Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
557/08.8TBPVL.G1
Relator: HEITOR GONÇALVES
Descritores: CONTRATO DE CESSÃO DE EXPLORAÇÃO COMERCIAL
RESOLUÇÃO DO NEGÓCIO
INDEMNIZAÇÃO DE PERDAS E DANOS
INTERESSE CONTRATUAL POSITIVO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 11/14/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: I – O efectivo prejuízo causado pelo incumprimento definitivo do contrato deve ser reparado, contemplando também o interesse contratual positivo, à luz do princípio da boa fé e do equilíbrio das prestações, considerando os efeitos da liquidação resolutiva das prestações contratuais.
II – Sabendo ambos os contraentes, desde o início, que assumiam uma execução irregular/ilegal dum contrato de cessão de exploração, concorreram ambos para essa ilicitude, aceitando os riscos que daí poderiam advir.
III – Perante tal circunstancialismo, a resolução do contrato operada pela ré não concede à autora o direito às prestações correspondentes ao período de duração do contrato.
Decisão Texto Integral: ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES

I
1.A sociedade comercial B…, Lda, intentou esta acção ordinária contra C…, Lda, D… e E…, pedindo a condenação dos demandados a pagar a quantia de 290.500€, acrescida de IVA (montante global de 348.600€), tendo alegado que, nos termos do contrato escrito por ambas celebrado em 1 de Outubro de 2006 cedeu à ré a exploração dum estabelecimento industrial de lavandaria (instalado num prédio tomado de arrendamento pela autora em 01.10.2002), pelo prazo de 2 anos, renováveis por iguais e sucessivos períodos, não sendo com a antecedência mínima de 6 meses com referência ao termo do prazo, mediante o preço de 303.000€, a pagar em 24 prestações mensais.
Sem que tenha resolvido ou denunciado o contrato, a ré encerrou o estabelecimento e mudou de instalações em 03.10.2008, e não pagou a prestação vencida nesse mês, do montante de 12.500,00, acrescido de IVA, pelo que nos termos da cláusula 13ª se venceram todas as correspondentes ao período de duração do contrato.
2. Os Réus contestaram, alegando ter resolvido o contrato com justa causa com efeitos a partir do fim do mês de Outubro de 2008, radicada no facto de os pavilhões onde se encontra instalado o estabelecimento terem sido objecto de obras não licenciadas, antes da celebração do contrato, sendo a existência de licença de utilização imprescindível para obter a necessária licença de exploração, daí a impossibilidade do objecto, e a perda de interesse na prestação por parte da ré. E, com fundamento nas despesas, nos danos causados à imagem da 1ª Ré e no stress causado aos demais, decorrentes da situação que conduziu à resolução, e de irregularidades e avarias de equipamento do estabelecimento, deduziram reconvenção pedindo a condenação da A. a pagar 141.455,81 €, a título de danos patrimoniais, e por danos não patrimoniais a quantia de 10.000 € à 1ª Ré, e igual montante ao 2º e 3º Réus, acrescidas de juros legais desde a citação.



3. Replicando, a Autora sustentou que a Ré, na carta enviada e recebida em 06.10.2008, solicitava a entrega de licenças de utilização dos pavilhões em causa, dando o prazo de 8 dias sob pena de resolver o contrato, quando ela própria já tinha ajustado outro contrato de cessão de exploração, e invocou subsidiariamente a verificação de abuso de direito.
4. Na tréplica, os Réus mantiveram a posição já assumida nos autos.
*
5. Realizado a audiência de julgamento, foi proferida sentença a condenar a ré C… a pagar à Autora a quantia de 290.500 €, acrescida do respectivo IVA, no montante global de 348.600 €, e os Réus D… e E…, na qualidade de fiadores, a pagarem à Autora a aludida quantia de 290.500 €, acrescida de IVA, no montante global de 348.600€, e absolutória da Autora da totalidade do pedido reconvencional.

