Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
287/12.6TBAMR.G1
Relator: FILIPE CAROÇO
Descritores: INQUÉRITO JUDICIAL
RECUSA LEGÍTIMA
CONCORRÊNCIA
PREJUÍZO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 11/25/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: 1- No inquérito judicial à sociedade, compete ao sócio requerente fazer a prova da sua qualidade de sócio, da recusa da prestação da informação pedida ou da prestação de informação falsa, incompleta ou não elucidativa, enquanto a sociedade recusante deve provar a factualidade de que se possa retirar a licitude da recusa, enquanto facto impeditivo do direito do autor.
2- Não constitui fundamento de recusa legítima de informação pedida pelo acionista, nos termos das al.s a) e b) do nº 4 do art.º 291º do Código das Sociedades Comerciais, o facto daquele ser gerente ou administrador de sociedades que concorrem no mercado com outras sociedades administradas pelo administrador da requerida, todas clientes desta sociedade, mas não concorrentes com ela, sem que se prove que do benefício que o A. possa tirar da informação resulta prejuízo ou seja suscetível de poder prejudicar expressivamente a sociedade requerida ou algum acionista.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

I. [1]
J…, casado, residente na Rua…, Braga, veio, ao abrigo do disposto no artigo 1479.º, do Código de Processo Civil, intentar a presente ação especial de inquérito judicial à sociedade anónima P…, S.A., com sede na Rua…, Amares, e M…, residente no …, Braga.
Para o efeito alega o seguinte:
- A sociedade requerida foi constituída em 23 de agosto de 1999, tendo como objeto social o fabrico e comércio de painéis para coberturas e revestimentos, conforme resulta do teor da certidão da conservatória do registo comercial de fls. 22 e ss., cujos dizeres se dão aqui com integralmente reproduzidos.
- O requerido M…, além de presidente do conselho de administração da R., é um dos sócios maioritários e gerente de todas as outras sociedades comerciais acionistas da sociedade requerida.
- O requerido, na qualidade de presidente do conselho de administração da sociedade requerida recusa fornecer informações solicitadas pelo requerente.
- O A. detém 10,71% do capital social da R.
- Pelo menos, desde 2007, que o A. não tem conhecimento de alguns aspetos da vida financeira da sociedade requerida. Tendo interpelado várias vezes os R.R. para o fornecimento de informações, tem visto o seu pedido ser parcialmente recusado.
Com efeito,
- O requerente, não tem na sua posse o dossier fiscal dos períodos findos em 31-12-2009, 31-12-2010 e 31-12-2011; os balancetes analíticos de grau elevado (com todos os clientes, fornecedores, devedores e credores) dos anos 2009 a 2011; mapas de antiguidade de saldos dos exercícios dos anos de 2009 a 2011; mapa de antiguidades de saldos dos clientes considerados de cobrança duvidosa; mapa do modelo oficial do movimento das provisões, perdas por imparidade em créditos e ajustamentos efetuados nos anos de 2009 a 2011; listagem nominativa dos créditos considerados incobráveis dos anos de 2009 a 2011; dossier dos preços de transferência dos anos de 2009 a 2011 relativo a empresas com relações especiais; livros de atas da sociedade desde o seu início; originais de todas as presenças nas assembleias gerais; tabela de reclassificação de todas as contas POC para SNC na data da transição, ou seja de 01-01-2010 e 01-01-2011; extratos de 01-01-2009 a 31-12-2011 dos clientes e fornecedores; cópia da fatura mensal de valor mais elevado por cada um dos principais clientes; cópia do respetivo meio de pagamento dessa fatura; cópia da respetiva nota de crédito do desconto efetuado nessa fatura; extratos de 2009, 2010 e 2011 da conta “rendas e alugueres”; extratos de 2009, 2010 e 2011 das contas “adiantamentos por conta de compras” discriminado por fornecedor a quem foram efetuados os adiantamentos; contratos de arrendamento das instalações que não são propriedade da empresa; relação nominativa dos “financiamentos obtidos”, constantes do balanço, acompanhada de tipo de financiamento, data da contratação, termo do prazo para pagamento, finalidade do empréstimo, garantias prestadas e fotocópias de todos os contratos de empréstimo em vigor.
Não ocorrem as razões de sigilo e de concorrência invocadas pelos R.R. para impedir o acesso do A. à documentação em causa, propondo-se ele, com base em tais documentos, confirmar a existência de irregularidades cometidas pelo presidente do conselho de administração, no âmbito da gestão exclusiva e abusiva que faz na R., designadamente em violação do disposto nos art.ºs 397º, nº s 2 e 3, e 398º, nº 3, do Código das Sociedades Comerciais.
Termina assim:
«Nestes termos e nos mais de direito que V. Ex.ª mui doutamente suprirá, deverá o presente processo seguir os seus termos, conforme disposto nos artigos 1407º e seguintes do Código de Processo Civil, para serem efetuadas as diligências pertinentes à averiguação dos factos alegados». (sic)
Citados, os R.R. contestaram a ação, com a argumentação que se segue:
1. O presente inquérito judicial tem por fundamento a falta de prestação de informação por parte da R. e do R., este enquanto Presidente do Conselho de Administração.
2. O A. tem pedido e obtido, permanentemente, abundante informação sobre a R., como o comprovam, desde logo, os documentos juntos pelo próprio, sendo este apenas um expediente para causar perturbação na vida social e tentar obter benefícios com prejuízos para a demandada.
3. Já foi facultada ao A. grande parte dos elementos sobre os quais versa o pedido de informação pretensamente recusada.
4. O A. é, como o próprio alega (artigos 33º e 34º da petição inicial), o maior acionista e Presidente do Conselho de Administração das sociedades S…, S.A. e P…, S.A. (cf. documentos nºs 20 e 21 juntos com a petição inicial).
5. A sociedade S…, S.A. tem como objeto social a indústria de serralharia de construção civil e estruturas metálicas.
6. E a sociedade P…, S.A. tem como objeto social a perfilagem e quinagem de chapa zincada e pré-lacada e estamparia de vários perfis em chapa, bem como a comercialização de painéis e outros materiais concernentes à colocação de produtos da empresa.
7. Essas sociedades são, desde logo, grandes clientes da R. e fornecedoras de chapa perfilada e remates, sendo que as compras que a R. lhes fez nos últimos anos ascenderam aos seguintes valores:
2008 - € 253.190,74;
2009 - € 206.072,50;
2010 - € 270.325,13;
2011 - € 141.123,80.
8. Além disso, essas sociedades são concorrentes da R. e de todos os clientes desta, terceiros relativamente a esta lide.
9. Essas empresas, em 31.12.2011, eram responsáveis por mais de três milhões de euros de dívida à R., como se demonstra.
10. Todos os pedidos de informação que o A. tem feito visam exclusivamente, chegar ao conhecimento de listas de clientes e fornecedores, com respetivas condições de pagamento, para que o A. possa, nas suas empresas, tirar benefício disso, com eventuais prejuízos para a R. e para os seus clientes terceiros.
12. A prestação de algumas das informações solicitadas poderá ser divulgada e utilizada pelo A. junto de outros fornecedores e clientes da R., com vista a obter benefícios para as sociedades que o mesmo administra.
13. A divulgação de negócios em curso, preços de compra e de venda, condições de venda e de compra praticados, são obviamente matéria que não pode nem deve ser divulgada pela R.
14. Fornecer essa informação ao A. significaria fornecer à concorrência trunfos decisivos para se poder apropriar de clientes da R. e dar a conhecer a um cliente e fornecedor elementos decisivos para negociar em seu favor as condições contratuais que pretendesse (preços, condições de pagamento, etc…).
