Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1671/15.9T8VCT.G1
Relator: FERNANDO FERNANDES FREITAS
Descritores: DECLARAÇÕES DE PARTE
CONTRATO DE MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA
REMUNERAÇÃO DA MEDIADORA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 02/09/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: I – O art.º 640.º do C.P.C. impõe diversos ónus ao recorrente que pretenda impugnar a decisão sobre a matéria de facto. Sendo essencial a indicação dos concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, já que definem o âmbito do recurso, e sendo ainda importante a indicação dos concretos meios probatórios e a proposta de decisão, atento o princípio da cooperação e porque conferem seriedade ao recurso, já a indicação das passagens da gravação pode bastar-se com a sua transcrição.
II - Não estando limitada pelos depoimentos e demais provas que lhe tenham sido indicados pelo recorrente, na reapreciação da matéria de facto a Relação avalia livremente todas as provas carreadas para os autos, valorando-as e ponderando-as com recurso às regras da experiência, aos critérios da lógica, aos seus conhecimentos das pessoas e das coisas, socorrendo-se delas para formar a sua própria convicção.
III – O art.º 466.º do C.P.C., concedendo às partes o poder de iniciativa que antes apenas cabia ao juiz (cfr. actual n.º 2 do art.º 7.º do C.P.C.), impõe que as declarações que prestem na audiência de julgamento sejam apreciadas pelo tribunal a par dos outros meios de prova de apreciação livre, cumprindo apenas, quiçá, um esforço mais aturado para apurar da sua credibilidade.
IV – Se não houver, sequer, uma aparência de declaração de vontade não existe negócio jurídico.
V – É, assim, ineficaz quanto à Ré o contrato de mediação imobiliária celebrado e assinado apenas pelo Réu, se se não provou qualquer facto do qual se possa extrair que aquela tenha, de algum modo, aderido ao contrato ou assumido a disponibilidade de pagar ou contribuir para o pagamento da comissão pretendida pela mediadora.
VI – A remuneração da mediadora imobiliária só é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação pelo que, em princípio, se se não concretizar o negócio também não haverá qualquer remuneração a pagar.
VII – O direito da mediadora imobiliária à remuneração depende, assim, da verificação de uma relação causal entre a actuação do mediador e a conclusão do negócio.
VIII – Considera-se quebrado o nexo de causalidade entre a actividade da mediadora imobiliária e a conclusão de um negócio de compra e venda que posteriormente veio a ser celebrado pelos mesmos interessados angariados por aquela se estes tinham, nos primeiros contactos, sujeitado a compra à verificação de uma condição e desistiram dela por a condição se não ter verificado, e tenham, passados uns meses, vindo a comprar o mesmo imóvel, directamente aos proprietários, mas agora sem que a mediadora imobiliária tenha praticado qualquer acto de mediação.
Decisão Texto Integral:

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES

A) RELATÓRIO
I.- E intentou acção comum contra A e mulher O, pedindo que:
a) se declare definitivo e culposo o incumprimento, por parte dos Réus, do contrato de mediação que celebraram;
b) sejam os Réus condenados a pagarem-lhe a quantia de € 5.500,00, acrescida de IVA à taxa legal de 23%, no valor de € 1.265,00, bem como os juros vencidos e vincendos, desde 10/10/2014, à taxa legal em vigor.
Ou, caso assim se não entenda, que os Réus sejam condenados a pagarem-lhe a indemnização que venha a ser julgada ao abrigo da equidade, calculando-a, desde já, pelo valor acima referido, de € 5.500,00.
Fundamenta estes pedidos alegando em síntese, que celebrou com os Réus um contrato de mediação imobiliária tendo como objetivo promover por conta destes, em regime de não exclusividade, a venda do imóvel identificado no artigo 3° da petição inicial, tendo ficado acordada a comissão de 5% sobre o valor da venda. Promoveu a venda do referido prédio, publicitando-o por diversos meios e na sequência dessas diligências, atendeu alguns interessados, acabando por conseguir que R e F se viessem a interessar pela aquisição do dito imóvel pelo preço pretendido de € 115.000,00; tendo esta proposta de compra sido aceite pelos Réus, ela, Autora, iniciou uma série de diligências para proceder à legalização do prédio, designadamente o registo do prédio em nome daqueles e a rectificação das áreas junto dos Serviços de Finanças, e ainda a obtenção da licença de habitabilidade, mantendo informados os referidos interessados.
Ora, em 10 de Outubro de 2014, veio a tomar conhecimento que os Réus, por escritura pública de compra e venda e mútuo com hipoteca, celebrada na Conservatória do Registo Predial de Viana do Castelo, venderam a F e R o prédio supramencionado, pelo preço, também acima referido, de € 115.000,00, e não deram conhecimento desta venda a ela, Autora, agindo assim com o único intuito de se furtarem ao pagamento da comissão devida no montante de € 5.500,00.
O réu A contestou, impugnando motivadamente os factos alegados pela Autora, alegando que desconhecia se F e R, antes de 04 de Fevereiro de 2014, estavam interessados em comprar-lhe o imóvel, não os conhecia, nem lhe foram apresentados; entre 27 de Julho de 2013 e 04 de Fevereiro de 2014, a Autora não lhe apresentou qualquer interessado, nem lhe formulou qualquer proposta e assim, no início do ano de 2014, ele Réu e o director da Autora, concluíram que a mediação imobiliária se encontrava esgotada, não havendo qualquer interessado para o imóvel; nessa sequência, e por sua própria iniciativa, conseguiu obter interessados para a compra do imóvel, designadamente A e L, com os quais celebrou contrato-promessa em 16 de Janeiro de 2014, negócio que acabou por não se concretizar por os referidos compradores não concordarem com as condicionantes do licenciamento camarário; cessado esse contrato o réu recolocou a placa de venda, tendo no início do mês de Maio de 2014, aparecido no imóvel um casal jovem que não conhecia e com o qual estabeleceu negociações que culminaram com a celebração de um contrato promessa de compra e venda, no Porto, em 04 de Julho de 2014 e posteriormente com a escritura de compra e venda mencionada nos autos.
Concluiu pela improcedência da acção com a sua consequente absolvição do pedido.
A ré O contestou, impugnando motivadamente os factos alegados pela Autora, alegando que nunca foi informada da existência de qualquer contrato de mediação imobiliária, nomeadamente daqueles que se encontram juntos aos presentes autos, nem que o negócio da venda do seu imóvel estava a ser mediado pela Autora; alega ainda que ela, Ré, nunca celebrou qualquer contrato com a Autora, e nunca foi contactada por esta ou por qualquer pessoa em sua representação.
Concluiu pela improcedência da acção com a sua consequente absolvição do pedido.
Os autos prosseguiram os seus termos vindo a proceder-se ao julgamento que culminou com a prolação de Sentença que, julgando a acção procedente, por provada, condenou os Réus a pagarem à Autora a (peticionada) quantia de € 5.500,00 (cinco mil e quinhentos euros), acrescida de IVA de 23%, no montante de € 1.265,00 (mil duzentos e sessenta e cinco euros) bem como dos juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal desde 10.10.2014, até efectivo e integral pagamento.
Inconformado, o Réu A impugna esta decisão, pedindo que seja revogada, com as legais consequências.
Também se não conformou a Ré O e, no recurso que interpôs, seja revogada a decisão proferida, que deverá ser substituída por outra que a absolva da totalidade do pedido.
Contra-alegou a Autora propugnando para que se mantenha o decidido.
Os recursos foram recebidos como de apelação, com efeito meramente devolutivo.
Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre apreciar e decidir.
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II.- O Réu A funda o seu recurso nas seguintes conclusões:
A. A sentença recorrida deu como provada a seguinte factualidade:
19. Aquele R apresentou uma proposta daquele montante que não foi reduzido a escrito.
20. Tal proposta foi comunicada aos RR. os quais afirmaram aceitá-la.
21. Deste modo, e para concretizar o negócio, ficou acordado que iria ser elaborado o contrato promessa entre os Réus e os referidos interessados.
22. Tendo aqueles interessados entregue à A. fotocópia dos seus cartões de cidadão de forma a poder ser efetuado tal contrato promessa.
33. Os Réus tiveram como único propósito furtarem-se ao cumprimento do contrato de mediação imobiliário assinado, nomeadamente no pagamento da comissão devida no montante de € 5.500,00.
B. E deu como não provada a seguinte factualidade:
- O Réu A desconhece quais as ações de promoção e recolha de informações sobre o negócio pretendido, que a Autora efetuou, designadamente se publicitou este negócio afixando um anúncio no seu site na internet.
- O Réu A desconhece se a Autora angariou algum interessado para esta compra e venda, o que sabe é que nunca lhe foi fornecida a identidade de qualquer interessado e nenhum interessado lhe fez qualquer proposta.
- O Réu A desconhecia se F e R, antes de 04 de fevereiro de 2014, estavam interessados em comprar-lhe o imóvel, não os conhecia, nem lhe foram apresentados e estes não lhe fizeram qualquer proposta.
- O que o Réu A sabe é que entre 27 de julho de 2013 - data da celebração do contrato de mediação imobiliária e o dia 04 de fevereiro de 2014 - data da recolha das chaves do imóvel, a Autora não lhe apresentou qualquer interessado, nem lhe formulou qualquer proposta.
- Daí que, no início de 2014, o Réu e o Diretor da Autora R, em contato que mantiveram, tivessem concluído que a mediação imobiliária se encontrava esgotada, não havendo qualquer interessado pra o imóvel.
- Os Réus não são responsáveis pelo pagamento da quantia peticionada.
C. Porque a decisão sobre a matéria de facto constante da sentença recorrida, contraria de modo frontal a prova produzida, constituindo um grave erro de julgamento, pede-se a sua reapreciação nos termos do artº 640º do Código de Processo Civil.
O. Na decisão sobre a matéria de facto o Tribunal a quo ignorou a factualidade confessada pela Recorrida e que se consubstancia no seguinte:
• Não ter acompanhado os atos posteriores a fevereiro de 2014, designadamente a marcação da escritura pública;
• Em 4 de fevereiro de 2014, o réu marido deslocou-se à sede da AUTORA para recolher as chaves;
• O contrato de mediação era feito em regime de não exclusividade.
E. A sentença recorrida ignorou também a prova documental carreada para os autos designadamente:
a) O documento nº 16 junto com a petição inicial, no qual se declara que as chaves do imóvel foram entregues ao Recorrente;
b) Os documentos nºs 1 a 6 juntos com a contestação relativos ao contrato promessa de compra e venda celebrado entre o Recorrente, como Promitente Vendedor e A e mulher como Promitentes Compradores, datado de 16 de janeiro de 2014;
c) O documento nº 7, junto com a contestação, datado de 17 de março de 2014, relativo à Autorização de Utilização nº 53/14, que estabelecia os condicionamentos do licenciamento;
d) O documento nº 8, junto com a contestação, datado de 4 de julho de 2014, relativo ao contrato promessa de compra e venda celebrado entre o Recorrente, como Promitente Vendedor, e R e F, como Promitentes Compradores;
e) O documento nº 9, junto com a contestação, datado de 29 de junho de 2014, relativo à definitiva Autorização de Utilização.
F. Acentuando a gravidade do erro de julgamento o Tribunal a quo:
• Valorizou o depoimento das testemunhas que dependem economicamente da Recorrida, por serem seus funcionários ou prestadores de serviços - H, J, I e H;
• E desvalorizou os depoimentos das duas únicas testemunhas que não tinham qualquer ligação nem ao Recorrente, nem à Recorrida, sendo-lhes indiferente o pagamento ou não pagamento da remuneração da mediadora - F e R, porque a mesma constituía encargo exclusivo do Recorrente.
G. Mau grado isto todos os depoimentos testemunhais confirmam o narrado pelo Recorrente.
H. A testemunha H confirmou que não concretizou qualquer negócio de compra e venda com qualquer cliente.
I. A testemunha J confirmou que na sua presença não foi apresentada qualquer proposta, nem feito qualquer contrato.
J. A testemunha I confirmou que só se faria contrato promessa se houvesse entendimento entre as partes, querendo uma vender e a outra comprar, sendo que na sua presença não foi celebrado qualquer contrato promessa.
