Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
3129/12.9TBBCL-C.G1
Relator: MARIA LUÍSA RAMOS
Descritores: CIRE
INSOLVÊNCIA CULPOSA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/30/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CIVEL
Sumário: I Apenas nas situações previstas no nº3 do artigo 186º do CIRE, estabelecendo este normativo presunções ilidíveis, relativas ou juris tantum, que podem ser ilididas por prova em contrário, se exige a demonstração do nexo causal entre o comportamento (presumido) gravemente culposo do devedor ou dos seus administradores e o surgimento ou o agravamento da situação de insolvência, não abrangendo esta presunção ilidível a do nexo de causalidade entre tais actuações omissivas e a situação da insolvência verificada ou do seu agravamento, já não se exigindo o estabelecimento de tal nexo de causalidade adequada nas situações previstas no nº2 do artº 186º do CIRE, em que a lei estabelece presunções inilidíveis, ou presunções absolutas ou jure et de jure, que não admitem qualquer prova em contrário, conduzindo, assim, necessariamente, os comportamentos dos administradores aí referidos à qualificação da insolvência como culposa. ( cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 6/10/2011, P.46/07.8TBSVC-O.L1.S1, in www.dgsi.pt )
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

AA, requerido nos autos de Processo Especial de Incidente de Qualificação da Insolvência, n.º 3129/12.9TBBCL-C, da Instância Central- 2ª Secção Comércio-J2, em que é insolvente BB, Lda”, veio interpor recurso de apelação da sentença proferida nos autos, com o seguinte teor: “Face ao exposto, considero a presente insolvência culposa, nos termos do disposto no art.º 186.º, n.º 2, al. h), do CIRE, afectando esta qualificação ao sócio gerente AA.
Mais declaro-o inibido para administrar patrimónios alheios e para o exercício do comércio, bem como para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de actividade económica, empresa pública ou cooperativa pelo período de 6 anos.
Decido não afectar CC, pela qualificação da insolvência como culposa.
Registe e notifique.
Cumpra o disposto no Art. 189º, n.º 3 do CIRE.
Custas pela massa insolvente”.
A administradora da insolvência apresentou o parecer a que alude o disposto no art.º 188.º, n.º 2 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), propondo a qualificação da insolvência como culposa, nos termos do disposto no art.º 186.º, n.º 2, al. h) do CIRE e que fosse afectada por essa qualificação o sócio gerente da empresa cuja insolvência foi declarada - AA, bem como a sua mulher CC, por considerar que a mesma exercia a gerência de facto da insolvente.
O Ministério Público concordou com o parecer do administrador da insolvência.
Notificados a sociedade devedora e citadas as pessoas consideradas como devendo ser afectadas pela qualificação da insolvência, nos termos do disposto no art. 188º-n.º 6 do CIRE, vieram AA e CC deduzir oposição e requerer que a insolvência fosse considerada como fortuita, alegando, em síntese que a devedora CC não era, à data do encerramento, gerente nem representante da empresa, nem de facto nem de direito, mais referindo que não corresponde à verdade que tenha sido vendido todo o imobilizado da empresa, porquanto não existiam quaisquer bens activos propriedade da insolvente e os que haviam sido alienados foram-no aos preços efectivos mercado e a empresa insolvente encaixou esses valores, os quais se destinaram à sua gestão, designadamente ao pagamento dos credores.
Por despacho de fls.182 dos autos, foi proferido despacho saneador e fixado o objecto da acção e temas de prova.

O recurso foi admitido como recurso de apelação, com subida imediata, e nos próprios autos do incidente e efeito meramente devolutivo.

Nas alegações de recurso que apresenta, o apelante formula as conclusões de fls. 289 a 296, concluindo e suscitando as seguintes questões:
- O Tribunal recorrido dá como provado que a última prestação de contas da empresa insolvente corresponde ao ano de 2012 –ano em que a empresa se apresentou à insolvência, não obstante a decisão é contraditória em relação àquela consideração, uma vez que qualifica a insolvência como culposa em consequência da verificação da situação prevista na al.h) do nº2 do artº 186º do CIRE.
- O recorrente entende que os factos provados não integram a previsão do nº2 do artº 186º do CIRE, e que, mesmo que integrasse, não bastava a respetiva prova para que se pudesse decretar aquela qualificação, sendo sempre necessária a demonstração do nexo de causalidade adequada entre as condutas que os integram e a criação ou o agravamento da situação de insolvência por parte da devedora, prova que, no entender do recorrente, não foi feita e que determina que a insolvência deva ser qualificada como fortuita.
- Dos factos provados nenhum consta que demonstre a verificação deste nexo causal, seja como criador da situação de insolvência, seja como causa agravante da mesma (com origem noutras circunstâncias), factos estes que, com o devido respeito, a M.ma Juiza a quo não teve em consideração, levando a uma incorreta aplicação do artigo 186º do CIRE, bem como a uma inexistência da fundamentação da sentença, sendo a mesma nula.

