Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
262/16.1T8VCT.G1
Relator: ANTÓNIO FIGUEIREDO DE ALMEIDA
Descritores: MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA
REMUNERAÇÃO DA MEDIADORA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 09/14/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO SOCIAL
Sumário:

1) A atividade do mediador já não é definida por uma obrigação de diligenciar, mas, sim, de procurar destinatários para a realização de negócios, o que é bem diferente da obrigação de concretização do negócio visado, obrigação esta que inexiste, pois isso não depende da vontade do mediador, mas do seu cliente e do interessado encontrado;

2) O direito da mediadora à retribuição acordada no âmbito de um contrato de mediação imobiliária pressupõe, por regra e sem prejuízo das exceções previstas na lei, que a mediadora tenha desenvolvido uma concreta atividade no sentido de angariar um interessado para a celebração do negócio, que o negócio visado pelo contrato de mediação tenha sido concretizado e que este negócio tenha sido celebrado com um terceiro angariado pela mediadora, de tal modo que se possa afirmar que a conclusão do contrato foi o resultado da atividade desenvolvida pela mediadora em virtude de esta se integrar na cadeia de factos que deram lugar ao negócio pretendido, ainda que não tenha sido a única causa.

Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

I. RELATÓRIO

A) “Mediação Imobiliária, Lda” veio intentar contra B. L., ação com processo comum, onde conclui pedindo a condenação do réu a pagar à autora a quantia de €6.150,00 (seis mil, cento e cinquenta euros), referentes à remuneração devida pela atividade de mediação exercida, acrescida de juros de mora, à taxa comercial vigente, vencidos até à presente data, que se computam em €74,84 (setenta e quatro euros e oitenta e quatro cêntimos), bem como juros vincendos, à taxa comercial vigente, até integral e efetivo pagamento.

Pelo réu, B. L. foi apresentada contestação onde conclui entendendo dever a ação ser julgada improcedente e, consequentemente, ser o réu absolvido do pedido feito pela autora.

A autora “Mediação Imobiliária Unipessoal, Lda” apresentou resposta onde entende dever julgar-se a contestação improcedente, por não provada, concluindo-se como na petição inicial.


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B) Foi elaborado despacho saneador, identificado o objeto do litígio e enunciados os temas de prova.

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Realizou-se julgamento e foi proferida sentença onde foi decidido julgar a ação totalmente improcedente e, em consequência, absolver o réu B. L. do pedido contra o mesmo formulado pela autora “ – Mediação Imobiliária, Lda”.

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C) Inconformada, a autora, “ – Mediação Imobiliária, Lda”, veio interpor recurso, que foi admitido como sendo de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos, com efeito devolutivo (fls. 152).

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Nas alegações de recurso da autora “ – Mediação Imobiliária, Lda”, são formuladas as seguintes conclusões:

I. A recorrente interpõe recurso de apelação, por não se poder conformar com a decisão do Tribunal a quo, nem com a fundamentação por este utilizada de que “ (…) a existência de potencial cliente para a compra não é o mesmo que a existência de cliente seguro para o negócio, sendo que para que esta situação existisse, necessário se tornava que a autora tivesse conseguido que o cliente houvesse concordado com o preço exigido pelo réu ao tempo da angariação pela mediadora.”.

II. Entendendo a recorrente que o recorrido deve ser condenado no pedido formulado, ou seja, no pagamento da retribuição requerida, por entender que a sentença não fez uma correta ponderação da prova produzida nos autos, impondo-se assim uma alteração da decisão final.

III. Equivocada ponderação que se demonstra evidente na fundamentação apresentada, quando julga como não provado, na al. b) da factualidade não provada, o correspondente ao artigo 22º da petição inicial, ao contrário do que se entende por certo, pois que a prova produzida nos autos e as demais razões aduzidas pelo tribunal a quo, levam-nos a uma solução diferente.

IV. Para tal, alicerçou a sua decisão dos depoimentos das testemunhas B. F. e M. R., pela positiva, partindo do errado pressuposto de que a autora, aqui recorrente, tardou em contactar as referidas testemunhas, então compradores, e da convicção de que é afirmado por estes, que celebraram um negócio mais vantajoso pelo facto de negociarem diretamente com o comprador.

V. Relativamente à testemunha B. F., não se pode concordar com o entendimento sufragado pelo tribunal a quo, de que resulta do seu testemunho que a recorrente tardou em contactar os compradores, o que terá levado ao contacto direto com o recorrido, porquanto, faz esta mesma testemunha referência que a sua segunda visita ao imóvel foi agendada apenas com o recorrido, mas apenas pelo fator preço, conforme resulta dos autos: B. F.: Ref.ª CD 20160602142751_1386894_2871835; 02-Junho-2016, aos 00.07:07 até aos 00:10:16 minutos, aos 00:11:43 até aos 00:14:06 minutos e aos 00:20:10 até aos 00:20.24 minutos.

VI. Também não se podendo extrair, tal conclusão, do depoimento da testemunha M. R., onde fica claro que o fator determinante para celebrar negócio passava pelo preço, Cfr. M. R. Ref.ª CD 20160602145327_1386894_2871835; 02-junho-2016 aos 00:10:08 até aos 00:10:40 minutos, dizendo ainda que tinha conhecimento da existência de uma imobiliária que promovia a venda do imóvel, que o recorrido era o cliente da recorrente e que o imóvel era o mesmo, Cfr. M. R., aos 00:01:18 até aos 00:02:40 minutos.

VII. Reconhece que o imóvel foi objeto de mediação imobiliária, bem sabendo que foi através desta que chegou até ao imóvel que acabaria por adquirir, bem como ao seu proprietário, com quem posteriormente estabeleceu contactos, nomeadamente dois dias após a primeira visita ao imóvel, tal como resulta dos autos: M. R. Ref.ª CD 20160602145327_1386894_2871835; 02-junho-2016 aos 00:04:18 até aos 00:04:37 minutos.

