Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1643/19.4T8BGC.G1
Relator: ROSÁLIA CUNHA
Descritores: SOCIEDADE COMERCIAL
DIMINUIÇÃO DO PATRIMÓNIO DA SOCIEDADE
LEGITIMIDADE PROCESSUAL DO SÓCIO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 07/06/2020
Votação: VOTAÇÃO SINGULAR
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I - A legitimidade, enquanto pressuposto processual que se exprime através da titularidade do interesse em litígio, exige que apenas se considere parte legítima como autor quem tiver interesse pessoal e direto em contradizer, não bastando um interesse indireto, reflexo, conexo ou derivado.
II - O interesse do sócio na não diminuição do património da sociedade não é um interesse direto, sendo antes um interesse meramente reflexo, indireto ou conexo.
III – Por isso, o sócio não é dotado de legitimidade ativa para instaurar providência cautelar com vista a impedir o uso e consequente desvalorização de veículos pertencentes à sociedade, cabendo tal legitimidade à sociedade por ser ela a titular da relação jurídica controvertida na vertente ativa e, consequentemente, ser quem detém interesse direto em demandar.
Decisão Texto Integral:
O recurso foi admitido na espécie, com o efeito e regime de subida adequados, nada obstando ao seu conhecimento.
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Uma vez que no presente recurso se suscita questão que entendemos se revestir de simplicidade, será proferida decisão sumária, nos termos do artigo 656º do Código de Processo Civil.

RELATÓRIO

M. J. instaurou o presente procedimento cautelar contra E. J. pedindo:

- que se ordene imediatamente a remoção do veículo ligeiro de mercadorias da marca Toyota, matrícula DC, e do trator de marca Newland, matrícula DT, uma vez que os mesmos estão na disponibilidade e a ser utilizados em exclusivo pelo requerido na sua própria atividade e não da sociedade, não estando a sociedade a cumprir o seu objeto;
- devendo os mesmos veículos serem entregues a uma terceira pessoa, fiel depositário, até efetiva dissolução da sociedade, evitando-se assim ainda maiores prejuízos para o requerente;
- proibindo-se ambos, requerente e requerido de com eles circularem ou os utilizarem.

Como fundamento dos seus pedidos alega, em síntese, que o requerente e o requerido são os únicos sócios da sociedade E. J. & M. J. – Construções, Lda., exercendo ambos as funções de gerente.
Os veículos atrás referidos são propriedade da sociedade.
Na sequência de desentendimentos entre ambos os sócios, o requerente intentou contra o requerido a ação que correu termos sob o nº 196/18.5T8BGC, em que foi realizada transação, homologada por sentença, nos termos da qual requerente e requerido se obrigavam mutuamente a requerer perícia às contas da referida sociedade, bem como, nessa sequência, a dissolvê-la e liquidá-la depois de averiguadas as respetivas contas, sendo que tal perícia se mostra, no entanto, significativamente atrasada, estando o requerido a utilizar as referidas viaturas em seu proveito, ao arrepio do objeto social da sociedade, e estando tais veículos a desvalorizar-se progressivamente.
Desconhecendo-se em que momento o acordo constante da transação será cumprido e com vista a evitar que aquando da liquidação da sociedade os veículos não tenham qualquer valor, o requerente considera que deve ser ordenada a providência requerida.
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Regularmente citado, o requerido deduziu oposição, na qual, entre outras coisas, invocou a ilegitimidade ativa do requerente para instaurar o presente procedimento cautelar porquanto as viaturas são propriedade da referida sociedade, a qual não é parte na ação.
Assim, a relação material controvertida existe entre a sociedade e o requerido, sendo o requerente parte ilegítima e sendo tal ilegitimidade insanável, na medida em que é singular.
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O requerente apresentou resposta alegando que o que está em causa é o seu interesse individual como sócio da referida sociedade, na medida em que já existe uma transação judicial homologada por sentença, nos termos da qual ambos os sócios se comprometeram com a dissolução e liquidação da sociedade.
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Foi proferido despacho que apreciou a exceção de ilegitimidade e considerou que a titular da relação material controvertida é a sociedade, só ela tendo interesse em demandar, pelo que decidiu nos seguintes termos:

“Pelo exposto, decide o Tribunal julgar procedente a excepção dilatória de ilegitimidade activa singular deduzida pelo Réu, E. J., na respectiva Oposição, e, em conformidade, absolver o Demandado da instância nos termos dos artigos 30º nº1 e 3, 278º nº1 alínea d), 279º, 576º nº1 e 577º nº1 alínea e) do CPC.”.
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O requerente não se conformou e interpôs o presente recurso de apelação, tendo terminado as suas alegações com as seguintes conclusões:

“15 – Dão-se por inteiramente reproduzidos os termos supra expostos.
16 – O tribunal recorrido, ao decidir como o fez, com o devido respeito, andou mal – artº 639, nº 2 do CPC.
17 –Entende o Tribunal, que parte legitima do lado do A. seria a sociedade e não o requerente, já que as máquinas em causa são propriedade da sociedade e não de nenhum dos sócios, pelo que, com a desvalorização das mesmas máquinas, quem perderia seria a sociedade.
18 – Ora, humildemente, entendemos que existe aqui um lapso de entendimento: quando se pede na providência que os veículos sejam entregues a um fiel depositário, pretende-se tão só que os mesmas sejam entregues a alguém que não os utilize, que as conserve para que não desvalorizam além do normal (do resultante da idade);
19 – E é importante acautelar o máximo de valor das mesmas viaturas pelo seguinte:
A - Aquando da dissolução, se vier a ser apurado a existência de compromissos e débitos para com terceiros e até para com os sócios, será utilizado o valor das máquinas para satisfação de tais encargos, sob pena de serem os sócios individualmente – hipoteticamente - a terem que acarretar com tais despesas;
B- Ainda que tal não venha a acontecer, isto é que não existam débitos, será sempre conveniente manter o valor dos bens como forma de distribuir igualmente por ambos os sócios o produto da venda dos mesmos, já que ambos os sócios tiveram despesas quando adquiriram os bens necessários para por a empresa a laborar;
C- E evitando-se assim que um sócio saia muito beneficiado, (pois há uma década que utiliza em exclusivo as ditas máquinas, enriquecendo o seu património pessoal) e o outro, quando for chamado a receber, nada receberá por as mesmas nada ou pouco valerem e estar até sujeito a pagar do seu próprio bolso.
20 – Assim sendo, o que está em causa, é a posição e situação concreta do requerente M. J., sendo indiferente se intervém como sócio ou não.
21 - Sendo certo que, não tendo ele maioria no capital social da sociedade, nunca conseguiria aprovar uma proposta de a sociedade intentar uma ação contra o sócio requerido, exatamente porque a este nunca lhe conviria e seria sempre ele a inviabilizar tal maioria em assembleia geral.
22 – Assim sendo, não entendemos que outro tipo de meio judicial poderíamos utilizar e em que termos, já que (de facto) uma tomada de posição dessas pela própria sociedade, no limite, estaria sempre inviabilizada;
23 – Restando-nos a possibilidade de ser o próprio M. J. a intentar o processo, já que é de facto ele e só ele o verdadeiro prejudicado com a atual situação: ou porque terá que suportar os custos caso a sociedade não o consiga fazer em consequência da falta ou desvalorização dos bens ou porque ficará diminuída a possibilidade de receber aquando da divisão dos mesmos em consequência da dissolução/partilha.