II
Apelaram os RR e a autora contra-alegou.
Sendo distribuído o processo nesta Relação, foram os apelantes convidados pelo relator a aperfeiçoarem as 80 conclusões de recurso, expondo de forma organizada e concisa as questões a apreciar (alertando-se então que deveriam evitar, designadamente, transcrições de depoimentos, considerações genéricas e de natureza argumentativa, e dedução difusa de questões de facto e de direito).
Conclui agora nos seguintes termos:
1 - Na Sentença proferida o Tribunal a quo fez uma errada apreciação da prova produzida, julgando provados factos que não ficaram demonstrados e julgando não provados factos que se encontram provados, impondo-se seja a mesma revogada e substituída por outra que (i) absolva os Réus do Pedido, e (ii) condene a Autora no Pedido Reconvencional.
2 - As questões submetidas à apreciação do Tribunal, foram, são, um lado, saber se a resolução do contrato de cessão de exploração celebrado com a Autora, operada pela Ré " ... se mostra legitima ... ", e se o contrato de cessão de exploração está ferido de nulidade, verificando-se a impossibilidade originária do seu objeto.
3 - Na Sentença ora em crise, as duas questões mereceram resposta negativa, com o que os Recorrentes não se conformam, atenta designadamente toda a prova documental e testemunhal produzida nos Autos, assentando a Decisão proferida em conclusões meramente silogísticas, tomadas com base em pressupostos errados e circunstâncias erradamente presumidas, porque tem por base juízos preconcebidos, induzidos pela incorreta apreciação de toda a prova produzida, designadamente a prova testemunhal.
4 - Com efeito o Tribunal sustentou a Decisão proferida numa interpretação manifestamente errada interpretação das obrigações assumidas por cada uma das partes no contrato celebrado (cessão de exploração), sem qualquer sustentação no texto do contrato e/ou no comportamento das partes, decidindo que era da exclusiva responsabilidade da Ré não só a obtenção da licença de exploração da atividade exercida, como também a obrigação de diligenciar pela regularização da licença de utilização do prédio onde está localizado o estabelecimento industrial, do qual a mesma não era sequer arrendatária, conclusão que é manifestamente excessiva, porque contrária ao texto do contrato, e violadora do princípio da boa-fé contratual, pois desonera em absoluto a Autora de obrigações que necessariamente impenderiam sobre a mesma, atento o contrato celebrado.
5 - Sendo que, para atribuir à Ré aqui Apelante a exclusiva responsabilidade pela eliminação dos vícios da licença de utilização do imóvel onde estava localizada a atividade, o tribunal, presumiu, sem mais que os vícios de que enferma a referida "Licença de utilização", e que ficaram provados nos Autos, eram contemporâneos da celebração do contrato, pelo que a Ré teria conhecimento dos mesmos desde essa data, ou pelo menos desde Novembro de 2007, e, mesmo assim teria aceitado manter-se no estabelecimento a laborar, o que impediria a invocação desses factos, posteriormente, como fundamento da resolução comunicada à A. em Outubro de 2008.
6 - Ora, toda a prova produzida, quer documental, quer testemunhal, demonstra exatamente o oposto, ou seja que a Ré não tinha conhecimento dos vícios de que enfermava a licença de utilização, e que, concluiu pela impossibilidade de no curto prazo obter a eliminação dos vícios, porque tal implicava a demolição de obras de estrutura do imóvel (do qual repita-se não era proprietária ou sequer arrendatária).
7 - Pelo que, só porque o Tribunal não atribuiu força probatória a documentos juntos aos Autos que não se demonstram impugnados, e cuja falsidade não foi suscitada, e desconsiderou na totalidade depoimentos que foram prestados de forma isenta e coerente por várias testemunhas, depoimentos esses que, de per si impunham, a final, resposta diversa aos factos constantes da base instrutória, veio a concluir no sentido que consta da Sentença, quando atenta a prova produzida nos Autos se impunha que se concluísse que a Autora não cumpriu com as obrigações contratualmente assumidas perante a Ré, pelo que a resolução foi legitimamente operada pela mesma, mais se verificando a impossibilidade originária do objeto do contrato celebrado entre as partes, pelo que sempre deveria a Ré ter sido absolvida do pedido e a Autora condenada no pedido reconvencional.
8 - O Tribunal valorou pois de forma errada os documentos juntos aos Autos, designadamente o doe. de fls. 68 dos Autos ao qual foi atribuída uma força probatória que o mesmo não tem nem pode ter, pois trata-se de uma licença de utilização da qual apenas consta genericamente a identificação do prédio e a atividade licenciada para o local, não resultando da análise do mesmo nem podendo resultar que no local licenciado existiam obras não legalizadas, sendo manifestamente excessivo que pelo simples facto de tal licença ter sido entregue à Ré, implicaria que a mesma tinha conhecimento (que não tinha) das obras ilegais existentes.
9 - Do mesmo modo, concluir que a Ré tinha conhecimento das obras ilegais, extensão das mesmas e impossibilidade de suprir tais vícios desde 2007, apenas porque a Câmara Municipal em despacho datado de Novembro de 2007, certificou que "Para o local foi licenciado o processo de obras n. 230/88, um estabelecimento industrial destinado a indústria de confecção têxtil e acabamentos, verificando-se a existência de alterações ao projeto inicial não licenciadas que carecem de licenciamento." é manifestamente excessivo.
10 - Impondo-se, atento o teor dos documentos supra, referidos a conclusão oposta à que consta da Sentença ora em crise, ou seja, que os Réus, aqui Recorrentes foram induzidos em ERRO pela Autora, que lhes forneceu copia da licença sem qualquer explicação, fazendo crer que tudo estava regularizado, e criando na Ré a legitima expectativa de vir a obter a Licença de exploração para a atividade que se propunha exercer, facto pelo qual contratou até um Gabinete especializado para o efeito.
11 - Os Réus não tinham pois, naquelas datas (celebração do contrato e obtenção da certidão camarária) nem podiam ter, conhecimento da dimensão do problema, e muito menos das consequências que do mesmo para eles poderiam advir, até porque a Autora sempre negou que existisse qualquer problema, e manteve tal posição nos presentes Autos, continuando a alegar expressamente e de forma clara que a licença de utilização do imóvel onde está situado o estabelecimento industrial, era válida, não enfermando de qualquer vício, facto a que o Tribunal não deu qualquer relevância na decisão.
12 - Atento o que, contrariamente ao que consta da Sentença, terá que julgar-se provado que a A. sempre afirmou à Ré que a licença de utilização era válida, e que inexistiria qualquer problema ou vício inerente à mesma, criando na Ré a convicção de que tudo se iria resolver, explicações que a Ré, de boa-fé, aceitou, não só porque necessitava de manter-se a laborar para poder cumprir com os compromissos assumidos, como ainda porque já tinha feito avultados investimentos no estabelecimento industrial, tendo por isso todo o interesse em manter o contrato celebrado com a A., não tendo nunca aceitado tais vícios e muito menos se tendo conformado com os mesmos.
13 - Estes factos, resultam ainda provados pelos depoimentos prestados pelas testemunhas dos Réus, aqui Apelantes, depoimentos que confrontados entre si, e com as testemunhas arroladas pela Autora, aqui Apelada, se mostram concisos, claros e firmes, pelo que não podem, nem devem, sem mais, ser desconsiderados na totalidade, como veio a ser entendido pelo Tribunal.
14 - Na verdade todas as testemunhas arroladas pelos Apelantes demonstraram claramente ter conhecimento direto dos factos, desde logo porque como declaram de forma espontânea e sincera tiveram intervenção direta nos acontecimentos em causa nos presentes Autos, tendo apresentado depoimentos coerentes entre si, demonstrando responder com clareza, e sem hesitações.
15 - Verificando-se que, pelo contrário as duas primeiras testemunham arroladas pela Autora, são familiares diretos do gerente da Autora, e eram sócios da "F… Têxteis, Lda" (anterior proprietária do estabelecimento industrial objeto da cessão de exploração, entidade em nome da qual estão a maioria dos documentos juntos aos Autos pela Autora), resultando dos depoimentos prestados pelas mesmas terem interesse pessoal na decisão a proferir nos presentes Autos,e, a terceira testemunha da Autora, Maria …, no final do depoimento permitiu-se até declarar que o representante legal da Autora estava todos os dias na Póvoa de Lanhoso no estabelecimento Industrial, quando o próprio representante legal e demais testemunhas disseram claramente que ele trabalhava em Guimarães e raramente ia à Póvoa de Lanhoso, o que só por si demonstra a falta de credibilidade do depoimento prestado por Maria …, que inicia no minuto 00:12:58, no dia 24/10/2012, a fls.202, 203 da transcrição.
16 - Verifica-se ainda que, contrariamente ao que consta da Sentença, está provado nos Autos, através da apresentação de certidão comercial da sociedade "F… Têxteis, Lda" (proprietária inicial da unidade industrial cuja exploração foi cedida pela Autora à Ré), não só o registo da Falência da mesma em 2004, como da inexistência de bens da falida, atento o que, na data da declaração da falência o estabelecimento objeto das licenças já não seria propriedade da falida, desconhecendo-se a quem e como aquela sociedade transmitiu o estabelecimento, pelo que nunca o liquidatário nomeado poderia assinar declarações de transmissão de bens que nunca foram apreendidos para a massa falida, tendo pois que dar-se como provado que não era possível o averbamento das licenças emitidas em nome daquela sociedade e juntas aos Autos pela Autora a favor da sociedade Ré.- Artigos 186º e 134º e seguintes, do CPEREF.
17 - Isto posto, é manifesto que, os depoimentos de cada uma das testemunhas dos Réus. aqui Apelantes, conexionados com a prova documenta junta aos Autos, resulta que no caso em apreço se impõem decisão diversa da matéria de facto julgada provada nos presentes Autos.
18 - Do depoimento da testemunha António …, ouvido na sessão de 22/01/2012, com início no minuto 00:49:19, a fls. 234 a 270 da transcrição, resulta que o mesmo acompanhou o processo de licenciamento industrial a pedido da l.i! Ré, aqui Apelante, ficando provado que: - No início da prestação dos serviços lhe terá sido fornecida a "licença de utilização", (doc de fls. 68) único documento de que havia conhecimento à data, sendo claro, que como a própria testemunha referiu, após análise desse documento, foi possível concluir que, em princípio, era possível exercer a atividade industrial da Ré, aqui Apelada, nas instalações em causa. Fls. 236 e ss da transcrição - Só após apresentação de pedidos junto da Câmara Municipal da Póvoa de Lanhoso, e após obtenção das primeiras respostas, foi possível verificar que a licença de utilização não estava em conformidade, no entanto, mesmo nessa data não foi de imediato possível aferir da dimensão do problema, tendo sido necessário consultar o processo físico na Câmara Municipal da Póvoa de Lanhoso, circunstância e íter temporal que foi de forma errada desconsiderado pelo Tribunal lia quo", que concluiu sem mais que desde o inicio do contrato, ou pelo menos desde Novembro de 2011 a Ré tinha total conhecimento da realidade.- fls 245, ss da transcrição. - Houve diversos contactos e reuniões com o sócio gerente da Ré, para analisar a situação e tomar uma decisão, tendo a Testemunha ficado com a convicção que, quando transmitiu ao gerente da Ré e ao Sr. Domingos os problemas verificados, os mesmos não tinham conhecimento da existência dos mesmos, mais tendo transmitido que a regularização da situação não seria possível sem a colaboração do proprietário das instalações e muito menos no curto prazo.- Pág. 252, ss da transcrição.
19 - Atento o depoimento prestado por esta Testemunha, impunha-se que o Tribunal a quo tivesse julgado provados na íntegra os factos constantes: - Da alínea d) da Base Instrutória (arts. 12 e 13 da Contestação), e alínea e) da Base Instrutória, factos que estão documentalmente provados e foram confirmados de forma clara e concisa por esta Testemunha, - Da alínea f) da Base Instrutória, resulta expressamente do depoimento prestado que necessariamente a Ré teria que ter solicitado documentos e informações à Autora, não sendo sequer imaginável situação diversa, atenta a dimensão e o volume das questões suscitadas. Resulta ainda de forma direta deste depoimento que nunca a Autora entregou aos Réus qualquer documento, tendo sido esta Testemunha quem teve que procurar e diligenciar pela obtenção de todos os documentos o que só por si demonstra e justifica a demora do processo e da tomada de decisão, pelo que os factos constantes desta alínea sempre deveriam ter sido julgados provados, pelo menos no que concerne aos alegados nos artigos 15.2, 16.2 e 17.2, e 1. parte do artigo 18.2, todos da Contestação - Da alínea j) que foram julgados como não provados, é manifesto que estando provados documentalmente nos Autos que a "Licença de Utilização" padecia de vícios que impediam a obtenção da "Licença de exploração", conjugado com o depoimento desta Testemunha, os conhecimentos técnicos revelados pela mesma e a forma como explicou e sustentou as afirmações feitas, necessariamente teriam que ter sido julgados como provados todos os factos alegados nos artigos 25º, 26º, 29º, 30º, 31º e 32º, todos da Contestação, sendo que, relativamente aos factos constantes destes últimos artigos o depoimento deve ser apreciado conjugado com os factos documentalmente provados nos Autos, designadamente o teor de todos os documentos emitidos pela Câmara Municipal, e a posição assumida pela Autora nos presentes Autos, como ficou supra alegado, - o que justifica ainda a resposta de "provado" ao quesito ae) da Base Instrutória. - Esta Testemunha declarou ainda expressamente o motivo por que consultou o processo na Câmara Municipal, pelo que deve, em consequência, ser julgada provada a matéria constante da alínea I) da Base instrutória, designadamente os factos alegados nos artigos 36º, art.s 37º na totalidade, 39º e 40º, todos da Contestação, - Quanto à alínea p), atentos os documentos juntos aos Autos e as declarações desta Testemunha, devem os factos alegados no artigo 56º da Contestação ser julgados como provados, - E, em consequência, devem os factos constantes da alínea u), v), x) ser julgados não provados.
20 - Em face do depoimento da testemunha Francisco …, ouvido na sessão de 22/01/2012, com inicio no minuto 00:22:17, a fls. 271 a 289 da transcrição, ficou provado que: - o Cliente Espanhol exigiu à aqui Ré documentos comprovativos da licença de exploração da unidade industrial explorada pela mesma, o que tal cliente representava para a Ré em termos de volume de faturação da sociedade, e a necessidade absoluta de uma tomada de decisão sob pena de a empresa (Ré aqui Apelante) perder o cliente, podendo mesmo ter que encerrar se tal se viesse a verificar. (fls. 273, ss da transcrição); - Declarou ainda a testemunha que a decisão tomada de resolver o contrato de cessão de exploração e mudar de instalações não teve como consequência qualquer benefício económico para a Ré, aqui Apelada, pelo contrário implicou avultados custos. (pag. 282, ss da transcrição) - Só por absoluta necessidade de sobrevivência foi tomada pela Ré a decisão de sair, pois esta era a única alternativo que permitia manter o cliente e assegurar a manutenção da empresa em laboração, e o facto de a decisão ter sido tomada de forma rápida, atenta a pressão do cliente espanhol, obrigando a um grande esforço por parte dos responsáveis da sociedade Ré, designadamente no período de férias para encontrar uma solução alternativa. - A sociedade Ré não teve qualquer benefício com a mudança de instalações, pelo contrário, pelo contrário, viu-se obrigada a suportar avultados custos e teve problemas graves com clientes e trabalhadores, factos que estão documentalmente provados designadamente pelos vários documentos juntos com a Contestação, comprovativos dos custos suportados. 21 - Impõe-se pois seja dada resposta diversa aos seguintes pontos da Base Instrutória: - Os constantes da alínea c} da Base Instrutória, porque Testemunha presenciou a apresentação pela Ré à Autora da reclamação de vários problemas tendo demonstrado conhecimento dos custos suportados com as reparações, que também estão documentalmente provadas (pág. 280 ss da transcrição) - Os constantes da alínea f) e g) - porque a Testemunha identificou a pessoa que fez os pedidos, ( o Sr. Domingos) a quem (ao Sr. Aires) e quando (quando ele ia lá buscar o cheque da renda) (pág. 275 da transcrição); alínea I) e m) sem as restrições constantes das respostas dadas pelo Tribunal, pois que a Testemunha esclareceu sem qualquer dúvida e de forma espontânea o que o cliente espanhol representava para a faturação da empresa que não poderia sobreviver se perdesse aquele Cliente. Situou os factos no tempo e explicou a angústia sentida com a situação e a dificuldade de tomada de decisão. Depoimento que aliás e consentâneo com a comunicação do cliente enviada por escrito para a sociedade Ré e que se encontra junta aos Autos, - alínea q) artigo 68.º, 69.º, 70.º, 71.º, da Contestação, factos de que a Testemunha demonstrou ter conhecimento tendo explicado o ocorrido, - alínea r) artigo 95.º da contestação, alínea s), porque a Testemunha explicou de forma clara o ocorrido, e de forma espontânea identificou o motivo da mudança e a justificação do facto de ter sido repentina a tomada de decisão, factos que necessariamente que ser julgados provados, - e em consequência, devem os factos constantes da alínea a), (sem qualquer limitação), b), u), v), x) da Base Instrutória ser julgados não provados.
22 - Resulta ainda provado pelos vários depoimentos, e designadamente do depoimento da testemunha Francisco … acima referida e da Testemunha Domingos …, ouvido na sessão de 22/01/2012, com inicio no minuto 00:50:20, a fls. 290 a 320 da transcrição, que a postura da sociedade Ré e respetivo gerente sempre foi no sentido de contribuir para a resolução dos problemas, sempre com o objetivo principal de manter a empresa a funcionar, e fazer crescer o novo negócio criado onde estavam todas as expectativas de futuro do mesmo, nunca a sociedade Ré ao longo da execução do contrato, pode contar com a colaboração da Autora para a efetiva resolução dos problemas (que de resto a A. nunca sequer alegou), pois os representantes da mesma, embora se preocupassem em receber a "renda" cujo pagamento que iam pessoalmente receber às instalações cedidas, nunca deram qualquer tipo de resposta às questões que iam surgindo. Postura que aliás mantiveram nos presentes Autos, a sociedade Ré, aqui Apelada, porque precisava de cumprir com as encomendas para ter dinheiro para pagar os ordenados dos trabalhadores cujo número foi aumentando ao longo do tempo, lá foi resolvendo como podia as questões pontuais que iam surgindo na expetativa da obtenção da licença de exploração e acerto final das contas (fls. 294 ss da transcrição).
23 - A Testemunha Domingos … declarou aliás de forma inequívoca, que conjuntamente com outros quadros superiores da empresa, tinha rescindido o contrato de trabalho que tinha (trabalhava num Banco) para vir trabalhar para a nova sociedade, sociedade que foi constituída com o objetivo único de iniciar laboração nas instalações aqui em causa. (fls. 293 da transcrição). O que demonstra bem o grau de envolvimento dos Réus na questão aqui em apreço, dizendo que com o passar do tempo, e os investimentos financeiros e pessoais já feitos, a tomada de uma decisão radical não era fácil, o que motivou e justificou a demora na tomada de decisão, não porque tivesse havido aceitação, mas antes porque os Réus se mantiveram até ao limite na esperança da resolução prometida pela Autora, até porque o investimento feito foi muito superior ao inicialmente previsto, pelo que atenta a demora da Autora em resolver o problema e havendo consciência de que só o proprietário das instalações poderia resolver o problema, os Réus chegaram até a equacionar a compra das instalações, para evitar o prejuízo total que acabou por vir a verificar-se. - fls. 310 ss da transcrição.
24 - É pois manifestamente excessiva, demonstrando um juízo preconcebido do Tribunal, a decisão de desconsiderar na totalidade o depoimento desta Testemunha (Domingos …) concluindo pela inexistência de qualquer reclamação, com base apenas na interpretação descontextualizada da questão relacionada com a suposta intenção por parte da Ré de vir a comprar as instalações onde estava instalada a unidade industrial objeto do contrato de cessão de exploração, facto isolado, que não tem o alcance pretendido.