15. Se a R. tivesse de fornecer ao autor todas as informações sobre todos os seus clientes, nomeadamente os referidos nos pontos 6.1.6 a 6.1.16 do artigo 67º da petição inicial, estaria a divulgar elementos de sociedades terceiras, que são completamente estranhas à R. e que são concorrentes das sociedades de que o A. é administrador e sócio maioritário, com inevitáveis prejuízos para aquelas.
16. - Os balancetes, quando solicitados, foram oportunamente fornecidos ao A., mas não os de grau mais elevado, porque revelam pormenores sobre clientes e fornecedores que não são relevantes para a análise da atividade da empresa e que devem ser mantidos sob reserva, sob pena de poderem vir a ser utilizados em prejuízo da mesma;
- Os mapas de antiguidade de saldos de clientes, a relação nominativa de créditos incobráveis, os extratos de contas de clientes, com cópias de todas as faturas, meios de pagamento, notas de crédito, a relação nominativa de fornecedores e tudo o mais em pormenor (pontos 1, 2., 6., 7., 8., 10.) também não foram fornecidos, por a administração da Ré ter entendido serem matéria que deve ser mantida sob reserva, pelos motivos supra referidos.
17. Em 2009, o não envio de alguns elementos foi justificado pelo seguinte:
- Relativamente a alguns elementos contabilísticos remeteu-se para as atas da sociedade, nomeadamente as de aprovação de contas, de onde constavam os elementos pedidos;
- Relativamente às contas das sociedades participantes, a R. informou que não tem acesso às mesmas, nem estava obrigada a prestar tais informações.
- Relativamente aos pedidos de mapas de amortizações e mapa fiscal, a R. questionou a A. sobre a finalidade de obtenção dessas informações.
18. Em 16.09.2009, o A. teve acesso a atas, listas de presenças, convocatórias e livros de registos de ações, pelo que é falso o alegado no art.º 20º da petição inicial.
19. Em 2011, o A. teve acesso e pôde consultar os livros de atas da assembleia geral e do conselho de administração, as listas de presença, a tabela de reclassificação das contas POC, os extratos das contas relativas a despesas de representação, deslocações e estadas, os extratos das contas “trabalhos especializados e comissões”, os extratos da conta “rendas e alugueres”, extratos das contas “descontos de PP concedidos” e relação dos financiamentos obtidos (cf. doc.s 22 e 23 juntos com a p.i.).
20. A informação contabilística solicitada e negada sempre foi aquela informação que é extremamente detalhada, com identidade de clientes e fornecedores, quantidades e preços praticados, e que foi considerada pela R. como informação comercial e estratégica, que pode e deve manter-se sigilosa, porquanto, se chegasse ao conhecimento do Autor e de outros concorrentes, poria em causa os interesses da R. e até de terceiros, seus clientes.
21. Existiu e existe, pois, o justo receio de que o A. utilize as informações em causa para fins estranhos à sociedade, com prejuízo desta.
22. Num primeiro pedido de informação, o A. não indicou que as informações solicitadas se destinavam a responsabilizar o órgão de administração (cfr. carta de 29.06.2011 junta com a petição como doc. nº17).
23. Só perante a recusa da R., invocando motivos válidos para manter a informação sob reserva (carta de 25.07.2011 junta com a petição como documento nº18), é que o A. se lembrou de invocar essa intenção de responsabilização do Conselho de Administração e do órgão de fiscalização (carta de 26.08.2011 junta com a petição como documento nº22).
24. Nos n.ºs 2 e 4 do mesmo artigo referem-se os casos em que é podem ser recusadas as informações pedidas.
25. A recusa de informação é lícita: a) Quando for de recear que o acionista utilize a informação para fins estranhos à sociedade e com prejuízo desta ou de algum acionista; b) Quando a divulgação seja suscetível de prejudicar relevantemente a sociedades ou os acionistas c) Quando ocasione violação de dever de segredo imposto por lei.
26. Sempre foram prestadas pela R. as informações exigíveis.
27. As recusas de informação fundaram-se precisamente no justificado receio de que o acionista, ora A., utilize essas informações em seu benefício e de terceiros, com fins estranhos à sociedade e em prejuízo desta.
28. E ainda porque a divulgação desses elementos é suscetível de prejudicar a R. e terceiros, clientes da R., completamente estranhos à sociedade.
Concluíram no sentido do indeferimento do pedido de inquérito, por o A. ter tido acesso a toda a documentação relevante e a recusa da restante informação ter sido licitamente efetuada.
O A. apresentou réplica defendendo a improcedência de exceções invocadas pelos R.R. na contestação, mas este articulado foi rejeitado em Juízo.
Resultou infrutífera uma tentativa de conciliação realizada.
O tribunal inquiriu testemunhas arroladas pelas partes, proferindo depois a sentença fundamentada que culminou com o seguinte dispositivo, ipsis verbis:
«Face ao exposto, indefiro o presente requerimento de inquérito judicial à sociedade “Painel 2000 – Sociedade Industrial de Painéis, S.A..
Custas pelo requerente.»

Inconformado, o A. apelou daquela decisão, com as seguintes CONCLUSÕES:
(…)
Os R.R. contra-alegaram, concluindo assim:
(…)
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
*
II.
As questões a decidir --- exceção feita para o que é do conhecimento oficioso --- estão delimitadas pelas conclusões da apelação do A. acima transcritas (cf. art.ºs 660º, nº 2, 684º e 685º-A do Código de Processo Civil, na redação que foi introduzida pelo Decreto-lei nº 303/2007, de 24 de Agosto e art.ºs 608º, nº 2, 635º e 639º do novo Código de Processo Civil [2], aprovado pela Lei nº 41/2013 de 26 de junho).

Estão para decidir as seguintes questões:
A) Erro de julgamento em matéria de facto; e
B) Da existência de fundamento para inquérito judicial à sociedade por violação do direito à informação de um sócio.
*
III.
Para o efeito, foram dados como provados na 1ª instância os seguintes factos [3]:
1.- A sociedade requerida foi constituída em 23 de Agosto de 1999, tendo como objecto social o fabrico e comércio de painéis para coberturas e revestimentos, conforme resulta do teor da certidão da conservatória do registo comercial de fls. 22 e ss., cujos dizeres se dão aqui com integralmente reproduzidos.
2.- O requerido M.., além de Presidente do Conselho de Administração da ré, é um dos sócios de outras sociedades comerciais accionistas da sociedade requerida.
3.- Teor do pacto social da sociedade requerida junto a fls. 32, cujos dizeres se dão aqui com integralmente reproduzidos.
