Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1716/15.2T8BGC.G1
Relator: MARIA DA PURIFICAÇÃO CARVALHO
Descritores: RECURSO
IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
REJEIÇÃO DO RECURSO
ERRO NA APRECIAÇÃO DAS PROVAS
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/26/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
1. O art.º 640.º do C.P.C. enumera os ónus que ficam a cargo do recorrente que pretenda impugnar a decisão da matéria de facto, sendo que a cominação para a inobservância do que aí se impõe é a rejeição do recurso quanto à parte afectada.

2. Ao impor tal artigo um ónus especial de alegação quando se pretenda impugnar a matéria de facto, com fundamento na reapreciação da prova gravada, o legislador pretendeu evitar que o impugnante se limite a atacar, de forma genérica e global, a decisão de facto, pedindo simplesmente a reapreciação de toda a prova produzida em primeira instância.

3. Ao cumprimento do ónus da indicação dos concretos meios probatórios não bastará somente identificar os intervenientes, efectuar uma apreciação do que possam ter dito ou impugnar de forma meramente genérica os factos em causa, devendo antes precisar-se, em primeiro lugar, detalhadamente cada um dos pontos da matéria de facto constante da decisão proferida colocados em crise, indicando-se depois, relativamente a cada um deles, as passagens concretas e determinadas dos depoimentos em que se funda a impugnação que impõem decisão diversa (e não que meramente a possibilitariam) e procurando-se localizar, ao menos de forma aproximada, o início e termo de tais passagens por referência aos suportes técnicos, conforme o preceituado no referido n.º4.

4. Se o recorrente não cumpre tais deveres, não é exigível ao Tribunal que aprecia o recurso que se lhe substitua e tudo reexamine, quando o que lhe é pedido é que sindique concretos erros de julgamento da peça recorrida que lhe sejam devidamente apontados com referência à prova e respectivos suportes.

5. O erro na apreciação das provas consiste em o tribunal ter dado como provado ou não provado determinado facto quando a conclusão deveria ter sido manifestamente contrária, seja por força de uma incongruência lógica, seja por ofender princípios ou leis científicas, nomeadamente das ciências da natureza e das ciências físicas ou contrariar princípios gerais da experiência comum (sendo em todos os casos o erro mesmo notório ou evidente), seja também quando a apreciação e valoração das provas produzidas apontarem num sentido diverso do acolhido pela decisão judicial mas excluindo este.

6. A procedência da impugnação pauliana depende da verificação dos requisitos discriminados no artº 610 do CC.

7. Não tendo ficado provada matéria fáctica concreta susceptível de integrar a verificação do requisito da má fé dos intervenientes – traduzido na consciência, por parte de todos os protagonistas do negócio jurídico oneroso, do prejuízo que esse acto causava ao credor –é incontroverso que a Autora não podia lograr êxito no recurso a este meio de conservação da garantia patrimonial que a lei lhe faculta, enquanto credor.
Decisão Texto Integral:
- Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães –

I. RELATÓRIO

A presente acção declarativa sob a forma de processo comum foi instaurada por LA, Sociedade Unipessoal, Lda. contra M. P., J. & V., Lda., deduzindo os seguintes pedidos:

- “Reconhecer que as Escrituras de Compra e Venda e Mútuo com Hipoteca e Fiança e Escritura de Justificação e Compra e Venda, outorgadas no 20/12/2010 no Cartório Notarial sito na Avenida …, em Bragança, tendo por objecto os prédios melhor identificados no artigo 1.º deste articulado, são ineficazes em relação à Autora;

- Condenados os Réus a reconhecer à Autora o direito à restituição de tais bens imóveis, na medida do seu interesse, isto é, no montante de 259.787,18 Euro e o direito de os executar para satisfação integral do seu crédito, acrescidos de juros vencidos e vincendos até integral e efectivo pagamento;

- Ordenar-se o cancelamento do Registo das Escrituras de Compra e Venda e Mútuo com Hipoteca e Fiança e Escritura de Justificação e Compra e Venda, outorgadas no 20/12/2010 no Cartório Notarial sito na Avenida …, em Bragança, tendo por objecto os prédios melhor identificados no artigo 1.º deste articulado e de eventuais registos que venham a ser efectuados sobre os mesmos”.

Para o efeito e em síntese, fez a alegação de factos tendentes a demonstrar que é titular de um direito de crédito sobre a sociedade Lar X, Lda., entretanto, extinta, mas representada, nos presentes autos pelos sócios liquidatários, M. P., sócia- gerente, e J., que não foi pago, em virtude de a Ré M. P. ter vendido à Ré J. V., Lda. um prédio que lhe pertencia e, outro, pertença da sociedade devedora, tendo as Rés impossibilitado, assim, a satisfação do seu crédito e agido com consciência de lhe causavam prejuízo.
Frustrada a citação pessoal do Réu J., foi citado o Ministério Público, que não apresentou contestação.

As Rés, regularmente citadas, apresentaram contestação, impugnando os factos articulados pela autora e, por excepção, invocaram a sua ilegitimidade, em razão de a acção não ter sido proposta também contra a sociedade Lar X, Lda., que fora a vendedora de um dos mencionados prédios; a ré M. P. invocou ainda a excepção de caducidade, alegando que a autora instaurou a presente acção já fora de prazo; e a Ré J. V., Lda., alegando factos tendentes a demonstrar que, ora, é titular do direito de propriedade sobre o prédio descrito no registo sob o n.º ... e inscrito na respectiva matriz sob o artigo ..., ora, a autora-reconvinda penhorou este prédio nos autos do processo de execução n.º 858/08.5TBBGC, que instaurara contra Lar X, Lda., deduziu reconvenção, pedindo que o seu direito de propriedade seja reconhecido e se ordene o levantamento da penhora.

Houve réplica, tendo a Autora-reconvinda pedido a condenação das Rés como litigantes de má fé em multa e pagamento de uma indemnização não inferior a trinta mil euros.

Realizaram-se as audiências, prévia – onde, em sede de despacho saneador, foram sanadas irregularidades e julgadas improcedentes as alegadas excepções de ilegitimidade e caducidade – e final, com observância das formalidades legais.
Seguiu-se a audiência de discussão e julgamento com a produção da prova admitida.

No final foi proferida sentença que terminou com o seguinte dispositivo:

Pelo exposto, julgo a acção improcedente, parcialmente procedente a reconvenção e prejudicado o pedido de levantamento da penhora, e, em consequência:

Absolvo o Réu e as Rés do pedido e, estas, do de litigância de má fé.

Descontente com a sentença apresenta a autora recurso que termina com as seguintes CONCLUSÕES:

1- As Autora/ Recorrente não se conforma com a douta decisão proferida em 20/10/2017, fundando tal discordância (i) quer no julgamento da matéria de facto efetuado pelo Ilustre Tribunal recorrido - impugnando-se, por conseguinte, a decisão de facto e tendo o presente recurso, também por objeto, a reapreciação da prova gravada -, (ii) quer no que diz respeito ao direito aplicado, por se entender que a douta sentença recorrida não fez a melhor interpretação e aplicação das normas jurídicas vigentes e pertinentes.

2- Quanto às nulidades da Sentença:

2.1- A Douta Sentença não fundamenta nem motiva a razão pela qual a Ré J. V., Lda. não agiu de má-fé;
Misteriosamente a Douta Sentença apenas refere em dois parágrafos “porquanto nenhum indício afluiu aos autos no que tivesse a consciência de que a compra dos prédios causasse prejuízo à Autora”.
Tratando-se…de actos onerosos, a impugnação só poderia proceder se tivesse havido má-fé por parte de todos os Réus incluindo o credor garantido…, pelo que, não se mostram preenchidos os requisitos legais da impugnação pauliana e, portanto, deverá a ação improceder”.
Tal facto, para além de estar em contradição com a matéria tida como provada, viola o disposto no artigo 615º, al. b) do C.P.C.
É, consequentemente, nula, a Sentença.

2.2- A Douta Sentença dá como provado nos pontos 12, 13, 14 e 20 dos factos provados que:
Os Réus M. P. e J. sabiam que o conteúdo da referida acta não estava em conformidade com a realidade, pois tinham perfeito conhecimento da referida ação executiva nº 858/08.5TBBGC”
“Tinham, ainda, conhecimento que a Sociedade Lar X, Lda. recebeu o valor de € 284 000, 00 pela venda do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º … e inscrito na respectiva matriz sob o n.º …”.
“Os Réus M. P. e J. venderam os prédios descritos em 2.º e 4.º, com intenção de fazerem desaparecer o património da sociedade e, desta forma, impedirem, como impediram, a satisfação do crédito por parte da Autora”.
“Os Réus M. P. e J. dissolveram a sociedade Lar X, Lda. com o intuito de prejudicar e lesar os interesses e satisfação integral do crédito da Autora”.
Espantosamente a Douta sentença não condena o Réu J. como tendo agido de má-fé, referindo “face ao comportamento do Réu J., porquanto apenas interveio na Assembleia de Dissolução da Sociedade Lar X, Lda. e não está demonstrado que com essa intenção tivesse causado prejuízos ao credor”.
Concluindo pela absolvição do Réu.
A conclusão da absolvição do Réu está, inequivocamente, em contradição com a matéria tida como provada, sendo mesmo absurda, violando, por conseguinte, o disposto no artigo 615º, nº 1 al. c) do N.C.P.C.
Sendo, consequentemente, nula a Sentença.

2.3- A Douta Sentença não se pronuncia quanto à prova testemunhal produzida em audiência de discussão e julgamento.
Não se pode, antes de tudo, deixar de questionar algum mistério que orienta a convicção do douto julgador no que tange à produção da prova, já que para a Douta Sentença só existiu uma ténue menção de um depoimento do Notário Manuel.
Todo o resto da prova testemunhal parede não ter existido.
Razão pela qual não se entende qual a motivação do Meritíssimo Juiz a quo para ditar a Douta Sentença recorrida, violando o disposto no artigo 607º, nº 4, do N.C.P.C. e consequentemente o artigo 615º, nº 1, al. b) do N.C.P.C.
Sendo, consequentemente, nula a Sentença.

2.4- A Douta Sentença não se pronuncia sobre o vertido nos artigos 115º, 124º e 125º da Petição Inicial, e que em nossa modesta opinião, era essencial apreciar, violando o disposto no artigo 615º, nº 1, al. d).
Sendo, consequentemente, nula a Douta Sentença.

3- Salvo o devido respeito, a recorrente considera incorretamente julgados os pontos da matéria de facto DADOS COMO PROVADOS SOB OS Nºs 17 e 18, os pontos a), b), c) e d) da matéria dos FACTOS DADOS COMO NÃO PROVADOS, e ainda os pontos a), b), c), d), e) e f) dos FACTOS DADOS COMO MATÉRIA CONCLUSIVA OU DE DIREITO NÃO CONSIDERADOS porquanto dos meios probatórios carreados para o processo teria que forçosamente resultar decisão diversa da recorrida.

4- Na verdade, na sequência da produção de prova, quer documental quer testemunhal, que ocorreu nos autos, os recorrentes consideram que, todos os factos por si alegados resultaram provados.

