Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
2046/10.1PBGMR.G1
Relator: PAULO FERNANDES DA SILVA
Descritores: RENOVAÇÃO DE PROVA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 09/23/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: JULGADO IMPROCEDENTE
Sumário: I – A renovação da prova no Tribunal da Relação (art. 430 nº 1 do CPP) pressupõe: a) que a prova, cujo renovamento se requer, tenha sido já produzida na primeira instância; e b) que a decisão recorrida padeça de algum dos vícios indicados nas alíneas do nº 2 do art. 410 do CPP.
II – Se fosse admitida na relação outra prova, para além da já produzida, o recurso deixaria de ser um remédio para suprir deficiências da decisão da primeira instância, passando a ser um segundo julgamento, desvirtuando-se o regime recursivo em processo penal;
III – Não padecendo a decisão recorrida dos vícios do art. 410 nº 2 do CPP, o recurso da matéria de facto pode ser conhecido cabalmente em face da documentação da prova produzida na audiência perante o tribunal recorrido.
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães: ---
I.
RELATÓRIO. ---
Nestes autos de processo comum, com intervenção do Tribunal Singular, o 1.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Braga, por sentença de 08.03.2013, depositada no mesmo dia, decidiu, além do mais, ---
«A – Julgar a acusação procedente por provada e, em consequência:
- Condenar o arguido José S..., pela prática, em autoria material, de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.ºs 143.º, n.º 1, 14.º, n.º 1, e 26.º, 1.ª parte, do Código Penal, na pena de 160 (cento e sessenta) dias de multa, à taxa diária de € 6,00 (seis euros);
(…)
B – Julgar o pedido de indemnização civil formulado parcialmente procedente e, em consequência:
- Condenar o demandado José S... a pagar ao demandante Manuel S... a quantia de € 750,00 (setecentos e cinquenta euros), a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, desde a presente data até integral pagamento, absolvendo-o do mais pedido» Cf. volume II, fls. 237 a 254. ---. ---
Do recurso para a Relação. ---
Inconformado com tal sentença, o Arguido veio dela interpor recurso para este Tribunal, em 16.04.2013, concluindo as suas motivações nos seguintes termos: (transcrição) ---
«1º) Salvo o devido respeito, que é manifesto, afigura-se ao Recorrente, carecer de fundamento de facto e de direito que justifique, a condenação pelo crime de ofensas à integridade física, bem como no pagamento das custas do processo e do pedido cível no pagamento de Euros 750,00.
2º) Relativamente à matéria de facto dada como provada, a convicção do Tribunal fundou-se nos documentos juntos no processo bem como nas declarações prestadas, no decurso da audiência de julgamento, pelas várias testemunhas e pelos arguidos.
3º) No entanto, o Mmº. Juiz a quo, salvo o devido respeito, não valorou devidamente, as várias contradições existentes nos depoimentos do próprio ofendido Manuel S....
4º) Para além disso, salvo o devido respeito e melhor opinião, a sentença, para além da indicação dos factos provados e não provados, há-de contar também, os elementos que, em razão das regras da experiência ou de critérios lógicos constituíram o substrato racional que conduziu a que a convicção do tribunal se formasse no sentido de considerar provados e não provados os factos da acusação, ou seja, ao cabo e ao resto, um exame crítico sobre as provas que concorrem para a formação da convicção do tribunal colectivo num determinado sentido - vide neste sentido Acórdão do Tribunal Constitucional de 2-12-1998, in Diário da Republica IIª Série de 5-3-1999.
5º) Ora, a ser assim em que se fundamentou o Mmº. Juiz a quo para na sua Douta sentença, vir dar como provado, sem qualquer margem para dúvidas, de que o arguido José Salgado agrediu o ofendido Manuel Salgado?
6º) De facto, o mesmo refere no seu depoimento "( ... ) ele não gostou que andasse a mexer na papelada que estava ali em cima, saltou-me em cima, esbarrou-me contra as divisórias, deu-me um murro na cara no olho esquerdo (...) , e quando perguntado se veio alguém separar respondeu (...) veio um sobrinho meu que estava ao lado, na secretária ao lado ( ... ) Vítor S... ( ... )" - 081112, 15-58-10 e 155911., no entanto a referida testemunha que não se chama assim mas Vítor Manuel Teixeira da Silveira não assistiu a qualquer agressão, conforme se observa das suas declarações - 051212, 154412 a 163043.
7º) De facto tal testemunha quando indagada se tinha visto alguém a bater a alguém refere quando indagado se viu algum deles com marca de ter sido batido refere "(..) no momento não (...)” 051212, 155506 - ou seja esta testemunha que estava na mesma sala, que apenas os desapertou não viu qualquer agressão ao ofendido.
8º) Aliás nenhuma das testemunhas arroladas viu qualquer agressão por parte do arguido ao ofendido, sendo que o Mmº. Juiz a quo, refere isso inclusivamente na sentença, mas alvitra, salvo o devido respeito, sem qualquer suporte, uma explicação que não colhe quando diz “(...) sendo que nenhum destes depoentes foi capaz de concretizar (estranhamente diga-se - ou não, se atentarmos no facto de estes terem o arguido como seu chefe/superior hierárquico), uma qualquer ofensa por parte do arguido ao assistente (,,.)".
