Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
655/06.2TBCMN.G1
Relator: MANSO RAÍNHO
Descritores: ARRENDAMENTO DE ESTABELECIMENTO COMERCIAL
ENCERRAMENTO DO ESTABELECIMENTO
RESOLUÇÃO
CADUCIDADE
ABUSO DE DIREITO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 01/19/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: 1. O prazo de caducidade reportado à resolução fundada no encerramento do locado, pois que se trata de facto continuado, está in casu submetido à regra do nº 2 (e não à regra do nº 1) do art. 65º do RAU, de sorte que nunca se verificaria a apontada caducidade.
2. O direito à resolução do contrato não pode ser actuado, por se revelar num exercício manifestamente abusivo.
3. Viola os ditames da boa fé quem deixa chegar praticamente à ruína o edifício onde se insere o locado (ademais sabendo que se trata de edifício deveras antigo, a demandar maior vigilância), quem conhece que o estado do locado contende com a sua regular utilização para os fins da actividade económica exercida pela arrendatária, quem sabe perfeitamente que o estabelecimento está encerrado por razões inerentes ao estado do imóvel, não podendo assim vir argumentar com o encerramento do locado com vista a resolver o contrato de arrendamento.
4. O risco de deterioração ao longo do tempo do prédio arrendado corre por conta do senhorio, que deve estar a par do que se passa, até porque sobre ele recai um dever de vigilância sobre o imóvel (art. 492º do CC).
Decisão Texto Integral: Acordam em conferência na 1ª Secção Cível da Relação de Guimarães:

MA intentou, pelo Tribunal Judicial da Comarca de Caminha, acção com processo na forma ordinária contra SR e marido LR, mas a quem a Autora atribuiu outro nome, na realidade o nome do pai da Ré) e contra MT e marido AT, peticionando a condenação solidária dos demandados no pagamento da quantia de €145.818,89, acrescida de juros de mora, e ainda na quantia mensal de €1.250,00, desde Setembro de 2006, acrescida de juros.
Alegou para o efeito, em síntese, que é titular de um estabelecimento comercial instalado em prédio dos Réus, e de que faz parte o direito ao arrendamento sobre o local. Sucede que por falta de obras que o locado e o prédio em geral necessitavam, obras essas da responsabilidade dos Réus, a Autora encerrou temporariamente o locado em 1998. Por força das condições do locado e do encerramento temporário, a Autora deixou de apurar no seu comércio aquilo que normalmente apuraria. Aos Réus compete reparar tal prejuízo.
Contestaram os Réus, concluindo pela improcedência da acção.
Disseram, muito em síntese e vistas as contestações de forma conjugada, desconhecer e impugnar a existência de quaisquer deficiências no locado, impeditivas do seu desfrute nos termos alegados pela Autora. Impugnaram, outrossim, a existência de prejuízos para a Autora. Mais deduziram reconvenção, peticionando a resolução do contrato de arrendamento com fundamento no encerramento do locado desde 1998 e no não pagamento das rendas em devida forma. Ainda pediram que se declarasse extinto o contrato por caducidade derivada da perda da coisa locada.
A Autora replicou, concluindo pela improcedência dos pedidos reconvencionais.
Seguindo o processo seus termos, veio a final a ser proferida sentença que julgou improcedente a acção e parcialmente procedentes as reconvenções, sendo declarado resolvido o contrato de arrendamento e a Autora condenada a despejar o local.

Inconformada com o assim decidido, apela a Autora.

Da sua alegação extrai as seguintes conclusões:

1ª.- O presente recurso incide sobre matéria de facto e matéria de direito.
2ª.- A prova (documental) junta aos autos demonstra o conhecimento efectivo que os R.R. possuíam do estado do locado e das obras de que este necessitava, pelo que se impõe a alteração da douta decisão proferida quanto à matéria de facto, bem como a ampliação da mesma.
3ª.- A recorrente pretende ver sindicada por esta Veneranda Relação a decisão proferida pelo Mmo. Juiz “a quo” quanto à matéria de facto levada aos quesitos 3º, 5º e 39º da base instrutória.
4ª.- Quanto ao quesito 3º (dado como não provado), os elementos de prova de fls. 27, 28, 29 e 136 dos autos impunham decisão diversa.
5ª.- Tais concretos meios probatórios atestam que os R.R. requereram em 13/09/2001 à Câmara Municipal de Caminha (CMC), e junto do processo de obras n.º 362/94, que lhes fosse passada e enviada “certidão do AUTO DE VISTORIA realizado no r/ch do prédio urbano sito na Rua Conselheiro Miguel Dantas, n.º … - Caminha - Proc. n.º 3….”
6ª.- O auto de vistoria requerido, porque à data não havia outro, é o de fls. 22 e 23 dos autos, que se reporta à vistoria realizada ao arrendado no dia 29/11/1994 - vd. alíneas G) e H) dos Factos Provados.
7ª.- Ou seja, já nessa data, tinham os R.R. conhecimento não apenas de que corria termos pela CMC um processo de obras tendo por objecto o imóvel dos autos, como também de que esse prédio tinha sido já objecto de uma vistoria pelos serviços municipais.
8ª.- E com a recepção desse auto de vistoria ficaram os R.R. na posse do douto despacho a que se refere a alínea I) dos Factos Provados, que se encontrava inserto naquele auto (vd. fls. 23 dos autos).
9ª.- Impõe-se a este Venerando Tribunal o dever de sindicar a douta decisão recorrida, nos termos do artigo 712º, n.º 2 do CPC, respondendo ao quesito 3º da base instrutória nestes (ou semelhantes) termos: “Provado apenas que em 13/09/2001 as R.R. requereram à Câmara Municipal de Caminha, no âmbito do processo de obras n.º 362/94, que lhes fosse passada e entregue certidão do auto de vistoria referido nas alíneas G), H) e I) dos Factos Provados.”
10ª.- Acaso se entenda que essa resposta extravasa ou excede aquilo que é perguntado, sempre imporá proceder-se ao aditamento à matéria de facto assente do teor dos referidos documentos de fls. 27, 28 e 29 (conjugados com o de fls. 138), ou, considerando tratar-se de matéria controvertida e carecida de prova, o seu apuramento em novo julgamento para que a A. (recorrente) possa produzir sobre a referida matéria a respectiva prova - cfr. artigos 712º, n.º 4, in fine, e 650º, n.º 2, alínea f), do CPC.
11ª.- Quanto ao quesito 5º da base instrutória, a douta decisão quanto a ele proferida está em manifesta contradição com o ofício de fls. 628 dos autos (vd. alínea b) desse ofício), do qual decorre que a Ré “SR foi notificada, nos termos legais, para a realização da vistoria em 06.02.2003, pelas 14h30, informando-se a mesma da possibilidade de indicação de peritos até à véspera da vistoria (ofício 357/SO/SV, a fls. 29)”.
12ª.- O facto de o parecer referido em O) dos Factos Provados ter mandado repetir as notificações expedidas ao proprietário do imóvel por preterição de formalidades legais não implica que a notificação a que se refere o ofício de fls. 628 tenha sido omitida, mas que, tendo sido efectuada, não observou as formalidades previstas na lei.
13ª.- O documento de fls. 628 dos autos impõe a alteração da resposta dada ao quesito 5º, de modo a que dele passe a constar que: “Provado apenas que a Ré SR foi convocada para essa vistoria.”
14ª.- Ao responder ao quesito 39º da base instrutória, o Mmo. Juiz “a quo” deu apenas como provado o que consta das alíneas F) a O) da matéria assente e nas respostas aos quesitos 3º a 7º da matéria controvertida, que nada dizem a respeito do que efectivamente se perguntava.
15ª.- Há nos autos elementos probatórios que permitem responder a esse quesito, concretamente a notificação de fls. 328 e 329 dos autos, com data de 15/06/2001, recepcionada pela Ré SR em 18/06/2001 (fls. 320), documentos não impugnados pelos R.R., quer quanto ao seu conteúdo, quer quanto à sua genuinidade.
16ª.- Através dessa notificação, a A. deu conhecimento à Ré SR e demais herdeiros dos vícios que afectavam o locado, da necessidade de realizar obras que os debelassem, do encerramento do estabelecimento comercial que funcionava no locado face ao estado de degradação do imóvel e dos prejuízos que os apontados vícios causavam no comércio da Autora.
17ª.- Impõe-se, naturalmente, uma nova resposta ao quesito 39º da base instrutória, consentânea com os documentos de fls. 328, 329 e 330 dos autos, nestes ou semelhantes termos: “Provado que a Autora informou a Ré SR, por carta registada (com A/R) datada de 15/06/2001, recebida em 18/06/2011.”
18ª.- Antes de se debruçar sobre o pedido de resolução invocado pelos R.R., o Mmo. Juiz “a quo” tinha que começar por indagar da tempestividade do exercício desse direito pelos senhorios.
19ª.- Não consta da matéria de facto em que data tomaram os R.R conhecimento do encerramento do locado pela A.
20ª.- Há nos autos elementos inequívocos que permitem a este Venerando Tribunal responder à matéria de facto que não foi conhecida pela 1ª instância, nos termos do artigo 712º, n.º 1 do CPC, na redacção aqui aplicável, concretamente o citado documento de fls. 328 e 329 dos autos, no qual a A. informou os R.R de que mantinha o estabelecimento encerrado “já que não pode abri-lo ao público no estado de total degradação em que se encontra”.
21ª.- Face ao documento de fls. 330 dos autos, constata-se que a Ré SR foi notificada desse documento em 18/06/2001.
22ª.- O encerramento do locado foi confirmado aos R.R. pelo ofício da CMC de 24/10/2001, a fls. 193 dos autos, documento este que foi junto aos autos pelos próprios R.R.
23ª.- Por se tratar de matéria indispensável para a boa decisão da causa, deve ordenar-se a ampliação da matéria de facto, aditando aos Factos Provados o teor dos documentos de fls. 328, 329 e 330 dos autos, nos termos do citado artigo 712º, n.º 1 do CPC, inserindo-se aí uma nova alínea, com o seguinte ou semelhante teor: “Os R.R. tomaram conhecimento do encerramento do estabelecimento que funcionava no locado com a recepção da notificação de fls. 328, 329 e 330 dos autos, ocorrida em 18/06/2001”.
24ª.- Ou considerando tratar-se de matéria controvertida e necessitada de prova, deve ordenar-se o apuramento desses factos em novo julgamento em novo julgamento para que a A. (recorrente) possa produzir sobre a referida matéria a respectiva prova cfr. artigos 712º, n.º 4, in fine, e 650º, n.º 2, alínea f), do CPC.
25ª.- Assim fixada (estabilizada) a matéria de facto (para o caso de não se ordenar a repetição do julgamento), impõe-se fazer agora a aplicação do direito a esses factos.
Da caducidade:
26ª.- Tendo os R.R. tomado conhecimento do encerramento do estabelecimento que funcionava no locado em 18/06/2001 (fls. 330), o prazo de caducidade previsto no artigo 65º, n.º 1 do RAU, começou a correr no dia seguinte e terminou no dia 19/06/2002.
27ª.- O direito dos R.R. em despejar a A. com fundamento no artigo 64º, n.º 1, alíneas d) e h) do RAU só foi exercido judicialmente com o oferecimento da sua contestação nestes autos, ou seja, em 3/10/2006, quando aquele direito já se tinha extinguido por caducidade.
28ª.- À mesma conclusão se chega se reportamos o conhecimento dos R.R. à recepção do ofício de fls. 193 dos autos ou à data da realização da vistoria a que se referem as alíneas Q) e R) dos Factos Provados, realizada em 6/06/2005, na qual os R.R. fizeram-se representar pelo seu perito (vd. resposta ao quesito 7º e fls. 79 a 81 dos autos).
29ª.- A caducidade é apreciada oficiosamente e pode ser alegada em qualquer fase do processo - cfr. artigo 333º do CC.
Sem prescindir,
Da não verificação dos pressupostos previstos no artigo 64º, n.º 1, alínea h) do RAU:
30ª.- Está assente que em 29/11/1994, o prédio apresentava os vícios descritos no auto de vistoria de fls. 22 e 23 dos autos e que carecia da realização imediata das obras nele referidas - vd. alíneas G) e H) dos Factos Provados.
31ª.- Em Setembro de 1998, quando o estabelecimento foi encerrado, o prédio apresentaria, pelo menos, os vícios descritos nesse auto de vistoria, agravados daqueles que o passar do tempo (cerca de quatro anos) sem qualquer intervenção acabou por causar.
