Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
8110/17.9T8VNF.G1
Relator: AFONSO CABRAL DE ANDRADE
Descritores: SEGURO FACULTATIVO
PERDA TOTAL
VALOR ATRIBUÍDO AO VEÍCULO NO CONTRATO OBTIDO POR ACORDO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 09/19/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
1. No âmbito de um seguro facultativo de cobertura de danos sofridos por veículo automóvel por colisão, em que se verifique a perda total do objecto seguro, a seguradora não pode invocar o princípio indemnizatório (art. 128º RJCS), defendendo que a prestação por si devida está limitada ao dano decorrente do sinistro”, sempre que o valor atribuído ao veículo no contrato tenha sido obtido por acordo das partes, pois a situação cai no âmbito das derrogações àquele princípio constantes do art. 131º,1,2 do mesmo diploma. 2. Constando do contrato o valor do bem, como sendo o capital seguro, no âmbito da cobertura do risco de “choque, colisão e capotamento”, deve-se presumir que esse valor emerge do acordo das partes, até prova em contrário.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

Sumário: 1. No âmbito de um seguro facultativo de cobertura de danos sofridos por veículo automóvel por colisão, em que se verifique a perda total do objecto seguro, a seguradora não pode invocar o princípio indemnizatório (art. 128º RJCS), defendendo que a prestação por si devida está limitada ao dano decorrente do sinistro”, sempre que o valor atribuído ao veículo no contrato tenha sido obtido por acordo das partes, pois a situação cai no âmbito das derrogações àquele princípio constantes do art. 131º,1,2 do mesmo diploma. 2. Constando do contrato o valor do bem, como sendo o capital seguro, no âmbito da cobertura do risco de “choque, colisão e capotamento”, deve-se presumir que esse valor emerge do acordo das partes, até prova em contrário.

I- Relatório

F. J. interpôs a presente acção declarativa com processo comum contra “X, Seguros Gerais, SA”.
Alegou o A., em síntese, que celebrou com a R. um contrato de seguro de danos próprios, incluindo os riscos de choque, capotamento e colisão, tendo como objecto uma viatura automóvel.
Mais deu conta que tal viatura foi interveniente em acidente de viação cuja responsabilidade na eclosão lhe é imputável, encontrando-se o veículo em situação de “perda total” em virtude dos danos sofridos.
Pede, assim, a condenação da R. a pagar-lhe indemnização referente ao valor seguro (deduzido o montante referente ao salvado e à franquia), bem como ao prejuízo decorrente da privação do uso da mesma.

Contestou a R., admitindo a celebração do contrato de seguro em causa. Impugnou, no entanto, a dinâmica do acidente descrita na petição inicial (incluindo a sua ocorrência).
Mais alegou que o valor venal do referido veículo à data da ocorrência do embate era inferior ao valor do capital seguro (tendo este último sido indicado unilateralmente pelo A. aquando da celebração do contrato); defende, assim, que, no caso de vir a ser condenada, nunca o valor a atribuir ao A. poderá ser superior àquele primeiro.
Foi proferido despacho saneador, tendo sido indicado o objecto do litígio e seleccionados os temas de prova.
Realizou a audiência de julgamento.
A final foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, e, em consequência, condenou a ré a pagar ao autor a quantia de € 28.556,00 (vinte e oito mil, quinhentos e cinquenta e seis euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal civil, contados desde a citação até integral pagamento.

Inconformada com esta decisão, a ré dela interpôs recurso, que foi recebido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (arts. 629º,1, 631º,1, 638º,1,7, 644º,1,a, 645º,1,a, e 647º,1 do CPC, na versão introduzida pela Lei nº 41/2013, de 26/6).
Terminou as suas alegações com a formulação das seguintes conclusões:

1. Fundam-se os presentes autos na responsabilidade civil contratual emergente de acidente de viação.
2. Alegando ter ocorrido um acidente de viação com o veículo seguro na ora Apelante, e do qual resultaram danos no mesmo, veio o A./Apelado, ao abrigo da cobertura facultativa contratada (choque, colisão e capotamento), peticionar a condenação da Seguradora R. no pagamento do valor da perda total e ao abrigo da cobertura de choque, colisão ou capotamento.
3. Em face da matéria de facto considerada provada, o douto Tribunal “a quo” proferiu a douta decisão ora posta em crise, de acordo com a qual julgou a acção parcialmente procedente, considerando demonstrada a ocorrência do sinistro participado e, bem assim, o nexo de causalidade entre o mesmo e os danos que o veículo propriedade do A./recorrido apresentava (e demandaram a sua consideração como perda total).
4. Ora, salvo o devido respeito por diversa opinião, não pode a Seguradora Apelante concordar com a apreciação da prova levada a cabo, discordando, consequentemente, dos fundamentos que suportam a douta decisão prolatada, quanto à matéria de facto e quanto à solução de direito.

DO ERRO DE JULGAMENTO - REAPRECIAÇÃO DA PROVA:

5. O presente recurso sobre a douta decisão proferida quanto à matéria de facto funda-se na convicção da Apelante de que o Douto Tribunal “a quo” terá efectuado uma incorrecta apreciação e valoração da prova, e concretamente na instrução da matéria factual plasmada nos artigos 7º, 24º, 25º, 26º, 27º, 28º, 29º, 30º e 31º do elenco da factualidade considerada provada os quais, pelos motivos que se infra se demonstrará, deveriam ter sido considerados não provados.
6. Com efeito, o Meritíssimo Tribunal “a quo” considerou provados os factos constantes dos artigos supra descritos, e que haviam sido alegados na douta petição inicial.
7. Porém, está a Seguradora Apelante em crer que o Meritíssimo Tribunal “a quo” não ajuizou bem a prova produzida, pois a mesma não se mostrou minimamente suficiente para alicerçar a convicção aduzida na douta sentença proferida.
8. Salvo o devido respeito por diverso entendimento, jamais poderia o Meritíssimo Tribunal “a quo” considerar suficientemente demonstrada a ocorrência e a dinâmica do alegado acidente, quando, de forma clara ficou devidamente evidenciada a existência de variadas contradições que, segundo as regras da experiência, levam a Seguradora Apelante forçosamente a crer que as circunstâncias em que terá ocorrido o sinistro participado jamais poderiam ser aquelas invocadas pelo A./Apelado.
9. A saber: há danos que o veículo apresenta que não são coincidentes com a dinâmica do sinistro vertida nos autos pelo A., nem se coadunam com os danos existentes no veículo terceiro e no local indicado como sendo o do sinistro.
10. Face ao acervo probatório carreado aos presentes autos, jamais poderia ser considerada demonstrada a ocorrência do sinistro participado e, bem assim, a existência de um nexo de causalidade adequada entre o evento descrito na petição inicial e os danos que o veículo apresentava.
11. Acresce que, jamais se pode conceder que o Mmo. Tribunal “a quo” confira pouco valor probatório à testemunha indicada pela R/Apelante, nomeadamente a testemunha B. A., fundando a prova da dinâmica e ocorrência do evento essencialmente nas declarações de parte do próprio A. e da testemunha A. C. que são naturalmente interessados no desfecho da presente demanda (o primeiro por ser o A. e o segundo por, enquanto condutor do outro veículo, ter pendente uma acção contra a ora R. igualmente por virtude do presente acidente).
12. Não podia, pois, e no entendimento da Seguradora Apelante, o Mmo. Tribunal “a quo” desvalorizar todo o juízo técnico emitido pela testemunha B. A. só pelo facto da mesma ser funcionário da R.
13. Da conjugação dos meios probatórios produzidos, nomeadamente testemunhais e documentais, impunha-se decisão diversa daquela que veio a ser proferida e que, presentemente, se impugna.
14. Os elementos probatórios aduzidos ao processo, quando apreciados de forma conjugada, não permitem, pois, concluir pela demonstração dos factos considerados provados e ora impugnados.
15. Concretamente, não permitem que se considere que ocorreu o evento relatado pelo Autor e, bem assim, que os danos que o veículo propriedade do A./Apelado apresenta tenham advindo, única e exclusivamente, do evento por este retratado na douta petição inicial.
16. Salvo o devido respeito por diverso entendimento, da prova produzida nos presentes autos, não resulta que tenha, de facto, ocorrido o evento participado, nem um qualquer nexo de causalidade adequada entre tal evento e os danos que o veículo em apreço apresentava.
17. Os concretos meios probatórios cujo reexame se solicita a este Venerando Tribunal da Relação, e que impunham decisão diversa da proferida são os que se passam a elencar:

