Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | FERNANDO MONTERROSO | ||
Descritores: | CONTRA-ORDENAÇÃO | ||
Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 03/05/2012 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | NEGADO PROVIMENTO | ||
Sumário: | O disposto nos nºs 5 e 6 do art. 145º do CPC é aplicável ao prazo de 20 dias previsto no art. 59 nº 3 do Dec.-Lei 433/82 de 27-10 para a impugnação judicial da decisão administrativa que aplicou coima. | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães A Câmara Municipal de Viana do Castelo, em processo de contra-ordenação, aplicou a “J... – Animação Nocturna, Lda.” a coima de € 426,00 por uma contra-ordenação p. e p. pelo art. 62 al. l) do Regulamento dos Resíduos Sólidos e Higiéne Urbana do Município de Viana do Castelo. A arguida “J... – Animação Nocturna, Lda.” interpôs recurso de impugnação judicial daquela decisão administrativa. Recebidos os autos no tribunal, o sr. juíza proferiu despacho a não admitir o recurso, por ter considerado que o mesmo era extemporâneo, por ter sido interposto após o decurso do prazo de 20 dias previsto no art. 59 nº 3 do Dec.-Lei 433/82 de 27/10 (RGCO). Inconformada, a arguida A arguida “J... – Animação Nocturna, Lda.” interpôs recurso para esta relação: Alega em resumo: A impugnação judicial foi apresentada no dia 18-10-2011, sendo que o prazo para o efeito terminara no dia anterior, em 17-10-2011; Porém, ao caso é aplicável o regime dos nºs 5 e 6 do art. 145 do CPC, pelo que a arguida deveria ter sido notificada para o pagamento da multa prevista naquele nº 6. Respondendo o magistrado do MP junto do tribunal recorrido defendeu a improcedência do recurso Nesta instância, a Ex.ma. procuradora geral adjunta emitiu parecer no mesmo sentido. Observou-se o disposto no art. 417 nº 2 do CPP. Colhidos os vistos, cumpre decidir. FUNDAMENTAÇÃO Não há qualquer divergência, por parte do recorrente, quanto ao facto de ter apresentado a impugnação judicial após o termo do prazo. O objecto do recurso limita-se à questão de saber se o disposto nos nºs 5 e 6 do art. 145 do CPC é aplicável ao prazo de 20 dias previsto no art. 59 nº 3 do Dec.-Lei 433/82 de 27-10 para a impugnação judicial da decisão administrativa que aplicou a coima. A resposta é negativa. Vejamos: O processo por contra-ordenação tem duas fases bem distintas. A primeira tem natureza administrativa e a segunda judicial. O recurso de impugnação judicial é apresentado à autoridade administrativa que aplicou a coima (art. 59 nº 3 Dec.-Lei 433/82). A apresentação não implica, necessariamente, que se passe à fase judicial, pois a entidade administrativa pode revogar a sua decisão de aplicar a coima – art. 62 nº 2 do RGCO. Isto é harmonioso com o facto de ainda não existir um processo judicial, mas um processo de natureza administrativa. Por outro lado, recebida a impugnação, à entidade administrativa, se não revogar a decisão de aplicação da coima, apenas compete enviar os autos ao MP (art. 62 nº 1), não cabendo nas suas atribuições decidir sobre se a impugnação foi apresentada em tempo. Não é assim nos recursos das decisões judiciais em que o juiz deve não admitir o recurso se este for extemporâneo – art. 414 nº 2 do CPP. Os nºs 5 e 6 do art. 145 do CPC pressupõem sempre que a verificação da extemporaneidade e a liquidação da multa é feita pela entidade perante a qual o acto é praticado (“praticado o acto em qualquer dos três dias úteis seguintes sem ter sido paga imediatamente a multa devida, logo que a falta seja verificada, a secretaria (...) notificará o interessado para pagar...”. – art. 145 nº 6 do CPP). Não tendo a entidade administrativa competência para verificar e decidir que o acto fora praticado fora de prazo, por maioria de razão, não podia também notificar o recorrente para pagar a multa em causa. Finalmente, as multas dos arts. 145 nºs 5 e 6 têm natureza judicial, sendo que as autoridades administrativas não têm competência para liquidar e cobrar estas multas. Como já se disse, o processo por contra-ordenação tem duas fases bem distintas, a administrativa e a judicial. O legislador teve em atenção as diversas estrutura e natureza das duas fases do processo, elegendo para cada uma delas, em separado, o direito subsidiário aplicável, sem esquecer mesmo o direito tributário distinto de cada uma delas (v. art. 93 do Dec.-Lei 433/82). A fase administrativa do processo de contra-ordenação é tributária do próprio processo administrativo, tendo o prazo de impugnação judicial natureza substantiva e não processual. A interposição do recurso de impugnação da decisão que aplicou uma coima integra-se, ainda, na fase administrativa do processo de contra-ordenação. Que é assim, demonstra-o ainda o art. 62 nº 1 do Dec.-Lei 433/82. Dispõe-se nesta norma que “recebido o recurso (...) deve a autoridade administrativa enviar os autos ao MP, que os tornará presentes ao juiz, valendo este acto como acusação. Ou seja, o feito só é introduzido em juízo quando o MP apresenta os autos ao juiz. Aliás, o MP, se entender que a aplicação da coima foi infundada, tem a faculdade de não apresentar os autos, já que pode retirar a acusação até à sentença em primeira instância – art. 65-A do Dec.-Lei 433/82. Ora, não sendo a impugnação da decisão administrativa um acto judicial, não lhe é aplicável o regime dos nºs 5 e 6 do art. 145 do CPC, que apenas dizem respeito à prática de actos desta natureza. Ou, como se decidiu em acordão do STA de 29-6-94 (BMJ 438/531) “o prazo do art. 59 nº 3 do Dec.-Lei 433/82 não tem natureza judicial mas substantiva, como verdadeiro prazo de caducidade, pelo que a sua contagem obedece ao disposto no art. 279 do C.C., não lhe sendo aplicável o art. 145 do CPP”. Finalmente há o acórdão do STJ de 2/94 de 10-3-93, que embora sem se debruçar especificamente sobre a questão da aplicação dos nºs nºs 5 e 6 do art. 145 do CPC, fixou a jurisprudência de que “não tem natureza judicial o prazo mencionado no n.º 3 do artigo 59.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro, com a alteração introduzida pelo Decreto-Lei n.º 356/89, de 17 de Outubro”. – DR/Iª série 1994-05.07. A posterior alteração à norma operada pelo Dec.-Lei 244/95 de 14-9, nenhum significado teve para o efeito, pois, no essencial, limitou-se a alterar o prazo de impugnação de 8 para 20 dias. Tem, pois, o recurso que improceder. DECISÃO Os juízes do Tribunal da Relação de Guimarães negam provimento ao recurso confirmando o despacho recorrido. O recorrente pagará 3 UCs de taxa de justiça. |