Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
900/12.5PBGMR.G1
Relator: ALCINA DA COSTA RIBEIRO
Descritores: REGIME PENAL ESPECIAL PARA JOVENS ADULTOS
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
CONFISSÃO DO MEIO DE PROVA
MATÉRIA CONCLUSIVA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 11/02/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário: I - A omissão de pronúncia sobre a aplicabilidade do Regime Penal Especial para Jovens Adultos (idade compreendida entre os 16 e os 21 anos) não se confunde com a decisão que o afastou do caso concreto.
II. No primeiro caso, o tribunal não aborda, sequer, a possibilidade do arguido poder beneficiar daquele diploma especial (nenhuma referência lhe faz), cometendo, por isso, a nulidade de sentença por omissão de pronúncia, enquanto que no segundo, o tribunal, apreciando aquela hipótese, opta por arredar do caso a aplicação daquele Regime.
III. Não constituindo a confissão do arguido um facto material e concreto, mas sim, um meio de prova (artigo 344º, do Código de Processo Penal) e tendo sido considerada como tal pelo tribunal a quo, inexiste qualquer omissão de pronúncia a viciar a sentença de nulidade.
III. A expressão «evolução da personalidade do arguido» configura matéria conclusiva e genérica a extrair de outras premissas fácticas. Se o recorrente não indica quais são os factos, que, a propósito da evolução da sua personalidade, alegou, oralmente, em audiência, está impedido este tribunal superior de apreciar se os «alegados factos» são essenciais ou não para a decisão.
Decisão Texto Integral: Acordam, os Juízes que compõem a Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães

I – RELATÓRIO

1 - Por sentença proferida em 20 de Março de 2015, foi o arguido, Dias S. condenado pela prática de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelos artigos 203º, nº 1 e 204º, nº1, al. e) do Código Penal, na pena de dois anos e dez meses de prisão.

2 - Inconformado com esta condenação, impugna-a o Arguido, com as conclusões que se transcrevem:

1. O aqui Recorrente DIAS S. não se conforma com a douta Sentença de fls. … dos autos que o condenou na pena de 2 (dois) anos e 10 (dez) meses de prisão, pela prática de um crime de furto qualificado;

2. O Tribunal a quo não deu, na douta Sentença aqui posta em crise, cabal cumprimento o disposto no n.º 2 do artigo 374º do Código Processo Penal, uma vez que, não fez uma exposição completa dos motivos de facto e direito que fundamentaram a decisão, com exame crítico da prova que serviu para formar a convicção do Tribunal e para determinar a concreta pena aplicada;

3. A sentença recorrida, padece assim, deste modo, da nulidade prevista no artigo 379º, alínea a) do Código de Processo Penal, a qual gera a nulidade apenas da sentença e não da audiência de julgamento (cf. v.g. Acs do STJ de 6-de Março de 1991, proc.º n.º 40874, e de 11 de Fevereiro de 1992, BMJ n.º 4141, pág. 389);

4. Acresce que, nos presentes autos, o crime praticado pelo Recorrente DIAS S., objecto dos presentes autos, foram praticados no ano de 2012, sendo certo que à data da prática de tais factos o arguido era menor de 21 anos, uma vez que o mesmo nasceu em 1994, tendo nessa altura 18 anos e actualmente 21 anos;

5. Ora, conforme jurisprudência unânime, particularmente do Venerando Supremo Tribunal de Justiça, sempre que esteja a ser valorada a conduta de arguidos, menores de 21 anos, para determinação da medida da pena, o Tribunal, no exercício vinculado de um poder-dever, procederá à ponderação sobre se é ou não aplicável ao arguido tal regime, que, sendo mais reeducador do que sancionador, se aproxima dos princípios e regras do direito reeducador de menores, caracterizando-se por uma maior flexibilidade e inclusão das medidas de correcção;

6. Naturalmente, a aplicação desse regime não afasta a aplicação da pena de prisão, quando as concretas necessidades de prevenção geral e especial assim o imponham, mas tal pena detentiva deverá ser especialmente atenuada, de harmonia com o artigo 4º, sempre que existam “sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado”;

7. Ora, o Tribunal a quo, apesar de ter considerado esse regime, conforme resulta do texto da douta Sentença, não faz, quanto a nós, uma correta ponderação das circunstâncias de facto e de direito, porque efectivamente se impunha a aplicação do Decreto-Lei n.º 401/82, de 23 de Setembro. É um poder-dever a que este não se pode eximir, mesmo que em momento anterior, a aplicação desse regime tivesse sido, por outro Tribunal, ponderada. Nesta decisão aqui posta em crise o Tribunal tem que atender a todas as circunstâncias, que não fazendo parte do tipo de crime, depusessem a favor do agente ou contra ele. Circunstâncias a jusante e a montante da prática do crime;

8. O arguido é um miúdo - a querer transformar-se num homem -, que errou no passado, de forma reiterada, teve problemas de adição e desestruturação social, não teve educação - dizer "NÃO " e impor "REGRAS" é um ato de carinho - e apoio conveniente da sua mãe - o pai é uma figura ausente, sendo certo que o recorrente tem mais cinco irmãos, todos de pais diferentes... - e nos últimos anos, sem prescindir ter cometidos crimes no período da suspensão da primeira condenação, mudou de vida, abandonou completamente as DROGAS - LUTA que tem de travar até ai fim da vida e que está a lograr fazer com sucesso -, começou a trabalhar, tem namorada (que tem sido o seu principal apoio), adoptou um comportamento conforme o direito, pretende ter um futuro diferente do seu passado;

9. Não aplicar a este miúdo este regime é contrariar o próprio regime e os fins das penas. O recorrente não soube inicialmente aproveitar as oportunidades que teve, mas agora que logrou integrar-se social e profissionalmente, tem emprego, namorada que o apoia, está abstinente, não cometeu qualquer crime nos anos recentes, adoptou comportamento conforme ao Direito, trilha um caminho de rectidão, que de todo não deve ser interrompido e que se o for será, com o devido respeito, contrario ao próprio fim das penas;

10. Sem prescindir, nas suas declarações o arguido/recorrente DIAS S. verbalizou e demonstrou arrependimento, conforme resulta das declarações do mesmo que aqui novamente se transcrevem parcialmente – cf. declarações prestadas pelo arguido DIAS S. conforme acta de audiência de julgamento de 10 de Março de 2015, gravadas através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal – ficheiro 20150210101709_2625185_2870586, com a duração 00:08:21 m, que supra se transcreveram e aqui se dão por integralmente reproduzidas para todos efeitos legais;

11. O Tribunal a quo, no que respeita a confissão e ao arrependimento do arguido, não apreciou os mesmos, nem sequer deu como provado, ou como não provado, nem apreciou ou valorou devidamente a evolução da sua personalidade após as condenações, tendo antes, sem prescindir o princípio da livre apreciação da prova, ignorado parte substancial das declarações do arguido/recorrente, no que respeita nomeadamente, reitere-se, ao arrependimento e a evolução da sua personalidade, a sua conduta atual de respeito e actuação conforme ao direito, estando social e laboralmente integrado e a construir uma vida de rectidão da qual se afastou na adolescência;

12. Ora, tendo a discussão da causa por objecto os factos alegados e constantes da acusação, os factos alegados pela defesa e os factos que resultarem da prova produzida em audiência, teria o Tribunal a quo que, na sua douta sentença, que pronunciar-se sobre a confissão e particularmente sobre o arrependimento do arguido, dando como provado ou como não provada essa factualidade, porque relevante para a decisão da causa, designadamente para a determinação da medida da pena e correcta determinação do enquadramento jurídico da conduta do arguido, pelo que, o Tribunal a quo ao não dar cumprimento ao disposto no artigo 374º, n.º 2 omitindo pronuncia, do que resulta a nulidade do douto Acórdão nos termos do disposto no artigo 379º, n.º 1, alínea c), 1ª parte, do Código Processo Penal, nulidade que aqui se invoca para os devidos e legais efeitos – cf. nesse sentido o douto Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 14 de Novembro de 2011, prolatado no processo n.º 24/09.2PEGMR.G1;

