Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
4542/16.8T8BRG.G1
Relator: ALCIDES RODRIGUES
Descritores: REGULAÇÃO DO EXERCÍCIO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS
IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
ATIVIDADE DE JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA
INTERESSE DA CRIANÇA
EXERCÍCIO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS POR TERCEIROS
CRIANÇA EM PERIGO
FIGURA PRIMÁRIA DE REFERÊNCIA
PRINCÍPIO DA NÃO SEPARAÇÃO DE IRMÃOS
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 07/13/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I. O critério essencial a ter em conta na regulação do exercício das responsabilidades parentais é o do superior interesse da criança.
II. A lei não fornece uma noção de interesse da criança, tratando-se de um conceito indeterminado que deve ser concretizado, caso a caso, tendo em consideração as particularidades de cada criança e a sua situação envolvente.
III. O atual sistema de exercício das responsabilidades parentais prevê as possibilidades excepcionais do exercício das responsabilidades parentais por outrem, que não os pais, nas situações previstas nos arts. 1907º e 1918º ambos do CC.
IV. O art. 1907º, n.º 1, do CC pode ser interpretado como contendo uma referência ao perigo emocional ou psicológico gerado pela separação da criança em relação à sua pessoa de referência quando esta não é nenhum dos progenitores biológicos.
V. Por dar prevalência à continuidade da estabilidade psicológica e afectiva que vem sendo vivenciada pelo menor, desde junho de 2016, e à necessidade de manutenção da relação afectiva com os tios/cuidadores – pessoas de referência –, e considerando o estilo parental desajustado, é de entender que respeita o superior interesse da criança a decisão que fixa a sua residência junto dos tios/cuidadores, os quais reúnem adequadas condições pessoais e morais para propiciar e assegurar ao menor uma vida feliz, pautada por uma adequada formação e desenvolvimento da sua personalidade e saudável ambiente afectivo.
Decisão Texto Integral:
Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I. Relatório

Na sequência do Acordo Provisório de Regulação das Responsabilidades Parentais do menor A. G., nascido a -.05.2009, formalizado, em 12.11.2019, no âmbito do Processo de Promoção e Protecção, foi extraída certidão, ficando este a constar por apenso, nos termos do art. 112º-A da LPCJP.
*
As partes foram remetidas para Audição Técnica Especializada e, em conformidade com o disposto no art. 39º, nº 4, do RGPTC, os progenitores e os cuidadores apresentaram alegações e prova.
*
Foram realizados exames periciais e foi junto aos autos relatório social.
*
Procedeu-se à realização de audiência de julgamento (ref.ª 177864113).
*
Posteriormente, a Mmª Julgadora “a quo” proferiu sentença (ref.ª 177907168), nos termos da qual decidiu regular o exercício das responsabilidades parentais do menor A. G. nos seguintes termos:
«A. O identificado menor ficará entregue à guarda e cuidados dos seus tios B. C. e C. R., fixando-se a residência do menor junto destes, que exercerão as responsabilidades parentais relativamente aos actos da vida corrente do menor, devendo as questões de particular importância da vida do mesmo ser decididas pelos tios e pelos progenitores;
B. O menor A. G. estará com os pais ao fim-de-semana, com uma pernoita, de quinze em quinze dias, levando-o os tios a casa dos pais após o final das actividades escolares e/ou extracurriculares de sexta ou sábado (em função dos horários das actividades que serão definidas no início de cada ano lectivo) e recolhendo-o no dia seguinte (sábado ou domingo) às 18h;
- um dia por semana (a definir no início de cada ano lectivo, em função dos horários das actividades que frequenta), o A. G. jantará com os pais, levando-o os tios a casa dos pais que aí o recolhem às 21h;
- os dias festivos de Natal e Ano Novo do corrente ano serão passados da seguinte forma:
o dia 24 de Dezembro será passado com os tios e o dia 25 de Dezembro será passado com os pais desde as 11h até às 22h, sendo os tios a entregar e recolher o menor em casa dos pais
o dia 31 de Dezembro será passado com os pais, com pernoita, desde as 11h do dia 31
até às 11h do dia 1 de Janeiro, sendo os tios a entregar e recolher o menor em casa dos pais, no ano seguinte o dia 24 de Dezembro será passado com os pais, com pernoita, deste as 15h até às 11h do dia 25 de Dezembro, sendo os tios a entregar e recolher o menor em casa dos pais o dia 31 de Dezembro será passado com os tios e o dia 1 de Janeiro será passado com os pais desde as 11h até às 22h, sendo os tios a entregar e recolher o menor em casa dos pais, e assim sucessivamente;
C. Os progenitores contribuirão, a título de alimentos devidos ao menor, com a quantia mensal de € 100,00 (cem euros), que deverão liquidar até ao dia 8 de cada mês e anualmente actualizável, a partir de Janeiro de 2023, em 3 € (três euros), a pagar por depósito ou transferência bancária para o IBAN que os tios providenciarão, a que acresce a comparticipação em metade nas despesas de saúde e educação do menor, na parte não comparticipada, que deverão ser remetidas por e-mail até 8 dias após o pagamento e liquidadas no prazo de trinta dias após a comprovação das mesmas».
*
Inconformados, os requeridos C. M. e S. M. interpuseram recurso dessa sentença (ref.ª 41772474) e, a terminar as respectivas alegações, formularam as seguintes conclusões (que se transcrevem):