5- Com a sua petição inicial a Autora apresentou:

- Certidões das Finanças e Certidão do Registo Predial dos dois prédios juntos como documentos nºs 1, 2, 3 e 5 e donde se pode aferir as confrontações iniciais dos dois prédios e a alteração do artigo ... para ... urbano;
- Escritura de Compra e Venda no ano de 2005 do prédio ... ao Lar X, Lda., e junto como documento nº 4;
- Escritura de justificação e compra e venda de António a M. P., realizada no ano de 2004 do artigo ..., junto como documento nº6;
- Requerimento dirigido à Câmara da entrada do projeto de construção de um Lar de Idosos no artigo ..., juntos como documentos nºs 7, 8 e 9;
- Documento de emissão por parte da Câmara Municipal Y, Alvará de
construção, em nome de M. P., respeitante ao artigo ..., junto como documento nº 10;
- Constituição da Sociedade Lar X, Lda., junto como documento nº 11;
- Documento de Imposto Municipal do artigo ..., junto como documento nº 12;
- Certidão da Repartição de Finanças junta no processo da Câmara, onde se pode aferir que o referido artigo ... tinha inicialmente aquelas confrontações, junto como documento nº 13;
- Requerimento dirigido à Divisão do Urbanismo, onde a Ré M. P. pretende alterar o artigo onde se encontra a construir o referido Lar, passando segundo esta, o Lar a deixar de ser construído no ..., mas sim no ... e solicita alteração ao alvará de construção para aquele artigo novo ..., junto como documento nº 14;
- Requerimento dirigido à Repartição de Finanças no artigo ..., onde a Ré M. P. solicita a alteração da confrontação a poente com A. G. para caminho, junto como documento nº 15;
- Certidão das Finanças do artigo ... com a alteração das confrontações solicitadas pela Ré M. P., junto como documento nº 16;
- Alvarás de obras de construção substituídos do artigo ... para o artigo ..., como documento nº 17 e 18;
- Requerimento dirigido à Câmara Municipal pela Ré M. P. com as confrontações antigas, junto como documento nº 19;
- Auto de vistoria da Câmara Municipal, junto como documento nº 20;
- Planta de localização dos dois prédios, onde se vê que a área para construção era muito reduzida, junto como documento nº 21;
- Requerimento dirigido à Câmara Municipal pela Ré M. P. de um projeto de construção nova de um armazém de produtos agrícolas no artigo ... com as confrontações antigas, juntos como documentos nºs 22 e 23;
- Certidão das Finanças referente ao artigo ... com as confrontações originais verdadeiras, junto como documento nº 24;
- Escritura Pública de Justificação e Compra e Venda e Abertura de Crédito com Hipoteca e Fiança de venda do artigo ... à Ré J. V., Lda., pelo preço de 1.500,00€, junto como documento nº 25;
- Escritura de Compra e Venda e Mútuo com Hipoteca e Fiança do artigo ... que, entretanto, passou a ... urbano pelo preço de 284.000,00€ à Sociedade J. V., Lda., junto como documento nº 26;
- Certidão do processo executivo nº 858/08.5TBBGC e 1680/08.4TBBGC, em que a Autora é Exequente e em que é Executado o Lar X, Lda., juntos como documentos nºs 27 e 28;
- Acta de Dissolução e Extinção da Sociedade Lar X, Lda., e onde se declara o encerramento da liquidação por inexistência de ativo e passivo, junto como documento nº 29;
- Certidão do processo 500/07.1TBBGC que correu os seus termos pelo Tribunal Judicial de Bragança em que é Exequente António e Executado o Lar X, Lda. e onde a Executada se encontra em divida para com o Exequente no montante de 651.895,83€, junto como documento nº 30;
- Certidão de Registo Predial do prédio ... e registado sob o nº ..., de onde consta a penhora feita por António na sequência da ação executiva por ele instaurada contra o Lar X, no montante de 650.000,00€, junto como documento nº 31.
- Escritura de Justificação e Compra e Venda e Abertura de Crédito com Hipoteca do artigo ..., onde se mostra averbada a publicação da escritura de justificação no Jornal T nº ..., de 1 de Março de 2011, junto como documento nº32.
- Despacho no processo 858/08.5TBBBGGC, datado de 03/09/2015 que insinua a extinção da execução.
- Com a Réplica a Autora apresentou requerimento de reclamação de créditos apresentada pela Banco C no processo 858/08.5TBBGC onde esta diz que celebrou com a firma J. V. Lda. Escritura Pública de Justificação e Compra e Venda e Abertura de Crédito com Hipoteca e Fiança para garantia do seu crédito, no montante de 850.00,00€, refere, ainda, tal Instituição Bancária que “concedeu à firma aqui reclamada J. V. Lda. um empréstimo de 850.000,00€ (oitocentos e cinquenta mil euros) dos quais utilizou 650.000,00€ na mesma data, nos termos constantes da proposta de crédito de 2218201000569 a que corresponde o empréstimo nº 56050144493”, como documento nº 1 da Réplica, vide Petição Inicial, onde se verificam todos os actos praticados por todos os Réus com o intuito único de dissipar os bens de forma a não satisfazer o crédito da Autora.

6- Todos estes documentos confirmam e dão veracidade à versão dos Autores, e não deixam margem para dúvidas de que todos os Réus, em conluio, e com os actos praticados, quiseram prejudicar e lesar a Autora, que se viu impossibilitada de recuperar o seu crédito.

7- Da prova testemunhal da Autora, designadamente do depoimento do Arq. Ricardo que disse, com razão de ciência, que houve troca das confrontações dos prédios na construção das edificações, o que atesta que desde o início da construção existiu má-fé da Ré M. P. e do Réu J., vide gravação Sistema Citius 20170523110750_1402091_2870627, minuto 0:18:55 a 0:19:22 e minuto 0:37:14 a 0:37:29.

8- A testemunha João confirmou a existência do montante em dívida por parte dos Réus M. P. e J. à Autora, referindo que foi ele que ajudou a Autora a redigir as declarações que serviram de título executivo nas Execuções que correm os seus termos pelo Tribunal Judicial de Bragança, vide gravação Sistema Citius 20170523142934_1402091_2870627, minuto 0:02:00 a 0:02:10, minuto 0:06:28 a 0:06:48.

9- A testemunha Arq. Ricardo referiu no seu depoimento que construiu inicialmente no artigo ... o Lar e mais tarde quando foi adquirido o segundo terreno com o artigo ..., fez o projeto de uma capela, uma piscina e de um armazém que afinal é uma casa de habitação, o que demonstra a má-fé e o conluio entre todos os Réus na compra e venda dos dois prédios, uma vez que o artigo ..., que na verdade tem implantado um Lar de Idosos e não uma capela, uma piscina e uma casa de habitação, como quis fazer crer a Ré M. P. e o Réu J., tenha sido vendido pelo preço de 1.500,00€, vide gravação Sistema Citius 20170523110750_1402091_2870627, minuto 0:35:33 a 0:36:16, 0:48:17 a 0:49:11, 0:49:20 a 0:50:00, 0:50:28 a 0:51:25, 0:52:11 a 0:52:48, 0:54:01 a 0:54:07.

10- A testemunha L. T., arrolada pela Autora, também não tem dúvidas em referir e atestar que a Autora construiu as edificações implantadas nos dois prédios, nomeadamente o Lar, uma capela, uma piscina e uma vivenda, vide gravação Sistema Citius, 20170523163410_1402091_2870627, minuto 0:01:04 a 0:01:30.

11- A testemunha César, arrolada pela Autora, falou com razão de ciência, sobre a existência de jornais no concelho de Bragança, explicando que foi Diretor de um jornal e que esses jornais publicavam os anúncios das escrituras dos prédios sitos no concelho e no distrito, vide gravação Sistema Citius 20170523163410_1402091_2870627, minutos 0:02:48 a 0:03:30, 0:06:28 a 0:06:43

12- A testemunha César, a quem foi perguntado também, enquanto Diretor de um Jornal de Bragança sobre se alguma vez publicou um anúncio de uma escritura no seu jornal de Bragança de um prédio sito em Vila Real, referiu, com razão de ciência e sem titubear referiu que “nem pensar”, vide gravação Sistema Citius 20170523163410_1402091_2870627, minuto 0:07:56 a 0:08:08.

13- Também esta testemunha referiu, a instâncias do Meritíssimo Juiz a quo, perguntando-lhe – e se o Jornal T. fosse o mais lido – tendo, com firmeza afirmado, que ninguém lia o Jornal T. em Bragança, tendo o mesmo afirmado “que é um jornal sem expressão a nível distrital”, vide gravação Sistema Citius 20170523163410_1402091_2870627, minuto 0:08:19 a 0:08:34, minuto 0:08:41 a 0:08:41, minuto 0:12:09 a 0:12:18.

14- Do depoimento de parte da primeira Ré, nomeadamente do depoimento de M. P., resulta claramente e sem qualquer dúvida que a mesma, conjuntamente com o Réu J., atuaram com manifesta má-fé, com o intuito único de impossibilitar a credora de obter a satisfação integral do seu crédito e coadjuvada pela Ré J. V., Lda., vide gravação Sistema Citius 20170...114753_1402091_2870627, minuto 0:02:36 a 0:02:49.

15- Os Réus M. P. e J. perpetraram um enredo arrepiante de actos que terminou com a dissipação de todos os bens de que eram donos, conseguindo lograr a impossibilidade de a Autora poder ser ressarcida integralmente do seu crédito, vide gravação Sistema Citius 20170...114753_1402091_2870627, minuto 0:10:07 a 0:10:14, minuto 0:10:55 a 0:11:25, minuto 0:11:36 a 0:11:48.

16- Tudo isto não passa de inverdades, conforme documentos juntos sob os nºs 4, 6, 7, 8, 9, 10, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 22, 23 e 24 na Petição Inicial e que contrariam a versão dada pela Ré M. P., vide gravação Sistema Citius 20170...114753_1402091_2870627, minuto 0:14:14 a 0:16:40, minuto 0:21:11 a 0:22:39.

17- Para aquilatar da postura da Ré M. P. em todo este processo, imputa responsabilidades a todos, nomeadamente ao Arquiteto, ao Notário, referindo que todos os actos praticados foram responsabilidade destes e não dela própria, vide gravação Sistema Citius 20170...114753_1402091_2870627, minuto 0:22:43 a 0:26:32 e gravação 20170628103539_1402091_2870627, minuto 0:19:55 a 0:20:24, minuto 0:27:28 a 0:30:42.

18- Ainda para demonstrar a má-fé com que atuou a Ré M. P., declarou nada saber quanto à alteração do alvará de construção e quanto à alteração das confrontações dos prédios, existindo documentos juntos com a Petição Inicial que provam que foram assinados por esta nas referidas instituições, vide gravação Sistema Citius Gravação 20170628103539_1402091_2870627, minuto 0:05:35 a 0:08:09.

19- Do depoimento de parte da Ré M. P. resultou claro que o artigo ... tinha e tem implantado uma casa de habitação, o que demonstra o conluio existente entre todos os Réus em querer manifestamente dissipar o património do Lar e dos Réus no sentido de fazer com que a Autora não pudesse ver-se ressarcida do seu crédito, já que tal prédio com a referida edificação foi escriturado pelo montante de 1.500,00€, vide gravação Sistema Citius Gravação 20170628103539_1402091_2870627, minuto 0:09:15 a 0:09:39, minuto 0:10:02 a 0:10:12, minuto 0:10:18 a 0:10:37, minuto 0:11:16 a 0:11:50, minuto 0:20:30 a 0:20:32, minuto 0:23:46 a 0:24:10, minuto 0:24:39 a 0:24:44, minuto 0:24:46 a 0:25:31, minuto 0:26:38 a 0:24:44, minuto 0:27:02 a 0:27:17.

20- Mais uma vez no depoimento prestado pela depoente M. P. denuncia a má-fé e o conluio existente entre todos os Réus em todo este negócio e quanto aos valores do mesmo, tentando esconder o real valor do negócio que face também aos documentos juntos na PI, nomeadamente nos documentos nºs 25 e 26, refere expressamente a constituição de uma hipoteca por parte da Ré J. V.. Lda. dos referidos prédios, no montante de 850.000,00€, vide gravação Sistema Citius Gravação 20170628103539_1402091_2870627, minuto 0:31:02 a 0:32:42, minuto 0:34:29 a 0:35:29.

21- Ainda para provar a falsidade com que a atuou a depoente M. P., refere com despudor que ganhou as ações executivas em que foi Exequente a Autora e Executada a Sociedade Lar X, Lda., contrariando os documentos que existem nos autos, vide gravação Sistema Citius Gravação 20170628103539_1402091_2870627, minuto 0:38:57 a 0:39:57, minuto 0:41:00 a 0:41:29, gravação 20170...150756_1402091_2870627, minuto 0:00:28 a 0:01:55, minuto 0:02:19 a 0:07:59, minuto 0:08:38 a 0:10:32.