Relatório de reconstituição de acidente e fotografias do mesmo, junto aos autos com a contestação como documento n.º 1 , reproduzidos a cores em requerimento de 30/11/2018
Depoimento testemunhal de B. A., prestado em audiência de julgamento de 29/10/2018, e gravado no ficheiro…
18. Salvo o devido respeito por diverso entendimento, entende a Seguradora Apelante que o Mmo. Tribunal “a quo” desvalorizou indevidamente as várias incongruências relativamente aos danos dos veículos, que foram apontadas e escalpelizadas pela testemunha B. A. e evidenciadas nos documentos supra indicados.
19. Atendendo ao teor do depoimento testemunhal cujo reexame se solicitou, cotejado com a reconstituição do acidente e fotografias dos danos dos veículos (doc. n.º 1 da contestação), e bem assim quanto à demais prova carreada aos autos, os artigos 7º, 24º, 25º, 26º, 27º, 28º, 29º, 30º e 31º dos factos provados deveriam ter sido julgados não provados.
20. Ao contemplar diverso entendimento, o Mmo. Tribunal “a quo” incorreu em flagrante erro de julgamento.
21. Por outro lado, considera a Apelante Seguradora que não podia o artigo 4º dos factos provados merecer a concreta redacção que lhe foi conferida.
22. Com efeito, quanto a esta matéria, e se bem se adquiriu o teor da fundamentação da decisão de facto, o facto provado no 4º foi julgado assente por acordo das partes.
23. Porém, analisada a contestação, verifica-se que assim não sucedeu.
24. Em lado algum naquele articulado se refere que “Acordaram A. e R. que o capital seguro no âmbito da cobertura do risco de choque, colisão e capotamento, ascendia a Euro 32.200,00”
25. E de facto, a concreta menção a esse “acordo” colide frontalmente com o que a Seguradora Apelante alegou nos artigos 16º a 20º da contestação, com especial enfoque no artigo 19º onde se refere expressamente (ainda que não tenha sido julgado provado) que o valor do veículo foi indicado pelo A.
26. Nessa medida, e sempre com o máximo respeito por diverso entendimento, não poderia o artigo 4º dos factos provados merecer a redacção que lhe foi dada.
27. Assim, deveria o referido artigo 4º dos factos provados ter sido julgado provado, mas com teor que se passa a sugerir:
O capital seguro no âmbito da cobertura de risco de “choque, colisão e capotamento” ascendia a 32 200€, tendo sido estabelecida uma franquia de 2% sobre o capital seguro, num mínimo de € 250,00”.
28. Ao contemplar diverso entendimento, o Mmo. Tribunal “a quo” incorreu em flagrante erro de julgamento.

DO DIREITO:

29. A propugnada alteração da decisão sobre a matéria de facto implicaria, como consequência directa e necessária e salvo o devido respeito por diverso entendimento, a improcedência da presente acção.
30. É convicção da Seguradora Apelante que não se logrou demonstrar que o veículo foi efectivamente interveniente no evento que deu causa aos presentes autos e que tal ocorreu tal como foi participado.
31. E não estando demonstrados tais factos, a presente acção está votada ao insucesso, na medida em que o ónus da prova do evento danoso despoletador da obrigação de indemnizar, recai sobre o Apelado.
32. Ao contemplar diverso entendimento, o Meritíssimo Tribunal “a quo” incorreu em violação do disposto nos arts. 342º do Cód. Civil e 516º do Cód. Proc. Civil, entre outros, motivo pelo qual a douta decisão ora posta em crise se mostra, assim, inquinada, devendo, pois, ser revogada na íntegra e substituída por outra que absolva a Apelante do pedido.

SEM PRESCINDIR:

33. Ainda que assim não seja doutamente entendido, o que apenas por mero dever de patrocínio se equaciona, sempre se dirá que andou mal o Mmo. Tribunal “a quo” na fixação do valor indemnizatório devido pela perda total do veículo QU.

DA INDEMNIZAÇÃO PELA PERDA TOTAL - DO SOBRESSEGURO:

34. A título de indemnização pela perda total, considerou o Mmo. Tribunal “a quo” que a R. estava obrigada a pagar ao A. “o valor do capital seguro previsto – por acordo das partes – no âmbito da cobertura do risco de “choque, colisão e capotamento”, ou seja, Euro 32.200,00”, valor a que teria de ser descontado o valor da franquia correspondente a 2% do capital seguro, bem como o valor do salvado que ficou na posse do A., o que redundou no valor total de Euro 28.556,00.
35. Porém, ficou provado que à data do evento, o valor venal (comercial) do veículo QU era de Euro 20.000,00. (Cfr. facto provado n.º 43).
36. Ou seja, está-se diante de um caso de sobresseguro.
37. O princípio do indemnizatório encontra-se previsto no artigo 128º do Decreto-Lei 72/202, de 16/04 (RJCS), preceito que determina que: “a prestação devida pelo segurador está limitada ao dano decorrente do sinistro até ao montante do capital seguro”.
38. Na generalidade dos casos a determinação do valor seguro é feita aquando da superveniência do sinistro, pois que a declaração de risco, em que se inclui a descrição e a avaliação do objecto do seguro, é uma declaração que a seguradora aceita sem verificação, apenas para efeitos de calcular o prémio e estabelecer o valor máximo da indemnização.
39. Acresce que ficou provado que o valor do veículo QU se quedava em Euro 20.000,00.
40. E por aplicação do disposto no art.º 128º do RJCS, sempre seria de considerar o valor assim alcançado do veículo, para efeitos de indemnização e não o valor do capital máximo seguro constante da apólice.
41. Assim, o valor de referência para a indemnização deveria ser Euro 20.000,00, havendo que descontar o valor do salvado (Euro 3.000,00) e o da franquia (Euro 644,00)
42. O que perfaz uma quantia indemnizatória de Euro 16.356,00.
43. Ao consignar diverso entendimento, o Mmo. Tribunal “a quo” incorreu em violação do disposto no art.º 128º do RJCS e 562º do Cód. Civil, entre outros.
44. Impõe-se, assim, a revogação da douta sentença recorrida, e sua substituição por outra que, alterando a decisão da matéria de facto nos termos supra propugnados, modifique a decisão de mérito no sentido do pagamento ao Autor da quantia de Euro 16.356,00.

O recorrido contra-alegou, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões (transcrição):

1- A Douta sentença não merece qualquer censura ou reparo, pelo que, salvo o devido respeito por melhor opinião, os fundamentos alegados pela Apelante são totalmente desprovidos.
2- Com efeito e ao contrário do alegado pela Apelante não houve qualquer incorrecta apreciação e valoração da prova, mais concretamente dos factos constantes dos arts. 7º e 24º a 31º dos factos provados.
3- Na verdade, a razão de ciência e a certeza técnica e objectiva da testemunha B. A. foi, efectivamente, posta em causa pela própria testemunha e pelos demais elementos de prova carreados para os autos, nomeadamente o depoimento objectivo e isento da testemunha N. F., militar da GNR que se deslocou ao local do acidente.
4- Veja-se que a testemunha B. A. assumiu no seu relatório e no seu depoimento que, à data do acidente, estava “bom tempo” e do depoimento da testemunha N. F. resulta claro que, à chegada ao local do acidente se fazia sentir muita humidade, estando nevoeiro.
5- Ou ainda o facto da testemunha B. A. assumir que não havia vestígios na via e a testemunha N. F. referir que havia derramamento de óleo na via, tendo sido chamados ao local os Bombeiros para proceder à limpeza da via.
6- Acresce que, a razão de ciência da testemunha B. A. assenta numa análise meramente técnica, matemática e ainda, assim, quando questionado directamente pelo Meritíssimo Juiz a quo sobre a ocorrência ou simulação do acidente dos autos, a conclusão a que esta testemunha chegou foi a de que não sabe se o acidente ocorreu ou se foi simulado.
7- Conclusão a que testemunha A. C., que também foi interveniente no acidente, quando questionado sobre a simulação do acidente, coloca imediatamente de parte, ao responder “é completamente mentira.”
8- Pelo que, muito bem esteve o Meritíssimo Juiz a quo ao decidir como decidiu, pelo que devem improceder totalmente as alegações da Apelante, preferindo-se acórdão que mantenha, na íntegra, a decisão recorrida.
9- Acresce que, os conhecimentos técnicos que a testemunha B. A. detém, não permitem que o seu relatório técnico possa ser valorado como um relatório efectuado no âmbito de uma perícia.
10- Na verdade, a prova pericial, garante que a informação prestada é isenta, uma vez que o perito encontra-se numa posição distanciada das partes.
11- Contudo, sendo a testemunha B. A. funcionário da Apelante, como o próprio afirma no início do seu depoimento, cai por terra a garantia de isenção.
12- Mas ainda que se admitisse que o depoimento desta testemunha fosse valorado como se de um perito se tratasse, com todas as garantias de isenção, é consabido que é opinião generalizada na nossa jurisprudência que a prova pericial é uma prova que deve ser valorada da mesma forma que as demais provas, na exacta medida em que o Juiz é o perito dos peritos, valendo quanto a este tipo de prova o princípio da livre apreciação da prova e, portanto, o princípio da liberdade de apreciação do juiz, nos termos do art. 389º do Código Civil.
13- Veja-se a este respeito o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 06/07/2011, proc. nº 3612/07.6TBLRA.C2.S1 (in www.dgsi.pt), o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 16/10/2014, proc. nº 2329/11.3TBPDL.L1-2 (in www.dgsi.pt) e ainda o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 24/04/2012, proc. nº 4857/07.6TBVIS.C1 (in www.dgsi.pt).
14- Pelo que, atento tudo quanto se deixa supra explanado, não há dúvidas de que muito bem andou o Meritíssimo Juiz a quo ao dar como provado os factos que deu como provados e como não provados aqueles que deu como não provados, pelo que, deve ser mantida a decisão recorrida.
15- Acresce que, da análise da fundamentação proferida pelo Meritíssimo Juiz a quo, verifica-se que o mesmo quando refere que o artigo 4º dos factos provados foi julgado assente por acordo das partes, não se está a referir ao facto do capital seguro no montante de € 32.200,00, ter ou não sido aceite no articulado de contestação da Apelante, mas outrossim, ao facto, de tal valor ter sido acordado entre o Apelado e a Apelante aquando da celebração do contrato de seguro aqui em discussão e que levou a que na respectiva apólice constasse que o capital seguro no âmbito da cobertura de risco de choque, colisão e capotamento, ascendia a € 32.200,00.
16- Sendo este o acordo das partes, a que o Meritíssimo Juiz a quo se quer referir quando diz que o artigo 4º dos factos provados foi dado como assente, por acordo das partes e por documentos com força probatória plena.
17- Motivo pelo qual, não há dúvidas de que, bem andou o Meritíssimo Juiz a quo ao dar como provado o artigo 4º dos factos provados, não devendo, como tal ser admitida a alteração da sua redacção.
18- Além disso, o princípio plasmado no disposto no artigo 128º do RJCS, visa evitar as situações de sobresseguro.
19 - Todavia, conforme o Meritíssimo Juiz a quo explanou e bem na sua Douta fundamentação, tal princípio, pode ser derrogado pelo princípio plasmado no artigo 131º do referido diploma que refere no seu número 1 que, “Sem prejuízo do disposto no artigo 128º e no nº 1 do artigo anterior, podem as partes acordar no valor do interesse seguro atendível para o cálculo da indemnização, não devendo esse valor ser manifestamente infundado.”
20- O que significa que, caso as partes acordem no valor do bem objecto do contrato, é este o valor a considerar para efeitos indemnizatórios e não o valor da coisa no momento do sinistro.
21- Assim, nos casos em que as partes acordam no valor do bem objecto do contrato, é este o valor a considerar para efeitos indemnizatórios.
22- In casu, conforme decorre dos artigos 4º, 41º e 42º dos factos provados e artigo 4º dos factos não provados, Apelante e Apelado acordaram que o capital seguro no âmbito da cobertura do risco de choque, colisão e capotamento, ascendia ao montante de € 32.200,00.
23- Motivo pelo qual, não há dúvidas de que, bem andou o Meritíssimo Juiz a quo ao condenar a Apelante a proceder ao pagamento da quantia de € 28.556,00, já descontado o valor da franquia e o valor do salvado.

