Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1269/06.2TBBCL-B.G1
Relator: MARIA LUÍSA RAMOS
Descritores: CUSTAS JUDICIAIS
RECURSO
INDICAÇÃO DO VALOR
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 03/26/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª CIVEL
Sumário: I. Na “Motivação subjacente á Lei nº 7/2012” estatui-se que : “ No âmbito do Memorando de Entendimento.....o estado Português assumiu, entre outras, um conjunto de obrigações relacionadas com o regime das custas processuais, das quais se destaca: ...a padronização das custas judiciais(...). A padronização das custas judiciais visa a aplicação do mesmo regime de custas a todos os processos judiciais pendentes, independentemente do momento em que os mesmos se iniciaram...”
II. Nos termos da actual redacção da norma do artº 12º-nº2 do RCJ, e em confronto com a anterior redacção do artº 11º-nº2 do CCJ, resulta que a indicação pelo recorrente do valor do recurso deixou de constituir um “ónus de impulso”, no sentido de imposição de “comportamento necessário para o exercício de um direito ou realização de um interesse próprio, de cuja realização depende a obtenção de uma vantagem, figura distinta do dever...” – cfr. noção dada em “Dicionário Jurídico”, Vol I, Ana Prata, 5ª edição, Almedina, carecendo de efeito cominatório ou sancionatório a omissão do dever de indicação que se impõe ao recorrente.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

Paula …, co-Autora nos autos de acção declarativa com processo ordinário, nº1269/06.2TBBCL, do 4º Juízo Cível, do Tribunal Judicial de Braga, veio interpor recurso de apelação da decisão que indeferiu parcialmente a reclamação apresentada contra a conta de custas, e, designadamente, decidiu que o valor do recurso para o Tribunal da Relação seria o valor da causa nos termos do disposto no artº 11º-nº2 do CCJ, em virtude do incumprimento de ónus que incumbia à recorrente de indicação do valor da sucumbência a atribuir ao recurso.


O recurso foi recebido como recurso de apelação, com subida em separado e efeito meramente devolutivo.

Nas alegações de recurso que apresenta, a apelante formula as seguintes conclusões:
A.- Estabelece o art.º 12.° nº 2 do Regulamento das Custas Judiciais que" nos recursos o valor é o da sucumbência quando esta for determinável devendo o recorrente indicar o respectivo valor no requerimento de interposição do recurso, nos restantes casos prevalece o valor da acção."
B. - Os restantes casos são aqueles recursos em que o valor da sucumbência não é determinável.
C. - Nos casos em que o valor da sucumbência é determinável é esse o valor do recurso.
D - Nos casos em que o valor da sucumbência não é determinável, como é lógico, o valor do recurso só poderá ser o da acção.
E - Na redacção do art.° 11º do Código das Custas Judiciais, que viria a ser revogado pelo actual Regulamento das Custas Judiciais, aprovado pelo DL. n.º 34/2008 de 26-02, estabelecia-se assim:
"1. - Nos recursos, o valor da causa é o da sucumbência quando esta for determinável, devendo o recorrente indicar o seu valor no requerimento de interposição do recurso.
2. - Se o valor da sucumbência não for determinável ou na falta da sua indicação. o valor do recurso é igual ao valor da acção".
F. - Enquanto no anterior art.º 11º nº 2 do CCJ, se estabelecia, claramente, que na falta de indicação do valor da sucumbência, o valor do recurso seria igual ao valor da acção, na redacção actual não se diz isso.
G. - Mantendo embora a obrigação de indicação por parte do Recorrente do valor do recurso, não estabelece qualquer sanção para a respectiva falta.
H. - Tendo em conta a clareza do preceito anterior, a alteração nos termos descritos só pode querer significar que o legislador entendeu retirar à falta de indicação do valor da sucumbência, a consequência que tinha, na legislação anterior.
I. - Assim, da redacção actual do preceito, impõe-se concluir que se mantém a obrigação de indicar o valor da sucumbência, por razões de boa técnica processual, de simplicidade e clareza, mas caso falte essa indicação, uma vez que o valor da sucumbência está determinado ou determinável, não há razão para que não seja esse o valor do recurso a ter em conta para efeitos de cálculo da taxa de justiça.
J.- Pela simples leitura do requerimento de interposição de recurso fica claro que a utilidade económica do pedido recursório é circunscrita e limitada, pelo que é ajustado que o recorrente só suporte os custos processuais na respectiva proporção.
L. - Com a disposição em análise pretendeu o legislador evitar que a parte recorrente tenha de pagar custas determinadas pelo valor inicial do processo, quando apenas discorda parcialmente da decisão, ou quando está em causa apenas uma parte do valor total do processo. - ARL. De 17/01/2012.
M. - No caso em análise, o valor da sucumbência decorria de mero cálculo aritmético.
N - O despacho recorrido violou o disposto no art.º 12.° nº 2 do Reg. das Custas Judiciais e artº 678°, n.º 1 do CPC.I actual nº 1 do artº 629° do NCPC e art° 20° CRP.
TERMOS EM QUE,
Deve conceder-se provimento ao presente recurso, revogando-se o despacho recorrido, ordenando-se a elaboração de conta por cada um dos AA., a qual deve considerar o valor para efeitos do recurso para o Tribunal da Relação limitado a 155.000,00 € e à A. Paula…e levar em conta o valor pago por esta, em sede de recurso para o STJ, no montante de € 816,00.

Foram proferidas contra-alegações pelo Digno Magistrado do MP, tendo conclui do: ”Considerando que é correta a posição defendida pela recorrente, face à redação do art. 12º, nº 2 do Regulamento das Custas Processuais, deve julgar-se procedente o recurso, ordenando-se a reforma da conta, considerando-se para efeito de recurso para o Tribunal da Relação o valor de 155.000,00€”.