VIII. Sobre a credibilidade das testemunhas já mencionadas, a testemunha B. F., ao longo do seu depoimento, refere a necessidade de criar uma nova conta de e-mail para contactar com o recorrido, pois conclui que este não havia rececionado o seu email, questionando-se como é que não se apercebe do sucedido aquando da alegada primeira tentativa, mas apenas após a visita ao imóvel acompanhado pela recorrente, o que apenas se pode justificar com alguma conversa paralela entre a testemunha B. F. e o recorrido aquando da primeira visita, pois que de outra forma, a ausência de resposta por parte do destinatário, poderia dever-se apenas a incúria ou falta de tempo para apresentar resposta, tal era o número de interessados, alegadamente, ao contrário da recorrente, que prontamente respondeu.

IX. A credibilidade desta testemunha surge ainda afetada, quando, a instâncias da Mandatária da recorrente, não se recorda de enviar e-mail a dizer que já não estava interessado em comprar, mas admite que a recorrente lhe possa ter ligado, todavia, a instâncias da Mandatária do recorrido, já se lembra de ter trocado um e-mail com a recorrente, sendo que, um pouco antes, admite como possível que a recorrente lhe tenha telefonado, mas não tem memória disso, mas para o caso de lhe terem telefonado, terá dito que já não estava interessado, por estar a negociar diretamente com o vendedor, aqui recorrido Cfr. Ref.ª CD 20160602142751_1386894_2871835; 02-Junho-2016, aos 00.08.07 até aos 00.08.23 minutos, aos 00.17.18 até aos 00.17.30 minutos, aos 00.11.42 até aos 00.12.51minutos, aos 00.16.47 até aos 00.16.58.

X. Já a testemunha M. R. sabe que a recorrente telefonou à testemunha B. F., não sabendo situar no tempo esse telefonema, mas nunca refere a existência de uma demora por parte da Recorrente, Cfr. M. R. Ref.ª CD 20160602145327_1386894_2871835; 02-junho-2016 aos 00.00.30 até aos 00.01.02 minutos, aos minutos 00.06.34 até aos 00.06.42.

XI. Assim, não persistem elementos que permitam concluir que a recorrente tardou em contactar os intervenientes e que isso tenha determinado o contacto direto com o recorrido, o que aliás é manifestamente contraditório com o facto 3.9 dado como provado, onde se prova que a recorrente contacta a testemunha B. F., uns dias após a visita e este manifesta a intenção de adiar o negócio.

XII. Porquanto, se é facto provado que quando a imobiliária, aqui recorrente, contacta a testemunha B. F., uns dias após a visita, este manifesta a intenção de adiar o negócio, como pode ser valorado o depoimento dos compradores, para dar como não provado o facto, quando estes dizem que a autora tardou em contactá-los e que foi por essa razão que negociaram com o recorrido, e fundamentando assim a ausência de conluio entre recorrido e compradores.

XIII. Contradições também se encontram quando se dá como não provado o facto da al. e), porquanto a prova documental existente demonstra que no mês de fevereiro as partes tentavam já agendar contrato promessa de compra e venda, assim, nunca existiu qualquer intenção de adiar o negócio, mas apenas de excluir a recorrente das negociações, mantendo as negociações sem qualquer interrupção, sendo a estratégia adotada, determinada pelo fator preço.

XIV. No respeitante à testemunha R. C., é nosso entendimento que este apresenta um discurso fluente e esclarecedor quanto ao que se terá passado, contrariamente à pouca objetividade e limitação a ilações e conclusões referidas pelo tribunal a quo.

XV. Foi a referida testemunha que promoveu o imóvel e que acompanhou a testemunha B. F. à visita do mesmo, onde este refere ter gostado do imóvel, o que é confirmado pela ficha de visita, apenas tendo referido que pretendia visita-lo na companhia da namorada M. R., por o objetivo passar por ir morar com a mesma, o que resulta dos autos: B. F.: Ref.ª CD 20160602142751_1386894_2871835; 02-junho-2016, aos 00.01.17 até aos 00.01.23, aos 00:01:58 até aos 00:03:14 minutos.

XVI. Nesse sentido, dias depois a testemunha R. C. contacta a testemunha B. F., que refere já ter visitado o imóvel com a namorada M. R., Cfr. R. C. Ref.ª CD 20160602150647_1386894_2871835 02-junho-2016 aos 00:04:30 até aos 00:06:57, aos 00:07:18 até aos 00:07:48 minutos, aos 00:10:17 até aos 00:10:55 minutos.

XVII. Ademais, uma empresa de mediação imobiliária, bem como o seu comercial, depois de encontrar um potencial comprador para determinado imóvel, sempre iria contacta-lo após o trabalho já realizado e até ter sido requerida simulação de crédito bancário a favor daqueles que foram os compradores, tal como o refere a testemunha: R. C. Ref.ª CD 20160602150647_1386894_2871835 02-junho-2016 aos 00:13:29 até aos 00:14:17 minutos.

XVIII. Também a testemunha M. J., deixa bem claro que a recorrente continuou a prestar os seus serviços com vista à celebração do negócio visado, indo mais além do que se havia comprometido, instR. C.ndo pedidos de simulação de crédito bancário, Cfr. M. J. Ref.ª CD 20160602153805_1386894_2871835 02-junho-2016, aos 00:04:59 até aos 00:05:40 minutos.

XIX. Já a testemunha I., refere ter sido contactada pelos vendedores, enquanto solicitadora, mas, de seguida, afirma que o seu papel foi também de ajudar na negociação da venda do apartamento, pois não havia acordo quanto ao preço: I. Ref.ª CD 20160602161226_1386894_2871835 02-junho-2016 aos 00.00.29 até aos 00.01.17 minutos, não obstante, depois referir que o seu papel não passou pela negociação, aos 00.04:00 até aos 00.04.32 minutos e aos 00.06:56 até aos 00.07.57 minutos, não se entendendo em que medida estas declarações fundamentam a posição tomada pelo tribunal a quo.

XX. Entende-se, assim, ser evidente ter sido produzida prova bastante de que existiu conluio entre o recorrido e as testemunhas B. F. e M. R., pelo que se impugna e se requer a reapreciação da prova, para que se decida que o facto descrito em b) se encontra provado.

