na verdade, sendo a incapacidade permanente, “de per si”, um dano patrimonial indemnizável, pela limitação que o lesado sofre na sua situação física, quanto à sua resistência e capacidade de esforços, deve ser reparado, quer acarrete para o lesado uma diminuição efetiva do seu ganho laboral, quer implique apenas um esforço acrescido para manter os mesmos níveis dos seus proventos profissionais – cfr., entre muitos outros, os Acórdãos do STJ de 20/11/2011 e de 20/01/2010 e o Acórdão da Relação de Coimbra de 04/12/2007, todos disponíveis em www.dgsi.pt.
Assim, a incapacidade em causa, constitui uma desvalorização efetiva que, normalmente, terá expressão patrimonial, embora em valores não definidos e com a consequente necessidade de recurso à equidade para fixar a correspondente indemnização.
“A afectação do ponto de vista funcional, não pode deixar de ser determinante de consequências negativas a nível da actividade geral do lesado, revestindo cariz patrimonial que justifica uma indemnização para além da valoração que se impõe a título de dano não patrimonial” - Ac. do STJ, de 23.04.2009 (relator Salvador da Costa), proferido no Proc. nº 292/04, disponível em www.dgsi.pt..
De igual modo se defende no Ac. do STJ de 16.12.2010 (Lopes do Rego), disponível em www.dgsi.pt. que a indemnização a arbitrar pelo dano biológico do lesado deverá compensá-lo também da inerente perda de capacidades, mesmo que esta não esteja imediata e totalmente reflectida no nível de rendimento auferido. “É que a compensação do dano biológico tem como base e fundamento, quer a relevante e substancial restrição às possibilidades de exercício de uma profissão e de futura mudança ou reconversão de emprego pelo lesado, enquanto fonte actual de possíveis e eventuais acréscimos patrimoniais, frustrada irremediavelmente pelo grau de incapacidade que definitivamente o vai afectar, quer da acrescida penosidade e esforço no exercício da sua actividade diária e corrente, de modo a compensar e ultrapassar as graves deficiências funcionais que constituem sequela irreversível das lesões sofridas”.
Os danos futuros decorrentes de uma lesão física não se limitam “à redução da sua capacidade de trabalho, já que, antes do mais, se traduzem numa lesão do direito fundamental do lesado à saúde e à integridade física. Por isso mesmo, não pode ser arbitrada uma indemnização que apenas tenha em conta aquela redução (…)” – cfr. Acórdãos do STJ de 28/10/1999, in www.dgsi.pt e de 25/06/2009, in CJ/STJ, II, pág. 128, sendo que, neste último expressamente se consagra a ideia de que, também deve considera-se, por isso mesmo, o período de esperança média de vida, de modo a contar com a vida ativa e com o período posterior à normal cessação da atividade laboral.
Daí que se venha considerando que a afetação da pessoa do ponto de vista funcional, ainda que não se traduza em perda de rendimento de trabalho, releva para efeitos indemnizatórios – como dano biológico/patrimonial – porque é determinante de consequências negativas ao nível da atividade geral do lesado e, especificamente da sua atividade laboral, designadamente, num jovem, condicionando as suas hipóteses de emprego, diminuído as alternativas possíveis ou oferecendo menores possibilidades de progressão na carreira, bem como uma redução de futuras oportunidades no mercado de trabalho, face aos esforços suplementares necessários para a excução do seu trabalho.
Daí que se julgue incorreta a conclusão extraída na 1.ª instância, de que tais danos só podem ser perspetivados sob o ponto de vista não patrimonial.
Como já vimos, este tipo de incapacidade, constitui uma desvalorização efetiva com expressão patrimonial, embora em valores não definidos e com a consequente necessidade de recurso à equidade para fixar a correspondente indemnização. Nestes casos de incapacidade sem rebate nos rendimentos provenientes do trabalho, o rendimento anual do lesado não tem a mesma relevância que nos casos em que tem repercussão no nível dos rendimentos auferidos. O dano biológico traduzido numa determinada incapacidade sem perda de rendimento de trabalho, é sensivelmente o mesmo, quer o sinistrado aufira € 500,00, quer aufira € 1500,00.
“Deve-se chegar a tal indemnização através de um juízo de equidade, que não é um qualquer exercício de discricionariedade, mas antes a procura da justiça do caso concreto” – Acórdão do STJ de 07/01/2010 (Conselheiro Pires da Rosa), processo n.º 5095/04.5TBVNG.P1.S1, in www.dgsi.pt.