22- Para aquilatar, também, da atuação de má-fé dos Réus M. P. e J., os mesmos conseguiram astutamente simular uma dívida inexistente no montante de 650.000,00€ e que serviu de base a uma execução, a António com o intuito de posicionar tal penhora em primeiro lugar prejudicando claramente a Autora, vide gravação Sistema Citius Gravação 20170628103539_1402091_2870627, minuto 0:15:04 a 0:16:03, minuto 0:17:19 a 0:18:03, minuto 0:18:29 a 0:18:38, minuto 0:29:09 a 0:30:11, minuto 0:31:44 a 0:35:35.

23- Afirmou, ainda, a depoente M. P. que foi o Notário que tratou da publicação do anúncio e que foi ele que decidiu publicar o anúncio no Jornal T., mostrando, mais uma vez, a má-fé e a falsidade com que atuou a Ré M. P., vide gravação Sistema Citius Gravação 20170628103539_1402091_2870627, minuto 0:36:24 a 0:36:42.

24- Do depoimento de parte/declarações de parte da terceira Ré, nomeadamente do depoimento do Bruno., resulta por demais evidente que a Ré J. V.. Lda. atuou com manifesta má-fé, com conhecimento de todo o negócio que envolveu a venda dos prédios, sabendo a existência da dívida dos primeiros Réus à Autora e com intuito único de prejudicar a Autora e que envolveu a diminuição da garantia patrimonial do crédito da Autora.

25- No seu depoimento, quanto à matéria da publicação do anúncio referente à escritura de Justificação e Compra e Venda, referiu que não foi ele que tratou de nada, vide gravação Sistema Citius 20170523110750_1402091_2870627, minuto 0:37:30 a 0:38:19 e 0:40:34 a 0:41:33.

26- Instado sobre se adquiriu um crédito da mesma instituição financeira que detinha as duas hipotecas, ou seja, a hipoteca contraída pela Ré M. P. e a hipoteca contraída posteriormente pela Ré Sociedade J. V., Lda., referiu que sim, vide gravação Sistema Citius 20170523110750_1402091_2870627, minutos 0:27:22 a 0:27:32 e 0:38:51 a 0:39:02.

27- O que leva a concluir que a Ré J. V., Lda. soube de todo o negócio e que tal negócio se deu também com o intuito de prejudicar a Autora.

28- Quanto ao valor do negócio, referiu que entregou à Sociedade o montante de 130.000,00€ em dois cheques, um de 80.000,00€ e outro de 50.000,00€ e que a Ré M. P. lhe pediu que os cheques não fossem à ordem de ninguém, o que revela o conluio entre todos os Réus para esconder o negócio e para que não existisse rasto do montante que fazia parte da venda, vide gravação Sistema Citius 20170523110750_1402091_2870627, minutos 0:39:04 a 0:40:01.

29- Com o depoimento de parte de Bruno., conheceu-se a sua versão sobre o montante global do negócio que em nada corresponde ao montante mencionado nas escrituras referentes aos dois prédios, afirmando este que o negócio global foi de 600.000,00€, vide gravação Sistema Citius 20170523110750_1402091_2870627, minutos 0:41:46 a 0:42:35, 0:44:30 a 0:53:19 e 0:56:42 a 1:00:25.

30- Do depoimento de parte do Bruno., resultou também que o negócio desta natureza e com tão avultados montantes se deu entre Outubro de 2010 e Dezembro de 2010, o que revela também o conluio entre todos os Réus com o intuito único de prejudicar e dissipar os bens dos Réus M. P. e J. de forma a que a Autora não pudesse obter a satisfação integral do seu crédito, conforme se infere do depoimento do mesmo, vide gravação Sistema Citius 20170523110750_1402091_2870627, minuto 0:10:36 a 0:11:16 e 0:11:52 a 0:12:22

31- Para atestar da má-fé com que atuou a Ré J. V., Lda. e para aquilatar do conhecimento do negócio, já que a Sociedade J. V., Lda. era cliente do banco que detinha ambas as hipotecas referentes à primeira Ré e posteriormente a que foi feita com a venda dos prédios à terceira Ré, vide gravação Sistema Citius 20170523110750_1402091_2870627, minuto 0:12:58 a 0:14:10

32 - E para que dúvidas não restem sobre a má – fé de todos os Réus, junta-se agora, por ser facto novo, de que a Autora só nesta data foi notificada, o documento emitido pela Banco C que comprova o montante da transferência realizada pela J. e V., Lda., para a Sociedade Lar X, Lda. em 21/12/2010, no dia a seguir à outorga das escrituras, de 367.845.12 Euro – Cf. documento que junta, nos termos do artigo 425º do N. C. P.C., por ser facto sob o nº 1 e que aqui se dá por integrado e reproduzido para todos os efeitos legais.

33- A testemunha da Ré J. V., Lda., C. N., foi fundamental e relevante para alicerçar a tese da Autora quanto à atuação de má-fé da Ré J. V., Lda., com o único intuito de ajudar a dissipar os bens dos primeiros Réus e a impossibilitar para a Autora a obtenção da satisfação integral do seu crédito.

34- Afirmou que o marido, sócio-gerente da Ré J. V., Lda., começou a sua atividade em 2009 com uma empresa de apoio domiciliário, vide gravação Sistema Citius 20170524152810_1402091_2870627, minutos 0:11:46 a 0:12:00.

35- Afirmou, ainda, e confirmou a referida testemunha, que o valor global do negócio foi de 600 mil euros, contrariando o que ficou definido nas escrituras de justificação e compra e venda, vide gravação Sistema Citius 20170524152810_1402091_2870627, minutos 0:13:03 a 0:13:47 e documentos 25 e 26 da P.I.

36- Confirmando, ainda, o valor da hipoteca dos dois prédios no montante de 850 mil euros, vide gravação Sistema Citius 20170524152810_1402091_2870627, minutos 0:17:02 a 0:17:20.

37- Referiu, ainda, que aos primeiros Réus lhe foram passados dois cheques, um no montante de 50.000,00€ e outro no montante de 80.000,00€, vide gravação Sistema Citius 20170524152810_1402091_2870627, minutos 0:17:42 a 0:18:02.

38- Do depoimento da referida testemunha, resulta ainda claro que o negócio de tão avultado montante foi pensado e concluído em três meses, o que revela, mais uma vez, a atuação de má-fé da Ré J. V., Lda. que sabia de tal negócio prejudicava a Autora, vide gravação Sistema Citius 20170524152810_1402091_2870627, minutos 0:22:07 a 0:23:59.

39- Referiu, ainda, que o valor do empréstimo foi de 850 mil euros, o que atesta, uma vez mais, a atuação de má-fé da Ré J. V., Lda., vide gravação Sistema Citius 20170524152810_1402091_2870627, minutos 0:33:54 a 0:34:07.

40- Para aquilatar, ainda, da atuação da má-fé da Ré Sociedade J. V., Lda., a testemunha da Ré demonstra que os valores que constam da escritura em nada têm que ver com o negócio perpetrado por todos os Réus, vide gravação Sistema Citius 20170524152810_1402091_2870627, minutos 0:36:00 a 0:38:45, 0:39:11 a 0:39:31.

41- Para, ainda, atestar da má-fé com que atuou a Ré Sociedade J. V., Lda. quanto ao negócio, a testemunha refere, que não foi feito nenhum outro papel para além das escrituras onde constasse o valor de 600 mil euros e que englobou o Lar, a capela, a casa e uma piscina, vide gravação Sistema Citius 20170524152810_1402091_2870627, minutos 0:43:01 a 0:43:47.

42- Com o depoimento da referida testemunha da Ré Sociedade J. V., Lda., ficou percecionado que a Ré J. V., Lda. bem sabia que os Réus M. P. e J. estavam com dívidas e que queriam rapidamente vender os referidos prédios, vide gravação Sistema Citius 20170524152810_1402091_2870627, minutos 0:44:25 a 0:47:52.

43- A referida testemunha e mulher do sócio-gerente da Ré da Sociedade J. V., Lda., tentou esconder a atividade profissional anterior do sócio-gerente da Ré, tentando dar a entender que o mesmo nada sabia sobre a área da gerontologia, fazendo crer que nada sabia sobre este negócio e que tudo foi fruto da casualidade, mostrando, mais uma vez, a má-fé da Ré Sociedade J. V., Lda., vide gravação Sistema Citius 20170524152810_1402091_2870627, minutos 0:49:45 a 0:50:47.

44- Finalmente, e para aquilatar do conluio de todos os Réus no referido negócio, bem sabendo a Ré J. V., Lda. que tal negócio poderia pôr em causa o crédito da Autora, a testemunha C. N. demonstra no seu depoimento a pouca preocupação e desinteresse na aquisição do Lar de Idosos, com o fim último de ajudar os primeiros Réus a dissipar os únicos bens de que eram proprietários, fugindo assim ao pagamento do crédito da Autora, vide gravação Sistema Citius 20170524152810_1402091_2870627, minutos 0:52:43 a 0:52:55.

45- Por último, a testemunha da Ré J. V., Lda., Manuel, Notário, referiu, com razão de ciência, que não foi ele que escolheu o jornal onde se publicou o anúncio, que quem escolheu o jornal foram os compradores, o que demonstra, mais uma vez, a atuação de má-fé da Ré J. V., Lda., vide gravação Sistema Citius 20170628102825_1402091_2870627, minutos 0:03:49 a 0:04:39 e 0:04:12 a 0:04:37.

46- Salvo o devido respeito, com base nos depoimentos das testemunhas arroladas pela Autora supra elencados, que foram críveis, sérios e com plena razão de ciência, a decisão sobre a matéria de facto dada como provada teria que ser forçosamente outra.

47- Mesmo a testemunha da Ré J. V., Lda., C. N., e o depoimento de parte da Ré J. V., Lda., que procuraram eximir a Ré J. V., Lda. da má-fé, acabaram por confirmar a versão da Autora.

48- Quanto aos pontos 1 e 2 dos factos provados, impunha-se uma decisão completamente contrária, já que ficou provado que à data da celebração da escritura e da publicação da mesma existiam dois jornais do concelho da situação do prédio, ou seja, na cidade de Bragança, o “N” e o “M”.

49- Motiva o Juiz a quo a sua convicção no depoimento do Exm. Notário e testemunha Manuel referindo que “lavrou a escritura e procedeu à sua publicação, asseverou que a escolha do periódico e a sua publicação obedeceram a critérios de lisura e independência dentro dos cânones que orientam o estabelecimento notarial, o que torna inócua as afirmações vertidas nos artigos 115º, 124º, 125º e 17º da petição…”

50- E que mesmo assim foi feita tal escritura no jornal “T”.

51- Do depoimento da testemunha Manuel, Notário, ficou claro que tal publicação no referido jornal não foi escolha sua, mas sim dos compradores, ou seja, da Ré Sociedade J. V., Lda.

52- Dando-se, assim, como provado que a Ré J. V., Lda. quis esconder o negócio, bem sabendo que tal negócio prejudicava a Autora, atuando, assim, de manifesta má-fé.

53- O Juiz a quo assentou a sua convicção no depoimento do Notário Dr. Manuel, deu como provados aqueles factos, mas decidiu em sentido completamente contrário.

54- Deste modo, os pontos 1 e 2 dos factos provados implicavam decisão diversa, devendo dar-se como provado que a Ré J. V., Lda. atuou de má-fé e em conluio com a Ré M. P. e o Réu J..

55- Pois, assim, resultou dos depoimentos das testemunhas arroladas e dos documentos juntos pelos Autores.

56- Por outro lado, devia quanto aos factos dados como não provados, considerar-se provados uma vez que:

57- Resulta dos depoimentos supra mencionados que todos os Réus sabiam que no prédio referente à escritura existia uma edificação com valor de mercado superior a 450 mil euros e que todos os Réus quiseram, em conluio, esconder o negócio, pelo que este facto teria obrigatoriamente que ser dado como provado.