9º) Ou seja as testemunhas Vítor S..., Vítor J... e João M..., cujos depoimentos foram importantes, conforme se refere na Douta sentença, pois estiveram todos no local, de repente já não colhem porque até dependem funcionalmente do arguido e por isso o seu depoimento já é estranho, no mínimo, ou não, atenta a explicação apontada salvo o devido respeito, sem qualquer fundamento.
10°) Ou seja, salvo melhor opinião não existe qualquer preenchimento do elemento objectivo ou subjectivo por parte do arguido quanto ao crime de ofensas à integridade física, sendo que ao arguido sempre deveria aproveitar o princípio do in dubio pro reo.
11°) In casu, salvo melhor opinião a Douta sentença em crise é nula por violação da alínea a) do artigo 379º do Código de Processo Penal.
12º) A presente acção tem a ver com uma estratégia do alegado ofendido relativamente a outras acções judiciais pendentes com a sociedade Irmãos S..., Lda, de que o mesmo é sócio e o arguido é filho de outro sócio existindo uma batalha judicial relativamente à mesma.
13°) Para além disso, o artigo 127º do Código de Processo Penal consagra o princípio da livre apreciação da prova. De acordo com esta disposição "(…) salvo quando a lei dispuser diferentemente a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente ( ... )".
14°) Contudo e como ensina Maia Gonçalves, in Código de Processo Penal anotado, 1990, 3ª Edição, pág. 221, "(..) como uniformemente expendem os autores, livre apreciação da prova não se confunde de modo algum com apreciação arbitrária da prova nem com a mera impressão gerada no espírito do julgador pelos diversos meios de prova; a prova livre tem como pressupostos valorativos a obediência a critérios de experiência comum e da lógica do homem médio suposto pela ordem jurídica. Dentro desses pressupostos se deve portanto colocar o julgador ao apreciar livremente a prova
15º) Havendo pois, lugar a um erro notório na apreciação da prova, a que alude o disposto na alínea c) do n° 2 do artigo 410º do Código de Processo Penal, pois que a apreciação desta, salvo o devido respeito, não teve como pressuposto valorativo, a obediência aos critérios de experiência comum supra aludidos.
16º) Pelo exposto supra, afigura-se ao Recorrente que a sentença recorrida traduz um manifesto erro na apreciação da prova, justificativo de que os Exmos. Senhores Desembargadores conheçam de facto e de direito no presente caso, admitindo a renovação da prova, ou de que ordenem o reenvio do processo para novo julgamento cfr. alínea a) e c) do artigo 410° e 430° e artigo 426° todos do Código de Processo Penal.
17º) Disposições violadas: as referidas supra nomeadamente, artigos 127°, 379°, 410°, 426º e 430° todos do Código de Processo Penal.
Termos em que e pelo que Vª. Exªs., doutamente suprirão deve dar-se provimento ao recurso, e em consequência:
a) julgar-se procedente o recurso, revogando-se a Douta Sentença recorrida e substituindo-a por outra, que absolva o arguido, ou quando assim não se entenda;
b) conheça este Venerando Tribunal da sentença de facto e de direito, admitindo para tal a renovação da prova a final requerida, por verificação de erro notório na apreciação da prova, nos termos do disposto na alínea c), do n° 2 do artigo 410° e artigo 430° ambos do Código de Processo Penal;
e) na hipótese de se considerar a verificação do vício referido na alínea c) do no 2 do artigo 410° , mas não seja possível decidir da causa, determine este Venerando Tribunal o reenvio do processo para novo ju1garnento nos termos do disposto no artigo 426° ambos do Código de Processo Penal,
Assim se fará Justiça.
Renovação da prova que o arguido requer no caso de opção pela hipótese prevista sob a alínea b) do pedido, na sequência do exposto nas conclusões
I - declarações do arguido;
II - testemunhal:
a) A constante da contestação apresentada e que aqui se dá por reproduzida» Cf. volume I, fls. 259 a 273. ---. ---
Notificados do referido recurso, o Ministério Público e o Assistente Manuel Fernandes Teixeira Salgado A sua constituição como tal conta a fls. 120 (volume I). --- responderam ao mesmo, tendo concluído pela respectiva improcedência Cf. volume I, fls. 278 a 287 e 290 a 294 verso, respectivamente. ---. ---
Neste Tribunal, na intervenção aludida no artigo 416.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, o Ministério Público emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso Cf. volume II, fls. 305 e 306. ---. ---
Notificado daquele parecer, o Arguido reafirmou a sua posição já indicada Cf. Volume II, fls. 312. ---. -
Proferido despacho liminar, colhidos os vistos legais e efectuada a conferência, cumpre ora apreciar e decidir. ---
II.
OBJECTO DO RECURSO.
Atentas as indicadas conclusões apresentadas, sendo que é a tais conclusões que este Tribunal deve atender no presente recurso, definindo aquelas o objecto deste, sem prejuízo de questões de conhecimento oficioso, cumpre no presente acórdão apreciar e decidir: ---
· Da requerida anulação da decisão recorrida em razão da sua deficiente fundamentação; ---
· Do referido erro notório na apreciação da prova; ---
· Da pretendida renovação da prova; ---
· Do alegado erro de julgamento. ---
III.