XXI. O depoimento das demais testemunhas também denuncia a falta de imparcialidade e isenção destas, pois a testemunha D. afirma apenas ter conhecido os compradores na celebração do contrato de compra e venda, o que não corresponde à verdade, pois a testemunha M. R. refere que quando visita o imóvel estava presente a testemunha D., Cfr: D. L. Ref.ª CD 20160602155356_1386894_2871835 02-junho-2016 aos 00:00:37 até aos 00:01:05 minutos, aos 00:09:22 até aos 00:09:55 minutos, aos 00:13:45 até aos 00:14:46 minutos e aos 00:15:12 até aos 00:15:35 minutos.

XXII. Tal como não é verdade quando afirma que os compradores só visitaram o imóvel em finais de fevereiro de 2015, como resulta das declarações da testemunha M. R.: Ref.ª CD 20160602145327_1386894_2871835;02-junho-2016 aos 00:03:26 até aos 00:03:36 minutos, situação esclarecida pela Testemunha B. F.: Ref.ª CD 20160602142751_1386894_2871835; 02-junho-2016, aos 00.10.45 até aos 00.11.18 minutos.

XXIII. O contrato de mediação imobiliária é aquele em que uma das partes se obriga a conseguir um interessado para certo negócio e a aproximar esse interessado da outra parte.

XXIV. É forçoso discordar da fundamentação apresentada pelo tribunal a quo, aquando da “análise dos factos e da aplicação do direito”, pois que, depois de decidir por provado o facto de a recorrente ter levado a cabo a atividade de promoção do negócio em causa a que se obrigou – divulgação do imóvel; de um colaborador da recorrente ter estabelecido contactos com um potencial comprador que se verificou vir a celebrar o contrato de compra e venda; na sequência desses contactos foi levada a cabo uma visita ao imóvel, promovida e acompanhada por um colaborador da recorrente, na presença do recorrido, em resultado da qual foi elaborada uma ficha de visita onde se vê manifestado o interesse do visitante; provado ainda que o colaborador da recorrente (R. C. – aqui testemunha) dias após a primeira visita, contactou o comprador B. F. (aqui testemunha), tendo o segundo informado o primeiro que era sua vontade adiar o negócio (não obstante se verificar pelos documentos juntos pelo recorrido aquando da contestação, de que as negociações se mantiveram) tal como acaba por confirmar no seu depoimento quando perguntado sobre o teor da conversa que terá tido com o comercial da recorrente; e por fim tendo-se ainda provado que o recorrido procedeu à denúncia do contrato de mediação imobiliária, ainda durante o mês de fevereiro (pouco dias após a primeira visita ao imóvel).

XXV. E, após dada como provada toda esta factualidade, considera que a intervenção da recorrente não foi determinante para a celebração do contrato de compra e venda do imóvel em apreço, referindo que “ (…) necessário se tornava que a autora tivesse conseguido que o cliente houvesse concordado com o preço exigido pelo réu ao tempo da angariação pela mediadora. (…) “.

XXVI. Nos termos da cláusula 2.ª n.º 3 do contrato de mediação imobiliária, qualquer decisão relativa à alteração ao preço acordado de €75.000,00 deveria ser comunicada à mediadora, o que ocorreu uma única vez, fixando-se novo preço de €70.000,00, no entanto, o recorrido procede a uma segunda redução do preço em cerca de €5.000,00 acrescentando ainda que o preço seria negociável, sempre no desconhecimento da recorrente, o que justifica a alegada vontade de “adiar o negócio”.

XXVII. O que nos conduz a um claro incumprimento do contrato de mediação imobiliária, onde há um aproveitamento das vantagens proporcionadas pelos mediadores imobiliários e assim que o negócio se demonstre definido, dispensam a sua intervenção, sempre para obter vantagens económicas,

XXVIII. Pois que, se por um lado o recorrido impôs à aqui recorrente que promovesse a venda por €70.000,00 (Setenta Mil Euros), “informou os demais” que venderia por €65.000,00 (Sessenta e Cinco Mil Euros) e ainda estava disponível para fazer um desconto, sem disso dar conhecimento à recorrente.

XXIX. Não se poderá também concordar com o entendimento do tribunal a quo, de que, para haver lugar a remuneração ao mediador, é necessário que este consiga que o cliente angariado concorde com o preço exigido pelo recorrido, ao tempo de angariação, porquanto, é quase impossível preencher esse requisito, bem como o mesmo não decorre quer da letra, quer do espírito da lei.

XXX. Posição que encontramos no acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 29-09-2014, processo nº 1651/11.3TBBCL.G1, cuja situação é praticamente subsumível à dos presentes autos, o qual considera que a determinação do preço está na inteira disponibilidade do vendedor, e, assim, a sua celebração, por um valor abaixo do previsto no contrato de mediação imobiliária, não preclude o direito à remuneração do mediador, assim como o TRC (processo n.º 1399/11.9TBCLD.C1) entende não ser necessário que a mediadora coopere nas negociações, mas apenas que influa no resultado, para que haja remuneração.

XXXI. De referir que, a recorrente apresentou a Testemunha B. F. ao recorrido, que nunca teve na sua posse as chaves do imóvel, porquanto o recorrido residia no imóvel em apreço, o que implica que este, tinha sempre conhecimento de que a imobiliária levava algum interessado para visitar o imóvel.

XXXII. Visita esta, que foi levada a cabo pela imobiliária, aqui recorrente, facilitando e potenciado o contacto entre o recorrido e a Testemunha B. F., levando assim ao conhecimento mútuo das partes, decorrente da devida apresentação e visita conjunta ao imóvel, o que determinou a aproximação entre ambos.

XXXIII. Tem entendido a jurisprudência, que para o mediador ter direito à comissão é suficiente ter dado o nome de pessoa disposta a negociar, pondo o comprador em contacto com o vendedor e que isso influa na realização do negócio, Cfr. Ac. STJ. de 18-3-97, Col. Acs. STJ, V, 1º, pág. 158, transcrito pelo Ac. do STJ de 20/04/2004),

XXXIV. Assim também entende o TRC, referindo ainda que pôr as partes em contacto poderá subsumir-se ao fornecimento da identificação ou qualquer outra forma que tenha potenciado o contacto entre ambos., Cfr. AC. TRC de 17.12.2014, processo nº 242/11.3TBNZR.C1, nesse sentido vide Higina Orvalho Castelo, in Portal Verbo Jurídico | 03-2016 (v2) - Contrato de mediação imobiliária, pág. 10.