32ª.- Provou-se que “NA SEQUÊNCIA DOS FACTOS constantes das respostas aos quesitos 1º e 2º, e da consequente degradação que os mesmos provocaram no locado, a autora encerrou o estabelecimento comercial que aí explorava.” - vd. resposta ao quesito 11º da base instrutória.
33ª.- Resulta, assim, manifesto que tais factos foram impeditivos do exercício do comércio da A. no locado, que, por via disso, deixou de exercer aí a sua actividade - ou seja, ficou provado o nexo de causalidade entre a degradação do imóvel e o encerramento do estabelecimento.
34ª.- O próprio auto de vistoria de fls. 22 e 23 refere que os vícios do locado “colocavam em risco a actividade económica (nele) exercida.”
35ª.- Os factos provados permitem, pois, alicerçar a conclusão de que a A. foi forçada a abandonar o locado, pelo que se mostra preenchida a referida excepção do artigo 64º, n.º 1, alínea h) do RAU.
36ª.- Por outro lado, não se verificam aqui os fundamentos desta causa de resolução, porquanto, por um lado, a degradação do imóvel é anterior ao encerramento e não causada (posteriormente) por este e, por outro lado, o locado, nas condições em que se encontrava à data do encerramento, não era, e não é, apto à realização dos fins a que se destina.
37ª.- O dever de os senhorios realizarem obras decorre directamente da lei - artigos 89º, nºs 1 e 2 do DL n.º 555/99, de 16/09, e no artigo 12º, n.º 1 do DL n.º 321-B/90, de 15/10 -, pelo que os R.R. (senhorios) não tinham que ser interpelados directamente pela A. (inquilina) para aquele efeito.
38ª.- Ainda assim, a CMC ordenou a notificação dos R.R. para realizarem as obras (vd. alínea I) dos Factos Provados), o que foi cumprido (fls. 34 dos autos), a qual, porém, só não foi recebida pelas razões constantes de fls. 32 e 33 dos autos.
39ª.- A recorrente não pode ser censurada pela omissão de um dever cujo cumprimento não estava, nunca esteve, sob o seu domínio.
40ª.- Constam dos autos elementos de prova seguros de que a A. deu cumprimento ao disposto no artigo 1038º, alínea h) do CC, primeiro, em 13/09/1994, por intermédio da CMC, depois, em 15/06/2001, pessoalmente.
41ª.- Face à inércia dos R.R., a A. não tinha que executar as obras sponte sua.
42ª.- As obras em causa eram de fundo, estruturais e extraordinárias, e não de carácter (absoluta ou relativamente) urgentes - vd. resposta aos quesitos 36º e 37º
43ª.- Não faz sentido onerar o arrendatário com a realização (e consequente pagamento) de obras dessa natureza e do montante referido na resposta ao quesito 38º.
Sem prescindir,
Da aceitação tácita pelos R.R. do encerramento do locado e, consequentemente, da manutenção do contrato de arrendamento, ou do abuso de direito dos R.R.:
44ª.- Após ter tomado conhecimento do encerramento do locado em 18/06/2001 (fls. 330) e de que este já não fazia consumos de água desde 1998 (fls.193), a Ré Sara, em 28/11/2001, comunicou à A. a actualização das rendas para o ano de 2002 (vd. fls. 291 dos autos), o que repetiu em 28/11/2002 (vd. fls. 298 dos autos), 13/12/2004 (vd. fls. 312 dos autos) e 30/11/2005 (vd. fls. 320 dos autos).
45ª.- A A. (recorrente) foi pagando, ponto por ponto, todas as rendas pelo valor das actualizações fixadas pela Ré - vd. fls. 292 a 297, 300 a 311, 314 a 319 e 321 a 326 dos autos.
46ª.- O comportamento daquela Ré ao enviar à A. a comunicação de fls. 291 dos autos (bem como as que posteriormente se lhe seguiram), após o conhecimento do encerramento do locado pela A. (vd. fls. 328, 329, 330 e 193 dos autos), é um facto concludente e inequívoco do qual se infere, com toda a probabilidade e segurança, a vontade da Ré de optar pela manutenção do contrato de arrendamento.
47ª.- Estamos perante uma declaração tácita de aceitação da manutenção do arrendamento, que produz os efeitos a que se dirige nos termos do artigo 217º, n.º 1 do CC.
48ª.- Ou, assim não se entendendo, estaríamos sempre perante um caso manifesto de abuso de direito, na modalidade do “venire contra factum proprium”.
49ª.- Com efeito, a Ré SR tomou conhecimento do encerramento do locado ou em 18/06/2001 ou com a recepção do ofício de 24/10/2001; actualizou as rendas em 28/11/2001, 28/11/2002, 13/12/2004 e 30/11/2005, e em 3/10/2006 vem pedir, na presente acção, a resolução do contrato de arrendamento com fundamento no encerramento do locado.
50ª.- Ou seja, a Ré SR criou, manteve e desenvolveu uma conduta para depois dela se aproveitar em prejuízo da A. e em seu exclusivo benefício, situação que a lei não consente - cfr. artigo 334º do CC.
Sem prescindir,
Do estado de necessidade no encerramento no locado:
51ª.- Face à resposta dada aos quesitos 9º, 11º, 31º e 37º e às alíneas G) e R) dos Factos Provados, conclui-se que não era exigível que a A. continuasse a utilizar o locado naquelas circunstâncias que por si não foram criadas, impondo-se o encerramento do locado por razões de segurança e saúde, quer de pessoas, quer de bens.
52ª.- Trata-se de um interesse juridicamente superior ao dos senhorios na utilização do locado.
53ª.- A actuação da A. (recorrente) em proceder ao encerramento do locado naquelas condições constitui uma situação típica de estado de necessidade, verificando-se os pressupostos objectivos previstos no artigo 339º do CC.
Sem prescindir,
Da não verificação dos pressupostos para decretar a resolução do contrato de arrendamento com fundamento no artigo 64º, n.º 1, alínea d) do RAU
54ª.- A alegada utilização imprudente é consequência directa e necessária do encerramento, pelo que não faz aqui sentido justificar o despejo em dois fundamentos que concorrem entre si - a suposta utilização imprudente traduz-se aqui no encerramento do locado.
55ª.- Ainda assim, não ficou provado o indispensável nexo de causalidade entre o encerramento e o estado de degradação que o imóvel apresenta.
56ª.- A resposta dada ao quesito 34º da base instrutória é claramente insuficiente para sustentar tal conclusão. Já a resposta ao quesito 35º imputa a falta de ventilação às condições físicas do próprio edifício (por se encontrar “parcialmente enterrado”) e as infiltrações de humidade ao facto de o chão do estabelecimento e da parede de fundo (da parte do armazém) estar em contacto com a terra.
57ª.- Ou seja, mesmo que a A. tivesse mantido o estabelecimento aberto, o arejamento e ventilação do locado não iriam resolver os problemas estruturais com que este se debatia.
58ª.- Pretender imputar-se a degradação do imóvel a conduta (activa ou omissiva) da A. choca e viola os mais elementares princípios da justiça e da boa fé contratual, já que provou-se que desde 29/11/1994 o prédio apresentava os vícios a que se refere o auto de vistoria de fls. 22 e 23 dos autos.
Quanto à apreciação dos pedidos formulados pela A. (recorrente)
59ª.- A procedência deste recurso há-de sempre implicar a remessa dos autos à 1ª instância para que o Mmo. Juiz “a quo” aprecie os pedidos formulados pela A. na acção, o que não fez por tê-los considerado prejudicados face à procedência da reconvenção.
60ª.- Ainda assim, provou-se que a A. encerrou o estabelecimento comercial que explorava na sequência da degradação do imóvel - vd. resposta ao quesito 11º da base instrutória.
61ª.- Provou-se também o nexo de causalidade entre o estado do locado e a quebra de facturação verificada a partir de 1993 - vd. resposta aos quesitos 13º e 11º e alíneas G), em especial sua subalínea b), e H) dos Factos Provados -, como também os prejuízos sofridos pela A. - vd. resposta aos quesitos 10º e 13º, conjugada com o relatório de fls. 971 a 973 dos autos.
62ª- Provou-se, finalmente, que a A. comunicou aos R.R. os vícios do locado e os prejuízos que daí advieram para o seu comércio - vd. fls. 328, 329 e 330 dos autos.
63ª.- Verificando-se uma omissão por banda dos R.R. no seu dever de realização das obras, faltaram estes culposamente ao cumprimento da obrigação, constituindo-se, assim, em responsabilidade pelo prejuízo que causaram à A. - cfr. artigos 798º e 562º e seguintes do CC.
64ª.- Pelo que estão reunidos todos os pressupostos para a procedência da pretensão da A.
65ª.- Ao decidir como decidiu, o Mmo. Juiz “a quo” violou, por errada interpretação, o disposto nos artigos 333º, 334º, 336º e 1038º, alínea h), do CC, nos artigos 12º, n.º 1, 64º, n.º 1, alíneas d) e h), e 65º, n.º1 do RAU, e nos artigos 89º, nºs 1 e 2 do DL n.º 555/99, de 16/09.