«1)Vem o presente recurso interposto da douta decisão que, com recurso a uma errada interpretação da prova documental e testemunhal carreada ao processo, decidiu – e cito” regular o exercício das Responsabilidades Parentais do menor A. G. nos seguintes termos:
C. “O identificado menor ficará à guarda e cuidados dos seus tios B. C. e C. R., fixando –se a residência do menor junto destes, que exercerão as responsabilidades parentais relativamente aos actos da vida corrente do menor, devendo as questões de particular importância da vida do mesmo ser decididas pelos tios e pelos progenitores;
D. O menor A. G. estará com os pais ao fim-de-semana, com uma pernoita, de quinze em quinze dias, levando-o os tios a casa dos pais após o final das actividades escolares e/ou extracurriculares de sexta ou sábado (em função dos horários das actividades que serão definidas no início de cada ano lectivo) e recolhendo-o no dia seguinte (sábado ou domingo) às 18h;
- um dia por semana (a definir no início de cada ano lectivo, em função dos horários das actividades que frequenta), o A. G. jantará com os pais, levando-o os tios a casa dos pais que aí o recolhem às 21h;
- os dias festivos de Natal e Ano Novo do corrente ano serão passados da seguinte forma:
o dia 24 de Dezembro será passado com os tios e o dia 25 de Dezembro será passado com os pais desde as 11h até às 22h, sendo os tios a entregar e recolher o menor em casa dos pais
o dia 31 de Dezembro será passado com os pais, com pernoita, desde as 11h do dia 31 até às 11 h do dia 1 de Janeiro, sendo os tios a entregar e recolher o menor em casa dos pais,
no ano seguinte
o dia 24 de Dezembro será passado com os pais, com pernoita, desde as 15h até às 11 h do dia 25 de Dezembro, sendo os tios a entregar e recolher o menor em casa dos pais
o dia 31 de Dezembro será passado com os tios e o dia 1 de Janeiro será passado com os pais desde as 11h até às 22h, sendo os tios a entregar e recolher o menor em casa dos pais, e assim sucessivamente;
C. Os progenitores contribuirão, a título de alimentos devidos ao menor, com a quantia mensal de € 100,00 (cem euros), que deverão liquidar até ao dia 8 de cada mês e anualmente actualizável, a partir de Janeiro de 2023, em 3 (três euros), a pagar por depósito ou transferência bancária para o IBAN que os tios providenciarão, a que acresce a comparticipação em metade nas despesas de saúde e educação do menor, na parte não comparticipada, que deverão ser remetidas por e.mail até 8 dias após o pagamento e liquidadas no prazo de trinta dias após a comprovação das mesmas”- fim de citação.
2) Fundamentando tal decisão, entre outros, nos factos dados como provados, a saber:
1-A. G., nascido em -.05.2009, em Braga, é filho de C. M. e S. M. (cfr. fls. 10 dos autos principais); 2- Em 8 de Março de 2016, na sequência de sinalização proveniente do Agrupamento de Escolas ... sobre criança vítima de negligência ao nível da supervisão e acompanhamento familiar, foi aberto processo na CPCJ de Braga relativamente ao A. G. (cfr. fls. 15-21); Em 7 de Junho de 2016, a CPCJ deliberou, por unanimidade dos presentes, a aplicação da medida de apoio junto de outro familiar, a executar junto dos tios maternos B. C., padrinho do A. G., e C. R. (cfr. fls. 73-76 dos autos principais); 4- Na mesma data, foi aplicada ao seu irmão C. G. a medida de promoção e protecção de apoio junto dos avós maternos, residentes no ..., Concelho de Ponte da Barca (cfr. fls. 372 verso do processo principal); 5- Em 19 de Outubro de 2016 foi instaurado processo de promoção e protecção a favor do menor A. G., no âmbito do qual foi aplicada ao menor, em 28.11.2016, a medida provisória de apoio junto dos tios maternos por seis meses; em 14.12.2016, foi aplicada a medida de apoio juntos dos tios maternos, pelo prazo de seis meses (cfr. fls. 207-209 dos autos principais), mantida por mais seis meses, por despacho datado de 27.09.2017 (cfr. fls. 240 e 241 dos autos principais), mantida por mais seis meses, por despacho de 24.10.2017 (cfr. fls. 257 dos autos principais) e prorrogada por mais seis meses, por despacho de 22.06.2018 (cfr. fls. 313 dos autos p principais; 6- A. G. manifestou boa ligação afectiva aos tios e, desde que integrou o seu agregado familiar, registou uma evolução favorável nas áreas da saúde, educação e socialização, bem como de arranjo e cuidado pessoal (cfr. fls. 372 verso dos autos principais); 7- Por despacho de 12.11.2019 (cfr. fls. 388-390 dos autos principais) foi determinado o arquivamento dos autos de promoção e protecção e, foi fixado o seguinte regime provisório de Regulação de Exercício das Responsabilidades Parentais: - RESIDÊNCIA da criança e atos da vida corrente: 1.1- O A. G. ficará a residir habitualmente com os tios maternos - B. C. e C. R. -, que ficam incumbidos de zelar e acautelar pelo respectivo bem-estar, a eles cabendo o exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente do sobrinho. II-QUESTÕES DE PARTICULAR IMPORTÂNCIA: 2.1- As responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância serão exercidas em comum por ambos os progenitores e pelos tios guardiães, ressalvados os casos de urgência manifesta, em que qualquer deles poderá agir sozinho, prestando contas ao outro logo que possível. III - Direito de VISITAS: 3.1- O A. G. estará com os pais ao fim-de-semana, com pernoita, de quinze em quinze dias, levando-o a tia a casa dos pais às 18:30 horas de sábado (no final da catequese) e recolhendo-o no domingo às 18:00 horas. 3.1.1- O regime que antecede inicia-se no próximo dia 23 de Novembro. 3.2.- À terça-feira, o A. G. jantará com os pais, que o recolhem na escola, no final das actividades escolares pelas 16:40 horas e os tios recolhem em casa dos pais às 21:00 horas. 3.3 - Os dias festivos de Natal e Ano Novo do corrente ano serão passados da seguinte forma: 3.3.1 - O dia 24 de Dezembro, será passado com os tios e o dia 25 de Dezembro será passado com os pais desde as 12:00 horas até às 21:00 horas, sendo os pais a ir buscar a casa dos tios e os tios a recolher em casa dos pais. 3.3.2 - O dia 31 de Dezembro será passado com os pais, com pernoita, desde as 12:00 horas do dia 31 até às 12:00 horas do dia 1 de Janeiro, sendo os pais a ir buscar a casa dos tios e os tios a recolher em casa dos pais. IV -ALIMENTOS: 4.1- A título de alimentos os pais contribuirão para o sustento do filho com a prestação mensal de €75,00, que entregarão aos tios até ao dia 8 de cada mês mediante depósito ou transferência bancária, actualizada anualmente, a partir de Janeiro de 2021 em €3,00. 4.2- As despesas de saúde e educação, devidamente comprovadas e não comparticipadas, serão suportadas pelos progenitores e pelos tios em partes iguais. 4.3- As despesas de saúde e de educação do menor deverão ser comunicadas, por e email, no prazo de 8 dias, após a sua realização e pagas, mediante comprovação documental da sua efectivação, no prazo de 30 dias, a contar da sua comunicação; 8- O progenitor é beneficiário de pensão de invalidez, no montante mensal de € 1.043,00, e a progenitora está desempregada, vivem, juntamente com o C. G., que tem 15 anos de idade e frequenta o 9º ano na Escola EB2/3 de ..., num apartamento T2, arrendado, ascendendo a renda à quantia mensal de € 450,00, situado em frente à Escola de ...; O tio é militar da GNR e a tia é gerente da loja da ... em Barcelos, auferindo cada um deles € 1.000,00 líquidos, vivem, com o A. G., num T2, sito em ..., adquirido com recurso a empréstimo bancário; 10- O A. G. frequenta o 7º ano na Escola EB 2/3 de ...; 11- O A. G. mantém uma relação positiva e próxima com o C. G., relativamente ao qual demonstra afeição; 12- A progenitora do A. G. e a tia materna mantêm uma comunicação positiva, acertando entre elas pormenores relativos às visitas do menor; 13- A progenitora, na interacção com o A. G., mantém uma postura de passividade, não promove o diálogo e a proximidade, demonstra alguma falta de atenção às necessidades, interesses e gostos do filho; 14-O progenitor demonstra características de personalidade egocêntrica, vulnerável e ansiosa perante situações de maior vulnerabilidade, manifesta sentimentos de rejeição, associados ao facto de sofrer de atrofia muscular e estar numa cadeira de rodas, essencialmente por parte da família da esposa; 15-Na interacção com o A. G. verifica-se um clima tenso e desconfortável pois o A. G. não se sente à vontade com o pai e este não consegue adoptar uma atitude promotora do bem estar do filho, colocando-o sob pressão ao confrontá-lo, durante a realização da perícia, com a escolha entre pais e tios; 16- Mostrou dificuldades em identificar gostos e preferências do menor, bem como, descrever actividades realizadas em conjunto como filho que possam ser consideradas gratificantes para ambos; Os tios maternos demonstram possuir competências parentais adequadas e positivas, demonstram interesse e preocupação com o menor e evidenciam estar a par dos seus gostos e preferências bem como das suas principais características; 18- São emocionalmente calorosos, demonstram forte apego ao A. G., a quem tratam como filho, mantém com ele uma interação positiva, afectuosa, responsiva e disponível, o qual se mostra totalmente à vontade no contacto com os tios, existindo entre todos comportamentos afectuosos e espontâneos; 19- São capazes de proporcionar ao menor um ambiente familiar seguro e afectuoso; 20- O A. G. manifesta forte vinculação aos tios cuidadores, cuja relação é percepcionada como capaz de prestar suporte emocional, segurança, apoio à individualidade e aceitação pessoal pois percepciona-os como pessoas atentas, protectoras que o aceitam como é; 21-Na relação com os tios demonstrou sempre à vontade, procurou contacto e pediu a cooperação dos tios que foram responsivos às necessidades do menor; 22- No contacto com os pais, demonstrou sentir ansiedade, apreensão e tensão, os quais não revelaram comportamentos que permitissem à criança sentir-se livre e à vontade, pressionando o menor sobre a tomada de uma posição entre pais e tios; 23-O A. G. manifesta sentir bastante pressão na presença dos pais, essencialmente do pai, considera-os pessoas menos atentas e menos disponíveis, associando-os a maior pressão para que se comporte de acordo com o desejo destes e percepciona relativamente aos pais um sentimento de maior afastamento afectivo; 24- Está bem integrado no agregado familiar dos tios, potenciador de adaptação e ajustamento psicológico; 25- Na sequência do acordado entre os progenitores e os tios (após contactos entre a tia e a progenitora), o regime provisório foi adaptado aos horários e actividades extracurriculares do menor e ao facto de os pais não terem veículo automóvel, pelo que o A. G. tem estado com os pais ao fim-de-semana, com pernoita, de quinze em quinze dias, levando-o a tia a casa dos pais, no final das actividades, entre as 18h e as 20h de sexta-feira, e recolhendo-o no sábado depois do almoço; 26-Janta com os pais à segunda-feira, sendo entregue em casa dos pais pelos tios que aí o recolhem; 27- No último Natal pernoitou em casa dos pais de 23 para 24 de Dezembro, tendo os tios o recolhido às 23h do dia 24; 28- No dia 1 de Janeiro esteve em casa dos pais de manhã até às 17h, tendo sido entregue e recolhido pelos tios; 29- Os progenitores têm melhores condições habitacionais e materiais, as quais permitem que o A. G. conviva com eles e com o irmão C. G. em conformidade com o regime de visitas em vigor; 30- O A. G. quer continuar a residir com os tios, manifestou agrado pelo regime de visitas existente e demonstrou desagrado perante a possibilidade de aumento das pernoitas.
3)Por sua vez, a Douta Sentença ora em crise, considerou como não provados os seguintes factos:
1. O A. G. tem uma excelente relação com os progenitores; 2. Sempre que se encontra com os pais mostra-se feliz, seguro e manifesta constantemente sinais de carinho e afecto bem como o desejo de com eles passar a residir; 3. Os progenitores desenvolveram capacidades parentais que lhes permitem estabelecer melhores relações com o A. G. e tê-lo a residir com eles.
4)Sendo que a motivação para dar como provados tais factos, decorreu, entre outros, do teor dos relatórios de perícia psicológica datados de 05.07.2021, do teor do relatório social datado de 16.12.2020, do teor da informação sobre Audição Técnica Especializada datada de 10.03.2020 e da convicção resultante da prova produzida, mormente das declarações dos progenitores, dos tios/cuidadores e do A. G.. Por sua vez, para considerar os factos não provados, a Meritíssima Juiz alicerça a sua motivação no teor dos relatórios periciais, nas declarações do A. G. e nas declarações dos progenitores. Ora,
5)Salvo o devido respeito, que é muito, não andou bem o Ilustre Tribunal a quo. Senão vejamos:
6)Como resulta do facto dado como provado em 13º, o Tribunal a quo entende que” a progenitora, na interação com o A. G., mantém uma postura de passividade, não promove o diálogo e a proximidade, demonstra alguma falta de atenção às necessidades, interesses e gostos do filho”. Contudo, este facto não deveria ter sido dado como provado. Com efeito,
7)Das declarações da progenitora resultam evidências claras de que a mesma promove o diálogo e a proximidade com o A. G. e está atenta às suas necessidades, gostos e interesses. Atente-se, neste particular, às declarações gravadas na audiência de julgamento ( – minutos 9.40 a 11.38):
Advogada dos Progenitores: Senhora Dona S. M., como é a sua relação com o A. G.? Diz-se aqui no Relatório que a Senhora fala pouco, que é pouco interactiva com o menino, que procura pouco o contacto com o menino. Como é a Senhora enquanto pessoa?
Progenitora: Sou tímida, sou calma. A relação com o A. G. é boa.
Advogada: Conhece os gostos dele? Procura o contacto com ele? Cozinha para ele? O que gosta ele de comer?
Progenitora: Cozinho o que ele gosta. Gosta de batatas fritas com bife, gosta de sopa. Pergunto se tem estado bem, como vai a escola…
Advogada: Procura contactos?
Progenitora: Ele está sempre a dar beijinhos, quando está comigo.
Advogada: Considera-se portanto uma pessoa introvertida e tímida…
Progenitora: Sim.
8)As declarações a que se alude, prestadas de forma espontânea e verdadeira, poderiam e deveriam ter sido levadas em conta pelo Ilustre Tribunal, o que, erradamente, não aconteceu. Se dúvidas houvesse quanto à questão de que a progenitora procura atender às necessidades e gostos do filho, o que não se concede, atente-se nas declarações prestadas pelo próprio A. G. (audiência de julgamento 24/02/2022 gravadas aos minutos 6.50 a 7.20):
Digníssima Magistrada do Ministério Público: Gostas da comida que a mãe faz?
A. G.: Umas gosto outras não. Dos legumes não gosto.
D.M.M.P: Não gostas dos legumes (risos). Mas a mãe cozinha bem?
A. G.: Cozinha. Ora,
9)Como facilmente se depreende do que antecede, a progenitora é uma pessoa atenta e cuidadosa que, comprovadamente, está atenta aos gostos do filho, tudo fazendo para que este se sinta bem, acolhendo-o e acarinhando-o no seio do ambiente familiar, pois, contrariamente ao dado por assente na Sentença de que se recorre, a progenitora não é uma pessoa passiva. Como acima se transcreve, a progenitora é uma pessoa tímida e introvertida que fala pouco quando está com pessoas que não conhece. No entanto, estas características que são as suas, não deveriam ter sido descritas e assentes como se de postura passiva se tratasse, mas sim de timidez. Como compreender então que a Meritíssima Juiz do Tribunal a quo, ao arrepio das declarações prestadas, tenha dado como provado que a progenitora demonstra falta de atenção às necessidades, interesses e gostos do filho e/ou demonstre uma postura de passividade? Nestes termos,
10)O preceituado no ponto 13º da Sentença ora em crise, não deve ser dado como provado. Mais,
11)De igual forma, mal andou o Tribunal ao considerar como provados os factos elencados nos pontos 14º,15º e 16º da Sentença de que se recorre (em relação ao progenitor). Efectivamente, o progenitor é pessoa atenta e comprometida com o bem-estar do filho A. G., promovendo actividades em conjunto com este e tudo fazendo para ser um bom pai. Com efeito,
12)Atente-se mais uma vez, nas declarações prestadas pelo A. G. em audiência de julgamento (gravadas em suporte informático 202202244113228_5748577_2870518 minutos 4.50 a 7.00):
D.M.M.P: A. G., tu quando estás de fim-de-semana, que actividades costumas fazer?
A. G.: Jogos, vejo filmes.
D.M.M.P: Mas com o teu mano ou com o teu pai?
A. G.: às vezes com o mano, às vezes com o pai.
D.M.MP.: E não saem para andar assim ao ar livre? Ir jogar futebol?
A. G.: Sim….ao sábado.
D.M.M.P.: nos parques da Rodovia?
A. G.: Sim.
D.M.M.P.: E já foram lá mais vezes?
A. G.: Sim, já fomos lá mais vezes.
D.M.M.P.: É uma coisa que tu gostas de fazer?
A. G.: Sim, de vez em quando.
13)Declarações neste sentido foram igualmente prestadas pelo progenitor pai que, de forma clara e verdadeira falou da sua relação com o A. G. e de como gosta de estar perto dele e realizar actividades com o menino, pelo que não se compreende e não se aceita que se dê por assente que o A. G. sente pressão na presença dos pais, essencialmente do pai, que o progenitor não se mostre atento ao filho, quando é o próprio A. G. a declarar que pratica actividades com o pai, que sai com ele para os campos da Rodovia para jogar futebol, que gosta de o fazer. Destas declarações facilmente se poderia depreender que o menino se sente à vontade com o pai e que gosta de estar com ele. A ser assim como é,
14)Estes factos dados como provados foram erradamente fixados como tal e devem ser alterados no sentido de se dar por assente que o progenitor é uma pessoa atenta e cuidadosa que procura sempre o bem-estar do filho A. G. (como de resto faz e sempre fez quer com o A. G. quer com o C. G.) e que o próprio A. G. se sente à vontade com o pai e não pressionado como na Sentença, erradamente, se conclui. Mas sem prescindir,
15)No ponto 30.º da Douta Sentença, o Tribunal dá como provado que o A. G. manifestou agrado pelo regime de visitas existente e demonstrou desagrado perante a possibilidade de aumento das pernoitas. Mais uma vez, ao decidir dar como assente tal facto, mal andou o Tribunal. Senão vejamos:
16)Conforme decorre da prova gravada em audiência de julgamento, mormente das declarações do menor A. G. (gravadas em suporte informático 202202224113228_5748957_2870518, a minutos 3.46 a 4.31), a Meritíssima Juiz questiona o menor sobre se este gostaria de passar, no verão, uma semana de férias com os pais, ao que este responde que sim. Vejamos as suas declarações:
17)Senhora Juiz: E as férias? Gostavas de passar também as férias com o teu pai e o teu irmão? Nas férias tu tinhas mais tempo para estar com o teu irmão, para jogar, estar a ver filmes com ele…porque em tempo de aulas é mais complicado…
A. G.: sim.
Senhora Juiz: E tu não gostavas de passar por exemplo uma semana com ele no verão?
A. G.: Uma semana sim.
18)Ora, inexplicavelmente, as declarações prestadas pelo menor (repita-se a instâncias da própria M. Juiz), não foram tidas em conta, alegando-se, para tal, que tais declarações haviam sido prestadas de forma comprometida (negrito nosso). Com efeito,
19)Transcreve-mos, neste ponto, o plasmado na sentença:” O facto provado 30.ºdecorre do teor do relatório pericial em que o examinado é o A. G. (…), e das declarações do A. G. que, em audiência de julgamento, afirmou preferir continuar a viver com os tios e considerar que “os fins de semana estão bem assim”, que “o tempo que passa em casa dos tios é suficiente” pois “acha que seria muito tempo de sexta a domingo”. “Não obsta ao exposto a relação positiva e próxima que o A. G. mantém com o C. G. nem o por si afirmado de que “no verão, poderia passar uma semana de férias com os pais e o irmão”. “Com efeito, conjugando a forma comprometida como o fez (o que só a imediação permite constatar) com o facto de esta última afirmação se mostrar contrária à afirmação anterior de que “ o tempo que passa em casa dos pais é suficiente, não quer ficar mais tempo”, o Tribunal, articulando o declarado com o facialmente demonstrado pelo A. G., interpretou a vontade do menor no sentido de não pretender o alargamento do regime de visitas em vigor” . “A corroborar o exposto, temos a justificação por si apresentada (saudades dos tios e da casa deles), a pressão de que é vitima por parte do progenitor e a relação pouco gratificante que mantém com os progenitores (…)”fim de citação. Ora,
20)Com todo o respeito, entendemos que o Tribunal não poderia ter chegado a tal conclusão, pois, como acima se aludiu, por um lado, o menor sente-se à vontade com o pai (vê filmes com ele, jogam jogos, vão aos campos da Rodovia jogar à bola) e nunca o progenitor exerceu qualquer pressão sobre o menor. Mais,
21)O Tribunal a quo qualifica as declarações do menor como tendo sido feitas de forma comprometida. Ora,
22)Curiosa e inexplicavelmente, o Tribunal apenas considera estas precisas declarações (querer passar uma semana de férias no verão com os pais e o irmão), como tendo sido prestadas de forma comprometida. Então e todas as outras que prestou (os fins de semana estão bem assim, seria muito tempo de sexta a domingo), não terão sido igualmente prestadas de forma comprometida???? Acresce que,
23)Conforme decorre de prova documental carreada aos autos (veja-se relatório social datado de 16/12/2020), no item Dados relevantes sobre a criança em causa, escreve o Técnico responsável – e cito- “ É uma criança muito influenciável pelo contexto em que se encontra e pelas figuras familiares de quem depende directamente. Apresenta vulnerabilidade psicológica, tendendo a estabelecer alianças com quem promete proteção, ou para evitar desagradar a quem o pode proteger. Em entrevista individual, fez declarações abonatórias em relação a quem o acompanhou nos últimos tempos e o levou ao CDist Braga, e pelo contrário, fez declarações críticas ou desfavoráveis face ao outro par de requeridos.(…). As suas estratégias face aos adultos vão no sentido de agradar-lhes directamente como estratégia de autoprotecção, não se importando de dar uma imagem desfavorável sobre quem não está próximo no espaço ou no tempo. Por exemplo receia voltar rapidamente ao casal de que deixou uma imagem desfavorável num relato. Desconhece-se se o A. G. é instruído perversamente por algum dos casais para tomar algumas dessas posições, mas ambos os casais ficam avisados que ficam vulneráveis se fomentarem instabilidade. Facilmente o menor desmente o que afirmara quando compreende o peso da perda que poderia sofrer se mantivesse o relato dramático”. Mais à frente (item Aspectos a destacar nas matérias em discussão), escreve o mesmo Técnico: (…) “tende a exprimir sentimentos de aliança com uma das partes e rutura com a outra parte no processo, em autodefesa”. Refere ainda : “ C. M. e S. M. estão insatisfeitos com a evolução do caso. C. M. está especialmente revoltado por considerar que tendo sido ilibado do crime de que era suspeito, deveria ter tido de imediato direito a acompanhar de novo os filhos C. G. e A. G. diariamente. Veio a verificar-se o regresso do C. G., mas a situação do A. G. é diferente porque os tios resistem a abdicar da guarda de A. G.” (negrito nosso) – fim de citação. Mais,
24)Do Relatório de Perícia Psicológica Forense datado de 06/07/2021, em que a examinada é a Progenitora, pode ler-se:- e cito- “ o A. G. é um menino doce, eles sempre quiseram ficar com ele porque a minha cunhada não pode ter filhos (…). E mais adiante,” Reconhece que o filho se sentirá na obrigação de agradar aos adultos, quer seja aos pais, quer seja aos tios, “ ele a nós diz que quer ficar connosco e depois diz aos tios que quer ficar com eles…, ele tenta dar a volta por cima” (negrito nosso) – fim de citação. E ainda,
25)No Relatório de Perícia datado de 05/07/2021, em que o examinado é o progenitor, pode ler-se: - e cito – “ Segundo C. M., o facto da tia não poder ter filhos biológicos, estará na origem daquilo que considera ter sido “um esquema para ficar com o A. G.”. A. G. está com os pais de 15 em 15 dias ao fim de semana. C. M. refere que as visitas correm bem, contudo salienta ter a percepção de que os tios pressionarão o menor, para que este rejeite os pais. Descreve A. G. como uma criança frágil, inocente, “ ele diz bem das duas partes para não se dar mal…., nunca fala sobre os tios, deve ter medo”. (negrito nosso) – fim de citação. Ora,
26) Como facilmente se depreende do que acima vem citado, o menor A. G. é um menino extremamente influenciável, que apresenta vulnerabilidade psicológica e tendência para “dizer o que o que os estão perto querem ouvir”, desmentindo o que antes afirmara, mostrando características de fragilidade e de inconstâncias várias. A ser assim como é, não se compreende, nem se aceita, que o Tribunal, ao arrepio do que são as várias provas em sentido contrário, nunca se tenha pronunciado sobre tais factos e características do A. G., sobre as motivações dos tios cuidadores para quererem ficar com o A. G. (a tia não pode ter filhos) preferindo aceitar como assentes factos e declarações contraditórias ao que antes se citou. Acresce que,
27)Não faltaram ao Tribunal elementos para se debruçar sobre as questões que aqui se levantam, o que erradamente, acabou por não fazer. Com efeito,
28)Como resulta das declarações prestadas em audiência de julgamento pelo A. G., facilmente se depreende que o menino ora responde de uma forma, ora responde de outra, numa tentativa clara de agradar a quem o está a ouvir. Senão vejamos,
29)O A. G. tem um discurso pouco firme, fala baixinho (a ponto de a Senhora Procuradora lhe dizer que não o ouve) e usa apenas monossílabos e/ou pequenas frases que evidenciam ter poucas ou nenhumas certezas sobre o que afirma. Prova disso são as inúmeras vezes em que responde “de vez em quando” (declarações gravadas em audiência de julgamento 20220224 113228_57448957_2870518, minutos 6.50 a 6.55 – Procuradora: Tu é sempre de vez em quando, é o Natal de vez em quando, é ir ao campo de vez em quando”. Mais,
30)Num momento diz que os fins de semana estão bem assim e noutro manifesta agrado por passar uma semana de férias no verão com os pais e irmão. Ora, tais comportamentos, forma de prestação das declarações e, bem assim, o descrito quanto à personalidade do A. G., deveriam ter merecido por parte do Tribunal outra atenção, mormente, não valorando sem mais declarações de um menino que sempre se mostrou pouco firme no que dizia, que não mostrou convicção nas (poucas) palavras que proferiu e, em consequência, não dar como assentes factos que, alegadamente, foram corroborados pelas declarações prestadas pelo menor. Ao invés o Tribunal deveria ter procurado aquilatar da verdadeira natureza e características do A. G., do porquê das suas parcas e confusas palavras e, bem assim, da verdadeira natureza do relacionamento do A. G. com os pais, destes para com o seu filho e, bem assim, das motivações dos tios cuidadores ao quererem tanto ficar com o A. G., a ponto de se dizer no relatório “ os tios resistem a abdicar da guarda de A. G.” e ainda se o menino era, de alguma forma, instrumentalizado por alguma das partes. Acresce que,
31)Como resulta quer das declarações acima citadas (prestadas perante os Técnicos examinadores), quer das prestadas em audiência de julgamento ou referenciadas nas Alegações que apresentaram ao Tribunal, os pais sempre disseram, por um lado, que o menor quando está com eles se mostra feliz, seguro, manifestando constantemente sinais de carinho e afecto para com todos e manifestando o desejo de com eles permanecer (ver alegações apresentadas ao Tribunal),
ALEGAÇÕES
O que fazem nos termos e com os seguintes fundamentos:
O teor dos relatórios apresentados e, bem assim, as conclusões que ali são expostas,
Não refletem o verdadeiro comportamento, personalidade e sentimentos dos pais face ao seu filho A. G.,
E muito menos, o verdadeiro comportamento e sentimentos do A. G. face aos pais. Com efeito,
1.Contrariamente ao que vem veiculado nos relatórios, o A. G. tem uma excelente relação com ambos os progenitores. Efectivamente,
2.Sempre que se encontra com os pais e o irmão, mostra-se feliz, seguro, manifestando constantemente sinais de carinho e afecto para com todos,
3.E manifestando o desejo de com eles permanecer. Acresce que, como resulta dos autos, o outro filho do casal (C. G.), que havia sido entregue à avó materna, Regressou à casa dos pais,
4.Onde permanece em segurança, com todas as condições de habitabilidade, carinho e apoio,
5.Sendo um menino aplicado, com boas notas, educado e respeitador. Ora, Segundo os relatórios que estiveram na origem da decisão de regresso do C. G. a casa dos pais,
6.Os progenitores são pessoas capazes, bons cuidadores e educadores e que, como tal, tinham todas as condições para receber de volta o C. G., como de facto aconteceu. A ser assim como de facto é,
7.Como compreender que de um relatório se extraia que os pais são idóneos e aptos a criar e educar o filho C. G. e de outro se extraia precisamente o contrário?
8.Incompreensível!
9.Os progenitores reúnem todas as condições para receber o A. G. no seio familiar. De facto,
10.A circunstância de lhes terem sido retirados os filhos, levou a que os progenitores compreendessem que precisavam de alterar algumas das suas atitudes para com os meninos,
11.O que de facto fizeram, (re)aprendendo, com humildade, pedindo ajuda a quem os pudesse orientar e aceitando os conselhos e orientações,
12.Para se tornarem melhores pais,
13.O que conseguiram, como se comprova, desde logo, pelo regresso do C. G. e, bem assim, pelo menino que este se tornou,
14. Muito por causa do regresso à casa dos pais. Acresce que,
15. Os pais reuniram igualmente todas as condições logísticas necessárias a receber o A. G.. Senão vejamos, 16. Vivem num apartamento de tipologia T2, com dois quartos grandes, uma sala, cozinha e casa de banho, 17. Completamente equipada e mobilada,
18. Limpa, asseada e segura. Mais,
19. As refeições, saudáveis e adequadas, são confeccionadas em casa,
20. Nada faltando ao agregado familiar, por terem um rendimento que ultrapassa os mil euros mensais. Em conclusão,
21. Os progenitores são hoje pessoas muito diferentes do que foram no passado, 22. Desenvolveram capacidades parentais,
23. Que lhes permitem hoje estabelecer relações diferentes (para melhor, claro), com ambos os filhos, 24. Assegurando-lhes proteção, afecto e todos os cuidados de que precisam. Nestes termos,
25. Requer-se a V.Exia. se digne proferir decisão que determine o regresso do A. G. ao seio familiar, 26. Mantendo-se, caso os tios e o A. G. assim o entendam, convívios e visitas ao casal.
Pede e Espera Deferimento, A Advogada,
(D. M.)
32)E, por outro, sempre reiteraram que os tios cuidadores pressionavam o A. G. para que este rejeitasse os pais, não promovendo contactos regulares, incumprindo o regime de visitas fixado mas, mais importante, afastando o A. G. dos pais e do irmão, pelo que, o Tribunal não poderia ter ignorado tais actuações e, bem assim, os comportamentos dos tios. Efectivamente,
33)Conforme ficou provado em Tribunal, o A. G. frequenta a catequese mas os tios cuidadores nunca comunicaram aos pais qual a paróquia onde tal sucedia, numa clara manifestação para que os pais não tivessem contacto com a vida do filho, afastando-os, tendo inclusive o A. G. feito a Primeira Comunhão e os tios não comunicaram aos pais tal facto, em mais uma actuação deliberada de afastar o menino dos pais e os pais da vida do menino. Os pais viram-se privados de participar de um momento tão importante e marcante para a vida Cristã do seu filho, tendo-se sentido tristes e magoados por não terem podido estar presentes e fazer parte deste caminho na fé, só tendo tido conhecimento que o A. G. tinha feito a Primeira Comunhão um tempo depois pela avó materna dos meninos que comentou o facto.
34) Questionado o A. G. do porquê de não ter dito aos pais que iria fazer a Primeira Comunhão, este respondeu que os tios o proibiram de o fazer. Mais,
35)Os tios cuidadores tudo fizeram para que o A. G. não se aproximasse dos pais e do irmão C. G.. Tal como resultou das declarações dos progenitores, os tios cuidadores tudo fizeram para afastar os pais do menino, por exemplo, não comunicando a estes onde o menino frequentava a catequese, quando e onde faria a primeira comunhão ou onde praticava futebol. Também sempre tentaram que as pessoas das suas relações não soubessem que o A. G. tinha pais, apresentando o A. G. como seu próprio filho. Com efeito,
36)E apenas para citar um e muitos exemplos, veja-se o sucedido quando o menor A. G. se encontrava um sábado de manhã nos campos da rodovia em Braga com o pai e o irmão C. G.. O A. G. jogava à bola com o irmão e acercou-se deles um homem (que o A. G. identificou como sendo vizinho da tia) e que, abordando o menino lhe perguntou o que estava ali a fazer e com estava, ao que o menor, muito aflito e a chorar, saiu do campo e quis terminar o jogo e pediu para regressar a casa. Questionado pelo pai do que sucedera, o A. G. respondeu que era muito mau que o vizinho da tia o tivesse visto ali com o irmão e o pai porque os tios não querem que ninguém saiba que eles existem, e que a tia o iria castigar por ter sido visto na companhia do pai e do irmão. Ora,
37)Embora as várias actuações dos tios cuidadores tenham sido relatadas em audiência de julgamento (incumprimento do regime de visitas estabelecido – por exemplo, em todo este tempo o A. G. passou o Natal e o Ano Novo com os pais apenas uma vez - não comunicar aos pais factos e eventos da vida do menino, pressão para que o menino participe o menos possível da vida dos pais), o Tribunal não cuidou de se debruçar sobre essas questões, quando podia e devia tê-lo feito. Acresce que,
38)Como acima se indicou, O Tribunal a quo considerou como não provados vários factos que, pela sua enorme importância e relevância para a decisão, deveriam ter merecido outro olhar e atenção por parte do julgador. Com efeito,
39)Como compreender que se dê por não provado que o A. G. tem uma excelente relação com os progenitores, que se sente seguro e manifesta sinais de carinho para com estes e ainda que os progenitores desenvolveram capacidades parentais que lhes permitem estabelecer melhores relações com o A. G. e tê-lo a residir com eles, quando tais factos são corroborados por circunstâncias e declarações que deveriam ter merecido, por parte do Tribunal, conclusão contrária. Senão vejamos:
40)Das declarações do A. G. a que já se aludiu, resulta que este sai com os pais (passeia com o pai e o irmão, vão jogar à bola, veem jogos e filmes juntos), gosta de ir jantar a casa dos pais, acha que a mãe cozinha bem…..Mais,
41)Das declarações da mãe, resulta que conversa com o menino, que procura saber como vai na escola, que cozinha para ele a comida de que ele gosta, que ele está sempre a dar beijinhos…..Enfim,
42)Contrariamente ao que foi decidido na Douta Sentença, os factos dados como não provados, deverão ser dados como provados, consignando-se que o menor se sente seguro junto dos pais e do irmão, que manifesta sinais de afecto para com todos, concluindo-se pelo regresso do A. G. ao seio familiar. Se dúvidas houvesse,