Assentes os pressupostos acima definidos, deve ainda dizer-se que a fixação da indemnização deve pautar-se por critérios de igualdade e razoabilidade, indispensáveis à realização do princípio da equidade, relevando como de particular importância a análise de decisões de tribunais superiores relativas à reparação deste tipo de danos: ora, podemos ver nos Acórdãos da Relação do Porto de 11/05/2011 e do STJ de 13/01/2009 (ambos disponíveis em www.dgsi.pt), que foi fixada em € 15.000,00 a indemnização pelo esforço equivalente à perda de capacidade de ganho de 5%, num menor de 13 anos, num caso e, no outro caso, com 8 anos e tendo-se ponderado um salário médio de € 800,00 ou de € 650/700,00. Também no Acórdão do STJ de 07/01/2010, já supra referido, entendeu-se que: “Provado que o autor tinha à data do acidente 26 anos, auferia o salário mensal de € 657,01 (14 vezes por ano) e que, em virtude do sinistro, ficou a padecer de uma IPP de 8% que não o impede do seu exercício profissional, mas exige esforços físicos suplementares, reputa-se de justa e equitativa a quantia de € 20 000 destinada à reparação dos danos patrimoniais sofridos pelo autor”

No nosso caso, considerando os factos provados, que nos dispensamos de repetir (e apesar das diferenças salariais auferidas que, como já referimos, não são de importância crucial nestes casos e considerando, sobretudo o tipo de incapacidade semelhante para todos os lesados), entendemos adequado fixar como dano patrimonial (biológico), o valor de € 25.000,00 para cada um dos sinistrados.

Uma vez que tinha sido fixado apenas um valor para cada um dos lesados, a título de dano não patrimonial, importa, agora, autonomizar esse dano, o que se fará de seguida.

No caso dos danos não patrimoniais, não há a intenção de pagar ou indemnizar o dano, mas apenas o intuito de atenuar um mal consumado, sabendo-se que a composição pecuniária pode servir para satisfação das mais variadas necessidades, desde as mais grosseiras e elementares às de mais elevada espiritualidade, tudo dependendo, nesse aspeto, da utilização que dela se faça - Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Almedina, 5ª edição, páginas 563 e 564.
Como também se tem dito, trata-se de prejuízos de natureza infungível, em que, por isso, não é possível uma reintegração por equivalente, como acontece com a indemnização, mas tão-só um almejo de compensação que proporcione ao beneficiário certas satisfações decorrentes da utilização do dinheiro. A indemnização tem aqui um papel mais compensatório, mais do que reconstitutivo.
Como ensina Antunes Varela in ob. cit., pág. 568, “a indemnização reveste, no caso dos danos não patrimoniais, uma natureza acentuadamente mista: por um lado, visa reparar de algum modo, mais do que indemnizar, os danos sofridos pela pessoa lesada; por outro lado, não lhe é estranha a ideia de reprovar ou castigar, no plano civilístico e com os meios próprios do direito privado, a conduta do agente”.
O dano deve ser de tal modo grave que justifique a tutela do Direito, pela concessão da satisfação de ordem pecuniária – artigo 496.º, n.º 1 do Código Civil.
O montante da indemnização deve ser fixado equitativamente pelo tribunal (nº 3 do referido art.º 496º), através de adequado e equilibrado critério de justiça material e concreta. Devem ser ponderadas as circunstâncias concretas de cada caso, considerando especialmente, em situações de mera culpa, a possibilidade da indemnização ser inferior ao que corresponderia aos danos causados, desde que a culpabilidade do agente e a situação económica deste e do lesado o justifiquem (art.ºs 494º e 496º, nº 3, do Código Civil), o que confere ainda mais a natureza de compensação, de satisfação, do que de indemnização à quantia a atribuir.
Tem entendido a jurisprudência dos tribunais superiores, de há anos a esta parte, que, para responder de modo atualizado ao comando do art.º 496º, a indemnização por danos não patrimoniais tem que constituir uma efetiva possibilidade compensatória, tem que ser significativa - Cf., entre outros, os acórdãos do S.T.J. de 11.10.94, BMJ 440/449, de 17.1.2008, proc. 07B4538 e de 29.1.2008, proc. 07A4492, in www.dgsi.pt; mas também tem que ser justificada e equilibrada, não podendo constituir um enriquecimento abusivo e imoral.
Assim, a apreciação da gravidade do dano, embora tenha de assentar no circunstancialismo concreto envolvente, deve operar sob um critério objetivo, num quadro de exclusão, tanto quanto possível, da subjetividade inerente a alguma particular sensibilidade humana, e a fixação da indemnização deve orientar-se em harmonia com os padrões de cálculo adotados pela jurisprudência mais recente, de modo a salvaguardar as exigências da igualdade no tratamento do caso análogo, uniformizando critérios, o que não é incompatível com o exame das circunstâncias de cada caso – neste sentido Acórdão da Relação de Guimarães de 05/02/2013, in www.dgsi.pt.
São de ponderar circunstâncias várias, como a natureza e grau das lesões, suas sequelas físicas e psíquicas, as intervenções cirúrgicas eventualmente sofridas e o grau de risco inerente, os internamentos e a sua duração, o quantum doloris, o dano estético, o período de doença, situação anterior e posterior da vítima em termos de afirmação social, apresentação e autoestima, alegria de viver, a idade, a esperança de vida e perspetivas para o futuro, entre outras.
Atendendo a que devemos pautar-nos por critérios de igualdade e razoabilidade na atribuição da indemnização (art.º 8º do Código Civil) - o que não obsta à realização do princípio da equidade -, vejamos algumas decisões dos Tribunais Superiores relativas aos danos não patrimoniais:
- Num acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7.6.2011, foi atribuída uma indemnização de € 23.000,00 a um sinistrado que ficou com ferimentos a nível da face, couro cabeludo, tórax, região dorsal e membro superior direito. Esteve internado 12 dias, apresentando traumatismo torácico com pneumotórax bilateral, fratura D4, D5 e D6 e fratura da clavícula direita. Ficou a padecer de uma IPG de 16%, sendo as sequelas descritas compatíveis com o exercício da atividade habitual, mas implicando esforços suplementares. E mesmo após a alta dos hospitais, andou em tratamento ambulatório, durante vários meses para lhe ser prestada assistência e tratamentos médicos por diversos especialistas, pois apresentava sinais e sintomas de disfunção, temporo-mandibular, tendo sido submetido a extrações e intervenções dentárias. Esteve, em consequência do acidente, com Incapacidade Temporária Geral quase três meses; com Incapacidade Temporária Geral Parcial, cerca de 7 meses e com Incapacidade Temporária Profissional Total, cerca de 10 meses. Ficou ainda demonstrado que sofreu um quantum doloris fixável em grau 4 e que ainda hoje sente dores, tomando, por vezes, analgésicos para suportar as mesmas. Teve de se deslocar várias vezes ao Porto para tratamentos e teve de usar um colete ortopédico durante cerca de 2 meses. À data do acidente era um jovem saudável e alegre, trabalhando, como sócio gerente e, em consequência do mesmo, sentiu-se e sente-se angustiado;
- No acórdão do STJ de 29/06/2011, decidiu-se: “VIII - Em matéria de lesões físicas do demandante sobressai a fractura do cotovelo, que o obrigou a uma intervenção cirúrgica e a um período de 30 dias de incapacidade temporária geral e profissional total, seguido de um período de 177 dias de incapacidade temporária geral e profissional parcial; as dores sofridas, tendo sido fixado quantum doloris no grau 5, numa escala de 7; o dano estético, constituído pela cicatriz de 14 cm, fixado no grau 3, numa escala até 7. IX -Tendo em conta esta factualidade, com destaque para o período de tempo de doença e o quantum doloris, que são significativos, entende-se que o montante de indemnização fixado (€ 25 000) é justo e adequado à reparação dos danos não patrimoniais”