25 - Com efeito, como a testemunha explicou no depoimento prestado atento o tipo de relação existente entre as partes (grande proximidade física, pois ocupavam armazéns contíguos), e a inexperiência dos quadros da Ré, e o esforço feito pela Ré para que tudo fosse sendo ultrapassado, sempre teria que ser justificada a inexistência de interpelações escritas, sendo que a intenção de comprar surgiu como eventual solução desesperada para poder ter o controlo de uma situação que não se resolvia atenta a postura da Autora que insistia negar a existência de problemas com o licenciamento.
26 - A Testemunha Domingos … até explicou como fazia as reclamações, socorrendo-se de um livro de notas onde fazia as anotações das questões a colocar ao Sr. Aires quando o mesmo fosse receber a renda, o que não pode deixar de ser relevado na apreciação do depoimento prestado (fls. 299 da transcrição), e tem que ser conjugado com o facto de as testemunhas da Autora que não obstante afirmarem que nunca houve uma reclamação, apresentaram varias justificações (ainda que pouco credíveis) para o que se passou com as caldeiras, os problemas surgidos com as águas e outros equipamentos, as questões ligadas à instalação elétrica, demonstrando conhecimento da existência dos problemas, impondo-se que a conclusão de que houve reclamações verbais, até porque tal factualidade é muito mais consentâneo com a realidade dos negócios, nomeadamente nas pequenas e médias empresas de cariz eminentemente pessoal e até familiar como eram a Ré e Autora, que no dai a dia não usam de grandes formalidades nas relações comerciais.
27 - A Testemunha Domingos … esclareceu ainda que muito embora tivesse havido visitas ao local antes da celebração do contrato, tais visitas foram pontuais até porque a empresa estava ainda a ser criada nessa altura (para outorgar no contrato - fls. 291 ss da transcrição), razão pela qual os sócios até aceitaram ser fiadores, pois de boa-fé sempre os Réus se preocuparam em criar o novo negócio, acreditando nos representantes da Autora, pessoas com mais experiência nesta área de negócio até porque já tinha tido outras sociedades, como está documentalmente provado nos Autos e os mesmos declararam ser verdade nos depoimentos que prestaram.
28 - No que concerne à forma como a decisão de saída foi tomada e a forma como tal foi feito, também aqui a Testemunha Domingos … esclareceu o ocorrido referindo as conversas que teve com a D.ª Manuela, onde as teve e porque as teve, os problemas surgidos com o Cliente espanhol, as potenciais consequências para a atividade da empresa que representaria o risco de continuarem a laborar em instalações que não podiam ser licenciadas, a procura desesperada de novas soluções, a oportunidade surgida e a rapidez com que foi necessário assegurar a possibilidade de alternativa entretanto surgida, porque a fabrica tinha que se manter em laboração (fls. 301 ss da transcrição).
29 - Mais esclareceu que a mudança implicou custos avultados, e que era economicamente muito mais interessante continuar a laborar naquelas instalações do que mudar da forma como tiveram que o fazer, deixando bem claro que nenhum benefício económico resultou para a sociedade Ré da Decisão tomada, pelo contrário, tiveram que suportar avultados custos que estão provados nos Autos. -fls. 306 ss da transcrição.
30 - Atento o que antecede, os factos constantes da alínea c), d), e), f), g), j), I)(sem qualquer limitação), m), n), p), q) (sem qualquer limitação), r), s) e ae) que foram julgados como não provados, devem ser julgados provados atenta a prova documental junta aos Autos e o depoimento desta testemunha conjugado com o depoimento da Testemunha Francisco …, designadamente nos pontos acima referenciados, mais devendo, em consequência, os factos constantes da alínea a), (sem qualquer limitação), b), u), v), x) ser julgados não provados.
31 - Por outro lado do depoimento da testemunha Susana …, ouvida na sessão de 22/01/2012, com inicio no minuto 00:05:44, a fls. 320, final da pág. A 325 da transcrição resulta também clara a forma como foram sendo apresentadas as reclamações, a quem, e quando, bem como a total ausência de resposta por parte dos representantes da Autora (fls. 323 ss da transcrição), confirmando os depoimentos das Testemunhas ouvidas antes, declarou também de forma clara que começou a trabalhar na sociedade Ré em Outubro de 2006, após entrevista para o efeito, sem que lá tivesse estado a trabalhar em data anterior aquela (fls. 321 ss da transcrição), também no que concerne às licenças (ou falta das mesmas) mostrou ter conhecimento dos factos referenciando até circunstâncias concretas ocorridas, como inspeções das entidades competentes, facto que também foi referido pela Testemunha Sr. Domingos …, atento o que, conjugado este depoimento com os antes referidos se impõe também seja julgado provados os factos constantes das alíneas c), d), e), f), g), j), I)(sem qualquer limitação), m), n), p), q) (sem qualquer limitação), r), s) e ae) que foram julgados como não provados, devem ser julgados provados atenta a prova documental junta aos Autos e o depoimento desta testemunha, designadamente nos pontos acima referenciados, devendo, e consequência, os factos constantes da alínea a), (sem qualquer limitação), b), u), v), x) ser julgados não provados.
32 - A testemunha José …, ouvido na sessão de 22/01/2012, com início no minutoOO:09:00, a fls. 325, final da pág. A 332 da transcrição, não dissepois a Testemunha não disse que os Réus saíram de um dia para o outro ou quase, o que a testemunha disse foi que "as negociações" do contrato celebrado para o novo espaço foram feitas num período muito curto, "quase de um dia para o outro" atenta a necessidade de encontrar alternativas e a urgência em satisfazer as exigências do cliente espanhol (fls. 328 ss da transcrição), demonstrando ter conhecimento das exigências feitas pelo cliente espanhol, quando foram feitas e porquê, reafirmando o que já antes havia sido declarado pelas demais testemunhas arroladas pelos Réus.
33 - Atento o que antecede, impõe-se que, reapreciando a prova produzida, designadamente atentos os depoimentos acima referidos, seja revogada a decisão proferida quanto à matéria de facto, substituindo-se por outra que julgue não provados, designadamente do ponto 19.º, 51.º, 60.º, 62.º, 63.º, 64.º, 65.º, 67.º, 75.º, 77.º, dos factos provados e, por outro lado, julgando provados os factos constantes da Base Instrutória, sob as alíneas c), d), e), f], g) h), j), I)m), n), o), p),q) (art. 68º, 69.º e 71.º da contestação), r) (artigo 95.º da Contestação), s) ad) e ae), acrescentando aos factos provados designadamente os seguintes factos: - Durante a execução do contrato, a 1.ª Ré verificou que parte dos equipamentos estavam avariados, outros não possuíam autorização para funcionar; - Os réus solicitaram verbalmente aos representantes da Autora a resolução das situações acima descritas; - A Autora nunca forneceu qualquer informação; - Os contactos foram feitos com o Senhor Aires quando o mesmo se deslocava ao estabelecimento industrial para receber a renda todos os meses; - Os Réus deparam-se com um impedimento à conclusão do processo industrial que tinham iniciado; - Confrontada com a resposta da Câmara no sentido de existirem obras não licenciadas a Autora continuou a afirmar que tudo estava regularizado; - Deve ser acrescentado no ponto 37.º dos factos provados que a Autora ocultou aos Réus que em data anterior ... " - Os Réus ficaram a aguardar a regularização da licença de utilização, questão a que era alheia, continuando a laborar no estabelecimento porque já tinha feito investimentos avultados, tendo toda a sua atividade ali sediada; - Mais uma vez os Réus interpelaram verbalmente a Autora, não tendo tido qualquer resposta. - Atento o agravar da situação consultaram novamente o processo na Câmara, tendo constatado que ... ponto 40.º dos factos provados. - Verificaram as Rés ser impossível dar satisfação à exigência do seu principal cliente que representava cerca de 85% da faturação global da sociedade Ré; - Atenta a postura anterior assumida pela Autora, e para evitar a paralisação quase total da atividade por falta de encomendas, os Réus começaram a procurar novas instalações para trabalhar; - Pois se continuasse nas instalações perderia o maior cliente; - Atenta a crise existente no sector dificilmente seria possível angariar clientes para o mesmo volume de faturação no curto prazo; - Os Réus não tinham condições para continuar a laborar e cumprir com as respetivas obrigações se a faturação ficasse reduzida a pouco mais de um décimo. - Destes factos foi dado conhecimento à D.ª Manuela …, pelo menos no mês de Setembro de 2008; - A licença n.º 685 enviada pela Autora à primeira Ré apenas titula parte das instalações, existindo obras não licenciadas; - No ponto 51.º deve ser retirada a data de 3 de Outubro de 2008, e substituída pela expressão durante o mês de Outubro. - A Ré porque não pretendia continuar na posse das chaves, tentou fazer a entrega das mesmas nas instalações da Autora, o que não foi possível, uma vez que as mesmas se encontravam encerradas; - Atenta a impossibilidade de entrega, as chaves foram enviadas pelo correio registado para a sede da Autora, em 10 de Dezembro de 2008, que as recebeu nessa data. - Os Réus viram-se confrontados com a necessidade de, num curtíssimo prazo deslocalizar a atividade industrial, sob pena de não poderem continuar a laborar, como consequência da perda do maior cliente; - Facto que causou grande angústia e danos na imagem da 1.ª Ré perante clientes. - A Autora nunca forneceu à 1.ª Ré, os documentos juntos com a contestação e que estão em nome da sociedade "F… Têxteis, Lda".
34 - Em face desta factualidade é manifesto que ficou provado que os fundamentos invocados pelos Réus como causa da resolução operada não eram do conhecimento dos mesmos à data da celebração do contrato, só tendo advindo ao seu conhecimento muito mais tarde, em data próxima da comunicação efetuada, Impondo-se pois conclusão oposta à que consta da Sentença ora em crise, ou seja, a verdade é que os Réus, aqui Recorrentes foram induzidos em ERRO pela Autora, que lhes forneceu copia da licença sem qualquer explicação, fazendo crer que tudo estava regularizado, e criando na Ré a legitima expectativa de vir a obter a Licença de exploração para a atividade que se propunha exercer, facto pelo qual contratou até um Gabinete especializado para o efeito, o que está provado nos Autos.
35 - Contrariamente pois ao que consta da Sentença, tem pois de concluir-se que a sociedade Ré, aqui Apelante cumpriu com as obrigações contratualmente assumidas, contratou até um gabinete especializado para dar início ao processo de obtenção da licença de exploração do estabelecimento industrial,não sendo correta a extrapolação simples e direta retirada de tal facto que leva à conclusão por parte do Tribunal no sentido de que tal comportamento (Contratar um gabinete especializado para diligenciar pela obtenção da licença de exploração) revelaria, e muito menos "necessariamente" que a Ré teria assumido ainda a obrigação de regularizar os vícios da "Licença de utilização" do imóvel e todos os demais que viessem a ocorrer, ficando a Autora, que era a arrendatária, totalmente desonerada de tais obrigações, o que aliás seria manifestamente desproporcional.
36 -Acresce que, nos termos previstos no artigo 19.º do Decreto-Regulamentar n.º 8/2003, de 11/04, alterado e republicado pelo DL n.º 61/2007, de 9/05, a existência de licença de utilização, exigível pelo DL 555/99 de 16/12, alterado e republicado pela Lei n.º 60/2007, de 04/09, é imprescindível para a emissão de licença de exploração ao estabelecimento industrial.
37 - Sendo manifesto que a obrigação de regularização da licença de utilização não é, nem pode ser dos Réus, pois quem tem legitimidade para requerer a licença de utilização e posteriores alterações é apenas e só o proprietário do imóvel, não tendo os Réus, Recorrentes legitimidade na qualidade de meros cessionários (não sendo sequer os arrendatários) para praticar atos ou requerer o que quer que seja no processo de licenciamento do imóvel onde funcionava o estabelecimento industrial, e muito menos para demolir obras ilegais, o que no caso seria necessário fazer,se verifica a impossibilidade de obtenção de licença de exploração não pode ser imputada aos mesmos.
38 - Assim, verificando-se, como se verificou a impossibilidade supra referida, que é da exclusiva responsabilidade da Autora, é certo que os Réus foram forçados a rescindir o contrato de cessão de exploração e transferir a atividade para novas instalações, tudo num curtíssimo espaço de tempo, sendo que, o facto de o contrato ter data anterior à data da l.ª carta enviada pela Ré á Autora, não tem, salvo melhor opinião, qualquer relevância, e muito menos a que lhe vem atribuída na Sentença ora em crise, não representado qualquer abuso de direito, pelo contrário, como as Testemunhas explicaram e consta dos depoimentos, a carta só foi enviada quando a situação se extremou, deixou de haver dialogo, e se gorou a expectativa de poder resolver a situação por acordo.
39 - Só após terem um local onde laborar, garantindo a manutenção da fábrica a laborar sem qualquer consequência para os clientes, trabalhadores e todas as partes envolvidas, é que os Réus, porque já não restava qualquer alternativa, até porque a Autora se remetia ao mais completo silêncio querendo continuar a ignorar a existência de um problema grave, que era a impossibilidade de obter a licença de exploração atentos os vícios da licença de utilização, foram os Réus forçados a fazer uma comunicação de resolução por escrito, sendo que, antes disso ocorreram diversas comunicações verbais entre as partes.
40 - Acresce que, a procura de instalações só se iniciou quando se tornou evidente que a Autora não resolveria os problemas existentes e que nada mais restaria do que resolver o contrato (como resulta nomeadamente dos depoimentos das Testemunhas Francisco …, Domingos … e Eugénio …), e só quando já estavam goradas todas as possibilidades de resolução da questão, encontrando-se como referiram as testemunhas "entre a espada e a parede" é que os Réus se viram forçados a mudar de atuação e usar a comunicação forma" por escrito, como meio de comunicação com a Autora, e, contrariamente ao que consta da Sentença, foi a Autora quem, com manifesta má-fé, recusou até o recebimento das chaves, sendo certo que está na posse das mesmas desde Dezembro de 2008.
41 - A Ré perdeu legitimamente o interesse na manutenção do contrato, atentos os factos que não podem deixar de ser julgados provados, mais se verificando que foi a Autora quem incumpriu de forma definitiva e culposa com as respetivas obrigações, sendo a única e exclusiva responsável pela necessidade que os Réus tiveram de mudar de instalações, como mudaram, causando assim graves prejuízos aos réus os quais se encontram provados documentalmente nos presentes Autos.
42 - Uma análise criteriosa da prova produzida não pode pois deixar de concluir que a haver má-fé, tem que ser imputada à Autora que (ela sim com perfeito conhecimento de todos os factos, e conhecedora da existência de obras não licenciadas que a mesma construiu) se permitiu celebrar o contrato de cessão de exploração ocultando aos Réus a existência de obras ilegais, e continuando a ocultar tal facto durante a execução do contrato e mesmo durante os presentes Autos permitindo-se até juntar documentos com o objetivo único de criar a aparência de um direito que bem sabia não existir.
43 - Atento o que, operadas as alterações propostas à decisão sobre a matéria de facto, por se demonstrarem mais consentâneas com a globalidade da prova produzida necessariamente terá de concluir-se a final que, no caso em apreço, está justificada a resolução operada pelos Réus, atenta a perda de interesse dos mesmos na continuação da relação contratual, por estar definitivamente posto em causa o fim a que o contrato se propunha, o qual se veio a demonstrar impossível.
SEM CONCEDER,
44 - E, se assim se não entender, o que por mera cautela de patrocínio se concebe, o certo é que, contrariamente ao que consta da Sentença ora em crise, no caso em apreço verifica-se a impossibilidade objetiva do contrato de cessão de exploração, nos termos previstos no n.º 1 do Artigo 280.º do Código Civil, sendo que a apreciação feita na Sentença no que a esta questão respeita peca, salvo melhor opinião, por não apreciar a questão na sua globalidade.
45 - Embora seja correto que para haver cessão de exploração de um estabelecimento basta a existência do núcleo central do mesmo, o certo é que no caso em apreço estamos perante um estabelecimento industrial a laborar em instalações arrendadas.- Cfr. Facto provado n.º 2.º
46 - O direito ao arrendamento é um elemento essencial do estabelecimento objeto do contrato de cessão de exploração, pelo que tendo ficado provado que inexiste licença de utilização válida para o imóvel dado de arrendamento,o contrato de arrendamento celebrado entre o proprietário do imóvel onde labora o estabelecimento e a cedente do contrato de cessão de exploração (aqui Recorrida) é nulo, atento o disposto no Artigo 1070.º do Código Cível e nos artigos 2º, alínea d], e Sº, em especial número 8, do DL nº 160/2006, de 8 de Agosto, e, em consequência o contrato de cessão de exploração enferma também de nulidade, que no caso concreto tem como consequência necessária a impossibilidade objetiva da prestação incluída no contrato de cessão de exploração, uma vez que o cedente não dispõe de qualquer título válido para fruição ou utilização do imóvel onde se situa o estabelecimento industrial, em nada relevando o facto de o mesmo ter estado a ser explorado durante algum tempo pela ré aqui Apelante.
47 - A nulidade do contrato de arrendamento acarreta necessariamente a nulidade do contrato de cessão de exploração, uma vez que este contrato assenta no direito do cedente ao arrendamento, verificando-se que o Tribunal na Sentença proferida deixa subentendido que se tratasse de uma cessão de exploração de um estabelecimento de restauração e bebidas teria que se considerar existir uma impossibilidade objetiva, não poderia o Tribunal deixar de concluir que no caso em apreço situação análoga se verifica, concluindo pela nulidade do contrato, até porque tal nulidade é do conhecimento oficioso do Tribunal, e como tal deve ser declarada.
48 - A Sentença ora recorrida fez pois uma errada apreciação da prova produzida nos autos, estando verificada uma verdadeira omissão de pronúncia, tal como previsto na alínea d) do n.2 1 do Artigo 668.2 do cpc.
49 - O Tribunal a quo violou ainda o disposto no Artigo 515.2 e 516.2 do c.P.C, ao não tomar em consideração toda a prova produzida nos autos, valorando-a de forma incorreta, mormente nos termos do disposto nos Artigos 236.2 e seguintes e 362.2 e seguintes do Código Civil.
50 - Acresce que, em razão da prova produzida, na Sentença proferida foi ainda violado o disposto no n.2 2 Art.2 653.2, o n.2 2 do Art.2 490.2 e Art.2 567.2, do c.P.C, uma vez que o Tribunal a quo, ao julgar a matéria de facto, não procedeu à análise crítica de toda a prova carreada para os Autos, mormente da prova testemunhal gravada em sede de Audiência de Discussão e Julgamento.
51 - A Sentença proferida deve pois revogada e substituída por outra que julgue improcedente por não provado o pedido formulado pela Autora, julgando procedente por provada a exceção deduzida pelos Réus na contestação apresentada, e, em consequência absolva os Réus do Pedido, e em consequência julgue procedente por provado o Pedido Reconvencional, condenando a Autora nos exatos termos peticionados.
III
Fundamentação:
Além da nulidade da sentença, as questões colocadas pelos apelantes prendem-se com a impugnação da decisão sobre a matéria de facto -pretendem que seja substituída por outra que julgue não provados os factos das alíneas a), sem qualquer limitação, b), u), v), x) - pontos 19.º, 51.º, 60.º, 61, 62.º, 63.º, 64.º, 65.º, 67.º, 75.º, 77.º, dos factos provados - e provados os factos constantes da Base Instrutória, sob as alíneas c), d) –artigos 12º e 13º da contestação-, e), f)- artigos 15, 16, 17 e 18, 1ª parte, da contestação- g), h), j)- artigos 25º, 26º, 29º, 30º, 31º e 32º da contestação-, l)-artigos 36º e 37º na totalidade, 39º e 40º da contestação- m), sem restrições, n), o), p)- artigo 56º da contestação-,q) -art. 68.º, 69.º, 70 e 71.º da contestação-, r) -artigo 95.º da Contestação-, s) ad) e ae)- e, as que versam matéria de direito, com a resolução do contrato de cessão de exploração por parte dos cessionários - dizem os recorrentes que é legítima a resolução comunicada pela cessionária à cedente – e, para o caso de assim não se entender, sustentam que há uma impossibilidade originária do contrato de cessão de exploração por estar ferido de nulidade, por aplicação dos normativos dos artigos 1070º e 280º, do C.C, e 2º, d), e 5º, do DL 160/06, de 08.08, e concluem ainda pela procedência da reconvenção.