Das capacidades parentais dos progenitores
43)O Tribunal a quo, decidiu dar como não provado que “os progenitores tenham melhorado e desenvolvido capacidades parentais que lhes permitem estabelecer melhores relações com o A. G. e tê-lo a residir com eles “.(ver ponto 3.º dos factos não provados).
44)Mais uma vez, mal andou o Tribunal. Senão vejamos,
45)Conforme decorre de vasta informação junta aos autos (de resto plasmada na Fundamentação de Facto da Sentença ora em crise), o A. G. tem um irmão (C. G.), agora com 15 anos de idade. Ora,
46)Em 7 de Junho de 2016, a Comissão Protecção de Crianças e Jovens de Braga, aplicou ao A. G. medida de apoio junto de outro familiar, a executar junto dos tios maternos,
47)Na mesma data, foi igualmente aplicada a mesma medida ao C. G., mas junto dos avós maternos, residentes no ..., Concelho de Ponte da Barca, tendo sido aberto processo de promoção e protecção que correu termos no Tribunal de Viana do Castelo, Secção de Família e Menores sob o n.º 3404/16.3T8BRG. Mais,
48)Durante o tempo em que o C. G. permaneceu junto dos avós (+/- dois anos), os progenitores trataram de alterar os seus hábitos, melhorar as suas competências parentais, recorrendo a pessoas que os aconselharam sobre a melhor forma de melhorarem enquanto pais, ouvindo e assimilando todos os conselhos, bem sabendo que tal era necessário e imprescindível. Mais,
49)Dado que as condições habitacionais em que se encontravam (residiam com a mãe e dois irmãos do progenitor) eram inadequadas, trataram de arranjar nova casa, passando a residir num apartamento de tipologia T2, com sala, cozinha, dois quartos (um para o casal e outro para os meninos onde foi colocado um beliche para os dois) e casa de banho, todo equipado com electrodomésticos e móveis adequados, limpo e asseado…..,
50)Durante aqueles cerca de dois anos em que o C. G. residiu com os avós maternos, os pais estiveram sempre presentes na vida do filho, telefonando-lhe diariamente e deslocando-se assiduamente a ... para o visitarem. Acresce que,
51)O C. G. passava todos os fins-de-semana em Braga junto dos pais que o iam buscar a ... (de táxi por não possuírem viatura).Passava igualmente todas as férias escolares junto dos pais, até que regressou definitivamente ao seio familiar. Com efeito,
52)A medida aplicada ao C. G. haveria de cessar, regressando este, definitivamente, a casa dos pais, por se considerar que os progenitores tinham melhorado consideravelmente as suas competências parentais, demonstrando interesse na vida e bem-estar do filho, assegurando todas as condições para a sua segurança e desenvolvimento harmoniosos. Acresce que,
53)Como se aludiu, os pais, enquanto o C. G. residiu com os avós, estiveram sempre presentes na vida do filho, comparecendo às reuniões na escola, velando pela sua saúde, indo-o buscar sempre a ... . Ora, ao contrário da posição desde sempre assumida pelos tios cuidadores em relação ao A. G. (incumprimento do regime de visitas estabelecido, afastamento do menino dos pais, tentativas várias e reiteradas para que os pais não estivessem com o menino e que este não participasse do dia a dia dos pais), a avó materna sempre permitiu e, diga-se até incentivou, que o C. G. passasse o mais tempo possível com os pais, culminando no seu regresso a casa. Ora,
54)Como se depreende, os pais sempre estiveram junto do filho C. G. (tal como sempre quiseram estar junto do A. G.), não só porque era seu desejo fazê-lo, mas também porque a avó materna o permitiu, coisa que os tios cuidadores (sobretudo a tia) sempre impediu, escondendo informações relevantes sobre o menino, incumprindo o regime de visitas estabelecido e pressionando o A. G. para que este não estivesse com os pais. Mas sem prescindir,
55)Em 18.01.2021 (muito tempo depois de o C. G. ter regressado a casa dos pais) a Meritíssima Juiz do Tribunal a quo, haveria de se pronunciar sobre a Cessação da Medida aplicada ao menor, pugnando, na senda do igualmente promovido pela Digníssima Magistrada do Ministério Público junto do Tribunal a quo, pelo arquivamento dos autos,
56)Fundamentando tal decisão – e cito- “ resulta do relatório social que a residência reúne as condições de conforto e habitabilidade, encontra-se equipada com mobiliário novo, o jovem frequenta o 8.º ano na escola de ... com currículo adaptado, é muito responsável e preocupado com as tarefas escolares, revela bom aproveitamento, com níveis de bom e muito bom, é assíduo e pontual e comparece sempre com os cuidados de higiene e boa apresentação assegurado, é carinhoso e adequado na relação com os outros. O pai revela-se muito preocupado e atento às necessidades do filho, estabelecendo contacto regular com a escola e o C. G. gosta de estar integrado na turma. Decorre, pois, do exposto, que não se verifica qualquer situação de perigo a que o jovem se encontre exposto, pelo que não se encontram reunidos os pressupostos que legitimam uma intervenção de promoção de direitos e de protecção, tornando-se, pois, desnecessária a aplicação de qualquer medida de promoção e protecção”. -fim de citação. Ora,
57)Como resulta do que acaba de se citar, quer para a Digníssima Magistrada do Ministério Público quer para a Meritíssima Juiz do Tribunal a quo, não restam dúvidas de que o menor C. G. se encontra bem e seguro junto dos pais, que estes se mostram atentos e preocupados com o menor, que reúnem todas as condições habitacionais e parentais para ter consigo o seu filho e que provêm, de forma adequada, a todas as suas necessidades, demonstrando ser bons pais, cuidando da segurança, bem estar, higiene, saúde física e emocional do seu filho, assim assumindo na íntegra todas as responsabilidades de pais. Ora, a ser assim, como de facto é,
58)Como compreender que na Douta Sentença ora em crise se diga, a propósito dos mesmos pais, precisamente o contrário? Como compreender que, entre o dia 18.01.2021 e o dia 03.03.2022 (data da Sentença sobre o A. G.), os mesmos pais passem de atentos e preocupados com o C. G. a pessoas que não “desenvolveram capacidades parentais que lhes permitem estabelecer melhores relações com o filho” (A. G.) ou ainda a pessoas com um “estilo parental desajustado”!!!!!!!!!!Não estamos aqui a lidar com dois processos distintos e desconexos relativos, por exemplo, a dois menores um de Faro outro de Braga, com decisões diferentes ou com factos diferenciadores. Estamos sim a falar de dois meninos, irmãos, com os mesmos pais, que agem e se comportam de igual forma para com os dois, sem estabelecer qualquer diferença entre ambos. Estamos ainda a falar de dois processos decididos pelo mesmo tribunal !!!!!!!! Mais,,
59)Os progenitores não são apenas bons pais do C. G.. São bons pais do C. G. e do A. G., ponto.
60)E nem se diga que os progenitores não estabelecem contactos de qualidade e/ou proximidade com o menor A. G., pois, como acima se aludiu, os tios cuidadores sempre trataram, por todos os meios, de afastar os pais do A. G. e este dos pais.
61)Salvo o devido respeito que é muito, o Tribunal fez tábua rasa de factos que bem conhecia e que deveriam ter sido tidos em conta na decisão sobre o A. G., mormente, apreciando e valorando o que sabia, conhecia e havia decidido sobre o C. G.,
62)Ao invés de decidir de uma forma para o C. G. e de outra completamente diferente no que ao A. G. diz respeito,
63)Incorrendo o Ilustre Tribunal a quo numa imensa contradição, o que não se aceita. Com efeito,
64)Em processos como o dos autos, o Tribunal, na análise da prova, deve ter em conta todos os elementos recolhidos que sejam relevantes para fundamentar a decisão, o que, claramente, aqui não foi feito. Ora,
65)Ao ter decidido em relação ao A. G. precisamente o contrário que decidiu em relação ao C. G., o Tribunal a quo, teve aqui o que poderemos apelidar de “ justiça a duas velocidades”,
66)O que de todo se aceita. Efectivamente, a Justiça deve ser, entre outros, a particularidade do que é justo e correcto, como o respeito à igualdade.
67)Nenhuma sentença pode ser justa se o que gera é desigualdade. Mais,
68)A justiça do caso, plasmada na Sentença, deve ser clara e passível de ser entendida por todos os aqueles a que se dirige e pela sociedade em geral. Ora, no caso dos autos, não só nenhum cidadão compreenderá ter sido decidido em relação ao C. G. que os pais são aptos e responsáveis e em relação ao A. G., precisamente o contrário, nem a compreendem os pais nem o C. G.. E, mais ainda,
69)Ao decidir como decidiu, o Tribunal põe em causa o desenvolvimento harmonioso do C. G., pois este não compreende (nem pode compreender) que, sendo os pais como são e conhecendo as suas competências, se decida que estes podem “tomar conta de si” mas já não do irmão. Além disso, também não compreende porque é que, sem razão alguma, se vê separado do seu irmão de quem tanto gosta e com quem deseja voltar a conviver diariamente. Ora,
70)Tal incompreensão (legítima) acarreta já para o C. G. sentimentos de desagrado e revolta, podendo, no limite, gerar desrespeito pelas regras instituídas, o que levará a que este possa vir a tornar-se um jovem irresponsável, revoltado, incumpridor das regras, com baixa no seu rendimento escolar, em suma, tudo em contrário ao que hoje é (lembre-se que o C. G. é carinhoso, assíduo, responsável….).

DA ALEGADA INGRATIDÃO DOS PROGENITORES PARA COM OS TIOS CUIDADORES
71)As incongruências e contradições a que acima se aludiu, não são as únicas que vêm plasmadas na Sentença de que ora se recorre. Com efeito, na fundamentação dos factos não provados, pode ler-se na sentença: . e cito – “ nas declarações dos progenitores que, em audiência de julgamento, mantiveram a postura descrita nos relatórios periciais (ou seja, a progenitora de passividade e o progenitor de intolerância perante opiniões diversas) e de ingratidão para com os tios do menor (sem consciência para o facto de que, caso os tios, em 2016, não tivessem assumido o menor A. G. a seu cargo, este teria sido institucionalizado(…).
72)Atentemos na, alegada, ingratidão dos pais face aos tios cuidadores.
73)Contrariamente ao plasmado na sentença, nunca os pais demonstraram ingratidão para com os tios cuidadores. Senão vejamos,
74)Do Relatório de Perícia Psicológica Forense datado de 6/7/2021, em que a examinada é a mãe, pode ler-se: “S. M. refere comunicar com a cunhada para acertar pormenores das visitas com o menor, descrevendo: ela tenta interagir para bem do menino, demonstrando reconhecer o cuidado da parte da cunhada para que a comunicação seja positiva entre todos os cuidadores. Reconhece que o A. G. é bem tratado junto dos tios, contudo quer o filho junto de si e do pai” – fim de citação. Ora,
75)Do que acaba de transcrever-se, resulta claro que a mãe reconhece o que os tios fazem em prol do A. G.. Mais, da citação acima resulta igualmente claro que o Tribunal adoptou (erradamente) uma perspectiva e visão subjectivas do caso, o que não deveria ter acontecido. Com efeito,
76)Atente-se, mais uma vez, no que se transcreveu, mormente na última parte: “ (sem consciência para o facto de que, caso os tios, em 2016, não tivessem assumido o menor A. G. a seu cargo, este teria sido institucionalizado”). Ora,
77)Trata-se de uma consideração eminentemente subjectivista e sem qualquer suporte factual, que, por um lado, está em contradição com o que se transcreveu do Relatório e, por outro, revela, por parte do julgador, tendência para considerar algo de um ponto de vista pessoal. Ora,
78)Mergulhar”, sem mais, em critérios de subjectividade, pode levar (e leva com certeza) a que se assista a decisões cuja certeza se discute, por falta de neutralidade nas mesmas.
79)Necessário (rectius) imprescindível se torna a redução do subjectivismo, sob pena de este se tornar um sério embaraço à segurança e certeza que se espera da Justiça. Acresce que,

