Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
4975/12.9TBBRG.G1
Relator: MARIA LUÍSA RAMOS
Descritores: CONTRATO DE SEGURO
RESOLUÇÃO
PROVA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 03/26/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª CÍVEL
Sumário: I . A resolução do contrato de seguro não constitui já formalidade de natureza “ad substantiam” ou “ad probationem”, admitindo qualquer meio de prova.
II . O contrato de seguro é aquele pelo qual uma pessoa se obriga, mediante o pagamento, por outra, de determinado prémio, a indemnizá-la ou a terceiro pelos prejuízos decorrentes da verificação de certo evento de risco, sendo que “a relação de seguro comporta o prémio, a cobertura do risco, a eventualidade do sinistro e a indemnização dele resultante” – Menezes Cordeiro, in “Direito dos Seguros”, pg. 525, sendo estes os seus elementos essenciais e constitutivos do direito.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

AA,,,, intentou contra BB… Companhia de Seguros, S.A, acção declarativa de condenação, com processo ordinário, nº 4975/12.9TBBRG, da Vara de Competência Mista da comarca de Braga, contra "BB Companhia de Seguros/ S.A", pedindo se condene a Ré a pagar ao "Banco CC, S.A" a quantia de € 40.931,50 (quarenta mil novecentos e trinta e um euros e cinquenta cêntimos), correspondente ao montante do valor em dívida ao banco à data do falecimento de DD, com quem foi casada, bem ainda a pagar-lhe a ela autora a quantia de € 32.474,40 (trinta e dois mil quatrocentos e setenta e quatro euros e quarenta cêntimos), referente às prestações mensais por si liquidadas desde o falecimento daquele ao banco, acrescida de juros vencidos e vincendos, incluindo ainda as prestações que venha a pagar e todas as despesas bancárias inerentes.
Para tanto alegou, em síntese, que a 2 de Fevereiro de 1996 contraiu casamento com DD.
Em 27 de Novembro do mesmo ano, no 2º Cartório Notarial de Braga, a Autora e o seu marido outorgaram uma escritura de compra e venda e mútuo com hipoteca com Banco XX, através da qual declararam adquirir, por compra, a fracção autónoma designada pela letra "P", inscrita na matriz sob o art, 1…., descrita na conservatória do Registo Predial sob o n.º …, e em regime de propriedade horizontal, do prédio urbano sito na Rua Feliciano Ramos, n.º … em São Vicente, Braga.
A venda foi efectuada pelo preço de dez milhões e trezentos escudos, correspondendo hoje a 51.000,00 € (cinquenta e um mil euros), tendo-se registado sobre a fracção uma hipoteca voluntária a favor do Banco XX.
Na mesma data e em complemento com a referida escritura, a Autora e o seu marido assinaram com aquela entidade bancária um documento complementar com as cláusulas específicas do contrato de empréstimo com hipoteca e celebraram um seguro de vida para cobrir o risco de falecimento da qual é beneficiário o mutuante até ao limite do que, no momento de tal sinistro, estivesse em divida.
Em 15 de Janeiro de 2001, o casal divorciou-se, tendo, porém, que quer durante o casamento, quer após a sua ruptura, o casal sempre cumprido com as suas obrigações financeiras, nomeadamente com a liquidação da prestação mensal ao Banco, bem como com todos os encargos inerentes ao contrato outorgado, como por exemplo as obrigações fiscais e o seguro de vida.
A Autora teve conhecimento por terceiros que o seu ex-marido havia falecido a 11 de Março de 2003, pelo que accionou junto da companhia de seguros o contrato, tendo a Ré recusado, sem qualquer justificação, o pagamento do capital garantido pela apólice.
A renda do crédito hipotecário era pontualmente paga e o montante referente à apólice nº 9700315, era, também, pontualmente, liquidada, por débito directo na sua conta bancária.
Na data do falecimento de DD a divida hipotecária ascendia a 40.931,50 ( (quarenta mil novecentos e trinta e um euros e cinquenta cêntimos), e já com a liquidação referente ao mês de Março efectuada, valor que a Ré deverá entregar ao agora Banco CC.
Além do mais, a Autora tem vindo a pagar com sacrifícios e alguns atrasos as respectivas obrigações bancárias, tendo já suportado de prestações a quantia de 32.474,40 ( (trinta e dois mil quatrocentos e setenta e quatro euros e quarenta cêntimos), correspondendo 2.609,55 € ao remanescente referente ao ano de 2003, 27.835,20 (, correspondente à prestação anual de 3.479,40 e referente aos anos de 2004, 2005, 2006, 2007, 200S, 2009, 2010, 2011. E ainda ao já liquidado este ano que resulta na quantia de 2.029,65 €, valores que deve a seguradora reembolsar-lhe acrescidos dos juros de mora.
Citada a Ré contestou, alegando, em suma, que o extinto Banco XX incorporado no actual CC celebrou com a YY, incorporada na Ré, um contrato de seguro de Vida Grupo, titulado pela apólice 700.315, o qual teve o seu início em 1.01.92 e foi celebrado pelo prazo de um ano, renovável por iguais períodos de tempo.
