Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
223/07.1TBMTR.G1
Relator: ANTÓNIO SOBRINHO
Descritores: CASO JULGADO FORMAL
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 12/04/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: I – A excepção de caso julgado formal de despacho ou sentença torna ineficaz a decisão posterior sobre a mesma questão que deles tenha sido objecto.
II – Suscitada a ilegitimidade passiva do Fundo de Garantia Automóvel (FGA), por preterição de litisconsórcio necessário, quanto ao condutor do veículo causador do acidente de viação, e tendo sido admitida a intervenção principal, do lado passivo, de tal condutor, ficando assim suprida a invocada ilegitimidade do FGA, desrespeita a excepção de caso julgado formal a decisão posterior que julga parte ilegítima o FGA por não ter sido demandado aquele condutor do veículo.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães:

I – Relatório;

Apelantes: J… e A…(AA.)
Apelado: Fundo de Garantia Automóvel (RR.);

*****

Nos presentes autos de acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, os autores, aqui recorrentes, demandaram os réus, Fundo de Garantia Automóvel e M…, pedindo a sua condenação no pagamento da quantia de € 135.000,00 e dos juros legais, a título de indemnização emergente de acidente de viação ocorrido com o veículo de matrícula CX-36-81, pertencente à 2ª ré e então conduzido por J…, seguindo como passageiro J…, filho dos autores.
Em sede de despacho saneador, datado de 27.03.2014, foi proferida decisão a conhecer da excepção de ilegitimidade passiva do Fundo de Garantia Automóvel e de M…, absolvendo-os da instância, por preterição de litisconsórcio necessário passivo, em virtude de não ter sido chamado à demanda o condutor do veículo responsável pelo sinistro, o aludido J… ,
Inconformados com tal decisão, os autores interpuseram o presente recurso, de cujas alegações se extraem, em súmula, as seguintes conclusões:
1) O chamamento do condutor do veículo responsável pelo acidente já ocorreu nos autos, tendo inclusive sido citado para os termos da causa, como se alcança do teor do despacho judicial de fls. 105 a 109.
2) A intervenção principal passiva do dito J… supriu a invocada ilegitimidade passiva invocada pelo Fundo de Garantia Automóvel (FGA).
3) O despacho recorrido, ao julgar procedente a ilegitimidade passiva do FGA, por falta de intervenção daquele J…, viola manifestamente o caso julgado formal que decorre do despacho judicial referido no ponto 1) supra.
Pede que se revogue a decisão recorrida, julgando-se parte legítima, do lado passivo, os demandados FGA, M… e J…, prosseguindo os autos.

Não houve contra alegações.

II – Delimitação do objecto do recurso; questões a apreciar;

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações, nos termos do artº 639º, do Código de Processo Civil (doravante CPC).

As questões a apreciar são as seguintes:

a) Da ilegitimidade do Réu Fundo de Garantia Automóvel;
b) Da excepção de caso julgado formal;

Colhidos os vistos, cumpre decidir:


III – Fundamentos;

1. De facto;

Têm-se em conta os elementos com incidência jurídico-processual constantes do relatório supra e a factualidade vertida nos articulados pelas partes, cujo teor se dá por reproduzido.

2. De direito;

a) Da ilegitimidade do réu Fundo de Garantia Automóvel;
b) Da excepção de caso julgado formal;

Por razões de sistematologia jurídica, abordaremos em primeiro lugar a questão atinente à excepção de caso julgado formal, uma vez que o mesmo diz respeito precisamente à matéria relativa à legitimidade do 1º réu, FGA, sendo que a procedência daquela preclude o conhecimento desta.

Assim, argumentam os apelantes que, já tendo sido conhecida e decidida nos autos a intervenção principal provocada do chamado J…, pelo despacho judicial proferido a fls. 105, transitado em julgado, na sequência da ilegitimidade passiva invocada pelo réu FGA, por preterição do litisconsórcio necessário, a decisão ora recorrida viola o princípio do caso julgado formal previsto no artº 672º, do CPC.

Apreciando.

Assiste inteira razão aos recorrentes, já que, relativamente à decisão recursiva, é flagrante o desrespeito (quiçá lapso) pelo caso julgado formal constituído com a prolação do despacho judicial de fls. 105 dos autos, que transitou em julgado.

Na verdade, o objecto desse despacho versa precisamente sobre a ilegitimidade passiva alegada pelo réu FGA, por ter sido preterido do lado passivo a demanda do condutor do veículo interveniente nos autos, o redito J…, tendo nesse despacho sido admitida a intervenção principal provocada daquele, a fim de ser sanada a invocada ilegitimidade passiva, atento o disposto no artº 29º, nº6, do Dec. Lei nº 522/85, de 31.12.

Ademais, o chamado J… foi inclusivamente citado para os termos da causa, como se abarca de fls. 108 e 109.

E o artº 672º, do CPC estatui que o despacho que recaia sobre a relação processual tem força obrigatória dentro do processo.

Logo, a decisão posterior e aqui recorrida não deixa de versar sobre a mesma questão e contraria a decisão anterior de admitir o chamamento e considerar suprida a ilegitimidade passiva do réu FGA.

Prevalece assim aquela primeira decisão, segundo o preceituado no artº 675º, nº2, do CPC.

A latere sempre se dirá que os fundamentos, as premissas, enfim, o objecto lato sensu do despacho de fls. 79, que se debruçou também sobre questão de chamamento do mesmo J… é distinto do ora apreciado, já que tem por base o enquadramento da legitimidade deste em matéria relativa à legitimidade dos cônjuges.

Do que deixa aduzido resulta que, havendo necessidade de cumprir a decisão que decretou a intervenção principal, do lado passivo, em relação ao chamado J…, assim ficando sanada a preterição de litisconsórcio necessário, associada à ilegitimidade invocada pelo réu FGA, está verificado o pressuposto processual da legitimidade passiva de todos os três demandados: FGA, dona do veículo e condutor do mesmo.

O que implica a procedência da apelação.

Sintetizando:

I – A excepção de caso julgado formal de despacho ou sentença torna ineficaz a decisão posterior sobre a mesma questão que deles tenha sido objecto.

II – Suscitada a ilegitimidade passiva do Fundo de Garantia Automóvel (FGA), por preterição de litisconsórcio necessário, quanto ao condutor do veículo causador do acidente de viação, e tendo sido admitida a intervenção principal, do lado passivo, de tal condutor, ficando assim suprida a invocada ilegitimidade do FGA, desrespeita a excepção de caso julgado formal a decisão posterior que julga parte ilegítima o FGA por não ter sido demandado aquele condutor do veículo.


IV – Decisão;

Em face do exposto, decide-se julgar procedente a apelação, revogando-se a decisão recorrida, por se verificar a legitimidade passiva dos demandados Fundo de Garantia Automóvel, M… e chamado J…, prosseguindo os autos os seus ulteriores termos.

Custas pelo vencido a final.

Guimarães, 4 de dezembro de 2014
António Sobrinho
Isabel Rocha
Moisés Silva