Foram oferecidas contra-alegações pelo Digno Magistrado do MP

O recurso veio a ser admitido neste tribunal da Relação na espécie e com os efeitos e regime de subida fixados no despacho de admissão do recurso na 1ª instância.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
Delimitação do objecto do recurso: Questões a decidir.
Atentas as conclusões do recurso de apelação deduzidas, e supra descritas, são as seguintes as questões a apreciar:
- alegada contradição entre o facto provado Al.O) e a decisão que qualifica a insolvência como culposa em consequência da verificação da situação prevista na al.h) do nº2 do artº 186º do CIRE.
- alegada nulidade de sentença por inexistência de fundamentação
- do mérito da causa:
- da verificação da previsibilidade do nº2 do artº 186º do CIRE
- nexo causalidade


FUNDAMENTAÇÃO
I) OS FACTOS ( factos declarados provados na decisão):
A. Em 18.10.2012, a sociedade «BB Ldª» veio requerer fosse declarada a sua insolvência;
B. Por sentença datada de 5.11.2012 foi declarada a insolvência da requerida;
C. À data da declaração de insolvência, a sociedade tinha como sócio gerente AA;
D. As instalações indicadas como o local da sede e de laboração da sociedade insolvente, sitas na Rua das Portelas, Edifício Portela Park, loja …, à data da declaração da insolvência, encontravam-se encerradas,
E. As instalações da empresa «BB Ldª» estavam situadas na Póvoa de Varzim;
F. Os bens da insolvente foram vendidos em momento anterior à data da declaração da insolvência, mais concretamente em 5.09.2011 – cfr. Fls. 76;
G. Os bens da insolvente foram vendidos por valores inferiores ao valor real e de mercado, dos mesmos;
H. Os bens da insolvente foram vendidos à filha do gerente da insolvente – DD;
I. Em data anterior à declaração da insolvência, a filha do gerente da insolvente criou uma empresa designada «EE»;
J. A empresa «EE» dedicava-se à produção de capas de chuva, tal como a empresa insolvente.
K. A empresa «EE» labora nas mesmas instalações da insolvente, sitas na Póvoa de Varzim;
L. Vários trabalhadores, em numero não concretamente apurado, da insolvente, passaram a trabalhar para a empresa «EE», em regime continuo, sem qualquer interregno temporal;
M. Algumas trabalhadoras da empresa «EE», apesar de receberem o salário como trabalhadoras desta empresa, ainda se encontravam como sendo trabalhadoras da insolvente, em data posterior à da declaração da insolvência, designadamente em 9.11.2012 – cfr. Fls. 73.
N. Nas instalações da empresa «EE» existia o relógio de ponto da insolvente com a sua identificação, bem como elementos denominativos da insolvente;
O. A última prestação de contas da insolvente corresponde ao ano de 2012;
P. Não existem recibos de pagamento correspondentes aos bens vendidos;