DA DECISÃO RECORRIDA – FACTOS E SUA MOTIVAÇÃO. ---
A decisão recorrida configura a factualidade provada e não provada, bem como a respectiva motivação da seguinte forma: (transcrição) ---
«1. Factos provados
Com relevo para a decisão da causa, provou-se a seguinte matéria de facto:
1) No dia 23/12/2010, cerca das 10:00 horas, no escritório da empresa “Irmãos S..., Lda”, sita na Rua P..., nesta comarca, o arguido dirigiu-se ao assistente, ambos gerentes daquela empresa e, respectivamente, sobrinho e tio, quando este estava a mexer em papéis que se encontravam na secretária daquele, e desferiu-lhe um soco, atingindo-o na testa.
2) Em consequência da conduta do arguido, o assistente sofreu hematoma na região frontal esquerda do crânio, abrangendo o sobrolho homolateral, com edema difuso e escoriações dispersas, e edema do sobrolho esquerdo com escoriações diversas, lesões estas que foram causa directa e necessária de sete dias de doença sem afectação da capacidade de trabalho geral e profissional.
3) O arguido agiu voluntária, livre e conscientemente, com intenção de molestar o assistente na sua integridade física, bem sabendo a sua conduta proibida e punida por lei.
4) Ainda em consequência da descrita conduta do arguido, o assistente sofreu dores e sentiu-se envergonhado, embaraçado, triste e desgostoso, tanto mais que na altura estavam no escritório empregados da empresa.
5) O arguido e o assistente encontram-se desavindos desde data anterior aos factos, em virtude de várias situações de conflito decorrentes de questões relacionadas com a gerência da referida empresa, na sequência do que corre termos a acção de processo ordinário n.º 278/08.1TCGMR, da 2.ª Vara de Competência Mista de Guimarães.
6) O arguido não assumiu qualquer atitude reveladora de arrependimento.
7) O arguido não tem antecedentes criminais.
8) O arguido tem como habilitações literárias a licenciatura em economia; aufere o salário mensal de € 750,00 como gerente da empresa acima referida, encontrando-se penhorados € 250,00; a mulher encontra-se desempregada há cerca de três anos, não recebendo qualquer subsídio; tem dois filhos menores, com treze e quinze anos de idade, estudantes; vive em casa própria, não estando desde há cerca de três anos a pagar a prestação mensal de cerca de € 700,00 para amortização do empréstimo que contraiu para a sua aquisição; beneficia da ajuda dos pais e dos sogros.
9) O demandante encontra-se reformado, recebendo uma pensão no montante mensal de cerca de € 1500,00; é casado; a mulher aufere como professora o vencimento mensal de cerca de € 2.000,00; não tem filhos a seu cargo; vive em casa própria; e recebe o montante mensal de € 600,00 a título de renda de um apartamento de que é proprietário.
2. Factos não provados
Não se provaram outros factos, em contradição com os provados ou para além deles.
3. Motivação da decisão de facto
O tribunal fundou a sua convicção, relativamente aos factos provados, no conjunto da prova produzida, que analisou e valorou de forma crítica, fazendo apelo às regras da experiência comum e a critérios de normalidade do acontecer e razoabilidade.
Tendo-se o arguido remetido ao silêncio sobre os factos que lhe vinham imputados, a coberto do direito que lhe assistia (cfr. art.º 61.º, n.º 1, al. d), do Código de Processo Penal), assumiram, desde logo, particular relevância as declarações do assistente Manuel S..., a qual narrou com minúcia, espontaneidade e coerência os factos de que foi vítima por parte do arguido, bem como elucidou sobre as consequências que lhe advieram da agressão e sobre a relação que mantém com o arguido, seu sobrinho, com várias situações de conflito decorrentes de questões relacionadas com a gerência da empresa “Irmãos S..., Lda”, o que tudo fez no sentido de confirmar na íntegra os factos considerados provados. Estas declarações afiguraram-se-nos merecedoras de acolhimento, não apenas pelo modo como foram prestadas, mas também pelo facto das mesmas terem resultado corroboradas pela demais prova produzida, nos termos que passamos a explicitar.
Por outro lado, foram importantes os depoimentos das testemunhas Vítor T..., Vítor S... e João M..., empregados da empresa “Irmãos S..., Lda”, que na altura dos factos estavam no escritório onde estes ocorreram, os quais em uníssono afirmaram que, na data aludida na acusação, alertados por um barulho ou curta troca de palavras, olham e vêem o arguido e o assistente já “agarrados”, “pegados”, sendo que nenhum destes depoentes foi capaz de concretizar (estranhamente, diga-se – ou não, se atentarmos no facto destes terem o arguido como seu chefe / superior hierárquico) uma qualquer ofensa por parte do arguido ou assistente, nomeadamente nenhum afirmou ter visto o arguido a desferir um murro no assistente, mas em que, ainda assim, o primeiro disse que o assistente na altura espontaneamente afirmou “isto não fica assim”, o segundo referiu que, no próprio dia ou no dia seguinte, viu o assistente, também seu tio, e ele apresentava uma marca na cara ou no pescoço (já não recorda) e apontando para ela lhe disse “foi o teu primo” (o arguido), e em que o último afirmou que o assistente tinha um ferimento numa parte visível do corpo (no rosto ou no pescoço).