13. Este vício afecta o acto decisório em si mesmo, bem como os actos que dele dependem e que podem ser afectados pela nulidade - artigo 122º n.º 1 do Código Processo Penal, o que tudo se suscita para devido e legal efeito;

14. Pelo exposto, foi incorrectamente julgada a matéria de facto dada como provada, devendo, de acordo com a prova produzida, nomeadamente as declarações do arguido, ter sido dado como provado - nomeadamente no ponto 3 ou 4, ou em ponto autónomo a introduzir, dos factos provados - a confissão dos factos, o arrependimento do condenado, a evolução da sua personalidade após a prática dos crimes e durante a reclusão, a sua interiorização do desvalor da sua conduta, porque assim o impunha toda a prova produzida em audiência de discussão e julgamento, nomeadamente as declarações do arguido Micael, prestadas na audiência de discussão e julgamento que teve lugar no dia 10 de Março de 2015;

15. Pelo exposto a douta sentença é nula, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 379º, n.º 1, alínea a) e 374º, n.º 2 do Código Processo Penal, o que aqui se invoca para os devidos e legais efeitos;

16. Sem prescindir, a escolha da pena reconduz-se, numa perspectiva politico-criminal a um movimento de luta contra a pena de prisão;

17. A opção pela pena de prisão só se justificará quando tal for imposto pelos fins das penas - previstos no art.° 40°, n.º 1 do Código Penal: "A aplicação de penas e de medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade" (sublinhado nosso);

18. Estes fins — comummente designados pela doutrina como prevenção geral positiva ou de integração e prevenção especial positiva ou de socialização traduzem respectivamente o reforço da consciência comunitária e do seu sentimento de segurança face ao atentado contra a vigência da norma penal e a necessidade de efectuar um raciocínio de prognose em relação aos efeitos da pena na futura conduta do Arguido em vista da sua ressocialização;

19. O disposto no artigo 40° do Código Penal fornece os critérios que hão-de presidir à aplicação das penas: a protecção dos bens jurídicos e a reintegração social do agente, sendo certo que "em caso algum a medida da pena pode ultrapassar a medida da culpa". Compaginando o teor do artigo 40.° n° 2 e os elementos contidos no artigo 71.°, ambos do Código Penal, temos que a determinação da medida da pena é feita em função da culpa do agente (limite inultrapassável), das exigências de prevenção e tendo-se ainda em ainda de conta todas as demais circunstâncias que não fazendo parte do tipo de crime (dos elementos essenciais da infracção), deponham a favor do arguido ou contra ele;

20. O arguido tinha à data da pratica dos factos 18 anos, era consumidor de produtos estupefaciente, cometeu diversos crimes nesse período - os dados como provados no ponto 9 dos factos provados -, cresceu num agregado desestruturado, sem pai e com mãe com competências reduzidas e sem hábitos de trabalho, subsídio-dependente, com várias relações falhadas e com filhos de todas elas, abandonou cedo a escola, acompanhou pares com comportamentos delinquentes e desviantes, os quais se dedicavam, para financiar a sua subsistência e os seus consumos, as furtos;

21. Acontece que actualmente, e conforme foi dado como provado nos pontos 4, 5 e 7, o arguido integrou-se social e laboralmente, deixou o consumo de produtos estupefaciente, vive com um avó que dele carece e que também o apoia, tem uma namorada com quem quer constituir agregado familiar e que foi e é um polo dinamizador da sua integração social, e do seu comportamento conforme ao direito;

22. Pelo exposto, tendo em conta a confissão, o arrependimento, a sua toxicodependência, a sua idade à data dos factos e à data da prática dos demais crimes, a sua escolaridade (7ª ano), as pequenas oportunidades e factores exógenos marginais que vivenciou na sua juventude e dos quais os pais não foram capazes de proteger, os fins das penas, as concretas necessidades de prevenção geral e especial e todas as circunstâncias que depunham a favor do arguido, e ainda tendo em conta o facto de o arguido actualmente se encontrar social e profissionalmente integrado, e ter existido manifestamente uma evolução da sua personalidade e interiorização da necessidade de ter um comportamento conforme o direito, com reflexo imediato na postura adoptada pelo arguido no presente julgamento e processo, permite, com elevada segurança, afirmar que a simples ameaça da prisão permitirá assegurar as finalidades da suspensão, pelo que a pena aplicada deveria, para além de ser reduzida a metade, ser suspensa na sua execução ou substituída por prestação de trabalho a favor da comunidade, para o qual o arguido dava – e dá – o seu consentimento expresso;

23. O Tribunal a quo não poderia, nem deveria de forma céptica, ignorar todas as supras referidas circunstâncias, concluído pela falência da ameaça da prisão para se alcançar as finalidades da punição;

24. O seu falhanço quando o Tribunal anteriormente lhe deu oportunidade com uma pena suspensa não pode redundar na ausência de oportunidades futuras. As circunstâncias de vida e evolução da personalidade do arguido/recorrente, impõe decisão diversa;

25. Acresce que, no que a determinação da medida concreta da pena e respectiva fundamentação diz respeito, o Tribunal a quo não fundamentou suficientemente a sua decisão, nem esclarece suficientemente o processo lógico-mental que motivou aquela concreta escolha da pena e respectiva dosimetria, numa clara violação do disposto no artigo 205º, n.º 1 e 32º. N.º 1 da Constituição da República Portuguesa, bem como, no artigo 374º, n.º 2 e 379º, n.º 1, alínea a) do Código Processo Penal, o que aqui se invoca para os devidos e legais efeitos;

26. Acresce ainda que, no que se refere a opção pela não suspensão da execução da pena de prisão, nos termos do artigo 50º do Código Processo Penal, o Tribunal a quo para além de também fundamentar insuficientemente essa decisão e o respectivo processo lógico-mental, também faz uma errada apreciação, conforme supra referido, atendendo a concreta personalidade e respectiva evolução, às suas condições devida, à sua tenra idade - à data dos factos e da pratica dos anteriores crimes - e a todas as circunstâncias que depunham a seu favor, e que em concreto permitiam claramente, sem prescindir todos os antecedentes criminais, e face a evolução da sua personalidade e ao seu atual comportamento conforme o direito, fazer um juízo de prognose favorável, e concluir, conforme supra referido, que a simples censura do facto e a ameaça de prisão realizava e realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição;

27. Por último, sem prescindir, tendo em conta a matéria de facto dada como provada, e não provada, e atendendo a concreta personalidade do arguido, às suas condições devida, idade à data dos factos e a todas as circunstâncias que depunham a seu favor, e que em concreto permitiam claramente, sem prescindir todos os antecedentes criminais, fazer um juízo de prognose favorável, e ainda tendo em conta as concretas necessidades de prevenção geral e especial, é nosso entendimento que a concreta pena aplicável deveria ter sido reduzida a 1 (um) ano pena de prisão e esta suspensa na sua execução ou substituída por trabalho a favor da comunidade, nos termos do artigo 58º do Código Penal, para a qual o arguido dava e dá o seu consentimento expresso;

28. Pelo exposto, deveria o Tribunal a quo ter optado por uma pena de prisão que não ultrapassasse um ano de prisão, suspendendo-se a mesma na sua execução pelo mesmo período uma vez que esta realizava de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, pois a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de foram adequada e suficientes as finalidades da punição, sendo certo que o arguido, actualmente e já desde pelo menos meados de Julho de 2012, adoptou uma postura conforme ao direito com evolução positiva da personalidade e capacidade de se manter abstinente do consumo de produtos estupefacientes, encontra-se integrado e a trabalhar, longe do seus pares;

29. Por último, é nosso entendimento que, face a atual integração, o arguido é hoje um homem diferente, que refletiu sobre o seu percurso de vida e sobre a necessidade de adoptar um comportamento conforme o direito, manter-se abstinente, lutar por melhores condições de vida para si, e assim fazer um juízo de prognose favorável - que foi feito também pelo Tribunal a quo -, e ainda tendo em conta as concretas necessidades de prevenção geral e especial, as quais (estas últimas) eram elevadas a data da prática dos factos e que, actualmente, face à evolução da personalidade do arguido, e abstinência, são diminutas, pelo que é nosso entendimento que a concreta pena aplicável deveria ser não superior a 1 (um) ano de prisão, suspensa na sua execução, como ocorreu quanto a pena de que se recorre»;

3 - O Ministério Público, em primeira instância, respondeu ao recurso do arguido, pugnando pela manutenção do decidido

4 - O Digno Procurador-Geral Adjunto, no parecer de fls. 243, pronuncia-se pela improcedência do recurso.