XXXV. Tendo assim a imobiliária cumprido a sua obrigação, pois que permitiu o conhecimento entre as partes e facultou aos compradores contacto direto com o recorrido, atento o facto de este residir no imóvel objeto de contrato de mediação imobiliária, tornando-se patente a existência do nexo de causalidade exigido, entre a atividade da Recorrente e a celebração do contrato de compra e venda do imóvel visado pelo contrato de mediação imobiliária.

XXXVI. Sendo que este se encontra demonstrado nos autos, o que implica decisão diversa da tomada pelo tribunal a quo, devendo ser reconhecido à recorrente o direito a receber a renumeração convencionada no contrato de mediação imobiliária.

Termina entendendo dever ser julgado procedente o presente recurso e, por via dele, ser revogada a sentença recorrida, devendo, em sua substituição, ser proferido acórdão que julgue procedente o pedido formulado pela aqui recorrente, condenando o recorrido ao pagamento da retribuição peticionada.

Pelo apelado foi apresentada resposta onde entende dever ser negado provimento ao recurso.


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D) Foram colhidos os vistos legais.

E) As questões a decidir na apelação são as de saber:

1) Se deverá ser alterada a decisão quanto à matéria de facto;

2) Se deverá ser alterada a decisão propriamente jurídica da causa e se é devida a remuneração pelos serviços prestados pela apelante (mediadora) ao apelado (cliente).


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II. FUNDAMENTAÇÃO

A) Na 1ª instância resultou apurada a seguinte matéria de facto:

I. FACTOS PROVADOS

1. – Mediação Imobiliária, Lda., que usa o nome de fantasia «V. Imobiliária», na qualidade de mediadora imobiliária, detentora da licença AMI nº 8..., válida, celebrou um contrato de mediação imobiliária com o réu, a 02 de junho de 2014.

2. O referido contrato foi celebrado em regime de não exclusividade, pelo período de 9 meses, renovando-se automaticamente por iguais e sucessivos períodos de tempo, caso não fosse denunciado por nenhuma das partes contratantes.

3. Através do presente contrato, o réu – na qualidade de proprietário da fração autónoma designada pela letra “T”, destinada à habitação, com uma garagem na parte central da cave, lado Sul, a segunda a contar de nascente para Poente e uma divisão para arrumos no lado Nascente do sótão, a sexta a contar no sentido Norte/Sul, descrita na Conservatória do Registo Predial de Viana do Castelo sob o número 9999 e inscrita na matriz predial urbana sob o artigo 7777, sita na Rua … – lotes nºs 20 e 21, 3º andar direito, centro, traseiras, no Concelho e Distrito de Viana do Castelo – incumbiu a autora de promover a venda do referido imóvel, pelo valor de €75.000,00 (setenta e cinco mil euros), realizando para tal, diversas ações publicitárias.

4. Posteriormente, a pedido do réu, a venda do imóvel passou a ser promovida pelo preço de €70.000,00 (setenta mil euros), conforme adenda ao contrato de mediação imobiliária, celebrada a 08 de outubro de 2014.

5. Enquanto contrapartida da mediação imobiliária levada a cabo pela autora, com a concretização do negócio de compra e venda, esta teria direito a receber a quantia de €5.000,00 (Cinco Mil Euros), acrescidos de IVA à taxa legal em vigor.

6. Na sequência do acordo firmado entre autora e réu, a primeira diligenciou pela promoção do referido imóvel, através da sua publicitação em jornal, através de placas publicitárias no imóvel, bem como a inserção do mesmo no sítio de internet da autora, acompanhando a visita de vários interessados, potenciais compradores.

7. Na sequência de contacto via e-mail ocorrido no dia 04.02.2015, através do Portal de Anúncios Classificados OLX, foi entre autora e B. F. agendada visita ao imóvel descrito em 3.3., a qual teve lugar no dia 07.02.2015 e na qual estiveram presentes, além daquele, o próprio réu e R. C., colaborador da autora.

8. Na referida data, logo após a visita, B. F. manifestou interesse no imóvel em sujeito, tendo comunicado ser sua intenção agendar nova visita, desta feita na companhia da então namorada, M. R..

9. Dias mais tarde, na sequência de contacto promovido por R. C., colaborador da autora, B. F. manifestou intenção de adiar o negócio.

10. Por e-mail datado de 26.02.2015, o réu denunciou junto da autora o contrato de mediação imobiliária entre ambos celebrado.

11. A partir de então, a autora excluiu o imóvel em crise da lista dos por si promovidos, não mais o publicitando.

12. Aos 25.06.2015, foi celebrado acordo escrito denominado “contrato de compra e venda e mútuo com hipoteca”, entre B. L. e mulher, D. L., na qualidade de primeiros outorgantes, e B. F. e M. R., na qualidade de segundos outorgantes, pelo qual os primeiros declararam vender aos segundos, e estes declararam comprar, a fração autónoma descrita em 3., pelo preço de €63.000,00 (sessenta e três mil euros).


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B) FACTOS NÃO PROVADOS

a) Tendo a autora tomado conhecimento do negócio descrito em 12. dos factos provados, interpelou o réu para proceder ao pagamento da quantia de €6.150,00 (seis mil, cento e cinquenta euros), mediante o envio de carta registada com aviso de receção, datada de 10 de novembro de 2015, devidamente rececionada por aquele.

b) O réu e os compradores ids. no negócio descrito em 12., agiram em conluio, visando o afastamento da autora do negócio entre ambos, entretanto firmado, com vista a permitir que aquele primeiro se furtasse ao pagamento da comissão devida pela concretização da referida venda.

c) Autora e réu acordaram na retificação da cláusula 7ª do contrato de mediação entre ambos celebrado, por forma excluir da mesma a “colocação de anúncios na Internet”.

d) No dia 10 de fevereiro de 2015 recebeu uma mensagem proveniente de B. F., através do OLX, na publicitação que havia feito em nome individual do imóvel.

e) A partir da data referida em d) seguiram-se contactos negociações e visita ao imóvel.

f) A autora nunca informou o réu da existência de interessados na aquisição do imóvel.