O recurso veio a ser admitido neste tribunal da Relação na espécie e com os efeitos e regime de subida fixados no despacho de admissão do recurso na 1ª instância.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
Delimitação do objecto do recurso: Questões a decidir.
Atentas as conclusões do recurso de apelação deduzidas, e supra descritas, é a seguinte a questão a apreciar:
- reapreciação da decisão recorrida
- falta de indicação pelo recorrente de valor determinável da sucumbência a atribuir ao recurso – efeitos.

FUNDAMENTAÇÃO
I) Os factos a atender com interesse á decisão do presente recurso, são os expostos no relatório supra.
II) O DIREITO APLICÁVEL
Insurge-se a recorrente Paula …, co-Autora nos autos da acção declarativa em curso, da decisão do Tribunal de 1ª instância que indeferiu parcialmente a reclamação apresentada pela ora apelante contra a conta de custas, e, designadamente, decidiu que o valor do recurso para o Tribunal da Relação seria o valor da causa nos termos do disposto no artº 11º-nº2 do CCJ, em virtude do incumprimento de ónus que incumbia à recorrente de indicação do valor da sucumbência a atribuir ao recurso.
Aplicável ao incidente em referência será não já o indicado artº 11º-nº2 do CCJ, mas o artº 12º-nº2 do RCJ, aprovado pelo DL nº 34/2008, de 26 de Fevereiro, aplicável aos processos pendentes nos termos previstos no artº 8º da Lei nº 7/2012, de 13 de Fevereiro, constando da “Motivação subjacente á Lei nº 7/2012” : “ No âmbito do Memorando de Entendimento.....o estado Português assumiu, entre outras, um conjunto de obrigações relacionadas com o regime das custas processuais, das quais se destaca: ..a padronização das custas judiciais(...). A padronização das custas judiciais visa a aplicação do mesmo regime de custas a todos os processos judiciais pendentes, independentemente do momento em que os mesmos se iniciaram. Nas sucessivas alterações ao regime de custas processuais efectuadas em Portugal, a opção do legislador foi, em regra, considerar que as alterações não eram aplicáveis aos processos pendentes, mas apenas aos processos que dessem entrada nos tribunais após a sua entrada em vigor(....). Esta solução levou a uma multiplicação de regimes aplicáveis nos tribunais portugueses, tornando a sua identificação e aplicação uma tarefa cada vez mais complexa e morosa. Assim, a aplicação das mesmas regras a todos os processos torna o regime de custas mais simples e potencialmente mais eficiente e eficaz...”.
Estabelece o art.º 12.° nº 2 do Regulamento das Custas Judiciais que “ Nos recursos o valor é o da sucumbência quando esta for determinável, devendo o recorrente indicar o respectivo valor no requerimento de interposição do recurso, nos restantes casos prevalece o valor da acção."
- Na redacção do art.° 11º do Código das Custas Judiciais, que viria a ser revogado pelo actual Regulamento das Custas Judiciais, aprovado pelo DL. n.º 34/2008 de 26/2, estabelecia-se, distintamente, que: "1. - Nos recursos, o valor da causa é o da sucumbência quando esta for determinável, devendo o recorrente indicar o seu valor no requerimento de interposição do recurso. 2. - Se o valor da sucumbência não for determinável ou na falta da sua indicação, o valor do recurso é igual ao valor da acção".
Como bem refere a apelante, enquanto no anterior art.º 11º nº 2 do CCJ, se estabelecia, claramente, que na falta de indicação do valor da sucumbência o valor do recurso seria igual ao valor da acção, na redacção actual não se diz isso, podendo concluir-se, consequentemente, ser clara a intenção do legislador de excluir tal sanção cominatória da falta de indicação pelo recorrente do valor da sucumbência determinável.
E, assim, ocorrendo tal falta de indicação, não deixa o valor do recurso de ser correspondente ao do valor da sucumbência, se determinável, devendo o Tribunal ordenar a notificação do recorrente para que corrija tal omissão, nos termos gerais do artº 6º do CPC, sendo que nos termos da actual redacção da norma do artº 12º-nº2 do RCJ, e em confronto com a anterior redacção do artº 11º-nº2 do CCJ, resulta que a indicação pelo recorrente do valor do recurso deixou de constituir um “ónus de impulso”, no sentido de imposição de “comportamento necessário para o exercício de um direito ou realização de um interesse próprio, de cuja realização depende a obtenção de uma vantagem, figura distinta do dever...” – cfr. noção dada em “Dicionário Jurídico”, Vol I, Ana Prata, 5ª edição, Almedina, carecendo de efeito cominatório ou sancionatório a omissão do dever de indicação que se impõe ao recorrente.
Procedem, consequentemente, nesta parte, os fundamentos da apelação.
Relativamente às questões suscitadas a final pela apelante, no sentido de se ordenar a elaboração de conta por cada um dos AA., e levar em conta o valor pago por esta, em sede de recurso para o STJ no montante de € 816,00, já obtiveram deferimento no despacho recorrido, não sendo a decisão nesta parte, susceptível de recurso.
Conclui-se, nos termos expostos, pela procedência da apelação, devendo proceder-se á correcção da conta de custas nos termos assinalados, procedendo-se à reforma da conta, considerando-se para efeito de recurso para o Tribunal da Relação o valor de 155.000,00€.

DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação, em julgar procedente o recurso de apelação, revogando-se a decisão recorrida, e ordenando-se a reforma da conta, considerando-se para efeito de recurso para o Tribunal da Relação o valor de 155.000,00€.
Sem custas

Guimarães, 26.03.2015
Maria Luísa Duarte
Raquel Rego
Isabel Rocha