5 - Em resposta ao parecer referido em 4, reitera o arguido os fundamentos expandidos na Motivação e Conclusões do seu Recurso.

6 - Colhidos os vistos legais, nada obsta ao conhecimento de mérito.

II – MATÉRIA A DECIDIR

1.Nulidade da sentença

2. Alteração da matéria de facto

3. Regime Penal Jovem Adulto

4. Dosimetria da pena

5. Pena de substituição

III – A SENTENÇA RECORRIDA

A sentença recorrida decidiu a matéria de facto como a seguir se transcreve:

«1. Factos Provados:

Da discussão da causa e produção da prova vieram a resultar provados os seguintes factos com interesse para a boa decisão da causa:

1. Em 06 de Agosto de 2012, pelas 10h e 15m, o arguido levantou a persiana da janela da sala da habitação sita na Rua C., n.º 2, em C.., arrombou-a introduzindo um objecto não apurado na zona de ligação entre a janela, e entrou na habitação, de onde retirou e levou consigo: - um televisor plasma, da marca Samsung, com o valor de 2.000 €; - um relógio de pulso, da marca Massimo Duti, com o valor de 89,95 €; - 150 € em dinheiro; - três pulseiras com o valor global de 150 €; - um anel em ouro branco com uma pera zarcão, com o valor de 100 €; - um anel em ouro com várias pedras tipo flor, com o valor 500 €; - três alianças em ouro, com uma pedra, unidas para formarem um anel, com o valor de 1.500 €; - e um brinco em ouro, com o valor de 100 €.

2. O arguido agiu com o propósito concretizado de arrombar a janela e entrar na habitação pela mesma e de subtrair e apropriar-se dos bens que aí encontrou.

3. O arguido agiu livre, deliberada e conscientemente, apesar de saber que os bens eram alheios e que a sua conduta era proibida e punida penalmente.

4. O arguido trabalha como operário fabril e aufere cerca de €505,00 mensais.

5. Vive com o avô que é reformado.

6. Em casa arrendada.

7. Foi toxicodependente, consumindo cocaína, e fez tratamento.

8. Frequentou a escola até ao 7º ano.

9. Tem antecedentes criminais: 1 crime de furto qualificado, praticado em 23.12.2010, condenado em 24.04.2012, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução; 1 crime de furto qualificado, praticado em 12/05/2012, condenado em 09/12/2014, na pena de 1 ano de prisão, suspensa na sua execução; 1 crime de furto qualificado, praticado em 24/09/2010, condenado em 07.02.2013, na pena de 1 ano e 9 meses de prisão, suspensa na sua execução; 1 crime de furto qualificado, praticado em 29.03.2010, condenado em 23.05.2013, na pena de 1 ano e 3 meses de prisão, suspensa na sua execução, sujeita a regime de prova; 1 crime de consumo de estupefacientes, praticado em 19.06.2013, condenado em 09.03.2013, na pena de 35 dias de multa à taxa de €5,00; 8 crimes de furto qualificado, praticados em 03/2010, na pena única de 4 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução; 1 crime de furto simples, praticado em 22.09.2011, 1 crime de furto qualificado, praticado em 03.01.2011, 1 crime de furto qualificado, praticado em 02.04.2010, condenado na pena única de 2 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução com regime de prova; 1 crime de furto qualificado, praticado em 18.05.2012, 1 crime de furto qualificado na forma tentada, praticado em 18.05.2012, 1 crime de furto qualificado, praticado em 04.05.2012, condenado em 06.05.2014, na pena única de 4 anos de prisão, suspensa na sua execução com regime de prova; 1 crime de furto simples, praticado em 28/01/2011, condenado em 30.10.2014, na pena de 3 anos de prisão, suspensa na sua execução.

IV – O OBJECTO DO RECURSO

1. NULIDADE DA SENTENÇA

O recorrente aponta à sentença recorrida o vício da nulidade, com os seguintes fundamentos: 1) Omissão da análise crítica da prova; 2) Omissão de pronúncia sobre o regime penal do jovem adulto; 3) Omissão de pronúncia sobre factos alegados pelo arguido e 4) omissão de fundamentação da medida concreta da pena.

1.1. Omissão da análise crítica da prova (Conclusões nº 1 e 2)

Para o recorrente, o Tribunal a quo não cumpriu o dever de fundamentação da sentença, na vertente da análise crítica da prova.

Que dizer?

É sabido, que o dever de fundamentação das decisões judiciais se encontra constitucionalmente consagrado, no artigo 205.º, nº 1, da Constituição da República Portuguesa A este propósito, lê-se no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 27-06-2012 (Processo nº 339/09.0JACBR.C1), acessível em www.dgsi.pt, local onde poderá ser localizada a Jurisprudência que venha a ser, de futuro, aludida: «O dever de fundamentação das decisões judiciais é uma realidade, ainda que com contornos variados, imanente a todos os sistemas de justiça que nos são próximos, mesmo que sejam detectáveis variáveis do grau de exigência em função das matérias em causa, do tipo de decisão ou da tradição histórica e cultural de cada povo.

Afirmando-se progressivamente como verdadeira conquista civilizacional a partir da Revolução Francesa, o dever de fundamentação das decisões judiciais constitui, nos modernos Estados de Direito, um dos pressupostos do chamado “processo equitativo” a que aludem o artigo 6º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (…), o artigo 7º da Carta Africana dos Direitos do Homem e dos Povos e, por exemplo, o artigo 20º nº 4 da Constituição da República Portuguesa»., devendo obedecer às formas previstas na lei.

Aí se estipula que «as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei».

Em processo penal, a forma que a lei prevê para cumprir o dever de fundamentação de uma sentença, [um acto decisório, que toma forma de acórdão quando for proferido por um tribunal colegial – artigo 97º, nº 1, al. a) e nº2], é a que consta na previsão do artigo 374º, nº 2.

De acordo com este normativo, a sentença deve, sob pena de nulidade, conter as seguintes menções:

a) A enumeração dos factos provados e não provados;

b) A exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos de facto que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para criar a convicção do tribunal.

Ou seja, depois de enumerados os factos, impõe o artigo 374º, nº 2, que a sentença contenha uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos de facto e de direito, que fundamentara a decisão.

A motivação de facto não se basta, assim, com a enumeração dos factos provados e não provados, antes deve descrever, da maneira mais completa possível, as razões de facto e de direito que justificaram a decisão, fazendo a análise critica, global e conjugada da prova que foi utilizada para formar a convicção do tribunal.

A análise crítica consiste na elucidação do processo de formação do convencimento do julgador, consubstanciado nos motivos pelos quais e em que medida um ou mais meios de provas foram valorados em determinados sentido e outros o não foram.

É através desta fundamentação – que tem como objectivo «a sindicância da legalidade do acto, por uma parte e serve para convencer os interessados e os cidadãos em geral acerca da sua correcção e justiça, por outra parte, mas é ainda um importante meio para obrigar a autoridade decidente a ponderar os motivos de facto e de direito da sua decisão, actuando, por isso como meio de autodisciplina Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, Volume III, pág. 294.» - que se poderá avaliar o processo lógico e subjectivo da formação da convicção do julgador.