Em 1.03.2002, o ex-marido da ora autora, DD pediu a anulação da adesão ao seguro em causa, e, por sua vez, em 1.11.2005 foi anulada a adesão da Autora, cônjuge sobrevivo, por falta de pagamento do prémio.
As anulações das adesões são do inteiro conhecimento da Autora, razão pela qual a mesma deduz pretensão cuja falta de fundamento não podia nem devia ignorar.
Conclui que a acção deve ser julgada improcedente, devendo ainda a Autora ser condenada como litigante de má-fé.
A Autora apresentou réplica.
Por despacho de fls. 52 e 53 foi proferido convite ao aperfeiçoamento da petição e à junção de documentos por ambas as partes.
Junta a nova petição, veio a Ré seguradora apresentar nova contestação.
Foi proferido despacho saneador e de selecção da matéria de facto assente e elaborada base instrutória.
Realizado o julgamento foi proferida sentença nos seguintes termos: “Pelo exposto, o Tribunal julga parcialmente procedente a acção, por provada, e em consequência, decide condenar a ré a pagar ao "Banco CC, S.A" a quantia de 40.931,50 € (quarenta mil novecentos e trinta e um euros e cinquenta cêntimos), correspondente ao montante do valor mutuado em dívida ao banco à data do falecimento de DD, acrescida de juros de mora a calcular à taxa comercial desde a data do óbito até à sua entrega, absolvendo-a dos demais pedidos formulados”.
Inconformada, veio a Ré interpor recurso de apelação da sentença proferida nos autos.

O recurso foi recebido como recurso de apelação, com subida nos autos e efeito meramente devolutivo.

Nas alegações de recurso que apresenta, a apelante formula as seguintes conclusões:
1. A douta sentença recorrida acolheu uma errada interpretação e valoração da prova produzida.
2. Desde logo, existe erro de julgamento quanto ao ponto 10º dos factos provados, uma vez que este não poderia ter sido julgado como provado tendo como base o documento previsto a fls.24 do processo, como assim efectivamente o foi, requerendo-se por esta via a sua alteração.
3. Na realidade, o contrato de seguro em dissídio conta de fls.130 a 134 dos presentes autos.
4. O documento de fls. 24 nem sequer é passível de provar a cobertura do risco de morte ou invalidez em relação ao ex-cônjuge da Autora, visto que nada a esse respeito é dito. Observando o documento atentamente o único sujeito que surge como “pessoa segura” é tão só a ora Autora. Nada se prova quanto ao ex-cônjuge da A., pelo que se impugna expressamente o ponto 10º.
5. Por outro lado, entende igualmente a Recorrente que existiu um erro de direito, uma vez que o tribunal “a quo” desconsiderou por completo as cláusulas estipuladas no contrato de seguro “Vida Grupo” (constante de fls. 130-134), em concreto e para o que aqui releva a cláusula IX que tem como epígrafe “condições de liquidação das importâncias seguras”, desrespeitando assim o tribunal a quo total e frontalmente certos princípios fundamentais e inerentes ao Direito, como o da autonomia privada enquanto liberdade contratual (art.405º Código Civil) e o do pacta sunt servanda (art.406º C.C).
6. Há assim por esta via, e sempre com o devido respeito, um erro de interpretação e aplicação da lei e do contrato.
7. Bem vistas as coisas a Recorrente só tomou conhecimento da morte do ex-cônjuge da A. quando foi citada para contestar a presente acção.
8. Para accionar o seguro de vida com a correspondente liquidação das quantias seguras não basta a comunicação da morte do cônjuge do segurado. É necessário, a par dessa comunicação, a entrega de toda a documentação referida na cláusula IX, para assim a Seguradora poder devidamente analisar o relatório médico onde constam as causas, início e duração da doença que causou a morte, bem assim como a certidão de habilitação de herdeiros, ou certidão do processo de inventário, por razões que todos compreendemos. Tratam-se assim de condições de exigibilidade, constitutivas do direito à liquidação das importâncias: sem a sua verificação não podem os segurados exigir qualquer quantia à seguradora.
9. É também requisito indispensável para a exigibilidade das importâncias seguras, em qualquer circunstância, a participação do sinistro e a cópia de documento comprovativo da identidade e identificação fiscal da pessoa segura.
10. Ora, dos factos provados não resulta sequer que a A. tenha efectuado qualquer participação do sinistro!
11. A cláusula IX (fls.133) do contrato de seguro a que as partes se vincularam é perfeitamente válida e eficaz, não tendo sido aliás em qualquer momento alvo de impugnação pelo que o seu conteúdo não deveria ter sido, como o foi pelo tribunal a quo, desconsiderado e ignorado.
12. De notar, que através da cláusula apreciada, não se procura obter uma qualquer vantagem ilegítima e/ou escusar-se ao pagamento do capital seguro, simplesmente pretende-se que seja entregue a documentação necessária comprovativa da verificação do evento seguro e em que moldes. Realce-se, porque importante, que a morte de uma das partes seguradas só acciona o seguro se estiveram cumpridos todos os termos do contrato (por exemplo a causa da morte não pode estar incluída nos riscos previstos na cláusula III), circunstância que legitima assim as condições de exigibilidade supra aludidas. Ou seja, como facto constitutivo do direito da ora recorrida receber o capital seguro, encontra-se não só a ocorrência de uma morte como também a ocorrência de uma morte sob determinadas circunstâncias.