Também foram considerados os depoimentos das testemunhas Maria S..., José A... e José R..., respectivamente mulher, cunhado e amigo do assistente, as quais elucidaram sobre as consequências que advieram ao assistente em resultado da agressão sofrida, no que mereceram crédito, na convocação das regras da experiência comum e da normalidade do acontecer, tendo nomeadamente em consideração a natureza da agressão e das lesões, as circunstâncias em que a mesma emergiu e a relação familiar existente entre o arguido e o assistente.
Foi, finalmente, valorada a prova pericial e documental produzida: o relatório pericial de fls. 5 a 8, o qual foi importante ao apuramento das lesões e do período de doença padecidas pelo assistente, cabendo notar que este elemento probatório evidencia que, tendo o assistente sido examinado no dia dos factos, o mesmo apresentava lesões completamente compatíveis com a agressão que afirmou ter sido vítima por parte do arguido; os documentos de fls. 56 a 89, relativos à acção judicial referida em 5); e o teor do certificado de registo criminal actualizado do arguido, constante de fls. 223.
As condições sociais e pessoais do arguido e a sua situação económica foram apuradas com base nas suas próprias declarações.
A situação económica do demandante foi apurada a partir das suas próprias declarações.
Quanto aos factos não provados, os mesmos foram assim havidos por falta de prova bastante e convincente tendente à sua comprovação» Cf. volume I, fls. 238 a 242. ---. ---
IV.
FUNDAMENTAÇÃO. ---
1. Da requerida declaração de nulidade da decisão recorrida em razão da de alegada deficiente fundamentação. ---
Invocando o disposto no artigo 379.º, n.º 1, alínea a), do Código de Processo Penal, o Recorrente alega que a motivação da decisão de facto é insuficiente por, em síntese, não ter procedido a «um exame crítico» da prova produzida. ---
Vejamos. ---
Nos termos dos artigos 374.º, n.º 2, e 379.º, n.º 1, alínea a), do Código de Processo Penal «é nula a sentença que não contiver» «a fundamentação», sendo que desta deve constar, além do mais, a «enumeração dos factos provados e não provados, bem como» «uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto (…), que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal». ---
Isto é, em sede de fundamentação das decisões de facto exige-se a indicação dos factos provados e não provados, bem como a explicitação dos motivos que justificaram tal indicação. ---
Os motivos «de facto que fundamentam a decisão não são nem os factos provados (…) nem os meios de prova (…) mas os elementos que em razão das regras da experiência ou de critérios lógicos constituem o substrato racional que conduziu a que a convicção do tribunal se formasse em determinado sentido ou valorasse de determinada forma os diversos meios de prova apresentados em audiência (…). ---
A fundamentação ou motivação deve ser tal que, intraprocessualmente, permita aos sujeitos processuais e ao tribunal superior o exame do processo lógico ou racional que lhe subjaz, pela via do recurso (…). ---
E extraprocessualmente, a fundamentação deve assegurar pelo conteúdo, um respeito efectivo pelo princípio da legalidade na sentença e a própria independência e imparcialidade dos juízes uma vez que os destinatários da decisão não são apenas os sujeitos processuais mas a própria sociedade» Cf. Marques Ferreira, Meios de prova, Jornadas de Direito Processual Penal, O Novo Código de Processo Penal, 229 e 230. ---. ---
Na situação vertente. ---
Da leitura da decisão recorrida, decorre que esta indicou os factos provados e não provados, bem como explicitou o raciocínio lógico que conduziu a tal. ---
Naquele último domínio, após referir que «o arguido» se remeteu «ao silêncio sobre os factos que lhe vinham imputados», aludiu pormenorizadamente aos diversos meios de prova, ---
- Uns de carácter pessoal (Assistente e testemunhas Vítor T..., Vítor S..., João M..., Maria S..., José M... e José P...), ---
- Outros de natureza não pessoal (relatório pericial de fls. 5 a 8 e documentos de fls. 56 a 89 e 223 dos autos), ---
Integrando-os num juízo lógico e à luz das regras da experiência comum, o que permite intra e extraprocessualmente descortinar o raciocínio do Tribunal recorrido. ---
No essencial, o Tribunal recorrido referiu que em julgamento o Assistente confirmou na íntegra, sem contradições, os factos de que o Arguido vinha acusado e que tal mostra-se conforme com a restante prova pessoal, pericial e documental produzida, o que em função das regras da lógica e da experiência comum, justificava dar como provada a integralidade da matéria de facto constante da acusação. ---
Ou seja, ao contrário do que alega o Recorrente, o Tribunal recorrido motivou devidamente a factualidade que deu como provada e como não provada. ---
Pode discordar-se do entendimento tido pelo Tribunal recorrido. ---
Pode até entender-se que o mesmo poderia ser explicitado de um outro modo ou melhor explicitado. ---
Não pode é dizer-se que o Tribunal recorrido não motivou a decisão de facto em termos suficientes, sendo que saber se a prova produzida permite a decisão de facto tomada pelo Tribunal recorrido é aspecto que releva em sede de erro de julgamento, questão a apreciar adiante. ---
Improcede, assim, a pretensão do Recorrente na matéria. ---
2. Do referido erro notório na apreciação da prova. ---
Nos termos do disposto no artigo 410.º, n.º 2, alínea c), do Código de Processo Penal, o recurso pode ter como fundamento «erro notório na apreciação da prova», «desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum». ---