K. A testemunha H confirmou que:
• O Recorrente R não estava na reunião realizada nas instalações da Recorrida, na sequência da visita ao imóvel;
• Não foi celebrado qualquer contrato promessa porque: o Sr A não estava disposto a esperar e podia surgir um outro cliente mais rápido para resolver o problema; e o Sr R porque ia recorrer a financiamento; e ambos porque não houve entendimento sobre o conteúdo do negócio;
• O negócio não se tornou perfeito.
L. A testemunha F confirmou que:
• Na primeira fase em que estiveram interessados no imóvel, não foram recebidos pelo Recorrente, nem com este reuniram no escritório da Recorrida;
• Não celebraram qualquer negócio relativamente ao imóvel, porque não estavam reunidas as condições;
• Depois das negociações de 2013 consideraram o assunto completamente encerrado e partiram para a compra de outra casa;
• Somente cerca de um ano depois e ao passarem no local, verificaram que o imóvel estava de novo à venda;
• Contactaram o Sr H para saber se a casa estava de novo à venda e ele disse não saber;
• A segunda fase da negociação, que conduziu à conclusão do negócio, foi feita sem a intermediação da Recorrida;
• Razão pela qual o declararam na escritura de compra e venda.
M. A testemunha R confirmou que:
• Na primeira fase desistiram do negócio, porque não estavam reunidas as condições para o celebrarem;
• Não se recorda de ter ocorrido qualquer reunião nos escritórios da Recorrida com a presença do Recorrente;
• Não foi concretizado qualquer negócio na primeira fase;
• Na sequência foram em busca de outras casas para comprar, tendo com o Sr H feito uma visita;
• Na segunda fase contactaram a Recorrida relativamente a esta casa e foi respondido que não sabiam;
• A conclusão do negócio não foi intermediada pela Recorrida, daí que o contrato promessa de compra e venda não tivesse a respetiva intervenção.
N. A testemunha M confirmou que:
• O Recorrente tem oitenta e dois anos de idade e queria vender a casa porque estava em processo de divórcio:
• As condições de venda eram 145.000,00 euros em regime de não exclusividade;
• Os serviços prestados pela Recorrida foram pagos;
• Nunca houve qualquer reunião estre o Recorrente e potenciais compradores nos escritórios da Recorrida;
• Havia muitas visitas à casa, mas não se realizava o negócio;
• Até que apareceu o Sr A e esposa, com quem foi celebrado um contrato promessa;
• Na sequência o Recorrente foi buscar as chaves do imóvel à Recorrida, acabando aí a sua intervenção;
• A escritura de compra e venda não se chegou a celebrar por falta de licença de utilização definitiva;
• Foi colocada novamente a placa de venda e apareceu um casal a dizer que estava interessado no imóvel;
• O Recorrente não reconheceu este casal, com o qual veio a concluir-se o negócio sem a intervenção da Recorrida.
O. Como resulta da prova documental carreada para os autos e da prova testemunhal acima transcrita o Tribunal a quo errou de forma grave no julgamento da matéria de facto.
P. Deste modo requer-se que sejam julgados NÃO PROVADOS os factos referidos na conclusão A.
Q. E sejam julgados PROVADOS os factos constantes da conclusão B.
R. A sentença recorrida fundamenta a sua decisão do direito no DL 211/2004, de 20 de agosto, devidamente atualizada pelo DL 69/2011, de 15 de junho.
S. Acontece que o artº 43 al a) da Lei nº 15/2013, de 8 de fevereiro, revogou expressamente o DL 2011/2004 e o DL 69/2011.
T. Sendo aplicável ao caso ajuizado a disciplina da Lei nº 5/2013, porque entrou em vigor no dia 1 de março de 2013, datando o contrato de mediação imobiliária em apreço de 27 de julho de 2013.
U. Aliás como consta do cabeçalho e da cláusula 5 desse contrato.
V. Há pois erro nos fundamentos de direito da decisão, o que corresponde à falta da sua especificação.
W. O que determina a nulidade da sentença, por violação do disposto no artº 615 nº 1 al b) do Código de Processo Civil, o que se requer.
X. A cláusula 2 do contrato de mediação imobiliária estabelece que a remuneração só será devida se a mediadora conseguir interessado que concretize o negócio visado pelo presente contrato, nos termos e com as exceções previstas no artº 19 da Lei nº 15/2013, de 8 de fevereiro.
Y. Por seu turno este preceito legal determina que a remuneração do mediador é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício de mediação.
Z. Não basta pois que a Recorrida angarie um candidato a negociar com o Recorrente.
AA. É necessário que se opere a conclusão e perfeição do negócio, como consequência adequada da intervenção desenvolvida pela Recorrida.
BB. A atividade da Recorrida tinha de ser causal do resultado produzido, integrando-se de modo idóneo na cadeia dos factos que deram origem ao negócio.
CC. Tem, por isso, de haver o indispensável nexo de causalidade adequada entre a atuação da Recorrida e a realização do negócio projetado.
DD. Sendo apenas devida a remuneração se o negócio fosse concluído e se tornasse perfeito por efeito direto da intervenção da Recorrida.
EE. Sob pena do Recorrente se ver na contingência de remunerar a Recorrida por cada interessado que esta indicasse.
FF. Que o negócio não foi concluído, nem se tornou perfeito por efeito direto da intervenção da Recorrida está abundantemente provado, como o evidenciam:
a) A recolha das chaves do imóvel pelo Recorrente em 4 de fevereiro de 2014;
b) A celebração do contrato promessa de compra e venda de 14 de janeiro de 2014 com A e mulher;
c) A não celebração de qualquer contrato promessa entre o Recorrente e os Srs R e F com a intervenção da Recorrida, porque estes, bem como o Recorrente, não quiseram essa celebração;
d) A confessada não intervenção da Recorrida em qualquer ato posterior a fevereiro de 2014.
GG. Não lhe sendo devida por isso qualquer remuneração.
HH. Como resulta dos autos não houve qualquer proposta negocial, nem, qualquer aceitação da mesma.
II. Sendo que, como o negócio do imóvel tem de ser celebrado por escritura pública, o respetivo contrato promessa tem de ser reduzido a escrito, tudo como o dispõem os artºs 224 nº 1, 232, 410 e 875 do Código Civil.
JJ. Donde enquanto as partes não acordarem sobre todas as cláusulas julgadas necessárias e as mesmas não tenham sido reduzidas a escrito, o negócio não está nem concluído, nem perfeito.
KK. Não sendo devida pois qualquer remuneração à Recorrida.
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III.- Por sua vez a APELANTE/RÉ formulou as seguintes conclusões, assentando nelas o seu recurso:
I - Vem o presente Recurso interposto da douta Sentença que julgou a presente acção procedente, por provada, condenando a Ré na totalidade do pedido, visando, desde logo, a reapreciação da prova gravada.
II- A MM. Juiz "a quo" errou na apreciação que fez das provas produzidas.
III - Tais provas impunham uma decisão sobre a matéria de facto diversa daquela que agora se vem impugnar por via do presente recurso.
IV - Na opinião da aqui recorrente a sentença recorrida considerou erradamente como provados os seguintes factos:
"5. Nos termos de tal contrato, A. e RR. acordaram que aquela, no exercício da sua atividade, iria promover por conta destes, em regime de não exclusividade, a venda do imóvel;
33. Os Réus tiveram como único propósito furtarem-se ao cumprimento do contrato de mediação imobiliário assinado, nomeadamente no pagamento da comissão devida no montante de € 5.500,00 supra identificado".
V- Quanto aos FACTOS NÃO PROVADOS, a recorrente considera incorrectamente julgada a matéria de facto não provada, a seguir transcrita, pelo que também se impõe a modificação da decisão do tribunal "a quo" sobre esta matéria.
São os seguintes factos que deveriam ter sido considerados como provados:
- A Ré O, nunca foi informada da existência de qualquer contrato de mediação imobiliária, nomeadamente daqueles que se encontram juntos aos presentes autos, nem que o negócio da venda do seu imóvel estava a ser mediado pela Autora.
- A Ré O nunca celebrou qualquer contrato com a Autora, nem nunca foi contactada por esta ou por qualquer pessoa em sua representação.
- Os Réus não são responsáveis pelo pagamento da quantia peticionada.
VI – Pontos de facto que a Recorrente considera incorrectamente julgados (art. 640º, n.º 1, al. a) do CPC): os acima transcritos (indicados na sentença recorrida como provados e não provados)
VII - PROVAS QUE IMPÕEM DECISÃO DIVERSA DA RECORRIDA (art. 640°, n.1 1, al. b) do CPC):
- Docs. ns.º 3 a 6 juntos com a Petição Inicial - trata-se dos contratos de mediação imobiliária juntos pela Autora e dos quais resulta claramente que a Ré Ofélia não teve qualquer intervenção nos mesmos, não os assinou, sendo que na parte referente à identificação dos clientes não consta o seu nome ou qualquer referência à sua existência, nomeadamente como mulher do Réu A.
- Conjugação dos depoimentos produzidos em audiência final, em concreto:
a) Declarações de parte da ora Recorrente - O;
b) Depoimento da Testemunha H.
VIII - No entender da Recorrente o Tribunal "a quo" valorizou o depoimento de testemunhas que dependem economicamente da Autora/Recorrida, como é o caso da testemunha H, que exerce funções de director comercial daquela e desvalorizou por completo as declarações da aqui Recorrente, não lhe dando qualquer credibilidade, apesar de se tratarem de declarações isentas, claras e que estão em consonância com a restante prova testemunhal produzida nos autos e com os referidos docs. 3 e 6 juntos à PI.
IX - Ora, da prova documental e da prova testemunhal acima transcrita o Tribunal "a quo" errou de forma grave no julgamento da matéria de facto.
X - O Tribunal recorrido valorizou o depoimento da testemunha H, que sendo director comercial da Autora tem evidente interesse nos autos, o qual, no que à Recorrente diz respeito apenas afirmou que falou com a mesma por telefone, ou melhor, está convencido que se tratava da Ré, não podendo dizer com toda a certeza que a pessoa em questão fosse efectivamente a Ré, e desvalorizou por completo as declarações da Ré que são claramente contraditórias ao depoimento daquela testemunha, mas claras, isentas, precisas, consistentes e, por isso, mesmo credíveis.
XI - Acresce que, como resulta da prova documental dos autos, os contratos de mediação em causa não se encontram assinados pela Ré O, a qual, em sede de Contestação, alegou isso mesmo, ou seja, que o contrato nunca foi por si assinado.
XII - A Recorrente nunca teve qualquer intervenção naquele negócio, nunca celebrou qualquer contrato com a Autora, nem nunca foi informada da existência do mesmo e/ou das suas condições.
XIII - Por outro lado, como resulta da própria motivação da sentença ora recorrida, nenhuma das testemunhas da Autora conhecia a Ré O, nunca falaram com a mesma pessoalmente ou sequer a viram, apesar de saberem que o Réu A era casado.
XIV - Todavia, como resulta igualmente da motivação da sentença ora recorrida, o Réu, naquela altura, tinha outra companheira, M, que se apresentava como mulher do Réu, sendo que esta assumiu, no seu depoimento prestado nestes autos, que acompanhou o Réu às instalações da Autora onde estiveram presentes algumas vezes.
XV – Ora, todas estas provas impõem, como se requer, que sejam dados como Não Provados os factos da matéria assente acima referidos na conclusão IV.
XVI - Sejam dados como Provados os factos da matéria não assente, referidos na conclusão VI.
XVII - Tendo por base esta matéria de facto provada e não provada, a decisão que se impunha ao Tribunal "a quo" era a de absolver a Ré/Recorrente da totalidade do pedido, na medida em que a mesma não celebrou qualquer contrato com a Autora, como ficou claramente demonstrado. E mesmo que assim não se entendesse, o que apenas por mera hipótese académica se admite, impunha-se que o Tribunal " a quo" tivesse declarado expressamente a nulidade do contrato em causa quanto à Ré O, por falta de forma, já que esta não subscreveu qualquer contrato, como expressamente o invocou, sendo que do teor da sua Contestação se depreende claramente a arguição de tal nulidade.