13. Deste modo, não tendo a A. cumprido com as suas obrigações, limitando-se a comunicar-lhe a morte do seu ex-marido aquando da presente acção sem a devida apresentação dos demais elementos exigidos, subsiste aqui um notório incumprimento contratual pelo que a seguradora, ora Recorrente, não pode ser obrigada a pagar o capital seguro ao banco mutuante.
14. Pelo que, ao decidir de outro modo, a sentença recorrida violou manifestamente o preceituado no artigo 342.º n.º 1 do Código Civil, que dispõe no seu nº1 o seguinte: “àquele que invocar um direito cabe fazer prova dos factos constitutivos do direito alegado”.
15. Ainda que assim não fosse e sem prescindir do até aqui exposto, sempre se dirá que o quesito 13º da B.I deveria ter sido julgado como provado (sem a menção a “solicitação por escrito” dado o princípio do dispositivo), isto em consonância tanto com a conjugação de toda a prova produzida na audiência final, como com a prova documental carreada para o processo.
16. Pretende-se assim pelo presente recurso dar efectivamente como provado que o ex-cônjuge da A. requereu a anulação do seguro, no que à sua parte diz respeito, situação que assim legitimou a sua exclusão do contrato de seguro. Deste modo, à data da morte do ex-cônjuge da A. o contrato já não vigorava em relação a ele pelo que a A. não dispunha de qualquer direito de liquidação das importâncias seguras.
17. Como é de conhecimento público, a Ré resultou de um processo de concentração de várias companhias seguradoras, resultando daqui a transferência de clientes de uma seguradora para outra, com os inerentes processos individuais, documentação e variada informação, que como se compreende acarreta sérias dificuldades na procura de determinados documentos antigos, como seja o documento de revogação do contrato quanto ao ex-marido da Autora.
18. E precisamente desta falha tentou aproveitar-se a A., exigindo aquilo a que bem sabia já não ter direito há mais de dez anos, note-se, dada a revogação do seguro na parte que respeitava ao ex-marido.
19. Acredita-se, sinceramente, que a A. continuaria a pagar um seguro, durante todos os posteriores anos, sem ser porque efectivamente tinha conhecimento da revogação efectuada pelo seu ex-marido? Porque razão continuaria ela a pagar esse seguro?
Claramente que sabia, sublinhe-se, de que aquela obrigação apenas recaía sobre ela!
Afinal, ninguém paga um prémio de um contrato de seguro durante tantos anos se sabia que podia accionar uma garantia que demais a mais implicava o pagamento integral do andar, o que demonstra em boa verdade que a A. tinha conhecimento pleno das suas
obrigações.
20. Neste sentido se conclui precisamente aquando da análise das provas e elementos trazidos para o processo, como seja o depoimento de parte da A.; depoimento das testemunhas (filho da A. e do funcionário da Ré); o ficheiro informático junto com a contestação no seu art.6º (documento que comprova devidamente o pedido feito pelo ex-marido – fls.88 do processo); o acordo de divórcio quanto à habitação (fls.190 do processo); os documentos comprovativos do pagamento das prestações pela A., e apenas por ela, quer durante o casamento, como depois do divórcio (cfr. os extractos bancários, fls 276-350, assim como os factos provados 24º e 25º, e o ponto 3 dos não provados)…
21. Na própria oposição à execução (fls.208 a 211) é referido que a A. e o seu ex-marido já não viviam em comunhão de cama e de mesa desde 2000! Posteriormente foi convencionado em acordo próprio que a casa de morada de família ficava entregue à A. (fls.190), não mantendo o ex-casal mais contactos (ponto 23º dos factos provados), o que demonstra claramente o desinteresse do ex-marido em relação à casa em questão.
22. Conforme resulta da confissão espontânea e plena da A. (depoimento de parte), ficou acordado com o seu ex-marido que seria esta a efectuar o pagamento das prestações, ficando o malogrado DD excluído de tal responsabilidade.
23. A Autora ao pretender exonerar-se da sua obrigação age em clara má fé, devendo assim a sua conduta ser consubstanciada com um puro abuso de direito. Como estipula o art.334º do Código Civil, “ é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito”.
24. A A. ao ter continuado a pagar as prestações durante os posteriores anos à morte do seu ex-marido estava claramente convicta de que aquela era uma obrigação que apenas a si dizia respeito. Vir agora, passados doze anos desde a morte do seu ex-marido requerer a liquidação das importâncias seguras é um comportamento por si só claramente ofensivo da boa fé e dos bons costumes e constitui aliás um indecoroso e lamentável venire contra factum proprium, violando o princípio da confiança tutelado por lei (art.334º C.C).