A/. Os apelantes invocam a nulidade da sentença com fundamento no nº1, alínea d), do artigo 668º do C.P.C., por omissão de pronúncia sobre a nulidade do contrato de cessão de exploração. Mas não têm razão, já que essa questão não foi colocada nos articulados ou, sequer, no decorrer da audiência de discussão e julgamento, e assim sendo só persistiria a nulidade da sentença se existisse o referido vício contratual e dele o tribunal não tivesse conhecido, o que não é o caso. É no entanto um assunto que retomaremos mais à frente, quando tivermos que analisar a alegada impossibilidade originária do contrato.
B/ Impugnando a decisão sobre a matéria de facto, reclamam a alteração das respostas dadas às alíneas a), b), u), v) e x) da base instrutória, ou seja, que se considerem não provados os factos indicados na sentença nos pontos 19.º (A primeira Ré, sem que previamente tivesse efectuado, expressa ou tacitamente, qualquer declaração de resolução do contrato ou de denúncia nos termos contratuais, em 3 de Outubro de 2008 saiu das instalações do estabelecimento industrial em causa, daí retirando diverso equipamento industrial da sua pertença, aí deixando de laborar e não mais exercendo a sua actividade industrial de lavandaria, tendo encerrado as suas portas, deslocou todo o equipamento que lhe pertencia, tendo-o transferido para outras instalações sitas no lugar de Anta, freguesia de Cavalões, concelho de Vila Nova de Famalicão, e deixou de pagar a prestação que se vencia a 1 de Outubro de 2008, no montante de 12.500 €, acrescido de IVA, e que se reportava ao mês de Novembro do mesmo ano, mantendo, nessa altura, na sua posse, as chaves do prédio em causa), 51.º (A 1ª Ré utilizou até ao dia 3 de Outubro de 2008 as instalações cedidas pela Autora), 60.º (Em Abril de 2006, manifestou a Ré, na pessoa do seu gerente, interesse em adquirir, a título provisório, a exploração do estabelecimento comercial então gerido pela A., 61 (No seguimento desse primeiro contacto, e após uma primeira visita às instalações, a ré, sempre através do réu Francisco José, por diversas vezes analisou as instalações fabris e o equipamento existente, tendo assim, oportunidade de aferir das suas condições de funcionamento), 62.º (Inclusivamente, e a partir de Junho de 2006, passou o Réu Francisco José a comparecer, quase diariamente, nas ditas instalações, acompanhando o desempenho dos funcionários que aí laboravam e assistindo ao funcionamento e laboração de todas as máquinas e equipamentos, 63.º (A partir desse referido mês, passou inclusivamente a Ré, a utilizar tais equipamentos, para aí fazer amostras tendo em vista a elaboração das “colecções de lavagens”), 64.º (Nessa altura, teve a Ré oportunidade de conhecer todo o equipamento existente, as suas condições de funcionamento e as anomalias que, porventura ocorressem), 65.º (no que concerne às duas caldeiras existentes, as mesmas tinham sido já analisadas e verificadas pela Ré, pelos menos em Junho de 2006), 67.º (Tal circunstância, era, assim, do perfeito conhecimento da Ré), 75.º (Durante os dois anos em que se manteve a explorar o estabelecimento industrial, nunca esta reclamou, por escrito, junto da A. da existência de qualquer desconformidade, nem nunca solicitou qualquer documento ou elemento porventura em falta), e 77.º (Com base em tal fundamento ou motivo, não ficou a Ré impedida de laborar).