Neste quadro factual, legal e jurisprudencial comparativo, em que sobrelevam as especificidades do caso submetido à nossa apreciação, temos como justo e equilibrado fixar a indemnização pelos danos não patrimoniais nas quantias de € 12.000,00 para o D.. e € 20.000,00 para o L.. e para o J.. (apesar deste último só ter peticionado € 15.000,00 a este título, não pode deixar de se atribuir o mesmo valor que ao lesado L.., sendo certo que tal é permitido por caber no pedido total formulado).

A estes valores, haverá que somar as quantias fixadas na sentença recorrida a título de danos patrimoniais - € 2714,74 para o D.., € 1639,65 para o L.. e € 25.649,80 para o J...

Em conclusão, na parcial procedência do recurso interposto pelos autores, irá revogar-se a sentença recorrida, substituindo-se por outra que condene a ré a pagar ao D.., a quantia de € 39.714,74, ao L.., a quantia de € 46.639,65 e ao J.., a quantia de € 70.649,80, mantendo-se a condenação em juros e na quantia a pagar ao Instituto de Segurança Social.
Sumário:
1 - A uma perda de ganho efetiva equivale, para efeitos de indemnização, como dano patrimonial, o esforço suplementar que as vítimas de incapacidade têm que desenvolver para realizar o seu trabalho.
2 - A afetação da pessoa do ponto de vista funcional, ainda que não se traduza em perda de rendimento de trabalho, releva para efeitos indemnizatórios – como dano biológico/patrimonial – porque é determinante de consequências negativas ao nível da atividade geral do lesado e, especificamente, também, da sua atividade laboral.

III. DECISÃO
Em face do exposto, decide-se julgar parcialmente procedente a apelação dos autores, revogando-se a sentença recorrida no que se refere às quantias devidas aos apelantes, indo, agora, a ré condenada a pagar:
- ao autor D.., a quantia de € 39.714,74;
- ao autor L.., a quantia de € 46.639,65;
- ao autor J.., a quantia de € 70.649,80;
e mantendo-se quanto ao demais.
Custas pela apelada e pelos apelantes na proporção do decaimento.
Guimarães, 15 de setembro de 2014
Ana Cristina Duarte
Fernando Fernandes Freitas
Maria Purificação Carvalho