Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
2297/10.9 TBFLG.G1
Relator: CONCEIÇÃO BUCHO
Descritores: INSOLVÊNCIA
APOIO JUDICIÁRIO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 06/16/2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I- O artigo 248º do CIRE não concede qualquer benefício de apoio judiciário, limitando-se a conferir ao devedor que apresente um pedido de exoneração do passivo restante o benefício do diferimento do pagamento das custas até à decisão final desse pedido.
II- Instaurado um processo de insolvência de pessoa singular, o pagamento da taxa de justiça faz-se até ao momento da prática do acto processual a ela sujeito ou, tendo sido requerido o apoio judiciário, no prazo que lhe for concedido pelo juiz, no caso de indeferimento desse pedido.
Decisão Texto Integral: Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães.

Proc. n.º 2297/10.9 TBFLG.G1


Nos presentes autos em que Vítor… se veio apresentar à insolvência foi proferido o seguinte despacho:

(…) Pelo exposto, determino o desentranhamento do pedido de apresentação à insolvência, bem como da petição do incidente de plano de pagamento constante do apenso A, nos termos do disposto no artigo 476º, n.º 6 do Código de Processo Civil ex vi do artigo 17º do CIRE, e a sua devolução ao apresentante.


Inconformado interpôs recurso cujas alegações de fls.90 a 98, terminam com conclusões onde são colocadas as seguintes questões:
A decisão recorrida não fez correcta interpretação do artigo 476º, n.º 6 do Código de Processo Civil e 17º do CIRE e o disposto no artigo 248º n.º 1.
Ao só notificar o recorrente em 4/11/10 a Segurança Social deixou passar o prazo de 30 dias, sem proferir decisão deferindo tacitamente o pedido. Daí que a partir da formação de tal acto tácito de deferimento (2/11/10) deixe de ser exigido o pagamento da taxa de justiça no caso em apreço.
Caso assim não se entenda, a decisão recorrida não respeitou o disposto no artigo 248º n.º 1 do CIRE.
Estabelece o artigo 248º n.º 1 do CIRE que o devedor que apresente um pedido de exoneração do passivo beneficia do deferimento do pagamento das custas até à decisão final desse pedido.
Assim, ao ter requerido a exoneração do passivo restante está o apelante em condições de lhe ser concedido o também requerido benefício do deferimento do pagamento das custas.
A norma do artigo 248º n.º 1 do CIRE que claramente cria um regime excepcional ao previsto no artigo 476º n.º 6 do Código de Processo Civil, é aplicável ao caso concreto.
A matéria de facto constante dos autos não possibilita o desentranhamento do pedido de apresentação da insolvência, nos termos do disposto no artigo 467º n.º 6 do Código de Processo Civil, ex vi do artigo 17º do CIRE.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

II – É pelas conclusões do recurso que se refere e delimita o objecto do mesmo, ressalvadas aquelas questões que sejam do conhecimento oficioso – artigos 684º, e 685-A Código de Processo Civil -.

São os seguintes os factos com interesse para a decisão da causa:
Em 25/11/10, o recorrente apresentou petição onde se apresentou à insolvência.
No mesmo requerimento solicitou o diferimento do pagamento das custas até à decisão final do incidente do pedido de exoneração do passivo.
Também requereu incidente de aprovação de plano para pagamento aos credores em apenso.
No requerimento em que solicitou a insolvência requereu que, caso aquele plano (de pagamento aos credores) não seja aprovado, pretende beneficiar da exoneração do passivo restante, nos termos do disposto no artigo 254º, e alínea a) do n.º 2 do artigo 23º do CIRE.
Juntou documento comprovativo do pedido de apoio judiciário na modalidade de dispensa da taxa de justiça e custas.

Em 3/12 /10 foi suspenso o processo de insolvência até à decisão da decisão sobre o plano de pagamentos.
Foi ainda solicitada informação sobre a decisão do pedido de apoio judiciário.
Tendo a Segurança Social informado que o pedido foi indeferido foi o recorrente notificado, em 4/2/11, para proceder, no prazo de 10 dias, ao pagamento da taxa de justiça, com a cominação do n.º 6 do artigo 467º do Código de Processo Civil.
Em 11/2/11 foi proferido novo despacho, em virtude do recorrente apenas ter depositado a quantia de € 80,00, invocando o diferimento do pagamento das custas.
A Segurança Social informou que não foi impugnada judicialmente a decisão (de não concessão do pedido de apoio na modalidade pretendida) pelo que, é definitiva a decisão que indeferiu o pedido de apoio judiciário.