II
As conclusões das alegações de recurso, conforme o disposto nos artigos 635º,3 e 639º,1,3 do Código de Processo Civil, delimitam os poderes de cognição deste Tribunal, sem esquecer as questões que sejam de conhecimento oficioso. Assim, e, considerando as referidas conclusões, as questões a decidir são as seguintes:

a) eventual erro no julgamento da matéria de facto
b) erro no valor da indemnização concedida

III
A decisão recorrida considerou provados os seguintes factos:

1- No dia ..-..-2016, A. e R. celebraram um contrato de seguro, com a apólice nº …, a vigorar entre os dias 28-1-2016 e 28-1-2017.
2- Nos termos desse contrato, o A. transferiu para a R. a responsabilidade civil decorrente da circulação rodoviária do veículo de matrícula “QU”.
3- Mais acordaram A. e R. que tal contrato cobriria, igualmente, o risco de “choque, colisão e capotamento” daquela viatura.
4- Acordaram A. e R. que o capital seguro no âmbito da cobertura do risco de “choque, colisão e capotamento” ascendia a 32.200 €, tendo sido estabelecida uma franquia de 2% sobre o capital seguro, num mínimo de € 250,00.
5- Consta do art. 1º da cláusula especial nº 2 do referido contrato, referente a “Choque, colisão e capotamento”, que: “1 -Esta cobertura garante os danos sofridos pelo veículo seguro em consequência de choque, colisão e capotamento. (…)”
6- Consta do art 2º da cláusula especial nº 2 do referido contrato, que: “1 – Para efeitos desta cobertura considera-se: Choque: o embate de veículo contra qualquer corpo fixo ou o embate sofrido pelo veículo imobilizado causado por outro veículo ou qualquer outro corpo em movimento; Colisão: o embate entre o veículo em movimento e qualquer corpo em movimento; Capotamento: o acidente em que o veículo perde a sua posição normal e que não resulte de choque ou colisão”.
7- No dia .. de Janeiro de 2017, na Avenida …, freguesia de ..., concelho de Vila Nova de Famalicão, ocorreu um acidente de viação em que foram intervenientes:
a) o veiculo ligeiro de passageiros marca Mercedes-Benz, modelo E 200 CDI, de matricula QU, propriedade do Autor e conduzido por este; e
b) o veículo ligeiro de passageiros marca Mercedes Benz, modelo E 200 CDI, de matricula PH, propriedade de A. C. e conduzido por este.
8- Naquelas circunstâncias, o Autor circulava na rua do … com destino à Avenida ..., por forma a, posteriormente, seguir no sentido “... – Castelões”.
9- Para tal, chegando ao entroncamento que a Rua do … forma com a Avenida ..., o Autor teria que virar à direita e prosseguir a sua marcha na referida Avenida.
10- No local da sua confluência, a faixa de rodagem da Avenida ..., é subdividida em duas hemi-faixas com cerca de 2,90 metros cada uma.
11- Nesse local, a faixa de rodagem é asfaltada.
12- Não tem bermas.
13- Aquando da ocorrência do sinistro, encontrava-se molhada.
14- Por sua vez, a rua ... é uma rua íngreme.
15- Que se encontrava asfaltada.
16- Aquando da ocorrência do sinistro, encontrava-se molhada.
17- E não tem bermas.
18- Na confluência com a Avenida ..., a Rua ... apresenta um declive com um grau de inclinação muito elevado.
19- E apresenta ainda uma ligeira lomba invertida, por forma a que a água das chuvas possa escoar.
20- Nessa zona de confluência com a Avenida ..., a Rua ... encontra-se ladeada por muros de vedação
21- Sendo que, sobre o muro do lado direito, atento o sentido de marcha do Autor, ainda se sobrepõe uma vedação em chapa.
22- Tal muro impede – sem que avance com a frente do veículo até à outra hemi-faixa de rodagem - qualquer condutor de verificar se circula algum veículo em sentido contrário,
23- A inclinação que a Rua ... apresenta na confluência com a Avenida ... impede qualquer veículo ligeiro de passageiros de aceder frontalmente a esta avenida, sob pena de raspar com a frente do veículo no chão e, posteriormente, com a traseira.
24- Assim, naquele dia de Janeiro de 2017, o Autor ao chegar ao local da confluência da rua ... com a Avenida ..., parou o seu veículo e, depois, iniciou a sua marcha com o intuito de passar a circular nesta Avenida.
25- Sucede que, em face das condicionantes supra referidas, o Autor enviesou o seu veículo ligeiramente para a esquerda, por forma a que este não raspasse com a frente no chão.
26- E, posteriormente, iniciou a manobra de marcha para a direita.
27- Acabando, obrigatoriamente, por invadir a hemi-faixa de rodagem destinada ao trânsito de veículos em sentido contrário àquele que pretendia tomar.
28- Quando a lateral direita do veículo do Autor se encontrava na referida hemi-faixa de rodagem, foi embatido pelo referido veículo PH.
29- Em virtude desse embate, o veículo do Autor acabou por se imobilizar a 10,60 metros do sinal de “stop” que se encontra na confluência da rua ... com a Avenida ...
30- Em consequência do embate resultaram danos no veículo automóvel “QU”, designadamente, na sua parte frontal direita e na sua parte lateral direita.
31- O custo de reparação desses danos ascendia a, pelo menos, 32.201,29 €.
32- O valor do salvado do “QU” ascendia a € 3.000,00.
33- Por carta datada de 16-3-2017, constante de fls. 19-verso, a R. comunicou ao A. , “sem que tal pressuponha a assunção de qualquer responsabilidade”, que do evento em causa resultou uma situação de “Perda total”, “por o valor da reparação ser superior a 70% do valor venal do veículo à data do acidente” e, bem assim, os seguintes valores:
“Seguro: 32 200 €
Franquia: 644 €
Valor do veículo acidentado: 3 000 €”
34- Por missiva datada do dia 21/03/2017, constante de fls. 20, a Ré informou o Autor que face a novos elementos carreados para o processo, havia concluído que os danos sobrevindos às viaturas envolvidas não se coadunavam com o sinistro participado, motivo pelo qual, não iriam assumir a responsabilidade pelo referido sinistro. 35- Após o sinistro, o veículo “QU”, por força dos danos que apresentava, ficou impedido de circular.
36- O “QU” era o único veículo automóvel propriedade do Autor disponível para utilização.
37- O Autor fazia uso diário do “QU” para as suas deslocações profissionais e quotidianas.
38- Além disso, ao fim de semana, o Autor costumava passear com a sua família no referido veículo.
39- Com vista a suplantar a impossibilidade de utilização do “QU”, o A. utilizou veículos emprestados por outras pessoas e recorreu a boleias de familiares e amigos.
40- O custo de aluguer diário de um veículo com as características do “QU” ascende a cerca de 100 €.
41- Aquando da celebração do seguro, o A. deslocou-se a um mediador de seguros da R. e este, após apurar as características do veículo “QU”, atribuiu-lhe o valor de 32.200 €.
42- Tendo o A. concordado com tal valor.
43- À data do acidente, imediatamente antes da sua eclosão, o veículo “QU” tinha o valor venal de cerca de 20.000 €.

IV
Conhecendo do recurso.

O núcleo essencial deste recurso assenta na alegação de que ocorreu erro no julgamento da matéria de facto, entendendo a recorrente que não podia o Tribunal ter dado como provada a ocorrência do acidente. Isto porque, afirma, ficou devidamente evidenciada a existência de variadas contradições que, segundo as regras da experiência, levam a seguradora apelante forçosamente a crer que as circunstâncias em que terá ocorrido o sinistro participado jamais poderiam ser aquelas invocadas pelo autor/apelado; a saber: há danos que o veículo apresenta que não são coincidentes com a dinâmica do sinistro vertida nos autos pelo autor, nem se coadunam com os danos existentes no veículo terceiro e no local indicado como sendo o do sinistro.