+

Os primeiros Réus contra-alegaram, concluindo pela improcedência da apelação.

+

Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir, tendo-se sempre presentes as seguintes coordenadas:
- O teor das conclusões define o âmbito do conhecimento do tribunal ad quem, sem prejuízo para as questões de oficioso conhecimento, posto que ainda não decididas;
- Há que conhecer de questões, e não das razões ou fundamentos que às questões subjazam;
- Os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido.

+

Quanto à matéria das conclusões 2ª a 17ª:

Impugna-se aqui o julgamento dos factos insertos nos quesitos 3º, 5º e 39º.
Nada impede que esta Relação escrutine o julgamento que foi feito destes factos, na medida em que do despacho motivador das respostas à base instrutória não decorre que para a convicção do tribunal quanto a tais concretos factos tenha tido implicação alguma a prova pessoal produzida (se assim não fosse, seria obviamente inadmissível o escrutínio, por não vir impugnada a decisão enquanto alicerçada também na prova pessoal). Pelo contrário, consta do despacho que a matéria dada como não provada (como é o caso daquela que temos aqui entre mãos) “resultou da manifesta falta de elementos probatórios, designadamente documentais, que a suportasse”. Portanto, repetimos, nada impede que se reaprecie a estrita matéria de facto em causa, justamente porque a prova pessoal produzida não teve aqui qualquer implicação.
No quesito 3º buscou saber-se se os Réus foram notificados do auto de vistoria e do despacho que sobre ele recaiu, referidos nas alíneas G), H) e I) dos Factos Assentes.
Convoca a Apelante para a pretendida modificação os documentos de fls. 27, 28, 29 e 136.
Ora, da documentação em causa retira-se que as Rés, através de advogado que as representava, requereram em 13 de Setembro de 2001 à Câmara Municipal de Caminha e com referência ao processo administrativo iniciado em Setembro de 1994 pela Autora com vista à realização de vistoria ao locado (v. fls. 18), que lhes fosse passada e enviada certidão do auto dessa vistoria. Tal auto é necessariamente o de fls. 22 e 23 (e a que se referem as alíneas G) e H) dos Factos Assentes), que se reporta à vistoria realizada no locado em 29 de Novembro de 1994. E o requerimento foi deferido (o que significa, dentro do que é normal e expectável - por isso presume-se o facto -, que aos Réus veio a ser entregue a certidão (ou que estes a receberam, o que vai dar ao mesmo), e do seu teor logo vieram a ter conhecimento). Deste modo, não pode senão concluir-se (para além de que à data do requerimento já os R.R. tinham conhecimento de que corria termos pela CMC um processo de obras tendo por objecto o imóvel dos autos, como também de que esse prédio tinha sido já sido vistoriado) que com a recepção do pretendido auto de vistoria ficaram os Réus na posse dos resultados da vistoria e do despacho a que se refere a alínea I) dos Factos Provados, que se encontrava inserto naquele auto.
Donde, a resposta cabida ao quesito em questão não é aquela que lhe foi consignada pelo tribunal recorrido mas bem a seguinte (note-se que esta resposta corresponde a um minus relativamente à economia do que vem perguntado, que é saber se os Réus tiveram ciência [foram notificados] do auto de vistoria e do despacho): “Provado apenas que pelo menos em Setembro de 2001 os Réus tiveram conhecimento do auto de vistoria e do despacho que sobre ele recaiu, referidos nas alíneas G), H) e I) dos Factos Assentes”.
No quesito 5º buscou saber-se se os Réus foram convocados para a vistoria a realizar em 6 de Fevereiro de 2003. Respondeu-se que se provou apenas o que consta da alínea O) dos Factos Assentes. Confrontando a pergunta com a resposta, o que resulta é que o tribunal considerou não provada a matéria quesitada, pois que a forma enviesada como se respondeu não representa em nada um minus relativamente à economia do perguntado (na realidade nada tem a ver uma coisa com a outra).
Ora, tem razão a Apelante quando afirma que do documento de fls. 628, emitido pelo Município de Caminha, decorre - é precisamente isso que está consignado no documento - que a Ré SR foi notificada para a realização de tal vistoria.
Consequentemente, a resposta que o quesito merece não é a que lhe foi dada, mas sim a seguinte: “Provado apenas que a Ré Sara Rodrigues foi convocada para a vistoria referida na alínea M) dos Factos Assentes”.
No quesito 39º perguntou-se se a Autora não informou os Réus da necessidade da realização de obras no prédio em causa. Respondeu-se da seguinte forma: “Provado apenas o que consta das alíneas F) a O) da matéria assente e nas respostas aos quesitos 3º a 7º da base instrutória”. Também aqui se vê que se perguntou uma coisa e se respondeu outra (de novo: a resposta não representa um minus relativamente à economia do perguntado). O que decorre desta forma de responder é necessariamente a não prova do facto perguntado.
Entretanto, entende a Apelante que se havia de responder ao quesito da seguinte forma: “Provado que a Autora informou a Ré SR, por carta registada (com A/R) datada de 15/06/2001, recebida em 18/06/2011”.
Mas é óbvio que semelhante pretensão carece de fundamento. Pois que o quesito reporta-se a um facto alegado pelos Réus, e a eles favorável, não podendo receber uma resposta (agora favorável à Autora) de sentido absolutamente oposto àquele que o mesmo quesito comporta. Ou seja, pergunta-se um facto alegado pelos Réus e a Apelante retorce a resposta de forma a, capitalizando sobre o que foi alegado pelos Réus, obter a prova do facto contrário e que lhe é favorável. Inaceitável. Não se pode perguntar uma coisa e obter a resposta do contrário!
Nesta parte improcede a pretendida modificação da matéria de facto.


Quanto à matéria das conclusões 18ª a 29ª:

Pretende-se aqui que se deve ampliar a matéria de facto, de modo a dar-se como provado, pois que há prova documental nesse sentido, que os Réus tomaram conhecimento em 2001 do encerramento do locado. E, em consequência, haveria que ser decidido que caducou o direito de pedir a resolução do contrato de arrendamento com fundamento no encerramento do locado por mais de um ano e na feitura de deteriorações no locado. Subsidiariamente, pretende a Apelante que se ordene um novo julgamento com vista ao apuramento da falada tomada de conhecimento.
Temos como óbvio que improcede esta pretensão.
A caducidade não é aqui de conhecimento oficioso (nº 2 do art. 333º do CCivil), sendo naturalmente infundamentado o que se afirma na conclusão 29ª.
Ora, tendo os Réus pedido na sua reconvenção a declaração de resolução do contrato de arrendamento com fundamento no encerramento do locado e no não pagamento das rendas (e ao que parece também com fundamento na prática de actos causadores de deteriorações consideráveis), debalde se procurará na réplica a invocação da caducidade do direito a resolver o contrato com fundamento seja no encerramento do locado seja na prática de actos que representem deteriorações consideráveis. Na realidade, e conforme decorre claro do artigo 91º a 112º da réplica, a Autora/Reconvinda invocou a excepção da caducidade sim, mas apenas quanto ao direito dos Réus em obterem a resolução com fundamento no não pagamento de rendas.
Consequentemente, o que a Apelante está agora a fazer é introduzir um thema decidendum novo, o que é inadmissível (ler o que acima se escreveu quanto aos limites de cognição deste tribunal ad quem).
De resto, e como toda a gente sabe (incluindo seguramente a Apelante), o prazo de caducidade reportado à resolução fundada no encerramento do locado, pois que se trata de facto continuado, está in casu submetido à regra do nº 2 (e não à regra do nº 1) do art. 65º do RAU, de sorte que nunca se verificaria a apontada caducidade. O que significa que sempre improcederia a pretensa excepção da caducidade.
Improcedem assim as conclusões em destaque.