II) O DIREITO APLICÁVEL
1- alegada contradição entre o facto provado Al.O) e a decisão que qualifica a insolvência como culposa em consequência da verificação da situação prevista na al.h) do nº2 do artº 186º do CIRE.
Alega a apelante que o Tribunal recorrido dá como provado que a última prestação de contas da empresa insolvente corresponde ao ano de 2012 – ano em que a empresa se apresentou à insolvência, não obstante a decisão é contraditória em relação àquela consideração, uma vez que qualifica a insolvência como culposa em consequência da verificação da situação prevista na al.h) do nº2 do artº 186º do CIRE.
Compulsado o teor da sentença recorrida, e respectiva fundamentação de facto e de direito, verifica-se que a “contradição” existente se traduz, tão só, em manifesto lapso material ou de escrita na referenciação da al.h) do nº2 do artº 186º do CIRE na parte decisória da sentença, ao invés da al.e) que resulta da exposição, e, é, aliás, expressamente referida na sentença, a fls. 254, como a situação que se julga verificada nos autos.
Igualmente, tal “mero” lapso, é referenciado pelo Digno Magistrado do MP, nas contra-alegações do recurso de apelação, concluindo: “Em face do exposto, efectuando-se a correcção do manifesto lapso de escrita quanto à menção da alínea e) do nº2 do artº186º do CIRE, deverá manter-se a douta sentença em apreço que declarou a qualificação da insolvência de BB Ldª como culposa afectando pela mesma o sócio gerente AA”.
Conclui-se, nos termos expostos, pela inexistência da invocada “contradição” de decisão, nesta parte improcedendo os fundamentos da apelação.
2. - alegada nulidade de sentença por inexistência de fundamentação
Nos termos do art.º 615º -n.º 1, alíneas, b) e d) do Código de Processo Civil, é nula a sentença quando o juiz não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, ou, quando deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento, respectivamente.
Os vícios previstos no citado art.º 615º do Código de Processo Civil, geradores de nulidade da sentença, são vícios de cariz adjectivo ou processual e que afectam a decisão na sua estrutura processual, invalidando-a ou tornando-a incompleta ou incompreensível, relativamente aos vícios ora apontados.
Assim, e quer relativamente à falta de fundamentação, quer no que à omissão de pronúncia se refere, reporta-se a lei a total ausência de fundamentação, e não a fundamentação insuficiente ou, eventualmente, errada, e a um desconhecimento absoluto da questão objecto da decisão (Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 6/5/2004, p.04B1409, in www.dgsi.pt), “Trata-se de um mero vício formal (e não de erro de substância ou de julgamento)” - Ac. do Supremo Tribunal de Justiça , de 23- -05-2006, Proc. n.º 06A10 90, in www.dgsi.pt..
No caso em apreço as indicadas causas de nulidade não ocorrem, verificando-se que a decisão recorrida contém fundamentação suficiente, que a torna compreensível, e no mais invoca o apelante vícios que respeitam não aos indicados vícios formais, geradores de nulidade da decisão, mas, distintamente, a erro de julgamento, e que oportunamente se conhecerão.
Improcedem, assim, também nesta parte, os fundamentos da apelação.
3. - do mérito da causa:
- da verificação da previsibilidade do nº2 do artº 186º do CIRE
- nexo causalidade
Dispõe o artigo 186º do CIRE, sob a epígrafe “ Insolvência culposa” que a insolvência é culposa quando a situação tiver sido criada ou agravada em consequência da actuação, dolosa ou com culpa grave, do devedor, ou dos seus administradores, de direito ou de facto, nos três anos anteriores ao início do processo de insolvência.
Nos termos do n.º 2, do citado artigo, considera-se sempre culposa a insolvência do devedor quando os seus administradores de direito ou de facto tenham:
a) Destruído, danificado, inutilizado, ocultado, ou feito desaparecer, no todo ou em parte considerável património do devedor;
b) Criado ou agravado artificialmente passivos ou prejuízos, ou reduzido lucros, causando, nomeadamente, a celebração pelo devedor de negócios ruinosos em seu proveito ou no da pessoa com eles especialmente relacionadas;
c) Comprado mercadorias a crédito, revendendo-as ou entregando-as em pagamento por preço sensivelmente inferior ao corrente, antes de satisfeita a obrigação.
d) Dispondo de bens do devedor em proveito pessoal ou de terceiros.
e) Exercido a coberto da personalidade da pessoa colectiva da empresa, se for o caso, uma actividade em proveito pessoal ou de terceiros e em prejuízo da empresa.
f) Feito do crédito ou dos bens do devedor uso contrário ao interesse deste, em proveito pessoal ou de terceiros, designadamente para favorecer outra empresa na qual tenham interesse directo ou indirecto;
g) Prosseguindo, no seu interesse pessoal ou de terceiro, uma exploração deficitária, não obstante saberem ou deverem saber que esta conduziria com grande probabilidade a uma situação de insolvência;
h) Incumprindo em termos substanciais a obrigação de manter contabilidade organizada, mantido uma contabilidade fictícia ou uma dupla contabilidade ou praticado irregularidades, com prejuízo relevante para a compreensão da situação patrimonial e financeira do devedor;