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B) O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente, não podendo o tribunal conhecer de outras questões, que não tenham sido suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.

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C) A apelante discorda da decisão de facto, no que se refere ao ponto b) dos factos não provados, entendendo que o mesmo deveria considerar-se provado.

Para tanto invoca os depoimentos das testemunhas B. F., M. R., R. C., M. J., I. e D. L., que transcreve parcialmente.

Sucede, porém, que do depoimento de todas as testemunhas indicadas e, designadamente dos excertos indicados e transcritos nas alegações de recurso, não há qualquer elemento relevante que permita concluir que o tribunal a quo decidiu erradamente no que se refere à matéria constante do ponto b) dos factos não provados e que, portanto, a conclusão que a apelante retira de tais elementos de prova não permitem considerar que tal matéria devesse ser considerada como provada.

Relativamente à apreciação da prova, conforme se refere no Acórdão da Relação de Coimbra de 10/12/2010, disponível na base de Dados do Ministério da Justiça, no endereço www.dgsi.pt, “a apreciação das provas resolve-se, assim, em formação de juízos, em elaboração de raciocínios, juízos e raciocínios estes que surgem no espírito do julgador, como diz o Prof. Alberto dos Reis, “...segundo as aquisições que a experiência tenha acumulado na mentalidade do juiz segundo os processos psicológicos que presidem ao exercício da atividade intelectual e, portanto, segundo as máximas de experiência e as regras da lógica...”

A prova não visa, adverte o Prof. Antunes Varela, “...a certeza absoluta, (a irrefragável exclusão da possibilidade de o facto não ter ocorrido ou ter ocorrido de modo diferente) ...”, mas tão só, “...de acordo com os critérios de razoabilidade essenciais à prática do Direito, criar no espírito do julgador um estado de convicção, assente na certeza relativa do facto.”

A certeza a que conduz a prova suficiente é, assim, uma certeza jurídica e não uma certeza material, absoluta.

Conforme se escreveu no Acórdão do STJ de 07/06/2005, relativamente à apreciação da prova, “quer seja na 1ª instância, quer seja na Relação, a questão é sempre de valoração das provas produzidas em audiência ou em documentos de livre apreciação.

Vigoram, em ambos os casos, para os julgadores desses tribunais, as mesmas regras e os mesmos princípios, dos quais avulta o da livre apreciação da prova ou sistema da prova livre (...) consagrado no artigo 655º nº 1 do Código de Processo Civil (atual 607º nº 5 NCPC).

Significa isto que a prova há de ser sempre apreciada segundo critérios de valoração racional e lógica do julgador, pressupondo o recurso a conhecimentos de ordem geral das pessoas normalmente inseridas na sociedade do seu tempo, a observância das regras da experiência e dos critérios da lógica, tudo se resolvendo, afinal, na formulação de juízos e raciocínios que, tendo subjacentes as ditas regras, conduzem a determinadas convicções refletidas na decisão dos pontos de facto sob avaliação.”

Na apreciação da prova, o tribunal está sujeito a determinadas regras, sendo-lhe imposto que declare quais os factos que considera provados e os que entende não se terem provado, analisando criticamente as provas e especificando os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador (artigo 653º nº 2 do Código de Processo Civil, atual artigo 607º nº 4 NCPC).

Um dos princípios que devem presidir ao julgamento é o da livre apreciação da prova, impondo-se ao juiz que decida de acordo com a sua prudente convicção acerca de cada facto, mas, quando a lei imponha para a existência ou prova do facto jurídico qualquer formalidade especial, não pode esta ser dispensada (artigo 655º do Código de Processo Civil – artigo 607º nº 5 NCPC).

Segundo este princípio, o que torna provado um facto é a íntima convicção do juiz, gerada em face do material probatório trazido ao processo (bem como da conduta processual das partes) e de acordo com a sua experiência de vida e conhecimento dos homens; não a pura e simples observância de certas formas legalmente prescritas (Professor Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, 1979, página 384).

Importa ter em conta que a apreciação da prova não pode ser parcial ou truncada, antes tem de ser global e realizar-se através de uma análise crítica da totalidade da prova produzida e não apenas de alguns dos elementos de prova e, no que se refere concretamente aos depoimentos testemunhais, em excertos dos depoimentos de determinadas testemunhas, não se podendo tomar a parte pelo todo.

Por todo o exposto resulta que se manterá a formulação da matéria de facto apurada, improcedendo a pretensão de alteração da mesma.


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O contrato de mediação imobiliária acha-se atualmente regulado pela Lei nº 15/2013, de 08/02 (a que nos referiremos na falta de indicação de origem diversa), o qual entrou em vigor em 01/03/2013 (artigo 45º nº 1) e revogou o Decreto-Lei nº 211/2004, de 20/08, teve em vista a conformação com a disciplina constante do Decreto-Lei nº 92/2010, de 26/07, que transpôs para a ordem jurídica interna a Diretiva nº 2006/123/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa aos serviços no mercado interno (artigo 1º nº 1).

Sobre o que seja mediação imobiliária diz-se no artigo 2º nº 1 que consiste na procura, por parte das empresas, em nome dos seus clientes, de destinatários para a realização de negócios que visem a constituição ou aquisição de direitos reais sobre bens imóveis, bem como a permuta, o trespasse ou o arrendamento dos mesmos ou a cessão de posições em contratos que tenham por objeto bens imóveis.

No caso dos autos não se levanta qualquer dúvida quanto ao facto de autora e réu terem celebrado um contrato de mediação imobiliária.

A questão que se levanta é a de saber se a autora e apelada tem direito a receber a remuneração relativa à celebração do negócio.

Recorde-se que resultou provado que, no âmbito do contrato celebrado entre autora e réu, em 02 de junho de 2014, em regime de não exclusividade, este incumbiu a autora de promover a venda do referido imóvel, pelo valor de €75.000,00, valor este que foi reduzido a €70.000,00, em 08 de outubro de 2014.

Em contrapartida da mediação imobiliária levada a cabo pela autora, com a concretização do negócio de compra e venda, esta teria direito a receber a quantia de €5.000,00, acrescida de IVA à taxa legal.