Não desconhecemos que o processo equitativo garantido no artigo 6º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, pressupõe a motivação das decisões judiciárias, consistindo estas, na enunciação dos pontos de facto e de direito fundantes das mesmas, em ordem a garantir a transparência da justiça, a persuadir os interessados, e a permitir-lhes avaliar as possibilidades de êxito dos recursos.

Contudo, esta motivação não obriga a uma descrição minuciosa a todos os argumentos, contentando-se com uma descrição clara das razões que justificaram a decisão.

Como afirma Lopes da Rocha, «o princípio do processo equitativo é compatível com a motivação sumária, mas impõe-se uma motivação precisa quando o meio submetido à apreciação do juiz, caso se revele fundado é de natureza a influenciar a decisão; a obrigação de motivar reveste importância peculiar quando se trate de apreciar uma pretensão na base de uma disposição de sentido ambíguo, caso em que é exigível uma motivação adequada e proporcional à complexidade da hipótese».

Não basta, pois, que o decisor indique os factos provados e não provados, devendo, também, explanar os motivos pelos quais julgou provado ou não provado determinado facto em detrimento de outro, esclarecendo quais os meios de prova produzidos, que, depois, de analisados, global, conjugada e criticamente, o levaram a decidir com decidiu.

Tanto não significa que se exija, uma análise crítica e exaustiva dos meios de prova, nomeadamente, «com apelo sistemático ao conteúdo concreto da prova. Esta vertente apenas se impõe na medida do necessário para a compreensão da decisão, da sua lógica intrínseca, de modo a que não possa apresentar-se como arbitrária ou injustificada, não porque o fosse mas porque demonstrada a sua justificação.

Se é verdade que a fundamentação não se basta com a simples indicação de provas, também é verdade que a análise critica destas deve apenas ser necessária e suficiente para dar a conhecer porque decidiu o tribunal em determinado sentido.

A análise critica da prova impõe-se sobretudo relativamente a meios de prova oral porque é em relação a estes que, pela sua natureza e especificidade, se torna necessário explicitar a convicção, (desde logo a imediação é essencial para a sua avaliação). Já no que refere a documentos ou prova pericial reveste-se o seu teor de um carácter objectivo e certo que na maioria dos casos dispensa considerações sobre o seu conteúdo, porque este se impôs sem que existam questões delicadas de credibilidade ou razão de ciência a equacionar. Ou seja, se o texto do documento ou o relatório de perícia permitem, só por si, compreender a decisão do tribunal, na verdade não se exige qualquer dissertação sobre eles, patente no processo, imutável e cuja interpretação depende apenas da declaração que contém Acórdão da Relação de Coimbra proferido no processo nº 72/07.7JACBR.C1.».

O exame crítico das provas deve ser aferido com critérios de razoabilidade, sendo fundamental que permita avaliar cabalmente e o porquê da decisão e o processo lógico-formal que serviu de suporte ao respectivo conteúdo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12 de Abril de 2000, processo nº 141/2000-3ª, SASTJ, nº 40, 48..

Na sentença recorrida consta que o tribunal a quo «formou a sua convicção com base na valoração da prova produzida e examinada em audiência de discussão e julgamento, designadamente:

- nos documentos juntos aos autos, nomeadamente de fls. 10 a 15 e 26 (reportagem fotográfica e relatório de inspecção lofoscópica), fls. 16 (relação de bens furtados), e fls. 88 a 91 (perícia).

- nas declarações do arguido, o qual, admitiu, parcialmente, os factos, relatando, em suma, que efectivou o furto em causa, forçando a janela, tendo levado a tv e objectos em ouro, e após vendido.

Mais relatou as suas condições pessoais, económicas e sociais.

O tribunal formou, ainda, a sua convicção nos depoimentos das testemunhas:

- José M., a qual que prestou um depoimento que se nos afigurou coerente e verosímil por si e entre si e quando conjugada com a demais prova, o qual relatou, em suma, que nas circunstâncias de tempo aludidas na acusação, a sua residência foi assaltada, confirmando o teor de fls. 12 a 14, tendo o individuo que lá entrou forçado a portada e levado os objectos que constam da relação de fls. 16, bem como os seus valores.

Não conhece o arguido, o qual não era visita de sua casa, nem lá fez qualquer trabalho.

Não recuperou qualquer bem furtado.

Na verdade, da conjugação da prova documental, pericial e testemunhal, logo se tem que concluir que foi o arguido o autor dos factos dados como provados, visto a testemunha inquirida (de forma verosímil e coerente por si e entre si e quando conjugado o seu depoimento com a demais prova) ter relatado as circunstâncias de tempo e lugar e modo, onde e como ocorreram, e bem assim, os bens que lhe furtaram e seus valores, o que é corroborado pela prova documental.

Acresce que foram recolhidos no local vestígios lofoscópicos no lado interior da persiana da porta da sala, por onde entrou o autor do furto, tendo a perícia, concluído que se tratam dedo médio e anelar da mão direita do arguido.

Neste jaez, tal prova só por si levaria à conclusão que foi o arguido o autor dos factos. Contudo, o arguido, já após a produção da prova, admitiu ter sido ele o seu agente.

Quanto ao valor dos aludidos bens, relevou o documento de fls. 16, confirmado pela testemunha inquirida.

Neste jaez, a versão trazida pela acusação merece, por isso, credibilidade atento o que supra se disse, produzindo prova bastante, analisada à luz da experiência comum e do normal acontecer, para convencer o tribunal que o arguido praticou os factos dados como provados.

No que concerne à situação económica, social e profissional relevaram as declarações do arguido que nos pareceram verosímeis.

Quanto à existência de antecedentes criminais, tomou-se em consideração o certificado de registo criminal junto aos autos».

Esta descrição clarifica o processo lógico de formação da convicção do julgador para ter como certos os factos que deu como provados.

Na verdade, as declarações do arguido, as da testemunha, José M. e o teor dos documentos juntos, sem contradições entre si e, complementaram-se de molde a convencer o tribunal quais os factos que, em seu entender, ficaram demonstrados em audiência.

A explanação do tribunal recorrido não deixa qualquer dúvida sobre os meios de prova que fundamentaram a sua decisão: de um lado, a confissão do arguido confirmou que foi ele quem forçou a janela e levou consigo a TV os objectos em ouro, que, posteriormente vendeu, e, de outro, as declarações da testemunha, José M., a reportagem fotográfica, o relatório de inspecção lofoscópica, a relação de bens furtados e o relatório pericial esclareceram as circunstâncias em que o furto se deu e bem assim as características e valor dos bens furtados.

Tanto significa que a sentença cumpre o dever de fundamentação previsto no artigo 379º, nº 1 e 374º, nº2, do Código de Processo Penal, não enfermando, por isso, do invocado vício de nulidade.

Improcedem as Conclusões nºs 1 e 2.

1.2. Omissão de pronúncia sobre o regime penal do jovem adulto

No que toca ao regime penal relativo a jovens com idades compreendidas entre os 16 e os 21 anos, aprovado pelo Decreto-Lei nº 401/82, de 23 de Setembro, tem vindo a ser entendido pela jurisprudência, que o juiz não pode deixar de apreciar expressamente se é ou não de aplicar aquele regime aos jovens que, à data da prática dos factos, tenham entre 16 e 21 anos de idade.

Neste sentido se pronunciou, entre outros, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 3 de Março de 2005 (processo nº 04P4706) in www.dgsi.pt, da seguinte forma:

«A aplicação do regime penal relativo a jovens entre os 16 e os 21 anos - regime-regra de sancionamento penal aplicável a esta categoria etária - não constitui, pois, uma faculdade do juiz, mas antes um poder-dever vinculado que o juiz deve (tem de) usar sempre que se verifiquem os respectivos pressupostos; a aplicação é, em tais circunstâncias, tanto obrigatória, como oficiosa.