i) Incumprindo de forma reiterada, os seus deveres de apresentação e colaboração até à data de elaboração do parecer referido no n.º 2 do art.º 188º.
Dispondo, ainda, o nº3 do indicado preceito legal: - Presume-se a existência de culpa grave quando os administradores, de direito ou de facto, do devedor que não seja uma pessoa singular, tenham incumprido:
a) 0 dever de requerer a declaração de insolvência;
b) A obrigação de elaborar as contas anuais, no prazo legal, de submetê-las à devida fiscalização ou de as depositar na conservatória do registo comercial.
Como se refere no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 6/10/2011, P.46/07.8TBSVC-O.L1.S1, in www.dgsi.pt:
1. A insolvência culposa implica sempre uma actuação dolosa ou com culpa grave do devedor ou dos seus administradores, a qual deve ter criado ou agravado a situação de insolvência em que o devedor se encontra.
2. O nº 2 do art. 186.º do CIRE estabelece, em complemento da noção geral antes fixada no nº 1, presunções inilidíveis que, como tal, não admitem prova em contrário. Conduzindo, assim, necessariamente, os comportamentos aí referidos à qualificação da insolvência como culposa.
3. O nº 3 do mesmo art. 186.º estabelece, por seu turno, presunções ilidíveis, que admitem prova em contrário, dando-se por verificada a culpa grave quando ocorram as situações aí previstas.
4. Não se dispensando neste nº 3 a demonstração do nexo causal entre o comportamento (presumido) gravemente culposo do devedor ou dos seus administradores e o surgimento ou o agravamento da situação de insolvência. Sendo, pois, necessário, nessas situações, verificar se os aí descritos comportamentos omissivos criaram ou agravaram a situação de insolvência, pelo que não basta a simples demonstração da sua existência e a consequente presunção de culpa que sobre os administradores recai. Não abrangendo tais presunções ilidíveis a do nexo causal entre tais actuações omissivas e a situação da verificação da insolvência ou do seu agravamento”, mais se esclarecendo em tal aresto: “Definindo, assim, este preceito legal em que consiste a insolvência culposa, começando por fixar, para o efeito, uma noção geral no seu nº 1. Implica sempre, tal insolvência culposa, uma actuação dolosa ou com culpa grave do devedor ou dos seus administradores, a qual deve ter criado ou agravado a situação de insolvência em que o devedor se encontra. Deixando, contudo, tal actuação de ser atendida – devendo considerar-se as noções de dolo e de culpa grave, na falta de outro critério específico, nos termos gerais de Direito – para o efeito da qualificação da insolvência em análise, se não tiver ocorrido nos três anos anteriores ao início do processo de insolvência. Estabelecendo, de seguida, em complemento da noção antes fixada, o seu nº 2, presunções inilidíveis, ou seja, presunções absolutas ou jure et de jure, não admitindo prova em contrário (cfr., ainda, art. 350.º, nº 2 do CC). Conduzindo, assim, necessariamente, os comportamentos dos administradores aí referidos – sem prejuízo de se dever atender às circunstâncias próprias da situação de insolvência do devedor – à qualificação da insolvência como culposa.
Finalmente, o nº 3 do mesmo preceito legal, estabelecendo, agora, presunções ilidíveis, ou seja, presunções relativas ou juris tantum, que assim podem ser ilididas por prova em contrário, dá por verificada a existência de culpa grave quando ocorram as situações aí previstas. Crendo-se que da diferenciação entre os referidos nºs 2 e 3, resulta que o legislador (cfr. art. 9.º, nº 3 do CC) não quis consagrar, neste último caso, também um complemento da noção de insolvência culposa, tal como é definida no anterior nº 1, não se dispensando a demonstração do nexo causal entre o comportamento (presumido) gravemente culposo do devedor ou dos seus administradores e o surgimento ou o agravamento da situação de insolvência.
Com efeito, como se deduz do preceito legal em referência- artº 186º do CIRE que regulamente a “Insolvência Culposa”, e é cabalmente esclarecido no Ac. STJ citado, apenas nas situações previstas no nº3 do indicado artigo, estabelecendo este presunções ilidíveis, relativas ou juris tantum, que assim podem ser ilididas por prova em contrário, se exige a demonstração do nexo causal entre o comportamento (presumido) gravemente culposo do devedor ou dos seus administradores e o surgimento ou o agravamento da situação de insolvência, não abrangendo esta presunção ilidível a do nexo de causalidade entre tais actuações omissivas e a situação da insolvência verificada ou do seu agravamento, e, já não nas situações previstas no nº2 do artº 186º do CIRE, em que a lei estabelece presunções inilidíveis, ou presunções absolutas ou jure et de jure, que não admitem qualquer prova em contrário, conduzindo, assim, necessariamente, os comportamentos dos administradores referidos nas respectivas alíneas à qualificação da insolvência como culposa.