25. Não obstante tudo o exposto, sublinhe-se ainda que o presente contrato de seguro mesmo relativamente à própria Autora foi resolvido automaticamente com efeitos a partir de 1.11.2005, em virtude da falta de pagamento do prémio de seguro, o que se encontra plenamente demonstrado nos autos ( cfr. último extracto bancário quanto ao pagamento do prémio de seguro, fls. 344 e ficheiro informático junto com a contestação, no art. 7º, fls. 89 do processo).
26. Deste modo, quando a A. propôs a presente acção com o intuito de accionar o seguro tal contrato, em boa verdade, já não existia, dada a sua resolução em 1.11.2005. Por conseguinte, tendo a A. claro conhecimento desta situação (quem melhor que ela?) a acção intentada só demonstra mais uma vez a sua patente e notória má-fé.
27. Por último, não se deve olvidar que subjacente ao tipo de contrato de seguro em causa estão interesses meramente privados que se prendem com o incremento do património dos segurados.

Não foram proferidas contra – alegações.
O recurso veio a ser admitido neste tribunal da Relação na espécie e com os efeitos e regime de subida fixados no despacho de admissão do recurso na 1ª instância.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
Delimitação do objecto do recurso: Questões a decidir.
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente, tal como decorre das disposições legais dos artº 635º-nº3 do CPC, não podendo o tribunal conhecer de quaisquer outras questões “salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras “( artº 608º-nº2 do CPC).
E, de entre estas questões, excepto no tocante aquelas que o tribunal conhece ex officio, o tribunal de 2ª instância apenas poderá tomar conhecimento das questões já trazidas aos autos pelas partes, nos termos do artº 5º do CPC, não podendo a parte nas alegações de recurso e respectivas conclusões vir suscitar e requerer a apreciação de questões ou excepções novas.
Atentas as conclusões da apelação deduzidas, e supra descritas, são as seguintes as questões a apreciar e que a recorrente invoca:
- reapreciação da matéria de facto :
- existe erro de julgamento quanto ao ponto 10º dos factos provados ?
- o quesito 13º da B.I deveria ter sido julgado como provado, e, sem a menção a “solicitação por escrito” dado o princípio do dispositivo ?
- do mérito da causa:
- a Autora não cumpriu as condições de exigibilidade, constitutivas do direito à liquidação das importâncias seguras ?
- deverá concluir-se que à data da morte do ex-cônjuge da A. o contrato já não vigorava em relação a DD pelo que a A. não dispunha de qualquer direito de liquidação das importâncias seguras ?
- relativamente á própria Autora o contrato de seguro foi resolvido automaticamente com efeitos a partir de 1.11.2005, não subsistindo já á data da propositura da acção ?
- alegado abuso de direito.

FUNDAMENTAÇÃO
I) OS FACTOS ( factos declarados provados na sentença recorrida ):
1. Por fusão ocorrida em 2002 a Companhia YY foi incorporada na Companhia de Seguros … S.A. tendo esta alterado a sua denominação para "Companhia de Seguros …, S.A.”.
2. Seguiu-se, em 2012, uma nova fusão entre a "Companhia de Seguros …, S.A.” e a …, dando origem à "BB Companhia de Seguros, S.A.”.
3. A 2 de Fevereiro de 1996 a autora casou com DD, do qual se divorciou a 15 de Janeiro de 2001. - cfr. assento de fls. 76.
4. Em 27 de Novembro de 1996, no 2º Cartório Notarial de Braga, a autora e o seu marido outorgaram uma escritura de compra e venda e mútuo com hipoteca com José e Maria, intervindo o Banco XX como banco mutuante, na qual os primeiros declararam comprar a fracção autónoma designada pela letra "P", inscrita na respectiva matriz sob o artigo 1…., descrita na Conservatória do Registo Predial sob o n.o …, e em regime de propriedade horizontal, do prédio urbano sito na Rua Feliciano Ramos, com o n.º …, na freguesia de S. Vicente, concelho de Braga, pelo preço de dez milhões e trezentos escudos. - cfr, escritura de fls. 11 a 22.
5. Através dessa escritura, e sobre a fracção "P" foi constituída uma hipoteca voluntária a favor do Banco YY, regulando-se o empréstimo e a hipoteca pelos termos cláusulas e condições constantes do "documento avulso" arquivado como "documento complementar" de fls. 67 a 75 dos autos. - idem.
6. O documento complementar para além de estipular o valor e o número de rendas a efectuar, calcular os juros, impunha obrigações aos contraentes, nomeadamente efectuar e pagar pontualmente o seguro contra incêndio do imóvel e o seguro de vida, pelos valores indicados pelo Banco em seguradora aceite pelo mesmo _ Clausula 10a alínea e). - idem.
7. Nos termos do parágrafo único desta cláusula "O Banco fica, desde já, autorizado a pagar, por subrogação, os referidos prémios de seguro, caso a parte devedora o não faça atempadamente, debitando a sua conta de Depósitos à Ordem nos termos da Cláusula sétima deste mesmo documento.". - idem.
8. Na data da outorga da escritura já se encontrava provisoriamente registada, pela inscrição "C-2" , a favor do banco, a hipoteca para garantia do mútuo. - idem.