A oficiosidade da aplicação e do conhecimento de todas as questões que lhe pertinem resulta da natureza dos interesses que se visam proteger, na realização de uma irrecusável (pelo julgador) opção fundamental de política criminal, e da própria letra da lei ao usar a expressão "deve" com significado literal de injunção. Para tanto, o juiz não pode deixar de averiguar se existem pressupostos de facto para a atenuação sempre que o indivíduo julgado tenha idade que se integre nos limites da lei (cf., v. g., os acórdãos do Supremo Tribunal, na "Colectânea de Jurisprudência", STJ, ano V, tomo III, pág. 192 e ano VII, tomo III, pág. 234, referindo vária jurisprudência)».

Veja-se, ainda, a este propósito, também o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) de 29 de Abril de 2009, bem como ampla jurisprudência aí citada, acessível in www.dgsi.pt, onde se lê:

“ (…) O instituto previsto no DL 401/82, de 23-09, corresponde a um dos “casos expressamente previstos na lei”, a que alude o n.º 1 do art. 72.º do CP, sendo que a atenuação especial ao abrigo deste regime especial:

- não é de aplicação necessária e obrigatória;

- não opera de forma automática, sendo de apreciar casuisticamente;

- é de conhecimento oficioso;

- não constitui uma mera faculdade do juiz, mas antes um poder-dever vinculado que o juiz deve (tem de) usar sempre que se verifiquem os respectivos pressupostos, sendo de concessão vinculada;

- é de conceder sempre que procedam sérias razões para crer que da atenuação resultam vantagens para a reinserção social do jovem condenado, sendo em tais circunstâncias obrigatória e oficiosa;

- não dispensa a ponderação da pertinência ou inconveniência da sua aplicação;

- impõe se justifique a opção ainda que se considere inaplicável o regime, isto é, deve ser fundamentada a não aplicação (…) ”».

O Decreto-Lei nº 401/82 configura, assim, o conjunto das normas que constitui a legislação especial a que alude a última parte do artigo 9º do Código Penal, que se aplica aos jovens maiores de 16 anos e menores de 21 que tenham praticado um facto qualificado como crime e que sejam penalmente imputáveis.

A lei geral aplicar-se-á, também, àqueles jovens, em tudo o que não for contrariado pelas regras do diploma (cf. art.s 1º e 2º do mencionado Decreto Lei).

Ora, mesmo que se defenda, como nós defendemos, que esta regulamentação não atingiu, na prática, as finalidades que se propunha - a de instituir um direito penal para os jovens adultos imputáveis, mais de índole reeducador do que sancionador - que necessita de uma revisão profunda, impondo métodos de interpretação actualista e teleológica - temos por certo, que o tribunal deve, sempre que o arguido tenha, à data da prática dos factos uma idade compreendida entre os 16 e os 21 anos, pronunciar-se sobre a aplicabilidade ou não do regime previsto Decreto-Lei 401/82, indicando os motivos/fundamentos pelos quais o aplica ou afasta a sua aplicação, sob pena, de não o fazendo, incorrer na nulidade prevista na alínea c), do citado artigo 379º.

O Recorrente destina as Conclusões 4 a 9 (sintetizam os argumentos de fls. 207 a 210) a censurar a decisão recorrida sobre a aplicação do Decreto-Lei nº 401/82, de 23 de Setembro, confundindo, no entanto, a omissão de pronúncia sobre a aplicabilidade deste diploma ao jovem com idade compreendida entre os 16 e os 21 anos (fls. 209 in fine) – que acabamos de analisar - com o eventual erro da decisão que afastou do caso concreto a aplicação do regime penal do jovem adulto.

No primeiro caso, estaremos perante uma nulidade de sentença por omissão de pronúncia - o tribunal não aborda a possibilidade de aplicar ao arguido o diploma especial (nenhuma referência lhe faz) – enquanto no segundo, existe uma decisão que se pronuncia sobre a questão, arredando a possibilidade de, naquele caso concreto, o arguido beneficiar do regime penal especial do jovem adulto.

Ora, lendo a sentença recorrida, nenhuma dúvida subsiste que contém expressa tomada de posição sobre a aplicação do regime penal especial para jovens adultos previsto no Decreto-Lei 402/82, de 23 de Setembro, quando, a fls. 138, depois de transcrever os artigos 1º, nº 2, e 4º deste diploma, conclui que, não obstante o arguido ser jovem, com 18 anos, à data da prática dos factos, ainda assim, há que «atentar no grau da ilicitude dos factos, bem como na intensidade do dolo, e a personalidade que revela, nomeadamente a enorme propensão para a prática de crimes contra o património, demonstrada pelo vasto curriculum criminal do arguido, apontam no sentido de uma acrescida necessidade de prevenção especial.

Ora, tal necessidade mostra-se incompatível com a utilização do instituto da atenuação especial da pena, pelo que se decide afastar a aplicação do regime especial do DL 402/82, de 23 de Setembro».

O tribunal apreciou a questão, tomando uma decisão sobre a mesma, com a qual o recorrente não concorda. Mas esta discordância não torna nula a sentença, por omissão de pronúncia, nos termos apontados pelo Recorrente.

Improcede, assim, esta sua pretensão.

1.3. Omissão de pronúncia sobre factos alegados pelo arguido

Afirma o recorrente (Conclusões 10 a 15) que o tribunal a quo não deu como provado ou não provado “a confissão e arrependimento do arguido”, nem «apreciou ou valorou devidamente a evolução da personalidade após as condenações, tendo antes ignorado parte substancial das declarações do recorrente no que respeita ao seu arrependimento e evolução de personalidade (…).».

Qualifica este vício como: 1) nulidade de sentença, por omissão de pronúncia (conclusão nº 12, 13 e 15); 2) erro de julgamento sobre a decisão da matéria de facto (Conclusão nº 14).

Em processo penal, o regime das nulidades obedece ao princípio da legalidade enunciado no nº 1, do artigo 118º, segundo o qual a violação ou a inobservância das disposições da lei de processo penal só determina a nulidade quando esta for expressamente cominada na lei.

Um dos casos em que a lei comina expressamente com nulidade a violação de determinadas estatuições legais, é o do artigo 379º, que enumera taxativamente, no seu nº 1, as causas de nulidade da sentença.

Aí se dispõe que, em processo comum, a sentença é nula:

a) Se não contiver as menções referidas no nº 2, e na alínea b) do nº 3, do art. 374º;

b) Se condenar por factos diversos dos descritos na acusação ou na pronúncia, fora dos casos previstos nos art.s 358º e 359º;

c) Quando o tribunal deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia conhecer.

São estes os casos e não outros que determinam a nulidade da sentença, destacando-se, agora, a causa prevista na alínea a), a falta de fundamentação, desta feita, no segmento da omissão de factos essenciais para a decisão.

De acordo com o já citado artigo 374º, nº2, al. a), do Código de Processo Penal, a sentença deve, sob pena de nulidade, a enumeração dos factos provados e não provados.

A enumeração dos factos provados mais não significa do que descrever (especificar, narrar, seleccionar) um a um, de forma metódica, os factos que resultaram provados e os que resultaram não provados, reportando-se à matéria constante da acusação ou da pronúncia, da contestação, do pedido cível e ainda aos factos provados resultantes da discussão da causa que se mostrem relevantes para a decisão e não constem daquelas peças processuais.

Esta exigência legal impõe-se pela necessidade de se demonstrar que o tribunal apreciou, em concreto, todos os factos submetidos a julgamento, relevantes para a boa decisão da causa, seja por lhe terem sido trazidos pela acusação e/ou pela defesa, seja porque resultaram da discussão da audiência de julgamento Com os limites impostos pelo art. 358º e 359º e art. 379º, n1, al. b)..

A este propósito, recordemos, o que decidiu o Supremo Tribunal de Justiça Por todos, no Acórdão de 31 de Janeiro de 1996, in Colectânea de Jurisprudência, ACSTJ, 1996, Tomo I, pág. 196.