(…).



Considera-se assim estabilizada a seguinte matéria de facto:
1º É a Autora dona, senhora e legítima possuidora de um estabelecimento industrial de lavandaria, instalado em prédio urbano constituído por dois pavilhões industriais sitos no lugar de Mirão, freguesia de Vilela, concelho da Póvoa de Lanhoso;
2º O referido prédio urbano onde se encontra instalado o invocado estabelecimento industrial, é trazido de arrendamento a uma sociedade comercial denominada “ G… – Imobiliária, Lda”, dona e possuidora do invocado prédio urbano;
3º Entre a Autora, na qualidade de titular do estabelecimento industrial de lavandaria, e a Ré denominada “C…” foi ajustado e reduzido a escrito contrato, em 29.08.06, contrato esse que as partes denominaram como contrato de cessão de exploração;
4º Por força do referido contrato de cessão de exploração, a A. cedeu então à Ré “C…, Lda” a exploração do invocado estabelecimento industrial, cessão de exploração que teve o seu inicio a 1 de Outubro de 2006, ajustada pelo prazo de dois anos, renováveis por iguais períodos de tempo;
5º Conforme foi convencionado pelas partes como contrapartida pela cessão de exploração, obrigou-se a 1ª Ré a pagar à autora a quantia de € 303.000,00 acrescida do respectivo IVA em vigor à data de pagamento de qualquer uma das prestações, a der pago pela segunda Ré à Autora, em vinte e quatro prestações mensais e sucessivas: as primeiras doze prestações alcançavam o valor unitário e mensal de € 12.500,00 acrescido do IVA e as segundas doze prestações alcançariam o valor mensal e unitário de € 12.750,00 cada;
6º Ainda de acordo com o convencionado entre as partes, as prestações acima referidas deveriam ser pagas pela primeira Ré, no primeiro dia útil do mês anterior aquele a que dissesse respeito, e conforme a cláusula quinta, o contrato de cessão de exploração renovar-se-ia por prazos sucessivos de dois anos, salvo se qualquer das partes o denunciasse, por escrito através do envio de carta registada, com a antecedência mínima de seis meses em relação a cada um dos seus termos;
7º. Ficou também estabelecido entre os outorgantes que por força da cessão de exploração convencionada, a primeira Ré utilizaria os pavilhões identificados pelas letras “A” e “B”, a Etar, o reservatório de água e parte do logradouro pertencente ao prédio, tudo de acordo com planta topográfica que se fez juntar ao contrato e que do mesmo ficou a fazer parte integrante;
8º-No referido contrato, ficou ainda estipulado na cláusula 13ª que a falta de pagamento atempado de qualquer umas das prestações referidas determinaria o vencimento total do preço devido pela cessão de exploração, sem prejuízo do direito de resolução motivado em incumprimento contratual;
9º De igual modo, ficou convencionado no contrato de cessão de exploração, que os segundos RR., se assumiriam como fiadores e desta forma, com plenitude e sem benefício de excussão prévia, se responsabilizavam, na dita qualidade de fiadores e principais pagadores, pelas responsabilidades decorrentes do cumprimento ou incumprimento do contrato, mantendo-se a fiança, não só no período inicial da cessão de exploração, como também nas eventuais e sucessivas renovações. A partir de 01/10/2006 a R. passou a realizar a lavagem de material têxtil para os seus clientes;
10º Os 2ºs e 3ºs RR. assumiram a qualidade de fiadores nos precisos termos clausulados;
11º Antes ainda de reduzir a escrito, o contrato de cessão de exploração em apreço nos autos, ocorreram diversos contactos preliminares entre A e a Ré, e concretamente, com o Réu D…;
12º. Esse representante legal da C…, a partir de Junho de 2006 visitou por diversas vezes as instalações da B…, acompanhando o desempenho dos funcionários que aí laboravam, assistindo ao funcionamento e laboração de todas as máquinas e equipamentos, tendo então a oportunidade de conhecer todo o equipamento existente e de aferir as suas condições de funcionamento, designadamente as duas caldeiras, suas condições de funcionamento e anomalias;
13º. Uma das caldeiras encontrava-se em manutenção, encontrando-se o queimador da caldeira grande desmontado, encontrando-se, por seu turno, o motor no electricista, a fim de serem mudados os rolamentos;
14º Tal circunstância era do perfeito conhecimento da Ré.
15º Tal caldeira grande possuía a autorização prévia de funcionamento e instalação invocada pela Ré. No que concerne à outra caldeira encontrava-se a mesma em plenas condições de funcionamento, e inclusivamente a laborar, faltando à mesma um documento do respectivo fabricante - a autora não desconhecia esse facto e que as caldeiras eram imprescindíveis para a laboração de um estabelecimento industrial de lavandaria - e relativamente a essa circunstância nunca a ré levantou qualquer objecção por escrito;
16º. A ré aceitou os equipamentos no estado em que se encontravam;
17º. A 1ª Ré reparou a caldeira que se encontrava desmontada, fez intervenção na linha de vapor e colmatou a situação referida da falta de documento emitido pelo fabricante duma das caldeiras, sendo o referido equipamento imprescindível ao funcionamento de uma unidade industrial de lavandaria;
18º. A linha de vapor de água do estabelecimento industrial foi intervencionada e a ré suportou o respectivo custo.
19º. Foi celebrado um protocolo com a empresa Águas do Ave, S.A. relativo à utilização de recursos do domínio público hídrico;
20º. A propósito das instalações eléctricas, o edifício onde decorreu a exploração mencionada nestes autos, possuía dois postos de transformação. Atendendo à capacidade instalada e às necessidades dos equipamentos fabris em funcionamento, bastaria um só posto de transformação para assegurar a normal laboração do estabelecimento industrial em apreço;
21º. Durante os dois anos em que se manteve a explorar o estabelecimento industrial, por escrito nunca a ré reclamou junto da A. da existência de qualquer desconformidade, nem nunca solicitou qualquer documento ou elemento porventura em falta;
22º A caldeira pequena funcionou durante todo o período em que vigorou a cessão de exploração e a caldeira grande funcionou desde a sua reparação até final da dita cessão. 23º. Com base nas anomalias das caldeiras não ficou a Ré impedida de laborar;
24ºº O processo para obtenção de licença de exploração nas instalações em causa requerido, junto do Ministério da Economia, pela F… - Têxteis e Acabamentos L.da, não estava finalizado por incumprimento das imposições constantes do documento junto a fls. 211 e referentes à instalação eléctrica do prédio referido em 1º.
25º Após verificação das irregularidades existentes, a 1.ª Ré contratou um gabinete especializado para dar início aos processos de licenciamento e regularização de tudo em falta e imprescindível ao legal funcionamento da unidade industrial, contratação que ocorreu em 06.09.2006;
26º No âmbito desse processo foi solicitada junto da Câmara Municipal da Póvoa de Lanhoso, para efeito de organização do respectivo processo de licenciamento industrial, a competente autorização de localização.
27º Autorização que foi emitida em 2/11/07, constando expressamente da mesma que “Para o local foi licenciado o processo de obras n.º 230/88, um estabelecimento industrial destinado a indústria de confecção têxtil e acabamentos, verificando-se a existência de alterações ao projecto inicial não licenciadas que carecem de licenciamento” (Resposta à alínea j) – no que respeita ao artigo 28º da contestação – da Base Instrutória);
28º Em data anterior à da celebração do contrato tinham sido efectuadas obras nos pavilhões onde está instalado o estabelecimento industrial, obras essas que, à data da contestação, não se encontravam devidamente licenciadas junto da Câmara Municipal da Póvoa de Lanhoso.
29º. À data da celebração do contrato, ou durante os contactos preliminares, a autora não informou a ré que tinham sido efectuadas obras nos pavilhões onde está instalado o estabelecimento industrial, obras essas que, à data da contestação, não se encontravam devidamente licenciadas junto da Câmara Municipal da Póvoa de Lanhoso»;
30º Posteriormente, em 10 de Julho de 2008, foi a 1.ª Ré, interpelada por escrito pelo seu maior Cliente (quer em quantidade, quer em volume de facturação), o qual a informou que para continuar a colocar encomendas exigia lhe fosse fornecida a licença de exploração da unidade industrial.
31º Atentos os problemas havidos em Portugal com outros fornecedores, aquele Cliente passou a exigir aos respectivos fornecedores prova da capacidade de produção e cumprimento dos prazos, designadamente exigindo prova de situação legal junto da entidade licenciadora da actividade industrial.
32º Do processo de licenciamento consta o descrito a fls. 308, nomeadamente: - Após a emissão da licença de utilização nº 685/1994, a F… Têxteis L.da (sociedade que requereu a licença inicial) apresentou em 19.02.1998 pedido de legalização das alterações introduzidas nas suas instalações, pedido este que foi deferido em 11.05.1998; - A requerente deixou caducar o despacho emitido em 11.05.1998, por não ter requerido a respectiva licença no prazo legalmente estabelecido; - Em 02.03.2000 a requerente apresentou novo pedido a solicitar a reapreciação do processo por ter deixado caducar o despacho de 11.05.1998, com novas alterações ao projecto de arquitectura; - Em 29.10.2001, foi deferido o projecto de alterações à arquitectura, devendo a requerente dar cumprimento às condições técnicas impostas pelos serviços técnicos da Câmara Municipal; - Em 29 de Outubro de 2001, a requerente apresentou os projectos de especialidade para serem apreciados; - Em 18.10.2002, a requerente foi notificada para apresentar elementos escritos e desenhados relativos às ditas alterações, o que a mesma não fez; - Em 13.07.2005, foi-lhe enviado um ofício a comunicar que deveria proceder à apresentação de elementos em falta, estabelecendo para tal o prazo de 30 dias; - Até 18.03.2011 não foram anexos ao processo novos elementos);
33º. Não era possível, no curto prazo, obter a necessária licença de exploração do estabelecimento industrial. A ré, apesar de em 13.02.2008 ter conhecido as concretas dificuldades em licenciar a exploração (data em que L.P.I. deu por concluídos, sem êxito, os serviços), e que não era contornar as dificuldades a curto prazo, continuou a laborar no estabelecimento industrial objecto da cessão de exploração, até em função dos investimentos já efectuados;
34º A 1.ª Ré teve conhecimento do facto de existir um estabelecimento de lavandaria em Famalicão, propriedade de uma sociedade que atravessava um período de graves dificuldades económico financeiras, a qual estaria na disponibilidade de ceder de imediato a exploração do mesmo;
35º Esse estabelecimento encontrava-se devidamente equipado, e a laborar, dispondo de licenciamento industrial;
36º A sociedade proprietária do mesmo, porque não tinha condições de assegurar a laboração, estava na disponibilidade de ceder de imediato a respectiva utilização;
37º Atento o que, após um curto período de negociações, a 1.ª Ré, em finais de Setembro de 2008, decidiu celebrar um contrato de cessão de exploração com aquela sociedade, com início no dia 1 de Outubro de 2008;
38º - Sem que previamente tivesse efectuado, expressa ou tacitamente, qualquer declaração de denúncia do contrato nos termos contratuais, a primeira Ré, em 3 de Outubro de 2008, saiu das instalações do estabelecimento industrial em causa, daí retirando diverso equipamento industrial da sua pertença, aí deixando de laborar e não mais exercendo a sua actividade industrial de lavandaria, tendo encerrado as suas portas, deslocou todo o equipamento que lhe pertencia, tendo-o transferido para outras instalações sitas no lugar de Anta-Cavalões, concelho de Vila Nova de Famalicão, e deixou de pagar a prestação que se vencia a 1 de Outubro de 2008, no montante de 12.500 €, acrescido de IVA, e que se reportava ao mês de Novembro do mesmo ano, mantendo, nessa altura, na sua posse, as chaves do prédio em causa;
39º Pouco antes, um dos funcionários da Ré, de nome Domingos, não descartou a hipótese de a Ré adquirir a título definitivo o estabelecimento comercial em causa
40º. A Ré enviou à Autora uma carta, que esta recebeu em 06.10.08, com o seguinte teor: “Como sabem temos pendente um processo de licenciamento industrial do estabelecimento cuja exploração nos foi contratualmente cedida, sendo que, na pendência desse processo, tivemos conhecimento que inexiste licença de utilização de parte dos pavilhões onde está instalada a unidade industrial; após diligências várias, fomos informados que não está sequer pendente qualquer processo de licenciamento junto da Câmara Municipal de forma a regularizar a situação; Tal circunstância inviabiliza a possibilidade de obtenção de licenciamento industrial no curto prazo, podendo causar graves prejuízos à nossa empresa, existindo até o risco de vermos as instalações encerradas pelo Ministério da Economia ou pela Câmara Municipal da Póvoa de Lanhoso, e as encomendas canceladas pelos Clientes; Atento o que antecede, informamos que, se no prazo de 8 dias não nos for entregue comprovativo da licença de utilização dos pavilhões nos reservamos o direito de resolver o contrato de cessão de exploração com justa causa” (docs de fls. 65 e 66);
41º. Em 7 de Outubro de 2008, a Autora respondeu à referida carta com uma outra do seguinte teor: “…entendemos ilegítima e ilegal a invocada resolução do contrato de cessão de exploração por incumprimento, atendendo à falta de fundamento para tal cessação contratual. Deste modo, aproveitamos para vos alertar que não prescindiremos dos nossos direitos (…)” “De qualquer modo, enviamos em anexo cópia da licença de utilização emitida pela Câmara Municipal” (documento de fls. 67);
42º Em anexo a esta carta, a Autora enviou o alvará de licença nº 685, em nome da Antar, junto a fls. 68, cujo teor integral se dá aqui por reproduzido (doc. de fls. 67 e 68);
43º Datada de 10.10.08, a Autora enviou à Ré uma outra carta, com, para além do mais, o seguinte teor: “(…) é com notória estupefacção que somos agora confrontados com o abandono injustificado e inopinado do estabelecimento industrial cuja exploração vos havíamos cedido.” (documento de fls. 69);
44º Com data de 24.10.2008, a Ré enviou uma carta à Autora, carta que esta recebeu em 06.11.2008, com o seguinte teor: “Como sabem, a licença com o nº 685 que nos enviaram apenas respeita a parte dos pavilhões existentes, não resultando da licença sequer a identificação concreta de quais. Além do que a referida licença respeita a licenciamento de actividade diversa da que foi objecto da cedência de exploração. Da análise da referida licença resulta pois comprovado que V.Ex.as nunca agiram com a diligência mínima exigível, revelando até manifesta má-fé, uma vez que temos conhecimento que a Câmara Municipal da Póvoa de Lanhoso não aprovou as obras realizadas no local, designadamente nos pavilhões que estávamos a ocupar, tendo inclusivamente intimado o proprietário dos pavilhões para proceder à legalização das mesmas, sendo que, até à presente data, ainda não foi sequer apresentado requerimento nesse sentido; Neste cenário, torna-se evidente que o processo de licenciamento industrial nunca poderia ser aprovado, e nunca o poderá ser no curto prazo, apesar de termos cumprido com todas as obrigações que nos foram sendo exigidas. Acresce que, recentemente, um dos nossos maiores Clientes passou a exigir, como condição para continuar a colocar encomendas, a prova do licenciamento industrial, atento o que, tendo conhecimento da dificuldade de obtenção da mesma fomos forçados a tomar a decisão de mudança das instalações, isto por forma a garantir a continuação de colocação das encomendas e a manutenção da nossa empresa em laboração. Reiteramos que esta decisão apenas foi tomada depois de termos verificado inexistir junto da Câmara Municipal qualquer processo de licenciamento pendente. (…) Atento o que antecede, consideramos o contrato resolvido com justa causa, estando disponíveis para fazer a entrega das instalações de imediato, ficando apenas a aguardar nos informem qual o dia e hora em que o pretendem fazer” (docs de fls. 70/71 e 72);
45º A A. não respondeu à última carta enviada pela R. junta como documento nº 4.
46º A Ré manteve os postos de trabalho de todos os empregados ao serviço da mesma.
47º A Ré suportou o custo da deslocalização da actividade, designadamente transporte de equipamentos, o custo suportado com a deslocação dos trabalhadores e demais custos administrativos da mudança -mudança de telefone e todo o economato da empresa.
48º Além do que, a 1.ª R. foi ainda confrontada com um conflito laboral motivado pela mudança de instalações, pois treze dos trabalhadores da empresa não aceitaram ir trabalhar para as novas instalações, tendo rescindido os respectivos contratos de trabalho e instaurado acções junto do Tribunal de Trabalho de Braga.
49º A 1ª Ré continuou a laborar com a maioria dos seus trabalhadores.
50º Por outro lado, todos os equipamentos objecto do contrato de cessão de exploração junto aos Autos pela Autora continuam nas instalações, de onde nunca saíram, à disposição da Autora, uma vez que a mesma não aceitou a entrega comunicada pela 1.ª Ré.
51º A Ré suportou com os processos de licenciamento a quantia de 6.050 € e, depois do referido em 19º, requereu o cancelamento dos processos que se encontravam em curso.
52º A 1.ª Ré teve ainda que suportar os custos da reparação da única caldeira existente no estabelecimento industrial com autorização para laborar, a quantia de € 16.890,61.
53º Bem como os custos com as despesas com o tratamento de águas residuais, no montante de € 36.300,00.
54º A Ré suportou as despesas com a intervenção efectuada nas linhas de água e vapor, no montante de 32.436,14 €.
55º A Ré teve que suportar despesas com a respectiva deslocação que ascenderam a 20.829,06€.
56º À data da contestação, a 1ª Ré estava a suportar o custo do transporte dos trabalhadores da Póvoa de Lanhoso para as actuais instalações sitas em Famalicão.
57º. A renda relativa a Out/08 e vencida em Set/08 foi paga pela primeira R. à A.
58º Durante o período de dois anos, contados desde Outubro de 2006, os Réus nunca apresentaram à Autora reclamação escrita relativamente a qualquer questão relacionada com o cumprimento do contrato e laboração efectiva.
59º A autora tinha captações de água através de furo e captações de água no rio.