E para demonstrar estas suas afirmações, requer o reexame de dois meios de prova: a) relatório de reconstituição de acidente e fotografias do mesmo, junto aos autos com a contestação como documento n.º 1 , reproduzidos a cores em requerimento de 30/11/2018; b) depoimento testemunhal de B. A., prestado em audiência de julgamento de 29/10/2018.

Vejamos.

A determinação, ao detalhe, de como ocorreu um acidente de viação é uma tarefa que pode ser extremamente simples, ou revestir elevada dificuldade, consoante as circunstâncias do caso concreto. Em regra, o julgamento da matéria de facto num processo de acidente de viação envolve a conjugação de vários meios de prova: testemunhal, documental, pericial, e percepção directa do local pelo Julgador, mediante inspecção ao local. Tudo isto é óbvio, e não é preciso perder mais tempo a repeti-lo.

Neste caso concreto, o Tribunal explicou fundamentada e detalhadamente porque razão decidiu como decidiu. Vejamos, agora na parte mais importante, que é a da ocorrência ou não do acidente e a dinâmica e consequências do mesmo, a argumentação expendida na sentença:

Quanto à dinâmica do acidente, importa frisar, desde logo, que as marcas e modelos dos veículos intervenientes resultam dos documentos de fls. 196 e segs. e 274 e segs. (sendo que, no tocante ao veículo “PH”, se atendeu, igualmente, ao certificado de matrícula de fls. 234).
No que concerne às concretas características do local onde se deu o embate, o Tribunal percepcionou-as directamente aquando da realização da inspecção judicial. Tais particularidades surgem descritas no auto de inspecção de fls. 319 e segs., quer nos dizeres que aí se consignaram, quer nas fotografias que aí igualmente constam.
Tais características também surgem evidenciadas nas fotografias juntas com a petição inicial e nas constantes da “informação técnica” levada a cabo pelos serviços da Ré constante de fls. 281 e segs..
Neste âmbito, também se atendeu à participação de acidente de fls. 12-verso e segs., tendo a testemunha N. F., que, à data, exercia funções como militar da “GNR” e que se deslocou ao local do embate após a sua eclosão, confirmado ser o autor de tal documento e, bem assim, a descrição constante do “croquis” aí inserido.
No mais, quanto aos concretos factos descritivos da forma como o embate ocorreu, o A., em declarações de parte, afirmou a sua ocorrência nos moldes tidos como provados. Da sua postura aquando da prestação dessas declarações não resultou qualquer indício que levasse a duvidar da veracidade do por si declarado.
Não obstante, tal elemento probatório sempre deverá ser ponderado com especial cautela, atento o interesse directo que o mesmo tem na prova dessa matéria. Porém, o declarado pelo A. foi confirmado, desde logo, pelo depoimento da testemunha A. C., condutor do outro veículo – de matrícula “PH” – interveniente no acidente.
Também esta testemunha deu conta que, quando seguia na avenida ... ao volante da viatura “PH”, o veículo “QU”, provindo da Rua ..., sita à esquerda, invadiu a hemi-faixa de rodagem destinada ao seu (da testemunha) sentido de trânsito, vindo o embate a ocorrer nos moldes tidos como demonstrados.
Revelou a referida testemunha que, antes dessa ocasião, não conhecia o A.; mais assegurou que não manteve com o mesmo qualquer contacto após o embate.
O depoimento desta testemunha mostrou-se pormenorizado, denotando segurança nas afirmações produzidas. Dele não ressaltou qualquer elemento que levasse a duvidar da sua sinceridade honestidade nem que diminuísse a sua potencialidade probatória. Pelo contrário: como vimos, esta testemunha afirmou que não conhecia – nem conhece - o A.: tal facto exponenciou a credibilidade do seu depoimento.
Neste ponto, importa referir que o acidente ocorreu de noite: seguramente, ambos os veículos seguiam com os faróis ligados. Não obstante este condicionalismo, quer o A., quer a testemunha A. C. afirmaram que, à aproximação do entroncamento, não se aperceberam da luz emitida pelos faróis do outro veículo. Referiram ambos os condutores que a rapidez com que os acontecimentos se deram obnubilou-lhes a percepção de tal facto. Ora, efectivamente, a fugacidade dos eventos associados a acidentes automóveis impedem, muitas vezes, os respectivos intervenientes de percepcionar todos os condicionalismos envolventes. Mais: no entroncamento onde o embate se deu existe um poste de iluminação pública, tal como decorre das fotografias nºs. 5, 6 e 8 do auto de inspecção e do “croquis” inserto na participação de fls. 11-verso e segs.. Ora, a claridade oferecida por tal poste poderá dissimular a luz emitida pelos faróis dos veículos. Assim, o circunstancialismo acima exposto não influiu negativamente na valoração do declarado pelo A. e pela referida testemunha A. C..
Além disso, a mencionada testemunha N. F., militar da “GNR” que se deslocou ao local após a eclosão do acidente, explicou que (tal como mencionado na participação de fls. 12 -verso e segs., por si elaborada), quando chegou ao local em causa, deparou-se com os veículos “QU” e “PH” nas posições retratadas no “croquis” inserto nessa participação. Ou seja, dúvidas inexistem quanto ao facto de os veículos aí se encontrarem, nas orientações mencionadas naquele desenho.
No mais, da inspecção efectuada resulta segura a necessidade de invasão da faixa contrária para efectuar a manobra de mudança de direcção à direita para quem vem da Rua ... e pretenda entrar na Avenida ..., tal como alegado pelo A.
Na verdade, o desnível do pavimento existente na intersecção das duas vias impede que essa manobra se faça em linha recta: forçoso é desviar o veículo para a esquerda, de forma a avançar obliquamente, com vista a evitar o embate da frente e da traseira do mesmo no solo.
Além disso, tal desvio para a esquerda também se afigura necessário dada a falta de visibilidade para Avenida ... desde a Rua ..., atento o muro e a vedação em chapa existentes à direita.
Estes dois circunstancialismos – o desnível do solo e a existência do muro e da chapa obstrutivos da visão – surgem retratados nas fotografias constantes do auto de inspecção.
Além disso, a amplitude dos danos que ambos os veículos apresentavam – designadamente, quando a testemunha N. F., militar da “GNR”, aí chegou (danos estes retratados nas fotografias de fls. 306 a 309, quanto ao veículo “QU”, e a fls. 313 a 313, quanto ao “PH”, todas constantes da “informação técnica” levada a cabo pela R.) sempre impediria a circulação dos mesmos caso já se encontrassem nesse estado antes do embate.
Nesta perspectiva, caso tais danos fossem pré-existentes, ambos os veículos teriam que ter sido transportados para o referido local, mormente, através de reboque. Ora, é pouco provável que tal tenha sucedido, atentas as suspeitas que tal operação sempre suscitaria a eventuais utilizadores da via, independentemente da hora a que a colisão se deu.
De todo o modo, ainda em abono da verificação do embate entre os veículos, cumpre sublinhar que a testemunha N. F. afirmou que existia derramamento de óleo na via, proveniente dos veículos intervenientes na colisão, sendo que foram chamados os Bombeiros para proceder à limpeza da via (tal como mencionado na participação policial, na sua parte final, sob a menção “Outras Informações”).
Além disso, a testemunha N. F. referiu que o condutor do “PH” se queixava de dores, não se recordando, contudo, se chegou a ser chamada a ambulância; também A. C., condutor do PH, referiu ter ficado combalido na sequência do acidente, tendo dito que chegou a ser assistido, no local, em ambulância que aí se deslocou, não tendo, no entanto, tido necessidade de se deslocar ao hospital.
Todos estes elementos probatórios atestam a ocorrência do embate nas circunstâncias de tempo, modo e lugar tidas como provadas.
Nesta medida, o declarado pela testemunha B. A., funcionário da R. “X” desde 2006, não foi apto a abalar a convicção criada por aqueles elementos probatórios.
A referida testemunha declarou ter procedido à averiguação do sinistro, tendo elaborado, sequentemente, a “informação técnica” constante de fls. 281 e segs.
Mais deu conta que algumas circunstâncias suscitaram-lhe dúvidas quanto à ocorrência do acidente nos moldes descritos pelo A..
Desde logo, a referida testemunha explicou que os danos existentes nas viaturas não se coadunam com a dinâmica do acidente descrita pelo A..
Em concreto, referiu que o embate em causa, se tivesse ocorrido nos moldes relatados pelo A., teria provocado danos mais graves; designadamente, a frente esquerda do veículo “QU” (oposta ao lado embatido) também teria sofrido deformações em virtude das forças a que foi sujeita.
Do mesmo modo, referiu aquela testemunha que as posições em que os veículos se quedaram não são compatíveis com a dinâmica do acidente nos moldes relatados, atentas as forças geradas pelo impacto.
Finalmente, a mencionada testemunha mencionou que a configuração dos danos existentes no pára-choques do “PH” é incompatível com o formato dos danos que o “QU” apresentava.
Não obstante, entendemos que tais conclusões, face à especificidade técnica que lhes subjaz, apenas mereceriam acolhimento pelo Tribunal caso fossem produzidas através de prova pericial. Na verdade, o juízo científico inerente a tal meio de prova, atenta a sua especificidade, não revestirá, em princípio, condições de ser analisado criticamente pelo Tribunal, uma vez que o mesmo pressupõe conhecimentos técnicos que os julgadores não possuem.
Por isso é que, nestas matérias de índole técnica, são necessárias, na sua averiguação, exigências suplementares de credibilidade.
E tais exigências são asseguradas pelo particular cuidado colocado na produção dessa prova pericial.
Com efeito, a prova pericial fornece, desde logo, a garantia de que quem a realiza tem, comprovadamente, especiais competências técnicas para a apreciação da matéria em causa. Além disso, tal meio de prova também garante que a informação prestada é isenta, uma vez que o perito encontra-se numa posição distanciada das partes.
Destas duas circunstâncias resulta um valor probatório reforçado do juízo veiculado na prova pericial, não obstante a mesma poder ser livremente apreciada pelo Tribunal nos termos do art. 389º do CC.
Assim, seguimos na esteira do decidido no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 12-7-2017, in “www.dgsi.pt”, quando ali se afirma que “Os depoimentos de testemunhas relativos a matéria científica carecem, em regra, de força persuasiva para a formação positiva da convicção do juiz, pois o juiz não tem forma de aquilatar o real saber ou competência científica das testemunhas no momento em que prestam declarações”.
De todo o modo, é de frisar que os específicos danos provenientes para os veículos e a posição em que os mesmos se quedaram depois do embate dependerão da concreta forma como o mesmo se deu, sendo que uma mera divergência de milímetros poderá provocar consequências absolutamente dispares. Assim, face ao carácter eminentemente técnico da apreciação da matéria em causa e, bem assim, ao grau de pormenor que lhe está associada, cumpre concluir que as referidas circunstâncias adiantadas pela testemunha B. A. não tiveram o condão de contrariar a conclusão a que acima se chegou relativa à ocorrência efectiva do embate.
Por outro lado, a testemunha em causa referiu que o veículo “QU” embateu no poste de iluminação que ladeia a via, aí se tendo quedado. Disse a testemunha que nem o veículo, nem o poste, apresentavam danos. Porém, tal conclusão é contrariada pela fotografia de fls. 59, na qual se constata a existência de “arranhões” na traseira deste veículo. Por outro lado, do facto de no poste não existirem danos não se pode concluir pela não ocorrência do embate nesse ponto fixo. Face à dureza do material do qual o mesmo é composto -em cimento- , poderá dar-se o caso de nele não ficarem visíveis quaisquer deteriorações na sequência do embate sofrido.
Por outro lado, a testemunha B. A. referiu que, na sequência do embate, rebentou um dos pneus dianteiros de cada um dos veículos, sendo que inexistem marcas no pavimento derivadas da fricção das respectivas jantes.
Porém, a testemunha N. F. referiu que quando chegou ao local do embate, fazia-se sentir muita humidade, estando nevoeiro. Tal afirmação não foi colocada em causa pelo facto de, na participação policial, constar que estava “Bom tempo”: esta indicação pode significar, tão-somente, que não estava a chover.
Ora, existindo humidade, o piso da estrada estaria, seguramente, molhado (daqui resultando a demonstração dos “factos provados “nºs. 13 e 16). Este facto atenuaria a fricção criada pela jante, sendo menos propícia a existência de marcas criada no pavimento. Mais: do facto de o pneu ter rebentado não decorre, de forma inelutável, a existência de contacto da jante com o solo: apesar do rebentamento, poderá ainda permanecer uma porção de borracha do pneu, ainda que esvaziado, entre a jante e o solo, impedindo o contacto entre estas duas superfícies e impedindo a criação de rastos na via.
Noutra perspectiva, referenciou ainda a referida testemunha B. A. que nada indicia a ocorrência de derramamento de óleos na via: caso tal sucedesse, existiriam, seguramente, marcas no pavimento. Porém, como vimos, a testemunha N. F. confirmou a existência desse óleo, tendo, inclusive, sido solicitada a intervenção dos Bombeiros para a limpeza da via. Portanto, face à rápida remoção dessa substância, não é de estranhar a inexistência de indícios desse derrame.
Por outro lado, referiu a testemunha B. A. que, tal como consta das fotografias de fls. 309-verso, 310 e 310-verso, os “airbags” frontais do “QU” não foram abertos; também expôs a testemunha que os “airbags” lateral direito e de cortina lateral direita foram accionados ou encontravam-se desalojados do local de fixação.
Porém, expôs a testemunha que o veículo “QU” não transportava passageiro, o que, em princípio, levaria à não deflagração dos “airbags” situados no lado direito.
Explicou esta testemunha que o veículo em causa está equipado com sensores que detectam a presença do passageiro, sendo que os “airbags” situados no lado direito só deflagram quando tal lugar está ocupado.
Não obstante, não foi produzida prova quanto à existência dos mencionados sistemas de sensores no veículo em causa (designadamente, através de comprovação pelo fabricante do veículo).
Além disso, conforme decorre das legendas das fotografias acima referidas, pode dar-se o caso de os “airbags “não terem sido accionados, encontrando-se apenas desalojados do local de fixação. Tal pode ter ficado a dever-se ao impacto sofrido pelo veículo, que incidiu, principalmente, nas suas zonas frontal e lateral direitas.