9. DD faleceu a 11 de Março de 2003. - cfr. assento de fls. 76.
10. Por contrato de seguro realizado junto da "Companhia de Seguros XX, S.A", titulado pela apólice n.o 9700315, foi coberto o risco de morte ou invalidez da autora e de DD relativamente ao contrato de mútuo referido em D). - acordo e doc. de fls. 24, (alíneas A) a J) da matéria assente no despacho saneador)
11. A 3.2,2014 a fracção referida em 4., 5., e 8. correspondente ao 3º andar esquerdo sul, tipo T3, para habitação do prédio n.o …, é alvo das seguintes inscrições prediais:
- G-2 - ap.15 de 1996/11/05 - aquisição por compra a favor da autora e DD, casados no regime da comunhão de adquiridos;
- C - 2 - ap. 16 de 1996/11/05 - hipoteca voluntária a favor do Banco YY para garantia do montante de 15.071.600,00 escudos, ao juro anual de 11,572%, elevável em mais de 4% nos casos de mora a titulo de cláusula penal.
12. Na 2.a conferência de divórcio, realizada a 15.01.2001, a autora e o DD persistiram no pedido de divórcio e declararam estar acordados entre si quanto à prestação de alimentos, da qual prescindiram, e quanto ao destino da casa de morada de família, único bem comum do então casal, que ficou para habitação da aqui autora.
13. O DD nunca foi excluído pelo Banco YY da qualidade de mutuário do contrato referido em 4 ..
14. Corre termos sob o n.º 3915/13.2TBBRG na vara mista de Braga uma execução comum iniciada pelo ora Banco … contra a aqui autora e o DD, através da qual o banco reclama o pagamento global das quantias em divida referentes ao empréstimo concedido pelo Banco YYàqueles a 27.11.1996.
15. Tal banco concedeu ao então casal dois financiamentos, sendo um de 730.000$00 contos (€ 3.641,22) ao abrigo do regime geral de crédito à habitação e outro de 9.270.000$00 contos (€46. 238,60) no âmbito do regime do crédito bonificado.
16. As prestações convencionadas relativamente ao pagamento da primeira quantia deixaram de ser pagas em 27.12.2009 e relativamente ao pagamento da segunda quantia em 27.07.2008, o que determinou a resolução do contrato de mútuo.
17. Ficaram em dívida de capital as quantias de € 1,790,14 e € 26.418,68, sobre as quais incidem os juros remuneratórios e moratórias, sendo o valor líquido da quantia exequenda peticionada de € 28.208,82 e dos juros remuneratórios e moratórios de €12.066,35.
18. Na aludida execução a aqui autora apresentou oposição a 13.9.2013, a qual ainda não foi decidida, por se mostrar suspensa pelo conhecimento do óbito do co-executado DD. (factos que ora se aditam como provados em face do teor dos documentos juntos entre a l.a e a 3.a sessão de audiência pelas partes e a por ordem do Tribunal, mormente a certidão de ónus e encargos de fls. 141 a 153, ofício do YY de fls. 168, certidão da C.R.Civil de Braga de fls. 186 a 193, documentos da execução n.º 3915/13.2TBBRG de fls. 202 a 214).
19. Quando a autora e o DD foram ao balcão do Banco YY, em Braga, tratar dos documentos relativos à hipoteca provisória subscreveram nesse mesmo dia e balcão a proposta de seguro relativa ao contrato referido em l0.
20. Só depois do pedido do seguro de vida, previamente remetido à seguradora, ter sido aprovado é que se concluiu o processo de concessão de mútuo.
21. Em data imediatamente anterior à data da escritura de compra e venda e mútuo com hipoteca foram outorgados os seguros contra incêndios e de vida.
22. Após o divórcio referido em 3., a autora permaneceu em Braga, na antiga casa de família, e o DD ausentou-se para paradeiro incerto.
23. A autora e aquele não mantiveram contactos.
24. Quer durante o casamento quer após o divórcio a autora pagou a prestação mensal ao banco até 27.7.2008 (regime geral credito habitação) e até 27.12.2009 (regime crédito bonificado).
25. Bem como liquidou todos os encargos inerentes ao contrato, nomeadamente os prémios dos seguros de vida, por débito directo na sua conta bancária.
26. Após tomar conhecimento do óbito, a autora solicitou à companhia de seguros que liquidasse ao banco o capital em dívida.
27. Na data do óbito do DD a dívida hipotecária ascendia a 40.931,50 € (quarenta mil novecentos e trinta e um euros e cinquenta cêntimos).
28. Após o mesmo óbito a autora liquidou, de prestações bancárias, quantia não determinada.
29. O contrato referido em 10. teve início para a autora e então marido a 1 de Dezembro de 1996, e foi celebrado por um ano, renovável por iguais períodos de tempo.

II ) O DIREITO APLICÁVEL
I .Reapreciação da matéria de facto
Invoca a apelante erro de julgamento quanto ao ponto 10º dos factos provados, alegando que este não poderia ter sido julgado como provado tendo como base o documento previsto a fls.24 do processo pois o contrato de seguro em dissídio conta de fls.130 a 134 dos presentes autos, e, o quesito 13º da B.I deveria ter sido julgado como provado, e, sem a menção a “solicitação por escrito” dado o princípio do dispositivo.