Constituem o apontado vício o desacerto sobre facto notório, nomeadamente sobre facto histórico de conhecimento geral, a ofensa às leis da física, da mecânica e da lógica, assim como a ofensa relativamente a conhecimentos científicos criminológicos e vitimológicos. ---
Em causa está o equívoco ostensivo, de tal modo evidente a partir da simples leitura da decisão, que não passa despercebido ao comum dos observadores, ou seja, quando o homem de formação média facilmente dele se dá conta Cf. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, III volume, edição de 2000, página 341, e Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código de Processo Penal, 4.ª edição, página 1119. ---
No mesmo sentido se vem pronunciando unanimemente o nosso Supremo Tribunal, referindo-se a título meramente exemplificativo os respectivos acórdãos de 14.05.2009, Processo n.º 1182/06.3PAALM.S1 - 3.ª Secção, relatado pelo Senhor Conselheiro Armindo Monteiro, 25.06.2009, Processo n.º 4262/06 - 3.ª Secção, relatado pelo Senhor Conselheiro Soreto de Barros, e 29.10.2009, Processo n.º 273/05.2PEGDM.S1 - 5.ª Secção, relatado pelo Senhor Conselheiro Souto Moura, in www.stj.pt/jurisprudencia/sumáriosdeacórdãos /secção criminal. ---. ---
Na situação em apreço. ---
O Arguido alega a existência de erro notório na apreciação da prova em função de um exame crítico da prova diferente daquele efectuado pelo Tribunal recorrido. ---
Para tal tece diversas considerações sobre a prova produzida. ---
Ora, definido que foi o erro notório, mostra-se impróprio o alegado na matéria pelo Recorrente. ---
De todo o modo, diga-se ainda que da decisão recorrida não decorre qualquer erro notório na apreciação da prova nos termos em que o mesmo ficou explicitado: na decisão recorrida inexiste qualquer equívoco ostensivo contrário a facto do conhecimento geral ou ofensivo das leis da física, da mecânica, da lógica ou de conhecimentos científicos criminológicos e vitimológicos. ---
Tanto basta para que se tenha por improcedente o alegado erro notório na apreciação da prova, relegando-se para momento ulterior deste acórdão o erro de julgamento. ---
3. Da pretendida renovação da prova. ---
O Recorrente pretende que se proceda a «renovação da prova», ouvindo-o nesta Relação «o arguido» e a prova «testemunhal (…) constante da contestação apresentada». ---
Vejamos. ---
Nos termos do artigo 430.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, «quando deva conhecer de facto e de direito, a relação admite a renovação da prova se se verificarem os vícios referidos nas alíneas do n.º 2 do artigo 410.º e houver razões para crer que aquela permitirá evitar o reenvio do processo». ---
Ou seja, segundo aquele preceito legal, além do mais, a renovação da prova pressupõe que ---
· A prova cujo renovamento se requerer tenha sido já objecto de produção de prova em 1.ª instância e ---
· A decisão recorrida padeça de algum dos vícios indicados nas alíneas do n.º 2 do artigo 410.º do Código de Processo Penal. ---
Nestes termos, a renovação da prova na Relação é inadmissível quando a prova cuja renovação se requer não tenha sido de alguma forma produzida em 1.ª instância, pois de outro modo o recurso para a Relação deixaria de ser um remédio para suprir deficiências da decisão daquela instância e passaria a ser um 2.º julgamento, um novo julgamento, desvirtuando o regime recursivo em processo penal. ---
«Não podem ser requeridos (…) novos meios de prova, isto é, meios de prova distintos dos “produzidos em primeira instância”» Paulo Pinto Albuquerque, Comentário do Código de Processo Penal, edição de 2011, página 1180. ---. ---
Por outro lado, a renovação da prova só faz sentido caso se detectem na decisão recorrido algum dos vícios indicados nas alíneas do n.º 2 do artigo 410.º do Código de Processo Penal, sendo que os factos a provar e as provas a renovar devem dizer respeito a tais vícios e visarem o suprimento destes, evitando o reenvio. ---
«Não padecendo a decisão recorrida dos vícios do artigo 410.º, n.º 2, o recurso em matéria de facto pode ser conhecido cabalmente em face da documentação da prova produzida na audiência diante do tribunal recorrido. Isto é, o TR deve fazer uso do seu poder previsto no artigo 431.º, al.ª b)» Paulo Pinto Albuquerque, Comentário do Código de Processo Penal, edição de 2011, página 1182. No mesmo sentido, acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 21.02.2007, Processo n.º 8815/2006-3, e do Tribunal da Relação de Coimbra de 16.07.2008, Processo: 46/04. GTLRA.C1, in www.dgsi.pt. --- . ---
No caso em apreço. ---
A requerida tomada de declarações ao Arguido constitui prova inteiramente nova, pelo que estranha ao instituto de renovação da prova em apreço. ---
Por outro lado, a decisão recorrida não padece de algum dos vícios indicados nas diversas alíneas do n.º 2 do artigo 410.º do Código de Processo Penal, nomeadamente do alegado vício de erro notório na apreciação da prova, conforme supra se concluiu. ---
Ou seja, por inverificados in casu os indicados pressupostos de que o artigo 430.º, n.º 1, do Código de Processo Penal faz depender a «renovação da prova», improcede a pretensão do Recorrente nesse sentido apresentada no presente recurso. ---
4. Do alegado erro de julgamento. ---
Segundo o artigo 428.º do Código de Processo Penal, «as relações conhecem de facto e de direito». ---
Tal constitui uma concretização da garantia do duplo grau de jurisdição em matéria de facto - reapreciação por um Tribunal superior das questões relativas à ilicitude e à culpabilidade. ---
O recurso em matéria de facto não constitui, contudo, uma reapreciação total pelo Tribunal de recurso do complexo de elementos de prova produzidos e que serviram de fundamento à decisão recorrida. ---
