Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1650/21.7T9VCT-A.G1
Relator: ALDA MARTINS
Descritores: EXECUÇÃO DE COIMA
EMBARGOS DE EXECUTADO
FUNDAMENTOS DE OPOSIÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 07/13/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: SECÇÃO SOCIAL
Sumário:
A decisão administrativa de condenação em coima que não seja impugnada judicialmente nem cumprida pelos responsáveis pelo seu pagamento tem carácter definitivo e executório, constituindo um título executivo equiparável à sentença.
O carácter definitivo advém de, não sendo interposto recurso de impugnação judicial, como podia, se formar «caso decidido» ou «caso resolvido», instituto inerente aos actos administrativos e que, embora distinto do caso julgado, tem efeito análogo, no sentido de não poder apreciar-se novamente o respectivo objecto e de a decisão já proferida se consolidar e impor na ordem jurídica, assim se prosseguindo, designadamente, o princípio geral da estabilidade do acto administrativo, com tradução prática na certeza e na segurança das relações jurídico-administrativas.
Em conformidade, a oposição à execução baseada em decisão condenatória da autoridade administrativa com carácter definitivo e executório só pode basear-se nalgum dos fundamentos previstos no art. 729.º do Código de Processo Civil, sendo inadmissível a invocação de fundamentos que o embargante podia ter usado em sede de impugnação judicial.

Alda Martins
Decisão Texto Integral:
1. Relatório

Por apenso aos autos de execução comum para pagamento de quantia certa que o Ministério Público moveu contra Celeiro X, Unipessoal, Lda., N. M. e P. C., vieram estes deduzir embargos de executado, sustentando que, estando a sociedade executada e responsável principal extinta por ordem judicial na data em que foi proferida a decisão condenatória que serve de base à execução, também a responsabilidade subsidiária dos gerentes se extinguiu.
O embargado contestou, pugnando pela improcedência dos embargos, na medida em que não se baseiam em qualquer dos fundamentos previstos nos arts. 729.º e 731.º do Código de Processo Civil e, por outro lado, não ocorreu a invocada extinção da sociedade executada Celeiro, designadamente por não ter ocorrido a sua liquidação.
Seguidamente, foi proferido despacho saneador-sentença que julgou improcedente a oposição e determinou o prosseguimento da execução contra os embargantes.

Os embargantes vieram interpor recurso, formulando as seguintes conclusões:

«a) O processo executivo sub iudice, funda-se no título executivo formado pela decisão condenatória da Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT) de 18 de Março de 2021, que condenou a sociedade executada no pagamento de uma coima única de € 5.300,00.
b) Foram também condenados no pagamento da coima os aqui Recorrentes, na qualidade de gerentes da sociedade, ao abrigo do disposto no artigo 551.º n.º 3 do Código de Trabalho.
c) Esta implica uma co-responsabilização objectiva dos gerentes de empresas que tenham sido condenadas por infração à legislação laboral, de forma apriorística e sem a determinação de um juízo de culpa imputável a estes, implicando na prática a transferência da responsabilidade contra- ordenacional sem determinação do elemento subjectivo relativo à conduta dos gerentes que respondem, pessoalmente e sem qualquer limite de valor, pelo pagamento das coimas que forem aplicadas à sociedade infratora.
d) Transferência de responsabilidade que a Lei Fundamental proíbe no seu artigo 30.º n.º 3, pelo que se imporia a desaplicação da norma em apreço pelo Tribunal a quo, no âmbito da fiscalização concreta da constitucionalidade a que todos os Tribunais se encontram adstritos (art. 204º da Constituição da República Portuguesa).
e) Não o tendo feito, requer-se que V. Exas., enquanto garantes da aplicação da Constituição, determinem a não aplicação da supra citada disposição, revertendo a decisão recorrida em conformidade. Sem prescindir,
f) A pretensão dos embargantes, aqui Recorrentes, assenta na decisão vertida no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 26-05-2020, proferido no âmbito do processo n.º 429/17.5YHLSB, - o teor completo do Acórdão encontra-se junto ao requerimento de embargos de executado, como Doc. nº 1.
g) No Acórdão proferido em 26-05-2020 e transitado em julgado em 03-07-2020, foi determinado o seguinte relativamente à sociedade executada nestes autos: “anula a denominação social da Ré, ordena o cancelamento da respectiva matrícula, inscrições e registos na Conservatória do Registo Comercial/ Registo Nacional de Pessoas Colectivas, assim como em quaisquer outros serviços ou entidades nos quais o correspondente registo se encontre lavrado e que proíbe a Ré de utilizar, na actividade comercial, a referida denominação social.”
h) De resto, resulta da factualidade dada como provada na sentença ora em crise que
“- no dia 1 de Julho de 2020, foi levantado o auto de notícia pela ACT;
- no dia 18 de Março de 2021, foi proferida a decisão da ACT que aplicou a contraordenação;
- no dia 14 de Abril de 2021, a decisão da ACT foi notificada a todos os executados;
- no dia 1 de Agosto de 2021, no estabelecimento comercial em causa nos autos laborava a “Y” (C. e P., Lda), sendo o representante legal N. M..
- no dia 26 de Maio de 2020, o Tribunal da Relação de Lisboa proferiu Acórdão onde “anula a denominação social da Ré, ordena o cancelamento da respectiva matrícula, inscrições e registos na Conservatória do Registo Comercial/ Registo Nacional de Pessoas Colectivas, assim como em quaisquer outros serviços ou entidades nos quais o correspondente registo se encontre lavrado e que proíbe a Ré de utilizar, na actividade comercial, a referida denominação social.
- no dia 3 de Julho de 2020, o Acórdão transitou em julgado;
- no dia 4 de Maio de 2021, o Tribunal expediu notificação ao Registo Nacional de Pessoas Colectivas;
- no dia 28 de Junho de 2021, foi averbado o registo de cancelamento da matricula da sociedade.
(…)
A decisão proferida pelo ACT tornou-se definitiva no dia 5 de Maio de 2021.”
i) De resto, o próprio Tribunal recorrido não tem dúvida de que o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa transitou antes da decisão que constitui título executivo se tornar definitiva.
j) Parafraseando a douta sentença recorrida, “Acresce referir que a mesma decisão transitou em julgado antes de a decisão da contraordenação se tornar definitiva, motivo pelo qual, em tese, a mesma é susceptível de implicar a extinção do procedimento contraordenacional.”
l) Então, porque é que o Tribunal considerou a decisão condenatória emitida por autoridade administrativa prevalecente em relação à decisão judicial vertida no citado Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, e que se tornou definitiva (trânsito em julgado) antes daquela?
m) O Tribunal a quo fundamentou a sua decisão na circunstância da sociedade executada não ter formalmente averbado a sua dissolução e o encerramento da liquidação, factos que determinam a extinção/morte da pessoa colectiva (arts. 141.º a 145.º do CSC).
n) Não podemos concordar com o vertido na sentença recorrida, desde logo porque o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, transitado em julgado, determinou, no seu dispositivo, o “cancelamento da matrícula cancelamento da respectiva matrícula, inscrições e registos na Conservatória do Registo Comercial/ Registo Nacional de Pessoas Colectivas, assim como em quaisquer outros serviços ou entidades nos quais o correspondente registo se encontre lavrado.”
o) O conteúdo do Acórdão exprime, pois, um comando insusceptível de ser interpretado doutra forma que não seja a de que aquele Venerando Tribunal determinou o “cancelamento da matrícula” e, por conseguinte, da existência/personalidade jurídica da sociedade executada nestes autos, cancelamento esse que veio a ser averbado pela Conservatória do Registo Comercial de Sintra mediante AP .. de 28.06.2021 – vd. certidão permanente do registo comercial da executada junta como Doc.2 do requerimento inicial de embargos.
p) Pela mesma razão, não é legalmente – nem tecnicamente – possível proceder a qualquer acto de registo comercial em relação a uma sociedade cuja matrícula foi cancelada.
q) Se dúvidas houvesse junta-se para os devidos efeitos como Doc. n.º1, o parecer da Sr.ª Conservadora do Registo Comercial de Sintra com a seguinte informação em resposta ao pedido de esclarecimento feito nesse sentido pelo aqui signatário, em que conclui pela impossibilidade e inexigibilidade do registo da dissolução e encerramento da liquidação, porque a sociedade já se encontra extinta em virtude de decisão judicial que decretou o cancelamento da sua matrícula.
r) Pelo que, s.m.o., não pode aos Recorrentes ser assacada a omissão do registo de um acto que para além de não ser juridicamente admissível seria também ele inútil, que é o do registo da dissolução e do encerramento da liquidação de uma empresa já extinta por ordem judicial.
s) Voltando aos factos dados como provados e relevantes para a decisão da causa, atrás transcritos, verifica-se pois que os mesmos deveriam ter levado o Tribunal recorrido a proferir decisão diversa da proferida.
t) Desde logo, deveria ter desaplicado a norma cuja inconstitucionalidade se invocou (art. 551º nº 3 do CT), pelas razões sobreditas.
u) Ainda que assim não fosse, deveria ter concluído que no momento em que a decisão administrativa que constitui título executivo se tornou definitiva (e logo passou a existir na ordem jurídica), já havia transitado em julgado o Acórdão que determinou a cessação da existência/personalidade jurídica da sociedade arguida.
v) Pelo que em momento algum tal responsabilidade poderia ter-se repercutido na esfera dos seus gerentes, aqui Recorrentes, porque a extinção da pessoa colectiva, equiparando-se à morte física, determinou que a decisão administrativa já tivesse nascido “sem vida”, sendo inexequível.