DO INCUMPRIMENTO POR PARTE DOS TIOS CUIDADORES DAS OBRIGAÇÕES PARA COM OS PAIS
79)Como acima por diversas vezes se frisou, os tios cuidadores tudo fizeram para manter o A. G. afastado dos pais e estes do seu filho, incumprindo o regime de visitas, desmarcando, muitas vezes sem justificação, as visitas agendadas, ocultando factos e circunstâncias relevantes da vida do menino, rejeitando os pais, apresentando o menino como se fosse seu filho ……
80)Tudo com o intuito claro de ficar com a guarda do menor, atendendo a que a tia não pode ter filhos. Com efeito,
81)Como acima se disse, os tios nunca comunicaram aos pais onde o menino frequentava a catequese, quando e onde fez a primeira comunhão, onde jogava futebol, como estava em termos de saúde….
82)Numa clara violação das obrigações a que estavam adstritos. Mais,
83)Por inúmeras vezes, os pais questionaram os tios (sobretudo a tia) para que esta desse informações sobre a vida do menino, ao que esta sempre se recusou, respondendo, de forma arrogante e prepotente, que “não o fazia, porque não tinha de o fazer e que eles não tinham nada com isso”.
84)A resposta que sempre foi dada aos pais, e bem assim a forma arrogante e prepotente com que foi transmitida, haveria de ser, pela tia, repetida em audiência de julgamento, numa clara manifestação de quem está convicta de que nenhuma obrigação tem para com estes pais. Com efeito,
85)Atente-se, neste particular, nas declarações prestadas pela tia gravadas em audiência de julgamento (suporte informático 20220224114718_5748957_2870518 minutos 03.27 a 06.37)
Advogado dos tios: Segundo julgo saber ele treina e frequenta o clube de futebol ali na vossa zona…O Este?
Mãe: (tia do menor): Sim, São Pedro.
Adv.tios: São Pedro ou São Mamede?
Tios: São Pedro.
Adv.tios: Ele gosta?
Mãe: Sim, gosta de ir…
Adv.tios: Os pais conhecem essa actividade?
Mãe: Sabem que tem futebol.
Adv.tios: Mas sabem onde é, qual é o clube?
Mãe: Não sabem porque não tenho que os informar.
M.Juiz: Tem sim de informar. Os pais não tem de perguntar a Senhora é que tem de lhes dizer no início do ano lectivo, o menino tem este horário, o menino está neste centro de estudos, o menino tem este horário da catequese, os pais não têm de perguntar. Podem fazê-lo mas vocês é que têm o dever de informar.
Mãe: Eu disse que o A. G. ia ter actividades só não disse qual era o sítio.
M.Juiz: Quanto às actividades do A. G. vocês é que têm de dizer.
86)Por sua vez, e ainda a respeito deste assunto, a instâncias da Advogada Signatária, declarou a tia (declarações gravadas no mesmo suporte mas entre os minutos 13.44 a 15.40) :
Adv.pais: O A. G. anda na catequese, já disse que também tem futebol. Alguma vez informou os pais do A. G. onde era a catequese?
Mãe: Os pais do A. G. sabem que a Igreja é em ..….
Adv.pais: a pergunta é se alguma vez informou onde era a catequese?
Mãe: Informei. Eu falhei na questão da comunhão, toda a gente sabe disso….não achei relevante porque os pais não queriam que o C. G. fosse à catequese e nós achámos que….
Adv.pais: Mas a questão é o A. G...
Mãe: A minha opinião é o C. G. não quer ir à catequese porque os pais não querem então o A. G.….
Adv. pais: Em relação à comunhão do menino. Quando é que isso foi?
M.Juiz: A Senhora já assumiu e disse eu falhei. Vamos passar à frente.
87)Em declarações gravadas em suporte informático (20220224110552_5748957_2870518 entre os minutos 03.40 a 19.18) declararam os pais:
Senhora Procuradora: Ele tem catequese ao Sábado?
Mãe: Sim.
Senhora Procuradora: Vocês têm condições para garantir as actividades de Sábado? Levá-lo à catequese e ao futebol?
M.Juiz: O que a Senhora Procuradora está a perguntar é se podem vocês levá-lo à catequese e ao futebol?
Pai: Não sabemos onde é a catequese nem o futebol.
M.Juiz: Mas têm carro?
Pai: Não, seria de autocarro.
Senhora Procuradora: E futebol também não sabem onde é?
Pai e Mãe: Não.
Senhora Procuradora: Quando ele vai ao médico, vocês sabem disso?
Pai: Não, nada. Só soubemos quando teve Covid.
Senhora Procuradora: Já perguntaram aos tios onde é a catequese e o futebol?
Pai e Mãe: Já.
Senhora Procuradora: E então eles não vos disseram?
Pai e Mãe: Não.
Pai: Queria dizer uma coisa. Fui com o A. G. para a Rodovia jogar à bola e ele estava a jogar muito bem mas depois parou de jogar e escondeu a cara, começou a chorar, veio um vizinho da tia que lhe perguntou o que estava ali a fazer, quis logo vir embora, dizendo que estava lá um vizinho da tia e que não o podia ver com os pais e acrescentou. “eles não podem saber que tu és meu pai”.
M.Juiz: O que o Senhor quer dizer é que ele tem medo dos tios e do que eles possam dizer é isso?
Pai: é isso.
Adv. dos pais: Dona S. M., disse há pouco o Sr. C. M. que não sabem onde é a catequese mas também lhes esconderam a comunhão. O menino fez a primeira comunhão?
Mãe: Fez, mas não soubemos. Soubemos depois pela minha mãe.
Adv.pais: E o que acham que pode estar na origem de não vos ter sido dito, o A. G. vai fazer a primeira comunhão, no dia X, na Igreja Y. O que pensam que pode estar na origem de tanto secretismo?
Pai: Para afastar os pais.
Adv.: Porquê?
Pai: Achamos que eles querem esconder que somos pais do A. G..
Adv. Senhor C. M., há pouco falou de uma situação que se passou na Rodovia e quando o menino estava a jogar futebol, disse que se acercou um vizinho da tia, foi isso?
Pai: Sim. Quando o viu não quis jogar mais
Adv. E vocês questionaram o menino por que é que isso aconteceu?
Pai: Sim.
Adv. O que é que ele respondeu?
Pai: Que a tia não quer que se saiba que nós somos pais dele. A tia diz que nós não somos pais dele, que somos parentes afastados.
Adv. Então o que me está a dizer é que segundo a tia, as informações que a tia presta ao menino é que vocês não são pais são parentes afastados?
Pai: Sim.
88)De tudo o que acaba de se transcrever, resulta claro que os tios (sobretudo a tia dado que o tio pouco ou nunca se manifesta), nunca respeitaram os pais, não cumpriram as obrigações que para com estes tinham e fizeram-no porque acham que nada lhes devem e ainda porque quanto menos os pais soubessem e tivessem contacto com a vida do menino, mais teriam estado próximos deste e este dos pais, coisa que os tios nunca quiseram, pois que o seu intuito sempre foi ficar com o A. G., dado que a tia não pode ter filhos biológicos. Ora, não obstante as evidências a que agora se aludiu, e contrariamente ao que devia, o Tribunal a quo nada diz sobre o comportamento destes tios, sobre a pressão que exerceram sobre o menor para que este se afastasse dos pais, sobre a actuação arrogante e prepotente da tia que considera nada ter de informar…Ora,
89)Mais uma vez se diga que em processos como o dos autos, o Tribunal, na análise da prova, deve ter em conta todos os elementos recolhidos que sejam relevantes para fundamentar a decisão, e, ao valorar o depoimento de uma testemunha ou parte deve ter em conta a forma como a declaração é feita.
90) O Tribunal a quo, ao arrepio de muitas evidências claras e inequívocas em sentido contrário (quanto mais não fosse a questão relativa ao C. G. que este Tribunal tão bem conhece), ao decidir que os progenitores não desenvolveram capacidades parentais que lhes permitem estabelecer melhores relações com o A. G. e tê-lo a residir com eles e ao regular as responsabilidades parentais do menor A. G. a favor dos tios cuidadores,
91) Decidiu (erradamente) não permitir a reunificação da família, não permitir que os meninos irmãos vivam e cresçam juntos e não permitiu que estes pais que amam os seus filhos, lutam por eles, asseguram o seu bem-estar e cumprem todos os requisitos para serem bons pais (como de resto a Senhora Juiz do Tribunal sabe pois conhece o caso do C. G.), o possam ser. Assim sendo,
92) Face a tudo o que se expôs, Requer-se aos Venerandos Desembargadores que seja a Sentença revogada e substituída por outra em que se decida entreguar o menor A. G. aos cuidados dos seus pais, para que a família se reúna e, juntos, sigam no caminho do desenvolvimento harmonioso destes jovens que tanto precisam dos seus pais.
ASSIM FAZENDO JUSTIÇA!».
*
O Ministério Público apresentou contra-alegações, nas quais pugna pelo não provimento do recurso e confirmação do decidido (ref.ª 36093).
*
O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (ref.ª 179761246).
*
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
*
II. Delimitação do objeto do recurso

Sendo o âmbito dos recursos delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente – arts. 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil (doravante, abreviadamente, designado por CPC), aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho –, ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, as questões que se colocam à apreciação deste Tribunal, por ordem lógica da sua apreciação, consistem em saber:
1.ª – Da impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto;
2ª – Saber se o superior interesse do menor impunha que a criança ficasse a residir com os pais, devendo ser estes quem exerce as responsabilidades parentais.
*
III. Fundamentos

IV. Fundamentação de facto.

A) A sentença recorrida deu como provados os seguintes factos:
1- A. G., nascido em -.05.2009, em Braga, é filho de C. M. e S. M. (cfr. fls. 10 dos autos principais);
2- Em 8 de Março de 2016, na sequência de sinalização proveniente do Agrupamento de Escolas ... sobre criança vítima de negligência ao nível da supervisão e acompanhamento familiar, foi aberto processo na CPCJ de Braga relativamente ao A. G. (cfr. fls. 15-21);
3- Em 7 de Junho de 2016, a CPCJ deliberou, por unanimidade dos presentes, a aplicação da medida de apoio junto de outro familiar, a executar junto dos tios maternos B. C., padrinho do A. G., e C. R. (cfr. fls. 73-76 dos autos principais);
4- Na mesma data, foi aplicada ao seu irmão C. G. a medida de promoção e protecção de apoio junto dos avós maternos, residentes no ..., Concelho de Ponte da Barca (cfr. fls. 372 verso do processo principal);
5- Em 19 de Outubro de 2016 foi instaurado processo de promoção e protecção a favor do menor A. G., no âmbito do qual foi aplicada ao menor, em 28.11.2016, a medida provisória de apoio junto dos tios maternos por seis meses; em 14.12.2016, foi aplicada a medida de apoio juntos dos tios maternos, pelo prazo de seis meses (cfr. fls. 207-209 dos autos principais), mantida por mais seis meses, por despacho datado de 27.09.2017 (cfr. fls. 240 e 241 dos autos principais), mantida por mais seis meses, por despacho de 24.10.2017 (cfr. fls. 257 dos autos principais) e prorrogada por mais seis meses, por despacho de 22.06.2018 (cfr. fls. 313 dos autos principais);
6- O A. G. manifestou boa ligação afectiva aos tios e, desde que integrou o seu agregado familiar, registou uma evolução favorável nas áreas da saúde, educação e socialização, bem como de arranjo e cuidado pessoal (cfr. fls. 372 verso dos autos principais);
7- Por despacho de 12.11.2019 (cfr. fls. 388-390 dos autos principais) foi determinado o arquivamento dos autos de promoção e protecção e, foi fixado o seguinte regime provisório de Regulação de Exercício das Responsabilidades Parentais:
I - RESIDÊNCIA da criança e atos da vida corrente:
1.1- O A. G. ficará a residir habitualmente com os tios maternos - B. C. e C. R. -, que ficam incumbidos de zelar e acautelar pelo respectivo bem-estar, a eles cabendo o exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente do sobrinho.

II- QUESTÕES DE PARTICULAR IMPORTÂNCIA:

2.1- As responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância serão exercidas em comum por ambos os progenitores e pelos tios guardiães, ressalvados os casos de urgência manifesta, em que qualquer deles poderá agir sozinho, prestando contas ao outro logo que possível.

III - Direito de VISITAS:

3.1- O A. G. estará com os pais ao fim-de-semana, com pernoita, de quinze em quinze dias, levando-o a tia a casa dos pais às 18:30 horas de sábado (no final da catequese) e recolhendo-o no domingo às 18:00 horas.
3.1.1- O regime que antecede inicia-se no próximo dia 23 de Novembro.
3.2.- À terça-feira, o A. G. jantará com os pais, que o recolhem na escola, no final das actividades escolares pelas 16:40 horas e os tios recolhem em casa dos pais às 21:00 horas.
3.3 - Os dias festivos de Natal e Ano Novo do corrente ano serão passados da seguinte forma:
3.3.1 - O dia 24 de Dezembro, será passado com os tios e o dia 25 de Dezembro será passado com os pais desde as 12:00 horas até às 21:00 horas, sendo os pais a ir buscar a casa dos tios e os tios a recolher em casa dos pais.
3.3.2 - O dia 31 de Dezembro será passado com os pais, com pernoita, desde as 12:00 horas do dia 31 até às 12:00 horas do dia 1 de Janeiro, sendo os pais a ir buscar a casa dos tios e os tios a recolher em casa dos pais.

IV - ALIMENTOS:

4.1- A título de alimentos os pais contribuirão para o sustento do filho com a prestação mensal de €75,00, que entregarão aos tios até ao dia 8 de cada mês mediante depósito ou transferência bancária, actualizada anualmente, a partir de Janeiro de 2021 em €3,00.
4.2- As despesas de saúde e educação, devidamente comprovadas e não comparticipadas, serão suportadas pelos progenitores e pelos tios em partes iguais.
4.3- As despesas de saúde e de educação do menor deverão ser comunicadas, por e email, no prazo de 8 dias, após a sua realização e pagas, mediante comprovação documental da sua efectivação, no prazo de 30 dias, a contar da sua comunicação;
8- O progenitor é beneficiário de pensão de invalidez, no montante mensal de € 1.043,00, e a progenitora está desempregada, vivem, juntamente com o C. G., que tem 15 anos de idade e frequenta o 9º ano na Escola EB2/3 de ..., num apartamento T2, arrendado, ascendendo a renda à quantia mensal de € 450,00, situado em frente à Escola de ...;
9- O tio é militar da GNR e a tia é gerente da loja da ... em Barcelos, auferindo cada um deles € 1.000,00 líquidos, vivem, com o A. G., num T2, sito em ..., adquirido com recurso a empréstimo bancário;
10- O A. G. frequenta o 7º ano na Escola EB 2/3 de ...;
11- O A. G. mantém uma relação positiva e próxima com o C. G., relativamente ao qual demonstra afeição;
12- A progenitora do A. G. e a tia materna mantêm uma comunicação positiva, acertando entre elas pormenores relativos às visitas do menor;
13- A progenitora, na interacção com o A. G., mantém uma postura de passividade, não promove o diálogo e a proximidade, demonstra alguma falta de atenção às necessidades, interesses e gostos do filho;
14- O progenitor demonstra características de personalidade egocêntrica, vulnerável e ansiosa perante situações de maior vulnerabilidade, manifesta sentimentos de rejeição, associados ao facto de sofrer de atrofia muscular e estar numa cadeira de rodas, essencialmente por parte da família da esposa;
15- Na interacção com o A. G. verifica-se um clima tenso e desconfortável pois o A. G. não se sente à vontade com o pai e este não consegue adoptar uma atitude promotora do bem estar do filho, colocando-o sob pressão ao confrontá-lo, durante a realização da perícia, com a escolha entre pais e tios;
16- Mostrou dificuldades em identificar gostos e preferências do menor, bem como, descrever actividades realizadas em conjunto como filho que possam ser consideradas gratificantes para ambos;
17- Os tios maternos demonstram possuir competências parentais adequadas e positivas, demonstram interesse e preocupação com o menor e evidenciam estar a par dos seus gostos e preferências bem como das suas principais características;
18- São emocionalmente calorosos, demonstram forte apego ao A. G., a quem tratam como filho, mantém com ele uma interação positiva, afectuosa, responsiva e disponível, o qual se mostra totalmente à vontade no contacto com os tios, existindo entre todos comportamentos afectuosos e espontâneos;
19- São capazes de proporcionar ao menor um ambiente familiar seguro e afectuoso;
20- O A. G. manifesta forte vinculação aos tios cuidadores, cuja relação é percepcionada como capaz de prestar suporte emocional, segurança, apoio à individualidade e aceitação pessoal pois percepciona-os como pessoas atentas, protectoras que o aceitam como é;
21- Na relação com os tios demonstrou sempre à vontade, procurou contacto e pediu a cooperação dos tios que foram responsivos às necessidades do menor;
22- No contacto com os pais, demonstrou sentir ansiedade, apreensão e tensão, os quais não revelaram comportamentos que permitissem à criança sentir-se livre e à vontade, pressionando o menor sobre a tomada de uma posição entre pais e tios;
23- O A. G. manifesta sentir bastante pressão na presença dos pais, essencialmente do pai, considera-os pessoas menos atentas e menos disponíveis, associando-os a maior pressão para que se comporte de acordo com o desejo destes e percepciona relativamente aos pais um sentimento de maior afastamento afectivo;
24- Está bem integrado no agregado familiar dos tios, potenciador de adaptação e ajustamento psicológico;
25- Na sequência do acordado entre os progenitores e os tios (após contactos entre a tia e a progenitora), o regime provisório foi adaptado aos horários e actividades extracurriculares do menor e ao facto de os pais não terem veículo automóvel, pelo que o A. G. tem estado com os pais ao fim-de-semana, com pernoita, de quinze em quinze dias, levando-o a tia a casa dos pais, no final das actividades, entre as 18h e as 20h de sexta-feira, e recolhendo-o no sábado depois do almoço;
26- Janta com os pais à segunda-feira, sendo entregue em casa dos pais pelos tios que aí o recolhem;
27- No último Natal pernoitou em casa dos pais de 23 para 24 de Dezembro, tendo os tios o recolhido às 23h do dia 24;
28- No dia 1 de Janeiro esteve em casa dos pais de manhã até às 17h, tendo sido entregue e recolhido pelos tios;
29- Os progenitores têm melhores condições habitacionais e materiais, as quais permitem que o A. G. conviva com eles e com o irmão C. G. em conformidade com o regime de visitas em vigor;
30- O A. G. quer continuar a residir com os tios, manifestou agrado pelo regime de visitas existente e demonstrou desagrado perante a possibilidade de aumento das pernoitas.
*
2.2.) E deu como não provados os seguintes factos:
1. O A. G. tem uma excelente relação com os progenitores;
2. Sempre que se encontra com os pais mostra-se feliz, seguro e manifesta constantemente sinais de carinho e afecto bem como o desejo de com eles passar a residir;
3. Os progenitores desenvolveram capacidades parentais que lhes permitem estabelecer melhores relações com o A. G. e tê-lo a residir com eles.
*
V. Fundamentação de direito.

1. Da impugnação da decisão da matéria de facto.
1.1. Em sede de recurso, os apelantes impugnam a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo tribunal de 1.ª instância.

Para que o conhecimento da matéria de facto se consuma, deve previamente o recorrente, que impugne a decisão relativa à matéria de facto, cumprir o (triplo) ónus de impugnação a seu cargo, previsto no artigo 640º do CPC, o qual dispõe que:
1- Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2- No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.».

Aplicando tais critérios ao caso, constata-se que os recorrentes indicam quais os factos que pretendem que sejam decididos de modo diverso, inferindo-se por contraponto a redação que deve ser dada (da modificação dos factos provados para não provados e destes em sentido inverso), como ainda o(s) meio(s) probatório(s) que na sua ótica o impõe(m), incluindo, no que se refere à prova gravada em que fazem assentar a sua discordância, a indicação dos elementos que permitem a sua identificação, procedendo inclusivamente à respetiva transcrição de trechos dos depoimentos testemunhais que consideraram relevantes para o efeito, julgando-se, assim, satisfeito o requisito da sua localização, pelo que podemos concluir que cumpriram suficientemente o triplo ónus de impugnação estabelecido no citado artigo 640.º.
*
1.2. Sob a epígrafe “Modificabilidade da decisão de facto”, preceitua o art. 662.º, n.º 1, do CPC, que «a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa».
Aí se abrangem, naturalmente, as situações em que a reapreciação da prova é suscitada por via da impugnação da decisão sobre a matéria de facto feita pelos recorrentes.

O âmbito da apreciação do Tribunal da Relação, em sede de impugnação da matéria de facto, estabelece-se, resumidamente, de acordo com os seguintes parâmetros (1):

- só tem que se pronunciar sobre a matéria de facto impugnada pelo recorrente;
- sobre essa matéria de facto impugnada, tem que realizar um novo julgamento;
- nesse novo julgamento forma a sua convicção de uma forma autónoma, de acordo com o princípio da livre apreciação das provas, mediante a reapreciação de todos os elementos probatórios que se mostrem acessíveis (e não apenas os indicados pelas partes).
- a reapreciação da matéria de facto por parte da Relação tem que ter a mesma amplitude que o julgamento de primeira instância.
- a intervenção da Relação não se pode limitar à correção de erros manifestos de reapreciação da matéria de facto, sendo também insuficiente a menção a eventuais dificuldades decorrentes dos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação das provas.
- ao reapreciar a prova, valorando-a de acordo com o princípio da livre convicção, a que está também sujeita, se conseguir formar, relativamente aos concretos pontos impugnados, uma convicção segura acerca da existência de erro de julgamento da matéria de facto, deve proceder à modificação da decisão.
- se a decisão factual do tribunal da 1ª instância se basear numa livre convicção objetivada numa fundamentação compreensível onde se optou por uma das soluções permitidas pela razão e pelas regras de experiência comum, a fonte de tal convicção - obtida com benefício da imediação e oralidade - apenas poderá ser afastada se ficar demonstrado ser inadmissível a sua utilização pelas mesmas regras da lógica e da experiência comum.
- a demonstração da realidade de factos a que tende a prova (art. 341º do Cód. Civil) não é uma operação lógica, visando uma certeza absoluta. A prova “visa apenas, de acordo com os critérios de razoabilidade essenciais à aplicação prática do Direito, criar no espírito do julgador um estado de convicção assente na certeza relativa do facto” (2). O mesmo é dizer que “não é exigível que a convicção do julgador sobre a realidade dos factos alegados pelas partes equivalha a uma certeza absoluta, raramente atingível pelo conhecimento humano. Basta-lhe assentar num juízo de suficiente probabilidade ou verosimilhança” (3).
*
1.3. Por referência às suas conclusões, extrai-se que os recorrentes pretendem:

i) - A alteração da resposta positiva para negativa dos pontos 13, 14, 15, 16 e 30 dos factos provados da decisão recorrida;
ii) - A alteração da resposta negativa para positiva dos pontos 1, 2 e 3 dos factos não provados da decisão recorrida.
Cumpre, pois, analisar das razões de discordância invocadas pelos apelantes e se as mesmas se apresentam de molde a alterar a facticidade impugnada, nos termos por si invocados.
Vejamos circunstanciadamente cada um dos factos impugnados.

< Do ponto 13 da matéria de facto provada da decisão recorrida.