+

Estão provados os factos seguintes:

Factos que foram considerados assentes:

A) No dia 15 de Dezembro de 1988, no Segundo Cartório Notarial de Viana do Castelo, a Autora tomou de trespasse o estabelecimento comercial de venda de confecções e pronto-a-vestir, instalado no rés-do-chão do prédio urbano, sito na Rua Conselheiro Miguel Dantas, freguesia e concelho de Caminha, inscrito na matriz sob o artigo urbano 2…°, nos termos constantes da cópia da escritura pública de trespasse que se encontra junta aos autos de fls. 10 a 16 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
B) Mário… subscreveu os recibos de aluguer que se encontram juntos aos autos a fls. 284, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
C) Para crédito na conta nº 03… da Caixa Geral de Depósitos, pertencente a Mário…, foram recebidos por aquela entidade bancária os montantes pecuniários que melhor surgem descritos nos documentos constantes de fls. 285 e cujos teores se dão aqui por integralmente reproduzidos;
D) Para crédito na conta nº 005… da Caixa Geral de Depósitos, pertencente a MT, foram recebidos por aquela entidade bancária os montantes pecuniários que melhor surgem descritos nos documentos constantes de fls. 286 a 290, 292 a 297, 300 a 311, 314 a 319 e 321 a 326, cujos teores se dão aqui por integralmente reproduzidos;
E) Para crédito na conta nº 08… da Caixa Geral de Depósitos, à ordem dos presentes autos, foram recebidos por aquela entidade bancária, o montante pecuniário que melhor surge descrito no documento constante de fls. 327 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, nele figurando, como arrendatária, MA, e como senhorios, SR e marido, LR, e MT e marido, AT;
F) Por requerimento datado de 13.09.94, mas entregue na Câmara Municipal de Caminha no dia 21.09.94, a Autora requereu ao Presidente da Câmara Municipal de Caminha, ao abrigo do disposto no artigo 10° do RGEU, uma vistoria ao prédio referido na alínea A), nos termos da cópia do documento que se encontra junto aos autos a fls. 18 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
G) Na sequência daquele requerimento, a Câmara Municipal ordenou uma vistoria ao prédio, que se realizou no dia 29.11.94, tendo constatado que: a) no tecto da parte posterior do estabelecimento ocupado pela reclamante, existe um estado avançado de deterioração, verificando-se mesmo a caída parcial desse tecto; b) esta situação é originada pela infiltração de águas da parte superior, colocando em risco a actividade económica exercida pela reclamante com as consequências daí inerentes; tudo conforme o conteúdo da cópia do auto de vistoria constante do presente processo de fls. 22 a 23 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
H) De acordo com tal auto de vistoria, propôs-se a realização, de imediato e com urgência, das seguintes obras: (i) verificação e remodelação, onde necessário, do sistema de esgotos e abastecimento de água no piso superior; (ii) verificação da cobertura do prédio, incluindo os respectivos rufos e caleiros, com a substituição dos elementos partidos ou deteriorados; (iii) arranjo do tecto e outras partes danificadas pelas infiltrações de água no estabelecimento da reclamante; tudo conforme o conteúdo da cópia do auto de vistoria constante do presente processo de fls. 22 a 23 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
I) Tal proposta constante do auto de vistoria mereceu despacho de concordância do Sr. Vereador do pelouro, que ordenou a notificação dos Réus e lhes fixou o prazo de 60 dias para a realização das obras em causa, conforme o conteúdo da cópia do auto de vistoria constante do presente processo de fls. 22 a 23 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
J) Por requerimento datado de 02.04.2002, dirigido à Câmara Municipal de Caminha, a Autora requereu que se notificassem novamente os Réus para a realização das obras em questão, conforme cópia do documento constante de fls. 24 dos presentes autos e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
K) O qual mereceu da Câmara Municipal de Caminha o seguinte despacho, datado de 30.04.2002: na sequência da notificação feita à CM Seixal, uma vez que a queixosa insiste na queixa, dado que decorreram desde então 5 anos, considero que: (…) 1 – Deve promover-se uma vistoria assinalando as deficiências encontradas e a evolução da situação demonstrada a 29NOV1994”; conforme cópia do documento constante de fls. 24 dos presentes autos e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
L) Após vistoria realizada ao prédio, em auto de vistoria de 09.07.2002, os Srs. Peritos decidiram, por unanimidade, que “não só se mantém a situação descrita no auto de vistoria datado de 29 de Novembro de 1994, como, o tempo decorrido, agravou naturalmente a situação existente, dado neste período, não ter havido qualquer intervenção”, conforme cópia do documento constante de fls. 36 dos presentes autos e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
M) Por ofício datado de 24.01.2003, a Câmara Municipal de Caminha notificou a Autora, informando-a que iria realizar nova vistoria, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 89° e seguintes do Decreto-Lei nº 555/99, a ter lugar no dia 06.02.2003, pelas 14.30 horas, conforme cópia do documento constante dos autos a fls. 38 e cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido
N) No auto de vistoria elaborado após a realização desta, lê-se que “viriam a observar-se as condições já antes descritas em auto de vistoria anterior, não tendo igualmente ocorrido, segundo os arrendatários, qualquer novo desenvolvimento. (…). Pelo exposto, os técnicos entendem manter a informação prestada no auto de vistoria datado de 09.07.02 e a descrição pormenorizada constante do auto de 29.11.94”, conforme cópia do documento constante dos autos a fls. 42 e cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido;
O) Em parecer datado de 01.06.2004, a jurista da Câmara Municipal de Caminha, propôs a repetição de todo o processo por preterição de formalidades legais, nos termos da cópia do documento constante dos autos de fls. 46 a 48 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, o qual mereceu a concordância do Sr. Vereador do pelouro que ordenou que a comissão de avaliação procedesse em conformidade com a mesma;
P) Em 06.09.2004, o técnico, Eng. Jorge Miranda, emitiu a informação que consta da cópia do documento constante dos autos de fls. 71 a 72 e cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido;
Q) Em sequência, foi marcada nova vistoria para o dia 06.06.2005;
R) Realizada a vistoria, foi constatado pelos Srs. Peritos o constante da cópia do auto de vistoria que consta dos autos de fls. 79 a 81 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
S) Com data de 19 de Maio de 2006, os Réus requereram à Presidente da Câmara Municipal de Caminha que se dignasse ordenar as diligências necessárias para que: (i) o edifício fosse declarado sem condições de habitabilidade; (ii) os inquilinos fossem notificados e impedidos de entrar no edifício; e (iii) que os ora requerentes fossem desobrigados de fazer obras de recuperação; tudo nos termos da cópia do requerimento que se encontra junto aos autos de fls. 85 a 86 e cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido;
T) O estabelecimento da Autora encontra-se encerrado desde Setembro de 1998.
U) O prédio em causa foi construído em 1893.