4.- Teor da carta dirigida pelo ora requerente à administração da sociedade requerida, datada de 14 de Maio de 2009, junta a fls. 53, cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
5.- Resposta à carta identificada em 4 pela administração da sociedade requerida, datada de 5 de Junho de 2009, junta a fls. 59, cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
6.- Teor da carta dirigida pelo ora requerente à administração da sociedade requerida, datada de 04 de Setembro de 2009, junta a fls. 59, cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
7.- Resposta à carta identificada em 6. pela administração da sociedade requerida, datada de 25 de Setembro de 2009, junta a fls. 61, cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
8.- Teor da carta dirigida pelo ora requerente à administração da sociedade requerida, datada de 28 de Março de 2011, junta a fls. 62, cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
9.- Resposta à carta identificada em 8. pela administração da sociedade requerida, datada de 08 de Abril de 2011, junta a fls. 64, cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
10.- Teor da carta dirigida pelo ora requerente à administração da sociedade requerida, datada de 13 de Maio de 2011, junta a fls. 73, cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
11.- Resposta à carta identificada em 10. pela administração da sociedade requerida, datada de 27 de Maio de 2011, junta a fls. 76 cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
12.- Teor da carta dirigida pela mandatária do ora requerente à administração da sociedade requerida, datada de 29 de Junho de 2011, junta a fls. 115 cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
13.- Resposta à carta identificada em 12. pela administração da sociedade requerida, datada de 25 de Julho de 2011, junta a fls. 119 cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
14.- Teor da carta dirigida pelo requerente à administração da sociedade requerida, datada de 26 de Agosto de 2011, junta a fls. 136 cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
15.- Resposta à carta identificada em 14. pela administração da sociedade requerida, datada de 26 de Agosto de 2011, junta a fls. 141 cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
16.- Teor do fax dirigido pela mandatária do requerente à administração da sociedade requerida, datado de 14 de Setembro de 2011, junto a fls. 142 cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
17.- Resposta ao fax identificada em 16. pela administração da sociedade requerida, datada de 21 de Setembro de 2011, junta a fls. 147 cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
18.- Teor da carta dirigida pela administração da sociedade requerida ao requerente, datada de 05 de Março de 2012, junta a fls. 151 cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
19.- Teor do fax dirigido pelo requerente à administração da sociedade requerida, datado de 15 de Março de 2012, junto a fls. 154 cujos dizeres se dão aqui como reproduzidos.
20.- Teor do documento junto a fls. 181, nos termos do qual o ora requerente, por meio da sua representante, declara que recebe em mão os balancetes analíticos de terceiro grau relativo ao exercício de 2011 e uma página do relatório de contas de 2011.
21.- Teor do relatório de contas da sociedade requerida junto a fls. 324 e ss., cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
22.- Balancete de grau 3 da sociedade requerida junto a fls. 430 e ss..
23.- O Autor tem pedido e obtido, permanentemente, abundante informação sobre vida económica e financeira da Ré.
24.- O requerido M.. possui exactamente as mesmas participações de capital que o sócio J.., com as percentagens que se passam a indicar: - 40% da A.., Lda; - 45% da C.., Lda; - 24, 95% da A.., LDA; - 50% da J.., LDA, conforme cópia das certidões permanentes juntas pelo requerente como doc. nº.s 4 a 7, cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
25.- O Autor é o maior accionista e Presidente do Conselho de Administração das sociedades S.., S.A. e P.., S.A., conforme documentos nºs 20 e 21 juntos com a petição inicial, cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
26.- A sociedade S.., S.A, tem como objecto social a indústria de serralharia de construção civil e estruturas metálicas.
27.- E a sociedade P.., S.A., tem como objecto social a perfilagem e quinagem de chapa zincada e pré-lacada e estamparia de vários perfis em chapa, bem como a comercialização de painéis e outros materiais concernentes à colocação de produtos da empresa.
28.- Essas sociedades são grandes clientes da Ré.
29.- E são fornecedoras de chapa perfilada e remates, sendo que as compras que a Ré lhes fez nos últimos anos ascenderam aos seguintes valores: 2008 - € 253.190,74; 2009 - € 206.072,50; 2010 - € 270.325,13; 2011 - € 141.123,80.
30.- A prestação de algumas das informações solicitadas poderá ser divulgada e utilizada pelo Autor junto de outros fornecedores e clientes da Ré, com vista a obter benefícios para as sociedades que o mesmo administra.
31.- Os balancetes, quando solicitados, foram oportunamente fornecidos ao Autor, mas não os de grau mais elevado.
32.- Os mapas de antiguidade de saldos de clientes, a relação nominativa de créditos incobráveis, os extractos de contas de clientes, com cópias de todas as facturas, meios de pagamento, notas de crédito, a relação nominativa de fornecedores e tudo o mais em pormenor não foram fornecidos, por a administração da Ré ter entendido serem matéria que deve ser mantida sob reserva.
33.- Em 2009, o não envio de alguns elementos foi justificado pelo seguinte: - Relativamente a alguns elementos contabilísticos remeteu-se para as actas da sociedade, nomeadamente as de aprovação de contas, de onde constavam os elementos pedidos; - Relativamente às contas das sociedades participantes, a Ré informou que não tem acesso às mesmas, nem estava obrigada a prestar tais informações. - Relativamente aos pedidos de mapas de amortizações e mapa fiscal, a Ré questionou a Autora sobre a finalidade de obtenção dessas informações.
34.- Em 16.09.2009, o Autor teve acesso a actas, listas de presenças, convocatórias e livros de registos de acções.
35.- Em 2011, o Autor teve acesso e pôde consultar os livros de actas da assembleia geral e do conselho de administração, as listas de presença, a tabela de reclassificação das contas POC, os extractos das contas relativas a despesas de representação, deslocações e estadas, os extractos das contas “trabalhos especializados e comissões”, os extractos da conta “rendas e alugueres”, extractos das contas “descontos de PP concedidos” e relação dos financiamentos obtidos.
36.- A informação contabilística solicitada e negada sempre foi aquela informação que é extremamente detalhada, com identidade de clientes e fornecedores, quantidades e preços praticados, e que foi considerada pela Ré como informação comercial e estratégica.
37.- Em 2012, o Autor teve acesso a toda a informação prévia à assembleia geral anual de 23 de Março.
38.- Com a carta de 6 de Março, a Ré enviou ao Autor o Relatório e Contas, incluindo o Relatório de Gestão, o Anexo ao Relatório de Gestão, as Demonstrações Financeiras e anexos, a Certificação Legal de Contas e o Relatório e Parecer do Fiscal Único.
*
Concretamente, a 1ª instância deu como não provado:
- Pelo menos, desde 2007 que o autor não tem conhecimento de alguns aspectos da vida financeira da sociedade requerida.
*
As questões da apelação
A- Erro de julgamento em matéria de facto
Nos termos do art.º 685º-B, nº 1, do Código de Processo Civil, quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
- Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; (al. a)) e
- Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida (al. b)).
O recorrente cumpriu aquelas exigências processuais, discriminando os pontos da matéria de facto e as provas, designadamente os documentos e as prestações testemunhais, com transcrição das passagens de gravação que, na sua perspetiva, justificavam resposta diversa do tribunal recorrido.
Segundo o recorrente,
- Quanto à matéria dada como provada:
a) O ponto 23º, cujo teor é “o A. tem pedido e obtido, permanentemente, abundante informação sobre vida económica e financeira da R.”, deveria ter tido resposta de “não provado”.
b) O ponto 37º, cujo teor é “em 2012, o A. teve acesso a toda a informação prévia à assembleia geral anual de 23 de Março”, deveria ter tido resposta de “não provado”.[4]
c) Os pontos 30º, 32º e 36º cujo teor é:
“30º- A prestação de algumas das informações solicitadas poderá ser divulgada e utilizada pelo Autor junto de outros fornecedores e clientes da Ré, com vista a obter benefícios para as sociedades que o mesmo administra.”
“32º- Os mapas de antiguidade de saldos de clientes, a relação nominativa de créditos incobráveis, os extractos de contas de clientes, com cópias de todas as facturas, meios de pagamento, notas de crédito, a relação nominativa de fornecedores e tudo o mais em pormenor não foram fornecidos, por a administração da Ré ter entendido serem matéria que deve ser mantida sob reserva.”
“36º- A informação contabilística solicitada e negada sempre foi aquela informação que é extremamente detalhada, com identidade de clientes e fornecedores, quantidades e preços praticados, e que foi considerada pela Ré como informação comercial e estratégica.”, deveriam ter tido a resposta de “não provado”.

- Quanto à matéria dada como não provada:
O ponto único, cujo teor é “pelo menos, desde 2007 que o A. não tem conhecimento de alguns aspetos da vida financeira da sociedade requerida”, deveria ter sido dado como “provado”. [5]

Estão reunidas as condições jurídico-processuais para o reexame da matéria de facto pretendido.