Nestes termos e com o mui douto suprimento de V. Exas Venerandos Desembargadores, deverá a presente apelação ser julgada procedente, por provada, determinando:
a) A desaplicação da norma vertida no artigo 551º nº 3 do Código de Trabalho (Lei nº 7/2009 de 12-02) por se afigurar materialmente inconstitucional, com a consequente extinção da responsabilidade contraordenacional dos ora Recorrentes;

Se assim não se entender,
b) Revogação da sentença sub iudice, substituindo-a por sentença que determine a extinção da execução em relação aos executados Recorrentes.»
O embargado apresentou resposta ao recurso, pugnando pela sua improcedência.
O recurso foi admitido como apelação, para subir imediatamente, com efeito meramente devolutivo.
Recebidos os autos neste Tribunal da Relação, e vistos os mesmos, cumpre decidir em conferência.

2. Objecto do recurso

Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente, as questões que se colocam a este tribunal são as seguintes:

- desaplicação do disposto no art. 551.º, n.º 3 do Código de Trabalho, por violação do disposto no art. 30.º, n.º 3 da Constituição;
- extinção da sociedade executada, prejudicando a responsabilidade dos embargantes pela coima aplicada àquela.

3. Fundamentação de facto

Os factos relevantes para a decisão são os seguintes:
1 – Como título executivo, o exequente apresentou uma decisão administrativa proferida pela Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT), da qual consta, para o que releva para os presentes autos:
«(…) concordo com a proposta acima referida, a fls. 31/53 dos autos, que aqui dou por inteiramente reproduzida nos termos do n.º 5 do artigo 25º da Lei 107/2009, de 14 de Setembro, passando a fazer parte integrante da presente decisão.
Nestes termos, aplico a Celeiro X – Unipessoal, Lda. a coima de Euros 5.300,00 (cinco mil e trezentos euros)…
(…)
Nestes termos, determino que N. M. pague a coima de Euros 5.300,00 (cinco mil e trezentos euros) como responsável solidário com Celeiro X – Unipessoal, Lda. (n.º 3 do Art.º 551.º do Código do Trabalho).
(…)
Nestes termos, determino que P. C. pague a coima de Euros 5.300,00 (cinco mil e trezentos euros) como responsável solidário com Celeiro X – Unipessoal, Lda. (n.º 3 do Art.º 551.º do Código do Trabalho).
(…)»
2 – Resulta do processo de contra-ordenação em que foi proferida a referida decisão administrativa:
- entre o dia 5 de Janeiro de 2020 e o dia 27 de Janeiro de 2020, foram praticados os factos que vieram a dar origem ao auto de notícia que espoletou a decisão objecto dos autos;
- no dia 1 de Julho de 2020 foi levantado o auto de notícia pela ACT;
- no dia 18 de Março de 2021 foi proferida a decisão da ACT que aplicou a coima;
- no dia 14 de Abril de 2021, a decisão da ACT foi notificada a todos os executados;
- no dia 1 de Agosto de 2021, no estabelecimento comercial em causa nos autos laborava a “Y” (C. e P., Lda.), sendo o representante legal N. M..
3 – A sociedade executada foi demandada em processo emergente de propriedade intelectual em que:
- no dia 26 de Maio de 2020, o Tribunal da Relação de Lisboa proferiu Acórdão que «anula a denominação social da Ré, ordena o cancelamento da respectiva matrícula, inscrições e registos na Conservatória do Registo Comercial/Registo Nacional de Pessoas Colectivas, assim como em quaisquer outros serviços ou entidades nos quais o correspondente registo se encontre lavrado, e proíbe a Ré de utilizar, na actividade comercial, a referida denominação social.»
- no dia 3 de Julho de 2020, o Acórdão transitou em julgado;
- no dia 4 de Maio de 2021, o Tribunal expediu notificação ao Registo Nacional de Pessoas Colectivas;
- no dia 28 de Junho de 2021, foi averbado o registo de cancelamento da matrícula da sociedade.