XVIII - Deste modo, deverá a douta Sentença ser revogada, declarando-se a acção improcedente por não provada, absolvendo-se a Ré da totalidade do pedido, conforme o exposto.
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IV.- Por sua vez, a AUTORA aduz que:
1. - Em sede de impugnação, entendemos, salvo sempre o devido respeito que o recorrente teria que indicar os artigos onde se encontra a matéria de facto objecto de erro no seu julgamento, pois é aí que estão os concretos factos que, tendo sido alegados, foram submetidos a julgamento.
2.- Ora, no caso sub judice, não se descortina a indicação, efectuada por referência aos articulados, de algum concreto ponto de facto considerado incorretamente julgado.
3.- Nesta medida, na ausência de indicação dos concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, entendemos, salvo sempre o devido respeito e melhor opinião, que fica inviabilizado o conhecimento dos doutos recursos, impondo-se, nessa medida, a respectiva rejeição.
4.- Acresce que, da análise atenta das doutas alegações, constatamos que os recorrentes em causa limitam-se a fazer referência ao ficheiro correspondente à totalidade do depoimento das testemunhas aí mencionadas, sem indicar em concreto os trechos que poderiam permitir decisão diferente.
5.- Por todas estas razões, entendemos que as presentes doutas alegações devem ser rejeitadas.
6. - A matéria de facto não merece qualquer censura, dada como provada e não provada, já que resulta não só dos depoimentos como ainda dos documentos, sendo que de uma análise crítica resulta evidente que a recorrida angariou os clientes compradores para o imóvel do recorrente, o qual teve conhecimento de tal proposta e a aceitou.
7.- No caso em apreço, parece evidente que a recorrida cumpriu a sua função: angariar compradores para o imóvel do recorrente. Também não restam dúvidas que foi através da recorrente que os compradores tomaram conhecimento do imóvel em causa e que o recorrente conheceu aqueles.
8.- Quanto ao facto da recorrente não ter assinado o contrato de mediação imobiliária, devia a recorrente ter alegado a nulidade do mesmo, o que não fez, e mesmo que o tivesse feito a verdade é que face à matéria dada como provada, sempre deveria aquela ter sido condenada a pagar a comissão.

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V.- Como resulta do disposto nos art.os 608.º, n.º 2, ex vi do art.º 663.º, n.º 2; 635.º, n.º 4; 639.º, n.os 1 a 3; 641.º, n.º 2, alínea b), todos do Código de Processo Civil, (C.P.C.), sem prejuízo do conhecimento das questões de que deva conhecer-se ex officio, este Tribunal só poderá conhecer das que constem nas conclusões que, assim, definem e delimitam o objecto do recurso.
Como se extrai das conclusões acima transcritas, cumpre:
- conhecer da nulidade da sentença arguida pelo Apelante/Réu;
- reapreciar a decisão da matéria de facto, nos segmentos impugnados (comum a ambos os recursos);
- reapreciar a decisão de mérito:
i) relativamente à Apelante/Ré, a proceder a sua pretensão de alteração da matéria de facto, saber se estamos perante uma nulidade do contrato ou antes perante a inexistência do contrato;
ii) se é devida remuneração à Autora e, em caso afirmativo, quem é o responsável pelo seu pagamento.
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B) FUNDAMENTAÇÃO
VI.- Nas conclusões R. a W. argui o Apelante/Réu à sentença a nulidade prevista na alínea b) do n.º 1 do art.º 615.º do C.P.C., com fundamento em o Tribunal a quo ter enquadrado a situação sub judice em legislação revogada.
O supramencionado vício – não especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão – reporta-se à inobservância do dever de fundamentação da sentença, constante do n.º 3 do art.º 607.º do C.P.C., consubstanciando-se, essencialmente, na falta de indicação de factos que tenham sido provados assim como das normas e institutos jurídicos pertinentes à decisão da causa.
Como vem sendo unanimemente considerado, só a total ausência de fundamentação integra a apontada nulidade, e não já a deficiente fundamentação.
Na situação sub judicio a fundamentação de direito consta da sentença mas, de facto, o Tribunal a quo recorreu ao Dec.-Lei n.º 211/2004, de 20 de Agosto, com as alterações introduzidas pelo Dec.-Lei n.º 69/2011, de 15 de Junho.
Acontece, porém, que a actividade de mediação imobiliária está agora regulada pela Lei n.º 15/2013, de 8 de Fevereiro, que entrou em vigor no dia 1 de Março (1.º dia útil do mês seguinte ao da publicação – art.º 45.º, n.º 1) e revogou, expressamente, aquela legislação – cfr. alínea a) do art.º 43.º.
O primeiro contrato de mediação invocado nos autos devia, atenta a data em que foi celebrado – 27/07/2013 - já estava sujeito ao regime jurídico consagrado na supramencionada Lei.
Houve, pois, erro de julgamento, mas a fundamentação errada também não consubstancia a nulidade em análise.
De qualquer modo, cumprindo a este Tribunal de recurso conhecer do direito, a declaração de nulidade da sentença não constitui obstáculo ao conhecimento do objecto da apelação, nos termos do disposto no n.º 1 do art.º 665.º do C.P.C..
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VII.- 1) Ambos os Apelantes impugnam a decisão da matéria de facto, identificando pelo número os que assim vêm identificados na sentença, transcrevendo-os, e transcrevendo os demais factos visados pela impugnação, e que na sentença não foram individualizados.
Apresentam a proposta de decisão – no essencial, pretendem ver revertido o sentido da decisão: que se julguem, em sede de recurso, “não provados” os factos enunciados na sentença sob os n.os 5 e 33, quanto à Apelante/Ré; e sob os n.os 19 a 22 e 33, quanto ao Apelante/Réu. E se julguem “provados” os que o Tribunal a quo julgou “não provados”, nos segmentos que ambos os Apelantes transcrevem.
Uma e Outro indicam os meios de prova – documental e testemunhal em que baseiam o seu dissenso.
E fazem a transcrição dos depoimentos nos trechos em que se fundam.
O art.º 640.º do C.P.C. enumera os ónus que ficam a cargo do recorrente que pretenda impugnar a decisão da matéria de facto, sendo que a cominação para a inobservância do que aí se impõe é a rejeição do recurso quanto à parte afectada.
Assim é que deverá o recorrente enunciar os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados (alínea a) do n.º 1), enunciação que é essencial porque delimita o poder de cognição do tribunal ad quem. Com efeito, versando o litígio sobre direitos de natureza disponível, a iniciativa é exclusivo do seu titular.
Deve ainda o recorrente indicar os meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida (alínea b) do n.º 1), assim como apresentar o seu projecto de decisão, ou seja, expor, claramente, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas (alínea c) do n.º 1), atento o princípio da cooperação e porque conferem seriedade ao recurso.
E no que concerne à alínea a) do n.º 2 do mesmo preceito legal julga-se suficiente a transcrição dos depoimentos, ainda que se cinjam aos segmentos pertinentes à alteração da decisão, conforme o entendimento que vem vingando no S.T.J. O aqui relator vem adoptando esta posição desde a entrada em vigor do actual C.P.C., atenta a nova filosofia que introduziu no processo, a qual assenta no primado da substância sobre a forma, pressupondo, por isso, a prolação de decisões materiais em detrimento das decisões formais, o que, por sua vez, tem como pressuposto básico o apuramento da verdade material dos factos. , até por este ónus não revestir a mesma importância daqueles, pela sua reduzida, se não nula, utilidade, não só porque a indicação das passagens do depoimento com referência ao tempo da gravação poderá nem estar correcta (e não há nenhuma sanção contra a incorrecção), como porque a credibilidade de uma testemunha não pode ser avaliada com base em algumas passagens do seu depoimento. Tem que se saber da sua razão de ciência e estar atento à sua postura, revelada pelo tom de voz, e pela forma como responde às perguntas que lhe são feitas por cada um dos inquiridores, o que impõe, as mais das vezes, que se alargue a audição do depoimento a outros temas que não, exclusivamente, àquele que está em reapreciação.
Isto considerado, resulta não dever acolher-se a pretensão veiculada pela Autora, de rejeição do recurso quanto à reapreciação da matéria de facto, por “a indicação dos concretos pontos de facto” não ter sido feita com referência aos articulados, e por não terem sido indicados “em concreto os trechos que poderiam permitir decisão diferente”.
Com efeito, e com o respeito devido, não colhe, de todo, o primeiro fundamento. Sendo já passada a bicéfala “selecção da matéria de facto” que continha os “factos assentes” e a “base instrutória”, a descrição dos factos é agora exclusivo da sentença, à qual devem ser levados os factos julgados provados e os que se julgaram não provados (cfr. n.º 4 do art.º 607.º do C.P.C.). Assim, o resultado do julgamento, com o qual se não concorda, hão-de ser os “concretos pontos de facto” descritos na sentença – tenha-se presente que, quanto aos factos, foram alargados os poderes de cognição do tribunal, nos termos constantes do art.º 5.º, n.º 2 do C.P.C..
Assim, o recurso aos articulados só fará sentido relativamente a factos que, tendo sido alegados, não constarem da sentença, nem como provados, nem como não provados.
No que se refere ao segundo fundamento invocado, remete-se para a análise que acima se fez ao requisito constante da alínea a) do n.º 2 do art.º 640.º, reafirmando-se que nas alegações oferecidas pelos Apelantes são transcritas as (longas, no recurso do Apelante/Réu) passagens dos depoimentos que, na perspectiva dos Recorrentes, impunham uma decisão diversa.
Têm-se, pois, por cumpridos todos os ónus legalmente impostos, nada obstando, por isso, à reapreciação da decisão de facto.
2) Na reapreciação da decisão da matéria de facto impõe-se à Relação observar o que dispõe o art.º 662.º do C.P.C..
Não estando limitada pelos depoimentos e demais provas que lhe tenham sido indicados pelo recorrente, a Relação avalia livremente todas as provas carreadas para os autos, valorando-as e ponderando-as com recurso às regras da experiência, aos critérios da lógica, aos seus conhecimentos das pessoas e das coisas, socorrendo-se de todos os elementos probatórios constantes do processo para formar a sua própria convicção.
Talqualmente como na 1.ª Instância, a Relação terá em consideração os factos admitidos por acordo, os que estiverem provados por documentos (que tenham força probatória plena) ou por confissão, desde que tenha sido reduzida a escrito, extraindo dos factos que forem apurados as presunções legais e as presunções naturais, advindas das regras da experiência, sendo que o princípio básico continua a ser o da livre apreciação das provas: relativamente aos documentos sem valor probatório pleno, aos relatórios periciais, aos depoimentos das testemunhas, e também às declarações de parte – cfr. art.os 341º. a 396º. do Código Civil (C.C.) e 607.º, n.os 4 e 5 e ainda 466.º, n.º 3 (quanto às declarações de parte) este do C.P.C..
De acordo com o art.º 341.º do C.C. as provas têm por função a demonstração da realidade dos factos. Sem embargo, não se exige que a demonstração conduza a uma verdade absoluta (objectivo que seria impossível de atingir) mas tão-só a um elevado grau de probabilidade, suficiente para as necessidades práticas da vida (cfr. Manuel de Andrade in “Noções Elementares de Processo Civil”, págs. 191 e 192), mas quem tem o ónus da prova de um facto tem de conseguir “criar no espírito do julgador um estado de convicção, assente na certeza relativa do facto”, como escreveram os Profs. Antunes Varela et Al. (in “Manual de Processo Civil”, Coimbra Editora, pág. 420).
As regras sobre o ónus da prova constam dos art.os 342º. a 346.º do C.C., sendo que o princípio basilar é o que vem estabelecido no primeiro daqueles preceitos legais: quem invoca um direito tem de fazer a prova dos factos que o constituem. Já os factos impeditivos, modificativos ou extintivos têm de ser provados por aquele contra quem o direito é invocado.
