Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
708/13.OGAFAF.G1
Relator: ANA TEIXEIRA
Descritores: CRIME PARTICULAR
CONSTITUIÇÃO DE ASSISTENTE
ACUSAÇÃO
NULIDADE
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/27/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: CONCEDIDO PROVIMENTO
Sumário: I) A legitimidade para promover a ação penal e deduzir acusação é um pressuposto processual; a acusação do particular só pode ser feita por quem previamente se tenha constituído assistente, como resulta do disposto no artigo 50º, n.º 1, do CPP.
II) No caso dos autos, o procedimento criminal depende de acusação particular, uma vez que a arguida é irmã do ofendido – artºs 207º, alínea a), do C. Penal, aplicável por remissão expressa do artº 212º, nº 4, do mesmo Código.
III) Tendo a acusação sido deduzida por quem não era assistente, não tendo o Mº Pº legitimidade para tal, não havia justificação para a abertura da instrução e mais tarde o despacho de pronúncia.
IV) Daí que se imponha a declaração de nulidade da acusação de acordo com o disposto no artº 119º, nº 1, al. b) do CPP, e dos actos posteriores que foram realizados, devendo o ofendido ser notificado, no prazo de 10 dias para se constituir assistente.
Decisão Texto Integral: O TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES SECÇÃO CRIMINAL

-------------------------------- Acórdão

I - RELATÓRIO

1. 1. No processo Comum (tribunal Singular n.º708/13.0GAFAF, do Tribunal Judicial da Comarca de FAFE, Mário Henriques A. apresentou queixa pela prática de crime de dano na sua residência
2. Findo o inquérito o MP deduziu acusação pública contra Maria E.A. pela prática de crime de dano
3. Esta requereu a abertura de instrução tendo a final sido pronunciada pela prática de crime de dano tal como p. e p. pelo artigo 212º,1 do CP
4. Recebida a pronúncia e admitido pedido de indemnização civil formulado pelo queixoso foi designada data para julgamento que veio a ter lugar, findo o qual foi proferida decisão condenando a arguida na pena de 150 dias de multa pela prática de crime por que vinha pronunciada.
5. Inconformada a arguida recorre pedindo a sua absolvição.
6. Em sede de resposta veio o MP junto daquele tribunal pedir a revogação da decisão em virtude de se tratar de crime particular, posição igualmente manifestada pelo Exmo. procurador-geral-adjunto
7. Colhidos os vistos, realizou-se a conferência.
8. Dado que a questão suscitada pelo MP em sede de resposta pode invalidar a análise das restantes questões suscitadas pela arguida, passamos de imediato para a sua análise.
9. Face às conclusões apresentadas, que delimitam o objecto do recurso, importa decidir desde logo a seguinte questão:
Resulta da decisão que a arguida em causa é irmã do ofendido Mário A. ; assim sendo, tal como se consigna na lei, são parentes em segundo grau na linha colateral (artigos 1580º e 1581º do CC)
Deste modo, de acordo com o preceituado no artigo 207º, alínea a) do Código Penal, aplicável por remissão expressa do artigo 212º,4, do mesmo código, se o agente for parente até ao segundo grau o procedimento criminal depende de acusação particular.
Resulta do exposto que no caso em análise sendo o queixoso parente do segundo grau, o crime em causa tem natureza particular.
Por essa razão e de acordo com o que se determina no artigo 50º,n.º1 do CPP teria o ofendido que se constituir assistente e deduzir acusação particular.
A legitimidade para promover a ação penal e deduzir acusação é um pressuposto processual; a acusação do particular só pode ser feita por quem previamente se tenha constituído assistente, como resulta do disposto no artigo 50º, n.º 1, do CPP, que marca os tempos de intervenção do assistente ao longo do processo em que esteja em causa crime particular.
Nestas circunstâncias, a acusação que enformará o objeto do processo foi deduzida por quem não era assistente, não tendo o MP legitimidade para tal, tratando-se de ato processual praticado a non domino, sendo que só face a uma acusação deduzida por assistente se justificará a abertura de instrução e mais tarde o despacho de pronúncia, por a acusação de assistente constituir conditio sine qua non do prosseguimento do processo. (Neste sentido se pronunciou o acórdão do STJ de 18-06-2008, no processo 1606/08- 3ª secção)
A descrita situação configura uma nulidade insanável de acordo com o disposto no artigo 119º,1 alínea b) do CPP uma vez que o MP não observou o processado devido, tornando o ato praticado por si como inválido- artigo 122º do CPP.
Ora, deste modo, é inválida a acusação deduzida pelo MP, tendo de ser declarada nula, impondo-se a notificação ao ofendido para se constituir assistente no prazo legal de 10 dias que não existiu e como constituiu omissão que afeta os atos subsequentes do processo.
E conformidade com o exposto será declarada nula a acusação e posteriores atos processuais, determinando-se que os autos vão com vista ao MP para sanar a nulidade decorrente da falta de cumprimento do disposto no artigo 68º,n.º2 e 246º,n.º4, ambos do CPP
Fica deste modo prejudicada a análise das questões suscitadas em sede de recurso pela arguida.

III – DISPOSITIVO

Pelo exposto, os juízes acordam em:

· Declaram-se nulas a acusação deduzida pelo Ministério Público e a pronúncia proferida nestes autos, que invalidam todos os atos subsequentes, devendo os autos serem enviados ao MP para sanar a nulidade decorrente da falta de cumprimento do disposto no artigo 68º,2 do CPP.
· Não é devida tributação

[Elaborado e revisto pela relatora]


Guimarães, 27 de Abril de 2015


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[Ana Maria Martins Teixeira]

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[Ana Teixeira e Silva]