58- Resulta, também, dos depoimentos supra mencionados e dos documentos juntos aos autos que na escritura pública junta sob o nº 26, a 1ª e 2º Réus em conluio com a 3º Ré, declararam na escritura pública o valor de 284.000,00 (Duzentos e Oitenta e Quatro Mil Euros), tendo a Ré J. V., Lda. contraído na mesma escritura um empréstimo à Banco C no montante de 850.000.00 € (Oitocentos e Cinquenta Mil Euros), devendo dar-se como provado tal facto.

59- Por outro lado, como foi referido nos depoimentos das testemunhas, e como se atesta dos documentos juntos, a Ré M. P. juntou naquelas Instituições Públicas, nomeadamente Finanças e Câmara Municipal, documentos falsos, alterando confrontações, fazendo crer que os prédios tinham outras confrontações que não as verdadeiras, falseando documentos, pelo que deve tal facto ser dado como provado.

60- Pelos documentos juntos e pelas regras da experiência e pelo procedimento formal do processo executivo, a Exma. Solicitadora de Execução dos processos executivos, tentou saber para onde havia ido o montante recebido por força dos contratos de compra e venda e justificação dos referidos prédios, pelo que tal facto deveria ter sido dado como provado.

61- Ainda, por outro lado, devia quanto aos factos dados como matéria conclusiva ou de direito não considerados, considerar-se provados uma vez que:

62- Dos depoimentos supra mencionados é evidente que ao ter sido extinta a sociedade Lar X, Lda. e ao terem sido vendidos os prédios, não existe qualquer outro bem que possa satisfazer o crédito da Autora.

63- O documento junto com a Réplica justifica, de per si, o perigo da extinção da execução.

64- Só a penhora e a venda judicial dos prédios ora em questão poderão garantir o pagamento dos créditos reclamados.

65- Pelo depoimento das testemunhas e pelos documentos juntos aos autos ficou claramente provado que todos os Réus agiram de má-fé, pretendendo com os actos praticados causar à credora sérios prejuízos, porque bem sabiam os Réus que com a compra e venda dos prédios, a Autora não lograria a garantia do seu crédito.

66- Sendo assim, face à prova testemunhal e documental supra referidos, bem como às regras da lógica quanto aos factos em questão, sempre a decisão da matéria de facto havia de ser diversa da recorrida.

67- E perante esta alteração da matéria de facto provada, não provada e da matéria conclusiva ou de direito não considerados, analisando os factos provados e não provados e a matéria conclusiva ou de direito não considerados, sempre a decisão do Tribunal recorrido teria que ser diversa, sob pena de violação da lei.

68- Em consequência, deverá dar-se como provada e procedente a ação deduzida pela Autora, douta decisão que se impõe, também, por via do disposto nos artºs 610º e 612º do Código Civil.

69- Tendo sido violado, também, o artº 607º, nº 3, 4 e 5, e o artigo 615º, nº 1, al. b), c) e d), todos do CPC. Sem prescindir,

70- Ainda que não seja modificada a decisão sobre a matéria de facto, o que não se aceita, sempre a decisão de mérito teria de ser diferente.

71- De forma resumida, a pretensão que a Autora levou ao Tribunal a quo resume-se a invocar que:

- a Autora possuía um crédito sobre os primeiros Réus no montante total de 210.000,00€ (duzentos e dez mil euros) a que acresceram os respetivos juros no montante total de 259.787,18€ (duzentos e cinquenta e nove mil setecentos e oitenta e sete euros e dezoito cêntimos);

- que tal crédito foi peticionado em duas ações executivas que correm os seus termos pelo 2º Juízo da Comarca de Bragança sob o nºs, respetivamente, 858/08.5TBBGC e 1680/08.4TBBGC;

- tais execuções foram intentadas no ano de 2008;

- na execução referente ao processo 858/08.5TBBGC que correu os seus termos pelo 2º Juízo do tribunal da Comarca de Bragança, já foi proferida Sentença quanto aos embargos, tendo os embargos sido declarados totalmente improcedentes;

- já após a última sessão da audiência de discussão e julgamento deste processo (Impugnação Pauliana), que terminou no dia 28/06/2017, foi proferida, em 10/07/2017, no processo 1680/08.4TBBGC-A, que correu os seus termos pelo Tribunal Judicial da Comarca de Bragança (oposição à execução comum), Sentença, na qual se diz “julgo extinta a presente instância” – Cf. documento que se junta, nos termos do artigo 425º do N. C. P.C., por ser facto novo, sob o nº 2 e que aqui se dá por integrado e reproduzido para todos os efeitos legais.

- acontece que, em 20/12/2010, os primeiros Réus, ainda na qualidade - a primeira Ré de sócia-gerente e o segundo Réu de sócio, da Sociedade Lar X, Lda.- venderam à terceira Ré o único prédio de que era proprietária a referida sociedade, ou seja, artigo ... que passou a prédio urbano com a inscrição sob o nº ... e descrição sob o nº ... e onde estava “supostamente” implantado um lar de idosos, pelo preço de 284.000,00€ (duzentos e oitenta e quatro mil euros);

- os primeiros Réus, venderam, ainda, à terceira Ré J. V., Lda. o prédio ..., propriedade da primeira Ré e que é contiguo ao prédio ..., pelo preço de 1.500,00€, onde está implantado uma capela, uma piscina e uma casa de habitação, a que chamaram armazém;

- tais vendas aconteceram com a indiscutível intenção de prejudicar a Autora;

- nas duas referidas escrituras, a Ré J. V., Lda. contraiu um empréstimo à Banco C no montante de 850.000,00€, o que demonstra a falsidade do preço da venda dos dois prédios nas referidas escrituras;

- a escritura de justificação e compra e venda que obedecia à publicação do anúncio anterior ao registo, referente ao prédio ..., foi realizada no jornal “T” de Mirandela, pela Ré J. V., Lda. e em 1 de Março de 2011, com o intuito único de esconder tal venda, já que existem na cidade de Bragança dois jornais, onde tal publicação deveria obrigatoriamente ter sido feita, uma vez que o prédio pertence ao concelho de Bragança;

- no dia 23/12/2010, três dias após as escrituras de compra e venda e de justificação e compra e venda, os primeiros Réus dissolveram e extinguiram a referida sociedade declarando o encerramento da liquidação da sociedade, por inexistência de ativo e passivo;

- todos estes atos onerosos foram praticados com manifesta má-fé por todos os Réus em conluio que resultou num ato de impossibilidade de a Autora poder satisfazer o seu crédito.

72- Antes de mais, os presentes autos pretendem que o Tribunal verifique se os pressupostos da impugnação pauliana foram ou não verificados.

73- A Autora pretendeu com a presente ação a possibilidade da satisfação integral do seu crédito, ao abrigo do disposto nos artigos 610º, 611º e 612º do Código Civil.

74- Salvo o devido respeito, discorda-se da aplicação que a Douta Sentença recorrida fez do normativo e jurisprudência quanto ao caso em apreço, porquanto, na situação em concreto, tal aplicação não se enquadra, e conduz à violação do conteúdo dos artigos 610º, 611º e 612º do Código Civil, já que tal decisão é completamente contrária à realidade dos factos, não tendo sido cumpridos, em nossa modesta opinião, os mais elementares princípios de justiça.

75- A aplicação das normas contidas nos artigos 610º, 611º e 612º do Código Civil não podia servir para afastar a decisão da totalidade do peticionado pela Autora.

76- O Tribunal tinha e devia decidir que todos os Réus atuaram de manifesta má-fé, porque, em manifesto conluio, impediram a satisfação integral do crédito da Autora.

77- A Autora, como de resto resulta da lei, alegou e provou a má-fé de todos os Réus.

78- Mesmo que assim não se pensasse, verifica-se que a Douta Sentença não se debruçou de uma forma exaustiva e cuidadosa sobre as questões levadas a juízo, nomeadamente a má-fé da Sociedade J. V., Lda., do conluio entre todos os Réus na dissipação dos bens, com o único intuito de impossibilitar a Autora da satisfação integral do seu crédito, bem como na má-fé do Réu J. que nos factos dados como provados refere que o mesmo teve a intenção de fazer desaparecer o património da sociedade e desta forma impedir, como impediu a satisfação do crédito por parte da Autora, tendo depois decidido quanto a este em sentido contrário

79- Não se compreende que conste da Douta Sentença que “nenhuma das partes contestou ou discutiu o direito de propriedade da Ré/Reconvinte…”.

80- Ora, a Autora, na Réplica, invocou, além do mais, que “as Rés M. P. e Sociedade J. V. Lda. não tendem a conseguir em seu benefício o mesmo efeito jurídico que a Autora se propõe obter”.

81- Tendo, ainda, referido que “deverá a reconvenção ser liminarmente indeferida e não admitida por não cumprir o disposto no artigo 266º, nº 2, al. d), do Código de Processo Civil.

82- Tendo violado, a Douta Sentença, o referido no artigo 266º, nº 2, al. d), do Código de Processo Civil.

83- A douta sentença entendeu, ainda, quanto à litigância de má-fé, que todos os Réus “fizeram defesa abnegada da sua causa, sempre num contexto de probidade, cooperação e boa fé, pelo que não podem ser condenados como litigantes de má-fé”.

84- Quanto a esta matéria, entende-se que a Douta sentença não poderia ter decidido como o fez, por violação do fixado no artigo 542º do Código de Processo Civil, uma vez que todos os Réus praticaram atos, como ficou demonstrado, que obrigatoriamente deveriam levar à condenação dos mesmos.

85- Salvo o devido respeito, a Douta Sentença decide em completo afastamento do objeto de litígio e dos temas de prova, ignorando o verdadeiro foco dos presentes autos.

86- A Douta Sentença, ao decidir como o fez, violou os artigos 610º, 611º e 612º do Código Civil e o artigo 542º e 266º, nº 2, al. d) do Código de Processo Civil.

87- Pelo que, deverá o Tribunal “ad quem” decidir quanto à matéria de mérito em contrário do que foi decidido.

88 - Em face do que foi acima alegado, a Douta Sentença, violou o disposto, nos artigos 266º, nº 2, al. d), 542º, 607º nºs 3,4 e 5, 615º, nº 1, al. b), c) e d) todos do Código de Processo Civil, o disposto nos artigos 610º, 611º, e 612º do Código Civil e, ainda, os dispostos nos artigos 100º, nº2, 101º, e 131º, nº 1, al. c) do Código do Notariado.

Por estes fundamentos, e invocando o douto suprimento de Vossas Excelências, pretende a Autora que seja dado provimento à sua apelação, revogando-se a douta decisão recorrida e, conseguintemente:

a) Declararem-se procedentes os pedidos da Autora;
b) Declararem-se improcedentes os pedidos dos reconvintes.
Ou, caso assim não seja entendido, deve a douta sentença ser declarada nula.

J. V., LDA., Ré nos autos à margem referenciados apresenta contra-alegações nas quais pugna para que seja negado provimento ao recurso mantendo-se a douta sentença proferida, assim se fazendo a já costumeira e sã JUSTIÇA!

Recurso que foi recebido como de o qual é de apelação, com subida nos próprios autos e efeito meramente devolutivo (ex. vi artigos 629.º, n.º 1, 631.º, n.º 1, 637.º, 638.º, números 1 e 7, 641.º, números 1 e 2, 642.º, 644.º, n.º 1, alínea a), 645.º, n.º 1, alínea a), e 647.º, n.º 1, do Código de Processo Civil).