Complementarmente àquelas regras e princípios de direito material, cumpre ainda ter presente o princípio de direito adjectivo consagrado no art.º 414.º do C.P.C., de interpretação da dúvida sobre a realidade de um facto ou sobre a repartição do ónus da prova, que se resolve contra a parte à qual o facto aproveita. De resto, o art.º 346.º do C.C. reporta-se, precisamente, à contraprova destinada a tornar duvidosos os factos – estabelecida a dúvida inultrapassável, a questão é decidida contra a parte onerada com a prova.
A importância das referidas regras e princípios radica na proibição do tribunal deixar de julgar alegando dúvida insanável acerca dos factos em litígio, nos termos consagrados no n.º 1 do art.º 8.º do C.C..
Relativamente à confissão, somente a que tenha sido reduzida a escrito tem força probatória plena, nos termos do disposto no n.º 1 do art.º 358.º do C.C., impondo, por isso, o art.º 463.º, n.º 1 do C.P.C., que o depoimento de parte prestado em audiência seja transcrito na acta, através da assentada, quanto aos factos confessados pelo depoente e quanto aos factos ou circunstâncias que impliquem indivisibilidade da declaração confessória.
A confissão judicial não reduzida a escrito, assim como as declarações favoráveis à parte depoente, são livremente apreciadas pelo tribunal, nos termos do disposto no n.º 4 do art.º 358.º do C.C. e no n.º 3 do art.º 466.º do C.P.C., tal como os depoimentos testemunhais, nos termos do disposto no art.º 396.º do C.C..
Desde que seja admitida a prova testemunhal, é igualmente admissível o recurso às presunções judiciais, de acordo com o que dispõe o art.º 349º., do C.C., que são ilações que o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido.
Como referem os Profs. Antunes Varela et Al., “as presunções naturais, judiciais ou de facto são aquelas que se fundam nas regras práticas da experiência, nos ensinamentos havidos através da observação (empírica) dos factos” e, prosseguem, “É nesse saber de experiência feito que mergulham as suas raízes as presunções continuamente usadas pelo juiz na apreciação de muitas situações de facto” (in ob. cit. pág. 486).
Admitindo prova em contrário, como referem ainda os mesmos Mestres, ela “dirige-se contra o facto presumido, visando convencer o juiz de que, não obstante a realidade do facto que serve de base à presunção, o facto presumido não se verificou …” (ob. cit., pág. 488).
Há-de ser, pois, à luz de quanto vem de ser referido que a decisão da matéria de facto será ser reapreciada.
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VIII.- O Tribunal a quo proferiu a seguinte decisão de facto: Vão sinalizados a negrito os factos impugnados.
a) julgou provado que:
1. A A. dedica-se, com intuito lucrativo, à mediação imobiliária, possuindo para o efeito, um estabelecimento comercial sito na Rua Gago Coutinho, n° …, rés-do-chão, na cidade Viana do Castelo.
2. A A. está devidamente licenciada para o exercício dessa atividade de mediação imobiliária, através do competente Instituto de Mercados de Obras Públicas e Particulares e Imobiliário, sendo titular da licença n.º ….
3. No exercício da sua actividade, a A. contactou, através do seu comercial H, os R. no sentido daquela promover a venda do seguinte imóvel, propriedade dos Réus:
"Prédio urbano, composto de casa de habitação de rés do chão, anexo e logradouro, sito no Caminho da Bandeira de Baixo, nº …, lugar do Poço, freguesia de Afife, concelho de Viana do Castelo, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº … e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo …".
4. Assim, na sequência desse contacto, o Réu marido leu, aceitou e assinou, conjuntamente com a A., o contrato de mediação imobiliária, n.º …, no dia 27 de julho de 2013, com uma duração de 6 meses, renovável automaticamente por iguais e sucessivos períodos de tempo, caso não fosse denunciado pelas partes.
5. Nos termos de tal contrato, A. e R. acordaram que aquela, no exercício da sua atividade, iria promover por conta destes, em regime de não exclusividade, a venda do imóvel supra identificado.
6. Nos termos igualmente constantes do contrato de mediação, o preço pretendido pelos R. para a venda em causa era de € 145.000,00.
7. Caso a A., pela sua diligência e trabalho, viesse a obter o resultado pretendido, os R. obrigavam-se a pagar-lhe, como compensação e contrapartida por esses serviços, neste caso, a quantia correspondente a 5% sobre o valor da venda.
8. Logo após a assinatura do aludido contrato, a A. publicitou o pretendido negócio.
9. Assim, no exercício da sua atividade e de acordo com o contratado, a A. publicitou o pretendido negócio.
10. Colocou na sua página da Internet o imóvel em causa, mencionando as suas características e preço.
11. Mandou distribuir publicidade onde constava tal imóvel.
12. E na sequência destas diligências, atendeu alguns interessados a quem prestou toda a necessária informação sobre os termos e condições pretendidas.
13. Diligenciando da melhor forma no sentido de obter a satisfação do interesse dos Réus em levar a cabo a referida venda.
14. No entanto, o preço pretendido pelos RR era demasiado alto para conseguir qualquer interessado.
15. Razão pela qual a A. contactou o Réu marido, no sentido de saber se estava disponível para baixar o preço de venda.
16. O que de facto fez, baixando o preço para a quantia de € 115.000,00.
17. Em consequência de tal baixa de preço, A. e o Réu marido assinaram novo contrato de mediação com o nº …, referente ao dito imóvel pelo prazo de 6 meses, com data de 15 de maio de 2014, em regime de não exclusividade.
18. Na sequência de diligências da Autora, em 12 de Novembro de 2013, a A. acabou por conseguir que R… e sua companheira F… se viessem a interessar na aquisição do dito imóvel pelo preço pretendido de EUR: 115.00,000.
19. Aquele R… apresentou uma proposta daquele montante que não foi reduzida a escrito.
20. Tal proposta foi comunicada aos R. os quais afirmaram aceitá-la.
21. Deste modo, e para concretizar o negócio, ficou acordado que iria ser elaborado o contrato promessa entre os Réus e os referidos interessados.
22. Tendo aqueles interessados entregue à A. fotocópia dos seus cartões de cidadão de forma a poder ser efetuado tal contrato promessa.
23. Sucede que o imóvel em causa encontrava-se omisso à Conservatória do Registo Predial.
24. O que obrigava a registá-lo em nome dos RR ..
25. Bem como a proceder à retificação das áreas junto do Serviço de Finanças,
26. O que, de facto, foi efetuado entre Novembro de 2013 e Dezembro de 2013.
27. Foi ainda necessário obter a licença de habitabilidade, atenta a data da inscrição do prédio no Serviço de Finanças, o que também foi obtido.
28. Durante estes meses, a A., através da sua funcionária I…, manteve o referido interessado informado da evolução do processo através de emails.
29. Toda a evolução deste processo foi ainda dada a conhecer ao Sr. P, funcionário do B, por ser esta a instituição bancária que iria conceder o empréstimo aos interessados R e sua companheira.
30. Sucede que, em 4 de Fevereiro de 2014, o Réu marido deslocou-se à sede da A. para recolher as chaves.
31. A A. veio, entretanto, a apurar que os Réus, em 10 de Outubro de 2014, mediante escritura pública de compra e venda e mútuo com hipoteca, celebrada na Conservatória do Registo Predial de Viana do Castelo, declararam vender a F, solteira, maior, e R, solteiro, maior, que, por sua vez, declararam comprar o dito prédio urbano em causa, pelo preço de € 115.000,00.
32. Tal venda foi efetuada sem dar conhecimento à A.
33. Os Réus tiveram como único propósito furtarem-se ao cumprimento do contrato de mediação imobiliária assinado, nomeadamente ao pagamento da comissão devida no montante de € 5.500,00.
34. Por carta de 28 de Outubro de 2014 enviada ao Réu, e na sequência do conhecimento da dita venda ao interessado angariado pela A., esta solicitou que o mesmo procedesse ao pagamento da comissão devida.
35. Tal missiva foi recebida pelo Réu.
36. Até à presente data, os Réus não efetuaram o pagamento de qualquer quantia à A..
b) julgou não provado que: (posto que não vêm individualizados na sentença, individualizar-se-ão estes factos com recurso às letras do alfabeto, também para melhor identificação dos que foram alvo de impugnação):
a) - O Réu A desconhece quais as ações de promoção e recolha de informações sobre o negócio pretendido, que a Autora efetuou, designadamente se publicitou este negócio afixando um anúncio no seu site na internet.
b) - O Réu A desconhece se a Autora angariou algum interessado para esta compra e venda, o que sabe é que nunca lhe foi fornecida a identidade de qualquer interessado e nenhum interessado lhe fez qualquer proposta.
c) - O Réu A desconhecia se F e R, antes de 04 de fevereiro de 2014, estavam interessados em comprar-lhe o imóvel, não os conhecia, nem lhe foram apresentados e estes não lhe fizeram qualquer proposta.
d) - O que o Réu A sabe é que entre 27 de julho de 2013 - data da celebração do contrato de mediação imobiliária e o dia 04 de fevereiro de 2014 - data da recolha das chaves do imóvel, a Autora não lhe apresentou qualquer interessado, nem lhe formulou qualquer proposta.
e) - Daí que, no início de 2014, o Réu e o Diretor da Autora R, em contato que mantiveram, tivessem concluído que a mediação imobiliária se encontrava esgotada, não havendo qualquer interessado para o imóvel.
f) - No início do mês de maio de 2014, num fim de semana, o Réu foi contatado no seu imóvel por um casal jovem, que não conhecia, os quais indagaram sobre se o imóvel estava à venda e porque preço, tendo o Réu informado que estava à venda pelo preço de € 115.000,00.
g) - A Ré O, nunca foi informada da existência de qualquer contrato de mediação imobiliária, nomeadamente daqueles que se encontram juntos aos presentes autos, nem que o negócio da venda do seu imóvel estava a ser mediado pela Autora.
h) – A Ré O nunca celebrou qualquer contrato com a Autora, nem nunca foi contactada por esta ou por qualquer pessoa em sua representação.
i) – Os Réus não são responsáveis pelo pagamento da quantia peticionada.
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IX.- i) Como acima se deixou referido, o Apelante/Réu impugna a decisão supra transcrita, pretendendo que, reapreciadas as provas, documental e testemunhal que indica, sejam julgados “não provados” os factos n.os 19; 20; 21; 22; e 33, e sejam “provados” os factos constantes das alíneas a); b); c); d); e); e i).
Já a Apelante/Ré propugna para que se julguem “não provados” os factos transcritos sob os nos. 5 e 33, e “provados” os factos constantes das alíneas g); h); e i).
ii) Como consta da motivação (fls. 86v.º a 88), o Tribunal a quo, no essencial, fundou-se nos depoimentos das testemunhas arroladas pela Autora: H (consultor imobiliário); J (comercial); M (administrativa); e H (director comercial), as quais, “não obstante a ligação funcional” à Autora, “revelaram-se sérios, credíveis, objectivos e com conhecimento directo dos factos relatados” (cfr. sétimo parágrafo de fls. 88).
Valorou negativamente os depoimentos das testemunhas R e F (os compradores) “na medida em que depuseram de forma completamente comprometida e nada natural, muitas faltas de memória, memória essa extremamente selectiva, como por exemplo quando questionados sobre se houve reuniões com a Autora e o réu A a resposta de ambos é conveniente, referindo que não se lembram” (cfr. oitavo parágrafo de fls. 88).
Desvalorizou o depoimento da testemunha M (com quem o Réu vivia e vive em união de facto) nas afirmações que contradizem os depoimentos das testemunhas R e F, supramencionados.
E relativamente à Apelante/Ré, reconhecendo ter esta relatado os factos “conforme o por si alegado na contestação” acrescenta “contudo atento o interesse manifesto que tem na decisão da causa e a parcialidade do mesmo não podem ser atendidas pelo tribunal”.