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C/.1. Por contrato escrito celebrado em 29 de Agosto de 2006, a sociedade comercial B…, Lda, pelo prazo de 2 anos (com início em 01.10.2006 e termo em 30.09.2008, renovando-se por iguais e sucessivos períodos de dois anos, salvo denúncia de qualquer das partes com a antecedência mínima de 6 meses), mediante o preço de 303.000€ (pago em 24 prestações, a 1ª à 12ª no valor de 12.500€ e a 13ª à 24ª, no valor de 12.750€, prevendo-se que a falta de pagamento de qualquer uma das prestações determinaria o vencimento total do preço devido), cedeu à ré sociedade C…, Lda, a exploração do estabelecimento industrial de lavandaria instalado num prédio urbano por si tomado de arrendamento em 1 de Outubro de 2002 (conforme documento escrito anexo ao contrato), com a utilização pela cessionária dos pavilhões “A” e “B” do imóvel, reservatório de água, todos os móveis, equipamentos e utensílios existentes no estabelecimento.
Esse enunciado factual autoriza que se considere como correcta a qualificação jurídica atribuída na sentença recorrida - cessão de exploração comercial (não obstante o artigo 1109º do Código Civil, na redacção introduzida pelo artigo 3º da Lei 6/2006, de 01 de Fevereiro, acabando com a controvérsia à volta da necessidade ou não de ser comunicada ao senhorio a cessão de estabelecimento instalado em prédio arrendado, o ter designado de locação de estabelecimento), contrato de execução continuada subtraído ao regime vinculístico do arrendamento urbano [1].
2. Quando foi celebrado o contrato (29 de Agosto de 2006), ou na data prevista para o início da sua vigência (1 de Outubro de 2006), não existia dispositivo legal que fizesse depender a validade da cessão de exploração industrial da existência e comprovação ab initio da licença de utilização do imóvel ou doutras condicionantes. Existia sim um regime disciplinador da actividade industrial e da atribuição da respectiva licença, cuja inobservância fazia incorrer os seus agentes em contra-ordenação, com aplicação de coimas e sanções acessórias, entre elas o encerramento do estabelecimento e instalações (cfr. Artigos 21º e 22º do DL 69/2003, de 10.04, Decreto Regulamentar 8/2003, de 11.04), mas não interferia com a validade do contrato de cessão de exploração - para melhor se elucidar essa asserção, podemos evocar um contrato de empreitada de imóveis a construir em loteamento ainda não aprovado: essa circunstância tornava nulo o contrato de empreitada ou constituía apenas uma condicionante à sua execução, que a ser efectivada poderia ser objecto de embargo e de demolição?-.