As questões a resolver, partindo das conclusões formuladas pelos apelantes, como impõem os artºs. 635º, nº 4, e 639º, nºs 1 e 2, do C.P.Civ, serão as seguintes:

- nulidades da sentença:
- Erro na apreciação da prova e assim na decisão da matéria de facto e como questão prévia: observância por parte do recorrente do ónus de alegação e especificação a que alude o artigo 640º do CPC e em caso negativo, consequente rejeição de tal reapreciação;
- Erro na aplicação do direito, como consequência da pugnada alteração da decisão da matéria de facto;
- Saber se se a solução jurídica deve ser alterada nos termos pedidos pela recorrente.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
*

II. FUNDAMENTAÇÃO

OS Factos:

O Tribunal recorrido deu como provada e não provada a seguinte factualidade:

1.º - Em 12 de Maio de 2005, a Autora M. P. e o Réu J. constituíram, por Escritura Pública, a Sociedade Lar X, Lda.
2.º - O prédio rústico composto por pastagem, inscrito na matriz predial sob o artigo ... e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º ..., adveio à propriedade da Ré M. P., por o haver adquirido, no ano de 2004, por Escritura de Justificação e Compra e Venda, ao seu anterior proprietário António.
3.º - No dia 21 de Junho de 2005, M. P., na qualidade de Gerente e em representação da Sociedade Comercial por quotas Lar X, Lda., comprou, por Escritura de Compra e Venda, a António, o prédio rústico, composto de pastagem, sito em …, Freguesia de ..., Concelho de Bragança, descrito na Conservatória do Registo Predial, sob o n.º ..., da Freguesia de ... e inscrito na matriz respectiva sob o artigo ..., contíguo ao artigo ....
4.º - O prédio rústico, composto de pastagem, sito em ..., Freguesia de ..., inscrito na matriz predial sob o artigo ... e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º ..., passou, entretanto, a prédio urbano, composto por prédio em propriedade total, sem andares nem divisões, sito em ..., Freguesia de ..., Concelho de Bragança, inscrito na matriz predial sob o n.º ... e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º ...
5.º - Por escritura pública outorgada em 20-12-2010, no Cartório Notarial de Bragança - Dr. Manuel, a Ré M. P., vendeu à Ré J. e V., Lda., pelo preço de € 1 500, 00, o prédio rústico, composto por pastagem, inscrito na matriz predial sob o artigo ... e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º ...;
6.º - No dia 20 de Dezembro de 2010, a Ré M. P., na qualidade de Sócia e única Gerente da Sociedade Lar X, Lda., celebrou uma escritura de compra e venda e mútuo com hipoteca e fiança, tendo vendido, pelo preço de € 284 000, 00 (duzentos e oitenta e quatro mil euros) à Ré J. e V., Lda. o prédio urbano, composto de Edifício de Rés-do-Chão e logradouro, sito em “...”, Freguesia de ..., Concelho de Bragança, descrito na Conservatória do Registo Predial deste Concelho sob o nº ... e inscrito na respectiva matriz sob o artigo ....
7.º - No âmbito da sua actividade, a Autora LA, Sociedade Unipessoal, Lda., procedeu à execução das obras de construção das edificações, nomeadamente, lar de idosos, casa de habitação, capela e piscina, nos prédios identificados em 2.º e 3.º.
8.º - Na sequência da falta de pagamento das referidas obras e edificações, por parte da sociedade Lar X, Lda. à Sociedade LA, Sociedade Unipessoal, Lda., esta é credora da importância de € 210 000, 00 (duzentos e dez mil euros), acrescida dos respectivos juros moratórios vencidos e vincendos até integral e efectivo pagamento.
9.º - No dia 23 de Dezembro de 2010, os Réus M. P. e J., na qualidade de Sócios da Sociedade Lar X, Lda. “reuniram em Assembleia Geral os Sócios da empresa, sob a Presidência da sócia M. P., com a seguinte ordem de trabalhos:

“1º. Dissolução da Sociedade;
2º- Aprovação das contas e do balanço do exercício final, reportadas à data da dissolução com declaração de liquidação simultânea da Sociedade, por inexistência de activo e passivo.
10º- Na acta de dissolução, liquidação e extinção da sociedade, a Ré M. P. na qualidade de Presidente, afirmou nela e ficou a constar:

- “… em virtude da sociedade na presente data, já não ter qualquer ativo nem passivo se encontra em condições de poder ser dada como liquidada, conforme tudo decorria da contabilidade social.

Nestes termos, propôs que fossem aprovados os documentos prestação de contas e balanço do exercício final, reportadas à data da dissolução e reconhecida a inexistência de activo e passivo, ficando os livros e demais escrituração comercial da sociedade confiados à guarda da Sócia Gerente M. P., a qual seria encarregada de proceder aos respectivos actos de registo comercial, escolhendo o procedimento administrativo de extinção imediata da sociedade”.

11.º - Consta, ainda, da referida acta que “a sócia concordou que os documentos em apreciação eram do seu perfeito conhecimento, pelo que dispensou a sua leitura e outras formalidades.

Postas à votação, foram aprovadas, por unanimidade as contas e o respectivo balanço de exercício final assim como a declaração de encerramento da liquidação, por inexistência de activo e passivo, tendo a Sócia Gerente M. P., sido nomeada depositária da escrituração comercial e designada para formalizar os actos de registo comercial”.

12.º - Os Réus M. P. e J. sabiam que o conteúdo da referida acta não estava em conformidade com a realidade, pois tinham perfeito conhecimento da referida acção executiva n.º 858/08.5TBBGC.

13.º - Tinham, ainda, conhecimento que a Sociedade Lar X, Lda. recebeu o valor de € 284 000, 00 pela venda do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º ... e inscrito na respectiva matriz sob o n.º ....

14.º - Os Réus M. P. e J. venderam os prédios descritos em 2.º e 4.º, com intenção de fazerem desaparecer o património da sociedade e, desta forma, impedirem, como impediram, a satisfação do crédito por parte da Autora.

15.º - Na acção executiva 858/08.5TBBGC, a Autora, no dia 22-12-2010, penhorou o prédio inscrito na matriz predial sob o artigo n.º ..., descrito na Conservatória do Registo Predial, sob o n.º .../20100122, e pela Ap. 2934 de 2010/12/22, inscreveu a penhora no registo.

16.º - A aquisição referida em 5.º está inscrita, pela Ap. 32 de 2011/04/05, na descrição n.º .../20100112, freguesia de ..., da Conservatória do Registo Predial.

17.º - A publicação da Escritura de Justificação e Compra e Venda e Abertura de Crédito com Hipoteca e Fiança foi feita no Jornal “T” de Mirandela, n.º ..., de 01 de Março de 2011.

18.º - À data, existiam dois jornais no concelho da situação do prédio, nomeadamente, o “N” e o “M.

19.º - Na Escritura mencionada em 6.º, a Ré M. P. declara que sobre o referido prédio existia uma penhora em que era exequente António, e o mesmo declara autorizar a extinção da instância executiva, em virtude de se encontrar integralmente pago e nada mais ter a exigir da exequente.

20.º - Os Réus M. P. e J. dissolveram a sociedade Lar X, Lda. com o intuito de prejudicar e lesar os interesses e satisfação integral do crédito da Autora.
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Não se provaram outros factos

O Direito:

A) VÍCIOS DA SENTENÇA

Nulidades da sentença

A recorrente aponta à sentença as nulidades previstas nas alíneas b); c) e d) do artº 615º do CPC.

Vejamos.
No despacho que admitiu o recurso, o juiz do tribunal “a quo” não se pronunciou sobre as nulidades da sentença, nos termos do art. 617º/1 CPC.

Atenta a simplicidade das questões suscitadas e face aos elementos que constam dos autos, não se mostra indispensável ordenar a baixa dos autos para a apreciação das nulidades, nos termos do art. 617º/5 CPC, passando-se a conhecer desde já das mesmas.
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Alínea b) do artº 615/1

Nos termos do artigo 154º, nº1, do CPC «as decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas».
Esse dever de fundamentação tem consagração constitucional (205º nº 1, CRP), constituindo a manifestação do direito a um processo equitativo (artigo 20º, nº4 do CRP e artigo da DUDH).
Como a propósito escreve A. dos Reis, «uma decisão vale, sob o ponto de vista doutrinal, o que valerem os seus fundamentos» (Comentário, II-pág. 172), «uma decisão sem fundamentos equivale a uma conclusão sem premissas; é uma peça sem base» (CPC anotado, volume V, pág. 139).
Isto é assim dado que uma das funções essenciais de toda e qualquer decisão judicial é convencer os interessados do bom fundamento da decisão. A exigência de motivação da decisão destina-se a permitir que o juiz ou juízes convençam os terceiros da correcção da sua decisão. Através da fundamentação, o juiz ou juízes devem passar de convencidos a convincentes.
Compreende-se facilmente este dever de fundamentação, pois que os fundamentos da decisão constituem um momento essencial não só para a sua interpretação – mas também para o seu controlo pelas partes da acção e pelos tribunais de recurso
A motivação constitui, pois, a um tempo, um instrumento de ponderação e legitimação da decisão judicial e, nos casos em que seja admissível – como sucede na espécie sujeita - de garantia do direito ao recurso.

Por sua vez, a falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão acarreta a nulidade desta – artºs 613º, nº3 e 615, nº1, al. b) do CPC – ainda que se entenda que só a falta absoluta de fundamentação traduz tal vício.

De efeito, como é sabido, constitui entendimento dominante na doutrina e na jurisprudência que tal nulidade apenas se verifica quando haja falta absoluta, ausência total de fundamentação de facto e de direito que justificam a decisão -o sublinhado é nosso- e não quando a fundamentação seja simplesmente deficiente, incompleta, medíocre ou mesmo errada, pois neste caso afecta apenas o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a tão só ao risco de ser revogada ou alterada em sede de recurso, mas não produz nulidade (cf. Prof. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, pág. 140 e Prof. Lebre de Freiras, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2º, pág. 707; acórdãos do STJ de 21/12/2005, proc. nº. 05B2287 e de 19/09/2006, proc. nº. 06A2230; acórdãos da RE de 8/04/2014, proc. nº. 1166/13.5TBABT-C e de 19/06/2014, proc. nº. 70/09.6TBMMN, todos acessíveis em www.dgsi.pt).

Relativamente à fundamentação de facto, só a falta de concretização dos factos provados que servem de base à decisão, permite que seja arguida a nulidade da sentença.

Quanto à fundamentação de direito, o julgador não tem de analisar, um por um, todos os argumentos ou razões jurídicas invocadas pelas partes em abono das suas posições, embora lhe incumba resolver todas as questões por elas suscitadas; não se lhe impõe, por outro lado, que indique cada uma das disposições legais em que se baseia a decisão – nesta parte, a fundamentação da sentença contenta-se com a indicação das razões jurídicas que servem de apoio à solução adoptada pelo julgador (cf. Pais do Amaral, Direito Processual Civil, 11ª ed., Agosto de 2013, Almedina, pág. 399 e Juiz Conselheiro Francisco Manuel Ferreira de Almeida, Direito Processual Civil, Vol. II, Abril de 2015, Almedina, pág. 369 e 370).

Sindicando o caso concreto, temos de convir que a sentença recorrida apresenta os fundamentos de facto e de direito que conduziram à decisão.

Com efeito, é nela existente a factualidade que serviu de suporte à decisão supra exposta, o fundamento da decisão de facto (ver fls. 487 a 490 da sentença) e aos factos apurados e apontados pelas partes nos articulados identifica e interpreta as normas jurídicas aplicáveis e determina os eventuais efeitos jurídicos.

Em concreto, como bem refere a recorrida/contra alegante o Tribunal de 1.ª Instância justificou na motivação da sua convicção fundamentada cada um dos factos provados, discriminando a matéria alegada e os respetivos meios de prova que conduziram àquela conclusão.
Se o Mmo Juiz a quo mais nenhuma referência fez aos depoimentos das restantes testemunhas tal só quer significar que daqueles depoimentos nada resultou de relevante para a boa decisão da causa, não tendo, por isso, o tribunal valorado os mesmos.
Ou seja, inexiste absoluta falta de fundamentação a justificar a procedência da nulidade prevista na alínea b) do artº 615º do C.P.C.
**
Alínea c) do artº 615º

Decorre do disposto no art.º 615.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil que a sentença é nula quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão, ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.
Trata-se – como os demais enunciados nesta disposição legal - de um vício de natureza formal e não substancial.