No mesmo sentido v. Luís Alberto Carvalho Fernandes e João Labareda C.I.R.E. Anot., Vol. II, Pags. 14 e 15.” ...as previsões deste número 2, consubstanciam presunções jure et de jure de insolvência culposa, portanto em si mesmas definitivas, por não elidíveis”.
Nestes termos, alegando o recorrente “que os factos provados não integram a previsão do nº2 do artº 186º do CIRE, e que, mesmo que integrasse, não bastava a respectiva prova para que se pudesse decretar aquela qualificação, sendo sempre necessária a demonstração do nexo de causalidade adequada entre as condutas que os integram e a criação ou o agravamento da situação de insolvência por parte da devedora”, falecem tais fundamentos, desde logo no tocante á exigibilidade do estabelecimento de nexo de causalidade que, no caso sub judice, estando em causa condutas do administrador da insolvente reportadas ao nº 2 do artº 186º do CIRE, não se impõe, contendo-se na presunção absoluta da norma, e, no demais, resultando dos factos provados integrada a previsibilidade do artº 186º-nº2 do CIRE, com referência ás alíneas a), b), d), e), f).
E, assim, relativamente à decisão de inibição do apelante, Sérgio Carvalho da Silva, para administrar patrimónios alheios e para o exercício do comércio, bem como para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de actividade económica, empresa pública ou cooperativa pelo período de 6 anos, atentos os factos provados, designadamente, os descritos de F) a N) e P), ( “F. Os bens da insolvente foram vendidos em momento anterior à data da declaração da insolvência, mais concretamente em 5.09.2011; G. Os bens da insolvente foram vendidos por valores inferiores ao valor real e de mercado, dos mesmos; H. Os bens da insolvente foram vendidos à filha do gerente da insolvente – DD I. Em data anterior à declaração da insolvência, a filha do gerente da insolvente criou uma empresa designada «EE»; J. A empresa «EE» dedicava-se à produção de capas de chuva, tal como a empresa insolvente; P. Não existem recibos de pagamento correspondentes aos bens vendidos” ), reitera-se a decisão proferida pelo Tribunal de 1ª instância, e respectivos fundamentos, podendo concluir-se dos factos provados que pela sua descrita conduta o apelante na qualidade de sócio gerente/administrador da insolvente “esvaziou” a insolvente de todo o seu património mobiliário, contra os interesses da insolvente e a favor de terceiros, designadamente em favor da filha do apelante e de sociedade comercial por esta criada com o mesmo objecto, assim dispondo o apelante dos bens da devedora em proveito pessoal ou de terceiros e celebrando o apelante negócios ruinosos em nome da devedora e em proveito de pessoa com ele especialmente relacionada, tendo feito dos bens da devedora uso contrário ao interesse desta, designadamente para favorecer outra empresa na qual tem interesse directo ou indirecto, mais se provando tal favorecimento de terceiros na medida em que se prova que “ A empresa «EE» labora nas mesmas instalações da insolvente, sitas na Póvoa de Varzim; Vários trabalhadores, em numero não concretamente apurado, da insolvente, passaram a trabalhar para a empresa «EE», em regime continuo, sem qualquer interregno temporal; Algumas trabalhadoras da empresa «EE», apesar de receberem o salário como trabalhadoras desta empresa, ainda se encontravam como sendo trabalhadoras da insolvente, em data posterior à da declaração da insolvência, designadamente em 9.11.2012; Nas instalações da empresa «EE» existia o relógio de ponto da insolvente com a sua identificação, bem como elementos denominativos da insolvente;”, tudo com grave prejuízo da defesa dos legítimos interesses dos credores.
As previsões do art.º 186.º, n.º 2, do CIRE, consubstanciam presunções jure et de jure de insolvência culposa, em si mesmas definitivas, por não elidíveis, fundamento bastante para o preenchimento do conceito de insolvência culposa”.- Ac. TRL de 12/3/2013 – P. nº 1043/11.4TBVFX-A.L1-7.
“Desde que evidenciado qualquer dos factos previstos nas diversas alíneas do número 2 do art.º 186º do C.I.R.E., nem o administrador da insolvência nem o Ministério Público podem deixar de se pronunciar no sentido de qualificar a insolvência como culposa - Ac. TRL 24/6/2012, P.nº 2160/10.3TJLSB-B.L1-2
“Quer se entenda que as várias alíneas do nº 2 deste mesmo artigo constituem presunções legais jure et jure, conducentes à qualificação da insolvência como culposa, ou se considere estarmos perante factos-índice de insolvência culposa, a verdade é que, uma vez demonstrado o facto nelas enunciado, fica, desde logo, estabelecido o juízo normativo de culpa do administrador, sem necessidade de demonstração do nexo causal entre a omissão dos deveres constantes das diversas alíneas do n.º 2 e a situação de insolvência ou o seu agravamento”- Ac. TRG de 29/6/2010, P.1965/07.7TBFAF-A.G1, todos os Ac. citados in www.dgsi.pt.
Conclui-se, nos termos expostos, pela improcedência da apelação.

DECISÂO
Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação, em julgar improcedente a apelação, mantendo-se a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente.

Guimarães, 30.04.2015
Maria Luísa Ramos
Raquel Rego
António Sobrinho