Compulsados os autos verifica-se que ponto nº 10º dos factos provados, com o teor supra indicado: “10. Por contrato de seguro realizado junto da "Companhia de Seguros XX, S.A", titulado pela apólice n.o 9700315, foi coberto o risco de morte ou invalidez da autora e de DD relativamente ao contrato de mútuo referido em D)”. - acordo e doc. de fls. 24, (alíneas A) a J) da matéria assente no despacho saneador)”, corresponde, como do próprio texto expressamente decorre, de matéria de facto já declarada assente no despacho saneador, sendo a expressa reprodução da al.J), declarada plenamente provada com base em acordo das partes, e, ainda com referência meramente complementar ao doc. de fls.24 dos autos.
Reportando-se o despacho de selecção da matéria de facto em referência a 16/4/2013, a data da vigência do Código de Processo Civil na sua anterior redacção, nos termos do artº 511º-nº 2 do citado diploma legal, caberia á Ré/apelante, a faculdade de ter deduzido reclamado contra tal selecção, o que não fez, dispondo o indicado preceito legal- “ As partes podem reclamar contra a selecção da matéria de facto, incluída na base instrutória ou considerada como assente, com fundamento em deficiência, excesso ou obscuridade”, tendo, consequentemente precludido o direito a tal impugnação, sendo que, como a lei determina nos termos do nº3 do citado artigo, só o despacho proferido sobre as reclamações é susceptível de impugnação no recurso da decisão final, e, este inexiste, nestes termos falecendo os fundamentos da impugnação.
Relativamente ao Artigo 13º da Base Instrutória, com o teor: “ A 1 de Março de 2002 o DD solicitou por escrito a anulação do seguro ? “, e que obteve a resposta “Não Provado”, pretende a apelante seja o mesmo declarado como provado, e, sem a menção a “solicitação por escrito” dado o princípio do dispositivo.
Relativamente á redacção do artigo que a apelante impugna invocando a violação do principio do dispositivo relativamente à inserção da palavra “escrito” no quesito, valem as razões acima expostas relativas á oportuna faculdade que à parte incumbia de proceder á reclamação da matéria de facto seleccionada ou incluída na base instrutória nos termos do artº 511º do Código de Processo Civil, na versão à data aplicável, mantendo-se, consequentemente, a redacção do quesito que se fixou definitivamente com a elaboração do despacho de selecção da matéria de facto, sempre se esclarecendo, porém, que a formulação de tal artigo decorre do teor do artº 6º da contestação e ainda da sua conjugação com o artº 6º da réplica, não se demonstrando ocorrer a invocada violação do princípio do dispositivo.
E, relativamente à factualidade que insere, tendo tal quesito vindo a ser declarado como “não provado”, deverá manter-se a resposta dada, não decorrendo da prova produzida nos autos que a 1 de Março de 2002 DD haja solicitado por escrito, ou por qualquer outra forma, a anulação do seguro, admitindo tal factualidade qualquer meio de prova, designadamente, prova testemunhal ou documental ( não revestindo a resolução do contrato de seguro formalidade de natureza “ad substantiam” ou “ad probationem” – Ac. STJ de 9/10/2008, in www.dgsi.pt, “O contrato de seguro é um contrato formal que se prova pela apólice, forma ad substantiam do mesmo contrato. No entanto, a sua resolução ou anulação pode carecer de meio de prova suplementar, pois pode não resultar daquela apólice. E, neste caso, não se impõe que esta prova dependa legalmente de certo meio de prova (…)”), e a qual não se realizou, designadamente, não resultando do teor do depoimento da própria testemunha da Ré seguradora, Manuel …, a verdade de tal pretendida afirmação, com a necessária segurança jurídica, demonstrando esta testemunha desconhecer, na realidade, os elementos e procedimentos do invocado processo de anulação do seguro relativamente ao titular DD, declarando não ter o processo sido tratado por si, e, admitindo inexistirem documentos comprovativos de pedido de anulação do contrato de seguro quanto ao titular DD, a pedido do próprio, com efeitos desde 1.3.2002, e, não se demonstrando, ainda, a verificação de comunicação pela seguradora ao banco beneficiário e consentimento deste e comunicação aos titulares da decisão de anulação, resultando, ainda, do facto provado nº 13 que “ O DD nunca foi excluído pelo Banco YY da qualidade de mutuário do contrato referido em 4 .. “, o que contraria a verificação da concretização da invocada anulação, nem havendo, ainda, lugar ao estabelecimento de qualquer presunção judicial nos termos dos artº 349º a 351º do Código Civil, nenhuma factualidade assente e indubitável se demonstrando e da qual resulte, consequentemente, a prova da factualidade inserta no aludido quesito 13º da Instrutória.