Explica, a este propósito, Pais do Amaral In Direito Processual Civil, 11ª Edição, Almedina, 2013, pág. 400 que "(...) a sentença tem de ser entendida pelos destinatários. Doutro modo, de nada lhes servirá.

Por isso, a sentença tem de ser clara, de forma que na sua interpretação se não hesite entre dois sentidos e se conheça claramente o seu alcance."
No caso em apreciação, a sentença especificou quais os factos provados e não provados e fundamentou a sua convicção quanto a aos factos provados, nos termos do disposto no artigo 607.º do C.P. Civ.
Sequencialmente, analisou a matéria de facto à luz das pretensões das partes, concluindo pela decisão final.

Porém tendo sido dada como provado nos pontos 12, 13, 14 e 20 dos factos provados que:

Os Réus M. P. e J. sabiam que o conteúdo da referida acta não estava em conformidade com a realidade, pois tinham perfeito conhecimento da referida ação executiva nº 858/08.5TBBGC”

“Tinham, ainda, conhecimento que a Sociedade Lar X, Lda. recebeu o valor de € 284 000, 00 pela venda do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º ... e inscrito na respectiva matriz sob o n.º ...”.

“Os Réus M. P. e J. venderam os prédios descritos em 2.º e 4.º, com intenção de fazerem desaparecer o património da sociedade e, desta forma, impedirem, como impediram, a satisfação do crédito por parte da Autora”.

“Os Réus M. P. e J. dissolveram a sociedade Lar X, Lda. com o intuito de prejudicar e lesar os interesses e satisfação integral do crédito da Autora”.

É contraditório como afirma a recorrente concluir que “a mesma conclusão – de que a ré M. P. agiu de má fé )- não pode obter-se face ao comportamento do Réu J., porquanto apenas interveio na Assembleia de Dissolução da Sociedade Lar X, Lda. e não está demonstrado que com essa intenção tivesse causado prejuízos ao credor”.

Todavia tendo a sentença concluído que não se provou o conluio de todos os réus considerando os requisitos legalmente exigidos para a procedência da acção de impugnação pauliana que a seguir se vão analisar a única solução possível seria a improcedência da acção com a consequente absolvição dos réus dos pedidos.

Pelo que a contradição em causa em nada releva para o desfecho da acção.

Não se verifica também na decisão qualquer vício de raciocínio que tenha levado a uma decisão em sentido oposto àquele que deveria ter sido, atenta a matéria de facto dada como provada.

Também não se verifica qualquer ambiguidade que torne a sentença ininteligível.
O que está em causa poderá ser um erro de apreciação, mas nunca a referenciada nulidade da sentença.
**
Alínea d) do artº 615/1

Nos termos do disposto no art. 615º, nº 1, al. d), do CPC, é nula a sentença quando deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar ou que conheça de questões de que não podia tomar conhecimento, nulidade esta que se prende com o disposto no art. 608º, nº 2, do mesmo diploma, de harmonia com o qual o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação – principio do dispositivo - e não podendo ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.

Integra esta nulidade a omissão do conhecimento (total ou parcial) do pedido, da causa de pedir ou excepção cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão, não se confundindo, porém, questões com razões, argumentos ou motivos invocados pelas partes para sustentarem e fazerem vingar as suas posições.

Portanto, a omissão de pronúncia equivale ao não conhecimento de questões, é o silêncio sobre questão que o tribunal devia conhecer.
Como refere o Prof. José Alberto dos Reis (in CPC Anotado, Vol. V, Coimbra Editora, pág. 143), “são, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para a sua pretensão”.

Assim, não enferma de nulidade a sentença que não se ocupou de todas as considerações feitas pelas partes, por o tribunal as reputar desnecessárias para a decisão do pleito (cf. Pais do Amaral, ob. cit., pág. 400 e 401 e Juiz Conselheiro Francisco Manuel Ferreira de Almeida, ob. cit., pág. 371).

Para a apreciação desta questão importa ainda realçar que a nulidade da decisão por omissão de pronúncia é questão diversa do desacordo da apelante quanto aos termos em que a decisão tenha sido proferida.

Na medida em que em causa esteja esta discordância, então em causa estará antes o erro de julgamento a ser apreciado em sede própria.

Reportando-nos ao caso “sub judice”, também nesta parte não assiste razão à recorrente uma vez que a sentença resolveu todas as questões que as partes apresentaram à sua apreciação inclusive pronunciou -se quanto ao vertido nos artigos 115º, 124º e 125º da pi.

De efeito na motivação da sua convicção referente aos factos 17 e 18 dados como provados, referiu “o notário que lavrou a escritura e procedeu à sua publicação, asseverou que a escolha do periódico e a publicação obedeceram a critérios de lisura e independência, dentro dos cânones que orientam o estabelecimento notarial, o que torna inócua as afirmações vertidas nos artigos 115.º, 124.º, 125.º e 17.º da petição;”.

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B) IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO

Dissente a Apelante/Autora da decisão da matéria de facto nos termos descritos nas conclusões supra transcritas.

Apreciando

O art.º 640.º do C.P.C. enumera os ónus que ficam a cargo do recorrente que pretenda impugnar a decisão da matéria de facto, sendo que a cominação para a inobservância do que aí se impõe é a rejeição do recurso quanto à parte afectada.

Assim é que deverá o recorrente enunciar os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados (alínea a) do n.º 1), requisito essencial já que delimita o poder de cognição do tribunal ad quem, se a decisão incluir factos de que se não possa conhecer ex. officio e se estiverem em causa direitos livremente disponíveis. Deve ainda o recorrente indicar os meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida (alínea b) do n.º 1), assim como apresentar o seu projecto de decisão, ou seja, expor, claramente, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas (alínea c) do n.º 1).

Os requisitos acima enunciados impedem “que a impugnação da decisão da matéria de facto se transforme numa mera manifestação de inconsequente inconformismo” - Abrantes Geraldes, ob. cit., in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 3ª ed., pág. 139 a 141.
A Apelante, no corpo das alegações e nas conclusões não cumpriu com todos os ónus que aquele dispositivo legal impõe, quer os enunciados nas três alíneas do n.º 1, quer o da alínea a) do n.º 2.

De efeito:

. Impugna no relevante para a versão que defende toda a factualidade que foi dada como não provada pretendendo que em vez de improcedente se julgue os seus pedidos totalmente procedentes, como claramente resulta da conclusão 4ª. (1)
Sabemos que o preceituado no citado artº em conjugação com o que se dispõe no artº 662º do mesmo diploma legal permite a este Tribunal de instância julgar a matéria de facto.
Porém ao impor um ónus especial de alegação quando se pretenda impugnar a matéria de facto, com fundamento na reapreciação da prova gravada, o legislador pretendeu evitar que o impugnante se limite a atacar, de forma genérica e global, a decisão de facto, pedindo simplesmente a reapreciação de toda a prova produzida em primeira instância- neste sentido Acórdão do STJ proferido no processo nº 471/10. T1 CSSC.L1. S1 com data de 09.02.2017. e António Abrantes Geraldes, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 3ª ed., 2016, Almedina, pág. 124.

. Não especifica os concretos meios probatórios.

Em concreto não efectuou – quer na motivação quer nas conclusões- qualquer correspondência directa de cada factualidade posta em crise com cada um dos meios de prova.
Ora é sabido que ao cumprimento do ónus supra descrito não bastará somente identificar os intervenientes, efectuar uma apreciação do que possam ter dito ou impugnar de forma meramente genérica os factos em causa, devendo antes precisar-se, em primeiro lugar, detalhadamente cada um dos pontos da matéria de facto constante da decisão proferida colocados em crise, indicando-se depois, relativamente a cada um deles, as passagens concretas e determinadas dos depoimentos em que se funda a impugnação que impõem decisão diversa (e não que meramente a possibilitariam) e procurando-se localizar, ao menos de forma aproximada, o início e termo de tais passagens por referência aos suportes técnicos, conforme o preceituado no referido n.º4.
E, se o recorrente não cumpre tais deveres, não é exigível ao Tribunal que aprecia o recurso que se lhe substitua e tudo reexamine, quando o que lhe é pedido é que sindique concretos erros de julgamento da peça recorrida que lhe sejam devidamente apontados com referência à prova e respectivos suportes.

. Não aponta em concreto qualquer erro de julgamento, limitando-se a fazer a sua interpretação dos documentos juntos aos autos e dos depoimentos de testemunhas que o Tribunal não relevou.

Porém o erro na apreciação das provas consiste em o tribunal ter dado como provado ou não provado determinado facto quando a conclusão deveria ter sido manifestamente contrária, seja por força de uma incongruência lógica, seja por ofender princípios ou leis científicas, nomeadamente das ciências da natureza e das ciências físicas ou contrariar princípios gerais da experiência comum (sendo em todos os casos o erro mesmo notório ou evidente), seja também quando a apreciação e valoração das provas produzidas apontarem num sentido diverso do acolhido pela decisão judicial mas excluindo este.
Não basta, pois, que as provas permitam, dentro da liberdade de apreciação das mesmas (como parece pretender a recorrente), uma conclusão diferente, a decisão diversa a que aludem os art.°s 640 nº 1 al. b) e 662° n° 1 do CPC, terá que ser única ou, no mínimo, com elevada probabilidade e não apenas uma dos possíveis dentro da liberdade de julgamento.
No caso concreto, considerando a interpretação da recorrente admitiriam as provas por ela indicada decisão diferente, é certo, mas isso seria insuficiente para lograr aquele efeito já que a lei só permite a alteração da decisão da matéria de facto caso as provas imponham essa alteração. Pelo que então se imporia confirmar aquela decisão.
Assim, considerando que as alegações da Recorrente não satisfazem as mencionadas exigências legais, sendo que quanto ao recurso da matéria de facto não existe despacho de aperfeiçoamento ao contrário do que sucede quanto ao recurso em matéria de direito, por aplicação do disposto no art. 639º, nº 3 do C.P.C, nos termos expostos, rejeita-se o recurso no que se refere à impugnação da decisão que fixou a matéria de facto provada e não provada.
A salientar que como é pacífico, a circunstância de o recurso ter sido oportunamente admitido, por despacho singular, aquando do exame preliminar do Relator, sem que então se tenha detectado imediatamente dúvida acerca do conteúdo do seu objecto, não obsta a que este Tribunal, ora decidindo em colectivo, entenda não dever dele conhecer, pois aquele despacho, não forma caso julgado quanto à regularidade e admissibilidade do recurso, conforme resulta dos artigos 641º, nº 5, 652º, nºs 3 e 5 e 658º, nº 1, todos do CPC.
Não obstante, e acautelando entendimento mais abrangente do citado preceito sempre se dirá que, revisitados (todos) os depoimentos produzidos em audiência, vista e analisada a prova documental a nossa convicção não difere da manifestada pelo Tribunal a quo na fundamentação da decisão de facto, no segmento em que os aprecia.

Concretizando esta afirmação.
A impugnação da decisão sobre a matéria de facto é efectuada com fundamento nas declarações de parte, documentos e prova testemunhal indicada
Nos termos do artigo 655º, n.º 1, do Código de Processo Civil, o tribunal aprecia livremente as provas produzidas, decidindo o Juiz segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto.
Tal preceito consagra o princípio da prova livre, o que significa que a prova produzida em audiência (seja a prova testemunhal ou outra) é apreciada pelo julgador segundo a sua experiência, tendo em consideração a sua vivência da vida e do mundo que o rodeia.
De acordo com Alberto dos Reis prova livre “quer dizer prova apreciada pelo julgador segundo a sua experiência, sem subordinação a regras ou critérios formais preestabelecidos, isto é, ditados pela lei” (Código de Processo Civil, anotado, vol. IV, pág. 570).
Também temos de ter em linha de conta que o julgador deve “tomar em consideração todas as provas produzidas” (art.º 515º do Código de Processo Civil), ou seja, a prova deve ser apreciada na sua globalidade.
No que se reporta ao valor probatório das declarações de parte dispõe a lei que o tribunal aprecia livremente as declarações das partes, salvo se as mesmas constituírem confissão (art. 466º, nº 3, do CPC).
As declarações de parte produzidas nestes autos só por si não comprovam a alegação por si produzida. Como é fácil de compreender. Como propugna, com toda a evidência e razoabilidade, L. Freitas (em A Ação Declarativa Comum, à Luz do CPC de 2013), pág. 278, e nota 11 a pág. 259/260) tal declaração de parte só relevará sobretudo como elemento de clarificação do resultado das provas produzidas (e, quando outros não haja, como prova subsidiária, máxime se ambas as partes tiverem sido ouvidas).