«Alguma temperança no rigor da injunção é, por vezes, admitida, através da restrição aos factos «essenciais» à caracterização do crime e suas circunstâncias juridicamente «relevantes» que tenham sido alegados pela acusação e pela defesa; à admissão de um critério de menor minúcia relativamente aos «factos não provados» que, todavia não ponha em causa a certeza de que todos os factos alegados foram apreciados, sempre com rejeição do emprego de fórmulas como «não se provaram quaisquer outros factos» ou através de remissões confusas para artigos de diversas provas processuais (…).

A «relevância» para a decisão ou a «essencialidade» para a caracterização do crime e suas circunstâncias juridicamente relevantes tem como contrapartida os «factos inócuos» que, por o serem, não têm qualquer interesse para a boa decisão da causa. Acontece, por vezes que, dados como provados factos essenciais e relevantes é perfeitamente inútil pronúncia sobre contra-factos ou simples negação dos primeiros, em sede de contestação. Pronunciando-se a sentença de modo positivo é manifestamente inútil repetir os factos já tidos por provados, pela negativa, isto é, descrevê-los e dizer que se não provaram. É puro preconceito formalista dizer que não se provaram certos factos que estão em flagrante contradição, pela negativa, com outros convulsivamente já considerados provados».

No caso dos autos, o recorrente não tendo apresentado, contestação, pretende, agora, ver nos factos provados, a sua confissão, o seu arrependimento, e a evolução da sua personalidade.

Ora, a confissão não constitui em si um facto material e concreto, mas um meio de prova (artigo 344º, do Código de Processo Penal), tendo sido considerado como tal na sentença recorrida. Aí se lê que o arguido «admitiu, parcialmente, os factos, relatando, em suma, que efectivou o furto em causa, forçando a janela, tendo levado a TV e objectos em ouro e após vendido.

Já a evolução da personalidade do arguido configura matéria conclusiva e genérica a extrair de outras premissas fácticas. Não traduz, em si, factos materiais e concretos que devam ser considerados como provados.

A este propósito, foi dado como provado, que o arguido trabalha como operário fabril, auferindo cerca de 505€ mensais; vive com o avô, que é reformado, em casa arrendada. Mais se apurou que foi toxicodependente, consumindo cocaína, tendo feito tratamento.

Não indicando o recorrente, quais são os outros factos, que, a propósito da evolução da sua personalidade, alegou em audiência, está impedido este tribunal de apreciar a essencialidade dos mesmos para a decisão.

No que toca ao arrependimento, diga-se que o que assume alguma relevância para a decisão, não é a clamação em audiência de um «estou arrependido», como sucedeu no caso, mas a demonstração daquele sentimento.

Como se lê no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 6 de Junho de 2007 (www.dgsi.pt) «manifestar é exteriorizar, mostrar algo para o exterior, enquanto demonstrar é dar mostras de, comprovar a existência de alguma coisa ou sentimento».

No caso, não revelam os autos (em peça processual escrita, em audiência ou neste recurso) que o arguido tenha alegado factos donde resulte a demonstração do arrependimento a que alude na Conclusão nº 10 e que esses mesmos factos não tenham sido apreciados pelo tribunal a quo.

Em suma, não corresponde à verdade que o tribunal de primeira instância tenha omitido pronunciar-se sobre questões que estava obrigada a apreciar, em particular, sobre factos alegados pelo arguido com interesse para a decisão da causa.

Improcedem, assim, as Conclusões nºs 10 a 13 e 15.

1.4. Omissão de fundamentação da medida concreta da pena

Sustenta, ainda, o recorrente, a nulidade da sentença, por omissão de fundamentação da decisão que determinou a medida concreta da pena e a não suspensão da execução da mesma e bem assim a falta esclarecimento «do processo lógico-mental que motivou aquela concreta escolha da pena e respectiva dosimetria (…)» (Conclusões nº 25 e 26).´

A manifesta falta de razão encontra-se no texto da decisão recorrida, na parte em que justifica os motivos pelos quais, o tribunal, de uma banda, escolheu e determinou a concreta pena e de, outra, afastou a possibilidade de substituição da prisão por pena não detentiva.

Depois de afastar a aplicação do regime do jovem adulto, e de elencar os critérios legais a que há-de obedecer a escolha e determinação da pena, a sentença sob judice subsume os factos ao direito da seguinte forma:

«Há que ter em conta que o arguido tem uma grande propensão para ofender os bens jurídicos protegidos pelo tipo legal que foi posto em causa com a factualidade apurada nestes autos, e que nem a primeira pena de prisão suspensa o fez parar de continuar a actividade criminosa muito gravosa em termos de alarme social.

Destarte, entendemos que o arguido deve cumprir pena privativa da liberdade, isto, porque, mesmo após uma advertência solene, e bem assim uma pena de prisão suspensa na sua execução, resulta que as mesmas não foram suficientes para o consciencializar da necessidade do respeito pelos valores mínimos que enformam a ordem jurídico-penal e assim para a abstenção da prática de novos factos.

Atente-se, que o arguido não obstante ter sido condenado em 24.04.2012, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução, logo de seguida praticou mais 5 crimes (4 contra o património), todos no período da suspensão, e ainda, o em apreço nestes autos, o que revela que nem assim, se consciencializou para pautar a sua conduta de acordo com o Direito, ou soube aproveitar a oportunidade que lhe foi dada.

Neste jaez, não é possível, de todo, fazer um juízo de prognose positivo no sentido de que simples censura do facto, o trabalho a favor da comunidade, ou a ameaça da prisão, ou, ainda, o cumprimento em dias livres, realizarão de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, bastando para o afastar da criminalidade, sem prejuízo de se banalizar o bem jurídico em apreço, não podemos esquecer a quantidade de crimes que o arguido cometeu e sua gravidade, ou seja, quase todos furtos qualificados.

A prevenção de futuros crimes só pode assentar na combinação da prevenção geral positiva com a prevenção especial, isto é, por um lado assente na tutela dos bens jurídicos que se traduz na reposição da confiança e das expectativas da comunidade na manutenção da vigência da norma violada e por essa via no restabelecimento da paz jurídica posta em crise com o crime, (que se enquadra perfeitamente no artº 18º, nº 2 da CRP) e por outro virada para a socialização do agente e para a sua advertência ou até em último recurso a sua inocuização.

Neste jaez, o arguido deve cumprir pena de prisão efectiva.

Escolhida a natureza da sanção a aplicar, tendo em vista as finalidades que com a mesma se pretende atingir, cumpre, agora, determinar a respectiva medida.

Dispõe o nº 1 do artigo 71º do Código Penal, que a determinação da medida concreta da pena faz-se em função da culpa do agente, tendo em conta as exigências de prevenção geral e especial.

Decorre do disposto no n.º 2 da referida norma, que na determinação da pena, o Tribunal atenderá a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor ou contra o agente.

Atender-se-á assim, ao grau médio da ilicitude atentas as consequências dos factos, nomeadamente o valor dos bens furtados, o facto de não terem sido recuperados, o dolo directo, porquanto o arguido agiu com consciência da ilicitude da sua conduta e ainda assim persistiu em praticá-la, o modus operandi do crime, à admissão parcial dos factos (se bem que pouco relevante porque após a produção bastante de prova), as suas condições pessoais e a existência de vastos antecedentes criminais.

Tudo visto e ponderado, entende-se justa, adequada e proporcional à culpa e às exigências de prevenção, a aplicação ao arguido uma pena de 02 (dois) anos e 10 (dez) meses de prisão.

Esta exposição manifesta os fundamentos pelos quais a primeira instância condenou o recorrente na pena de dois anos e dez meses, cumprindo-se o dever de fundamentação das sentenças a que já aludimos acima.

Também, aqui, não assiste razão ao recorrente, nas Conclusões nº 25 e 26º.

2. ALTERAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO

Quanto à pretensa impugnação da decisão sobre a matéria de facto ventilada na Conclusão nº 14, diremos, que não obedece aos requisitos de admissibilidade.

O sistema processual penal vigente consagra, como se sabe, um duplo grau de jurisdição na apreciação da matéria de facto, facultando aos sujeitos processuais a possibilidade de reagir contra eventuais erros do julgador na livre apreciação das provas e na fixação da matéria de facto.

A este propósito, rege o artº. 412º, nº 3 do Código de Processo Penal, que impõe ao sujeito processual que impugne a decisão sobre a matéria de facto, a especificação de:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;

b) As concretas provas que imponham decisão diversa da recorrida;

c) As provas que devem ser renovadas.

Quando as provas tenham sido gravadas, as especificações previstas nas alíneas b) e c) referidas fazem-se por referência ao consignado na acta, nos termos do disposto no art. 364º, nº 2, do Código de Processo Penal, devendo o Recorrente indicar concretamente as passagens em que se funda a impugnação (art. 412º, nº 4, do diploma que vimos citando).

No caso dos autos, o Recorrente não indica, na Motivação ou nas Conclusões, quais são os factos que, em concreto, foram incorrectamente julgados pelo decisor da primeira instância.

Com já vimos acima, o recorrente não enuncia factos, mas matéria probatória (confissão) ou conclusiva (arrependimento, evolução da sua personalidade após a prática dos crimes, sendo que a interiorização do desvalor da sua conduta constitui uma generalidade e não facto material e concreto.

Por outro lado, não especifica o recorrente, quais os meios de prova que, em concreto, impunham uma decisão diversa da tomada pela primeira instância.

Esta omissão leva, a nosso ver e salvo melhor opinião, ao não conhecimento deste segmento do recurso do Arguido.

Tal decorre, expressamente da conjugação dos nºs 3 e 4 do art. 417º, nº 3, do Código de Processo Penal que, estabelecem, respectivamente, que:

«Se das conclusões do recurso não for possível deduzir total ou parcialmente as indicações previstas nos n.s 2 a 5 do art. 412º, o relator convida o recorrente a completar ou esclarecer as conclusões formuladas, no prazo de dez dias, sob pena do recurso ser rejeitado ou não ser conhecido na parte afectada. Se a motivação do recurso não contiver as conclusões e não tiver sido formulado convite a que se refere o n.º 2, do art. 411º, o relator convida o Recorrente a apresentá-lo, em 10 dias, sob pena de o recurso ser rejeitado».

Porém, este aperfeiçoamento «não permite modificar o âmbito do recurso que tiver sido fixado na Motivação».

Ou seja, o convite a formular ao Recorrente, quando ocorra a omissão de uma das indicações previstas nos nºs 2 a 5, do art. 412º, do Código de Processo Penal, onde se inclui, o nº 3, al. a) – a que ao caso interessa – só é exigido quando aquela omissão se verifique nas Conclusões.

Porém, se na própria Motivação não constam os elementos necessários ao cumprimento do nº 3, do art. 412º, do Código de Processo Penal, não há qualquer solicitação ao Recorrente para aperfeiçoar a peça recursal que apresentou.

Neste caso, o recurso é, legalmente, rejeitado, sem que ao recorrente seja dada nova oportunidade para completar as omissões verificadas.

Neste sentido, cf. Paulo Pinto de Albuquerque, in Comentário ao Código de Processo Penal, página 1147, onde se lê:

«A falta de indicação nas conclusões da motivação, das menções contidas nas alíneas a), b) e c), do nº 3 do artigo 412º, não é motivo para rejeição liminar do recurso, mas apenas motivo para convite a “apresentar” ou “completar” as conclusões, nos termos do art. 417º, nº 3 (conjugado com o artigo 412º, nº 3) que acolhe a jurisprudência dos acórdãos do TC nº 288/2000 e 320/2002, este com força obrigatória geral. Ao invés se o recorrente não fez constar na própria motivação os elementos necessários ao cumprimento do disposto no artigo 412º, nº 3 do CPP, há motivo legal de rejeição ou de improcedência do recurso nessa parte, sem que ao Recorrente seja dada a oportunidade de suprir o vício dessa falta (…).

O relator não tem o dever de convidar o recorrente a aperfeiçoar a própria motivação de recurso quanto à matéria de facto (acórdão do TRL de 20.10.1999, in CJ, 4, 153)».

Ora, in casu, já se disse, o Recorrente não concretizou na Motivação nem nas Conclusões, quais os pontos de facto que consideram erradamente julgados pelo tribunal a quo, nem especificou os meios de prova que impunham uma decisão diversa da recorrida.

Tal circunstância impede que este tribunal conheça deste segmento de recurso, nos termos e para efeitos do disposto do art. 412º, nº 3, do Código de Processo Penal.

Acresce que, do texto da decisão recorrida, não se detecta qualquer vício de conhecimento oficioso, como sejam, os do nº2, do art. 412º, do Código de Processo Penal.

É sabido, que resulta expressis verbis deste preceito que os vícios nele referidos – a) a insuficiência param a decisão da matéria de facto provada; b) a contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão e c)erro notório na apreciação da prova – têm que resultar da própria decisão recorrida, na sua globalidade – do texto da decisão recorrida – sem recurso a quaisquer outros elementos que lhe são externos.

Em conformidade com todo o exposto pode concluir-se que não estão reunidos os pressupostos legais para que esta instância possa modificar a factualidade fixada pelo tribunal a quo.

Improcede, também, este segmento do recurso, mantendo-se a decisão sobre a matéria de facto proferida pela primeira instância

3. REGIME ESPECIAL PENAL DO JOVEM ADULTO

A discordância do arguido sobre o decidido em primeira instância centra-se, também, na circunstância do tribunal recorrido ter afastado a aplicação do regime penal relativo a jovens com idades compreendidas entre os 16 e os 21 anos, aprovado pelo Decreto-Lei nº 401/82, de 23 de Setembro.

É ponto assente que o arguido, tendo nascido em 2 de Janeiro de 1994, tinha, à data da prática dos factos (6 de Agosto de 2012), 18 anos de idade [cf. artigo 279º, al. c) ex vi artigo 296º do Código Civil)], ou seja, uma idade superior a 16 anos e menor que 21.

Tendo completado 16 anos de idade, é, nos termos do artigo 19º do Código Penal, imputável criminalmente.

Para os jovens com estas idades são aplicáveis as normas fixadas em legislação especial, di-lo o artigo 9º do Código Penal.

A opção por regular em diploma especial as normas penais para os jovens imputáveis, parece ter resultado do facto de, não existindo, entre nós, qualquer experiência nesta matéria, haver necessidade de se submeter a nova legislação, antes de a afirmar, a um longo período de prova – “Actas, I, págs. 136-137, como refere Eliane Gersão, pág. 247, do “Tratamento Criminal de Jovens Delinquentes” – Coimbra, 1968.

A legislação especial encontrou assento no Decreto-Lei nº 401/82, de 23 de Setembro, diploma que auspiciava, segundo se afirma no Preâmbulo, a consagração de um direito penal dos jovens imputáveis” sujeito tanto quanto possível, “aos princípios e regras do direito reeducador de menores”.

Partindo do pensamento, segundo o qual a «capacidade de ressocialização do homem é pressuposto necessário, sobretudo quando este se encontra ainda no limiar da sua maturidade», acolheu-se a ideia de que «o jovem imputável é merecedor de um tratamento penal especializado».

«O princípio geral imanente em todo o texto», lê-se no ponto 4 do respectivo Preambulo, «é o da maior flexibilidade na aplicação das medidas de correcção que vem permitir que a um jovem imputável até aos 21 anos possa ser aplicada tão só uma medida correctiva.

Trata-se, em suma, de instituir um direito mais reeducador do que sancionador, sem esquecer que a reinserção social para ser conseguida, não poderá descurar os interesses fundamentais da comunidade, e de exigir, sempre que a pena prevista seja a de prisão, que esta possa ser especialmente atenuada, nos termos gerais, se para tanto, concorrerem serias razões no sentido de que, assim, se facilitará aquela reinserção».