Tem vindo a entender-se de uma forma que se vem generalizando nos tribunais superiores, hoje largamente acolhida no art.º 662º do NCPC, que, no seu julgamento, a Relação, enquanto tribunal de instância, usa do princípio da livre apreciação da prova com a mesma amplitude de poderes que tem a 1ª instância (art.º 655º do Código de Processo Civil e atual art.º 607º, nº 5, do NCPC), em ordem ao controlo efetivo da decisão recorrida, devendo sindicar a formação da convicção do juiz ou seja o processo lógico da decisão, recorrendo com a mesma amplitude de poderes às regras de experiência na análise das provas, como garantia efetiva de um segundo grau de jurisdição em matéria de facto [6], porém, sem prejuízo do reconhecimento da vantagem em que se encontra o julgador na 1ª instância em razão da imediação da prova e da observação de sinais diversos e comportamentos que só a imagem fornece.
Citando Antunes Varela, escreve Baltazar Coelho [7] que “a prova jurídica de determinado facto ... não visa obter a certeza absoluta, irremovível da (sua) verificação, antes se reporta apenas a certeza subjectiva, a convicção positiva do julgador ou, o que vale por dizer, apenas aponta para a certeza relativa dos factos pretéritos da vida social e não para a certeza absoluta do fenómeno de carácter científico”.
Na mesma linha, ensina Vaz Serra [8] que “as provas não têm forçosamente que criar no espírito do juiz uma absoluta certeza acerca dos factos a provar, certeza essa que seria impossível ou geralmente impossível: o que elas devem é determinar um grau de probabilidade tão elevado que baste para as necessidades da vida”. É a afirmação da corrente probabilística --- seguida pela maior parte da doutrina --- que, opondo-se à corrente dogmática, considera não exigível mais do que um elevado grau de probabilidade para que se considere provado o facto.
Em todo o caso, há necessidade de um grau de convicção indispensável para justificar a decisão, devendo o quantum da prova ser fixado em atenção a todas as características do caso concreto e, especialmente, à importância do processo, à posição processual da alegação a provar e ao conteúdo dessa alegação. O que a decisão não pode ser, de modo algum, é arbitrária, funcionando a fundamentação como meio de justificação e compreensão do processo lógico e convincente da sua formação.
Importa, pois, reexaminar as provas indicadas pelo recorrente e pelos recorridos (todos se referem às prestações probatórias testemunhais e a documentos juntos aos autos) e as que serviram para formar a convicção da Ex.mo Julgador em ordem a manter ou a alterar a referida matéria de facto, exercendo um controlo efetivo dessa decisão e evitando, na medida do possível, a anulação do julgamento; antes corrigindo, por substituição, o erro que, acaso, tenha ocorrido [9] (art.º 665º do NCPC).
Da análise da fundamentação das respostas dadas pelo tribunal em matéria de facto, pese embora o seu caráter sintético, parece-nos indiscutível e evidente que foi feito um exame crítico das provas em que o tribunal alicerçou sua convicção, mais do que uma simples identificação dos meios de prova que teve por relevantes; fez uma real apreciação valorativa, explicando os motivos pelos quais deu alguma matéria como provada e outra como não provada.
Há que verificar se aquele exame ou discussão probatória corresponde à prova realmente produzida e ali invocada, desta feita, atendendo nomeadamente à argumentação exposta nas alegações da apelação e nas subsequentes contra-alegações.
Para tal, no que respeita à prova testemunhal, pese embora a transcrição de longos excertos de depoimentos feita pelo recorrente e pelos recorridos, foram ouvidas as gravações, pelas vantagens que assim emergem para o julgamento, pela perceção dos depoimentos na sua globalidade e de sinais, designadamente relacionados com a utilização da de voz, segurança e firmeza nas afirmações ou nas negações, forma e tempos de reação, que não apenas de palavras escritas.
Alguma dificuldade na perceção do discurso da ilustre mandatária do A. não obstou a que se tivesse compreendido suficientemente a exposição de conhecimento feita por cada uma das testemunhas, sem prejuízo para o controle da decisão em matéria de facto.
Como adiante iremos afirmar, em sede da aplicação do Direito, cabe ao sócio requerente do inquérito judicial a prova da sua qualidade de sócio, da recusa da prestação da informação pedida ou da prestação de informação falsa, incompleta ou não elucidativa, enquanto a sociedade recusante deve provar a factualidade de que se possa retirar a licitude da recusa, enquanto facto impeditivo do direito do autor. Daí que, enquanto ao A. basta provar factos que justifiquem o seu direito à informação, aos R.R. impõe-se a prova de que a recusa em a prestar tem fundamento legal.
Todos os depoimentos foram prestados por pessoas que, de uma ou outra forma, estão ligadas ao funcionamento da R. sociedade ou de sociedades de que o A. é acionista e administrador, com destaque para a P.., S.A, mostrando-se as suas prestações apoiadas em conhecimento das realidades a que deram resposta. Não foram detetadas divergências assinaláveis entre os depoimentos, sendo absolutamente natural que umas testemunhas conhecessem melhor ou até exclusivamente os factos com que se relacionaram. Em larga medida, os depoimentos foram coincidentes e, sobretudo compatíveis entre si, o que revela bem a credibilidade que nos mereceram.
A Dr.ª M.. é técnica oficial de contas e tem vindo a colaborar com o A. na tentativa de obtenção da informação pretendida e que continua a ser parcialmente negada. A M.. é filha do A. e trabalha na contabilidade e na direção de uma das empresas de que aquele é acionista e administrador, mostrando conhecer as relações estabelecidas entre as sociedades e que o progenitor administra e a R. P.., S.A. I.. é técnica oficial de contas na referida R. tendo-se referido às relações existentes entre esta sociedade administrada pelo R. M.., o A. e as empresas que este administra. J.. é diretor comercial da P.., S.A. e referiu-se às relações comerciais que veem sendo travadas entre esta sociedade e a R., com alusão segura à qualidade das relações que também esta mantém com outras sociedades administradas ou geridas pelos acionistas da R., o aqui R. M.. e seu irmão J.., com referência especial à A... O Eng.º A.. trabalha na R. desde o início da atividade empresarial desta, no ano 2000, e nem por isso deixou de prestar um depoimento em sentido semelhante ao da testemunha anterior na parte em que manifestou conhecer os factos a que foi perguntado.
Ficou a ideia clara de que existem elementos documentais na R. que têm vindo a ser negados ao A. e aos quais este não tem acesso, entre eles os balancetes de graus elevados, de onde constam elementos pormenorizados de gestão e prática comercial da R., extratos de conta, mapas de clientes que os identificam individualmente e definem os negócios com eles desenvolvidos, dossier fiscal, contendo inventário e balancetes, para conhecimento das imparidades e da regularidade fiscal e fecho de contas, e dossier dos preços de transferência. Como, fundadamente, refere a testemunha M.., a falta daqueles elementos não permite que o A. compreenda a situação financeira da R. sociedade, nomeadamente a condição de cada um dos seus clientes (valor da dívida de cada um deles, juros, crédito incobrável, etc.) e o critério que a administração da R. utiliza em negócios, assim como o teor destes, de que deu exemplo a venda de uma máquina transferida para Angola em condições incompreendidas, de valor muito elevado (€ 3.200.000,00) e a venda de produtos a clientes, entre eles as empresas do A. e sociedades que o 2º R. e o seu irmão administram e de que também são sócios, por preços que o A. não consegue descortinar, suspeitando de que estas sociedades são favorecidas em relação às administradas pelo A., através de descontos especiais percetíveis no funcionamento do mercado. Ainda na perspetiva daquela testemunha, o relatório anual que tem sido enviado com aquela periodicidade ao A. pela R. é muito resumido e conclusivo, não permitindo que tome conhecimento de factos ou pormenores daquela natureza e que só a documentação não facultada permitirá.