Este tribunal poderá sempre controlar a convicção do julgador na primeira instância quando se mostre ser contrária às regras da experiência, da lógica e dos conhecimentos científicos. Para além disso, admitido que é o duplo grau de jurisdição em termos de matéria de facto, o tribunal de recurso poderá sempre sindicar a formação da convicção do juiz ou seja o processo lógico. Porém, o tribunal de recurso encontra-se impedido de controlar tal processo lógico no segmento em que a prova produzida na primeira instância escapa ao seu controle porquanto foi relevante o funcionamento do princípio da imediação.

Tudo isto, sem prejuízo, como acima já referido, de o Tribunal de recurso, adquirir diferente (e própria) convicção (sendo este o papel do Tribunal da Relação, ao reapreciar a matéria de facto e não apenas o de um mero controle formal da motivação efectuada em 1.ª instância – cf. Acórdão do STJ, de 22 de Fevereiro de 2011, in CJ, STJ, ano XIX, tomo I/2011, a pág. 76 e sgs. e de 30/05/2013, Processo 253/05.7.TBBRG.G1. S1, in http://www.dgsi.pt/jstj.

Animados por estes princípios é a seguinte a nossa apreciação:

I. Conclusões 5 e 6º

Trata-se da indicação de todos os documentos juntos.
Documentos que tal como os demais reportados a peças processuais foram devidamente apreciados pelo Tribunal conforme melhor consta da motivação da decisão de facto.
A salientar que os documentos de prova livre, não formal ou vinculada (como acontece com a prova plena), e porque impugnados pela defesa a sua simples análise, desacompanhada de outra prova, não impõe de modo irrefutável a demonstração de factos diversos dos que foram dados como provados ou a modificação da matéria tida como não provada.
Ou seja, o conjunto de documentos em si mesmo, sem a sua conexão ou reforço por outras provas, revela-se insuficiente para formar a convicção do tribunal no sentido pedido pela recorrente.
**
II. Conclusões 7ª, 9ª, 10, ª18ª, 19ª e 59ª:

Trata-se como bem se refere na sentença (2) de factualidade que não tem interesse para a boa decisão da causa.

E na medida em que os recursos visam, por via da modificação de decisão antes proferida reapreciar a pretensão dos recorrentes por forma a validar o juízo de existência ou inexistência do direito reclamado, temos igualmente de concluir que a reapreciação da matéria de facto está limitada ao efeito útil que da mesma possa provir para os autos, em função do objeto processual delineado pelas partes e assim já antes submetido a apreciação pelo tribunal a quo [vide neste sentido Acs. deste TRG de 12/07/2016, Relator Jorge Seabra e de 15/12/2016, Relatora Maria João Matos, ambos in www.dgsi.pt/jtrg ].

É neste último pressuposto (do efeito útil) que claudica a pretensão da recorrente – como justificaremos - e impõe como tal a improcedência do pedido de inclusão ou alteração de factualidade nos factos provados por via da reapreciação da prova produzida, por este tribunal.

Na verdade, mesmo a dar-se como provada a factualidade em causa sempre a pretensão da recorrente seria improcedente caso se mantenha a demais factualidade provada e não provada.
**
III. Conclusões 14, 15, 16,17,18, 19, 21, 22,23,

Reportam-se a factualidade que foi dada como provada e consta dos f. P. nº 12 a 14 e 19 a 20.
**
IV- As demais conclusões reportadas à actuação da recorrida J. V., Lda. descrita na conclusão 24º - atuou com manifesta má-fé, com conhecimento de todo o negócio que envolveu a venda dos prédios, sabendo a existência da dívida dos primeiros Réus à Autora e com intuito único de prejudicar a Autora e que envolveu a diminuição da garantia patrimonial do crédito da Autora.

Salvo o devido respeito as alegações escritas da recorrente que são na parte relevante “cópia” das alegações orais efectuadas em sede de audiência de julgamento leva este tribunal a secundar a observação da Exª Mandatária da 3ª ré que começa as suas alegações orais referindo que parece ter ouvido prova diferente da que ouviu a colega que representa a autora.

Também este Tribunal ouviu “prova diferente” da referida pela recorrente nas suas alegações no que se reporta à actuação da terceira ré no negócio em debate.

Analisemos a prova para este efeito indicada pela recorrente:

▪. Documentos enunciados na conclusão 5.

Dos muitos documentos juntos relevantes são apenas os referidos na sentença e valorados.
Se a autora intenta uma acção pauliana pedindo a ineficácia do negócio é porque aceita a sua validade- como bem se salienta na decisão recorrida. Logo e nos termos supra escritos todos os documentos referentes a momentos anteriores à celebração do negócio e nos quais a recorrida J. V. não teve qualquer intervenção são irrelevantes.

▪. Depoimentos do arquitecto Ricardo e da testemunha João referenciados nas conclusões 7ª e 8ª.

Acerca das confrontações e suas rectificações ouvimos o Arquitecto Ricardo dizer após visualizar o doc. nº 15 junto com a p.i que “Não se recorda de se ter falado em fazer uma rectificação do artigo. Isto faz-se porque por vezes as confrontações estão erradas outras vezes é para ser possível a edificação. Neste caso não sei para que foi esta rectificação. Se calhar deslocaram as confrontações para permitir a construção. Mas eu não sei o que fizeram. Poderá não corresponder à verdade as confrontações depois de deslocadas. Mas sendo os terrenos do mesmo proprietários ele coloca os marcos aonde quiser.

Ao contrário do afirmado pela recorrente não apresentou outra razão de ciência para este depoimento que não seja a ora apontada.

Não explica também a recorrente como se consegue chegar á conclusão de que a troca das confrontações alegadamente efectuadas pelos primeiros réus numa altura em que não interveio em nada a sociedade ré denuncia má fé desta.

A testemunha João em concreto nada sabia, muito menos o valor em divida, ao ponto do Sr, Juiz lhe apontar falta de memória.

Referiu ser compadre do Sr. LA que era o sócio gerente na altura da autora, pessoa que desabafava com ele. Em concreto só sabe ter feito as declarações juntas como doc, nº 27 e 28 não sabendo os valores em causa a que se reportavam. Não sabia o valor em divida, referindo estar em causa muito dinheiro, não saber ao certo acabando por acrescentar após muitas insistências mesmo com indicações numéricas da Ex mandatária da autora que ouviu falar estar em divida de cerca de 200 mil euros.

▪. Publicação do Anúncio – conclusões 23º e sgs.

No que se reporta aos pontos 17 e 18 dos F.P e não 1. e 2 como por lapso se refere a recorrente na conclusão 48 ouvimos a ré M. P. referir aquando do depoimento de parte que foi ela quem pagou a publicação em causa, tendo entregue € 70,00 para o efeito, e que terá sido o funcionário do Cartório a tratar da publicação, tendo cabido a este último, inclusivamente, a escolha do jornal em causa.

O gerente da sociedade/recorrida disse, nas suas declarações, que não tratou de qualquer formalidade relacionada com as escrituras, tendo sido peremptório ao afirmar que não tratou de qualquer publicação, não mandou fazer qualquer publicação e não pagou qualquer publicação, não tendo sido sequer questionado acerca desse assunto.

Depoimento este que foi confirmado pelo Dr. Manuel, Notário que para além do que consta da decisão final no referente á escolha do jornal referiu a pedido de esclarecimento da Ex. mandatária da recorrida que a publicitação no jornal é solicitada pela parte que justifica o facto (neste caso, a R. M. P.) e que todas as formalidades são tratadas pelo Cartório Notarial.

Á pergunta se: O comprador não tem nada a ver com a escritura de justificação? Respondeu com toda a clareza: Não.”

Esclareceu também que às vezes quando justificam e vendem no mesmo ato, entre justificante e comprador até combinam qual é o jornal... Mas eu aqui não acho. Que eles nem saberiam destes factos de que era preciso justificar... Eu tenho ideia que o comprador, na altura quando se falou nesta justificação, até ficou admirado por que é que se ia fazer este ato. Julgavam que estava tudo registado. Tenho uma ideia, porque esta segunda escritura foi enxertada assim um bocado sobre a hora porque o facto...aquele prédio não estaria registado na Conservatória. Tenho ideia de que terá sido isso. Mas normalmente quem justifica é que dá ordens para a publicação sair no jornal onde ------. É essa a regra.

Como nota final afirmou que Este foi um acto notarial que tinha de praticar como praticava qualquer notário. É um acto que qualquer notário praticaria.

Por fim não encontramos qualquer documento que comprove qualquer intervenção da sociedade recorrida na autoria da publicação impugnada.

▪. Preço do negócio

Se há factualidade em que existe mais acordo na prova testemunhal é sobre o valor deste negócio confirmada também em documentos.

Quer a ré M. P. quer o gerente da sociedade ré quer a sua mulher a testemunha C. N. de forma clara, explicativa e coincidente disseram que o preço total do negócio foi de 600 mil euros, sendo que este valor englobava todos os bens móveis, imóveis e o negócio.

Valor que segundo esta prova foi pago da seguinte forma: a Sociedade Recorrida entregou à Ré M. P. dois cheques, no valor total de € 130.000,00 e assumiu o pagamento das penhoras e hipotecas que incidiam sobre o prédio, aquelas num montante global de cerca de € 105.000,00 e esta num montante de aproximadamente € 365.000,00.

Para concretizar este negócio a compradora contraiu um empréstimo de € 850.000,00 no Banco C.

Valor este que terá sido gasto da seguinte forma: € 600.000,00 serviram para pagar o negócio, € 50.000,00 foram usados para pagar impostos, comissões e servir de apoio a uma fase inicial do negócio, tendo os restantes € 200.000,00 sido pedidos para a realização de obras na parte de baixo do Lar, o que ainda não foi levado a cabo até à presente data, pelo que dinheiro ainda nem sequer foi utilizado.

Relatou e esclareceu ainda o gerente da sociedade ré que os valores que constam da escritura foram fixados por apelo aos valores patrimoniais à data das escrituras (ao prédio urbano, que tinha um valor patrimonial tributário de € 283.860,00, foi atribuído o valor para venda de € 284.000,00, e ao prédio rústico, que tinha um valor patrimonial tributário de € 95,20, foi atribuído o valor para venda de € 1.500,00), conforme resulta do teor das escrituras juntas aos autos, visando-se assim uma otimização fiscal conforme afirma a Exª Mandatária em sede de recurso.

Embora não seja legal todos sabemos que corresponde á realidade de muitos dos negócios similares. Realidade esta que mereceu o seguinte comentário do Srº Juiz:. As pessoas fazem isto para fugir aos impostos. Isto é um arranjo.

E que o preço de 600 mil euros terá sido ajustado disse-o a testemunha Ricardo, arquitecto que respondendo ao Sr Juiz acerca do valor daquilo tudo apontou tudo cerca de 550 mil euros.

Quanto ao facto de a entidade bancária ser comum a comprador e vendedor nada vemos de anormal ou indicador do que quer que seja sendo usual assim acontecer até por facilidade de concretização dos negócios.