Referem os recorrentes que a referida facticidade não deveria ter sido dada como provada, erigindo para tanto as declarações da progenitora – das quais, dizem, resultam evidências claras de que a mesma promove o diálogo e a proximidade com o A. G. e está atenta às suas necessidades, gostos e interesses –, bem como das declarações prestadas pelo próprio A. G., na audiência de julgamento de 24/02/2022.
Da audição das declarações da progenitora decorre que, às perguntas da Exma. mandatária dos recorrentes sobre como era a sua relação com o A. G. (?) – dando-lhe conta que no Relatório se referia que falava pouco e que era pouco interactiva com o menino – e como é enquanto pessoa (?), respondeu a progenitora afirmando ser tímida e calma e que a «relação com o A. G. é boa»; por sua vez, às perguntas “Conhece os gostos dele? Procura o contacto com ele? Cozinha para ele? O que gosta ele de comer?”, respondeu dizendo cozinhar o que ele gosta (como seja batatas fritas com bife, sopa), mais acrescentando perguntar-lhe (ao menor) se tem estado bem, como vai a escola e que ele, quando está com ela, está sempre a dar-lhe beijinhos, reiterando considerar-se uma pessoa introvertida e tímida.
Já o menor afirmou que umas vezes gosta e outras não da comida que a mãe lhe faz, não gostando dos legumes, mas rematando que a mãe cozinha bem.
Alicerçando exclusivamente a sua impugnação em tais trechos, certo é que os recorrentes desvalorizam por completo todas as informações colhidas nas perícias realizadas aos pais, aos cuidadores e ao menor, as quais, mostrando-se expressas nos relatórios periciais juntas aos autos, resultaram de entrevistas de observação e da recolha de informação junto de todos os envolvidos.

De tais perícias resulta que (4):

- a progenitora reconhece “o cuidado da parte da cunhada para que a comunicação seja positiva entre todos os cuidadores. Reconhece que o A. G. é bem tratado junto dos tios, contudo quer o filho junto de si”; “(…) identifica-se um padrão de exercício de uma disciplina relaxada, caracterizada pela definição de regras pouco claras e omissão relativamente ao cumprimento das mesmas.
A monitorização positiva parece estar pouco presente na dinâmica relacional com o menor. Esta prática define-se como o conjunto de práticas parentais que envolvem atenção e conhecimento dos pais acerca do seu filho, das atividades desenvolvidas, dos gostos e preferências, com demonstrações de afeto e carinho dos pais, principalmente relacionados aos momentos de maior necessidade da criança.
Na interação com o menor, foi evidente uma postura de passividade no contato com o menor, que não promove o diálogo e a proximidade”.
A “S. M. demonstrou características de passividade no relacionamento com o menor. Afetivamente, o menor esteve distante dos pais e S. M. responsabiliza os tios por essa postura. Contudo, não existiram da sua parte comportamentos que incentivassem à proximidade e ao diálogo positivo com o menor.
Nas suas práticas educativas, (…), S. M. tenderá a adotar práticas em que a monitorização positiva dos comportamentos do menor é escassa, demonstrando alguma falta de atenção às necessidade, interesses e gostos do filho.
Mostrou dificuldades em identificar, gostos e preferências do menor, bem como descrever atividades realizadas em conjunto com o filho, que possam ser consideradas gratificantes para ambos. Refere que A. G. gosta de estar com o irmão a jogar.
S. M. beneficiaria de uma intervenção focalizada no desenvolvimento de competências parentais positivas, fomentando um papel mais ativo da sua parte no desenvolvimento do menor e o desenvolvimento de estratégias de cooperação e investimento afetivo, que possam beneficiar a sua relação com o menor”;
Assim, sem embargo do indefectivel amor, afecto e carinho que a progenitora demonstra pelo menor A. G. (e que não está em causa), a verdade é que, no tocante à interação com o menor, os elementos probatórios carreados aos autos são aptos a formar neste Tribunal uma convicção coincidente com a da Mmª Juíza julgadora, sendo manifesto que os parcos excertos das declarações invocados pelos recorrentes na impugnação deduzida de modo algum são aptos a habilitar-nos a proferir (ou a impor-nos) uma decisão distinta sobre o ponto fáctico impugnado.
Termos em que se julga improcedente a impugnação do referido ponto de facto.
*
< Dos pontos 14, 15 e 16 dos factos provados da decisão recorrida;

Os mencionados pontos têm a seguinte redação:
«14- O progenitor demonstra características de personalidade egocêntrica, vulnerável e ansiosa perante situações de maior vulnerabilidade, manifesta sentimentos de rejeição, associados ao facto de sofrer de atrofia muscular e estar numa cadeira de rodas, essencialmente por parte da família da esposa;
15- Na interacção com o A. G. verifica-se um clima tenso e desconfortável pois o A. G. não se sente à vontade com o pai e este não consegue adoptar uma atitude promotora do bem estar do filho, colocando-o sob pressão ao confrontá-lo, durante a realização da perícia, com a escolha entre pais e tios;
16- Mostrou dificuldades em identificar gostos e preferências do menor, bem como, descrever actividades realizadas em conjunto como filho que possam ser consideradas gratificantes para ambos».
Pretendem os recorrentes ver alteradas as respostas aos referidos pontos fácticos estribando-se para o efeito nas declarações prestadas pelo A. G. na audiência de julgamento, bem como nas declarações prestadas pelo progenitor.
Quanto a estas últimas dir-se-á desde logo que os recorrentes não especificaram as passagens da gravação em que fundam o seu recurso (tão pouco tendo procedido à transcrição dos excertos que consideram relevantes), pelo que esse meio de prova torna-se imprestável para o fim pretendido.
Por outro lado, o curto excerto do depoimento do A. G. reproduzido não é suficiente nem idóneo para infirmar a convicção formada pelo Tribunal recorrido no sentido das respostas dadas ao pontos fácticos em discussão.

Também nesta parte assume particular relevância o teor dos relatórios periciais realizados, dos quais resulta (na parte que ora releva) que (5):
- quanto ao progenitor, “sobressai o recurso a comportamentos típicos do exercício de uma monitorização negativa (ou supervisão estressante) caracterizada pelo excesso de fiscalização dos pais sobre a vida dos filhos e pela grande quantidade de instruções repetitivas. Esta prática educativa poderá induzir um clima familiar hostil, stressado e sem diálogo, já que os filhos tentam proteger sua privacidade evitando falar com os pais sobre suas particularidades.
Na avaliação das caraterísticas de personalidade, sobressaem características de preocupação do individuo com o funcionamento somático, que em situações de stress poderá levar a maior vulnerabilidade, egocentrismo e dificuldade em manifestar respostas emocionais profundas. Sentimentos de inadequação e rejeição são facilmente despertáveis no contato com os outros (sente-se tratado de modo inferior).
Do ponto de vista do funcionamento psicológico (…) surgem indicadores de mal-estar resultante da perceção do funcionamento somático da ansiedade e de um funcionamento cognitivo com tendência à projeção e hostilidade e egocentrismo.
Na interação com o menor, foi evidente alguma tensão do pai, perante o desconforto de A. G., na sua presença e da mãe. C. M. justifica o comportamento retraído do menor com a pressão que acredita ser exercida pelos tios. Contudo, no contato com o filho, não foi capaz de cativar o filho para uma interação mais positiva e confortável. Como exemplo, C. M. questionou o filho sobre com quem pretende ficar, o que colocou o menor numa situação de desconforto acrescido e de pressão”.
O progenitor “demonstrou características de personalidade egocêntrica, vulnerável em situações de stress. Manifesta sentimentos de rejeição, associados à sua condição de saúde, essencialmente por parte da família da esposa.
Na interação com o menor, sobressaiu um clima relacional tenso e desconfortável.
A criança não se sentiu à-vontade com o pai, e este não conseguiu adotar uma atitude promotora do bem-estar do filho, colocando-o sobre pressão ao confronta-lo com a escolha entre pais e tios.
Nas suas práticas educativas, com base nos instrumentos aplicados, C. M. tenderá a exercer uma monitorização stressante sobre o comportamento de A. G., que poderá gerar um clima de maior hostilidade.
Mostrou dificuldades em identificar, gostos e preferências do menor, bem como descrever atividades realizadas em conjunto com o filho, que possam ser consideradas gratificantes para ambos.
Do ponto de vista psicológico, o seu funcionamento parece assentarem características de egocentrismo e ansiedade perante situações de maior vulnerabilidade, onde sentimentos de rejeição social são facilmente despertáveis.
Estas características influenciaram fortemente a qualidade do vinculo afetivo com o menor, que poderá sentir-se pressionado para corresponder às expectativas do pai, gerando um ambiente familiar mais inseguro para a criança”.
Acresce que, não obstante o acima mencionado acerca da não prestabilidade das declarações do progenitor por não indicação da respetiva localização, ainda assim não deixou este Tribunal de as ouvir na íntegra (gravadas em suporte informático 202202224110552_5748957_2870518), não decorrendo delas qualquer valia probatória com vista a infirmar ou alterar a decisão sobre os concretos pontos da matéria de facto (6).
Donde se conclui pela manutenção das respostas aos pontos fácticos impugnados.
*
< Do ponto 30 da matéria de facto provada da decisão recorrida.

O mencionado ponto fáctico apresenta a seguinte redação:

«30- O A. G. quer continuar a residir com os tios, manifestou agrado pelo regime de visitas existente e demonstrou desagrado perante a possibilidade de aumento das pernoitas».
Sustentam os recorrentes que, inexplicavelmente, as declarações prestadas pelo menor (a instâncias da própria Mm.ª Juíza “a quo”) não foram tidas em conta por considerar que tais declarações haviam sido prestadas de forma comprometida, conclusão esta a que o Tribunal não poderia ter chegado.
Pois bem, o trecho do depoimento do menor assinalado pelos recorrentes diz unicamente respeito ao seu agrado (ou não) quanto à possibilidade de passar com o irmão uma semana no verão, no período de férias, e nada tem a ver com o aumento das pernoitas com os progenitores.
Embora o menor tenha respondido afirmativamente – “uma semana sim”, em férias –, a verdade é que o modo como terá verbalizado essa posição não terá sido convincente, considerando a Mmª Juíza “a quo” que o fez de forma comprometida.
Sublinhe-se, porém, que a Mmª Julgadora não deixou de justificar a referida conclusão a que chegou, conjugando-a com o facto dessa «última afirmação se mostrar contrária à afirmação anterior de que “o tempo que passa em casa dos pais é suficiente, não quer ficar mais tempo”», pelo que, «articulando o declarado com o facialmente demonstrado pelo A. G., interpretou a vontade do menor no sentido de não pretender o alargamento do regime de visitas em vigor”».
No fundo, a perceção assinalada tem atinência com as circunstâncias típicas que decorrem do princípio da imediação, que só são alcançáveis por quem preside à inquirição e que a mera reprodução dos depoimentos gravados, dada a sua limitação, não consegue transmitir ou reproduzir (7).
Em reforço daquela conclusão assinale-se a menção feita pela Ex.ma Procuradora quando, a propósito da possibilidade do menor passar com os pais de sexta-feira a domingo e de o A. G. ter manifestado que preferia estar com os pais (só) de sexta para sábado, até porque tem saudades da casa dos tios, ter aquela verbalizado que “essa cara diz tudo”, apreciação esta que também só percetível através da imediação.
Acresce que, contrariamente ao propugnado pelos recorrentes, o facto de, nessa parte, ter sido considerado que tais declarações do menor foram prestadas de forma comprometida, tal não inibe o tribunal de valorar, positiva ou negativamente, o remanescente das demais declarações prestadas, porquanto o facto de uma parcela do depoimento do interveniente ser imprestável não inquina ou invalida necessariamente todo o depoimento.
Isto porque, ao contrário do que ocorre com a confissão (art. 360º do CC), inexiste o princípio da indivisibilidade do depoimento, pelo que cabe ao julgador cindir os segmentos do depoimento que se afiguram sinceros e verazes daqueles que são forjados e errados (8).
Foi, aliás, o próprio menor que manifestou que o actual regime de visitas ao fim de semana estava bem (com pernoita de sexta a sábado, atentas as atividades extraescolares), afirmando gostar de lá ir por causa do irmão, mas que é suficiente, o mesmo sucedendo com o dia da semana em que vai jantar a casa dos pais (segunda feira) - “um dia chega”, disse o menor.
Podemos assim concluir que, das declarações prestadas pelo menor A. G., resulta inequívoco que este pretende continuar a residir com os tios, manifestou agrado pelo regime de visitas existente e demonstrou contrariedade perante a possibilidade do aumento das pernoitas em casa dos progenitores.
Essa manifestação de vontade mostra-se, de resto, em consonância com o resultado da avaliação psicológica realizada ao menor, da qual se destacamos os seguintes elementos (9):
- «O menor mantém contato com os pais, semanalmente. Salienta, contextualizando estes contatos, a interação com o irmão, com quem diz gostar de "jogar playstation" (sic). Sobre as dinâmicas em casa dos pais, A. G. refere que está "quase sempre a jogar ... não saio muito ... " (sic), não identificando atividades ou rotinas de interação positiva com os pais, "vou mais passear com os tios, vamos ao parque, jogamos em casa, brinco com o meu amigo ... " (sic).
Foi observada a dinâmica relacional entre o menor e os tios e entre o menor e os pais. Na presença dos tios, A. G. mostrou-se completamente à-vontade, livremente explorou a atividade que lhe foi pedida, solicitando espontaneamente colaboração ora do tio ora da tia. Procurou o contato físico co a tia, sentando-se no seu colo. Ambos os tios forma responsivos, emocionalmente calorosos.
Na presença dos pais, o menor manteve uma postura de bastante pressão, ansiosa, retraída. Não interagiu espontaneamente com os pais e a sua expressão facial foi sempre de tensão e desconforto. Os pais revelaram alguma dificuldade em interagir positivamente com o filho, oscilando entre a passividade e o mencionar da alegada pressão que consideram estar a ser exercida pelos tios.
No seu desenho de família, A. G. representa-se a si próprio, o tio e a tia, em interação positiva e fazendo referência a sentimentos positivos decorrentes da convivência entre os três. Associa a liberdade de praticar atividades com os pares aos cuidados dos tios.
A exploração do clima sociofamiliar, decorrente dos relacionamentos, crescimento pessoal, organização e controlo do sistema familiar, permite considerar a existência de diferenças significativas na perceção que o menor tem dos dois ambientes familiares. No domínio [do] crescimento pessoal, ao contexto familiar dos tios, são associados interesses, objetivos e atividades familiares que contribuem para o bem-estar e crescimento pessoal do menor.
(…) A qualidade das relações interpessoais, coesão, compromisso ajuda e suporte entre os membros da família, bem como o incentivo à expressão emocional livre aparece claramente associada ao contexto de casa dos tios.
Estes dados sugerem uma melhor adaptação social e familiar da criança ao contexto familiar dos tios.
A perceção do menor sobre as práticas parentais dos tios reflete um conjunto de práticas que encorajam a sentir-se bem na relação com os cuidadores, aprovado na sua individualidade, com expressões verbais e físicas de amor, apoio emocional, aprovação e sentimentos de eficácia, refletindo uma dimensão de suporte emocional positiva.
Os tios são considerados como pessoas atentas, protetores, mas não exercendo excessiva proteção que pode originar stress ou mal-estar ou evitar comportamentos de independência. Não é associada aos tios, com base na perspetiva do menor, o fator de pressão para que se comporte de acordo com o desejo destes.
A perceção do menor sobre as práticas parentais dos pais não evidencia indicadores de suporte emocional, comportamentos que que encorajem a sentir-se bem na relação com os pais e aprovado na sua individualidade. Os pais são considerados como pessoas menos atentas, menos disponíveis para a criança e para os seus interesses. Aos pais é associada, com base na perspetiva do menor, uma maior pressão para que se comporte de acordo com o desejo destes.
(…)
A dimensão Comunicação e Proximidade Afetiva, que avalia a qualidade da comunicação e sentimento de proximidade é associada claramente à figura da tia e do tio. A perceção de aceitação mútua e capacidade de compreensão (e.g. "aceitam-se tal como sou") aparece claramente associada á figura da tia e do tio.
O sentimento de maior afastamento afetivo é percecionado relativamente às figuras dos pais».