Factos emergentes das respostas aos artigos da base instrutória:

1) Provado apenas o que consta da al. G) da matéria assente. -Quesitos 1º e 2º
1-A) Pelo menos em Setembro de 2001 os Réus tiveram conhecimento do auto de vistoria e do despacho que sobre ele recaiu, referidos nas alíneas G), H) e I) dos Factos Assentes: - Quesito 3º
2) Os réus não executaram as obras em questão. -Quesito 4º
3) A Ré SR foi convocada para a vistoria referida na alínea M) dos Factos Assentes. – Quesito 5º
4) Os réus não estiveram presentes nessa vistoria. -Quesito 6º
5) As Rés e a Autora foram notificadas do dia da realização da vistoria pressuposta no despacho do Sr. Vereador do pelouro referido na alínea O) dos Factos Assentes e para, querendo, indicarem os seus peritos. -Quesito 7º
6) Os Réus não executaram qualquer obra no imóvel em causa após a vistoria referida na alínea R) dos Factos Assentes. -Quesito 8º
7) O imóvel em causa está de tal modo degradado que para a sua reparação é necessário destruir o seu miolo e o telhado. -Quesito 9º
8) Na declaração fiscal de 2007, o valor de mercadoria em stock no estabelecimento da autora era de € 7.263,03. -Quesito 10º
9) Na sequência dos factos constantes das respostas aos quesitos lº e 2°, e da consequente degradação que os mesmos provocaram no locado, a autora encerrou o estabelecimento comercial que aí explorava. -Quesito 11º
10) A contabilidade da empresa espelha uma quebra de facturação a partir do ano de 1993, sendo essa redução mais drástica a partir do ano de 1995. -Quesito 13º
11) Gustavo Meleiro Garcia fez obras no prédio contíguo ao locado. -Quesito 19º
12) Quando da realização dessas obras foram feitas escavações no quintal, o que provocou derrocada do muro do logradouro do prédio em que está implantado o edifício que integra o locado. -Quesito 20º
13) Ao nível do lº andar, na parede do alçado encostado o edifício onde foram realizadas as obras referidas na resposta ao quesito 20°, surgiram algumas fissuras. -Quesito 21º
14) Provado apenas o que consta da resposta ao quesito 20°, e que o Gustavo Meleiro procedeu à reconstrução e arranjo desse muro. -Quesito 23º
15) Provado apenas o que consta da resposta ao quesito 21º. -Quesito 24º
16) O Gustavo Meleiro mandou reparar as fissuras referidas na resposta ao quesito 21°, mas continuam a verificar-se algumas. -Quesito 27º
17) O estado actual do prédio põe em perigo a segurança física e a saúde das pessoas. -Quesito 31º
18) A autora não tem consumido água e electricidade no locado –Quesito 33º
19) Com o encerramento, o locado deixou de ter arejamento e ventilação. -Quesito 34º
20) O rés-do-chão padece de uma evidente falta de ventilação transversal, na medida em que se encontra parcialmente enterrado, sendo apenas desafogado na fachada voltada à Av. Miguel Dantas. Para além disso, o contacto do chão do estabelecimento, e da parede do fundo (da parte do armazém), com a terra ocasiona infiltrações de humidade. A falta de arejamento e ventilação acaba por agravar essas patologias e ocasionar um aumento desses teores de humidade, a criação de fungos e outras eflorescências e o surgimento de cheiros desagradáveis. -Quesito 35º
21) O prédio não é recuperável, nem reparável, sem que seja totalmente destruído e, posteriormente, totalmente reconstruído, com excepção das paredes que constituem a estrutura do edifício, constituídas em alvenaria de pedra nos alçados principal, posterior e laterais. –Quesito 36º
22) O seu interior corre o risco de ruir. -Quesito 37º
23) Para a reparação do prédio será necessário despender uma quantia entre € 200.000,00 a € 250.000,00. -Quesito 38º
24) Provado apenas o que consta das alíneas F) a O) da matéria assente e nas respostas aos quesitos 3° a 7° da base instrutória. -Quesito 39º

+

Perante a descrita matéria de facto, enfrentemos as demais questões colocadas pela Apelante.
Assim:

Quanto à matéria das conclusões 30ª a 43º:

Impugna-se aqui o julgamento de direito feito pela sentença recorrida quanto à resolução do contrato de arrendamento com fundamento no encerramento do locado por mais de um ano.
Vê-se que, na verdade, a sentença recorrida declarou a resolução do contrato de arrendamento com fundamento (ou também com esse fundamento) no encerramento do locado por mais de um ano.
Entretanto, importa observar, por uma questão de clareza, o seguinte: os primeiros Réus, na sua reconvenção, pediram por via principal a declaração de resolução (com fundamento no encerramento do locado, no não pagamento de rendas na forma devida e, ao que parece [a reconvenção não é lá muito clara quanto a isto], na prática de deteriorações no locado) do contrato de arrendamento e, subsidiariamente, a declaração de caducidade do contrato (por perda da coisa locada); inversamente, os segundos Réus, na sua reconvenção, pediram por via principal a declaração de caducidade do contrato (por perda da coisa locada) e, subsidiariamente, a declaração de resolução do contrato (com fundamento no encerramento do locado). Verifica-se assim que foram invocadas pelos dois conjuntos de Reconvintes, isto por via principal, quatro causas de pedir distintas com vista ao efeito pretendido (a cessação do contrato). Acontece que a sentença recorrida apenas de duas delas (encerramento do locado e prática de deteriorações ilícitas no locado, embora quanto a esta última causa de pedir se fique sem saber concludentemente se serviu mesmo para decretar a resolução) conheceu. Ora, não vale aqui o princípio da prejudicialidade previsto no nº 2 do art. 660º do CPC. Pelo contrário, quando o pedido vem apoiado em várias causas de pedir, deve o tribunal apreciar todas elas e não apenas uma ou algumas, mesmo que a que foi apreciada baste para satisfazer o aspirado pela parte (cfr. Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 4ª ed., p. 31). Serve isto para dizer que a sentença recorrida omitiu o conhecimento de questões de que lhe competia conhecer, mas contra a nulidade daí adveniente (e que não é de conhecimento oficioso) não se insurgiram os Reconvintes (que eram estes quem tinha interesse em fazê-lo), fosse por via de recurso principal, fosse por via de recurso subordinado, fosse pelo expediente da ampliação do âmbito da apelação da Autora (v. art. 684º-A do CPC). Donde, seja qual for a decisão a proferir neste recurso, estão definitivamente consolidadas e fora de causa as questões cujo conhecimento se omitiu.
Isto posto, o que importa ver aqui é então se os factos provados autorizam a resolução do contrato de arrendamento com fundamento no encerramento do locado por mais de um ano.
A sentença recorrida entendeu que sim.
A Apelante entende que não.
Vejamos:
Está provado que o estabelecimento da Autora se encontra encerrado desde Setembro de 1998. E embora encerramento do estabelecimento e encerramento do local arrendado não sejam exactamente a mesma coisa, não suscita dúvidas de maior, até mesmo pela forma como está desenhada a petição inicial, que a Autora tem desde então encerrado o local que lhe está arrendado.
E o encerramento do local arrendado por mais de um ano, e nos termos da alínea h) do nº 1 do art. 64º do RAU, confere ao senhorio o direito de resolver o contrato de arrendamento.
Verifica-se, entretanto, que o locado passou a manifestar desde 1994 deficiências, por causa de deteriorações e estas, como é notório, fundaram-se na falta de manutenção do edifício (e estamos a falar de um edifício deveras vetusto - foi construído em 1893), que contendem com as condições existentes à data em que a Autora se tornou locatária. Nesta medida, ficou afectado o normal uso e fruição do local por parte da locatária, tendo ademais em vista que nele exercia esta o comércio de venda de confecções e pronto-a-vestir. Os factos acima elencados sob G), H), I), L), N), P), R), 9), 17) e 22) revelam, quanto a nós, a bondade do que acaba de ser dito.
Alegou a Autora na sua petição inicial e reiterou na sua réplica, que encerrou o locado devido ao facto deste ter deixado de possuir as adequadas condições de utilização. Esta alegação, e ainda quanto a nós, recebe suficiente respaldo nos factos provados que acabam de ser destacados e particularmente no que resulta da resposta dada ao quesito 11º (ponto 9) da supra fundamentação fáctica).
Mas significa isto que se deve ter por justificado o encerramento, de modo a dizer que não estamos in casu perante uma causa resolutiva do contrato de arrendamento?
Em favor de uma resposta positiva a esta questão poder-se-ia porventura argumentar que só o ilícito contratual (“falta de cumprimento”, ut art. 63º nº 2 do RAU) por parte da arrendatária é que justificaria a resolução do contrato, mas a verdade é que o encerramento do locado não teria resultado de qualquer comportamento proposicional e ilícito da Autora, ou seja, não se teria verificado qualquer ilícito contratual imputável à Autora. De outro lado, e sabendo-se que a resolução facultada pela alínea h) do nº 1 do art. 64º do RAU se radica no propósito (função teleológica da norma) de impedir a desvalorização do locado (pela consequente degradação motivada pelo encerramento) e no de favorecer o lançamento no mercado locativo todos os espaços susceptíveis de ocupação por terceiros (v. Aragão Seia, Arrendamento Urbano, 7ª ed., p. 443), poder-se-ia acrescentar que nada disto pode estar em causa no caso vertente (rectius, não se encaixa uma coisa na outra), na certeza de que se sabe que o prédio, devido à sua vetustez e ausência de adequada manutenção, foi perdendo condições de utilização.
Pensamos, todavia, que só a resposta negativa è juridicamente cabida à interrogação feita. É que, atento o disposto na alínea h) do nº 1 do art. 64º do RAU, apenas o encerramento motivado por caso de força maior e que não se prolongue por mais de dois anos é que deixa de relevar para os fins resolutivos em causa. Estamos aqui perante uma causa de resolução que, mais do que centrada numa violação dos deveres do arrendatário, vale como uma situação que, objectivamente apreciada, torna injustificável a perduração do arrendamento (v. Pinto Furtado, Manual do Arrendamento Urbano, 3ª ed., p. 753 e 754). Acontece que o encerramento do locado se prolonga por mais de dois anos e que não estamos perante um caso de força maior, pois que tal figura tem como pressuposto a imprevisibilidade, a inevitabilidade (v. Pais de Sousa, Anotações ao Regime do Arrendamento Urbano, 6ª ed., p. 215), e os factos provados não se reportam a qualquer imprevisibilidade ou inevitabilidade.
Portanto, não pode deixar de se concluir que os Réus adquiriram o direito à resolução do contrato.
Mas uma coisa é a titularidade do direito, outra é a possibilidade de o exercer legitimamente.
E aqui chegados, a questão que se põe é a seguinte: deverá então ser declarada a resolução e ordenado o despejo da Autora?
Cremos que não.
Justificando:
Os factos provados mostram que os Réus, como donos do imóvel e como sucessores da relação jurídica de propriedade (e quem sucede na relação jurídica de propriedade, sucede para o bem e para o mal), deixaram de proceder à manutenção do edifício, não efectuando (aliás em contravenção do estabelecido no DL nº 555/99, designadamente seu art. 89º nº 1) as devidas obras de conservação. Por isso, apresenta agora o edifício riscos praticamente impeditivos da sua utilização (v. pontos R), 7), 21) e 22) da fundamentação fáctica acima elencada). E pelo menos desde 2001 (v. ponto 1-A) que os Réus adquiriram conhecimento da existência, reportada a 1994, de deficiências no edifício e no locado (aqui com risco para a actividade comercial da arrendatária, conforme consta do auto da vistoria então feita), e que sem dúvida teriam justificado a tomada de algum tipo de medidas de conservação, aliás ordenadas no auto de vistoria. Mas sabe-se que, apesar de adquirirem tal conhecimento, nada fizeram os Réus quanto a obras e restauros. Pelo contrário, pretenderam até que o edifício fosse declarado sem condições de utilização (v. S)), e esta pretensão não deixa de estar omnipresente nas suas contestações e nas contra-alegações que foram apresentadas. E sem dúvida que desde a vistoria de 2005 que os Réus sabem, como aliás não escondem, que o edifício se foi degradando paulatinamente, ao ponto de haver risco de todo o seu interior colapsar (v. R)).
Nesta medida, vistas portanto as circunstâncias idiossincráticas do caso, afigura-se-nos que o direito dos Reconvintes à pretendida resolução do contrato não pode ser actuado, por se revelar num exercício manifestamente abusivo. De facto, repugna ao vector da boa fé que quem deixa chegar praticamente à ruína o edifício onde se insere o locado (ademais sabendo que se trata de edifício deveras antigo, a demandar maior vigilância), que quem conhece que o estado do locado contende com a sua regular utilização para os fins da actividade económica exercida pela arrendatária (isto está claro, repetimos, no auto de vistoria a que se reporta o ponto G), e que chegou ao conhecimento dos Réus pelo menos em 2001), e que quem sabe perfeitamente desde pelo menos 2001 (v. a missiva de fls. 328, documento 79 junto com a réplica) que o estabelecimento está encerrado por razões inerentes ao estado do imóvel, possa ainda assim vir argumentar com o encerramento do locado com vista a resolver o contrato de arrendamento. Não nos parece aceitável que os Reconvintes possam capitalizar sobre uma omissão sua - qual seja, a não manutenção oportuna do edifício, com reflexos no locado - de forma a tirar partido precisamente de um circunstancialismo que somente eles podiam, razoavelmente, ter invertido. É certo que estamos perante um prédio antigo, é certo que há que levar em conta a inevitável fadiga e deterioração natural dos seus elementos, é certo que apenas é exigível ao Réus que, para efeitos do arrendamento, mantenham (conservem) o edifício e não que o recriem. Mas tudo isto deve ser visto e valorizado apenas como parte da questão. Se ao longo do tempo as acções de manutenção fossem cumpridas não estaríamos agora a falar de um imóvel manifestamente degradado. E, de resto, a vetustez incontornável de um imóvel não poderá nunca servir de factor facilitador (e muito menos indutor) da resolução do contrato de arrendamento, mas sim como causa da caducidade do contrato.
Neste contexto, julgamos que vale de pouco argumentar, como faz a sentença recorrida, com a falta de interpelação para a realização de obras, com a faculdade (mas não obrigação) que a Autora tinha de executar ela própria obras urgentes, ou sequer com a falta do aviso a que alude a alínea h) do art. 1038º do CC (aviso este que, de resto, está talhado para os vícios de que o senhorio não tem ou não deve ter conhecimento, e não para os vícios mais gerais inerentes à vetustez e manutenção do próprio edifício). Como se aponta no Ac do STJ de 25.11. 1998 (BMJ 481, p. 484), o risco de deterioração ao longo do tempo do prédio arrendado corre por conta do senhorio, que deve estar a par do que se passa, até porque sobre ele recai um dever de vigilância sobre o imóvel (art. 492º do CC).
Visto o disposto no art. 334º do CC, o exercício abusivo do direito por parte dos Réus não pode senão levar à denegação da actuação do direito à resolução do contrato com o estrito fundamento em causa.
Consequentemente, procede o que se visa com as conclusões em destaque.