Para tanto a autora publicitou o imóvel e levou a este, para visita, o interessado B. F., no dia 07/02/2015, na qual esteve presente o réu, tendo o interessado manifestado interesse no negócio e a intenção de agendar nova visita na companhia da então namorada M. R..

Entretanto, em 26/02/2015, o réu denunciou junto da autora o contrato de mediação imobiliária entre ambos erigido, tendo em 25.06.2015, sido celebrado contrato de compra e venda e mútuo com hipoteca, entre B. L. e mulher, D. L., na qualidade de primeiros outorgantes, e B. F. e M. R., na qualidade de segundos outorgantes, pelo qual os primeiros declararam vender aos segundos, e estes declararam comprar, a fração autónoma descrita em 3., pelo preço de €63.000,00 (sessenta e três mil euros).

Estabelece-se no artigo 19º nº 1 e 2 que:

1 — A remuneração da empresa é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação ou, se tiver sido celebrado contrato-promessa e no contrato de mediação imobiliária estiver prevista uma remuneração à empresa nessa fase, é a mesma devida logo que tal celebração ocorra.

2 — É igualmente devida à empresa a remuneração acordada nos casos em que o negócio visado no contrato de mediação tenha sido celebrado em regime de exclusividade e não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário ou arrendatário trespassante do bem imóvel.

Conforme se refere no Acórdão da Relação de Guimarães de 12/06/2014, no processo nº 1218/10.3TBBCL.G1, relatado pelo Desembargador Filipe Caroço e subscrito pelo ora relator, “tem-se entendido que a remuneração é devida mesmo que a ação do mediador não constitua a única causa da conclusão e perfeição do negócio visado [Acórdão da Relação do Porto de 20.9.2001, proc. nº 0131169, in www.dgsi.pt], mas uma sua causa adequada.

Como se refere naquele aresto, “nos contratos de mediação, o direito à remuneração nasce da conclusão dos negócios objeto da mediação, mas a conclusão, para o mediador – isto resulta da essência do contrato – surge quando tais negócios se consideram aproximados entre o comitente e terceiros e consegue a adesão destes, haja ou não execução posterior.

Deve, porém, haver um nexo de causalidade entre a atividade do mediador e a conclusão do negócio.”

Também na situação tratada naquele acórdão, a empresa mediadora havia diligenciado no sentido de arranjar compradores para um prédio dos, aí, réus, o que conseguiu, tendo estes procedido à cessação do contrato de mediação com essa mediadora e vendido o imóvel aos compradores arranjados por aquela mediadora.

E, continua aquele aresto, “avaliar se a autora deve ou não ser remunerada depende apenas de saber os réus andaram bem quando, por missiva…, denunciaram o contrato.

Demonstrado que está o contrato de mediação, a prestação dos referidos serviços da autora no âmbito desse contrato e a conclusão do negócio, assim como o nexo causal entre aqueles e este, e o incumprimento dos réus no pagamento da remuneração (os elementos constitutivos do seu direito), é aos demandados que compete provar que agiram sem culpa, que, algo aconteceu que justifique o não pagamento da retribuição acordada com a autora, sob pena de se tornarem responsáveis perante o mediador, pela satisfação do direito à remuneração legalmente previsto (art.ºs 798º e 799º do Código Civil e citado art.º 18º nº 1) – agora artigo 19º nº 1 da Lei nº 15/2013 – já que de responsabilidade contratual se trata.

Basta o contributo causal preponderante e injustificado do cliente proprietário do bem no sentido da não concretização do negócio para que haja lugar à remuneração.

Também o Dr. Fernando Baptista de Oliveira, O Contrato de Mediação Imobiliária na Prática Judicial, CEJ, 2016, páginas 14 e segs, refere que “agora (diferentemente, portanto, do anterior DL 211/2004) a atividade do mediador já não é definida por uma obrigação de diligenciar, mas, sim, de procurar (... destinatários para a realização de negócios). O que é bem diferente da obrigação de... concretização do negócio visado, (obrigação) esta que inexiste, pois isso não depende da vontade do mediador, mas do seu cliente e do interessado encontrado. O termo destinatários parece algo impreciso, pois destinatário é aquele que já celebrou o negócio visado, ou que seguramente o celebrará. E não é isso que se visa com aquela palavra destinatários, antes o que se pretende ali falar é de meros interessados no negócio visado, que podem celebrá-lo, ou não!

Mas sendo a obrigação essencial que impende sobre a mediadora a de angariar interessado para o negócio, praticar atos isolados, tal significa que não basta que a mediadora faça diligências no sentido de aproximar os interessados na realização do negócio. Se assim fosse bastar-lhe-ia simular um comprador que se mostrasse interessado e depois desistisse do negócio, mesmo que sem qualquer fundamento sério. Portanto, em princípio parece que se torna necessário que o contrato previsto seja levado a bom termo. Claro que o contrato visado pode não ser integralmente cumprido. Mas aí já não será a mediadora responsável por tal incumprimento, tendo direito a receber a comissão acordada. De qualquer forma, em princípio, o pagamento da comissão encontra-se ligado à conclusão do negócio pretendido, no caso, a projetada venda.

E citando alguma jurisprudência, menciona aquele autor alguns arestos:

«IV - O contrato de mediação, salvo acordo em contrário, não exige ao mediador que acompanhe toda a negociação até à celebração do negócio.» - Ac. STJ de 29-09-2011, revista n.º 6067/07.3TCLRS.L1.S1 - 7.ª Secção, Sérgio Poças. Acrescenta o aresto que (para haver direito à remuneração acordada) basta que a mediadora consiga um interessado que concretize o negócio (diz o mesmo aresto).

«São pressupostos do contrato de mediação: a) Um acordo de vontades pelo qual uma pessoa – o mediador – se encarrega, perante outra – o comitente – de encontrar uma terceira pessoa – interessado - com vista à conclusão, entre ambas, de um negócio pretendido pela segunda; b) Conclusão efetiva do negócio entre o comitente e o terceiro, como consequência adequada da atividade do mediador.» - Ac. RL de 14.04.2011, proc. 761/07.6TCFUN.L1-2, Olinda Carmo Alves.