Diversamente, apenas poderá ter como objecto uma reapreciação autónoma do Tribunal de recurso sobre a razoabilidade da decisão tomada pelo Tribunal a quo quanto aos pontos de facto que o Recorrente considere incorrectamente julgados, na base, para tanto, da avaliação das provas que, na indicação do Recorrente, imponham decisão diversa da recorrida ou determinado a renovação das provas nos pontos em que entenda que deve haver renovação da prova Cf. Acórdão do Venerando Supremo Tribunal de Justiça de 20.01.2010, Processo n.º 149/07.9JELSB.E1.S1 - 3.ª Secção, relatado pelo Senhor Conselheiro Henriques Gaspar, in www.stj.pt/jurisprudencia/sumáriosdeacórdãos /secção criminal. ---. ---
Por isso, nos termos do artigo 412.º, n.ºs 3 e 4, do Código de Processo Penal, «quando impugne a decisão proferida sobre matéria de facto, o Recorrente deve especificar: a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) As concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida; c) As provas que devem ser renovadas», indicando «concretamente as passagens em que se funda a impugnação». ---
Explicitando tal norma, o acórdão do Venerando Supremo Tribunal de Justiça de 8 de Março de 2012 fixou jurisprudência no sentido de que «visando o recurso a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, com reapreciação da prova gravada, basta, para efeitos do disposto no artigo 412.º, n.º 3, alínea b), do CPP, a referência às concretas passagens/excertos das declarações que, no entendimento do Recorrente, imponham decisão diversa da assumida, desde que transcritas, na ausência de consignação na acta do início e termo das declarações» Publicado no Diário da República n.º 77, de 18.04.2012. ---. ---
O recurso não é, pois, um novo julgamento, em que a 2.ª instância aprecia toda a prova produzida e documentada em 1.ª instância, como se o julgamento ali realizado não existisse; antes é um remédio jurídico destinado a colmatar erros que devem ser identificados e individualizados, com menção das provas que os evidenciam e indicação concreta, por referência à acta, das passagens em que se funda a impugnação Cf. Acórdão do Venerando Supremo Tribunal de Justiça de 26.02.2009, Processo n.º 3270/08 - 5.ª Secção, relatado pelo Senhor Conselheiro Rodrigues da Costa, in www.stj.pt/jurisprudencia/ sumáriosdeacórdãos /secção criminal. ---. ---
Ao apreciar-se o processo de formação da convicção do julgador não pode ignorar-se que a apreciação da prova obedece ao disposto no artigo 127.º do Código de Processo Penal, ou seja, fora as excepções relativas a prova legal, assenta na livre convicção do julgador e nas regras da experiência, não podendo também esquecer-se o que a imediação em 1.ª instância dá e o julgamento da Relação não permite. Basta pensar, naquilo que, em matéria de valorização de testemunhos pessoais, deriva de reacções do próprio ou de outros, de hesitações, pausas, gestos, expressões faciais, enfim, das particularidades de todo um evento que é impossível reproduzir Cf. Acórdãos do Venerando Supremo Tribunal de Justiça de 23.04.2009, Processo n.º 114/09 - 5.ª Secção, e de 29.10.2009, Processo n.º 273/05.2PEGDM.S1 - 5.ª Secção, ambos relatados pelo Senhor Conselheiro Souto Moura, in www.stj.pt/jurisprudencia/sumáriosdeacórdãos /secção criminal. ---. ---
O Tribunal da Relação só pode/deve determinar uma alteração da matéria de facto assente quando concluir que os elementos de prova impõem uma decisão diversa e não apenas permitem uma outra decisão Cf. Acórdãos do Venerando Supremo Tribunal de Justiça de 15.07.2009, Processo n.º 103/09 - 3.ª Secção, 10.03.2010, Processo n.º 112/08.2GACDV.L1.S1 - 3.ª Secção, e 25.03.2010, Processo n.º 427/08.0TBSTB.E1.S1 - 3.ª Secção, relatados pelo Senhor Conselheiro Raul Borges, in www.stj.pt/jurisprudencia/sumáriosdeacórdãos /secção criminal. ---. ---
Na situação vertente. ---
O Recorrente põe em causa a apreciação da prova feita pelo Tribunal recorrido, tecendo as suas próprias considerações quanto à prova produzida, sem, contudo, indicar, quer na motivação, quer nas respectivas conclusões, «os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados», nem consistentemente «as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida», como prescrevem os indicados n.ºs 3 e 4 do artigo 412.º do Código de Processo Penal. ---
Com efeito, o Arguido, que em julgamento exercer o direito ao silêncio Cf. Acta de Julgamento de 08.11.2012 (fls. 200, volume I), assim como minutos 3:43 a 3:48 das suas declarações da mesma data, iniciadas pelas 15:37:43, e minutos 0:00 a 0:11 das suas declarações de 16.01.2013, iniciadas pelas 16:43:02. --- , limita-se basicamente em sede de recurso a produzir considerações genéricas sobre a prova produzida, sem apontar elementos concretos que ponham em causa o processo lógico que motivou a factualidade indicada pelo Tribunal recorrido. ---
No fundo, cinge-se a expor a contrapor a sua ponderação da prova produzida à ponderação tomada na matéria pelo Tribunal recorrido, o que se configura inócuo em termos de impugnação da matéria factual em sede de recurso. ---
«A censura quanto à forma de formação da convicção do Tribunal não pode (…) assentar de forma simplista no ataque da fase final da formação dessa convicção, isto é, na valoração da prova; tal censura terá de assentar na violação de qualquer dos passos para a formação de tal convicção, designadamente porque não existem os dados objectivos que se apontam na motivação ou porque se violaram os princípios para a aquisição desses dados objectivos ou porque não houve liberdade na formação da convicção.