4. Apreciação do recurso

Como é sabido, a decisão de autoridade administrativa que aplique coimas e ou sanções acessórias com fundamento na prática de ilícitos contraordenacionais de natureza laboral consubstancia um acto administrativo que, para além do prévio exercício do contraditório, admite a impugnação judicial mediante recurso interposto para o tribunal do trabalho, de cuja sentença, em regra, é admissível recurso para o tribunal da relação (arts. 17.º, 20.º, 32.º e 49.º do regime processual aplicável às contra-ordenações laborais e de segurança social, aprovado pela Lei n.º 107/2009, de 14 de Setembro – RPCLSS).
Em conformidade, resulta do art. 25.º, n.º 2, al. a) e n.º 3 do RPCLSS que a decisão da autoridade administrativa que aplica a coima e ou as sanções acessórias contém, entre outras menções, a informação de que a condenação se torna definitiva e exequível se não for judicialmente impugnada nos termos dos artigos 32.º a 35.º e a ordem de pagamento da coima no prazo máximo de 10 dias após o carácter definitivo da decisão. Acrescenta o art. 26.º que a decisão condenatória de aplicação de coima que não se mostre liquidada no prazo legal tem a natureza de título executivo.
Isto é, a decisão administrativa de condenação em coima que não seja impugnada judicialmente nem cumprida pelos responsáveis pelo seu pagamento tem carácter definitivo e executório, constituindo um título executivo equiparável à sentença.
Com efeito, o carácter definitivo advém de, não sendo interposto recurso de impugnação judicial, como podia, se formar «caso decidido» ou «caso resolvido», instituto inerente aos actos administrativos e que, embora distinto do caso julgado, tem efeito análogo, no sentido de não poder apreciar-se novamente o respectivo objecto e de a decisão já proferida se consolidar e impor na ordem jurídica, assim se prosseguindo, designadamente, o princípio geral da estabilidade do acto administrativo, com tradução prática na certeza e na segurança das relações jurídico-administrativas.
Assim, a oposição à execução baseada em decisão condenatória da autoridade administrativa com carácter definitivo e executório só pode basear-se nalgum dos fundamentos previstos no art. 729.º do Código de Processo Civil, sendo inadmissível a invocação de fundamentos que o embargante podia ter usado em sede de impugnação judicial.