Da generalidade dos depoimentos testemunhais resultou a evidência da inexistência de concorrência entre a R. P.., S.A. e as sociedades que o A. administra. Nenhuma testemunha afirmou a existência de concorrência. Sendo clientes da R., não são suas concorrentes. O que foi convincentemente referido por vários depoentes foi que há concorrência na distribuição dos produtos que a R. fabrica e vende quer às sociedades de que o A. é acionista e administrador (a P.., S.A. e a S... S.A.), quer às sociedades de que o R. M.. também é administrador e acionista, com destaque para a A.., sendo esta e a P.., S.A. os dois maiores clientes da R. É entre estas que a concorrência se desenvolve, podendo haver descontos diferenciados com base em formalizações diversas (pese embora a testemunha I.. refira que não há), em prejuízo das empresas do A. Não o tendo afirmado, algumas das testemunhas admitem como possível aquela diferenciação de preços, com destaque para M., M.., J.. e até A.., funcionário da R., este, porém, não interveniente na gestão financeira, reforçando a ideia de que só a informação pretendida pelo A. permite esclarecer perante ele a situação.
A testemunha I.., técnica oficial de contas na própria R. P.., S.A., refere expressamente que a P.. é um bom cliente daquela empresa e que não vê qualquer perigo para a R. sociedade que o A. tenha acesso e conhecimento do dossier de transferência, sem o qual o A. não consegue averiguar se a política de descontos é igual para todos os clientes, e do dossier fiscal, reconhecendo que têm sido recusados ao A., designadamente os balancetes de grau elevado.
Os documentos de fl.s 53 e seg.s refletem o esforço do A. na obtenção dos elementos documentais e a negação parcial do acesso por parte da R., resultando já da carta subscrita pela ilustre mandatária do A., de 16.9.2011, a intenção de apurar responsabilidades civis e criminais dos membros do conselho de administração e do órgão de fiscalização da sociedade (doc. de fl.s 142), e da carta da R. de 25 de junho de 2011 que a divulgação dos elementos negados prejudicaria relevantemente a sociedade e os clientes (atente-se, porém, que o A. é administrador de uma das maiores clientes da R., a sociedade P.., S.A. e que o 2º R., administrador da 1ª R., também administra várias empresas clientes da 1ª R.).
Tudo visto, constata-se que há muita informação na R., porventura a mais pormenorizada e esclarecedora, que não foi facultada ao A. ao longo de vários anos e que prejudica o seu conhecimento cabal da gestão que vem sendo ali desenvolvida. De modo algum se pode considerar que o A. tem obtido abundante informação sobre a vida económica e financeira da R. Muito menos se prova que a prestação de informação é permanente. Pelo contrário, só em parte é obtida, apenas por insistência do A. e de modo parcial.
Com efeito, o facto constante do item 23º dos factos provados deve ter-se como “não provado” e eliminado.
Não há dúvida de que, a ser-lhe fornecida a informação em falta, o A. poderá vir a divulgar e a utilizar essa informação junto das empresas que administra e que são fornecedoras e, principalmente, também clientes da R. sociedade. Tal utilização pode trazer benefícios para as sociedades que aquele administra. Na falta de referências probatórias à intenção de obter o benefício, devemos ficar-nos pela sua possibilidade. O sentido da prova testemunhal é o de que o A. pretende esclarecer-se e compreender a gestão da R., tendo em vista a eventual responsabilização dos seus administradores e fiscalizadores. Assim, altera-se o item 30º dos factos provados Para: “A prestação de algumas das informações solicitadas poderá ser divulgada e utilizada pelo A. em benefício das sociedades que administra e que são clientes da R.”
De facto, resulta da prova documental e da prova testemunhal que a R. decidiu manter sob reserva os elementos documentais descritos sob o item 32º dos factos provados, não os fornecendo ao A. Este ponto mantém-se inalterado (veja-se, por exemplo, o documento de fl.s 119).
Também o ponto 36º dos factos provados não merece qualquer modificação. Ninguém pode questionar, em função das provas produzidas, que os R.R. quiseram ocultar e ocultaram ao A. a informação contabilística detalhada ali referida, por (bem ou mal) considerarem ser uma questão de estratégia comercial.
Quanto ao ponto 37º dos factos provados, não há prova de que toda a informação (toda… qual?) foi fornecida ao A. antes da assembleia geral anual de 23 de março de 2012. Simplesmente, podemos assentar em que o A. teve acesso à informação preparatória dessa assembleia (veja-se, por exemplo, a sentença certificada a fl.s 470 e seg.s, também proferida pelo Tribunal Judicial de Amares). Daí que aquele ponto passe a ter o seguinte teor: “Em 2012, o A. teve acesso à informação preparatória da assembleia geral de 23 de março.”.
Quanto à matéria não provada e descrita no ponto único da sentença, não pode manter-se. Na falta de documentos solicitados e na negação de informação a que, claramente, o A. está sujeito desde há vários anos, por decisão da administração da R., é por demais evidente que não tem conhecimento de alguns aspetos da vida financeira da mesma. A matéria em causa passa a constituir um facto provado, sob o item 39º: “Pelo menos, desde 2007 que o A. não tem conhecimento de alguns aspetos da vida financeira da R. sociedade.”.

Dada a modificação introduzida, os factos provados passam a ser os seguintes:
1.- A sociedade requerida foi constituída em 23 de Agosto de 1999, tendo como objeto social o fabrico e comércio de painéis para coberturas e revestimentos, conforme resulta do teor da certidão da conservatória do registo comercial de fls. 22 e ss., cujos dizeres se dão aqui com integralmente reproduzidos.
2.- O requerido M.., além de Presidente do Conselho de Administração da ré, é um dos sócios de outras sociedades comerciais acionistas da sociedade requerida.
3.- Teor do pacto social da sociedade requerida junto a fls. 32, cujos dizeres se dão aqui com integralmente reproduzidos.
4.- Teor da carta dirigida pelo ora requerente à administração da sociedade requerida, datada de 14 de Maio de 2009, junta a fls. 53, cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
5.- Resposta à carta identificada em 4 pela administração da sociedade requerida, datada de 5 de Junho de 2009, junta a fls. 59, cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
6.- Teor da carta dirigida pelo ora requerente à administração da sociedade requerida, datada de 04 de Setembro de 2009, junta a fls. 59, cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
7.- Resposta à carta identificada em 6. pela administração da sociedade requerida, datada de 25 de Setembro de 2009, junta a fls. 61, cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
8.- Teor da carta dirigida pelo ora requerente à administração da sociedade requerida, datada de 28 de Março de 2011, junta a fls. 62, cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
9.- Resposta à carta identificada em 8. pela administração da sociedade requerida, datada de 08 de Abril de 2011, junta a fls. 64, cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
10.- Teor da carta dirigida pelo ora requerente à administração da sociedade requerida, datada de 13 de Maio de 2011, junta a fls. 73, cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
11.- Resposta à carta identificada em 10. pela administração da sociedade requerida, datada de 27 de Maio de 2011, junta a fls. 76 cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
12.- Teor da carta dirigida pela mandatária do ora requerente à administração da sociedade requerida, datada de 29 de Junho de 2011, junta a fls. 115 cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
13.- Resposta à carta identificada em 12. pela administração da sociedade requerida, datada de 25 de Julho de 2011, junta a fls. 119 cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
14.- Teor da carta dirigida pelo requerente à administração da sociedade requerida, datada de 26 de Agosto de 2011, junta a fls. 136 cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
15.- Resposta à carta identificada em 14. pela administração da sociedade requerida, datada de 26 de Agosto de 2011, junta a fls. 141 cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
16.- Teor do fax dirigido pela mandatária do requerente à administração da sociedade requerida, datado de 14 de Setembro de 2011, junto a fls. 142 cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
17.- Resposta ao fax identificada em 16. pela administração da sociedade requerida, datada de 21 de Setembro de 2011, junta a fls. 147 cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
18.- Teor da carta dirigida pela administração da sociedade requerida ao requerente, datada de 05 de Março de 2012, junta a fls. 151 cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
19.- Teor do fax dirigido pelo requerente à administração da sociedade requerida, datado de 15 de Março de 2012, junto a fls. 154 cujos dizeres se dão aqui como reproduzidos.