25 – Aliás, note-se que logo na clausula 1ª – A) da transação/acordo, ficou decidido que a perícia visava exatamente “avaliação dos bens, nomeadamente dos veículos automóveis”, o que significa que a partir da transação, também os sócios têm obrigações e direitos próprios, individuais, sendo que intervieram nessa qualidade.
26 – Salvo melhor opinião, o Tribunal não fez a melhor interpretação quando na sentença considera “…o prejuízo dificilmente reparável que é invocado é o da desvalorização das viaturas, o qual afeta obviamente a dona das mesmas, ou seja, a sociedade…”
27 – Não, o prejuízo dificilmente reparável que é invocado na pi. é o do sócio M. J., que devido ao comportamento do ouro sócio, corre o risco de ter que pagar do seu bolso os encargos da sociedade aquando da liquidação e de nada ou pouco receber na partilha dos bens e em consequência dessa dissolução/liquidação.
28 –Teria razão o tribunal se não estivéssemos num contexto de dissolução, liquidação e partilha da sociedade em que, aí sim, a desvalorização das máquinas afetaria a sociedade,
29 – No caso presente, os processos judiciais existem porque a sociedade de facto já não funciona, não existe, as máquinas não estão ao seu serviço e ambos os sócios acordaram formalmente e juridicamente resolver uma situação que já este - dissolução e partilha.
30 – Significa isto que neste momento o interesse em causa é o dos sócios, até porque, a vingar a tese do Tribunal, assim sendo a justiça não funcionaria já que seria impossível o recurso a Tribunal e a satisfação dos legítimos interesses do requerente.
31 – O tribunal violou desta forma o artº 30 do CPC, devendo esta norma ser interpretada no sentido de que o recorrente tem todo o interesse em demandar e é por isso parte legitima neste processo.
32 – Porque foi assim que a relação material controvertida foi apresentada pelo requerente, sem que exista legislação ou norma que determine o contrário - nº 3 do artº 30 citado.
33 – Sendo certo que entende a jurisprudência e a doutrina, que há interesse processual, sempre que há interesse em agir, sempre que se demonstra a necessidade de usar do processo.
34 - Não há duvidas que no caso presente, o recorrente M. J. tem todo o interesse em agir, pois ao fim e ao cabo, num contexto de dissolução da sociedade inativa, e que é o que está em causa, está a ser muito prejudicado e sairá ainda mais prejudicado devido à conduta do requerido E. J. e por isso tem todo o interesse em reagir judicialmente e daí a sua legitimidade para o presente processo – ele tem o direito e o dever de tudo fazer para acautelar o valor dos bens (dos poucos que restam) da sociedade para que os mesmos venham a desempenhar a sua função aquando da partilha e liquidação da sociedade.
35 – Entender o contrário, é negar aos cidadãos o recurso ao tribunal para defesa dos seus legítimos interesses e deixa-los de mãos completamente atadas.
36 – Se o requerente nada fizer em termos de travar a conduta do requerido, não há dúvidas que sairá muito prejudicado de uma situação que está a tempo de tentar evitar.
37 – Pelo que não deve haver lugar a qualquer absolvição da instância por parte do recorrido e o processo deve seguir os seus termos até final, já que duvidas não restam de que o recorrente tem todo o interesse processual em consequência de uma manifesta e comprovada necessidade de agir.
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Não foram apresentadas contra-alegações.