O Apelante/Réu alicerça a sua impugnação na “confissão” produzida pela Autora nos itens 52º; 32º; e 5º, da Petição Inicial (P.I.); no documento n.º 16 junto com a P.I., e nos documentos n.os 1 a 9 juntos com a sua Contestação. Extrai, das afirmações produzidas pelas testemunhas H, J, e M, conclusões diferentes das do Tribunal a quo, e invoca o depoimento da testemunha Hugo Pinto (director comercial da Autora), e os depoimentos das testemunhas F, R e M, para as quais reclama credibilidade.
A Apelante/Ré, para além de fazer notar que não há nenhuma indicação a seu respeito nos documentos n.os 3 a 6 juntos com a P.I., firma-se no seu depoimento de parte e no depoimento da testemunha H.
iii) Entrando na reapreciação (propriamente dita) da decisão, impõe-se começar por referir que o constante da alínea i) como “não provado”: “Os Réus não são responsáveis pelo pagamento da quantia peticionada” deve ser eliminado do acervo factual por ser conclusivo, integrando matéria de direito que constitui o thema decidenduum.
Ainda que com fundamento diverso, a eliminação referida vai de encontro à pretensão dos Recorrentes.
Foram revisitados os depoimentos – de parte e testemunhais – produzidos nos autos, compensando a imediação mitigada, que é proporcionada pelas gravações, com uma atenção redobrada às inflexões da voz, ao teor das respostas, e à razão de ciência das testemunhas, comparando-os entre si e conjugando-os com os documentos juntos aos autos.
a) Assim, e relativamente ao recurso da Apelante/Ré:
A Ré pretende ver-se dissociada deste contrato de mediação que, afirma, nunca lhe foi proposto, não o assinou, e dele não teve, sequer, conhecimento.
E desde já se afirma assistir-lhe razão.
Com efeito, depois de ouvir os depoimentos em que se fundamenta o Tribunal a quo e considerado o acervo documental carreado para os autos, não se conseguiu perceber facilmente em qual daqueles elementos probatórios se alicerçou a convicção da Meritíssima Juiz quanto a esta parte.
O nome da Apelante/Ré não consta de nenhum dos dois contratos de mediação juntos aos autos e nem consta, tampouco, qualquer referência, ainda que indirecta, à sua pessoa – foram traçados os espaços em branco destinados a escrever o “estado civil”, o “regime de bens” e o “nome do cônjuge” do “Cliente”. A única assinatura que deles consta (para além da do comercial da Autora) é a do Apelante/Réu, ex-marido da Apelante/Ré (estando, na altura, em processo de divisão dos bens do casal subsequente ao divórcio, como foi amplamente referido). De todos os documentos que foram juntos aos autos, o seu nome apenas consta da descrição na Conservatória do Registo Predial como co-titular do prédio, e do contrato-promessa de compra e venda, e da escritura de venda definitiva do prédio às testemunhas R e F (respectivamente, fls. 50-52 e 29v.º-32). Mas já não consta da “Declaração”, “Modelo 1”, apresentada nas Finanças para regularização da inscrição matricial do prédio (parte urbana) – cfr. fls. 20v.º-21; nem do requerimento para avaliação – cfr. 21v.º; nem das cadernetas prediais, como co-titular do prédio – cfr. fls. 18 e 26 -, isto apesar de ter sido a testemunha M, administrativa da Autora, quem terá “tratado” de «legalizar o prédio».
Na transcrição dos depoimentos que a Meritíssima Juiz inclui na fundamentação, consta uma referência à Apelante/Ré, da autoria da supra referida testemunha M a qual “pensa que houve uma chamada telefónica do Director a dar-lhe conhecimento de todos os factos que a mesma aceitou” (cfr. 4.º parágrafo de fls. 87v.º).
A outra testemunha que aí vem igualmente referida - V, que é o director comercial da Autora, afirmou, de facto, ter falado pessoalmente com a Apelante/Ré, dizendo ter-lhe telefonado «uma vez», para ver se ela aceitava «o preço da venda por € 115.000». Perguntado disse ter pedido ao Apelante/Réu o número de telefone daquela. E questionado expressamente se “falou com ela sobre o contrato de mediação?” respondeu espontaneamente «Não. O contrato de mediação vai lá atrás (que se interpretou, pelo tom de voz, “já era passado”). Eu falei com ela sobre a questão do preço». E à pergunta subsequente: “apresentou-se como? Como director comercial da Entre Portas? Ela já sabia disso, ou não sabia? Estou eu a perguntar” respondeu «Isso não sei. Sinceramente não sei. Certamente disse-lhe que estava a ligar da Entre Portas, agora não sei se ela já sabia, se não sabia…».
Deste modo, a acreditar-se na sinceridade deste depoente, as respostas que deu às perguntas directamente relacionadas com o contrato de mediação não são minimamente afirmativas para criar uma convicção, que tem de ser segura, de que a Apelante/Ré teve, sequer, conhecimento dos contratos e acordos estabelecidos pelo Apelante/Réu e pela Autora, devendo salientar-se que, nos termos afirmados, o único contacto que terá havido foi pelo telefone, o que não permitia, de modo algum, à testemunha confirmar se estava ou não a falar com a aquela.
Acrescente-se a testemunha J, comercial da Autora, e também interveniente nos factos, que contraria o depoimento acima referido (o que será útil para avaliar da sua credibilidade) já que quando questionado se conhece a Apelante/Ré responde «com a D.ª O nunca tive oportunidade de falar mas já estive com ela», repetindo «sei da existência da D.ª mas pessoalmente a conversar nunca estive», e quando questionado da razão por que acha que a senhora que viu a acompanhar o Apelante/Réu era aquela, claramente improvisando, afirma «ouvi o director comercial a cumprimenta-los “boa tarde Sr. R, boa tarde D.ª O”», o que, como se deixou acima transcrito, não corresponde, de todo, à verdade.
Com o respeito devido, não se acompanha o Tribunal a quo no entendimento, que manifestou, da não utilização das declarações de parte, “atento o interesse manifesto que tem na decisão da causa”.
Com efeito, o art.º 466.º do C.P.C., congruentemente com a nova filosofia que introduziu – do primado das decisões materiais e do apuramento da verdade material que lhes subjaz –, concedeu à parte o poder de iniciativa que antes apenas cabia ao juiz – cfr. actual n.º 2 do art.º 7.º do C.P.C.. E era, pelo menos para alguns, incompreensível que estando a parte obrigada a comparecer e a prestar todos os esclarecimentos que lhe fossem solicitados, e estando ainda obrigada a cooperar para a descoberta da verdade (art.º 417.º do C.P.C.) só fossem “aproveitados” os esclarecimentos que lhe fossem desfavoráveis, por mais sincera e honesta que se apresentasse e ainda que houvesse coerência entre os factos favoráveis e os desfavoráveis. De resto, o C.C. consagra o princípio da indivisibilidade da confissão – cfr. art.º 360.º - que impõe se considerem nela incluídos também “os factos ou circunstâncias tendentes a infirmar a eficácia do facto confessado ou a modificar ou extinguir os seus efeitos”, e estes, como resulta óbvio, apenas beneficiam o confitente.
As declarações de parte deverão ser apreciadas pelo tribunal (cfr. n.º 3 do art.º 466.º do C.P.C.), a par dos outros meios de prova de apreciação livre, cumprindo apenas, quiçá, um esforço mais aturado para apurar da sua credibilidade.
E assim é que, na situação sub judicio, considerados os elementos probatórios a que acima já se fez referência, atento o modo sereno como depôs e a congruência das justificações que acompanharam as suas afirmações, julga-se merecer credibilidade a Apelante/Ré O ao assegurar que “nunca foi informada de qualquer contrato de mediação imobiliária”, incluindo estes que estão juntos aos autos, nem que o negócio da venda estava a ser mediado pela Autora, da qual, segundo afirmou «só ouviu falar no âmbito desta acção», recusando, por isso, ter celebrado qualquer contrato com ela.
E o certo é que a própria Autora, apesar de saber que a Ré tinha uma morada diferente do Réu, só reclamou perante este o pagamento da comissão, remetendo para o seu domicílio carta registada com A/R, do que se infere não ter a Apelante/Ré como parte contratante no(s) contrato(s) de mediação.
Do exposto se conclui merecer provimento o recurso da Apelante/Ré, neste segmento da alteração da matéria de facto.
A referência a si deve, pois, ser eliminada, designadamente dos n.os 5 e 33, e devem ser julgados provados os factos que ficaram (agora) a constar sob as alíneas g) e h), com o aditamento, meramente explicativo, de a Apelante/Ré não ter sido contactada por qualquer pessoa em representação da Autora, para o efeito da celebração de qualquer contrato (sobre a também impugnada alínea i) já nos pronunciamos no início).
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b) No que se refere ao recurso do Apelante/Réu:
Pretende este Apelante que sejam julgados não provados os factos transcritos sob os n.os 19; 20; 21; e 22 (que referem ter a testemunha Ricardo Correia apresentado uma proposta do montante de € 115.000, que não foi reduzida a escrito, mas que foi comunicada aos Réus, que afirmaram aceitá-la, tendo ficado acordado, para concretizar o negócio, que iria ser “elaborado” o contrato-promessa “entre” os Réus e os interessados R e companheira F, que, para o efeito, entregaram à Autora fotocópia dos seus cartões de cidadão). E, bem assim, sob o n.º 33 (os Réus, ao efectuarem a venda sem dela darem conhecimento à Autora, tiveram como único propósito furtarem-se ao cumprimento do contrato de mediação imobiliária assinado, nomeadamente no pagamento da comissão devida no montante de € 5.500,00).
Mais pretende o Apelante/Réu que sejam julgados provados os factos que (agora) ficaram a constar (para além da alínea i) sobre a qual já nos pronunciamos) sob as alíneas a) a e): que ele, Réu, desconhece quais as acções de promoção e recolha de informações sobre o negócio que a Autora tenha levado a efeito, designadamente se o publicitou; desconhece se a Autora angariou algum interessado para esta compra e venda, recusando que lhe tenha sido fornecida a identidade de alguém; desconhece que, antes de 04/02/2014, F e R estavam interessados em comprar-lhe o imóvel, afirmando não os conhecer antes, nem lhe terem sido apresentados, ou ter recebido destes alguma proposta; que entre 27/07/2013 (a data da celebração do contrato) até 04/02/2014 (data da recolha das chaves do imóvel) a Autora não lhe apresentou qualquer interessado nem lhe formulou qualquer proposta; que no início de 2014 ele, Réu, e o director da Autora, em contacto que mantiveram, concluíram que a mediação imobiliária estava esgotada, não havendo qualquer interessado para o imóvel.
Como já se referiu, convoca, para fundamentar a sua pretensão, a “confissão” produzida pela Autora nos itens: 52º, no segmento onde se diz: “pese embora a AUTORA não ter acompanhado os actos posteriores a Fevereiro de 2014”; 32º, que diz “Sucede que, em 4 de Fevereiro de 2014, o RÉU marido deslocou-se à sede da AUTORA para recolher as chaves”, e 5º, onde a Autora reconhece que o contrato de mediação foi celebrado “em regime de não exclusividade”.
O Apelante/Réu, no item 6. da sua Contestação deixou expresso que “Por serem relevantes para a apreciação e decisão da causa o Réu aceita expressamente a confissão destes factos e as respectivas evidências documentais”.
A confissão judicial espontânea é a que é feita nos articulados, sendo irretractável, não mais podendo ser retirada, a partir do momento em que a parte contrária a tenha aceitado – cfr., respectivamente, art.os 356.º do C.C. e 465.º do C.P.C..
Dos factos acima referidos, somente o primeiro não tem contemplação na matéria de facto. Com efeito, a recolha das chaves consta sob o n.º 30, e o regime de “não exclusividade” consta sob o n.º 5.
E quanto ao não acompanhamento dos actos posteriores a Fevereiro de 2014, não podemos desenquadrar este segmento (constante do item 52.º da P.I.) do contexto em que está inserido.
É, de resto, o princípio da indivisibilidade da confissão, consagrado no art.º 360.º do C.C. que o impõe.