20.- Teor do documento junto a fls. 181, nos termos do qual o ora requerente, por meio da sua representante, declara que recebe em mão os balancetes analíticos de terceiro grau relativo ao exercício de 2011 e uma página do relatório de contas de 2011.
21.- Teor do relatório de contas da sociedade requerida junto a fls. 324 e ss., cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
22.- Balancete de grau 3 da sociedade requerida junto a fls. 430 e ss..
23.- O requerido M.. possui exatamente as mesmas participações de capital que o sócio J.., com as percentagens que se passam a indicar: - 40% da A.., Lda; - 45% da C.., Lda; - 24, 95% da A.., LDA; - 50% da J.., LDA, conforme cópia das certidões permanentes juntas pelo requerente como doc. nº.s 4 a 7, cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
24.- O Autor é o maior acionista e Presidente do Conselho de Administração das sociedades S.., S.A. e P.., S.A., conforme documentos nºs 20 e 21 juntos com a petição inicial, cujos dizeres se dão aqui como integralmente reproduzidos.
25.- A sociedade S.., S.A, tem como objeto social a indústria de serralharia de construção civil e estruturas metálicas.
26.- E a sociedade P.., S.A., tem como objeto social a perfilagem e quinagem de chapa zincada e pré-lacada e estamparia de vários perfis em chapa, bem como a comercialização de painéis e outros materiais concernentes à colocação de produtos da empresa.
27.- Essas sociedades são grandes clientes da Ré.
28.- E são fornecedoras de chapa perfilada e remates, sendo que as compras que a Ré lhes fez nos últimos anos ascenderam aos seguintes valores: 2008 - € 253.190,74; 2009 - € 206.072,50; 2010 - € 270.325,13; 2011 - € 141.123,80.
29.- A prestação de algumas das informações solicitadas poderá ser divulgada e utilizada pelo A. em benefício das sociedades que administra e que são clientes e fornecedoras da R.
30.- Os balancetes, quando solicitados, foram oportunamente fornecidos ao Autor, mas não os de grau mais elevado.
31.- Os mapas de antiguidade de saldos de clientes, a relação nominativa de créditos incobráveis, os extratos de contas de clientes, com cópias de todas as faturas, meios de pagamento, notas de crédito, a relação nominativa de fornecedores e tudo o mais em pormenor não foram fornecidos, por a administração da Ré ter entendido serem matéria que deve ser mantida sob reserva.
32.- Em 2009, o não envio de alguns elementos foi justificado pelo seguinte: - Relativamente a alguns elementos contabilísticos remeteu-se para as actas da sociedade, nomeadamente as de aprovação de contas, de onde constavam os elementos pedidos; - Relativamente às contas das sociedades participantes, a Ré informou que não tem acesso às mesmas, nem estava obrigada a prestar tais informações. - Relativamente aos pedidos de mapas de amortizações e mapa fiscal, a Ré questionou a Autora sobre a finalidade de obtenção dessas informações.
33.- Em 16.09.2009, o Autor teve acesso a atas, listas de presenças, convocatórias e livros de registos de ações.
34.- Em 2011, o Autor teve acesso e pôde consultar os livros de atas da assembleia geral e do conselho de administração, as listas de presença, a tabela de reclassificação das contas POC, os extratos das contas relativas a despesas de representação, deslocações e estadas, os extratos das contas “trabalhos especializados e comissões”, os extratos da conta “rendas e alugueres”, extratos das contas “descontos de PP concedidos” e relação dos financiamentos obtidos.
35.- A informação contabilística solicitada e negada sempre foi aquela informação que é extremamente detalhada, com identidade de clientes e fornecedores, quantidades e preços praticados, e que foi considerada pela Ré como informação comercial e estratégica.
36.- Em 2012, o A. teve acesso à informação preparatória da assembleia geral de 23 de março.
37.- Com a carta de 6 de Março, a Ré enviou ao Autor o Relatório e Contas, incluindo o Relatório de Gestão, o Anexo ao Relatório de Gestão, as Demonstrações Financeiras e anexos, a Certificação Legal de Contas e o Relatório e Parecer do Fiscal Único.
38.- Pelo menos, desde 2007 que o A. não tem conhecimento de alguns aspetos da vida financeira da R. sociedade.
*
B) Da existência de fundamento para inquérito judicial à sociedade por violação do direito à informação de um sócio
A divergência do apelante relativamente à decisão sentenciada baseia-se no alegado erro do tribunal na aplicação do Direito relativamente ao fundamento da ação. Na sua perspetiva, o tribunal julgou a ação improcedente e absolveu os R.R. por, indevidamente, ter considerado não haver violação do dever de informação ao sócio.
O direito potestativo à informação dos sócios ou acionistas é um dos princípios básicos em que assenta o Código das Sociedades Comerciais.
Resulta do art.º 21º, nº 1, al. c), do Código das Sociedades Comerciais [10], genericamente, que “todo o sócio tem direito … a obter informações sobre a vida da sociedade, nos termos da lei e do contrato”.
O direito à informação é depois tratado especificamente no mesmo código em relação a cada um dos tipos de sociedades [11].
Trata-se de um direito instrumental, instituído na perspetiva da sua essencialidade para garantir o exercício de outros direitos sociais, nomeadamente o direito aos lucros, de voto, de impugnação de deliberações sociais, de ação de responsabilidade contra os administradores, etc.). Por isso é tido como um direito geralmente qualificado como um direito extrapatrimonial do sócio para o exercício de outros direitos, patrimoniais ou extrapatrimoniais [12], a exercer junto do órgão habilitado a prestá-las, que é o órgão de gestão da sociedade, como sejam «... esclarecimentos, dados, elementos, notícias, descrições sobre factos, actuais e futuros, que integrem a vida e a gestão da sociedade ...». [13]
A propósito das sociedades anónimas, o direito à informação está previsto nos art.ºs 288º a 291º, dividindo-se em “direito mínimo à informação” que se concretiza pelo exercício do direito de consulta na sede da empresa ou pela exigência de que se facultem ao acionista os elementos constantes dos art.ºs 288º, nº 1, “informações preparatórias da assembleia geral” ou informação intercalar (art.º 289º), “informações em assembleia geral” (art.º 290º) e “direito coletivo à informação” (art.º 291º). Nos casos dos art.ºs 288º e 291º podemos falar em informação permanente.
Entre os elementos e consultar ou a facultar ao acionista, contam-se os relatórios de gestão e os documentos de prestação de contas previstos na lei, relativos aos três últimos exercícios, incluindo os pareceres do conselho fiscal ou do conselho geral, bem como os relatórios do revisor oficial de contas sujeitos a publicidade, nos termos da lei (al. a) do nº 1 do art.º 288º), sendo que os acionistas cujas ações atinjam 10% do capital social podem solicitar, por escrito, ao conselho de administração ou à direção que lhes sejam prestadas, também por escrito, informações sobre assuntos sociais em geral, incluindo sobre factos já praticados (art.º 291º, nºs 1 e 3).