Doutra forma, seria uma inversão da posição das personagens do processo, como seja a de substituir a convicção de quem tem de julgar, pela convicção dos que esperam a decisão» Cf. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 184/2004, de 24.11.2004, que transcreve na matéria acórdão da Relação de Coimbra, in www.tribunalconstitucional.pt. ---. ---
De todo o modo. ---
O Recorrente alega que o «Assistente» teceu diversas «contradições», sem, porém, as especificar, o que torna impertinente tal alegação, sendo que ouvidas integralmente as declarações prestadas pelo Assistente em julgamento não descortina este Tribunal nelas qualquer contradição. ---
Pelo contrário, as mesmas revelam-se absolutamente coerentes. ---
Ao longo do seu depoimento o Assistente aludiu à factualidade dada como provada nos termos indicados na decisão recorrida Cf. nomeadamente minutos 7:30 a 8:04, 29:05 a 29:58 e 31:30 a 31:37 das suas declarações de 08.11.2012, iniciadas pelas 15:50:15. ---. ---
Fê-lo de forma absolutamente clara, objectiva e lógica, sem qualquer solução de continuidade. ---
A circunstância da testemunha Vítor S..., ouvida na sessão de julgamento de 08.11.2012 Cf. fls. 199 a 201 (volume I). ---, ter sido referida pelo Assistente sob o nome de «Vítor S...» mais não constitui que um mero lapso do Assistente, tanto mais que este referiu claramente tratar-se de um seu «sobrinho» e haver aquando dos factos um outra pessoa presente com o nome de «Vítor S...», ouvido como testemunha na sessão de julgamento de 05.12.2012 Cf. fls. 202 a 204 (volume I). ---. ---
Por outro lado, o transcrito excerto do depoimento daquela testemunha é absolutamente inócuo, pois a circunstância de no momento não ter visto marcas de agressão, não significa que esta não tenha ocorrido, nem que tais marcas não existissem. ---
O facto das testemunhas Vítor T..., Vítor S... e João M... terem referido em julgado que não viram o Arguido agredir o Assistente, sem, contudo, negarem tal facto Cf. os depoimentos da testemunha Vítor Silveira de 08.11.2012, iniciado pelas 16:30:25, nomeadamente minutos 7:55 a 8:40, 13:16 a 13:24, 18:56 a 18:59 e 25:36 a 25:40, Vítor Salgado de 05.12.2012, iniciado pelas 15:49:07, designadamente minutos 2:45 a 2:58 e 8:08 a 8:39, e João Machado de 16.01.2013, iniciado pelas 15:04:50, nomeadamente minutos 5:03 a 6:12, 14:49 a 15:00 e 22:38 a 22:50. --- , não obsta por si à perpetração de tal agressão nos termos dados como provados na decisão recorrida. ---
Embora estando-se num mesmo espaço físico pode-se não ver o início de uma contenda; basta que não se esteja a olhar para o local dela no momento do seu começo. ---
No caso e no que respeita à factualidade em causa, tais depoimentos não conflituam com as declarações do Assistente, as quais merecem credibilidade, conforme referido e por corroboradas que estão pela indicada prova pericial produzida. ---
A mesma corroboração decorre ainda da circunstância daquelas três testemunhas terem igualmente referido em julgamento que o Assistente e o Arguido andaram «encostados um ao outro» e «agarrados» Expressões usadas pela testemunha Vítor Silveira, conforme o seu depoimento de 08.11.2012, iniciado pelas 16:30:25, nomeadamente minutos 7:55 a 8:40, 16:30 a 17:20, 25:20 a 25:30 e 30:50 a 30:57. ---, «embrulhados» Expressão utilizada pela testemunha Vítor Salgado, conforme o seu depoimento de 05.12.2012, iniciado pelas 15:49:07, designadamente minutos 2:45 a 2:58. ---, bem como «entrelaçados» e «pegados» Expressões usadas pela testemunha João Machado, conforme o seu depoimento de 16.01.2013, iniciado pelas 15:04:50, nomeadamente minutos 5:03 a 6:12, 14:49 a 15:00 e 22:38 a 22:50. --- . ---
O mesmo se diga do facto de tais testemunhas terem então referido que o Assistente apresentava no dia ou dias imediatamente após os factos marcas no «pescoço» Expressão usada pela testemunha Vítor Silveira, conforme o seu depoimento de 08.11.2012, iniciado pelas 16:30:25, nomeadamente minutos 8:56 a 10:44 e 32:44 a 33:10. --- e «na cara e no pescoço» Expressões usadas pelas testemunhas Vítor Salgado, conforme o seu depoimento de 05.12.2012, iniciado pelas 15:49:07, designadamente minutos 6:47 a 7:28, e João Machado, conforme o seu depoimento de 16.01.2013, iniciado pelas 15:04:50, nomeadamente minutos 10:34 a 13:11. --- . ---