Isto considerado, estendendo-se a parte confessória aos demais factos que ali constam, temos por assente que “a Autora não acompanhou os actos posteriores a Fevereiro de 2014, referentes à conclusão do negócio da venda, em Outubro do mesmo ano, designadamente a marcação da escritura pública”.
No sentido de formar a convicção própria sobre a facticidade em análise, revisitaram-se todos os depoimentos, que foram integralmente ouvidos.
E estes depoimentos conjugados com a prova documental carreada para os autos permitem, com o grau de certeza necessário, reconstituir a evolução fáctica que conheceu a relação que vem referida nos autos.
Como referiu a testemunha H, e é, aliás, ponto pacífico, havendo sabido que o Apelante/Réu tinha uma casa à venda, conseguiu que este contratasse os seus serviços no sentido de procurar compradores para ela, vindo a ser assinado o escrito constante de fls. 12, intitulado “Contrato de Mediação Imobiliária”, datado de 27/Julho/2013. Na sequência da assinatura deste contrato, a Autora, através da testemunha M, funcionária administrativa, tratou de publicitar a intenção de venda, designadamente por prospectos, semelhante ao que consta de fls. 77 e sgs. dos autos, e através do seu site da internet, tendo sido por esta via que as testemunhas R e F vieram a tomar conhecimento de tal facto.
Fizeram visitas ao imóvel, nas quais foram acompanhados por aquele J e também por H, outro comercial da Autora.
Face ao interesse que manifestaram, foram encaminhados para o director comercial da Autora, a testemunha V, que encetou as conversações.
No decurso destas conversações aqueles transmitiram a este a proposta de baixar o preço da venda para os € 115.000, o que veio a ser aceite pelo Apelante/Réu quando foi, para o efeito, consultado, já que tinha urgência na venda.
Como deram a conhecer, designadamente ao referido V, os supramencionados R e F tinham de recorrer ao crédito bancário pelo que deram início junto do seu Banco ao processo de apreciação de concessão do crédito.
Verificou-se, porém, que a situação do imóvel não estava regularizada – não estava registado, estava omisso à matriz predial urbana e não tinha autorização de utilização. A testemunha M prestou apoio ao Apelante/Réu na parte do registo e da inscrição matricial, e este tratou de obter a referida autorização. De todas as diligências que fez, e dos resultados que obteve, deu a testemunha conhecimento ao supramencionado R, como este confirmou e resulta dos emails constantes de fls. 17, 19, 20, 22, 24 e 27, sendo o mais antigo datado de 12/11/2013, e o mais recente de 16/12/2013.
Quanto à autorização de utilização, foi o Apelante/Réu que se encarregou de a obter já que tinha pessoa amiga que o auxiliava, como foi referido pela testemunha M.
De acordo com o afirmado pelas testemunhas M, V, R e F, estes dois últimos não celebraram qualquer contrato-promessa de compra e venda aquando das negociações que tiveram com a Autora porque «não estávamos em condições de perceber se podíamos pagar ou não o valor do empréstimo». Em resumo, como reconheceu aquele V (os referidos Interessados e o Apelante/Réu) «não se entenderam quanto ao contrato-promessa».
Ainda relacionado com esta parte, os supra referidos R e F, questionados, reconheceram as fotocópias constantes de fls. 16 e v.º como sendo dos seus cartões de cidadão, mas afirmaram que as não facultaram com a intenção ou o fim de celebrarem o contrato-promessa, esclarecendo «na altura (quando fizeram a primeira abordagem) entregamos a documentação que nos pediram».
Ainda de acordo com o que garantiram ambos, pelos finais de 2013 e princípios de 2014, após consulta a outro Banco (“BIC”), concluíram que não podiam suportar as condições que lhes eram exigidas em relação ao empréstimo bancário pelo que decidiram que «não iam avançar» com a compra, do que deram conhecimento à testemunha V.
Afirmou a testemunha R que na altura este lhe disse que «a casa foi vendida».
E, com efeito, a fls. 47 dos autos, consta cópia de um contrato-promessa de compra e venda celebrado pelo Apelante/Réu, e por sua exclusiva iniciativa, sem qualquer interferência da Autora, com A e mulher, contrato este datado de “16-1-14”, recebendo dos promitentes-compradores o respectivo sinal – cfr. fls. 48-49.
E, segundo a testemunha M, foi na sequência da celebração deste contrato que, dando a casa por vendida, procedeu ao levantamento das chaves que tinha entregue à Autora – o que, como se vê do documento de fls. 29, ocorreu em 4/02/2014, data a partir da qual, como confessou a Autora, deixou de acompanhar “os actos posteriores” ao contrato que veio a ser celebrado.
Enquanto a testemunha V afirma que “ficaram” (na Autora) à espera de feedback do Apelante/Réu, este deu a relação de mediação por finda.
No entretanto, o Apelante/Réu diligenciou pela obtenção da autorização de utilização, vindo a consegui-la em 09/03/2014, mas apenas para “Fins Notariais”, tendo-lhe sido fixado o prazo de 90 dias para demolir “o anexo adossado à construção principal”.
Esta imposição camarária terá, segundo a supramencionada M, desagradado ao promitente-comprador A, que “deu sem efeito” o contrato-promessa, e, nas suas palavras, «tivemos que devolver os € 20.000» (que tinham sido recebidos a título de sinal) – refira-se que esta testemunha vivia na altura (e continua a viver) em união de facto com o Apelante/Réu, acompanhando-o nas suas deslocações relacionadas com a venda.
Gorada esta hipótese, o Apelante/Réu voltou a publicitar a venda do imóvel, designadamente colocando no portão de entrada uma placa indicativa, com o seu número de telefone.
E em 15 de Maio de 2014 volta a celebrar novo contrato com a Autora, nos mesmos termos do primeiro, apenas tendo sido alterado o preço, que baixou para o anteriormente proposto e aceite - € 115.000 – cfr. o documento de fls. 14v.º e 15, cuja letra e assinatura não foram impugnadas pelo Apelante/Réu, pelo que tem força probatória plena, conferida pelo disposto no art.º 376.º do C.C..
Causa alguma estranheza e perplexidade que nem as testemunhas V e M, e nem os dois comerciais H e J se tenham referido expressamente a este contrato, explicando as circunstâncias em que foi assinado e se foram praticados quaisquer actos com ele directamente relacionados, ou se posteriormente a ele houve algum contacto de algum interessado.
Afirmaram as testemunhas R e F que tinham ficado a “gostar da casa”, tinha sido «um projecto para a vida» pelo que de vez em quando passavam por lá para ver se alguém «já estava a fazer obras», e numa dessas “passagens”, que terá ocorrido em princípios de Maio, verificaram que tinha sido “recolocada” no portão a “placa” a indicar que estava à venda, com o número do telefone do Apelante/Réu.
Mais afirmaram ambos que chegaram a casa e consultaram o site da Autora e não “viram” o prédio à venda (segundo declararam tinha sido removido «pouco tempo depois de terem desistido de avançar para a compra»), e o primeiro, R disse ter telefonado para a testemunha V que lhe disse «que não sabia» (que a casa voltou a estar à venda).
Tendo, no entretanto, visto melhoradas as suas condições, decidiram avançar para a compra, e entraram directamente em contacto com o Apelante/Réu, tendo, em 4/07/2014 celebrado o contrato-promessa de compra e venda cuja cópia consta de fls. 50 a 52 dos autos, o qual, segundo afirmaram, foi elaborado e assinado no escritório forense do Mandatário Judicial deste.
A autorização de utilização definitiva só veio a ser concedida em 24/09/2014 (após as demolições impostas) (cfr. doc. de fls. 52v.º), e em 10 de Outubro seguinte foi celebrada a escritura pública de “compra e venda mútuo com hipoteca”, que consta de fls. 29v.º a 32, que a Autora invoca como fundamento do pedido de remuneração.
É, agora, altura de referir que as testemunhas a que acima se fez alusão foram credíveis quanto às afirmações que se reproduziram.
Diverge, assim, esta Relação do Tribunal a quo, no que se refere à valoração do grau de credibilidade dos mencionados depoimentos.
Quanto aos depoimentos das testemunhas R e F, considerada a postura da voz, que denunciava calma e ponderação (mais evidente no primeiro), sem deixar transparecer falta de espontaneidade nas respostas, e uma vez que as suas afirmações obtêm confirmação na prova documental junta aos autos, estão conformes com as regras da experiência comum, com o normal do acontecer. Atenta a sua intervenção directa nos factos, e por não terem manifestado tendência favorável ao Apelante/Réu, é segura a convicção de merecerem credibilidade.
Quanto às apontadas “faltas de memória”, como se sabe, há factos que ficam memorizados, seja por a pessoa lhes atribuir um significado especial, seja por estarem relacionados com outros que, naquelas concretas circunstâncias, tiveram maior relevo.
Se a testemunha não tem a certeza sobre um facto que lhe é perguntado será preferível que responda com o habitual “não tenho bem presente” do que “atirar uma resposta” que, para além de não convencer, afecta a sua credibilidade. Por outro lado sabe-se que, não raras vezes, as respostas são condicionadas pelas perguntas.
Cumpre ao julgador, pelo cruzamento das declarações e informações, extrair a verdade de cada depoimento, que lhe permitirá a reconstituição dos factos, necessária à boa administração da justiça.
Deste modo, cumpre reconhecer a razão ao Apelante/Réu quanto à pretensão de serem julgados “não provados” os factos constantes sob os n.os 21 (quanto ao acordo que iria ser elaborado o contrato-promessa) e 22 (quanto à razão por que “os interessados” “entregaram” a fotocópia do cartão de cidadão), devendo ainda ser dada nova redacção ao n.º 33, de acordo com o que se pode deduzir, rectius judicialmente se pode presumir, da prova produzida.
Já os factos constantes dos n.os 19 e 20 deve manter-se a decisão de “provados” por resultarem à evidência da prova produzida.
Relativamente à facticidade constante das alíneas a); b); c); d); e e), como se extrai de quanto acima ficou referido, saíram confirmados os factos de sentido contrário aos aí transcritos.
Sem embargo, tem de reconhecer-se, alguns daqueles factos não obtiveram confirmação na prova - v.g., o efectivo conhecimento da publicitação do negócio no site da internet, a que alude a alínea a); o fornecimento da identidade dos interessados, mencionado na alínea b) – embora seja crível que pelo menos os nomes próprios das testemunhas Ricardo Jorge e Filipa Isabel tenham sido referidos ao Apelante/Réu.
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X.- Considerado quanto se deixa exposto decide-se proferir a seguinte decisão de facto:
i) considera-se provado que:
1. A Autora dedica-se, com intuito lucrativo, à mediação imobiliária, possuindo para o efeito, um estabelecimento comercial sito na Rua Gago Coutinho, n°…, rés-do-chão, na cidade Viana do Castelo.
2. A Autora está devidamente licenciada para o exercício dessa atividade de mediação imobiliária, através do competente Instituto de Mercados de Obras Públicas e Particulares e Imobiliário, sendo titular da licença n.º ….
3. No exercício da sua actividade, a Autora contactou, através do seu comercial H, o Réu A, no sentido daquela promover a venda do seguinte imóvel, propriedade dos Réus:
"Prédio urbano, composto de casa de habitação de rés-do-chão, anexo e logradouro, sito no Caminho da Bandeira de Baixo, nº …, lugar do Poço, freguesia de Afife, concelho de Viana do Castelo, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº … e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo …".
4. Assim, na sequência desse contacto, o referido Réu leu, aceitou e assinou, conjuntamente com a Autora o contrato de mediação imobiliária, n.º …, no dia 27 de julho de 2013, com uma duração de 6 meses, renovável automaticamente por iguais e sucessivos períodos de tempo, caso não fosse denunciado pelas partes.
5. Nos termos de tal contrato, Autora e Réu A… acordaram que aquela, no exercício da sua atividade, iria promover por conta destes, em regime de não exclusividade, a venda do imóvel supra identificado.
6. Nos termos igualmente constantes do contrato de mediação, o preço pretendido pelo Réu para a venda em causa era de € 145.000,00.