Naturalmente que o direito à informação sobre assuntos sociais é mais abrangente do que o direito mínimo à informação a que se refere o art.º 288º, é um direito de informação em sentido estrito, de exercício permanente, podendo a informação ser solicitada a todo o tempo, sem que a lei restrinja o seu pedido a qualquer quantidade ou quantifique o número de pedidos efetuados em cada exercício, ao contrário do que se verifica noutros ordenamentos jurídicos, designadamente o francês, sem que, naturalmente, se vá ao ponto de admitir ao acionista a realização de um inquérito privado à sociedade. [14]
Estas informações só não serão prestadas, com base em recusa legítima, ao abrigo do nº 4 do mesmo art.º 291º, quando:
a) For de recear que o acionista a utilize para fins estranhos à sociedade e com prejuízo desta ou de algum acionista;
b) A divulgação, embora sem os fins referidos na alínea anterior, seja suscetível de prejudicar relevantemente a sociedade ou os acionistas;
c) Ocasione violação de segredo imposto por lei.
O inquérito judicial funciona como o meio processual especial, adequado a determinar que a informação seja prestada em caso de recusa expressa ou presumida, ou ainda em caso de prestação de informação presumivelmente falsa, incompleta, ou não elucidativa, por parte do conselho de administração ou direção da sociedade (art.º 292º, nºs 1, 2 (corpo) e 6 do Código das Sociedades Comerciais e art.º 1479º e seg.s do Código de Processo Civil). [15] É uma forma de processo de jurisdição voluntária (art.ºs 1409º e seg.s do Código de Processo Civil). Visa, assim, garantir e tornar efetivo o direito dos sócios à informação que está consagrado nos art.º 21º, nº 1, al. c) e 288º e seg.s no que concerne às sociedades anónimas. Comporta duas fases:
- a primeira, em que nos situamos, destina-se à apreciação pelo juiz dos fundamentos invocados pelo requerente e, haja ou não resposta dos requeridos, decide se há motivos para proceder ao inquérito (arte.º 1480º, nº 1);
- na segunda fase, se for ordenada a realização do inquérito, o juiz fixa os pontos que a diligência deve abranger, nomeando perito ou peritos que deverão realizar a investigação, aplicando-se o disposto quanto à prova pericial e, depois de concluído, fixa a matéria de facto e decide sobre as providências requeridas (art.ºs 1480º, nº 2, e 1482º, nº 1).

O art.º 1410º do Código de Processo Civil determina que nos processos de jurisdição voluntária será tomada a decisão julgada mais conveniente e oportuna, sem estrita subordinação a critérios de legalidade estrita.
Enquanto na jurisdição contenciosa o juiz, por regra, só pode servir-se dos factos fornecidos pelas partes [16], na jurisdição voluntária pode utilizar factos que ele próprio capte e descubra. O material de facto, sobre que há de assentar a resolução, é não só o que os interessados ofereçam, senão também o que o juiz conseguir trazer para o processo pela sua própria atividade [17].
Assim, numa primeira fase do processo, após o contraditório, o juiz decide se há motivos para proceder ao inquérito, optando pela sua negação ou pela ordem da sua realização nos termos do art.º 1480º do Código de Processo Civil.
Cabe ao sócio requerente do inquérito judicial a prova da sua qualidade de sócio, da recusa da prestação da informação pedida ou da prestação de informação falsa, incompleta ou não elucidativa, enquanto a sociedade recusante deve provar a factualidade de que se possa retirar a licitude da recusa, enquanto facto impeditivo do direito do autor[18]. Não demonstrando a parte o facto que lhe aproveita (art.º 342º, nº 1, do Código Civil), o juiz não pode deixar de o considerar como não existente. Este ónus traduz-se para a parte a quem compete, no encargo de fornecer a prova do facto visado, incorrendo nas desvantajosas consequências de se ter como líquido o facto contrário, quando omitiu ou não logrou realizar essa prova; ou na necessidade de, em todo o caso, sofrer tais consequências se os autos não contiverem prova bastante desse facto [19].
Voltando aos fundamentos da recusa legítima a que se refere o nº 4 do art.º 291º, e que aqui podem relevar, o prof. Raul Ventura [20], abordando a al. a), entende que o receio de utilização e divulgação da informação de modo a prejudicar a sociedade ou acionistas desta tem de ser apreciado objetivamente e que a expressão “for de recear” não se compadece com meras suposições infundadas. Tudo pode ser sempre receado e o exagero do receio inutilizaria o direito à informação. A recusa é legítima quando as circunstâncias do caso indicam razoável probabilidade de utilização incorreta da informação. A apreciação do receio deve ser feita objetivamente, assente em elementos suficientemente consistentes que permitam constatar tal receio, sem para isso contarem convicções ou predisposições dos gerentes ou administradores. [21]
Deve essa apreciação assentar em elementos suficientemente consistentes que permitam constar tal receio, não sendo de aceitar para o efeito meras suposições de ordem subjetiva. [22]
E foi citando Raul Ventura que o tribunal recorrido concluiu assim: “Ora, atenta a matéria de facto provada, é nosso entendimento de que o ora requerente não só está devidamente informado sobre a situação económica e financeira da sociedade requerida, como as demais informações requeridas por este podem ser recusadas pela requerida ao abrigo do citado artigo 291.º, n.º 1, al. a) e b), pois são legítimas as desconfianças de que essa informação não cedida pela requerente ao requerido possa ser utilizada por este, dada actividade desenvolvida pelas sociedades que eles representa e administra, em prejuízo da sociedade requerida e com fins estranhos à esta sociedade.
E sendo assim, concluímos que é legítima a recusa da requerida em prestar as demais informações de que o ora requerente ainda não dispõe e lhe solicitou.
Neste contexto, é nosso entendimento que também esta pretensão do ora requerente deve ser indeferida.” (sic)
Ninguém duvida, pois, que ao A. assiste o direito à informação nos termos do art.º 291º, designadamente em função da sua qualidade de acionista, com participação no capital social da R. com um valor percentual de ações superior a 10%. Mas recusa-se-lhe o direito à informação, designadamente nos termos do item 31º dos factos provados, informação de maior pormenorização, com base nas referidas al.s a) e b) do nº 4 daquele artigo.
Será de recear que o A., acionista, venha a utilizar a informação para fins estranhos à sociedade e com prejuízo desta ou de algum acionista? A informação pretendida é suscetível de prejudicar relevantemente a sociedade ou os acionistas?
Está provado que o A. poderá vir a utilizar a informação solicitada em benefício das sociedades que administra e que são clientes e fornecedoras da R. Mas não está provado que, dessa utilização, resulte prejuízo para a R. ou que seja de recear tal resultado; tão pouco que esse receio encontra justificação numa análise objetiva da situação.
As empresas que o A. administra e das quais é o principal acionista não são concorrentes da 1ª R. Têm por objeto segmentos diferenciados do mercado, embora em interligação: na realidade, quer a P.., S.A., quer a S.., S.A. são grandes clientes da R. e também seus fornecedores (cf. itens 1º e 24º a 28º dos factos provados); daí que, sem mais, não se possa concluir por uma suspeita séria, de elevada probabilidade ou desconfiança de utilização da informação em prejuízo da sociedade. Não havendo concorrência cai, em larga medida, por terra a argumentação dos recorridos, já que a pressupõem na defesa da confirmação da decisão recorrida.