Ouvimos ainda Bruno, indicado como gerente da sociedade ré, bem como a testemunha C. N., e mulher daquele, explicarem com detalhe – sobretudo a testemunha Bruno que foi quem liderou as negociações e de forma espontânea, a forma como se deu o negócio bem como o tempo da sua negociação e concretização , ambos dizendo que era um projecto profissional que ambicionavam porque ligados à área quer a nível dos cursos que tiraram quer a nível das profissões que exerciam – Bruno licenciado em educação física e acção social e que se dedicava profissionalmente ao apoio social sem alojamento; a mulher licenciada em Psicologia e gerontologia edirectoria técnica numa instituição que distava 60 km/h de Bragança- e que lhes permitia ficar próximo do filho recém nascido para o qual não tinham apoio familiar pois não são naturais da região. Por estas razões procuraram este negócio que concretizaram por ser um bom negócio e no tempo necessário uma vez que a licença de maternidade da testemunha C. N. terminava em Dezembro de 2010.

Mais afirmaram que a sociedade ré, à data da celebração do negócio e das escrituras em causa, desconhecia, em absoluto, a existência de qualquer dívida (ou açcão judicial pendente) para além das que estavam devidamente identificadas nas certidões da Conservatória do Registo predial e nas escrituras celebradas, relativas aos prédios em causa.

Bruno e a testemunha C. N. e mesmo do Dr. Manuel, Notário, contaram que a preocupação da sociedade recorrida foi a de pagar as dívidas existentes, tendo efectuado o pagamento de todas as dívidas que estavam na base das penhoras que constavam das certidões do Registo Predial, tendo sido esses pagamentos contabilizados para efeito do negócio.

A confirmar estas versões temos os últimos documentos juntos aos autos quer pela autora quer pela ré de onde resulta que se é certo que existe uma transferência realizada pela sociedade ré para a sociedade Lar X, Lda. em 21.12.2010, de €367.845,12 - ver fls. 592 a 594 dos autos-também existe uma nota de lançamento com a mesma data do Banco C relativa à amortização/liquidação do empréstimo da sociedade Lar X, Lda., conforme melhor consta do documento junto a fls.991 a 993 dos autos.

Perante esta prova considera-se correcta a afirmação que o Mmo. Juiz a quo fez plasmar na sentença em crise que “nenhum indício afluiu aos autos de que (a sociedade J. V., Lda.”) tivesse a consciência de que a compra dos prédios causasse prejuízo à autora.

Acresce dizer que se é certo que da matéria de facto considerada como provada devem constar todos os factos alegados pelas partes, decisivos para a viabilidade ou procedência da acção/reconvenção ou da defesa e que mereçam um juízo de valoração positiva do tribunal face à prova produzida também é certo que da matéria de facto não devem constar conclusões.

Bem andou assim o Tribunal em não incluir na decisão de facto a matéria conclusiva a matéria alegada nos artigos 68.º, 69.º, 73.º, 74.º, 75.º, 76.º, 82.º, 88.º, 93.º, 94.º, 96.º (salvo a já referida alegação do crédito), 102.º, 105.º, 106.º, 107.º, 108.º, 109.º, 110.º, 111.º, 112.º, 113.º, 114.º, 116.º, 119.º, 121.º, 126.º, 127.º, 128.º, 131.º, 132.º, 133.º, 134.º, 135.º, 136.º, 137.º, 138.º e 139.º da petição inicial.
Conclui-se, pois, que compulsada a prova produzida, tendo em conta as regras do ónus da prova, e conjugando toda a prova produzida não podem restar dúvidas que a matéria de facto deve manter-se inalterada, confirmando-se a análise crítica efectuada pelo Tribunal de Primeira Instância quanto a essa factualidade.
Em consequência, improcede a apelação nesta parte.
***
●. Da aplicação do Direito

Finalmente, importa verificar se, independentemente de não se ter procedido à alteração da matéria de facto no sentido propugnado pela Recorrente deve manter-se a apreciação de mérito efectuada pela Decisão Recorrida, em face da matéria de facto dada como provada.
Ora, ponderando essa questão, é evidente que, não existindo qualquer modificação na matéria de facto considerada provada, nenhuma crítica pode ser apontada à decisão de mérito proferida pelo Tribunal de Primeira Instância, já que aí bem se ponderou o ónus de prova que recaía sobre a Autora e que a mesma manifestamente não logrou cumprir (art. 342º, nº 1 do CC).

Na verdade, pode-se aqui manter na íntegra a fundamentação de direito que o Tribunal de Primeira Instância desenvolveu na sentença que proferiu.

Rematando esta decisão diremos apenas que o exercício da impugnação pauliana depende da verificação dos requisitos discriminados no artº 610 do CC, requisitos esses explicados na decisão recorrida.

Ora, como emerge da factualidade dada como provada, a Autora/Recorrente não logrou provar – como lhe competia, nos termos do art. 342º, nº 1 do CC – a existência de má fé na actuação dos terceiros adquirentes (a sociedade /ré), sendo certo que o contrato de compra e venda é um negócio jurídico oneroso, como emerge do art. 879º do CC.

Por conseguinte, não tendo ficado provada matéria fáctica concreta susceptível de integrar a verificação do apontado requisito – traduzido na consciência, por parte de todos os protagonistas do negócio jurídico oneroso, do prejuízo que esse acto causava ao credor – de que depende o funcionamento do instituto da impugnação pauliana, é incontroverso que a Autora não podia lograr êxito no recurso a este meio de conservação da garantia patrimonial que a lei lhe faculta, enquanto credor.
Razão por que a sua pretensão estava, como está, irremediavelmente votada ao insucesso, impondo-se, pois, que se mantenham de pé o questionado contrato.

Contrato pelo qual a sociedade /ré/recorrida adquiriu o prédio urbano, composto de Edifício de Rés-do-Chão e logradouro, sito em “...”, Freguesia de ..., Concelho de Bragança, descrito na Conservatória do Registo Predial deste Concelho sob o nº ... e inscrito na respectiva matriz sob o artigo ....

Goza também esta sociedade da presunção de registo prevista no artº 7 do C.R Predial, presunção de que o direito existe e lhe pertence, pelo que bem andou o tribunal recorrido em lhe reconhecer o direito de propriedade peticionado.

Não vemos que a recorrente tenha apresentado recurso:

- Do despacho de admissão da reconvenção proferido em 14.12.2016. Pelo contrário no requerimento de interposição do recurso em apreciação afirma a recorrente não se conformar com a sentença proferida- ver fls. 502 destes autos.
- Bem como da parte da decisão recorrida que reconhece á sociedade recorrida o direito de propriedade pedido em sede reconvencional.
Aliás nos termos já afirmados se a autora intenta uma acção de impugnação pauliana pedindo a ineficácia do negócio é porque aceita a existência do negócio.
No que se refere à condenação como litigante de má fé confunde a recorrente os pressupostos da aplicação de tal figura como requisito da procedência da acção de impugnação pauliana com as exigências legais para a verificação da má fé processual.
Acerca desta questão concorda-se com a apreciação que foi efectuada pela decisão recorrida, nada mais se tendo a acrescentar.
Nesta conformidade, e sem necessidade de mais alongadas considerações, porque se concorda com a fundamentação de direito aduzida pelo Tribunal de Primeira Instância, decide-se manter integralmente a decisão proferida.
Improcede, também, nesta parte o Recurso interposto.
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●. Das custas

É critério para atribuição do encargo das custas o da sucumbência e na respectiva proporção (artigo 527º, nºs 1 e 2, do código de processo).
Na hipótese o encargo das custas é, no total, vínculo da apelante.
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SUMÁRIO (artigo 663º n º7 do Código do Processo Civil):

●. O art.º 640.º do C.P.C. enumera os ónus que ficam a cargo do recorrente que pretenda impugnar a decisão da matéria de facto, sendo que a cominação para a inobservância do que aí se impõe é a rejeição do recurso quanto à parte afectada.
●. Ao impor tal artigo um ónus especial de alegação quando se pretenda impugnar a matéria de facto, com fundamento na reapreciação da prova gravada, o legislador pretendeu evitar que o impugnante se limite a atacar, de forma genérica e global, a decisão de facto, pedindo simplesmente a reapreciação de toda a prova produzida em primeira instância.
●. Ao cumprimento do ónus da indicação dos concretos meios probatórios não bastará somente identificar os intervenientes, efectuar uma apreciação do que possam ter dito ou impugnar de forma meramente genérica os factos em causa, devendo antes precisar-se, em primeiro lugar, detalhadamente cada um dos pontos da matéria de facto constante da decisão proferida colocados em crise, indicando-se depois, relativamente a cada um deles, as passagens concretas e determinadas dos depoimentos em que se funda a impugnação que impõem decisão diversa (e não que meramente a possibilitariam) e procurando-se localizar, ao menos de forma aproximada, o início e termo de tais passagens por referência aos suportes técnicos, conforme o preceituado no referido n.º4.
●. Se o recorrente não cumpre tais deveres, não é exigível ao Tribunal que aprecia o recurso que se lhe substitua e tudo reexamine, quando o que lhe é pedido é que sindique concretos erros de julgamento da peça recorrida que lhe sejam devidamente apontados com referência à prova e respectivos suportes.
●. O erro na apreciação das provas consiste em o tribunal ter dado como provado ou não provado determinado facto quando a conclusão deveria ter sido manifestamente contrária, seja por força de uma incongruência lógica, seja por ofender princípios ou leis científicas, nomeadamente das ciências da natureza e das ciências físicas ou contrariar princípios gerais da experiência comum (sendo em todos os casos o erro mesmo notório ou evidente), seja também quando a apreciação e valoração das provas produzidas apontarem num sentido diverso do acolhido pela decisão judicial mas excluindo este.
● A procedência da impugnação pauliana depende da verificação dos requisitos discriminados no artº 610 do CC.
● Não tendo ficado provada matéria fáctica concreta susceptível de integrar a verificação do requisito da má fé dos intervenientes – traduzido na consciência, por parte de todos os protagonistas do negócio jurídico oneroso, do prejuízo que esse acto causava ao credor –é incontroverso que a Autora não podia lograr êxito no recurso a este meio de conservação da garantia patrimonial que a lei lhe faculta, enquanto credor.
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III. DECISÃO

Em face do exposto e concluindo, acordam os Juízes da Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar improcedente o recurso de apelação interposto pela autora e, em consequência, confirmar a sentença recorrida.
Custas a cargo da recorrente.
Notifique.
Guimarães, 26 de Abril de 2018
(processado em computador e revisto)

(Maria Purificação Carvalho)
(Maria dos Anjos Melo Nogueira)
(José Cravo)


1 - 4- Na verdade, na sequência da produção de prova, quer documental quer testemunhal, que ocorreu nos autos, os recorrentes consideram que, todos os factos por si alegados resultaram provados.
2 - Porque, na presente acção, a causa de pedir é constituída pelos factos que concretizam os requisitos legais da impugnação pauliana, diversamente do que ocorre nas acções reais, não é questionável a titularidade do direito transmitente, relativamente aos bens cuja alienação prejudica o credor, até porque a acção pauliana pressupõe a validade do negócio cuja ineficácia se pretende. Sendo assim, não interessam à boa decisão da presente causa, os factos relativos à posse ou usucapião alegados nos artigos 4.º, 5.º e 45.º, 46.º, 47.º, 48.º, 50.º e 51.º da petição inicial, nem aqueles que, porventura, poderiam indiciar que o titular obteve, junto dos poderes administrativos, uma diferente configuração ou identidade dos prédios e com estas teria realizado os negócios cuja ineficácia se peticiona. Assim sendo, não interessa à boa decisão da causa a alegação dos procedimentos administrativos de que resultou a identidade com que os prédios foram vendidos e, portanto, a matéria alegada nos artigos 6.º, 7.º, 8.º, 9.º, 10.º, 11.º, 12.º, 13.º 14.º, 15.º, 16.º, 17.º, 18.º, 19.º 20.º, 21.º e 22.º, 23.º, 24.º, 25.º, 26.º, 27.º, 28.º, 29.º, 30.º, 31.º, 32.º, 33.º, 34.º, 35.º, 36.º, 37.º, 38.º, 39.º, 40.º, 41.º, 42.º, 43.º, 44.º e 54.º.