Quanto à matéria das conclusões 51ª a 53ª:

Invoca aqui a Apelante o estado de necessidade quanto ao encerramento do locado.
Ora, para além de se tratar de assunto invocado ex novo neste recurso (portanto, não submetido à apreciação do tribunal recorrido), há que dizer que a situação factual vertente não se ajusta à estatuição do art. 339º do CC. O estado de necessidade, diz-nos Antunes Varela (v. Das Obrigações em Geral, I, p. 510), consiste na situação de constrangimento em que age quem sacrifica coisa alheia, com o fim de afastar o perigo actual de um prejuízo manifestamente superior. Não vemos que seja o caso. Do que se poderia tratar, no contexto em que se move a Apelante, seria bem de causa de força maior, mas sobre isto já dissemos acima o que havia a dizer.


Quanto à matéria das conclusões 44ª a 50ª:

Fala aqui a Apelante na aceitação tácita pelos Réus do encerramento do locado, de sorte que seria abusiva a sua actuação em contrário disto. Trata-se também de um assunto de última hora, sobre que não foi chamado a pronunciar-se o tribunal recorrido.
E o que há a dizer sobre isto é que a Apelante carece de razão, na medida em que a comunicação feita por uma das Rés em ordem à actualização das rendas apenas revela objectivamente o propósito de perceber a nova contraprestação devida pela afectação do locado à Autora. E o que é facto é que independentemente do locado estar ou deixar de estar encerrado, quem está na posse dele é a Autora, como arrendatária que é, e, como assim, é devido o pagamento das rendas. O propósito de actualização das rendas nestas circunstâncias em nada revela aceitação do encerramento do locado, é antes um facto perfeitamente neutro quanto a tal.
Improcedem pois as conclusões em destaque.


Quanto à matéria das conclusões 54ª a 58ª:

Conforme acima observámos, temos alguma dificuldade em perceber se foi efectivamente formulado algum pedido reconvencional à luz da alínea d) do nº 1 do art. 64º do RAU. E também, repetimos, não resulta para nós muito claro da sentença recorrida se a resolução do contrato nela decretada se fundou cumulativamente na prática de deteriorações consideráveis e no encerramento do locado, senão apenas neste último facto.
Mas seja como for, não vemos que da factualidade provada se possa retirar que a Autora praticou actos no locado que nele tenham causado deteriorações consideráveis. O que consta dos pontos 19) e 20), para além de não poder ser desligado das causas que levaram a Autora a encerrar o locado e por cuja ocorrência não é responsável, não tem por que representar uma deterioração considerável. Deterioração considerável é por certo, e como se tem acentuado (v. Aragão Seia, ob. cit., p. 436), a que revista um certo vulto, quer pela sua extensão, quer pelo custo da reparação, quer pelo confronto do valor e dimensão do prédio onde é praticada, mas a verdade é que o que está provado nada nos elucida quanto a isto. De resto, é óbvio que o fundamento resolutivo do encerramento do locado consome necessariamente o fundamento em causa, sendo este um efeito daquele e, como tal, não pode valer como fundamento resolutivo autónomo.
Procedem assim as conclusões em destaque.


Quanto à matéria das conclusões 59ª a 64ª:

Insurge-se aqui a Apelante contra a forma como foi abordado o seu pedido na sentença recorrida.
A sentença, há que o reconhecer, é um pouco confusa no que tange ao pedido da Autora, pois que apesar de nela (sentença) se significar que a procedência das reconvenções prejudicava o conhecimento de tal pedido, não deixa ainda assim a mesma sentença de referir que a pretensão da Autora não pode proceder, seja por falta de demonstração dos seus fundamentos seja por se tratar de um exercício abusivo do direito. E no seu dispositivo, a sentença julga inclusivamente improcedente a acção e absolve os Réus do pedido, tudo isto efeitos que, supondo um juízo de mérito, não parecem lá muito compatíveis com a anunciada prejudicialidade.
Mas seja como for, carece de razão a Apelante no que diz na conclusão 59ª, ao pretender que haveria que remeter os autos ao tribunal recorrido para apreciação dos seus pedidos. Pois do que se trata sempre é de escrutinar a decisão recorrida, tal como esta se apresenta, e isto é incumbência deste tribunal ad quem, a quem competirá, como questão que a Apelante coloca efectivamente em sede de recurso (conclusões 60ª e seguintes), aferir da existência ou não dos falados direitos.
Isto posto:
Pretende a Autora que goza do direito a ser indemnizada pelo facto de, devido à situação em que caiu o locado e ao seu consequente encerramento, ter sofrido prejuízo em mercadoria e no rendimento de exploração do estabelecimento.
Ora, como se vê da resposta dada ao quesito 10º (e pese embora estarmos aqui de novo perante uma resposta enviezada, mas cujo sentido útil não pode deixar de ser senão a não prova do facto perguntado) nada resultou provado quanto a danos em mercadorias.
E das respostas dadas aos quesitos 12º a 16º não pode senão concluir-se que, pese embora o encerramento do estabelecimento (resposta ao quesito 11º), ficaram por provar os factos basilares, constitutivos, do alegado prejuízo decorrente de perda de rendimento. De observar que a resposta dada ao quesito 13º não pode ser vista como decisiva em ordem a fazer concluir por qualquer prejuízo, até porque uma coisa é a facturação (que apenas revela o volume dos negócios), outra o rendimento que se obtém a partir da facturação, se é que algum. E este “algum” é que está precisamente em causa, pois que os factos não revelam a sua presença.
Estando por provar a existência de dano efectivo, pressuposto fundamental da obrigação de indemnizar, improcedem necessariamente as conclusões em destaque.


Quanto à matéria da conclusão 65ª:

O que se afirma nesta conclusão procede e improcede na justa medida do que acima se veio dizendo.

+

Concluindo:
Procede a apelação na parte em que visa impugnar o sentenciado quanto aos pedidos reconvencionais de resolução do contrato de arrendamento com fundamento no encerramento do locado por mais de um ano e (supostamente) na prática de deteriorações consideráveis. Consequentemente, deve ser a Autora/Reconvinda absolvida de tais pedidos, mantendo-se subsistente o contrato.
Improcede a apelação na parte em que se visa a procedência da acção. Consequentemente, deverão ser absolvidos do pedido os Réus.

+

Decisão:

Pelo exposto acordam os juízes nesta Relação em julgar parcialmente procedente a apelação e, em consequência:
a) Julgam improcedentes os pedidos reconvencionais na parte que vem impugnada, deles absolvendo a Autora/Reconvinda, revogando correspectivamente a sentença recorrida;
b) Confirmam a sentença recorrida (dispositivo) na parte em que julgou improcedente a acção e absolveu os Réus do pedido.

Regime de custas:

As custas inerentes à presente apelação ficam a cargo da Autora e dos Réus, na proporção de metade para cada, que nelas são condenados.
As custas inerentes de primeira instância inerentes à acção ficam a cargo da Autora, que nelas é condenada; as custas de primeira instância inerentes à reconvenção ficam a cargo dos Réus, que nelas são condenados.

+

Guimarães, 19 de Janeiro de 2012
José Rainho
Carlos Guerra
Conceição Bucho