Mas sempre se observa que o RAU aprovado pelo DL 321-B/90, de 15 de Outubro (o aplicável ao aludido contrato de arrendamento celebrado em 1 de Outubro de 2002, e aditamento de 1 de fevereiro de 2006, nos termos do artigo 12º do Código Civil), não cominava de nulidade os contratos de arrendamento urbano por falta de menção da licença de utilização do locado, antes sujeitava o senhorio a uma coima se o incumprimento lhe fosse imputável, e facultava ao locatário a resolução do contrato, com direito a indemnização nos termos gerais, e é aliás o que veio a ser consagrado nos artigos 2º,d), e 5º, do DL 160/2006, de 8.08 [2].


3. Acabámos de expor razões bastantes para se afirmar a improcedência da nulidade invocada nos termos e para os efeitos do artigo 280º, nº1, do Código Civil, o mesmo é dizer que não está verificada a impossibilidade objectiva originária da prestação a que alude o artigo 401, nº1, do Código Civil.
4. A cessionária abordou a questão de ter sido induzida em erro, só que não assentou a sua defesa e a resolução do contrato nos termos do normativo do artigo 437º do Código Civil, regime aplicável ao erro sobre as circunstâncias que constituem a base negocial (artigo 252º, nº2, do Código Civil)[3], e nem sequer alegou que não teria celebrado o contrato em apreço caso tivesse conhecimento da real situação do estabelecimento. Por outro lado, é incontroverso que a ré sabia ter iniciado a sua actividade sem licença de exploração, e que a autora não podia ignorar que a ilegalidade de obras no locado e a falta de licença de utilização inviabilizava a sua obtenção, ou seja, ambos assumiram os riscos dum comportamento contra-ordenacional, com a aplicação de coimas e da sanção acessória do encerramento do estabelecimento por parte das autoridades administrativas.



5. Resta saber se é válida a resolução do contrato por banda da ré sociedade, radicada na conversão da mora na prestação da autora (falta de entrega da licença de utilização do locado para fins industriais) em incumprimento definitivo, nos termos da previsão do artigo 808º do Código Civil (dispõe o nº1 que “se o credor, em consequência da mora, perder o interesse que tinha na prestação, ou esta não for realizada dentro do prazo que razoavelmente for fixada pelo credor, considera-se para todos os efeitos não cumprida a obrigação”, e reza o nº2 que “a perda do interesse na prestação é apreciada objectivamente”).




É pertinente evocar o que em duas cartas a ré sociedade C…, Lda, comunicou à autora B…, Lda, cujo teor está incluído nos factos provados:




«A Ré enviou à Autora uma carta, que esta recebeu em 06.10.08, com o seguinte teor: “Como sabem temos pendente um processo de licenciamento industrial do estabelecimento cuja exploração nos foi contratualmente cedida, sendo que, na pendência desse processo, tivemos conhecimento que inexiste licença de utilização de parte dos pavilhões onde está instalada a unidade industrial. Após diligências várias, fomos informados que não está sequer pendente qualquer processo de licenciamento junto da Câmara Municipal de forma a regularizar a situação. Tal circunstância inviabiliza a possibilidade de obtenção de licenciamento industrial no curto prazo, podendo causar graves prejuízos à nossa empresa, existindo até o risco de vermos as instalações encerradas pelo Ministério da Economia ou pela Câmara Municipal da Póvoa de Lanhoso, e as encomendas canceladas pelos Clientes. Atento o que antecede, informamos que, se no prazo de 8 (oito) dias não nos for entregue comprovativo da licença de utilização dos pavilhões nos reservamos o direito de resolver o contrato de cessão de exploração com justa causa»





«Com data de 24.10.2008, a Ré enviou uma carta à Autora, carta que esta recebeu em 06.11.2008, com o seguinte teor: “Como sabem, a licença com o nº 685 que nos enviaram apenas respeita a parte dos pavilhões existentes, não resultando da licença sequer a identificação concreta de quais. Além do que a referida licença respeita a licenciamento de actividade diversa da que foi objecto da cedência de exploração. Da análise da referida licença resulta pois comprovado que V.Ex.as nunca agiram com a diligência mínima exigível, revelando até manifesta má-fé, uma vez que temos conhecimento que a Câmara Municipal da Póvoa de Lanhoso não aprovou as obras realizadas no local, designadamente nos pavilhões que estávamos a ocupar, tendo inclusivamente intimado o proprietário dos pavilhões para proceder à legalização das mesmas, sendo que, até à presente data, ainda não foi sequer apresentado requerimento nesse sentido. Neste cenário, torna-se evidente que o processo de licenciamento industrial nunca poderia ser aprovado, e nunca o poderá ser no curto prazo, apesar de termos cumprido com todas as obrigações que nos foram sendo exigidas. Acresce que, recentemente, um dos nossos maiores Clientes passou a exigir, como condição para continuar a colocar encomendas, a prova do licenciamento industrial, atento o que, tendo conhecimento da dificuldade de obtenção da mesma fomos forçados a tomar a decisão de mudança das instalações, isto por forma a garantir a continuação de colocação das encomendas e a manutenção da nossa empresa em laboração. Reiteramos que esta decisão apenas foi tomada depois de termos verificado inexistir junto da Câmara Municipal qualquer processo de licenciamento pendente. (…) Atento o que antecede, consideramos o contrato resolvido com justa causa, estando disponíveis para fazer a entrega das instalações de imediato, ficando apenas a aguardar nos informem qual o dia e hora em que o pretendem fazer”.
A primeira comunicação tem a nosso ver todo o aspecto duma interpelação admonitória, visto que a ré fixa à autora o prazo de oito dias para proceder à entrega da licença de utilização dos pavilhões, reservando o direito de resolver o contrato se tal não fosse cumprido, tendo para o efeito alegado as razões da perda do interesse no contrato (“Tal circunstância inviabiliza a possibilidade de obtenção de licenciamento industrial no curto prazo, podendo causar graves prejuízos à nossa empresa, existindo até o risco de vermos as instalações encerradas pelo Ministério da Economia ou pela Câmara Municipal da Póvoa de Lanhoso, e as encomendas canceladas pelos Clientes”). A segunda comunicação concretiza a efectiva resolução por alegada justa causa, enfatizando mais uma vez a impossibilidade de obter em curto prazo a licença de exploração e os prejuízos que daí decorreriam, designadamente a perda dum dos maiores clientes e o risco da continuidade da empresa.
A aludida interpelação pressupunha desde logo, para relevar nos termos do artigo 808º, do CC que o prazo fosse considerado razoável face às circunstâncias apuradas, que não era, considerando que a prestação de facto não dependia exclusivamente do cedente, envolvendo a intervenção de terceiros e da Câmara Municipal de Póvoa de Lanhoso, ou seja, seria um processo moroso. Por outro lado, tal interpelação admonitória deveria ter necessariamente subjacente o interesse do credor na manutenção do contrato [4]. Mas a actuação da ré fazia concluir o contrário, visto que à data já tinha celebrado outro contrato de cessão de exploração e mudou de instalações sem dar tempo de a carta ser recepcionada pela autora (“sem que previamente tivesse efectuado, expressa ou tacitamente, qualquer declaração de denúncia do contrato nos termos contratuais, em 3 de Outubro de 2008 a primeira ré saiu das instalações do estabelecimento industrial em causa, daí retirando diverso equipamento industrial da sua pertença, aí deixando de laborar e não mais exercendo a sua actividade industrial de lavandaria, tendo encerrado as suas portas, deslocou todo o equipamento que lhe pertencia, tendo-o transferido para outras instalações sitas no lugar de Anta, freguesia de Cavalões, concelho de Vila Nova de Famalicão, e deixou de pagar a prestação que se vencia a 1 de Outubro de 2008, no montante de 12.500 €, acrescido de IVA, e que se reportava ao mês de Novembro do mesmo ano, mantendo, nessa altura, na sua posse, as chaves do prédio em causa”)

6. Contudo, isso não significa que não haja fundamentos para a procedência da apelação, na parte em que é pedida a revogação da sentença condenatória dos réus. Vejamos:
Consta do acervo factual provado: “O processo para obtenção de licença de exploração nas instalações em causa requerido, junto do Ministério da Economia, pela F… - Têxteis e Acabamentos L.da, não estava finalizado por incumprimento das imposições constantes do documento junto a fls. 211 e referentes à instalação eléctrica do prédio”; “Após verificação das irregularidades existentes, a 1.ª Ré contratou um gabinete especializado para dar início aos processos de licenciamento e regularização de tudo em falta e imprescindível ao legal funcionamento da unidade industrial, contratação que ocorreu em 06.09.2006”, “No âmbito desse processo foi solicitada junto da Câmara Municipal da Póvoa de Lanhoso, para efeito de organização do respectivo processo de licenciamento industrial, a competente autorização de localização, autorização que foi emitida em 2/11/07, constando expressamente da mesma que “Para o local foi licenciado o processo de obras n.º 230/88, um estabelecimento industrial destinado a indústria de confecção têxtil e acabamentos, verificando-se a existência de alterações ao projecto inicial não licenciadas que carecem de licenciamento”; “Em data anterior à da celebração do contrato tinham sido efectuadas obras nos pavilhões onde está instalado o estabelecimento industrial, obras essas que, à data da contestação, não se encontravam devidamente licenciadas junto da Câmara Municipal da Póvoa de Lanhoso”; “Posteriormente, em 10 de Julho de 2008, foi a 1.ª Ré, interpelada por escrito pelo seu maior Cliente (quer em quantidade, quer em volume de facturação), o qual a informou que para continuar a colocar encomendas exigia lhe fosse fornecida a licença de exploração da unidade industrial. Atentos os problemas havidos em Portugal com outros fornecedores, aquele Cliente passou a exigir aos respectivos fornecedores prova da capacidade de produção e cumprimento dos prazos, designadamente exigindo prova de situação legal junto da entidade licenciadora da actividade industrial”; “Do processo de licenciamento consta o descrito a fls. 308, nomeadamente: - Após a emissão da licença de utilização nº 685/1994, a F… Têxteis L.da (sociedade que requereu a licença inicial) apresentou em 19.02.1998 pedido de legalização das alterações introduzidas nas suas instalações, pedido este que foi deferido em 11.05.1998; - A requerente deixou caducar o despacho emitido em 11.05.1998, por não ter requerido a respectiva licença no prazo legalmente estabelecido; - Em 02.03.2000 a requerente apresentou novo pedido a solicitar a reapreciação do processo por ter deixado caducar o despacho de 11.05.1998, com novas alterações ao projecto de arquitectura; - Em 29.10.2001, foi deferido o projecto de alterações à arquitectura, devendo a requerente dar cumprimento às condições técnicas impostas pelos serviços técnicos da Câmara Municipal; - Em 29 de Outubro de 2001, a requerente apresentou os projectos de especialidade para serem apreciados; - Em 18.10.2002, a requerente foi notificada para apresentar elementos escritos e desenhados relativos às ditas alterações, o que a mesma não fez; - Em 13.07.2005, foi-lhe enviado um ofício a comunicar que deveria proceder à apresentação de elementos em falta, estabelecendo para tal o prazo de 30 dias; - Até 18.03.2011 não foram anexos ao processo novos elementos”; “Não era possível, no curto prazo, obter a necessária licença de exploração do estabelecimento industrial”;



Em primeiro lugar importa dizer que a factualidade descrita não encerra uma absoluta impossibilidade objectiva da execução do contrato[5] - mesmo tendo-se em conta que o incumprimento não deve ser olhado só no plano naturalístico de gozo do estabelecimento e da contraprestação da renda, mas essencialmente num quadro normativo e de legalidade, e a falta de licenciamento não é superveniente ao contrato, o que desde logo afasta a previsão da impossibilidade objectiva a que alude o artigo 790º, nº1, do CPC, embora haja circunstâncias sobrevindas que objectivamente legitimaram a perda de interesse do credor na manutenção do contrato.