7. Caso a Autora, pela sua diligência e trabalho, viesse a obter o resultado pretendido, o Réu obrigavam-se a pagar-lhe, como compensação e contrapartida por esses serviços, neste caso, a quantia correspondente a 5% sobre o valor da venda.
8. Logo após a assinatura do aludido contrato, a Autora publicitou o pretendido negócio.
9. Colocou na sua página da internet o imóvel em causa, mencionando as suas características e preço.
10. Mandou distribuir publicidade onde constava tal imóvel.
11. E na sequência destas diligências, atendeu alguns interessados a quem prestou toda a necessária informação sobre os termos e condições pretendidas.
12. Diligenciando da melhor forma no sentido de obter a satisfação do interesse do Réu em levar a cabo a referida venda.
13. Em 12 de Novembro de 2013 a Autora acabou por conseguir que R e sua companheira F se viessem a interessar na aquisição do dito imóvel, propondo, porém, o preço de € 115.00,000.
14. Razão pela qual a Autora contactou o referido Réu, no sentido de saber se estava disponível para baixar o preço de venda.
15. Ao que ele acedeu, baixando o preço para a quantia de € 115.000,00.
16. Sucede que o imóvel em causa encontrava-se omisso à Conservatória do Registo Predial.
17. O que obrigava a registá-lo em nome dos Réus.
18. Bem como a proceder à retificação das áreas junto do Serviço de Finanças.
19. O que, de facto, foi efetuado entre Novembro de 2013 e Dezembro de 2013.
20. Foi ainda necessário obter a licença de habitabilidade, atenta a data da inscrição do prédio no Serviço de Finanças, o que também foi obtido.
21. Durante estes meses, a Autora, através da sua funcionária M, manteve o referido interessado informado da evolução do processo através de emails.
22. Toda a evolução deste processo foi ainda dada a conhecer ao Sr. P, funcionário do Banco B, por ser esta a instituição bancária que iria conceder o empréstimo aos interessados R e sua companheira F.
23. Estes, porém, decidiram não avançar com a compra, desistindo dela, do que deram conhecimento à Autora.
24. Com a data de 16/01/2014, o Réu celebrou um contrato com A e esposa, prometendo vender-lhes o prédio acima referido, pelo preço de € 115.000, nos termos que constam do documento de fls. 47, cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido.
25. Na sequência da celebração deste contrato, em 4 de Fevereiro de 2014, o Réu deslocou-se à sede da Autora para recolher as chaves do prédio.
26. Em 09/03/2014 foi concedida a autorização de utilização do prédio referido, pela Câmara Municipal de Viana do Castelo, mas apenas para “fins notariais”, impondo ao Réu a demolição “do anexo endossado à construção principal”, nos termos que consta do doc. de fls. 49v.º, que se dá aqui por reproduzido.
27. Por alturas de Abril ou Maio de 2014 o Réu voltou a colocar o prédio à venda, pondo uma placa com o seu número de telefone, e, juntamente com a Autora, assinou novo contrato de mediação com o nº …, válido pelo prazo de 6 meses, com data de 15 de maio de 2014, em regime de não exclusividade – cfr. doc. de fls. 14v.º e 15, cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido.
28. Pela mesma altura, apercebendo-se que o prédio voltou a ficar à venda, os referidos R e F, entraram em contacto com o Réu, e manifestaram-lhe o interesse na compra do prédio.
29. A intenção da compra veio a ser formalizada por contrato-promessa datado de 04/07/2014, tendo ficado estabelecido que o contrato definitivo seria celebrado no prazo de “60 (sessenta) dias após a emissão do alvará de licença de utilização do bem imóvel…”, comprometendo-se o Réu “a comunicar aos promitentes-compradores … o respectivo deferimento e emissão da competente autorização de utilização”, conforme documento de fls. 50-52, que se dá aqui por reproduzido.
30. A autorização definitiva de utilização veio a ser concedida em 24/09/2014, nos termos do doc. de fls. 52v.º, que se dá aqui por reproduzido.
31. Em 10 de Outubro de 2014, por escritura pública de compra e venda e mútuo com hipoteca, celebrada na Conservatória do Registo Predial de Viana do Castelo, os Réus declararam vender aos mencionados F e R, que declararam comprar, o dito prédio urbano pelo preço de € 115.000,00
32. A Autora só mais tarde veio a ter conhecimento desta venda, da qual o Réu lhe não deu conhecimento.
33. O Réu não o fez por estar convencido que nada tinha a pagar à Autora, nomeadamente a comissão no montante de € 5.500,00.
34. Por carta de 28 de Outubro de 2014 enviada ao Réu, e na sequência do conhecimento da dita venda, a Autora solicitou àquele que procedesse ao pagamento da comissão devida.
35. Tal missiva foi recebida pelo Réu.
36. Até à presente data, os Réus não efetuaram o pagamento de qualquer quantia à Autora.
37. A Ré O, nunca foi informada da existência de qualquer contrato de mediação imobiliária, nomeadamente daqueles que se encontram juntos aos presentes autos, acima referidos, nem que o negócio da venda do seu imóvel estava a ser mediado pela Autora.
38. A referida Ré nunca celebrou qualquer contrato com a Autora, e nunca foi contactada por esta ou por qualquer pessoa em sua representação para o efeito da celebração de um contrato de mediação.
ii) não se provaram os factos alegados, de sentido contrário aos acima transcritos, designadamente que:
a) A Autora não tenha fornecido ao Réu A a identificação dos interessados R e F, pelo menos dando-lhe conhecimento dos nomes.
b) No início de 2014, aquele Réu e o Diretor da Autora V, em contato que mantiveram, tivessem concluído que a mediação imobiliária se encontrava esgotada, não havendo qualquer interessado para o imóvel.
c) Na sequência dos factos acima transcritos em 14 e sgs. tenha ficado acordado entre a Autora, o Réu A e os acima referidos em a), que iria ser elaborado o contrato promessa entre o Réu e estes últimos.
d) Tendo os quais, para este efeito, entregue à Autora fotocópia dos seus cartões de cidadão.
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XI.- Transcrita a facticidade apurada, cumpre passar à apreciação de mérito.
Relativamente ao recurso da Apelante/Ré, como ficou provado, esta não assinou qualquer escrito a corporizar um contrato de mediação com a Autora, e nem foi, tampouco, informada da existência dos que vêm invocados nos autos.
Condição da existência de um qualquer contrato é a declaração de vontade, que o Prof. M define como “todo o comportamento de uma pessoa (em regra, palavras escritas ou faladas ou sinais) que, segundo os usos da vida, convenção dos interessados ou até, por vezes, segundo disposição legal, aparece como destinado (directa ou indirectamente) a exteriorizar um certo conteúdo de vontade negocial, ou em todo o caso o revela e traduz” acrescentando que “vontade negocial é a vontade dirigida a efeitos práticos (em regra económicos), com a intenção de que esses efeitos sejam juridicamente tutelados e vinculantes” (in “Teoria Geral da Relação Jurídica”, vol. II, Almedina, 4.ª Reimpressão, pág. 122).
A declaração negocial, diz o art.º 217.º do C.C., pode ser expressa ou tácita, dizendo-se expressa quando feita por palavras, escrito ou qualquer outro meio directo de manifestação da vontade, sendo tácita quando se deduz de factos que, com toda a probabilidade a revelam.
A declaração é expressa, como refere o Prof. M, “quando feita por palavras, escrito ou quaisquer outros meios diectos, frontais, imediatos de expressão da vontade” e é tácita “quando do seu conteúdo directo se infere um outro, isto é, quando se destina a um certo fim, mas implica e torna cognoscível, a latere, um auto-regulamento sobre outro ponto – em via oblíqua, imediata, lateral”, afirmando resultar claramente da formulação legal que “a inequivocidade dos factos concludentes não exige que a dedução, no sentido do auto-regulamento tacitamente expresso, seja forçosa ou necessária, bastando que, conforme os usos do ambiente social, ela possa ter lugar com toda a probabilidade”, defendendo ainda que em conformidade com o critério de interpretação dos negócios jurídicos, consagrado no art.º 236.º do C.C., “deve entender-se que a concludência dum comportamento, no sentido de permitir concluir «a latere» um certo sentido negocial, não exige a consciência subjectiva por parte do seu autor desse significado implícito, bastando que, objectivamente, de fora, numa consideração de coerência, ele possa ser deduzido do comportamento do declarante” (in “Teoria Geral do Direito Civil”, 3.ª Ed. Actualizª, pág. 425).
Refere o Ac. do S.T.J. de 24/05/2007 que “a declaração tácita é constituída por um comportamento do qual se deduza com toda a probabilidade a expressão ou a comunicação de algo, embora esse comportamento não tenha sido finalisticamente dirigido à expressão ou à comunicação daquele conteúdo”, e prossegue, “tal comportamento declarativo pode estar contido ou ser integrado por comunicações escritas, verbais ou por quaisquer actos significativos de uma manifestação de vontade, incorporem ou não uma outra declaração expressa” (ut Proc.º 07A988, Cons.º Alves Velho, in www.dgsi.pt).
O silêncio, em princípio, não vale como declaração negocial, salvo se a lei, o uso ou uma convenção lhe atribuírem esse valor – art.º 218.º do C.C..
Já ensinava o Prof. Manuel de Andrade que a estipulação negocial a fazer valer o silêncio como declaração “deverá ser tal que não só constitua para as partes ou para alguma delas o dever de falar em dadas circunstâncias, mas ainda deva ser interpretada como estabelecendo que o silêncio valha como declaração de vontade de certo conteúdo”, defendendo não ser legítimo “sem disposição de lei ou cláusula especial, entender como aceitação duma proposta de contrato a atitude puramente omissiva do destinatário” (ob. cit., págs. 136-137).
De qualquer modo, como refere o Prof. Heinrich Ewald Hörster “o silêncio como meio declarativo só deve ser possível no caso de resposta a uma declaração expressa (ou eventualmente tácita) precedente. O silêncio é uma maneira de reagir. Não parece possível tomar uma iniciativa (p. ex. fazer uma proposta) por meio de silêncio” (in “A Parte Geral do Código Civil Português – Teoria Geral do Direito Civil”, Almedina, 1992, pág. 435).
Estas citações vêm a propósito de o Tribunal a quo fundamentar a condenação da Apelante/Ré na convalidação do contrato de mediação decorrente da não invocação, por esta, da nulidade da falta de forma, prevista no n.º 5 do art.º 16.º da Lei n.º 15/2013, de 8 de Fevereiro.
A Autora alega, na P.I. que “no exercício da sua actividade” contactou “os RR.” e que “na sequência desse contacto, o Réu marido leu, aceitou e assinou, conjuntamente com a A., o contrato de mediação imobiliária …”.
No entanto, relativamente à Apelante/Ré não alega um único facto pelo qual esta tenha expressado a sua declaração de vontade negocial.
E, referindo constantemente “os RR.”, também não descreve nenhuma acção, acto ou atitude que aponte para a expressão da declaração de aceitação dos contratos.
O facto singular, concretizado pelo contacto telefónico narrado pela testemunha V não é passível de ser tomado como a expressão, ou a comunicação de aceitação, do contrato de mediação invocado nos autos.
Resta o silêncio que, inequivocamente, também não pode ser considerado por se não verificar nenhum dos pressupostos legalmente estabelecidos, tanto mais que, in casu, e no que respeita ao contrato, o silêncio foi bilateral – a Autora nada propôs e a Ré nada disse ou exprimiu.
Ora, voltando às sábias palavras do Prof. Manuel de Andrade, “Onde não houver ao menos a aparência duma declaração de vontade não pode sequer falar-se de negócio jurídico” (ob. cit., pág. 121).
Defendendo, e com razão, não haver contrato, não tinha a Apelante/Ré que se pronunciar sobre as condições de validade de uma realidade que para si era abstracta.
A Apelante/Ré não se vinculou contratualmente à Autora e nem se provou qualquer facto do qual se possa extrair que tenha, de algum modo, assumido a disponibilidade de pagar ou contribuir para o pagamento da comissão pretendida pela Autora pelo que não há fundamento legítimo para lhe impor qualquer pagamento.