O que resulta do item 2º dos factos provados e dos autos, designadamente dos itens 4º a seg.s que dão vários documentos por reproduzidos [23] e foi explicado pelas testemunhas é que a 1ª R. sociedade tem como acionistas outras sociedades, sendo o R. M.. sócio gerente ou administrador de algumas delas e de outras que são, à semelhança das duas referidas sociedades que o A. administra, também clientes da R. P.., S.A., fazendo-se a concorrência no mercado entre estas mesmas clientes, e não entre as clientes e a R.
E se assim é, não podemos excluir a possibilidade (sempre uma mera possibilidade) de o 2º R. estar a servir-se de uma empresa, a 1ª R., da qual o A. também é acionista, ocultando ao A. o seu conhecimento de pormenores da gestão, em benefício de empresas que concorrem no mercado com as empresas que o A. administra e, indiretamente do próprio R., o que bem justifica a recolha da informação pormenorizada relativa aos clientes da demandada, para eventual apuramento de responsabilidades.
Note-se que nem das respostas dadas ao A. pela R. esta justifica factualmente a recusa, resguardando-se conclusivamente no invocado interesse comercial e estratégico da empresa, ou sigilo em aspetos relacionados com a sua organização e supremos interesses patrimoniais e laborais, sem que aponte e, muito menos, prove --- como lhe cumpria fazer segundo as regras do ónus da prova [24] (art.º 342º, nº 2, do Código Civil), como é que o A. ia prejudicar a sua gestão e a sua atividade comercial ao receber a informação pormenorizada.
Objetivamente, não se verifica um receio razoavelmente fundado de que a informação recusada fosse utilizada pelo A. para fins estranhos à R., sobrando a mera possibilidade de tirar partido dessa informação em benefício das sociedades que administra (mas nem por isso um benefício injusto ou excessivo, face à informação que o 2º R. pode estar a utilizar nas sociedade que administra e que são também clientes da 1ª R.), sempre sem demonstração de que dali resulte prejuízo, ou haja suscetibilidade de prejudicar de modo muito relevante a P.., S.A. ou algum dos seus acionistas, sejam eles pessoas singulares ou coletivas.
Em suma, afigura-se-nos ilegítima a recusa em prestar a informação por parte dos R.R. Como tal, não pode ser recusada, nos termos quer da al. a) quer da al. b) do nº 4 do art.º 291º do Código das Sociedades Comerciais, devendo proceder-se a inquérito.
Naturalmente que se o requerente vier a utilizar indevidamente as informações obtidas, causando prejuízos à sociedade, poderá ser civilmente responsabilizado por isso, nos termos gerais (referido art.º 291º, nº 6).
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SUMÁRIO (art.º 663º, nº 7, do novo Código de Processo Civil):
1- No inquérito judicial à sociedade, compete ao sócio requerente fazer a prova da sua qualidade de sócio, da recusa da prestação da informação pedida ou da prestação de informação falsa, incompleta ou não elucidativa, enquanto a sociedade recusante deve provar a factualidade de que se possa retirar a licitude da recusa, enquanto facto impeditivo do direito do autor.
2- Não constitui fundamento de recusa legítima de informação pedida pelo acionista, nos termos das al.s a) e b) do nº 4 do art.º 291º do Código das Sociedades Comerciais, o facto daquele ser gerente ou administrador de sociedades que concorrem no mercado com outras sociedades administradas pelo administrador da requerida, todas clientes desta sociedade, mas não concorrentes com ela, sem que se prove que do benefício que o A. possa tirar da informação resulta prejuízo ou seja suscetível de poder prejudicar expressivamente a sociedade requerida ou algum acionista.
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IV.
Nestes termos, acorda-se nesta Relação em julgar a apelação procedente e, em consequência, revogando-se a decisão recorrida e abrindo inquérito, determina-se que os R.R., em 60 dias, facultem ao A. os elementos documentais de informação por ele pretendidos, referenciados no artigo 67º da petição inicial.
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Custas da apelação e na 1ª instância pelos R.R. recorridos.
Guimarães, 25 de novembro de 2013
Filipe Caroço
António Santos
Figueiredo de Almeida
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[1]Segue-se de perto o relatório da sentença recorrida na parte que respeita à síntese dos articulados, dada a sua evidente fidelidade.
[2] Adiante NCPC.
[3] Por transcrição.
[4] O A. recorrente incorre aqui na contradição de pedir que seja dado como provado um facto que, como tal, foi considerado pelo tribunal. Mas, dos fundamentos do recurso extrai-se sem dificuldade que, na realidade, o que pretende é que seja dado como “não provado”.
[5] O A. recorrente incorre aqui na contradição de pedir que seja dado como não provado um facto que, como tal, foi considerado pelo tribunal. Mas, dos fundamentos do recurso extrai-se sem dificuldade que, na realidade, o que pretende é que seja dado como “provado”.
[6] Entre outros, acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24.5.2011, proc. 376/2002.E1.S1, in www.dgsi.pt.
[7] Sob o título “Os Ónus da Alegação e da Prova, em Geral ...” in Colectânea de Jurisprudência, Ano VII, T I, pág. 19.
[8] “Provas – Direito Probatório Material”, BMJ 110/82 e 171.
[9] Acórdão do Tribunal Constitucional nº 346/2009, in DR 2ª Série, de 18.8.2009, citando Lopes do Rego, in Comentários ao Código de Processo Civil, Vol. I, 2.ª ed., pág. 610.
[10] Diploma a que pertencem todas as disposições legais que se citarem sem menção de origem.
[11] No caso das sociedades por quotas, cf. art.ºs 214º a 216º.
[12] Prof. Raul Ventura, Sociedades por Quotas, I, 2ª edição, pág. 282.
[13] C. Pinheiro Torres, O Direito à Informação nas Sociedades Comercias, pág. 122, citado no acórdão da Relação do Porto de 14.9.2006,pProc. 0633440, in www.dgsi.pt.
[14] Prof. Raul Ventura, in Novos Estudos sobre Sociedades Anónimas e Sociedades em Nome Colectivo, pág. 148.
[15] Mas a possibilidade de inquérito judicial não se esgota na realização do direito à informação (art.ºs 292º, 181º, nº 6, 450º, 216º, 292º, nºs 2 e 6). Várias situações existem em que a lei faculta ao sócio o procedimento de inquérito judicial, como é o caso de falta de apresentação das contas do exercício (art.º 67°) ou recusa da sua aprovação (art.º 68°, nº 2); deliberação ilícita de distribuição de bens aos sócios (art.º 31º, nº 3); e ainda de redução da remuneração dos gerentes (art.º 255°, nº 2, todos eles do Código das Sociedades Comerciais).
[16] Embora seja cada vez maior a atividade oficiosa.
[17] Doutrina que não oferece controvérsia. Já assim se entendia no Código de Processo Civil de 1939 (Alberto dos Reis, Processos Especiais, vol. II, pág. 399).
[18] Acórdão da Relação de Lisboa de 2.10.2008, proc. 4451/2008-2, acórdão da Relação do Porto de 17.12.2001, proc. 0151616, in www.dgsi.pt.
[19] Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, pág. 184; Antunes Varela, Manual de Processo Civil, pág. 448.
[20] Sociedades Por Quotas, I, p. 312, aliás, também citado na decisão recorrida e no citado acórdão da Relação do Porto de 17.12.2001, e ainda acórdão da mesma Relação de 19.1.2006, proc. 0536276, in www.dgsi.pt.
[21] Cf. também Pinheiro Torres, in O Direito à Informação nas Sociedades Comerciais, págs. 220 a 221.
[22] Acórdão da Relação do Porto de 19.1.2006, proc. 0536276, in www.dgsi.pt.
[23] Numa técnica processual que, justificadamente --- por se confundirem os factos com os meios de prova --- tem sido criticada pelos tribunais superiores.
[24] Neste sentido andou também o citado acórdão da Relação do Porto de 19.1.2006.