Por outro lado, «a inconveniência dos efeitos estigmatizantes das penas aconselha a que se pense na adopção preferencial de medidas correctivas para os delinquentes a que o diploma se destina “de forma a “ consagrar um tratamento diferenciado que permita uma adequada individualização das reacções da sociedade» (Preâmbulo, nº 5).

Dando corpo a estes princípios e abrangendo jovens que tenham cometido facto qualificado como crime (artigo 1º, nº 1), considerando como jovem aquele que à data da prática do facto tiver, completado 16 anos, sem ter atingido os 21 (artigo 1º, nº 2) e que não seja inimputável, por anomalia psíquica (artigo 1º, nº 3), consagraram-se neste diploma, algumas regras diferenciadoras de punibilidade, a saber:

1) Atenuação especial da pena (artigo 4º);

2) Aplicação subsidiária da legislação relativa a menores (artigo 5º).

3) Aplicação de medidas de correcção (artigo 6º);

4) Regras especiais para a execução das penas de prisão (artigo 12º).

Contudo, estas regas e princípios não são de aplicação automática e imediata. Não basta o jovem ter uma idade compreendida entre os 16 e os 21 anos, para que, por si só, beneficie de uma das medidas previstas no Decreto-Lei 401/82 citado.

«As medidas propostas» afirma-se no ponto 7 do Preâmbulo deste diploma «não afastam a aplicação – como ultima ratio – da pena de prisão aos imputáveis maiores de 16 anos, quando isso se torne necessário, para uma adequada e firme defesa da sociedade e prevenção da criminalidade, e esse será o caso de a pena aplicada ser a de prisão superior a 2 anos».

A atenuação especial da pena, nos termos dos artigos 73º e 74º do Código Penal, (a ter lugar quando ao crime for aplicável No BMJ 290, lê-se na página 109, “sempre que seja aplicada”, “o que, a não haver lapso de escrita, sugere a pena em concreto “ – Trabalho Colectivo da Procuradoria da República junto do Tribunal de Família de Lisboa, in Revista do Ministério Público, ano 4º, volume 13, página 92. pena de prisão) só será considerada, quando o juiz «tiver sérias razões para crer que da atenuação especial resultem vantagens para a reinserção do jovem condenado» (cf. artigo 4º do Decreto Lei 401/82).

Volvendo ao caso dos autos, também, nesta parte, nenhuma censura merece a decisão recorrida.

É que, não obstante, a juventude do recorrente, a propensão para o crime revelada pelo seu passado criminal, a gravidade dos factos praticados, não permitem formular um juízo positivo sobre as vantagens decorrentes da atenuação especial para a sua reinserção social.

Note-se, que, com 18 anos, o arguido já tinha sido condenado, em 26 de Abril de 2012, na pena de um ano e seis meses de prisão, suspensa na sua execução, pela prática de um crime de furto, continuando, nesse caminho, até pelo menos, 2013, tendo praticado desde então, cinco crimes, quatro dos quais contra o património. Anteriormente e, entre 2010 e 2011, praticou o arguido 7 crimes de furto qualificado, pelos quais foi condenado em penas de prisão suspensa na sua execução.

São, pois, elevadas, as exigências de prevenção especial.

Bem andou assim, o tribunal recorrido, quando conclui que as particulares razões de prevenção especial afastam a aplicação do Regime Penal Especial do Jovem Adulto.

4. DOSIMETRIA DA PENA

Insurge-se, ainda, o recorrente, contra a medida concreta da pena – em seu entender deveria ser próxima de um ano – suspensa na sua execução ou substituída por trabalho a favor da comunidade.

A defesa de uma pena não inferior a um ano de prisão assentava na atenuação especial da pena previsto no Regime Penal Especial para os Jovens Adultos.

Afastada a aplicação deste diploma, a pena de um ano de prisão pugnada pelo recorrente, mostra-se aquém do limite mínimo moldura abstractamente aplicada ao crime praticado pelo arguido, entre dois e 8 anos de prisão (artigo 203º e 204º, nº 2, al. e), do Código Penal).

Posto isto e ponderados os fundamentos exarados na sentença apreciada e acima transcritos, a pena de dois anos e dez meses de prisão mostra-se adequada aos critérios que presidem à determinação da pena concreta, os previstos nos artigos 40º e 71º, do Código Penal, razão pela qual se mantém.

5. PENAS DE SUBSTITUIÇÃO

A última discordância do recorrente em relação ao sentenciado em primeira instância centra-se no segmento que afastou a substituição da prisão por pena não detentiva de liberdade (Conclusões nºs 22º a 24º, 26º a 28), nomeadamente a suspensão da execução da pena ou trabalho a favor da comunidade.

A suspensão da execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 5 anos, pode, nos termos do art. 50º do Código Penal, ser suspensa, se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

Trata-se, como refere Manuel Lopes Maia Gonçalves – Código Penal Português, 2004, página 202 - de «uma medida penal de conteúdo reeducativo e pedagógico».

Para que se verifique a suspensão da pena, é necessário que o julgador, aquando da decisão, possa fazer um juízo de prognose favorável relativamente à conduta do arguido, no sentido de que a ameaça da pena seja adequada e suficiente a realizar as finalidades da punição, isto é, a protecção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.

No caso dos autos, dificilmente se conceberá o juízo apontado, para alguém que, insiste em praticar ilícitos criminais, depois de já ter sido condenado em penas de prisão suspensa na sua execução, por crimes contra o património e outros.

Sofreu a primeira condenação em pena de um ano e seis meses de prisão, cuja execução foi suspensa por igual período, por sentença proferida em 24 de Abril de 2012.

Não obstante esta condenação, veio a praticar, no mês seguinte, 4 crimes de furto, todos eles qualificados (4 de Maio, 12 de Maio de 2012 e 18 de Maio).

Em 7 de Fevereiro de 2013, foi o arguido condenado na pena de um ano e 9 meses de prisão, suspensa na sua execução, pela prática de um outro crime de furto qualificado.

Não obstante esta condenação, praticou o arguido, em 19 de Junho do mesmo ano, o crime de consumo de estupefacientes, pelo qual foi condenado na pena de 35 dias de multa, substituídas por horas de trabalho.

A conduta do arguido demonstra, assim, uma personalidade impermeável à interiorização dos valores do Direito, maxime, o respeito pelo património de terceiros.

A suspensão da execução da pena, que se traduz, numa mera advertência imediata ao arguido, não é, nas circunstâncias em que agiu e tem actuado, ao longo dos anos, o bastante para atingir as finalidades da punição.

A tanto obsta, a reiteração da conduta delituosa do Recorrente.

Por outro lado, se é certo, que as penas devem favorecer a reintegração do arguido na sociedade, não é menos certo que as exigências de prevenção, como meio de protecção dos bens jurídicos, deve, também ser salvaguardadas.

Não há, pois, neste momento, condições para concluir que a simples censura do facto e a ameaça da pena, se mostram adequadas e suficientes para realizar as finalidades da punição exigidas pela prática do crime cometido pelo arguido.

Motivos pelos quais não se substitui a pena de prisão pela suspensão da sua execução.

O mesmo se diga em relação à substituição da prisão por prestação de trabalho a favor da comunidade. Esta pena não realiza, de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, que, no caso, são elevadas.

Além de que, não está preenchido o pressuposto formal para a aplicação daquela pena: a condenação do arguido em pena de prisão não superior a dois anos.

Improcede, também, aqui, o recurso.

V – DECISÃO

Em face do exposto, acordam os Juízes da Secção Penal desta Relação, em julgar não provido o recurso interposto por Dias S.

Custas pelo Recorrente, com taxa de justiça que se fixa em 4 UCS.

Guimarães, 2 de Novembro de 2015

Alcina da Costa Ribeiro

Luís Coimbra