“A reapreciação da matéria de facto, pela Relação, no âmbito dos poderes conferidos pelo artº 712º do CPC, não pode confundir-se com um novo julgamento, destinando-se essencialmente á sanação de manifestos erros de julgamento, de falhas mais ou menos evidentes na apreciação da prova “(v.Ac. STJ,de 14/3/2006,inCJ,XIV,I,pg.130;Ac.STJ,de19/6/2007,www.dgsi.pt; Ac. TRL, de 9/2/2005, www.pgdlisboa.pt ), dispondo o artº 662º-nº1 do CPC, que “ A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão deiversa”.
Nestes termos, inexistindo erro de julgamento que se evidencie e não se fundamentando a convicção do julgador em provas ilegais ou proibidas ou contra a força probatória plena de meio de prova vinculada, improcede a impugnação da matéria de facto, mantendo-se inalterado o elenco factual constante da sentença recorrida.
II. 1. Alega a apelante que da cláusula IX do contrato de seguro (Vida Grupo) celebrado entre a entidade bancária Banco YY (actual ,,,) e a … (actual Recorrente) em 1992, e, posteriormente alvo de adesão pela A. e por DD, por ocasião de um empréstimo bancário, encontra-se devidamente previsto nas fls. 130 a 134 do processo, titulado pela apólice nº 9700315, prevendo especificamente na sua cláusula IX o seguinte:
IX. Condições de liquidação das importâncias seguras
1. A liquidação das importâncias seguras, sempre que a ela houver direito, será efectuada de acordo com as condições contratuais e após o envio da seguinte documentação:
1.1. Em qualquer circunstância:
a) Participação do sinistro;
b) Cópia de documento comprovativo da identidade e da identificação fiscal da Pessoa Segura.
1.2. Adicionalmente, em qualquer circunstância, caso existam beneficiários diferentes do Tomador de Seguro:
a) Cópia de documento comprovativo da identidade e da identificação fiscal dos beneficiários, se diferentes do Tomador de Seguro, caso existam;
b) Certidão de habilitação de herdeiros ou certidão do processo de inventário, se a esta houver lugar, desde que determinantes para a regularização do benefício.
1.3. Adicionalmente, em caso de morte da Pessoa Segura:
a) Certidão ou certificado de óbito da Pessoa Segura;
b) Documento comprovativo das causas e circunstâncias em que ocorreu o falecimento;
c) Relatório médico sobre a doença e sua evolução, se aquela for causa do falecimento
(…)”
“Deste modo, para accionar o seguro de vida com a correspondente liquidação das quantias seguras não basta a comunicação da morte do cônjuge do segurado. É necessário, a par dessa comunicação, a entrega de toda a documentação supra referida, para assim a Seguradora poder devidamente analisar o caso, com conhecimento de todos os factos e tomar deste modo a melhor decisão face ao estipulado no contrato. Tratam-se assim de condições de exigibilidade, constitutivas do direito à liquidação das importâncias: sem a sua verificação não podem os segurados exigir qualquer quantia à seguradora.
Ou seja, aplica-se aqui o seguinte raciocínio: ao beneficiário cabe demonstrar o seu direito, para poder accionar devidamente o seguro e à seguradora, munida de todos os elementos, incumbe fazer a prova da eventual verificação de uma situação de exclusão da apólice.
Ora, dos autos decorre, sem margem para dúvidas, que a A., ora Recorrida, não observou a cláusula supra referida. A prova da morte do Sr. DD não basta para, sem mais, obrigar a Companhia a pagar o capital seguro ao banco mutuante. Há condições de exigibilidade dos valores seguros, devidamente previstas na cláusula supra aludida, que têm de ser cumpridas pelo cônjuge sobrevivo e que no caso claramente não o foram. Ou seja, sendo estas condições parte constitutiva do direito invocado pela A. cabia a esta alegar os factos inerentes, situação que sem sombra de dúvida não aconteceu!
De realçar que o contrato em causa não foi em qualquer momento do processo impugnado, nem na sua veracidade, conteúdo, legalidade ou conhecimento, pelo que o tribunal a quo deveria ter dado plena consagração ao disposto na sua cláusula IX, exigindo assim à A. a prova da participação do sinistro nos termos e condições exigidos pelo contrato.”
É manifesta a falta de razão da apelante.
Com efeito, desde logo, como do próprio teor da cláusula contratual em referência decorre, estipulam-se na indicada “Cláusula IX” do contrato de seguro as condições de liquidação das importâncias seguras, dispondo o indicado preceito que “a liquidação das importâncias seguras, sempre que a ela houver direito, será efectuada de acordo com as condições contratuais e após o envio da documentação que se enumera”.
Trata-se, assim, de condições de liquidação do pagamento da importância segura e condições de procedibilidade respectiva, e, em caso, algum de condições de exigibilidade e de verificação do direito, pressupondo-se, aliás, na cláusula em referência, que tais procedimentos de liquidação terão lugar caso a tal haja direito – “sempre que a ela houver direito”;
sendo a verificação do sinistro, in casu o falecimento do titular do contrato, o evento de risco accionador do direito á indemnização e condição de exigibilidade do direito, tal como da própria noção legal de contrato de seguro decorre, cfr. artº 1º da LCS – “Por efeito do contrato de seguro, o segurador cobre um risco determinado do tomador do seguro ou de outrem, obrigando-se a realizar a prestação convencionada em caso de ocorrência do evento aleatório previsto no contrato, e o tomador do seguro obriga-se a pagar o prémio correspondente”,
sendo, assim, o contrato de seguro aquele pelo qual uma pessoa se obriga, mediante o pagamento, por outra, de determinado prémio, a indemnizá-la ou a terceiro pelos prejuízos decorrentes da verificação de certo evento de risco, sendo que “a relação de seguro comporta o prémio, a cobertura do risco, a eventualidade do sinistro e a indemnização dele resultante” – Menezes Cordeiro, in “Direito dos Seguros”, pg. 525, sendo estes os seus elementos essenciais e constitutivos do direito.