E nele se conclui que:
O «A. G. manifesta uma forte vinculação aos tios cuidadores, cuja relação é percecionada pela criança como capaz de prestar suporte emocional, segurança, apoio à individualidade e aceitação pessoal. Na relação com os tios, o menor demonstrou sempre à-vontade, procura o contato e pede a cooperação dos tios. Estes foram responsivos às necessidades do menor.
No contato com os pais, A. G. demonstrou sentir ansiedade, apreensão e tensão. Estes não revelaram comportamentos que permitissem à criança sentir-se livre e à vontade, pressionando o menor sobre a tomada de uma posição entre pais e tipos. Mostraram-se menos sensíveis às necessidades do A. G..
A criança manifesta sentir bastante pressão na presença dos pais, essencialmente do pai, que poderá indicar o medo de não corresponder ao esperado pelo pai, uma vez que este questiona diretamente o menor se quer ficar com eles.
A criança apresenta indicadores de um estado de desenvolvimento normativo, tendo em conta a idade, considerando-se ter evoluído nos últimos anos.
Encontra-se bem integrado no agregado familiar dos tios cuidadores (…)».
Acresce que, não obstante ao longo de todo o processo (e que é reiterado na apelação), os recorrentes concentrarem essencialmente a sua argumentação nas motivações menos abonatórias ou não desinteressadas dos tios cuidadores (10), a verdade é que os elementos probatórios disponíveis nos autos não permitem secundar tais juízos depreciativos.
Pelo contrário, os autos indicam da parte dos tios cuidadores uma atitude positiva de cooperação e de responsabilidade, em prol da salvaguarda do interesse do menor, caraterísticas estas que estão arredadas do comportamento adoptado pelos progenitores do menor.
Resta, por conseguinte, subscrever por inteiro a resposta sobre o ponto fáctico impugnado, improcedendo este fundamento da apelação.
*
Da alteração da resposta negativa para positiva dos pontos 1, 2 e 3 dos factos não provados da decisão recorrida.
Insurgem-se os recorrentes contra a resposta ao ponto 3 dos factos não provados invocando para o efeito o circunstancialismo fáctico e a decisão judicial atinente à cessação da medida de promoção e protecção aplicada ao menor C. G., irmão do A. G., relativamente ao qual foi decidido que aquele menor «se encontra bem e seguro junto dos pais, que estes se mostram atentos e preocupados com o menor, que reúnem todas as condições habitacionais e parentais para ter consigo o seu filho e que provêm, de forma adequada, a todas as suas necessidades, demonstrando ser bons pais, cuidando da segurança, bem estar, higiene, saúde física e emocional do seu filho, assim assumindo na íntegra todas as responsabilidades de pais», o que se revela em manifesta contradição com o explicitado na sentença recorrida, onde se refere que os pais não «“desenvolveram capacidades parentais que lhes permitem estabelecer melhores relações com o filho” (A. G.) ou ainda a pessoas com um “estilo parental desajustado”», sendo que os progenitores não são apenas bons pais do C. G., sendo, sim, bons pais do C. G. e do A. G..
Com o devido respeito, julgamos que a argumentação desenvolvida pelos recorrentes padece de uma petição de princípio, posto que o contexto vivencial do menor C. G. não é – nem foi – inteiramente idêntico ao que subjaz ao do irmão A. G..
Na verdade, tendo a CPCJ deliberado, em 7/07/2016, a aplicação ao menor A. G. da medida de apoio junto de outro familiar, a executar junto dos tios maternos, B. C. e C. R., foi na mesma data aplicada ao seu irmão C. G. a medida de promoção e protecção de apoio junto dos avós maternos.
Neste processo em particular cuida-se apenas da regulação das responsabilidades parentais referentes ao menor A. G., e não do C. G., pelo que qualquer tentativa de aproveitamento do que se decidiu no processo referente ao menor C. G. tem-se por infundado; desde logo porque, apesar de ambos os menores terem beneficiado da mesma medida de apoio junto de outro familiar, essa medida foi executada junto de familiar distinto (o menor A. G. foi colocado sob a guarda dos tios maternos, enquanto o C. G. foi colocado à guarda dos avós maternos), tendo sido diferenciada a inserção de cada um dos menores junto dos respetivos familiares a quem foram confiados.
O mesmo é dizer que a solução acolhida na situação do C. G. na sequência da cessação da medida de proteção não vale necessariamente para o menor A. G., não dispensando a sua apreciação e valoração casuística.
O princípio da igualdade encontra-se acolhido pelo art. 13.º da Constituição da República Portuguesa que, no seu n.º 1, dispõe, genericamente, terem todos os cidadãos a mesma dignidade social, sendo iguais perante a lei, especificando o n.º 2, por sua vez, que «ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social».
Segundo a generalidade da jurisprudência do Tribunal Constitucional (11), o princípio postula que se dê tratamento igual a situações de facto essencialmente iguais e tratamento desigual para as situações de facto desiguais. Inversamente, o princípio proíbe o tratamento desigual de situações iguais e o tratamento igual das situações desiguais.
Nesta mesma linha, afirmou-se, entre muitos outros, no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 362/2016, in www.dgsi/tc.pt., que «a Constituição não proíbe todo e qualquer tratamento diferenciado. Proíbe, isso sim, as discriminações negativas atentatórias da (igual) dignidade da pessoa humana e as diferenças de tratamento sem qualquer razão justificativa e, como tal, arbitrárias».
Como tem sido defendido, o princípio da igualdade não exige o tratamento igual de todas as situações, mas sim o tratamento igual de situações (substancialmente) iguais.
A qualificação das várias situações como iguais ou desiguais depende do carácter idêntico ou distinto dos seus elementos essenciais.
Em suma, só há que tratar por igual o que na sua essência for igual. A não discriminação não significa nem pressupõe uma igualdade jurídica em todas as relações.
Nesta conformidade, e ressalvando sempre o devido respeito por opinião contrária, é nosso entendimento que a argumentação invocada pelos recorrentes é manifestamente insubsistente posto que, sendo distinta a realidade fáctica que serve de pressuposto às duas decisões em confronto, não se vê como é que a solução adoptada no processo referente ao menor C. G. tenha forçosamente de ser replicada ou transposta, sem mais, no processo atinente à regulação do exercício das responsabilidades parentais do irmão A. G..
Já no tocante às asserções de que, “ao decidir como decidiu, o Tribunal põe em causa o desenvolvimento harmonioso do C. G., pois este não compreende (nem pode compreender) que, sendo os pais como são e conhecendo as suas competências, se decida que estes podem “tomar conta de si” mas já não do irmão» e de que o mesmo «também não compreende porque é que, sem razão alguma, se vê separado do seu irmão de quem tanto gosta e com quem deseja voltar a conviver diariamente», dir-se-á que esta última questão tem direta atinência com o mérito da causa, podendo eventualmente comportar erro de julgamento da matéria de direito, mas nada tem a ver com um suposto erro de julgamento da matéria de facto.
No presente processo há que cuidar da obtenção da solução que melhor salvaguarde o superior interesse do menor A. G., e não do menor C. G., se bem que não se pode deixar de reconhecer que, em sede de apreciação ulterior da matéria de direito, haverá também de aquilatar se a melhor solução passa por manter os dois irmãos conjuntamente ou não.
Contudo, tais questões não se confundem, nem se subsumem, à matéria de facto, pelo que julgam-se improcedentes tais argumentos tendo em vista a impugnação da matéria de facto deduzida.
De igual modo, a questão atinente à alegada (inexistência da) ingratidão dos progenitores para com os tios cuidadores, que no dizer dos recorrentes traduz uma incorreta valoração da fundamentação dos factos não provados, tão só teria relevância se, dela se discordando, determinasse de per si a alteração/modificação de um concreto facto (não provado, no caso).
Olvidam, porém, os recorrentes que na formação da sua convicção a Mmª Juíza “a quo” não se limitou a invocar a referida ingratidão dos tios do menor para alicerçar a resposta negativa aos factos em apreço.

Na verdade, em abono da sua decisão aduziu igualmente:
- o teor dos relatórios perícias que relatam a relação distante entre o menor e os progenitores;
«- as declarações do A. G. que afirmou gostar de ir à casa dos pais para estar com o irmão e, dessa forma, centrou no afecto pelo seu irmão C. G. o foco da sua vontade em manter os convívios com os progenitores;
- as declarações dos progenitores que, em audiência de julgamento, mantiveram a postura descrita nos relatórios periciais (ou seja, a progenitora de passividade e o progenitor de intolerância perante opiniões diversas) (…), tendo o progenitor acabado por assumir, de forma espontânea, que “agora temos mais dinheiro mas como pais somos iguais”».
De qualquer modo, sempre se dirá que este Tribunal revê-se na conclusão firmada na motivação da sentença recorrida, denotando-se uma ingratidão dos progenitores (sobretudo do progenitor C. M.) para com os tios do menor, o qual não se consegue dissociar da convicção de que os tios cuidadores se aproveitaram da situação – pois a C. R. está biologicamente impedida de ter filhos –, tudo não passando de um esquema para ficarem com o A. G., esquecendo ou não tendo consciência de que, «caso os tios, em 2016, não tivessem assumido o menor A. G. a seu cargo, este teria sido institucionalizado».
Daí que se comungue da afirmação final da motivação da matéria de facto no sentido de resultar “de toda a prova produzida que os pais do A. G. têm condições habitacionais e materiais que lhes permitem conviver com o A. G. em conformidade com o regime de visitas em vigor mas não resultou provado que desenvolveram capacidades parentais que lhes permitem estabelecer melhores relações com o filho (o qual demonstra sentir ansiedade, apreensão e tensão no contacto com os pais – cfr. factos provados 22º e 23º)”.
Em suma, por referência aos concretos meios de prova erigidos como justificadores da impugnação dessa matéria de facto e por apelo às regras da experiência comum e da lógica normal da vida (proficientemente explicitadas pela Mmª Juíza “a quo”), é de concluir que aqueles não têm a aptidão de credibilidade que os apelantes lhes pretendem atribuir.
Não tendo sido produzida prova suficiente à formação de uma convicção positiva deste Tribunal quanto à veracidade dos factos impugnados a que correspondem os pontos 1, 2 e 3 da matéria de facto não provada da decisão recorrida, todos merecem respostas negativas.
*
Nesta conformidade, por referência à prova produzida nos autos, não se evidenciam razões concretas e circunstanciadas capazes de infirmar a apreciação crítica feita pelo tribunal recorrido sobre a matéria de facto impugnada.
De facto, a fundamentação que serviu de base a essas conclusões dadas pela 1.ª instância – que subscrevemos, nos termos supra explicitados –, baseando-se na livre convicção e sendo uma das soluções permitidas pela razão e pelas regras de experiência comum, revela-se convincente e sustentada à luz da prova auditada e não se mostra fragilizada pela argumentação probatória dos impugnantes, não se impondo decisão sobre os referidos pontos da matéria de facto diversa da recorrida (art. 640º, n.º 1, al. b) do CPC).
Em suma, não se evidenciando dos autos qualquer elemento idóneo que possa abalar a livre convicção do tribunal recorrido quanto aos fundamentos da decisão sobre a matéria de facto, resta concluir pela total improcedência da pretensão dos recorrentes, mantendo-se inalterada a decisão sobre a matéria de facto fixada na sentença recorrida.
*
2. – Reapreciação da matéria de direito

2.1. No âmbito do presente recurso interposto no processo tutelar cível de regulação do exercício das responsabilidades parentais os recorrentes/progenitores peticionam a revogação da sentença recorrida, substituindo-a por outra que decida entregar o menor A. G. aos cuidados dos seus pais, de modo a permitir a reunificação da família e, juntos (o A. G. e o irmão C. G.), sigam no caminho do desenvolvimento harmonioso que tanto precisam dos seus pais, sendo que estes amam os seus filhos, lutam por eles, asseguram o seu bem-estar e cumprem todos os requisitos para serem bons pais, o que lhes foi coartado na sentença impugnada.
Em suma, pretendem os progenitores que o exercício (definitivo) das responsabilidades parentais lhes seja atribuído, com a consequente revogação da decisão recorrida que determinou que o menor A. G. ficará entregue à guarda e cuidados dos seus tios B. C. e C. R., com a fixação da residência do menor junto destes, que exercerão as responsabilidades parentais relativamente aos actos da vida corrente do menor, devendo as questões de particular importância da vida do mesmo ser decididas pelos tios e pelos progenitores;
A decisão a ponderar por este Tribunal de recurso reconduz-se a saber e apurar, no presente, se a sentença recorrida não consagrou a melhor solução para o menor A. G., ou seja, se aquela decisão não acautela a solução de vivência que melhor se adequa ao concreto e real interesse do menor ao confiar a sua guarda a terceira pessoa, ponderando o seu grau de integração, a sua actual vivência, a sua real vontade, bem como as vantagens de que poderá beneficiar para o seu desenvolvimento e formação.
Tarefa que, reconheça-se desde já, não se configura fácil ou assaz lógica, mas antes dependente de uma multiplicidade de factores a indagar necessária ponderação.
*
2.2. Os processos tutelares cíveis têm a natureza de jurisdição voluntária (arts. 12º e 3º, al. c), do Regime Geral do Processo Tutelar Cível (RGPTC) – aprovado pela Lei n.º 141/2015, de 08/09).

A atividade de jurisdição voluntária carateriza-se fundamentalmente:
1) Pela consagração do princípio do inquisitório no plano da alegação de factos e da prova (art. 986º, n.º 2, do CPC).
Nessa medida, o tribunal pode investigar livremente os factos, coligir as provas, ordenar os inquéritos e recolher as informações convenientes. A sua atividade inquisitória prevalece sobre a atividade dispositiva das partes.
2) Segundo o critério de julgamento, nas providências a tomar o tribunal não está sujeito a critérios de legalidade estrita, devendo antes adotar em cada caso a solução que julgue “mais conveniente e oportuna” (art. 987º do CPC). Tem assim a liberdade de poder decidir de acordo com a equidade, procurando a solução que melhor serve os interesses em causa.
3) As decisões tomadas, sem prejuízo dos efeitos já produzidos, podem sempre ser revistas, desde que ocorram factos supervenientes que justifiquem ou tornem necessária essa alteração (art. 988º, n.º 1, do CPC) (12).
O acordo ou a sentença de regulação do exercício das responsabilidades parentais não são, pois, imutáveis.
4) Das resoluções proferidas segundo critérios de conveniência ou oportunidade não é admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça (art. 988º, n.º 2, do CPC).
*
2.3. Relativamente ao conteúdo das responsabilidades parentais, prescreve o art. 1877º do Código Civil (CC) que “os filhos estão sujeitos ao poder paternal até à maioridade ou emancipação”, competindo aos pais, “no interesse dos filhos, velar pela segurança e saúde destes, prover ao seu sustento, dirigir a sua educação, representá-los, ainda que nascituros, e administrar os seus bens” – cfr. o n.º 1 do art. 1878º do CC –, bem como, de acordo com as suas possibilidades, promover o desenvolvimento físico, intelectual e moral dos filhos, proporcionando-lhes adequada instrução geral e profissional, correspondente, na medida do possível, às aptidões e inclinações de cada um (cfr. art. 1885º, nºs 1 e 2, do CC). Só ficam desobrigados de prover ao sustento dos filhos e de assumir as despesas relativas à sua segurança, saúde e educação na medida em que os filhos estejam em condições de suportar aqueles encargos, pelo produto do seu trabalho ou outros rendimentos (art. 1879º do CC).

E, no que respeita aos deveres dos pais e filhos por efeitos da filiação, aduz o art. 1874º do CC que:
1. Pais e filhos devem-se mutuamente respeito, auxílio e assistência.
2. O dever de assistência compreende a obrigação de prestar alimentos e a de contribuir, durante a vida em comum, de acordo com os recursos próprios, para os encargos da vida familiar”.
Na pendência do matrimónio, prescreve o art. 1901º, n.º 1, do CC que “o exercício das responsabilidades parentais pertence a ambos os pais” e, “se um dos pais praticar acto que integre o exercício das responsabilidades parentais, presume-se que age de acordo com o outro (…).” – cfr. o n.º 1, 1ª parte do art. 1902º do mesmo diploma.

Prevendo acerca do exercício das responsabilidades parentais em caso de divórcio, separação judicial de pessoas e bens, declaração de nulidade ou anulação do casamento, prescreve o art. 1906º (13) do CC que:

1 - As responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho são exercidas em comum por ambos os progenitores nos termos que vigoravam na constância do matrimónio, salvo nos casos de urgência manifesta, em que qualquer dos progenitores pode agir sozinho, devendo prestar informações ao outro logo que possível.
2 - Quando o exercício em comum das responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho for julgado contrário aos interesses deste, deve o tribunal, através de decisão fundamentada, determinar que essas responsabilidades sejam exercidas por um dos progenitores.
3 - O exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente do filho cabe ao progenitor com quem ele reside habitualmente, ou ao progenitor com quem ele se encontra temporariamente; porém, este último, ao exercer as suas responsabilidades, não deve contrariar as orientações educativas mais relevantes, tal como elas são definidas pelo progenitor com quem o filho reside habitualmente.
4 - O progenitor a quem cabe o exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente pode exercê-las por si ou delegar o seu exercício.
5 - O tribunal determinará a residência do filho e os direitos de visita de acordo com o interesse deste, tendo em atenção todas as circunstâncias relevantes, designadamente o eventual acordo dos pais e a disponibilidade manifestada por cada um deles para promover relações habituais do filho com o outro.
6 - Quando corresponder ao superior interesse da criança e ponderadas todas as circunstâncias relevantes, o tribunal pode determinar a residência alternada do filho com cada um dos progenitores, independentemente de mútuo acordo nesse sentido e sem prejuízo da fixação da prestação de alimentos.
7 - Ao progenitor que não exerça, no todo ou em parte, as responsabilidades parentais assiste o direito de ser informado sobre o modo do seu exercício, designadamente sobre a educação e as condições de vida do filho.
8 - O tribunal decidirá sempre de harmonia com o interesse do menor, incluindo o de manter uma relação de grande proximidade com os dois progenitores, promovendo e aceitando acordos ou tomando decisões que favoreçam amplas oportunidades de contacto com ambos e de partilha de responsabilidades entre eles.
9 - O tribunal procede à audição da criança, nos termos previstos nos artigos 4.º e 5.º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível”.

Sob a epígrafe “Exercício das responsabilidades parentais quando o filho é confiado a terceira pessoa”, dispõe o art. 1907.º do CC:

«1 - Por acordo ou decisão judicial, ou quando se verifique alguma das circunstâncias previstas no artigo 1918.º, o filho pode ser confiado à guarda de terceira pessoa.
2 - Quando o filho seja confiado a terceira pessoa, cabem a esta os poderes e deveres dos pais que forem exigidos pelo adequado desempenho das suas funções.
3 - O tribunal decide em que termos são exercidas as responsabilidades parentais na parte não prejudicada pelo disposto no número anterior».

E estatui o art. 1918.º(“Perigo para a segurança, saúde, formação moral e educação do filho”) do CC:
«Quando a segurança, a saúde, a formação moral ou a educação de um menor se encontre em perigo e não seja caso de inibição do exercício das responsabilidades parentais das responsabilidades parentais, pode o tribunal, a requerimento do Ministério Público ou de qualquer das pessoas indicadas no n.º 1 do artigo 1915.º, decretar as providências adequadas, designadamente confiá-lo a terceira pessoa ou a estabelecimento de educação ou assistência».
A regulação do exercício das responsabilidades parentais tem por objecto decidir quanto ao destino dos filhos (com a inerente fixação da residência da criança), fixar os alimentos que lhes são devidos e a forma da respectiva prestação, fixar o regime de visitas no tocante ao progenitor que não tem os menores a seu cargo e ainda a atribuição do exercício das responsabilidades parentais.

Conforme resulta dos normativos citados, o atual sistema de exercício das responsabilidades parentais, instituído pela Lei n.º 61/2008, de 31/10, orienta-se pelos seguintes princípios:
- Exercício em comum dessas responsabilidades, salvo excepções;
- Exercício em comum mitigado das responsabilidades parentais quando os pais não vivam juntos;
- Possibilidade de exercício das responsabilidades parentais por terceiro (quando a criança é entregue ou confiada a terceira pessoa).