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Em suma, debalde se encontra na decisão recorrida erros de julgamento no processo de formação da convicção do Tribunal recorrido que imponham decisão da matéria de facto diversa daquela por ele tomada. ---
A decisão recorrida explicita os diversos meios de prova produzidos, sem que o Recorrente fundadamente impugne o referido nesse âmbito. ---
Mais, de tal explicitação decorre inteligível a decisão recorrida no que respeita à matéria de facto dada como provada, à luz das regras da experiência comum e da lógica. ---
Nestes termos, justifica-se, pois, cabalmente a decisão da matéria de facto inserta no acórdão recorrido, sendo, por isso, impertinente apelar ao princípio in dubio pro reo. --
Com efeito, o nosso regime jurídico processual-penal consagra o princípio da livre apreciação da prova Cf. artigo 127.º do Código de Processo Penal segundo o qual «salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente». ---. ---
A livre apreciação da prova pressupõe que esta seja considerada segundo critérios objectivos que permitam estabelecer o substrato racional da fundamentação da convicção. ---
O princípio in dubio pro reo constitui um limite normativo do princípio da livre apreciação da prova, na medida em que impõe orientação vinculativa para os casos de dúvida sobre os factos: em tal situação, impõe-se que o Tribunal decida pro reo, a favor do Arguido, pois. ---
O princípio in dubio pro reo encerra uma imposição dirigida ao juiz no sentido de este se pronunciar de forma favorável ao réu, quando não tiver certeza sobre os factos decisivos para a solução da causa, pelo que a sua violação exige que o juiz tenha ficado na dúvida sobre factos relevantes e, nesse estado de dúvida, tenha decidido contra o Arguido. ----
“A dúvida que há-de levar o tribunal a decidir «pro reo», tem de ser uma dúvida positiva, uma dúvida racional que ilida a certeza contrária. Por outras palavras ainda, uma dúvida que impeça a convicção do tribunal” Cf. Cristina Líbano Monteiro, Perigosidade de inimputáveis e in dubio pro reo, página 166. No mesmo sentido se vem pronunciando unanimemente o nosso Supremo Tribunal, referindo-se a título meramente exemplificativo os respectivos acórdãos de 05.02.2009, Processo n.º 2381/08 - 5.ª Secção, relatado pelo Senhor Conselheiro Arménio Sottomayor, 14.10.2009, Processo n.º 101/08.7PAABT.E1.S1 - 3.ª Secção, relatado pelo Senhor Conselheiro Pires da Graça, e 15.04.2010, Processo n.º 154/01.9JACBR.C1.S1 - 5.ª Secção, relatado pelo Senhor Conselheiro Rodrigues da Costa, in www.stj.pt/jurisprudencia/sumáriosdeacórdãos /secção criminal. ---. ---
Ora, no caso sub judice justificando-se a factualidade apurada, sem se lograr encontrar qualquer dúvida no raciocínio que a ela conduz, carece de qualquer sentido apelar ao princípio in dubio pro reo. ---
O Tribunal recorrido fundou a factualidade apurada no exame crítico dos diversos elementos probatórios, sem que se vislumbre por qualquer forma uma qualquer dúvida e muito menos a resolução dela de modo desfavorável à Recorrente. ---
Pelo exposto, tem-se, pois, por definitivamente fixada a matéria factual constante da decisão recorrida, improcedendo, assim, a pretensão do Recorrente na matéria. ---
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Uma vez que pretendida absolvição do Recorrente fundava-se no facto de não ter cometido a ofensa à integridade física em causa, provada que está a sua autoria no cometimento de tal ilícito criminal e civil, fica prejudicada a sua pretendida absolvição, mantendo-se, pois, integralmente a decisão recorrida. ---
V.
DECISÃO. ---
Pelo exposto, julga-se improcedente o presente recurso, confirmando-se integralmente a decisão recorrida. ---
Custas pelo Recorrente, fixando-se em 4 (quatro) UC a respectiva taxa de justiça. ---
Notifique. ---
Guimarães, 23 de Setembro de 2013