Nestes termos provou a Autora os elementos constitutivos do seu direito, nos termos do artº 342º do Código Civil, falecendo os fundamentos da apelação.
Acresce que a indicada questão se traduz, ainda, em questão nova, não suscitada perante o Tribunal de 1ª instância, e que se baseia na alegação de factos novos não invocados pela Ré na contestação, não tendo qualquer correspondência com os factos provados, também por este fundamento improcedendo a apelação relativamente a esta questão, tendo a oportunidade de dedução de defesa pela Ré precludido como o oferecimento da contestação nos termos do artº 489º do CPC.
2. Relativamente ás alegações da apelante no sentido de que deverá concluir-se que à data da morte do ex-cônjuge da A. o contrato já não vigorava em relação a DD e relativamente á própria Autora o contrato de seguro foi resolvido automaticamente com efeitos a partir de 1.11.2005, não subsistindo já á data da propositura da acção, pelo que a A. não dispunha de qualquer direito de liquidação das importâncias seguras, os factos provados contrariam tais conclusões da recorrente, designadamente os factos nº 10, 13, 24, 25, tendo resultado provado que “ Por contrato de seguro realizado junto da "Companhia de Seguros …, S.A", titulado pela apólice n.o 9700315, foi coberto o risco de morte ou invalidez da autora e de DD relativamente ao contrato de mútuo referido em D).”, “O DD nunca foi excluído pelo Banco YY da qualidade de mutuário do contrato referido em 4 ..”, “Quer durante o casamento quer após o divórcio a autora pagou a prestação mensal ao banco até 27.7.2008 (regime geral credito habitação) e até 27.12.2009 (regime crédito bonificado).”, “ Bem como liquidou todos os encargos inerentes ao contrato, nomeadamente os prémios dos seguros de vida, por débito directo na sua conta bancária”, tendo, ainda, resultado “não provado” ter a Ré comunicado á Autora a anulação do seguro relativamente à própria.
3. Nos termos expostos, e atento o factualismo concretamente apurado, improcede igualmente a apelação da Ré seguradora no tocante à alegada actuação da Autora em abuso de direito, nos termos do art.º 334º do Código Civil, o qual determina ser ilegítimo o exercício de um direito quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito, pois que os factos provados não abrangem a previsibilidade da norma, baseando-se a apelante nesta invocação em juízos valorativos sem correspondência nos factos que se provaram, deste modo falecendo, desde logo por tais razões, os fundamentos da apelação.
Como refere P.Pais de Vasconcelos, in Teoria Geral do Direito Civil, 5ª edição, pg. 262 “ A jus-eticidade desempenha um papel importante na substância do direito subjectivo. Esta exige um direito de mérito, de conformidade com as coordenadas axiológicas, ético-jurídicas, do Direito (… ). De entre os princípios ético jurídicos avultam, entre outros, a boa fé e os costumes ( art.º 334º e 762º-n.º 2 do Código Civil )”, dispondo, ainda, este preceito legal, a par do já estatuído pelo art.º 334º, do citado diploma legal, que “ No cumprimento da obrigação, assim como no exercício do direito correspondente, devem as partes proceder de boa fé”.
“ As normas jurídicas – Lex – influenciam a substância do direito subjectivo – Ius _ ao impor, proibir ou determinar o seu conteúdo e o modo do seu exercício. Trata-se de estatuir limites extrínsecos do direito subjectivo e ao seu exercício “- autor e obra citada.
“O abuso de direito é (…) contradição entre o respeito por uma estrutura formal ( através da qual se invoca um “direito” ) e a violação da intenção material em que normativamente se funda o mesmo direito que aquela estrutura pretende traduzir – Castanheira Neves - Questão de Facto - Questão de Direito ou o Problema Metodológico da Juridicidade, pg. 524”.
Analisados os autos, na sua globalidade, e o exercício do direito da Autora que no processo se realiza, afigura-se legítimo o exercício de tal direito e correspondente a exigência do cumprimento de estipulação contratual, legalmente prevista e concedida, e que a Autora logrou provar verificar-se, de facto e de direito, tendo a Autora feito a prova dos factos constitutivos do direito, nos termos gerais do art.º 342º do Código Civil.
Improcedem, consequentemente, na totalidade, os fundamentos da apelação.

DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação, em julgar improcedente a Apelação, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.

Guimarães, 26.03.2015
Maria Luísa Duarte
Isabel Rocha
Jorge Teixeira