Neste sentido, a título exemplificativo, vejam-se os seguintes arestos, com os seguintes sumários ou partes de sumários, disponíveis em www.dgsi.pt:
- Acórdão da Relação de Guimarães de 10 de Novembro de 2016, proferido no processo n.º 9/15.0T9VPC-A.G1:
“A decisão administrativa definitiva é equiparada a uma sentença, como título executivo, pelo que, deduzidos embargos de executado, a este apenas é possível invocar, como fundamentos de oposição à execução, os previstos para a sentença judicial no artº 729º do CPC.”
- Acórdão da Relação de Évora de 27 de Junho de 2019, proferido no processo n.º 931/18.1T9FAR-A.E1:
“II – Nos termos do art.º 25.º, n.º 2, al. a), da Lei n.º 107/2009, de 14-09, a condenação da autoridade administrativa torna-se definitiva e exequível se não for judicialmente impugnada, sendo, desse modo, atribuído a tal decisão valor igual ao do caso julgado de uma decisão judicial.
III – E, a ser assim, em sede de embargos de executado, apenas é possível invocar os fundamentos previstos no art.º 729.º do Código de Processo Civil, já não os previstos no art.º 731.º do mesmo Diploma Legal.
IV – Na inexequibilidade de um título executivo, para efeitos do disposto na al. a) do art. 729.º do Código de Processo Civil, apenas relevam os vícios formais desse título, já não os eventuais vícios de mérito da decisão administrativa, tornada definitiva por não ter sido judicialmente impugnada.”
- Acórdão da Relação do Porto de 25 de Janeiro de 2021, proferido no processo n.º 38/19.4T9ALB-A.P1:
“I – A decisão da autoridade administrativa proferida em processo de contra-ordenação que não seja impugnada judicialmente torna-se definitiva, formando o que na doutrina e na jurisprudência se designa por “caso decidido” ou “caso resolvido”.
II - O “caso decidido”, embora distinto do instituto do caso julgado, equipara-se-lhe para vários efeitos, desde logo, para exigir o cumprimento coercivo, ou seja, a decisão definitiva torna-se exequível (artigo 58.º, n.º 2, al. a), do RGC-O).
III - Em sede de execução para cobrança coerciva do valor da coima, ao executado está interdito pôr em causa a prática dos factos que consubstanciam a contra-ordenação por que foi acoimado e, em geral, opor toda a defesa que lhe era lícito deduzir no processo de contra-ordenação, quer na sua fase administrativa, quer na fase judicial (havendo impugnação judicial).”
- Acórdão da Relação de Coimbra de 25 de Março de 2022, proferido no processo n.º 354/21.5T9CVL-A.C1:
“Tendo em conta o caráter definitivo da decisão da autoridade administrativa não impugnada, que preclude a possibilidade de reapreciação do mesmo facto como contraordenação (art. 79.º do RGCC), essa decisão assume efeitos semelhantes aos da sentença no âmbito dos fundamentos de oposição à execução (art. 729.º do NCPCiv.) – com inerente preclusão de meios de defesa –, desde que à embargante tenha sido assegurado o direito de defesa na esfera contraordenacional.”

Ora, no caso em apreço, os Apelantes pretendem a reapreciação da sua responsabilização pela coima aplicada à sociedade executada, já decidida pela Autoridade para as Condições de Trabalho por decisão de 18 de Março de 2021, que lhes foi notificada em 14 de Abril de 2021, invocando que se deveria desaplicar a norma contida no art. 551.º, n.º 3 do Código de Trabalho, por violação do disposto no art. 30.º, n.º 3 da Constituição, e que a sociedade executada já se encontrava extinta por efeito do Acórdão da Relação de Lisboa de 26 de Maio de 2020, transitado em julgado em 3 de Julho de 2020.
Trata-se, pois, de fundamentos que podiam ter servido de fundamento, não só a oposição na fase administrativa do processo de contra-ordenação, posto que o auto de notícia foi levantado em 1 de Julho de 2020, como a recurso de impugnação perante o tribunal do trabalho, pelo que, não tendo este sido interposto, a decisão administrativa adquiriu carácter definitivo e executório, não tendo aqueles fundamentos cabimento na previsão do art. 729.º do Código de Processo Civil.
Em face do exposto, não sendo tais fundamentos atendíveis, improcede necessariamente o recurso.

4. Decisão

Nestes termos, acorda-se em julgar a apelação improcedente e, em consequência, confirmar o despacho saneador-sentença.
Custas pelos Apelantes.
13 de Julho de 2022

Alda Martins
Vera Sottomayor
Maria Leonor Barroso