Do mesmo modo, relatou a testemunha que, conforme resulta das fotografias de fls. 315 e 316, o “airbag” do passageiro do veículo “PH” também deflagrou, sendo que este veículo também não levava passageiro. Porém, dão-se aqui por reproduzidas as considerações acima deixadas: não é seguro que o “PH” estivesse equipado com tais sensores e, tal como consta da legenda dessas fotografias, pode dar-se o caso de tal “airbag” se encontrava apenas desalojado do local de fixação.
Também disse esta testemunha que o accionamento do “airbag”, em regra, implica a quebra do pára-brisas, o que não sucedeu no caso em apreço. Porém, tal conclusão não é uma inevitabilidade, podendo dar-se o caso de tal quebra não ter ocorrido no caso em apreço, não obstante o accionamento do “airbag”.
De todo o modo, cumpre referir que as referidas fotografias, tal como delas consta, forma tiradas, respectivamente, em 30-1-2017 e em 3-2-2017, nos locais para onde os veículos foram transportados. A testemunha B. A. também só terá contactado com os veículos nestas datas.

Ora, o acidente ocorreu em ..-1-2017: desconhece-se o que terá acontecido entre a data do acidente e a data em que as fotografias foram tiradas. Não é de excluir que os “airbags” se encontrem naquele estado por intervenção de terceiros.
Ainda neste ponto, importa realçar que seria altamente improvável que, se alguém pretendesse simular um acidente, descurasse um pormenor tão flagrante. Certamente que essa pessoa saberia que a deflagração dos “airbags” do passageiro quando no veículo só seguisse o condutor levantaria de imediato fortes suspeitas.
Finalmente, mencionou a testemunha B. A. que os quilómetros registados no odómetro do “QU” e os registados no sistema de retenção dos “airbags” e dos pré-tensores não coincidiam, tal como resulta do documento de fls. 317-verso. Tal levou a testemunha a suspeitar que o veículo havia sido transportado para o entroncamento em causa através de reboque, mantendo as rodas traseiras no chão.
Não obstante, desconhece-se se o transporte do veículo nestes moldes acarreta tal disparidade na contabilização dos quilómetros percorridos em ambos os sistemas de contagem.
Além disso, a diferença em causa é mínima, sendo a mesma explicável pelo facto -consabido- de a contagem efectuada pelo sistema de “airbags” e pré-tensores funcionar através de actualizações regulares tendo por referência o registo do odómetro. Por outras palavras, a contagem dos quilómetros naqueles dispositivos de segurança não ocorre em tempo real, ao contrário da contagem registada no odómetro.
Atento o que acima ficou exposto, conclui-se que as circunstâncias declaradas pela testemunha B. A. não tiveram o condão de pôr em causa os elementos, inicialmente expostos, que suportam e comprovam a tese fáctica vertida pelo A..
Lateralmente, refira-se que a R., em sede de contestação, limitou-se a impugnar a ocorrência do embate, não adiantando qualquer outro facto contrário a tal matéria. Ainda que deixe entrever na alegação constante dessa peça processual que tal evento terá sido causado dolosamente pelo A., nunca a R. chegou a afirmá-lo expressamente. Ou seja, a R. insinuou dúvidas e suspeitas sobre a “veracidade” do evento invocado pelo A., mas não alegou, afirmando-o, que o mesmo foi intencionalmente provocado para obter dela a indemnização correspondente ao valor da viatura, defraudando-a.
Por último, neste ponto, importa sublinhar, a traço bem grosso, que as regras da experiência apontam no sentido de a simulação de acidente, com vista à obtenção de indemnização a pagar pela seguradora, constituir uma circunstância anómala: desde logo, quem o faz ficará sujeito às sanções – inclusivamente, penais, nos termos do art. 219º do Código Penal – decorrentes dessa conduta.
Por outro lado, também é anormal que alguém, com aquele objectivo, destrua a sua própria viatura, arriscando-se a que a seguradora recuse o pagamento de indemnização, assim arcando o segurado com o encargo da respectiva reparação.

No caso, tal simulação, a ter ocorrido, teria como intervenientes não um, mas dois veículos – o “QU” e o “PH”: tal circunstância sempre reforçaria o carácter insólito dessa ocorrência.

Assim, na senda do decidido no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 3-10-2013, in www.dgsi.pt., deve presumir-se, pela própria natureza das coisas, que o evento em causa nos autos não teve qualquer contribuição dolosa do segurado. Nas expressivas palavras deste aresto, “(…) como diz o povo, que na sua infinita sabedoria sabe mais que todos os juristas do mundo inteiro juntos, “os carros não foram feitos para bater…”; quer isto dizer que a natureza fortuita e casual do acidente só deixa de existir se o mesmo for doloso e não também meramente negligente ou decorrente do risco da circulação automóvel”.