Foi então proferido o despacho recorrido.
O apelante veio requerer a sua insolvência, com exoneração do passivo restante.
Não demonstrou ter pago a taxa de justiça inicial devida nem lhe foi concedido a concessão do apoio judiciário na modalidade que abarcasse a isenção daquele pagamento.
O despacho recorrido, perante a constatação de tal omissão, notificou o apelante para efectuar o pagamento da taxa de justiça.
A taxa de justiça em dívida é de € 612,00, tendo o recorrente feito o depósito de apenas € 80,00.
De acordo com o artigo 4º do citado Regulamento a presente acção não está isenta do pagamento de custas.
Conforme se refere no despacho recorrido, de acordo com o disposto no artigo 14º, n.º 1 do Regulamento das Custas Judiciais “o pagamento da taxa de justiça faz-se até ao momento da prática do acto processual a ela sujeito, devendo o interessado entregar o documento comprovativo do pagamento ou realizar a compensação desse pagamento juntamente com o articulado ou requerimento”.
O n.º 5 do artigo 29º da Lei n.º 47/07 que alterou a Lei n.º 34/04 de 29 de Julho dispõe que “ não havendo decisão final quanto ao pedido de apoio judiciário no momento em que deva ser efectuado o pagamento da taxa de justiça e demais encargos do processo judicial, proceder-se-á do seguinte modo:
a) no caso de não ser ainda conhecida a decisão do serviço da segurança social competente, fica suspenso o prazo para proceder ao respectivo pagamento até que tal decisão seja comunicada ao requerente (...)”.
Dispõe o artigo 467º n.º 1 do Código de Processo Civil, na redacção que lhe foi conferida pelo DL 34/08 de 26 de Fevereiro que “ o autor deve juntar à petição inicial o documento comprovativo do prévio pagamento da taxa de justiça devida ou da concessão do benefício de apoio judiciário, na modalidade de dispensa do mesmo.
O n.º 6 do citado artigo dispõe que “no caso previsto no número anterior, o autor deve efectuar o pagamento da taxa de justiça no prazo de 10 dias a contar da data de notificação da decisão definitiva que indefira o apoio judiciário sob pena de desentranhamento da petição inicial apresentada salvo se o indeferimento do pedido de apoio só for notificado depois de efectuada a citação do réu.
Resulta dos autos que em 27 de Outubro de 2010 foi proposta (pela Segurança Social) decisão de indeferimento do pedido de apoio (sendo referido que apenas poderá ser proposto pagamento faseado da taxa de justiça e demais encargos), da qual foi notificado o recorrente, não se tendo o mesmo pronunciado (artigo 23º) pelo que passou a mesma proposta (de indeferimento) a definitiva.
Por sua vez, esta decisão não foi impugnada pelo recorrente nos termos do disposto no artigo 27º da citada Lei n.º 34/04 de 29 de Julho, pelo que decorrido o prazo legal para o mesmo se pronunciar (artigo 23º), a mesma tem que se considerar como definitiva.

De acordo com o artigo 17º do CIRE, ao processo de insolvência aplica-se, subsidiariamente o Código de Processo Civil, e o Regulamento aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008 de 26/2.
Nos termos do artigo 467º, nº 3, do C. P. C. (na redacção do Dec. Lei nº 34/2008), o autor deve juntar à petição inicial o documento comprovativo do prévio pagamento da taxa de justiça devida ou da concessão do benefício do apoio judiciário, na modalidade de dispensa do mesmo.
Com o Decreto- Lei nº 183/2000, de 10/8, o pagamento da taxa de justiça inicial (actual taxa de justiça única) passou a ser feito pelas partes antes da propositura da acção, o que implica a sua prévia liquidação em função da tabela de custas, e a posterior apresentação, com a petição inicial, do documento que o prova, ressalvados os casos de apoio judiciário, a obter nos Serviços da Segurança Social, provando o autor a sua obtenção (vide Lebre de Freitas, C.P.C. Anotado, 2ª ed., vol. 2º, 253). A falta desta prova determina a recusa do recebimento da petição pela secretaria (artigo 474º, nº 1, al. f), do C.P.C.) ou a recusa de distribuição pelo juiz que a ela preside (artigo 213º, nº 1, do C.P.C.).

O artigo 248º do CIRE, epigrafado de «apoio judiciário», não concede o benefício do apoio judiciário a quem quer que seja, limitando-se a conferir ao devedor que apresente um pedido de exoneração do passivo restante, o benefício do diferimento do pagamento das custas até à decisão final desse pedido (nº 1), na parte em que a massa insolvente e o seu rendimento disponível durante o período da cessão sejam insuficientes para o respectivo pagamento integral, ou o pagamento em prestações das custas e a obrigação de reembolsar o Cofre Geral dos Tribunais das despesas e remunerações do administrador da insolvência e do fiduciário que aquele Cofre tenha suportado (nº 2).
Isto não significa que o recorrente não tenha que efectuar, inicialmente, o pagamento da taxa de justiça no processo de insolvência.
Conforme consta dos autos, o pedido (de apoio judiciário) formulado pelo recorrente foi indeferido, pelo que, o mesmo não está isento do pagamento da taxa de justiça, e, tendo-lhe sido proposto o pagamento faseado, o mesmo nada disse ou requereu, pelo que após a junção aos autos daquela decisão, o Mmº Juiz ordenou a notificação do recorrente para efectuar o respectivo pagamento.
Em síntese dir-se-á que instaurada um processo de insolvência de pessoa singular o pagamento da taxa de justiça faz-se até ao momento da prática do acto processual a ela sujeito, ou tendo sido requerido o apoio judiciário, no prazo que lhe for concedido pelo juiz, no caso de indeferimento desse pedido.
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III – Pelo exposto, acordam os Juízes desta Secção em julgar a apelação improcedente e, em consequência, confirmam a decisão recorrida.
Custas pelo apelante

Guimarães, 16 de Junho de 2011
Conceição Bucho
Antero Veiga
Conceição Saavedra