«O mediador obriga-se a uma atividade, que não a um resultado, embora seja em função da realização do negócio que ele desenvolve toda a sua atividade, sendo a sua remuneração, em princípio, apenas devida se o negócio se efetivar.» - Ac. STJ de 29-03-2011, Revista n.º 2439/07.1TBPTM.E1.S1 - 1.ª Secção, Paulo Sá.

«O comitente só fica constituído na obrigação de remunerar o mediador se o negócio tido em vista pelo incumbente for concretizado em virtude da atividade do mediador, ou seja, a obrigação de meios que lhe incumbe há-de desembocar no resultado pretendido...» - Ac. STJ de 28.04.2009, Proc. 29/09.3YFLSB – Fonseca Ramos.

Acórdão do TRL de 14/04/2011, proc. 5500/05.3TJLSB.L1-6 – «No dizer do acórdão do STJ de 28.04.2009, cuja doutrina se acompanha, “O comitente só fica constituído na obrigação de remunerar o mediador se o negócio tido em vista pelo incumbente for concretizado em virtude da atividade do mediador, ou seja, a obrigação de meios que lhe incumbe há de desembocar no resultado pretendido – a celebração do negócio para que foi mandatado o mediador (…) ”».

«Tem sido entendimento da doutrina e da jurisprudência que a função do mediador consiste em pôr em contacto duas ou mais partes interessadas em realizar uma operação que é, usualmente, comercial, desenvolvendo, assim, uma atividade de carácter material e preparatória, já que se limita a facilitar a conclusão de contratos, sendo a sua atividade, essencialmente, não jurídica.» - Ac. RL de 05.04.2011, proc. 700/09.0TVLSB-C.L1-7, Roque Nogueira.

«I – O mediador, que exerce uma atividade essencialmente de carácter material e em nome próprio, obriga-se perante o comitente apenas a diligenciar por conseguir interessado em certo negócio e a aproximá-lo daquele (facilitando a conclusão do negócio).» - Ac. TRP de 19.02.2009, José Ferraz.

Entende ainda o Dr. Fernando Baptista de Oliveira, ibidem, páginas 57 e segs que “tem sido entendimento generalizado na jurisprudência que o mediador, no contrato de mediação imobiliária, só tem direito à remuneração convencionada com o comitente/cliente se o negócio visado (constituindo objeto legal da sua atividade de mediação) vier a ser concluído/concretizado e desde que a celebração deste tenha sido o corolário ou a consequência da sua atividade – exigindo-se um nexo causal entre a sua atuação (no âmbito da mediação) e a outorga do contrato visado (competindo ao mediador a alegação e prova dos pressupostos do seu direito, particularmente da verificação desse mesmo nexo causal).

Isto é, o direito à remuneração implica a execução da prestação contratual a que o mediador se obrigou, nomeadamente a prática dos atos adequados a conseguir que seja atingido o objetivo do contrato – a concretização e perfeição do negócio visado com a mediação.

Dito de outra forma: o mediador adquire o direito a receber a remuneração/comissão quando o seu trabalho influi sobre a conclusão do negócio – ou seja, o mediador tem direito à comissão quando, embora a sua atividade não seja a única causa determinante da cadeia dos factos que deram lugar ao negócio pretendido pelo comitente, contribuiu/influiu (decisivamente) para ela, (Cfr., v.g.:

«No contrato de mediação imobiliária, o mediador tem direito à comissão quando, embora não sendo a sua atividade a única causa determinante da realização do negócio pretendido pelo comitente, ela contribuiu para a sua realização, bastando que se tenha limitado a dar a conhecer o nome de uma pessoa disposta a fazer determinado negócio» - Ac. RL de 07.04.2003, Roque Nogueira.

«O direito da mediadora à retribuição acordada no âmbito de um contrato de mediação imobiliária pressupõe, por regra e sem prejuízo das exceções previstas na lei, que a mediadora tenha desenvolvido uma concreta atividade no sentido de angariar um interessado para a celebração do negócio, que o negócio visado pelo contrato de mediação tenha sido concretizado e que este negócio tenha sido celebrado com um terceiro angariado pela mediadora, de tal modo que se possa afirmar que a conclusão do contrato foi o resultado da atividade desenvolvida pela mediadora em virtude de esta se integrar na cadeia de factos que deram lugar ao negócio pretendido, ainda que não tenha sido a única causa.» Ac. TRC de 17.12.2014, proc. 242/11.3TBNZR.C1, Catarina Gonçalves.

«… o mediador só tem direito à remuneração quando haja desenvolvido uma atividade que haja influído na conclusão do negócio visado, sendo a sua atividade causal dessa efetivação.» - Ac. STJ de 19-05-2009, Revista n.º 5339/06.9TVLSB - 6.ª Secção, Silva Salazar.

Sendo, aliás, que, de forma mais abrangente, MANUEL SALVADOR até admite (como orientação que melhor acode aos interesses em causa) que o mediador adquire o direito à remuneração quando influir no resultado final, mas sem que seja necessário para isso “que tenha cooperado no desenvolvimento das negociações, pelo que basta ter-se limitado a dar o nome de uma pessoa disposta a pagar determinado negócio” (situação que também consubstancia a aludida influência (decisiva) para a celebração do negócio) – acrescentando nós, que também bastará ter-se o mediador limitado a pôr em contacto as partes interessadas no negócio (obviamente, é claro, desde que tal atividade da mediadora tenha influído de algum modo no negócio) (Assim também, v.g.: «No contrato de mediação imobiliária, o mediador tem direito à comissão quando, embora não sendo a sua atividade a única causa determinante da realização do negócio pretendido pelo comitente, ela contribuiu para a sua realização, bastando que se tenha limitado a dar a conhecer o nome de uma pessoa disposta a fazer determinado negócio» - Ac. RL de 07.04.2003, Roque Nogueira.

Ac. TRC de 03.02.2015, proc. 1399/11.9TBCLD.C1 (Carvalho Martins): «(...) O mediador só adquire o direito à remuneração, quando influir no resultado final, mas sem que seja necessário para isso, que tenha cooperado no desenvolvimento das negociações, pelo que basta ter-se limitado a dar o nome de uma pessoa disposta a pagar determinado negócio. Não é necessária a continuidade do nexo causal, sendo suficiente que o mediador tenha posto em contacto as partes e que isso tenha influído na conclusão do negócio.».