Em suma, a destruição dolosa de bem próprio, assim impedindo a sua utilização, constitui, face às regras da normalidade do acontecer, um evento absolutamente excepcional, devendo presumir-se, judicialmente, a natureza casual desse evento danoso.

Como vimos, a R. não logrou contrariar (nem conseguiu, sequer, colocar em dúvida) os factos decorrentes dessa presunção, que surge confirmada, no caso concreto, pelos elementos inicialmente apontados.

Em suma, face ao acima exposto, o Tribunal considerou que existem motivos para afirmar, com a segurança legalmente exigida, que o acidente ocorreu nos moldes relatados pela A. em sede de petição inicial”.

Esta Relação considera esta fundamentação exaustiva e exemplar.

Com clareza, o M.mo Juiz a quo começou por pôr o dedo na ferida: o conteúdo do depoimento de B. A., funcionário da R. “X” desde 2006, não tem valor como prova testemunhal e não tem valor como prova pericial.
Concordamos na íntegra.
Não tem valor como prova testemunhal porque B. A. não assistiu ao acidente, e nem sequer chegou ao local logo a seguir ao mesmo, como aconteceu com a testemunha N. F..
Assim, B. A. não sabe como o acidente ocorreu.
Não sabendo como o acidente ocorreu, nenhuma ajuda poderia dar ao Tribunal, nessa qualidade de testemunha.
Sucede que B. A. identificou-se como Engenheiro mecânico.
Nessa qualidade e com os conhecimentos que daí decorrem, poderia ter um contributo útil a dar para a descoberta da verdade. Já não como testemunha, mas sim como perito.
Sucede que não foi apresentado nem ouvido como perito, mas sim como testemunha.
A diferença entre estas duas figuras é óbvia: do artigo 516º,1 CPC retira-se que “a testemunha depõe com precisão sobre a matéria dos temas da prova, indicando a razão da ciência e quaisquer circunstâncias que possam justificar o conhecimento; a razão da ciência invocada é, quando possível, especificada e fundamentada”.
Ao invés, o art. 388º CC dispõe que “a prova pericial tem por fim a percepção ou apreciação de factos por meio de peritos, quando sejam necessários conhecimentos especiais que os julgadores não possuem, ou quando os factos, relativos a pessoas, não devam ser objecto de inspecção judicial”. Testemunha é quem possui informação objectiva sobre factos que presenciou, seja porque viu, ouviu, sentiu ou tocou, e ao ser chamada a depor como tal, pretende-se que ela relate ao Juíz, da forma mais objectiva possível, aquilo de que se apercebeu através dos sentidos, sem misturar nesse relato objectivo juízos de valor ou opiniões. Já o perito, por definição, não presenciou nada, ou se presenciou foi por pura coincidência, mas por ser detentor de conhecimentos profundos e especializados sobre matérias que o Juíz não domina, é chamado, não para transmitir factos, mas sim para emitir opiniões ou juízos sobre os assuntos da sua especialidade. Uma testemunha nunca pode, por definição, emitir opiniões sobre os factos que presenciou; o perito não precisa de presenciar nada, e a sua função é justamente, ao contrário das testemunhas, emitir opiniões. Opiniões porém, com valor reforçado, por provirem de quem tem conhecimentos essenciais à compreensão do que está em discussão. Do ponto de vista material a função de perito é muito parecida com a de julgador: nos dois casos estamos perante profissionais especializados, que recolhem e analisam informação sobre um determinado evento, para no final emitirem o seu julgamento: esse julgamento chama-se no primeiro caso “relatório pericial” e no segundo “sentença”.
Não oferece dúvidas a esta Relação, depois de ouvir o “depoimento”, que B. A., sendo formalmente uma testemunha, substantivamente portou-se como um perito. Identificou-se como Engenheiro mecânico, declarou não ter assistido ao acidente, e que lhe pediram para elaborar um relatório sobre o mesmo, o que fez.
Sucede porém que jamais as declarações de B. A. podem ser vistas como prova pericial. Resulta dos artigos 467º e 468º CPC o regime de nomeação de peritos, podendo a perícia ser singular ou colegial, e no art. 470º,1 estão previstos os obstáculos à nomeação de peritos, sendo aplicável aos peritos o regime de impedimentos e suspeições que vigora para os juízes, com as necessárias adaptações.
Para não perder mais tempo com o que é óbvio, vamos assentar em que nunca um Engenheiro Mecânico que trabalha para a ré Seguradora, como é o caso de B. A., poderia fazer uma perícia singular nestes autos, pois como vimos supra um perito está numa posição muito parecida à de Juiz (arts. 115º e 119º CPC). Cabia à ré, se estivesse de facto convicta que este acidente foi simulado, com intuitos fraudulentos, ter feito duas coisas: primeiro, ter alegado isso mesmo, abertamente, na contestação, o que não fez; depois, tendo o autor logrado fazer a prova dos factos constitutivos do seu alegado direito, nos termos do art. 346º CC deveria a ré opor contraprova a respeito dos mesmos factos, destinada a torná-los duvidosos; se o conseguisse era a questão decidida contra a parte onerada com a prova. Ou seja, deveria a ré requerer prova pericial singular ou colegial, caso em que ela teria sido produzida, de forma válida, ou por um perito isento e independente das partes, ou por um colégio de peritos, sendo que cada parte indicaria o seu e o Tribunal nomearia o terceiro. O que também não fez. Assim, a ré só se pode queixar de si própria. Não poderia certamente esperar que, arrolando como testemunha um Engenheiro mecânico que trabalha para si e que não presenciou o acidente, o Tribunal fosse dar crédito a tal juízo pericial, apesar de mortalmente ferido pelo pecado da parcialidade.
Mas, dito isto, temos também de dizer que não somos adeptos de um formalismo cego e rígido, castrante da substância, que é o que verdadeiramente interessa. E assim, admitimos que, apesar de tudo o que dissemos, se a referida testemunha tivesse convincentemente apontado contradições sérias, falhas graves e incongruências manifestas aos outros meios de prova, esta Relação não deixaria de daí retirar as devidas consequências no âmbito do julgamento da matéria de facto.
Aliás, nem o próprio Tribunal recorrido desprezou liminarmente, por razões estritamente processuais, o conteúdo das declarações de B. A.. Pelo contrário, apesar de ter começado por chamar a atenção para que, nestas matérias de índole técnica, são necessárias, na sua averiguação, exigências suplementares de credibilidade, posteriormente analisou ao detalhe as referidas declarações, e explicou porque razão veio a entender que as mesmas não foram suficientes para destruir a prova feita pelo autor. Assim, o Tribunal recorrido fundamentou convincentemente porque razão não deu credibilidade ao afirmado pela referida “testemunha”, nos seguintes tópicos: a) o facto alegado de os danos existentes nas viaturas não se coadunarem com a dinâmica do acidente descrita pelo autor; b) as posições em que os veículos se quedaram não são compatíveis com a dinâmica do acidente nos moldes relatados, atentas as forças geradas pelo impacto; c) a configuração dos danos existentes no pára-choques do “PH” ser incompatível com o formato dos danos que o “QU” apresentava; d) o argumento do embate no poste sem deixar neste danos; e) o argumento retirado da inexistência no pavimento de marcas causadas pela fricção das jantes após o respectivo pneu ter rebentado; f) a referência ao derramamento de óleo; g) a questão dos air-bags; h) e a divergência entre os quilómetros registados no odómetro do “QU” e os registados no sistema de retenção dos “airbags” e dos pré-tensores.
Não só não vemos onde esteja aqui o erro no julgamento da matéria de facto, como secundamos totalmente o raciocínio do Tribunal recorrido.
Vamos apenas tentar reforçar uma ou duas ideias já expostas na sentença recorrida.
Primeiro, apesar de a recorrente, na sua contestação, não ter alegado que este acidente tenha sido encenado, para a prejudicar, todas as suas alegações de recurso o pressupõem. Ora, esse cenário, o de estarmos perante um acidente encenado, implica necessariamente uma actuação concertada e dolosa dos dois condutores, e o transporte dos dois veículos já previamente acidentados para o local, em dois reboques. Se juntarmos a isto a escolha do local, a necessidade de ter contratado porventura mais um ou dois cúmplices para ajudar no transporte e colocação no local dos veículos acidentados, estaremos perante uma operação de pesada e complicada logística, quase diríamos, de natureza militar ou paramilitar. O que não faz sentido.
Também não faz muito sentido, neste cenário, a escolha do local para a encenação, onde se podem ver algumas habitações, e onde havia por isso o sério risco de terceiros se aperceberem das estranhas movimentações de colocação de dois veículos acidentados no local. A serem verdadeiras as suspeitas da ré/recorrente, faria muito mais sentido que os autores da encenação tivessem ido colocar os veículos num sítio ermo, onde não existissem casas à volta.

Por outro lado, a natureza aparentemente científica dos cálculos constantes do relatório pericial junto a fls. 281 e seguintes dependeria do mesmo rigor absoluto na aquisição dos dados iniciais. Ora, esse rigor não existe de todo. Os únicos dados objectivos seguros são o local de imobilização dos veículos. Tudo o mais, velocidade, travagens, sítios de embate, são sempre informações aproximadas, transmitidas por via testemunhal. Daí que também por aí não possa ser dada credibilidade ao “depoimento” da “testemunha” B. A., nem ao relatório pericial.