Os dois contratos assinados pelo Réu são, pois, ineficazes em relação à Apelante Ré.
Impõe-se, assim, reconhecer a boa razão da sua pretensão, devendo, por isso, ser revogada, quanto a ela, a condenação proferida pelo Tribunal a quo, com a consequente absolvição dos pedidos formulados pela Autora.
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XII.- Passando à apreciação do recurso do Apelante/Réu, resulta inequívoco dos autos que este, em 27 de Julho de 2013, celebrou com a Autora um contrato pelo qual ambos acordaram que esta poderia promover, por conta dele, Réu, mas não em regime de exclusividade, a venda de um imóvel.
Mediação, escreve o Prof. Carlos Ferreira de Almeida, “é o contrato pelo qual uma das partes (o mediador) se obriga, mediante remuneração, a promover negociações ou a indicar a contraparte para a formação de um contrato que a outra parte no contrato de mediação (o cliente) pretende celebrar” (in “Contratos II”, Almedina, pág. 203).
No que se refere à actividade de mediação imobiliária, o art.º 2.º da Lei n.º 15/2013 define-a dizendo que “consiste na procura, por parte das empresas, em nome dos seus clientes, de destinatários para a realização de negócios que visem a constituição ou aquisição de direitos reais sobre bens imóveis, bem como a permuta, o trespasse ou o arrendamento dos mesmos ou a cessão de posições em contratos que tenham por objecto bens imóveis”, consubstanciando-se nas acções de prospecção e recolha de informações que visem encontrar os bens imóveis pretendidos pelos clientes, e em acções de promoção dos bens imóveis sobre os quais os clientes pretendam realizar negócios jurídicos, designadamente através da sua divulgação ou publicitação, ou da realização de leilões.
É um contrato formal, devendo ser reduzido a escrito, encontrando-se o seu conteúdo mínimo regulado, impositivamente, nas alíneas a) a g) do n.º 2 do art.º 16.º da Lei acima referida.
A obrigação principal do mediador, como refere o Ac. da Rel. de Coimbra de 3/11/2015, é “a de aproximar diferentes pessoas, através da sua intermediação, na busca comum e convergente para a celebração de um contrato entre ambas (obrigação de fazer), numa relação de causa/efeito (obrigação de resultado)”, sendo obrigação principal do comitente a de “remunerar os serviços prestados, através de uma comissão, sendo, por isso, um contrato oneroso, já que tanto o mediador (que é remunerado), como o comitente (que encontra no terceiro interessado, aproximado pelo mediador, a possibilidade concreta de realização do negócio visado), auferem vantagens ou benefícios patrimoniais”, pelo que, o contrato de mediação “ainda que autónomo, é acessório ou preparatório de um outro contrato, a ser concluído entre o comitente (que contratou previamente com o mediador) e terceiro interessado (identificado e aproximado pelo mediador ao comitente) (in Colectânea de Jurisprudência (C.J.), ano XL, tomo V/2015, pág. 6).
A remuneração do mediador imobiliário só é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação.
Se tiver sido celebrado contrato-promessa e no contrato de mediação imobiliária estiver prevista uma remuneração nessa fase, ela terá que ser paga logo que este contrato-promessa seja celebrado, nos termos determinados pelo n.º 1 do art.º 19.º, ainda daquele Lei n.º 15/2013.
Deste modo, se se não concretizar o negócio também não haverá qualquer remuneração a pagar.
Com efeito, como decidiu o Ac. do S.T.J. de 28/04/2009, “O comitente só fica constituído na obrigação de remunerar o mediador se o negócio tido em vista pelo incumbente for concretizado em virtude da actividade do mediador, ou seja, a obrigação de meios que lhe incumbe há-de desembocar no resultado pretendido – a celebração do negócio para que foi mandatado o mediador – sob pena de se considerar que o contrato não almejou a perfeição e, não surtindo efeito útil a actividade do mediador – o risco, a álea negocial – não há lugar à remuneração (comissão), nem ao pagamento de despesas se o contrato for celebrado pelo incumbente com terceiro, que não se interessou pelo negócio por causa da actuação do mediador” (ut Proc.º 29/09.3YFLSB, Cons.º Fonseca Ramos, in www.dgsi.pt).
Em face do art.º 18.º, n.º 1 do Dec.-Lei 211/2004, cuja redacção é práticamente igual à da 1.ª parte do n.º 1 do art.º 19.º da Lei 15/2013, referiu o Ac. da Rel. do Porto, de 08/09/2011, que para que a remuneração seja devida “é ainda necessário que se verifique uma relação causal entre a actuação do mediador e a conclusão do negócio”, pelo que “se o contrato não for realizado o mediador não tem direito ao recebimento da remuneração…” (in C.J., ano XXXVI, tomo IV/2011, pág. 166).
Seguindo a terminologia proposta pelo Prof. Carlos Ferreira de Almeida, há a distinguir três fases na formação dos contratos: a fase preliminar ou preparatória, que “é preenchida pelo conjunto de actos de comunicação através dos quais se desenvolve o diálogo conducente ao acordo”, a esta fase se referindo o art.º 227.º do C.C., durante a qual ocorrem troca de informações e de intenções; o acordo pré-contratual final, que são “acordos não-contratuais preparatórios da celebração de um contrato”, cujo regime está consagrado naquele preceito legal, distinguindo os acordos pré-contratuais intermédios, isto é, “aqueles que eventualmente se estabelecem em qualquer momento entre o início e o termo das negociações para a celebração de um contrato”, e o acordo pré-contratual final, que “surge no termo final das negociações”, consistindo o seu efeito típico “na criação do dever pré-contratual de contratar, concluindo assim o contrato negociado”.
Para que este acordo pré-contratual seja considerado final, “deve representar o consenso material, completo e preciso”, de acordo com o artº. 232.º do C.C., e deve “ter gerado em alguma das pessoas que negociou, ou em nome de quem negociou, a justificada confiança de que a outra está disposta a contratar nos termos do acordo, de tal modo que a frustração dessa confiança seja desconforme com as regras da boa fé” – artº. 227.º referido.
A terceira fase será a subscrição, isto é, a aposição da assinatura no documento – art.º 373.º (in “Comemorações dos 35 anos do Código Civil”, volume II, págs. 357 a 360).
O Ac. da Rel. de Coimbra de 09/09/2014, depois de referir como “características ou pressupostos essenciais” do contrato de mediação imobiliária “(1) a prática de actos pelo mediador com o fito a celebração de um negócio jurídico entre comitente e terceiro; (2) a actuação do mediador com autonomia e independência; (3) o direito ao recebimento da retribuição se o negócio se concretizar; (4) a existência de uma relação de causalidade entre a actividade do mediador e o negócio celebrado”, acrescenta que “o nexo causal necessário à atribuição à mediadora do direito à comissão não exige que a sua actividade, com vista à consecução do negócio, seja contínua e ininterrupta, no sentido de que tenha participado em todas as tentativas até à sua fase conclusiva, antes sendo apenas necessário que ela indique a pessoa disposta a fazer o negócio e consiga a sua adesão à celebração deste; e competindo ao comitente a prova de factos interruptivos de tal nexo.”(ut Proc.º 1421/12.1TBTNV.C1, Desemb. Carlos Moreira, in www.dgsi.pt).
Ora, na situação sub judicio, ficou provado que a Autora, em resultado da acção de publicidade na internet, foi contactada por R e F que se mostraram interessados na compra do imóvel, oferecendo mesmo uma proposta de preço inferior àquela que estava publicitada, a qual foi apresentada ao Réu A, que a veio a aceitar.
Porém, também ficou provado que os referidos Interessados desde o início sujeitavam a compra à condição de conseguirem obter um empréstimo bancário, havendo-se mesmo recusado celebrar o contrato-promessa enquanto não tivessem a garantia de aprovação desse empréstimo.
Não o tendo conseguido nas condições que pretendiam, desistiram da compra, do que deram conhecimento à Autora e ao Apelante/Réu.
Não passou, assim, o contrato da fase “preliminar ou preparatória”, na terminologia do Prof. Carlos Ferreira de Almeida.
Não tendo sido contratado o regime de exclusividade, o Apelante/Réu podia promover, por si próprio ou mesmo através de outras imobiliárias, a venda do imóvel.
Era-lhe, pois, legítimo negociar a venda, como o fez, directamente com os supramencionados R e F.
Esta negociação ocorreu cerca de quatro a cinco meses depois de estes terem desistido da compra, retirando a proposta que, então, fizeram.
A Autora não interveio nas negociações que conduziram à efectivação da venda.
A questão que cumpre decidir é, assim, a de saber se, mesmo apesar disso, é possível estabelecer um nexo de causalidade entre a venda e a actividade anteriormente desenvolvida pela Autora.
Crê-se que a resposta terá de ser negativa já que a venda ocorre num circunstancialismo fáctico diverso do anterior, tendo o nexo de causalidade sido interrompido pela não verificação da condição a que os Interessados sujeitaram a compra e a consequente desistência destes.
E que assim foi entendido também pela Autora poderá invocar-se a circunstância de ter sido celebrado um segundo contrato de mediação, sinal evidente que ambas as partes consideraram que se tinha extinguido a vigência do primeiro.
Por outro lado, das conversações anteriores, propiciadas pela Apelante, o único elemento do negócio que ficou apurado foi o preço.
Contudo, não é apenas a este elemento que se reduz o clausulado de um contrato de compra e venda, e este em particular se atentarmos na circunstância que fez gorar uma outra prometida compra – a imposição de demolição de parte do imóvel urbano, que ficou a constituir condição necessária da emissão da autorização de utilização, a qual, por sua vez, constituía também uma condição necessária à concretização da venda.
Deste modo, não tendo sido em resultado da actividade da Autora que a venda se veio a concluir, não tem ela direito à remuneração.
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XIII.- Pede a Autora subsidiariamente, prevenindo a hipótese de se vir a decidir no sentido de não ser devida a remuneração estabelecida no contrato, que lhe seja fixada uma indemnização para compensação das “diligências” e “despesas”, em quantia a determinar pelas regras da equidade.
Fundamenta este pedido em incumprimento culposo e definitivo, pelo Réu, do contrato de mediação.
Contudo, e como se extrai de quanto acima ficou exposto, o Réu não violou o contrato, tendo antes exercido um direito, não havendo fundamentação fáctica que possa estribar um juízo de culpa na sua actuação.
Por outro lado, a Autora não condensa em factos as invocadas “diligências” e “despesas”, nem ao menos com referência às que saíram provadas, relacionadas com a regularização matricial do prédio e o seu registo na Conservatória.
Sem embargo de se reconhecer ao credor o direito a ser indemnizado pelo devedor dos prejuízos que decorram do cumprimento defeituoso, da mora ou do incumprimento definitivo da obrigação contratual, como decorre dos art.os 798.º e 804.º do C.C., desde logo, terá o credor de fazer a prova dos factos que consubstanciam os prejuízos, por serem constitutivos do direito que se arroga (cfr. art.º 342.º, n.º 1 do C.C.).
E visando a indemnização a reconstituição da situação anterior ao acto lesivo, de acordo com o art.º 564.º do C.C., o recurso à equidade só é possível se se não provar o valor exacto dos danos, como se alcança do n.º 3 do art.º 566.º do mesmo Cód..
Ora, como se referiu, não estão preenchidos nenhum dos mencionados pressupostos pelo que também este pedido subsidiário há-de improceder.
Merece, pois, provimento a pretensão recursiva do Apelante/Réu
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C) DECISÃO
Considerando quanto acima fica exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar procedentes os dois recursos de apelação, e, consequentemente, em revogar a decisão impugnada, absolvendo os Apelantes/Réus dos pedidos formulados pela Autora.
Custas da acção e das apelações pela Autora.
Guimarães, 09/02/2017
(escrito em computador e revisto)

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(Fernando Fernandes Freitas)


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(Lina Aurora Castro Bettencourt Baptista)


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(Maria de Fátima Almeida Andrade)