Na cessão de exploração em apreço, a autora cedeu, pelo prazo de dois anos (renováveis por iguais períodos, não sendo denunciado com a antecedência de pelo menos 6 meses com referência ao seu termo), o gozo do locado que trazia de arrendamento, com o equipamento que integrava o estabelecimento. A prestação principal a que se vinculou não correspondia exactamente á que constava da interpelação admonitória, só que há deveres acessórios a cumprir[6] em função da boa fé, lealdade e cooperação que deve presidir na formação e execução dos contratos (artigos 227º e 762º, nº2, do Código Civil)[7].
Ora, além de não ter informado a ré sobre as obras não licenciadas, a A. B… violou um dever acessório que estava directamente ligado à prestação principal de cedência do gozo do estabelecimento: sendo a locatária das instalações e cedente da exploração do estabelecimento, deveria entregar e/ou pelo menos colaborar pela obtenção da licença das obras clandestinas herdadas da empresa F…, sem ter de esperar que o cessionário o reclamasse, oralmente ou por escrito, visto que não podia desconhecer que isso constituía condição essencial para o licenciamento da exploração industrial no locado.
A falta de informação e a reiterada falta de colaboração da autora foi, como aliás decorre dos factos provados documentalmente, impeditiva da conclusão com êxito do processo de legalização da exploração industrial, e esse incumprimento presume-se culposo nos termos do artigo 799º, nº1, do Código Civil. Face a essa violação contratual positiva, não era exigível à luz do direito que á ré C…, Lda continuasse vinculada a um contrato de execução ilícita. Batista Machado, a propósito dum caso de resolução de contrato de arrendamento, refere: “A apreciação de uma violação contratual positiva como fundamento de resolução (como justa causa) nestas relações obrigacionais duradouras é feita à luz do conceito de inexigibilidade: pergunta-se se é exigível que o contraente cumpridor continue imperativamente vinculado ao contrato, continue ligado pelo vínculo duradoiro ao contraente infiel, não obstante este, agindo ilícita e culposamente, ter abalado a confiança contratual daquele… Esta não exigibilidade tem obviamente a ver com o valor sintomático da violação imputável ao contraente infiel, tem a ver com o prognóstico de risco e com a frustração do fim do contrato, olhando este na sua economia complexiva (vide Obra Dispersa, I, pág. 670).


Contudo, também não se pode ignorar que a ré iniciou a actividade sabendo não dispor de licença de exploração averbada em sem nome, isso é um dado incontroverso, tendo contratado os serviços duma empresa especializada para regularizar o processo já em plena execução do contrato, e, apesar de em 13.02.2008 ter conhecido as concretas dificuldades em licenciar a exploração (data em que L.P.I. deu por concluídos, sem êxito, os serviços), e que não era contornar as dificuldades a curto prazo, continuou a laborar no estabelecimento industrial objecto da cessão de exploração, quando podia denunciar a tempo o contrato nos termos da cláusula 5ª.
Ou seja, ambas as contraentes sabiam ab initio que assumiam uma execução irregular/ilegal dum contrato de cessão de exploração, concorreram ambas para essa ilicitude, e aceitaram os riscos que daí poderiam advir, mas apenas a ré quis por termo definitivo à sua continuidade, decisão que é de admitir como aceitável e merecedora de tutela.
Pelo exposto, exceptuando as prestações já efectuadas (artigo 434º, nº2, do C.C.), a resolução operada pela ré não concede à autora o direito às prestações peticionadas. O mesmo se poderá concluir mutatis mutandis relativamente ao pedido reconvencional, cujos factos em que assentou a decisão não sofreu aliás qualquer alteração.
O Supremo Tribunal de Justiça decidiu um caso similar, por acórdão de 12.03.2013 relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro Alves Velho no processo 1097/09.3tbvct.gi.S1, e data vénia passamos a transcrever as passagens que se nos afiguram de maior interesse para o caso dos autos: «Como, em sede de matéria de facto, vem demonstrado, o A. outorgou o contrato em 29 de Julho de 2007, iniciou a actividade no estabelecimento em 31 do mesmo mês, a perdurar até 30-11-2011, sabendo que a R. não tinha, para o mesmo, alvará de licenciamento. Em 14 de Fevereiro seguinte, alegando ter-lhe sido ocultada a inexistência da necessária licença de utilização e exploração, notificou a R. para solucionar o problema, em 180 dias, sob pena de resolução contratual, que, no seguimento, efectivamente, declarou para 31 de Agosto de 2008. Por efeito da declaração resolutiva, o ora Recorrente renunciou ao gozo do estabelecimento e, do mesmo passo, libertou-se do pagamento do preço locativo ou rendas, que a Recorrida deixou de poder exigir-lhe. Dada a natureza do contrato, a resolução não abrange as prestações efectuadas até ao momento da extinção da relação contratual operada pela declaração resolutiva, seja a prestação de facto (cedência do gozo) da locadora seja a das rendas pagas pelo locatário (art. 434º-2 C. Civ.). O dever de prestar – de prestação e contraprestação - extinguiu-se, inviabilizado pela declaração resolutiva. Embora, quanto aos efeitos da resolução, a lei não distinga entre os casos fundados em circunstância imputável ou não imputável à parte contra quem é declarada, o dever de indemnizar, a repousar, como atrás referido, no incumprimento definitivo, há-de, para os fins de reintegração ora em apreciação, identificar-se com uma causa adequada da impossibilidade de prestação imputável à Ré-recorrida. Os reclamados lucros cessantes encontram suporte na execução do contrato, mediante a manutenção da prestação de cedência do uso e fruição do estabelecimento pela R., suporte das vantagens patrimoniais que a A. poderia obter. A Ré não dispunha do necessário alvará de licença do estabelecimento, facto desde sempre conhecido do Autor, nem supriu a falta nos seis meses que este, em interpelação admonitória lhe concedeu. (….) As Partes conheciam-no e, apesar disso, puseram em execução as relações contratuais, assumindo os respectivos riscos, ou seja, auto-colocaram-se na posição de, a qualquer momento, verem interrompida a possibilidade de execução das prestações emergentes do contrato, incorrendo nas respectivas sanções administrativas. Ao assim agirem, ambos os Contraentes, auto-responsabilizaram-se pelos efeitos de uma possível intervenção da Administração, tendo, certamente, ponderado as vantagens e as desvantagens do início e manutenção do vínculo em situação desconforme à lei. Perante um tal circunstancialismo, certamente que o A.-recorrente, que durante mais de seis meses conviveu com a situação de ilegalidade, se propôs resolver o contrato porque a relação vantajosa que se lhe afigurava por ocasião da respectiva celebração e início da exploração deixou de como tal se apresentar, sobrepondo-se àquele quadro inicial um outro, de desvantagem, em que compensaria a extinção do contrato. Tudo em harmonia, afinal, do pondo de vista da boa fé e do equilíbrio de prestações, com os riscos voluntaria e conscientemente assumidos pelo Recorrente com a celebração do contrato. É verdade que Autor não tinha que permanecer numa situação de ilegalidade, sujeito a ver, a qualquer momento, o estabelecimento encerrado, mas não pode olvidar-se que ele mesmo colaborou nessa situação, outorgando um contrato que o colocava, desde o início, justamente na mesma posição a que veio a entender pôr termo. Ininvocável, na liquidação da relação contratual, qualquer situação de confiança, a não ser a de que não se viesse a verificar o evento em que consistia o risco voluntariamente assumido. Em suma, e concluindo, entende-se não se estar perante um efectivo prejuízo causado pelo incumprimento definitivo merecedor de tutela à luz da ponderação das regras da boa fé, dada irregularidade do vínculo contratual e o aludido contributo para a sua precariedade, a manter em permanente incerteza a data do termo e inerentes possibilidades de ganhos. Enfim, os efeitos dos riscos assumidos, logo na formação do contrato, não devem ser unilateralmente transferidos para os efeitos de uma resolução assente precisamente na existência desses riscos, apesar de não verificados, sob pena de, na mesma medida, se aceitar o desequilíbrio dos efeitos do negócio celebrado. Não se configura, portanto, um caso de admissibilidade de indemnização, a título de lucros cessantes integrados nos danos do interesse contratual positivo».



Pelos fundamentos expostos, acordam os Juízes desta Relação em julgar parcialmente procedente a apelação dos Réus, pelo que:


A/ Revogam a sentença de condenatória dos réus, absolvendo-se os mesmos do pedido formulado pela autora; B/ Mantém-se o decidido na sentença recorrida quanto ao pedido reconvencional; C/ Custas do recurso por A. e RR., na proporção do decaimento.

TRG, 14 de Novembro de 2013
Heitor Gonçalves
Amílcar Andrade
José Rainho
_________________________________________
[1] Vide Prof. António Menezes Cordeiro, Direito Comercial, 3ª edição, pág. 343 e segs.
[2] Diploma legal aprovado na sequência da remissão do n.° 2 do artigo 1070°, do Código Civil, na redacção dada pela Lei 6/2006, de 27 de Fevereiro, visando regular “os elementos do contrato de arrendamento.
[3] Cfr. Antunes Varela, Das Obrigações em geral, volume II, 3ª edição, pág. 69.
[4] Segundo Batista Machado, Obra Dispersa, Vol. I, pág. 167-168, essa interpelação “não faz sentido nos contratos de execução continuada ou periódica, quando o incumprimento se verifica em condições de fazer desaparecer a confiança do credor no futuro cumprimento exacto das obrigações contratuais por parte do devedor, e, consequentemente, em termos de fazer desaparecer o interesse do credor na manutenção da relação contratual”.
[5] No comentário ao artigo 790º, nº1, do Código Civil, o Professor Antunes Varela ensinava que não deve confundir-se a impossibilidade da prestação com a difficultas praestandi ou difficultas agendi.
[6] Para Mota Pinto, in Cessão da Posição Contratual, pág. 339, esses deveres caracterizam-se “por uma função auxiliar da realização positiva do fim do contrato e de protecção à pessoa e aos bens da outra parte contra os riscos de danos concomitantes”
[7] Ensina o Professor A. Varela, in Das Obrigações em Geral, II, 3ª edição, pág. 11, que “o princípio da boa fé, embora proclamado apenas quanto ao cumprimento dos direitos de crédito, deve considerar-se extensivo, através do canal aberto do nº3, do artigo 10º, a todos os outros domínios onde exista uma relação especial de vinculação entre duas ou mais pessoas”.