Finalmente, a tese da encenação total do acidente, para ser aceite, implicaria concluir que os condutores dos dois veículos acidentados mentiram deliberadamente em audiência de julgamento. Ora, o Tribunal recorrido não só não considerou que eles tivessem mentido, como deu credibilidade aos respectivos depoimentos. E lendo as conclusões do recurso, verificamos que a recorrente não atacou a credibilidade desses depoimentos, aceitando-os tacitamente.

Assim, consideramos que a sentença recorrida elaborou um correcto e bem fundamentado julgamento da matéria de facto, que não merece censura. Assim, os factos provados sob os pontos 7 e 24 a 30, consideram-se definitivamente assentes.

A recorrente impugna também o facto provado 4 (acordaram A. e R. que o capital seguro no âmbito da cobertura do risco de “choque, colisão e capotamento” ascendia a 32.200 €, tendo sido estabelecida uma franquia de 2% sobre o capital seguro, num mínimo de € 250,00).

O Tribunal explica assim a decisão: o facto nº 4 já se encontrava assente por acordo das partes e por documentos com força probatória plena (designadamente, a apólice do seguro e as respectivas cláusulas, constantes de fls. 110-verso e segs).

A recorrente vem dizer que não podia esse artigo 4º dos factos provados merecer a concreta redacção que lhe foi conferida. E isto porque, afirma, do teor da fundamentação da decisão resulta que este facto foi julgado assente por acordo das partes. Porém, analisada a contestação, verifica-se que assim não sucedeu, pois em lado algum daquele articulado se refere que “acordaram A. e R. que o capital seguro no âmbito da cobertura do risco de choque, colisão e capotamento, ascendia a Euro 32.200,00”. Assim, entende a recorrente que deveria o referido artigo 4º dos factos provados ter sido julgado provado, mas com o seguinte teor: ”o capital seguro no âmbito da cobertura de risco de “choque, colisão e capotamento” ascendia a 32.200€, tendo sido estabelecida uma franquia de 2% sobre o capital seguro, num mínimo de € 250,00”.

Ora, sobre isto, responde o recorrido que, da análise da fundamentação proferida pelo Meritíssimo Juiz a quo, verifica-se que o mesmo quando refere que o artigo 4º dos factos provados foi julgado assente por acordo das partes, não se está a referir ao facto do capital seguro no montante de € 32.200,00, ter ou não sido aceite no articulado de contestação da Apelante, mas outrossim, ao facto, de tal valor ter sido acordado entre o Apelado e a Apelante aquando da celebração do contrato de seguro aqui em discussão e que levou a que na respectiva apólice constasse que o capital seguro no âmbito da cobertura de risco de choque, colisão e capotamento, ascendia a € 32.200,00. Assim, entende que não deve ser admitida a alteração da redacção do ponto nº 4.

Ora, não há muito a dizer, por ser óbvio que assiste razão ao recorrido. A fls. 109 verso a ré e ora recorrente veio juntar cópia do contrato celebrado com o autor, e a fls. 111 consta o âmbito da cobertura, tal como o Tribunal verteu no ponto nº 4 dos factos provados. Ora, o que é um contrato senão um acordo de vontades ? Qualquer cláusula inserida num contrato foi, por definição, acordada entre as partes, até prova em contrário.

A questão que se poderia colocar é o porquê de a recorrente vir suscitar esta questão, sugerindo uma outra redacção para o facto provado nº 4 que, bem vistas as coisas, é idêntica na substância à que o Tribunal adoptou.

Recordemos:

a) facto provado nº 4: “acordaram A. e R. que o capital seguro no âmbito da cobertura do risco de “choque, colisão e capotamento” ascendia a 32.200 €, tendo sido estabelecida uma franquia de 2% sobre o capital seguro, num mínimo de € 250,00”;

b) correcção sugerida: ”o capital seguro no âmbito da cobertura de risco de “choque, colisão e capotamento” ascendia a 32.200€, tendo sido estabelecida uma franquia de 2% sobre o capital seguro, num mínimo de € 250,00”.

Com a correcção sugerida, a recorrente parece querer apresentar o capital seguro e o respectivo valor como um dado objectivo, como algo independente da vontade humana, como o crescimento dos cristais ou a velocidade da luz no vácuo. Não é: o referido valor tem origem apenas na vontade humana. É um puro produto do acordo das partes, consta de um documento que contém as cláusulas do mesmo, e que se mostra assinado pelas partes contratantes. Curiosamente, a recorrente não impugna os factos provados nº 41 e 42, que, recordemos, têm o seguinte teor:

41- Aquando da celebração do seguro, o A. deslocou-se a um mediador de seguros da R. e este, após apurar as características do veículo “QU”, atribuiu-lhe o valor de 32.200 €.
42- Tendo o A. concordado com tal valor.

E, fundamentando esta decisão, escreve o M.mo Juiz a quo: “no tocante aos “factos provados” nºs. 41 e 42, o A., em declarações de parte, deu conta que interveio directamente na celebração do contrato de seguro em causa, tendo contactado, para o efeito, com mediador de seguros. Mais referiu que o valor que consta do contrato foi adiantado pelo referido mediador do seguro. O A. explicou que, tendo-lhe sido apresentado esse valor, limitou-se a com ele concordar, nada tendo oposto. Note-se, neste particular, que o valor indicado na apólice não consubstancia um número “redondo”. O valor seguro é, precisamente, de “32 200 €”. Ora, se fosse o A. a indicar esse valor, certamente não o faria com a inclusão dos 200 euros ali aludidos. Daqui se deduz que o valor em causa terá sido alcançado automaticamente pelo programa informático que procede à simulação do seguro face às características do veículo e às coberturas peticionadas, tal como comummente sucede. Daqui decorre que não foi o A. quem indicou o valor constante da apólice – quanto muito, deu a sua anuência ao valor alcançado pela simulação efectuada”.

Assim, ficou definitivamente assente que o valor atribuído ao veículo QU foi indicado pelo mediador da ré, e que o autor concordou com o mesmo, pois assinou o contrato.

Daqui decorre, em linha recta, que a redacção dada pelo Tribunal recorrido ao facto provado nº 4 seja intocável, pois não pode restar a menor dúvida a quem quer que seja que o referido valor foi objecto de acordo das partes (não alcançado nos articulados, mas sim muito antes, na celebração do contrato), pois foi incluído expressis verbis no contrato que ambas subscreveram.

E por nos parecer óbvio que assim é, nem iremos apreciar a aplicação à situação dos autos do disposto no art. 3º do DL 214/97 de 16 de Agosto (1).
A explicação para a insistência da recorrente neste ponto que deveria ser pacífico tornar-se-á perceptível quando chegarmos à apreciação da matéria de direito.

Assim, também esta parte do recurso improcede.

E assim, a totalidade do recurso sobre matéria de facto improcede.

O Direito

Quanto à aplicação do Direito aos factos provados, o Tribunal começou por considerar isento de dúvida -sendo que autor e ré concordam nesse aspecto- que estamos perante uma situação de “perda de total”: ou seja, a reparação do “QU” é economicamente inviável, por o seu custo suplantar o valor do próprio veículo.

Estamos perante um contrato de seguro que integra, na parte que aqui importa, o tipo denominado “seguro de danos” (cfr. Título II do RJCS – arts. 123º a 174º). O art. 128º de tal diploma estipula que “a prestação devida pelo segurador está limitada ao dano decorrente do sinistro até ao montante do capital seguro”.

Já o art. 130º preceitua que:

“1. No seguro de coisas, o dano a atender para determinar a prestação devida pelo segurador é o valor do interesse seguro ao tempo do sinistro.
2. No seguro de coisas, o segurador apenas responde pelos lucros cessantes resultantes do sinistro se assim for convencionado
3. O disposto no número anterior aplica-se igualmente quanto ao valor de privação de uso do bem.”

Por outro lado, o art. 131º (“Regime Convencional”) estipula que:

“1. Sem prejuízo do disposto no artigo 128º e no nº 1 do artigo anterior, podem as partes acordar no valor do interesse seguro atendível para o cálculo da indemnização, não devendo esse valor ser manifestamente infundado.”

O citado art. 128º consagra o chamado “princípio indemnizatório”; tal princípio visa evitar um enriquecimento do segurado com o sinistro nos seguros de danos em coisas.

O anterior regime continha uma disposição que também consagrava o mesmo princípio – mais propriamente, o art. 435º do Código Comercial, que estipulava: “Excedendo o valor do objecto segurado, só é válido até à ocorrência desse valor.”.

Contudo, o nº 1 do citado art. 131º do RJCS expressamente prevê a admissão genérica de derrogação esse princípio indemnizatório, consagrando a prevalência sobre este do princípio da liberdade contratual.
Visto isto, importa, atentas aquelas disposições legais e o disposto no artigo 342º do CC, decidir a quem compete o ónus da prova do valor do bem abrangido pela cobertura do seguro.

Não está em causa, face ao disposto no art. 128º (e não havendo acordo em contrário), que o segurador, atento o referido princípio indemnizatório, apenas é obrigado a pagar o valor da coisa no momento do sinistro.

No entanto, desse preceito não decorre, ainda que conjugado com o nº 1 do art. 342º do CC (o qual estabelece que cabe àquele que invocar um direito a prova dos respectivos factos constitutivos), que seja sempre o segurado que tem o ónus de provar o valor da coisa ao tempo do sinistro.

Assim sendo, importa distinguir as situações consoante a forma como foi fixado o valor do bem no contrato: mais concretamente, cumpre averiguar se o valor foi indicado pelo tomador de seguro ou se foi fixado por acordo entre tomador e seguradora.