OBJETO DO RECURSO

Nos termos dos artigos 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do CPC, o objeto do recurso está delimitado pelas conclusões contidas nas alegações dos recorrentes, estando vedado ao Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso, sendo que o Tribunal apenas está adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objeto do recurso.
Nessa apreciação o Tribunal de recurso não tem que responder ou rebater todos os argumentos invocados, tendo apenas de analisar as “questões” suscitadas que, por respeitarem aos elementos da causa, definidos em função das pretensões e causa de pedir aduzidas, se configurem como relevantes para conhecimento do respetivo objeto, excetuadas as que resultem prejudicadas pela solução dada a outras.
Por outro lado, o Tribunal não pode conhecer de questões novas, uma vez que os recursos visam reapreciar decisões proferidas e não analisar questões que não foram anteriormente colocadas pelas partes.

Neste enquadramento, a questão relevante a decidir consiste em saber se o requerente tem legitimidade ativa para instaurar o presente procedimento cautelar.

FUNDAMENTAÇÃO

FUNDAMENTOS DE FACTO

Para além dos factos já referidos no relatório, relevam ainda para a decisão a proferir os seguintes factos, que resultam do acordo das partes e dos elementos juntos aos autos:

1. O veículo ligeiro de mercadorias da marca Toyota, matrícula DC, e o trator de marca Newland, matrícula DT, são propriedade de E. J. & M. J. – Construções, Lda. (acordo das partes).
2. Requerente e requerido celebraram transação no âmbito do processo nº 196/18.5T8BGC, a qual foi homologada por sentença, conforme cópia da ata junta aos autos e que aqui e dá por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais, tendo acordado, entre outras cláusulas que se comprometem “a dissolver e a liquidar a sociedade no prazo de seis meses a contar do recebimento do relatório pericial referido em 1)”(cópia da ata de tentativa de conciliação realizada no processo 196/18.5T8BGC junta com o requerimento inicial).
3. A sociedade E. J. & M. J. – Construções, Lda. foi constituída com o capital social de € 30 0000 e tem como sócios E. J. e M. J., detendo cada um uma quota no valor de € 15 000, sendo a gerência exercida por ambos (certidão da CRP relativa à sociedade junta com a oposição).
4. Não se mostra registada quanto à referida sociedade a dissolução e liquidação ou o encerramento da liquidação (certidão da CRP relativa à sociedade junta com a oposição).

FUNDAMENTOS DE DIREITO

Cumpre apreciar e decidir.

O recorrente considera que tem interesse em agir e que é parte legítima no procedimento cautelar, apesar de os bens pertencerem à sociedade, porque existe um contexto de dissolução da sociedade inativa e o requerente está a ser muito prejudicado devido à conduta do requerido , tendo o requerente o direito e o dever de tudo fazer para acautelar o valor dos poucos bens que restam da sociedade para que os mesmos venham a desempenhar a sua função aquando da partilha e liquidação da sociedade, sendo que o interesse que importa acautelar é o do sócio.

Importa, então, apurar se o requerente é dotado de legitimidade ativa para instaurar o procedimento cautelar.

Quanto ao conceito de legitimidade, dispõe o art. 30º, do CPC, que:

1 - O autor é parte legítima quando tem interesse direto em demandar; o réu é parte legítima quando tem interesse direto em contradizer.
2 - O interesse em demandar exprime-se pela utilidade derivada da procedência da ação e o interesse em contradizer pelo prejuízo que dessa procedência advenha.
3 - Na falta de indicação da lei em contrário, são considerados titulares do interesse relevante para o efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor.