Escreveu-se, pertinentemente, no Acórdão do STJ, de 28-04-2009: «O comitente só fica constituído na obrigação de remunerar o mediador se o negócio tido em vista pelo incumbente for concretizado em virtude da atividade do mediador, ou seja, a obrigação de meios que lhe incumbe há-de desembocar no resultado pretendido – a celebração do negócio para que foi mandatado o mediador – sob pena de se considerar que o contrato não almejou a perfeição e, não surtindo efeito útil a atividade do mediador – o risco, a álea negocial –, não há lugar à remuneração (comissão), nem ao pagamento de despesas se o contrato for celebrado pelo incumbente com terceiro, que não se interessou pelo negócio por causa da atuação do mediador.»65. Neste aresto, citando-se CARLOS LACERDA BARATA, acrescentou-se: «O direito à retribuição depende da celebração do contrato prometido embora seja independente do cumprimento do mesmo. Só com a verificação de um “resultado útil” – a realização do negócio – da atuação do mediador, este ganha o direito à retribuição. Está em causa mais do que a mera exigibilidade; é da própria constituição do direito que se trata. Pode-se, assim, afirmar que o direito à retribuição está sujeito a condição suspensiva: a celebração do negócio. Naturalmente, que só o negócio cuja celebração advenha (exclusivamente ou não) da atuação do mediador relevará, para este efeito. A prestação do mediador terá de ser causal, em relação ao negócio celebrado entre o comitente e o terceiro... Em matéria de direito à retribuição, o momento relevante é o da constituição do contrato promovido, pelo que as ocorrências supervenientes que incidam sobre a execução ou o conteúdo do contrato serão, em regra, indiferentes” – como abaixo melhor se explicitará.

Da jurisprudência indicada resulta, para lá de qualquer dúvida razoável, que o necessário nexo de causalidade se mostra verificado, no caso dos autos entre a atividade do mediador e o negócio celebrado entre o réu e os compradores do imóvel agenciado.

Com efeito, foi a autora e apelante quem diligenciou pela apresentação de um interessado na aquisição do imóvel do réu e apelado e proporcionou que este visitasse o mesmo e, mais tarde, em momento posterior à denuncia do contrato pelo réu, decorridos cerca de quatro meses, viria a ser consumada a aquisição da fração autónoma por aquele interessado e pela sua esposa, ao réu e apelado.

Não pode haver dúvidas que sem o trabalho desenvolvido pela autora, a venda da fração àquele interessado, muito provavelmente, não ocorreria, antes resulta que tal atividade foi determinante ou causal da celebração do contrato de compra e venda, pelo que se mostra verificado o nexo de causalidade referido.

De resto, nem faria sentido que assim não fosse, pois estaria aberta a porta à possibilidade de desvinculação dos contratos de mediação imobiliária em regime de não exclusividade, por parte dos proprietários de imóveis, sem obrigação de pagamento da quantia devida às agências de mediação imobiliária que agenciassem potenciais interessados para aquisição dos imóveis, possibilitando que aqueles, a quem interessa unicamente a venda das suas propriedades, conseguissem tal desiderato, inclusivamente vendendo por um preço mais barato, decorrente da desnecessidade de pagamento das comissões, apesar do trabalho desenvolvido pelos mediadores e causal da celebração do negócio.

Tendo optado as partes pela estipulação de uma importância fixa (€5.000,00), para remuneração dos serviços de mediação imobiliária, como sucedeu no caso dos autos, tal significa que independentemente do valor pelo qual o imóvel é vendido, a remuneração é sempre a mesma e corresponde ao valor que as partes convencionaram para pagamento dos serviços prestados pela mediadora, uma vez que a celebração do negócio dependeu da aceitação do valor da venda, pelas partes e, portanto, do vendedor.

Por todo o exposto, sem necessidade de ulteriores considerações, face à verificação de todos os elementos relativos ao contrato de mediação imobiliária, dado que a mediadora, aquando da denúncia do contrato de mediação imobiliária que o réu havia celebrado com aquela, havia já praticado todos os atos necessários, suficientes e causais da celebração do contrato de compra e venda, daí resulta que a sentença terá de ser revogada e, em consequência condenado o réu e apelado a pagar à autora e apelante, a quantia de €6.150,00, acrescida de juros de mora comerciais, à taxa legal, desde a citação, até integral pagamento, assim se julgando procedente a apelação.


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D) Em conclusão:

1) A atividade do mediador já não é definida por uma obrigação de diligenciar, mas, sim, de procurar destinatários para a realização de negócios, o que é bem diferente da obrigação de concretização do negócio visado, obrigação esta que inexiste, pois isso não depende da vontade do mediador, mas do seu cliente e do interessado encontrado;

2) O direito da mediadora à retribuição acordada no âmbito de um contrato de mediação imobiliária pressupõe, por regra e sem prejuízo das exceções previstas na lei, que a mediadora tenha desenvolvido uma concreta atividade no sentido de angariar um interessado para a celebração do negócio, que o negócio visado pelo contrato de mediação tenha sido concretizado e que este negócio tenha sido celebrado com um terceiro angariado pela mediadora, de tal modo que se possa afirmar que a conclusão do contrato foi o resultado da atividade desenvolvida pela mediadora em virtude de esta se integrar na cadeia de factos que deram lugar ao negócio pretendido, ainda que não tenha sido a única causa.


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III. DECISÃO

Pelo exposto, tendo em conta o que antecede, acorda-se em julgar a apelação procedente, revogando-se a douta sentença recorrida e, em consequência, condenando o réu e apelado a pagar à autora e apelante, a quantia de €6.150,00, acrescida de juros de mora comerciais, à taxa legal, desde a citação, até integral pagamento.

Custas pelo apelado.

Notifique.


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Guimarães, 14/09/2017


Relator: António Figueiredo de Almeida (64905091718)
1ª Adjunta: Desembargadora Raquel Baptista Tavares
2ª Adjunta: Desembargadora Margarida Almeida Fernandes