Como decorre do citado art. 131º do RJCS e, bem assim, do art. 405º do CC, nada impede que as partes estipulem o valor do bem objecto do contrato. Quando assim ocorre, o segurado não tem de provar qual o valor do bem, precisamente por este ter sido fixado por acordo das partes.

Por isso, o segurado apenas tem de provar, como elemento constitutivo do seu direito, que o valor do bem objecto do seguro foi fixado por acordo das partes ou pelo segurador.

No plano dos princípios, a indemnização deve corresponder, numa primeira linha, ao valor do seguro, sendo certo que foi em função dele que o segurador recebeu o prémio.

Assim, o segurado só tem de provar o valor do bem na data do sinistro quando o valor tenha sido indicado por ele aquando da celebração do contrato (cfr., neste sentido, o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 13-6-2013, disponível em “www.dgsi.pt”).

No caso em apreço, perante a matéria dada por provada, temos que considerar que o valor do bem foi fixado por acordo das partes (cfr. os “factos provados” nºs. 42 e 43 e, bem assim, o “facto não provado” nº 4).
Consequentemente, o valor do bem segurado a atender para este efeito será o resultante desse acordo.

No caso dos autos, estando em causa uma situação de “perda total”, forçoso é concluir que a R. está obrigada a pagar ao A. o valor do capital seguro previsto - por acordo das partes - no âmbito da cobertura do risco de “choque, colisão e capotamento, ou seja, 32 200 €, conforme decorre do “facto provado” nº 4.
A este montante deverá descontar-se o valor da franquia contratualmente estabelecida, ou seja, 644 €, correspondente a 2% do capital seguro, nos termos do referido “facto provado” nº 4.
Além disso, também deverá descontar-se o valor do salvado, que ficou na posse do A., no montante apurado de 3.000 € - cfr. “facto provado” nº 32 - , assim se evitando o duplo enriquecimento pelo A. pelo mesmo facto danoso.

Nesta perspectiva, deverá a R. ser condenada a pagar ao A. a quantia de 28.556 € (ou seja, 32.000 - 3.000 - 644).

A recorrente insurge-se contra este valor fixado a título de indemnização pela perda total, naquilo que chama “o sobresseguro”. Concretizando, diz a recorrente: “considerou o Mmo. Tribunal “a quo” que a R. estava obrigada a pagar ao A. “o valor do capital seguro previsto – por acordo das partes – no âmbito da cobertura do risco de “choque, colisão e capotamento”, ou seja, Euro 32.200,00”, valor a que teria de ser descontado o valor da franquia correspondente a 2% do capital seguro, bem como o valor do salvado que ficou na posse do A., o que redundou no valor total de Euro 28.556,00”.

Porém, ficou provado que à data do evento, o valor venal (comercial) do veículo QU era de Euro 20.000,00 (facto provado n.º 43). É, afirma, um caso de sobresseguro. E o princípio do indemnizatório encontra-se previsto no artigo 128º do Decreto-Lei 72/202, de 16/04 (RJCS), preceito que determina que: “a prestação devida pelo segurador está limitada ao dano decorrente do sinistro até ao montante do capital seguro”. Assim, sempre seria de considerar o valor assim alcançado do veículo, para efeitos de indemnização e não o valor do capital máximo seguro constante da apólice. Pelo que entende que o valor de referência para a indemnização deveria ser Euro 20.000,00, havendo que descontar o valor do salvado (Euro 3.000,00) e o da franquia (Euro 644,00), o que perfaz uma quantia indemnizatória de Euro 16.356,00.

Sobre esta pretensão pronuncia-se o recorrido, nos seguintes termos: “…o princípio plasmado no disposto no artigo 128º do RJCS, visa evitar as situações de sobresseguro. Todavia, conforme o Meritíssimo Juiz a quo explanou e bem na sua Douta fundamentação, tal princípio, pode ser derrogado pelo princípio plasmado no artigo 131º do referido diploma que refere no seu número 1 que, “Sem prejuízo do disposto no artigo 128º e no nº 1 do artigo anterior, podem as partes acordar no valor do interesse seguro atendível para o cálculo da indemnização, não devendo esse valor ser manifestamente infundado. O que significa que, caso as partes acordem no valor do bem objecto do contrato, é este o valor a considerar para efeitos indemnizatórios e não o valor da coisa no momento do sinistro. Assim, nos casos em que as partes acordam no valor do bem objecto do contrato, é este o valor a considerar para efeitos indemnizatórios. Daí que, conforme decorre dos artigos 4º, 41º e 42º dos factos provados e artigo 4º dos factos não provados, Apelante e Apelado acordaram que o capital seguro no âmbito da cobertura do risco de choque, colisão e capotamento, ascendia ao montante de € 32.200,00”.

Também aqui pensamos que a sentença recorrida não merece censura.

Vejamos. Provou-se que autor e ré celebraram o referido contrato de seguro, nos termos do qual o autor transferiu para a ré a responsabilidade civil decorrente da circulação rodoviária do veículo de matrícula “QU”, sendo que ainda acordaram que tal contrato cobriria, igualmente, o risco de “choque, colisão e capotamento” daquela viatura, com o capital seguro no âmbito dessa cobertura a ascender a 32.200 €, com uma franquia de 2% sobre o capital seguro, num mínimo de € 250,00. Como bem se afirma na sentença recorrida, estamos perante um contrato de seguro que integra, na parte que aqui importa, o tipo denominado “seguro de danos” (cfr. Título II do RJCS – arts. 123º a 174º).

Como vimos, ocorreu uma colisão. Dessa colisão, atentos os valores provados, resultou a perda total do objecto seguro.

Daí, o Tribunal recorrido concluiu que a ré está obrigada a pagar ao autor o valor do capital seguro previsto, no âmbito da cobertura do risco de “choque, colisão e capotamento, ou seja, € 32.200,00.

A recorrente opõe-se a esta interpretação, invocando o disposto no art. 128º RJCS, defendendo que “a prestação devida pelo segurador está limitada ao dano decorrente do sinistro”.

Só que, para nós o principal argumento, como bem refere a decisão recorrida, é que no plano dos princípios a indemnização deve corresponder numa primeira linha ao valor do seguro, sendo certo que foi em função dele que o segurador recebeu o prémio. O mais óbvio sentido de justiça equitativa assim impõe.

E não só: a decisão recorrida fez uma correcta interpretação da lei, pois o art. 128º citado, que contém o princípio indemnizatório, admite as derrogações constantes do art. 131º,1,2 do mesmo diploma.

Como escreve Pedro Martinez (Lei do Contrato de Seguro Anotada, fls. 370), “o nº 1 prevê a admissão genérica de derrogações ao princípio indemnizatório. Portanto, admitindo a prevalência sobre o princípio indemnizatório do princípio da autonomia da vontade, fixa-lhe todavia um limite racional (a razoável correspondência do valor acordado ao valor real), por forma a garantir o fim último do princípio indemnizatório – a prevenção do enriquecimento do segurado com o sinistro, logo, dos sinistros fraudulentos, logo, a desordenação social. Solução aliás comum às leis do direito comparado próximo, que expressa e genericamente aceitam derrogações ao princípio indemnizatório. (…) Naturalmente, o valor estimado da coisa começará por ser indicado pelo tomador do seguro (nº 2 do art. 49º, por analogia), mas sujeitando-se à aceitação do segurador (2)”.

Nada resultou provado que ponha em causa a razoabilidade do valor obtido por acordo das partes, muito pelo contrário, atenta a conhecida rápida deterioração do valor dos veículos automóveis.

Como se pode ler no Acórdão do STJ de 8-6-2017 - Abrantes Geraldes (Relator), “embora vigore no regime do contrato de seguro de danos o princípio indemnizatório (art. 439.º do CCom e art. 128.º da LCS), nos termos do qual a Seguradora apenas responde pelo valor do dano realmente causado, tal não afasta a possibilidade de as partes estabelecerem acordo prévio quanto ao valor do bem para esse efeito (valor estimado).
Foi o que aqui sucedeu.
E assim, não vislumbramos qualquer erro na aplicação do Direito feita pela sentença recorrida.

Com o que o recurso improcede integralmente.

V- DECISÃO

Por todo o exposto, este Tribunal da Relação de Guimarães decide julgar o recurso improcedente, confirmando na íntegra a sentença recorrida.

Custas pela recorrente (art. 527º,1,2 CPC).
Data: 19/9/2019

Relator (Afonso Cabral de Andrade)
1º Adjunto (Alcides Rodrigues)
2º Adjunto (Joaquim Boavida)



1. Este diploma “institui regras destinadas a assegurar uma maior transparência nos contratos de seguro automóvel que incluam coberturas facultativas relativas aos danos próprios sofridos pelos veículos seguros” (art. 1º). No artigo 2º dispõe que “o valor seguro dos veículos deverá ser automaticamente alterado de acordo com a tabela referida no artigo 4.º, sendo o respectivo prémio ajustado à desvalorização do valor seguro”. E no seu art. 3º acrescenta: “a cobrança de prémios por valor que exceda o que resultar da aplicação do disposto no número anterior constitui, salvo o disposto no artigo 5.º, as seguradoras na obrigação de responder, em caso de sinistro, com base no valor seguro apurado à data do vencimento do prémio imediatamente anterior à ocorrência do sinistro, sem direito a qualquer acréscimo de prémio e sem prejuízo de outras sanções previstas na lei”.
2. Sublinhado nosso.