Da leitura desta norma, conclui-se, utilizando as palavras de Castro Mendes (in Direito Processual Civil, Vol. II, págs. 187 e 192) que “a legitimidade é uma posição de autor e réu, em relação ao objecto do processo, qualidade que justifica que possa aquele autor, ou aquele réu, ocupar-se em juízo desse objeto do processo.” (...) Assim, a legitimidade da parte depende da titularidade, por esta, dum dos interesses em litígio”.
No mesmo sentido ensinava o Prof. Alberto dos Reis (in Comentário ao Código de Processo Civil, 2ª edição, Vol. I, pág. 41) que a “questão da legitimidade é simplesmente uma questão de posição quanto à relação jurídica substancial. As partes são legítimas quando ocupam na relação jurídica controvertida uma posição tal que têm interesse em que sobre ela recaia uma sentença que defina o direito.”
A exigência deste requisito pretende acautelar que a causa seja julgada perante os verdadeiros e principais interessados na relação jurídica, tornando-se assim necessário que estejam em juízo, como autor e réu, as pessoas titulares da relação jurídica em causa (Acórdão da Relação de Guimarães, de 18.1.2018, in www.dgsi.pt).
A legitimidade, enquanto pressuposto processual que se exprime através da titularidade do interesse em litígio, exige que apenas se considere parte legítima como autor quem tiver interesse pessoal e direto em contradizer, não bastando um interesse indireto, reflexo, conexo ou derivado.
Por isso, afirmava o Prof. Alberto dos Reis (in Código de Processo Civil Anotado, 3ª edição, Vol. I, pág. 84) que “não basta que a decisão da causa seja suscetível de afetar, por via de repercussão ou por via reflexa, uma relação jurídica de que a pessoa seja titular (...) não basta que as partes sejam sujeitos de uma relação jurídica conexa com a relação litigiosa; é necessário que sejam os sujeitos da própria relação litigiosa.
E exemplificava que se A quer propor uma ação de reivindicação de um prédio contra B, que é possuidor em nome próprio, e que foi dado de arrendamento a C por B, só B é parte legítima na ação como réu porque só B tem interesse direto em contradizer. C tem interesse na ação porque o seu arrendamento pode cessar por via da procedência da ação, mas não é parte legítima porque o seu interesse não é direto, sendo antes um interesse indireto, reflexo ou conexo.
Em idêntico sentido exemplifica o Professor Antunes Varela (in Manual de Processo Civil pág. 135) que “a mulher não terá legitimidade para reivindicar de terceiro os bens próprios do marido, tal como o pai não tem legitimidade para cobrar judicialmente os créditos do filho maior, porque nem uma nem outro são os portadores do interesse tutelado pelo direito invocado” e também “o promitente comprador, por exemplo, não tem legitimidade para requerer a declaração judicial de validade do contrato pelo qual o promitente vendedor adquiriu a coisa (de terceiro), embora tenha um interesse indireto na manutenção do contrato”.
Só quando a lei o prevê é de admitir que possa ter legitimidade para a ação quem tenha apenas interesse indireto no litígio.
No caso em análise, o interesse do requerente em demandar é meramente indireto, conexo ou reflexo não sendo o requerente o titular da relação jurídica controvertida.
Os veículos são propriedade da sociedade E. J. & M. J. – Construções, Lda., a qual é dotada de personalidade jurídica. Como é sabido, a personalidade jurídica das sociedades inicia-se a partir do seu registo definitivo, mantém-se mesmo no decurso da liquidação e apenas termina com a extinção da sociedade, a qual ocorre no momento do registo do encerramento da liquidação (arts. 5º, 146º, nº 2 e 160º, nº 2, do CSC).
No caso, a sociedade não está sequer em liquidação, tendo somente sido acordado que iria ser dissolvida, o que ainda não sucedeu, mantendo a mesma a sua personalidade jurídica e sendo, como tal, sujeito de direitos e obrigações.
Assim, a depreciação do valor dos veículos mercê do uso pelo requerido apenas se repercute de forma direta na esfera jurídica da sociedade posto que tais bens integram o seu património e a desvalorização que os atinja naturalmente que diminui tal património.
Logo, é a sociedade a titular da relação jurídica controvertida na vertente ativa e é ela quem detém interesse direto em demandar.
O interesse do requerente, como sócio, na não diminuição do património da sociedade não é um interesse direto, sendo antes um interesse meramente reflexo, indireto ou conexo.
Compreende-se que o requerente esteja preocupado com a perspetiva de nada vir a receber aquando da partilha da sociedade, quando esta for dissolvida e liquidada, por a mesma não ter património.
Porém, tal preocupação legítima não lhe confere legitimidade para demandar por o seu interesse não ser direto.
O requerente terá que salvaguardar os seus legítimos interesses de sócio e gerente com recurso aos meios que o direito societário lhe faculta para reagir contra eventuais situações abusivas e lesivas de um sócio e gerente, não cabendo porém, ao tribunal indicar-lhe que meios são esses, mas tão só aferir da questão da legitimidade. E esta não ocorre no caso em apreço porque o interesse do requerente, embora pessoal e justificado, é meramente indireto, reflexo ou conexo, o que significa que o requerente não é dotado de legitimidade para instaurar a providência, tal como considerado na decisão recorrida, a qual é, por isso, de manter.
Do exposto se conclui que o requerente não é dotado de legitimidade ativa para instaurar a providência cautelar, pelo que improcede a apelação.
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Improcedendo o recurso, deve o recorrente suportar as custas respetivas, nos termos do art. 527º, nºs 1 e 2, do CPC.

DECISÃO

Pelo exposto, julga-se a apelação improcedente e, em consequência, mantém-se a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente.
Notifique.
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Guimarães, 6 de julho de 2020

(Relatora) Rosália Cunha