Na previsão do regime adjectivo do presente processo tutelar cível, refere o n.º 1 do art. 40º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível (RGPTC) – aprovado pela Lei n.º 141/2015, de 08/09 –, que o exercício das responsabilidades parentais será regulado de harmonia com os interesses da criança, devendo determinar-se que seja confiado a ambos ou a um dos progenitores, a outro familiar, a terceira pessoa ou a instituição de acolhimento, aí se fixando a residência daquela”, acrescentando o n.º 2 que “é estabelecido regime de visitas que regule a partilha de tempo com a criança, podendo o tribunal, no interessa desta e sempre que se justifique, determinar que tais contactos sejam supervisionados pela equipa multidisciplinar de assessoria técnica, nos termos que forem ordenados pelo tribunal”.
Decorre do exposto que o princípio fundamental a observar no exercício das responsabilidades parentais é o do interesse da criança – cfr. arts. 40º, n.º 1, do RGPTC e 1905º, n.º 1 e 1909º, ambos do Código Civil.
Trata-se de conceito jurídico indeterminado ou aberto que, apesar de não ser definível, «é dotado de uma especial expressividade, funcionando como uma noção mágica”, de força apelativa e tendência humanizante”; não sendo “susceptível de uma definição em abstracto que valha para todos os casos”, este critério do “interesse do menor” “só adquire eficácia” (e sentido) “quando referido ao interesse de cada criança, pois há tantos interesses da criança como crianças» (14).
A prossecução do interesse do menor acarreta que o julgador proceda à sua concretização em face do circunstancialismo concreto, e não de um qualquer modelo estereotipado, recorrendo para o efeito aos valores familiares, educativos e sociais que, sendo dominantes em dado momento, informam a vivência do menor e permitem determinar as necessidades e as condições adequadas ao seu bom desenvolvimento e ao seu bem estar material e moral.
A lei não define o que deva entender-se por interesse do menor, cabendo ao juiz, em toda a amplitude que resulta dos arts. 1906º e seguintes do CC, identificar e definir, em cada caso, esse interesse superior da criança, por alguns já definido como “o direito do menor ao desenvolvimento são e normal no plano físico, intelectual, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade” (15) ou como tratando-se de uma “noção cultural intimamente ligada a um sistema de referências vigente em cada momento, em cada sociedade, sobre a pessoa do menor, sobre as suas necessidades, as condições adequadas ao seu bom desenvolvimento e ao seu bem-estar material e moral” (16).
Em situação de dissociação familiar, o interesse do menor pode ser identificado com o estabelecimento de condições psicológicas, materiais, sociais e morais favoráveis ao desenvolvimento harmónico da criança e à sua progressiva autonomização (17).
Na determinação do destino dos filhos menores há, portanto, que ver o que mais convém para a formação equilibrada das suas personalidades, evitando-se-lhes traumas de qualquer espécie.
A entrega ou confiança dos menores deve ser feita (melhor, manter-se) a quem melhores situações oferece na sua formação e educação, a quem mostre maior garantia de protecção e guarda, pelo seu carinho e dignidade, afecto e exemplo (18).
Em segundo lugar, há que analisar as possibilidades ou alternativas que os meios em confronto são susceptíveis de lhes proporcionar.
Isto porque a criança necessita de saúde física e de bem-estar material (para garantir a sobrevivência e o desenvolvimento das potencialidades) e cuidados emocionais (como condição de uma escolha autónoma).
Os menores gostam de estabilidade e sossego e há que proporcionar-lhes o melhor ambiente familiar e mantê-las no meio ambiente a que se adaptaram.
Deve, pois, tomar-se em linha de conta a disponibilidade afectiva demonstrada pelos progenitores, ou terceira pessoa, a capacidade, ou não, dos progenitores em promoverem o harmonioso desenvolvimento do menor e de se adaptar às suas necessidades.
O princípio do superior interesse da criança traduz, pois, o propósito de bem estar, protecção e promoção do filho que ainda não tenha completado 18 anos de idade. O referido princípio confere prioridade ao interesse da criança na “continuidade de relações de afeto de qualidade e significativas” (art. 4º, al. a) da LPCJP (19)) e em “manter uma relação de grande proximidade com os dois progenitores”, no caso de divórcio ou separação (art. 1906º, n.º 8, do CC) (20).
Concluímos, portanto, que o interesse da criança ou jovem passa pela existência de um projecto educativo; pela efectiva prestação de cuidados básicos diários (alimentos, higiene, etc.); pela prestação de carinho e afecto; pela transmissão de valores morais; pela manutenção dos afectos com o outro progenitor e a demais família (designadamente irmãos e avós); pela existência de condições para a concretização do tal projecto educativo; pela criação e manutenção de um ambiente seguro, emocionalmente sadio e estável; pela existência de condições físicas (casa, espaço íntimo) e pela dedicação e valorização com vista ao desenvolvimento da sua personalidade.
Antes de prosseguirmos para a análise do caso concreto, importa ter também presente as particularidades do exercício das responsabilidades parentais por terceiros, como seja as possibilidades excepcionais do exercício das responsabilidades parentais por outrem, que não os pais, em concreto na situação prevista no supra citado art. 1907º do CC.
Segundo o art. 36º, n.º 6, da CRP os «filhos não podem ser separados dos pais, salvo quando estes não cumpram os seus deveres fundamentais para com eles e sempre mediante decisão judicial» (21).
A garantia de não privação dos filhos é, por conseguinte, um direito subjectivo a favor dos pais – as restrições a esse direito estão sob reserva da lei e sob reserva de decisão judicial (art. 36º, n.º 6, da CRP) (22) .
Por mais que se aceite a existência de um “direito subjectivo” dos pais a terem os filhos consigo, é, no entanto, o denominado “interesse superior da criança” – conceito abstracto a preencher face a cada caso concreto – que deve estar acima de tudo. Se esse “interesse subjectivo” dos pais não coincide com o “interesse superior” do menor, não há outro remédio senão seguir este último interesse (23).
As “responsabilidades parentais” não são “um conjunto de faculdades de conteúdo egoísta e de exercício livre, ao arbítrio dos respectivos titulares, mas um conjunto de faculdades de conteúdo altruísta que tem de ser exercido de forma vinculada, de harmonia com a função do direito, consubstanciada no objectivo primacial de protecção e promoção dos interesses do filho, com vista ao seu desenvolvimento integral” (24).
Os pais devem saber pôr os filhos em primeiro lugar, mostrar civismo em prol dos filhos, pela simples razão de que “os filhos precisam de ambos”, cabendo ao tribunal “ajudar os pais a trabalhar em conjunto tendo em vista o bem-estar dos seus filhos” e o futuro do qual são ambos colaboradores e responsáveis, mas sem colocar demasiada ênfase na solidariedade familiar, porquanto, não raras vezes, a tentativa de manter as famílias unidas a qualquer custo pode ser demasiado prejudicial (25).
Não se desconhece que a doutrina tem questionado a constitucionalidade do preceito contido no art. 1907º, n.º 1, do CC, na redação da Lei n.º 61/2008, de 31/10 (26), que admite que um filho menor seja confiado a terceira pessoa por decisão judicial, independentemente de se terem verificado algumas das circunstâncias previstas no art. 1918º do CC (27).
Contudo, seguindo a posição preconizada por Maria Clara Sottomayor (28), entendemos ser lícito conferir-lhe um sentido compatível com a CRP, interpretando o segmento normativo em apreço como uma referência ao perigo emocional ou psicológico gerado pela separação da criança em relação à sua pessoa de referência quando esta não é nenhum dos progenitores biológicos.
A criança, que desde o seu nascimento ou idade muito precoce foi criada por terceiras pessoas com quem contruiu fortes laços afetivos semelhantes à filiação, é uma criança em perigo, em termos psicológicos, para efeitos do art. 3º e ss. da LPCJP. A criança que vive nestas condições, sem que a relação afectiva construída com as pessoas que cuidam de si esteja protegida por uma decisão judicial, vive numa situação de instabilidade e de insegurança, em virtude de, a qualquer momento, poder ser reclamada pelos pais biológicos e desinserida da “família de facto”, que sempre conheceu e amou. Trata-se, portanto, de um perigo psicológico e emocional profundíssimo para uma criança, e ao qual os tribunais não podem ser insensíveis, fazendo prevalecer o vínculo biológico sobre a continuidade e a qualidade dos laços afetivos estabelecidos entre a criança e a sua família de facto (29) (30).
Neste sentido, a Lei n.º 142/2915, de 8/09 – que procedeu à segunda alteração da LPCJP –, acrescentou ao art. 3º da citada lei, na al. d), uma nova situação de perigo, passando a reconhecer-se expressamente que se encontra em situação de perigo a criança que “[e]stá aos cuidados de terceiros, durante período de tempo em que se observou o estabelecimento com estes de forte relação de vinculação e em simultâneo com o não exercício pelos pais das suas funções parentais”.
Assim, como refere a citada autora cuja explanação vimos seguindo de perto, a “referência do art. 1907º/1 a «decisão judicial» está abrangida pela norma do art. 1918º e pelo art. 3º da LPCJP, cujo âmbito foi alargado ao perigo psicológico da separação da criança em relação aos seus cuidadores.
O efeito útil da formulação do art. 1907º/1 significa que esta decisão judicial pode ser proferida num processo de regulação do exercício das responsabilidades parentais e não apenas numa ação tutelar comum de limitação do exercício das responsabilidades parentais nos termos do art. 1918º”.
Em consonância com o alargamento da noção de “criança em perigo”, o conceito de interesse superior da criança e do jovem foi concretizado no art. 4º/a) da LPCJP, de forma a incluir a protecção da “continuidade de relações de afeto de qualidade e significativas”; na al. h) do mesmo preceito, no princípio da prevalência da família, acrescentou-se, para além da família biológica e adoptiva, «outra forma de integração familiar estável» e introduziu-se um novo princípio orientador da intervenção do Estado para a promoção dos direitos e proteção da criança, na al. g), em que se consagrou o «primado da continuidade das relações psicológicas profundas», nos termos do qual «a intervenção deve respeitar o direito da criança à preservação das relações afetivas estruturantes de grande significado e de referência para o seu saudável e harmónico desenvolvimento, devendo prevalecer as medidas que garantam a continuidade de uma vinculação securizante».
Nas palavras de Maria Clara Sottomayor (31), «estas alterações legislativas refletem os dados da psicologia que confirma que a separação da criança das pessoas que, independentemente dos laços biológicos, desempenharam a função parental, causa às crianças danos sociológicos e de saúde mental, como depressões, fúrias violentas, adaptação superficial às outras pessoas, angústias, risco de instabilidade afectiva ou fuga, assim como a experiência de um sofrimento emocional e um retrocesso no desenvolvimento. Os tribunais devem considerar estes danos nas suas decisões. A criança é uma pessoa e não uma cidadã de segunda categoria ou um ser inanimado, sem sentimentos e vontade própria».
O legislador tornou, assim, clara a protecção devida às crianças que vivem ao cuidado de terceiros, dando um lugar de destaque na lei à família afetiva, afirmando a sua essencialidade para o desenvolvimento das crianças (32).
Como se disse, é o superior interesse da criança que norteia toda a regulação do exercício do poder paternal, e, modernamente, tem-se entendido que o factor relevante para determinar esse interesse é constituído pela regra da figura primária de referência, segundo a qual a criança deve ser confiada é pessoa que cuida dela no dia-a-dia (33).
Esta regra permite, por um lado, promover a continuidade da educação e das relações afectivas da criança e por outro, atribuir a guarda dos filhos ao progenitor [ou terceira pessoa] com mais capacidade para cuidar destes e a quem estes estão mais ligados emocionalmente. A figura primária de referência será, também, em regra, aquele progenitor com quem a criança prefere viver.
A regra da figura primária de referência é um critério objectivo e funcional, relacionado com o dia-a-dia da criança, ou seja, com a realização de tarefas concretas prestadas ao menor, no quotidiano (34).
No tocante à jurisprudência do TEDH (35), como critério decisivo de interpretação das normas de direito interno, há que ter presente que aí se tem considerado que a relação entre crianças e famílias de acolhimento ou de facto, que delas cuidam em substituição dos pais, constitui vida familiar para o efeito do art. 8º da CEDH (36) (Moretti and Beneditti v. Italy) e que a recusa em reconhecer a estas famílias direito de vista viola o art. 8 da CEDH (Kopf and Liberda v. Austria).
Também já entendeu o TEDH que a transferência da guarda da família de acolhimento para os pais biológicos, quando causa às crianças danos psíquicos, viola o art. 8º, considerando, por outro lado, que a relação de parentalidade estritamente biológica não está protegida como «vida familiar», quando não está associado a prestação de cuidados, responsabilidade financeira e laços afectivos com os filhos (Rieme v. Sweden de 22/04/1992, e K. e T. c. Finlândia, n.º 25702/94, de 12/07/2001 e Gorgulu v. Germany, de 26/05/2004).
Se a fronteira entre as obrigações positivas e as obrigações negativas do Estado a título do art. 8.º da Convenção não se presta a uma definição precisa, os princípios aplicáveis são todavia comparáveis. Em particular, nos dois casos, há que ter em conta o justo equilíbrio que deve ser respeitado entre os interesses concorrentes – os da criança, os dos dois pais e os da ordem pública (Maumousseau e Washington c. França, n.º 39388/05, § 62, CEDH 2007-XIII) -, tendo em conta todavia que o interesse superior da criança deve constituir a consideração determinante (ver, neste sentido, Gnahoré, supra, § 59), podendo segundo a sua natureza e a sua gravidade, prevalecer sobre o dos pais (Sahin c. Alemanha [GC], n.º 30943/96, § 66, CEDH 2003-VIII). Além do mais, a dispersão de uma família constitui uma ingerência muito grave; uma medida conducente a uma semelhante situação deve, assim, assentar sobre considerações inspiradas pelo interesse da criança e de um peso e de uma solidez bastantes (Scozzari e Giunta c. Itália, [GC], n.ºs 39221/98 e 41963/98, § 148, CEDH 2000-VIII).
*
2.4. - Feito este exercício de índole teórica ou abstrata, é altura de particularizarmos o caso concreto.

Dos autos resulta demonstrado que:
- A. G., nascido em -.05.2009, é filho de C. M. e S. M.;
- Em - de Março de 2016, na sequência de sinalização proveniente do Agrupamento de Escolas ... sobre criança vítima de negligência ao nível da supervisão e acompanhamento familiar, foi aberto processo na CPCJ de Braga relativamente ao A. G. e, em -.06.2016, a CPCJ deliberou, por unanimidade dos presentes, a aplicação da medida de apoio junto de outro familiar, a executar junto dos tios maternos, B. C., padrinho do A. G., e C. R., encontrando-se o A. G., desde esta data, a residir com eles;
- O A. G. sempre manifestou boa ligação afectiva aos tios e, desde que integrou o seu agregado familiar, registou uma evolução favorável nas áreas da saúde, educação e socialização, bem como de arranjo e cuidado pessoal;
- O A. G. frequenta o 7º ano, na Escola EB 2/3 de ...;
- Na interacção com o A. G., a progenitora mantém uma postura de passividade, não promove o diálogo e a proximidade, demonstra alguma falta de atenção às necessidades, interesses e gostos do filho;
- O progenitor demonstra características de personalidade egocêntrica, vulnerável e ansiosa perante situações de maior vulnerabilidade, manifesta sentimentos de rejeição, associados ao facto de sofrer de atrofia muscular e estar numa cadeira de rodas, essencialmente por parte da família da esposa;
- Na interacção com o A. G. verifica-se um clima tenso e desconfortável, pois o A. G. não se sente à vontade com o pai e este não consegue adoptar uma atitude promotora do bem estar do filho, colocando-o sob pressão ao confrontá-lo com a escolha entre pais e tios;
- Mostrou dificuldades em identificar gostos e preferências do menor, bem como descrever actividades realizadas em conjunto como filho que possam ser consideradas gratificantes para ambos;
- Os tios maternos demonstram possuir competências parentais adequadas e positivas, demonstram interesse e preocupação com o menor e evidenciam estar a par dos seus gostos e preferências bem como das suas principais características;
- São emocionalmente calorosos, demonstram forte apego ao A. G., a quem tratam como filho, mantém com ele uma interação positiva, afectuosa, responsiva e disponível, o qual se mostra totalmente à vontade no contacto com os tios, existindo entre todos comportamentos afectuosos e espontâneos;
- São capazes de proporcionar ao menor um ambiente familiar seguro e afectuoso;
- O A. G. manifesta forte vinculação aos tios cuidadores, cuja relação é percepcionada como capaz de prestar suporte emocional, segurança, apoio à individualidade e aceitação pessoal pois percepciona-os como pessoas atentas, protectoras que o aceitam como é;
- Na relação com os tios demonstrou sempre à vontade, procurou contacto e pediu a cooperação dos tios que foram responsivos às necessidades do menor;
- No contacto com os pais, demonstrou sentir ansiedade, apreensão e tensão, os quais não revelaram comportamentos que permitissem à criança sentir-se livre e à vontade, pressionando o menor sobre a tomada de uma posição entre pais e tios;
- O A. G. manifesta sentir bastante pressão na presença dos pais, essencialmente do pai, considera-os pessoas menos atentas e menos disponíveis, associando-os a maior pressão para que se comporte de acordo com o desejo destes e percepciona relativamente aos pais um sentimento de maior afastamento afectivo;
- Está bem integrado no agregado familiar dos tios, potenciador de adaptação e ajustamento psicológico;
- O A. G. quer continuar a residir com os tios, manifestou agrado pelo regime de visitas existente e demonstrou desagrado perante a possibilidade de aumento das pernoitas.
Pois bem, à luz dos factos concretamente apurados dúvidas não temos em subscrever e secundar por inteiro o decidido na sentença recorrida quanto ao exercício das responsabilidades por terceiro, porquanto se afigurar ser a solução que melhor salvaguarda o superior interesse da criança.
Como proficientemente explicitou a Mmª Juíza “a quo”, «dando prevalência à continuidade da estabilidade psicológica e afectiva que vem sendo vivenciada pelo A. G., desde Junho de 2016, e à necessidade de manutenção da relação afectiva com os tios/cuidadores – pessoas de referência – entendemos que o que satisfaz o superior interesse do menor é que a sua residência seja fixada junto dos tios/cuidadores, os quais reúnem adequadas condições pessoais e morais para propiciar e assegurar ao menor uma vida feliz, pautada por uma adequada formação e desenvolvimento da sua personalidade e saudável ambiente afectivo.
No que respeita aos progenitores, entendemos resultar da factualidade provada que a residência do menor com eles é contrária ao seu superior interesse.
Com efeito, visto o estilo parental desajustado, consideramos que a residência do menor junto dos progenitores implicaria uma mudança totalmente contrária ao seu interesse (porque não se vê que traga qualquer benefício para o menor, antes só o prejudicaria)».
Centralizam, porém, os recorrentes a sua discordância quanto ao teor da solução alcançada na sentença recorrida no facto desta não permitir a reunificação da família, na medida em que não só obsta a que os dois irmãos vivam e cresçam juntos, como igualmente impede que os pais, «que amam os seus filhos, lutam por eles, asseguram o seu bem-estar e cumprem todos os requisitos para serem bons pais», possam efetivamente sê-lo.
Tais asserções importam que nos debrucemos sobre a situação particular de o menor A. G. ser irmão do C. G., com quem mantém uma relação positiva e próxima e relativamente ao qual demonstra afeição, sendo que este, após ter beneficiado da medida de promoção e proteção de apoio junto dos avós maternos e na sequência da cessação dessa medida, voltou a regressar a casa dos progenitores, ora recorrentes, com quem vive.
Com relevância quanto à questão em análise há a destacar estarmos perante dois menores irmãos, respetivamente com 13 e 15 anos, e, segundo as diversas ciências que estudam o desenvolvimento das crianças, a separação de irmãos é, em princípio, uma situação pouco recomendável, uma vez que poderá contribuir para o seu afastamento e para o enfraquecimento dos laços que os ligam, levando a que – nos casos de divórcio ou separação dos progenitores (o que não é a situação objeto dos autos) – os menores sofram mais uma perda afectiva quando já perderam a possibilidade de usufruírem da companhia conjunta do pai e da mãe e da harmonia entre estes.
Fala-se, inclusivamente, na regra ou no princípio da não separação de irmãos, frequentemente invocado nas decisões sobre a atribuição da guarda dos filhos (37), sobretudo nos casos em que as crianças viviam juntas antes da separação, como consequência da necessidade da criança na continuidade das suas relações sociais e efetivas. O fundamento de tal princípio reside na ideia de que os filhos de pais divorciados ou separados judicialmente, já traumatizados com o afastamento de um dos pais, ainda sofreriam mais com a separação dos irmãos, o que afetaria negativamente o seu desenvolvimento (38).
Este princípio não é, porém, absoluto.
A separação de irmãos, a ser feita com precaução e só em casos verdadeiramente excecionais, pode justificar-se, por exemplo, quando se verifica uma forte preferência de um adolescente por um dos pais e animosidade pelo outro, a quem o interesse dos seus irmãos exige que sejam confiados; o caso de a família ser muito numerosa e haver uma necessidade económica e/ou de espaço de separar os irmãos; a consolidação de uma situação de facto de separação entre irmãos, cuja alteração seria suscetível de causar danos aos menores (39).
Deve, no entanto, rejeitar-se a separação de irmãos quando com essa medida se visa sobretudo equilibrar os direitos dos pais, ou seja, para que nenhum deles se sinta espoliado dos seus direitos sobre os filhos, satisfazendo-se, assim, o desejo de ambos de obter a guarda. Isto porque os interesses das crianças são superiores aos interesses dos pais e são apenas eles e só eles que devem constituir o critério da decisão.
No caso versado nos autos, não estamos perante uma situação típica de dois irmãos menores que viviam conjuntamente e que, por força da sentença recorrida, passarão a viver em agregados familiares distintos.
Tendo beneficiado ambos da medida de promoção e protecção de apoio junto de outro familiar, deliberadas em 2016, foram tais medidas executadas junto de familiares distintos, tendo o A. G. sido colocado sob a guarda dos tios maternos com quem passou a residir e o C. G. colocado à guarda dos avós maternos.
No caso versado nos autos, considerando a posição de preferência e de rejeição assumida pelo menor A. G. em relação à atribuição da sua guarda, bem como a situação de não convivência diária com o irmão C. G. e que perdura há já mais de seis anos, julgamos – na senda do perfilhado pelo tribunal recorrido – ser de valorizar decisivamente a manutenção de um “continuum” familiar, escolar e social, consubstanciado no princípio da continuidade ou presunção de “status quo”.
Parafraseando Jon EIster (40), este princípio cria o equivalente a uma presunção de status quo, consistente na entrega do menor ao progenitor ou, diríamos nós, a terceiro pessoa com quem o menor está a viver (desde há algum tempo) no momento do litígio.
Pensamos, na verdade, que o princípio apontado deve ser adoptado nos presentes autos, já que o menor A. G. se encontra a residir com os tios maternos desde 2016, além de que tal corresponde à vontade exteriorizada pelo menor. Relembre-se para o efeito que o menor A. G. é, presentemente, um jovem com 13 anos, tudo indiciando ter o mesmo um normal grau de desenvolvimento e inteligência, não se mostrando comprovados fatores de persuasão externa que influenciassem a sua vontade.
Como se decidiu na sentença de 16/11/1995, do Tribunal Judicial da Comarca de Beja (41), “alterar todo o universo de referenciais com que” o menor vem “convivendo até aqui, seria introduzir um conjunto de variáveis susceptíveis de provocar distúrbios irreversíveis e de consequências imprevisíveis no processo de crescimento” daquele.
E, neste domínio, reputamos de essencial valorar o facto de, ao nível do seu relacionamento interpessoal, cada um dos menores se mostrar já integrado num determinado contexto escolar e habitacional, revelando inteira adesão à manutenção do estado atual e a empatia do menor A. G. em relação aos tios cuidadores e repulsa/rejeição em relação à possibilidade de voltar a estar à guarda e cuidados dos progenitores.
Neste contexto, a retirada nesta fase do menor A. G. do agregado dos tios cuidadores – mudança, essa, preconizada pelos recorrentes – constituiria a pior solução que poderia ser propugnada, dados os fortes laços de afectividade recíprocos existentes entre eles firmados.
Essa mudança constituiria, aliás, um sério risco de perigo para a segurança, formação, educação e desenvolvimento harmonioso do menor A. G., considerando os contornos específicos que o caso em apreço reveste.
Bem sabemos que essa solução compromete o seu crescimento conjunto com o irmão C. G., com eventuais reflexos negativos ao nível da estabilidade emocional e adequada estruturação da personalidade de ambos os menores, mas quanto a esse ponto o regime de visitas estabelecido afigura-se-nos adequado e apto a proporcionar aos dois irmãos ocasiões para se verem e relacionarem e de estreitarem os laços afectivos que os une. Não é de aceitar que as reservas ou as objeções patenteadas pelos progenitores quanto à decisão alcançada da atribuição da guarda do A. G. a terceira pessoa sirva para colocar dificuldades ou entraves no estreitamento e desenvolvimento dessa relação e possa frustrar esse salutar e desejado convívio entre irmãos.
Além de que, na decisão a tomar, o superior interesse do A. G. não tem necessariamente de coincidir com o interesse do C. G., nem aquele tem de ficar refém do destino deste.
Efectivamente, não se pode olvidar que o critério último e a ratio fundante da decisão é encontrada no concreto interesse superior da criança, ou seja, naquilo que, em cada momento da sua vida, se revela como mais consentâneo com os seus interesses, que, em contraponto, tem menos inconvenientes, que menos o prejudica, que menos altera as suas dinâmicas vivenciais e que, no fundo, a faz mais feliz.
Sendo assim, e porque o factor sociabilizante de cada um dos menores se situa em agregados distintos, nada impede – bem pelo contrário – que o menor A. G. deva continuar a viver/residir com os tios cuidadores.
Na verdade, existindo uma situação de estabilidade não se antevê qualquer motivo que conduza à ruptura dessa posição, devendo pois a mesma ser salvaguardada em nome do interesse do menor.
Face ao que ficou dito, cremos que a segurança, a saúde e a educação do A. G. seriam postos em perigo se se interrompesse a continuidade da relação que tem com os tios e com o ambiente familiar envolvente.
O interesse – legítimo, como se disse – dos recorrentes em terem o seu filho A. G. consigo não coincide com o interesse deste.
Nesta conformidade, nada temos a censurar à sentença recorrida que, conjugando todos esses factores e procurando apenas promover o superior interesse desta criança, confiou a sua guarda e cuidados aos seus tios, B. C. e C. R., fixando a residência do menor junto destes, a quem conferiu o exercício das responsabilidades parentais relativas a todos os actos da sua vida corrente, sendo que as questões de particular importância da vida do mesmo deverão ser decididas pelos tios e pelos progenitores.
Consequentemente, improcede a apelação, sendo de confirmar a sentença recorrida.
*
As custas do recurso, mercê do princípio da causalidade, são integralmente da responsabilidade dos recorrentes, atento o seu integral decaimento (art. 527º do CPC).
*
Síntese conclusiva:

I. O critério essencial a ter em conta na regulação do exercício das responsabilidades parentais é o do superior interesse da criança.
II. A lei não fornece uma noção de interesse da criança, tratando-se de um conceito indeterminado que deve ser concretizado, caso a caso, tendo em consideração as particularidades de cada criança e a sua situação envolvente.
III. O atual sistema de exercício das responsabilidades parentais prevê as possibilidades excepcionais do exercício das responsabilidades parentais por outrem, que não os pais, nas situações previstas nos arts. 1907º e 1918º ambos do CC.
IV. O art. 1907º, n.º 1, do CC pode ser interpretado como contendo uma referência ao perigo emocional ou psicológico gerado pela separação da criança em relação à sua pessoa de referência quando esta não é nenhum dos progenitores biológicos.
V. Por dar prevalência à continuidade da estabilidade psicológica e afectiva que vem sendo vivenciada pelo menor, desde junho de 2016, e à necessidade de manutenção da relação afectiva com os tios/cuidadores – pessoas de referência –, e considerando o estilo parental desajustado, é de entender que respeita o superior interesse da criança a decisão que fixa a sua residência junto dos tios/cuidadores, os quais reúnem adequadas condições pessoais e morais para propiciar e assegurar ao menor uma vida feliz, pautada por uma adequada formação e desenvolvimento da sua personalidade e saudável ambiente afectivo.
*
VI. Decisão

Perante o exposto acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente o recurso de apelação, confirmando a sentença recorrida.
Custas da apelação a cargo dos apelantes (art. 527º do CPC).
*
Guimarães, 13 de julho de 2022

Alcides Rodrigues (relator)
Joaquim Boavida (1º adjunto)
Paulo Reis (2º adjunto)


1. Cfr., na doutrina, António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2017, 4ª ed., Almedina, pp. 271/300, Luís Filipe Pires de Sousa, Prova testemunhal, Almedina, 2017 – reimpressão, p. 384 a 396, Miguel Teixeira de Sousa, em anotação ao Ac. do STJ de 24/09/2013, in Cadernos de Direito Privado, n.º 44, Outubro/dezembro 2013, p. 33 e Francisco Manuel Lucas Ferreira de Almeida, obra citada, pp. 462 a 469; na jurisprudência, Acs. do STJ de 7/09/2017 (relator Tomé Gomes), de 24/09/2013 (relator Azevedo Ramos), de 03/11/2009 (relator Moreira Alves) e de 01/07/2010 (relator Bettencourt de Faria); Acs. da RG de 11/07/2017 (relatora Maria João Matos), de 14/06/2017 (relator Pedro Damião e Cunha) e de 02/11/2017 (relator António Barroca Penha), todos consultáveis em www.dgsi.pt.
2. Cfr. Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio Nora, in Manual de Processo Civil, 2ª ed., Coimbra Editora, pp. 435/436.
3. Cfr. Lebre de Freitas, Introdução ao processo civil. Conceito e princípios fundamentais à luz do código revisto, 3ª ed., Coimbra 2013, p. 200.
4. Cfr. relatório pericial em que a examinada é a progenitora constante de fls. 19 a 21.
5. Cfr. relatório pericial em que o examinado é o progenitor constante de fls. 22 a 24.
6. Presumivelmente, terá sido esse também o motivo por que os recorrentes não cuidaram sequer de indicar a localização da passagem do depoimento do progenitor que alicerce a impugnação da matéria deduzida.
7. Como refere Abrantes Geraldes, “a gravação dos depoimentos por registo áudio ou por meio que permita a fixação da imagem (video) nem sempre consegue traduzir tudo quanto pôde ser observado no Tribunal a quo. Como a experiência o demonstra frequentemente, tanto ou mais importante que o conteúdo das declarações é o modo como são prestadas, as hesitações que as acompanham, as reacções perante as objecções postas, a excessiva firmeza ou o compreensível enfraquecimento da memória, sendo que a mera gravação dos depoimentos não permite o mesmo grau de percepção das referidas reacções que porventura influenciaram o juiz da 1ª instância. Na verdade, existem aspectos comportamentais ou reacções dos depoentes que apenas são percepcionados, apreendidos, interiorizados e valorados por quem os presencia e que jamais podem ficar gravados ou registados para aproveitamento posterior por outro tribunal que vá reapreciar o modo como no primeiro se formou a convicção do julgador” (cfr. obra citada, pp. 285/286). Essa comunicação não-verbal, insuscetível de ser recolhida através do registo audio da prova, pode assumir uma grande importância na conclusão final sobre a veracidade/credibilidade dos depoimentos. Contudo, por si só, não pode legitimar a não reapreciação dos meios de prova.
8. Cfr. Luís Filipe Pires de Sousa, Prova Testemunhal, Almedina, 2017, p. 304.
9. O relatório pericial consta de fls. 31vº a 33.
10. Por exemplo, a recorrente S. M. refere-se a este processo «como "uma jogada" da cunhada e do irmão, "o A. G. é um menino doce, eles sempre quiseram ficar com ele porque a minha cunhada não pode ter filhos, a minha mãe também dizia que era melhor ele ficar com o padrinho ...«responsabilizando os tios pela pressão alegadamente exercida sobre o menor» (relatório constante de fls. 20 e 21). Por sua vez, o recorrente C. M. refere que «o facto da tia não poder ter filhos biológicos, estará na origem daquilo que considera ter sido um esquema ara ficar com o A. G. …»; o menor «nunca fala sobre os tios, deve ter medo…» (relatório constante de fls. 22 a 24). E, no âmbito do recurso de apelação, a título meramente exemplificativo, os pontos 45, 52, 53, 54, 55, 56 do corpo das alegações.
11. Cfr., entre outros, o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 186/90, publicado no Diário da República, 2.ª Série, de 12.09.1990 e os acórdãos nºs 186/90, 39/88, 187/90, 188/90, 330/93, 381/93 e 335/94, publicados no referido jornal oficial, 1.ª série, de 03.03.1988, e 2.ª Série, de 12.09.1990, 30.07.1993, 06.10.1993, 19.01.1994 e 30.08.1994, respetivamente.
12. Cfr. Ac. do STJ de 13/09/2016 (relator Alexandre Reis) e Ac. da RL de 28/03/2019 (relatora Gabriela Fátima Marques), in www.dgsi.pt.
13. No sentido de que a nova redação do art. 1906º do CC, decorrente da Lei nº 65/2020, de 4/11, com entrada em vigor em 1.12.2020, se aplica aos processos pendentes, por força do disposto no art. 12º, n.º 2, segunda parte, do Código Civil, na medida em que a lei nova deve aplicar-se às situações jurídicas que se constituíram na vigência da lei antiga e que transitam para o domínio da lei nova, ver Ac. do STJ de 30/11/2021 (relator Pedro de Lima Gonçalves), Ac. da RL de 15/12/2020 (relator Luís Filipe Sousa) e Ac. da RE de 25/02/2021 (relator José António Moita), in www.dgsi.pt.
14. Cfr. Clara Sottomayor, Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais nos Casos de Divórcio, 8ª ed, Almedina, 2021, pp. 59/63.
15. Cfr. Almiro Rodrigues, Interesse do Menor – Contributo para uma Definição, Revista de Infância e Juventude, n.º 1, 1985, p. 18 e ss.
16. Cfr. Rui Epifânio e António Farinha, Organização Tutelar de Menores (Decreto-Lei N.º 314/78, de 27 de Outubro) Contributo para uma visão interdisciplinar do direito de menores e de família, Almedina, 1992, p. 326.
17. Cfr. António H. L. Farinha e Conceição Lavadinho, Mediação familiar e Responsabilidades Parentais, Almedina, 1997, p. 49.
18. Cfr. Ac. da RL de 14/03/78, CJ, T. II, p. 439, Ac. da RP de 17/05/1994, C.J. 1994, T. III, p. 200 e Ac. da RL de 20/01/05 (relator Gonçalves Rodrigues), in www.dgsi.pt.
19. Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo, aprovada pela Lei n.º 147/99, de 01/09.
20. Cfr. Jorge Duarte Pinheiro, O Direito da Família Contemporâneo, Gestlegal, 2020, pp. 297/298.
21. E os filhos menores não podem abandonar a casa paterna ou aquela que os pais lhes destinaram, nem dela ser retirados; mas se abandonarem a casa paterna ou dela forem retirados, qualquer dos pais e, em caso de urgência, as pessoas a quem eles tenham confiado o filho podem reclamá-lo, recorrendo, se for necessário, ao tribunal ou à autoridade competente (art. 1887º do CC).
22. Cfr. J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, CRP Anotada, 4ª edição, Coimbra Editora, 2007, p. 566.
23. Cfr. Ac. do STJ de 04/02/2010 (relator Oliveira Vasconcelos) e Ac. da RC de 30/06/2015 (relator Fonte Ramos), disponíveis in www.dgsi.pt.
24. Cfr. Armando Leandro, Poder Paternal: natureza, conteúdo, exercício e limitações. Algumas reflexões de prática judiciária, Temas do Direito da Família – Ciclo de Conferências no Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados, Almedina, p. 119.
25. Cfr. T. Berry Brazelton e Syanley I. Greenspan, A Criança e o Seu Mundo – Requisitos Essenciais para o Crescimento e Aprendizagem, Editorial Presença, 5ª ed., 2006, pp. 52 a 54.
26. O n.º 1 do art. 1907º do CC não previa até então as situações em que o filho passou então a poder ser confiado a terceira pessoa por acordo dos pais ou por decisão judicial, mesmo sem a verificação de alguma das circunstâncias referidas no art. 1918º. Note-se que a aludida norma estabelece, em alternativa, através da utilização da conjunção sindética “ou”, o acordo dos progenitores, a decisão judicial e a verificação de alguma das circunstâncias previstas no art. 1918º.
27. Ao passo que Jorge Duarte Pinheiro refere que tal preceito se lhe afigura “duvidoso” e não parecer “estar de harmonia com o texto constitucional” (cfr. O Direito da Família Contemporâneo, Gestlegal, 2020, p. 83 e 283), Helena Bolieiro e Paulo Guerra expressamente concluem que o preceito é claramente inconstitucional (cfr. A Criança e a Família – Uma questão de Direito(s), 2ª ed., 2014, Coimbra Editora, p. 213); pugnando, identicamente, pela inconstitucionalidade material do art. 1907º, n.º 1 do CC, quando interpretado no sentido de permitir, sem o acordo dos pais, a decisão judicial de entrega da criança ou jovem a terceira pessoa fora das situações denunciadas no art. 1918º, por violação frontal e inequívoca dos n.ºs 5 e 6 do art. 36º da CRP, Tomé d`Almeida Ramião, Regime do Processo Tutelar Cível, (de acordo com a Lei n.º 24/2017, de 24 de maio) Anotado e Comentado, Jurisprudência e Legislação Conexa, 2ª ed., Quid Iuris, 2017, p. 126.
28. Cfr. Código Civil Anotado, Livro IV - Direito da Família (Coord. Clara Sottomayor), Almedina, pp. 930/931 Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais nos Casos de Divórcio, 8ª ed, Almedina, 2021, pp. 103/105.
29. Cfr. Maria Clara Sottomayor, Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais (…), p. 101.
30. Ao nível da jurisprudência, no sentido de atribuir a guarda a terceira pessoa, rejeitando a prevalência do vínculo biológico da parentalidade e atendendo ao critério da prestação de cuidados, veja-se, por ex., Ac. do STJ de 4/02/2010 (relator Oliveira Vasconcelos), os Acs. da RP de 23/11/2006 (relatora Deolinda Varão) e de 26/06/2008 (relatora Ana Paula Lobo), de 24/01/2019 (relator Filipe Caroço) e de 30/01/2017 (relatora Maria José Simões), os Acs. da RL de 17/11/2009 (relatora Cristina Coelho) e de 20/12/2017 (relator António Moreira) e o Ac. da RC de 30/06/2015 (relator Fonte Ramos), todos disponíveis in www.dgsi.pt.
31. Cfr. Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais (…), p. 102.
32. Cfr. Maria Clara Sottomayor, Código Civil Anotado, Livro IV – (…), p. 931.
33. Cfr. Ac. do STJ de 04.02.2010 (relator Oliveira Vasconcelos), in www.dgsi.pt.
34. Cfr., para mais desenvolvimento, Maria Clara Sottomayor, Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais (…), pp. 78, 80 e 81.
35. Cfr., para mais desenvolvimento, Maria Clara Sottomayor, Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais (…), pp. 105/109.
36. O art. 8.º da CEDH dispõe (nas suas partes pertinentes para o caso): “1. Qualquer pessoa tem direito ao respeito da sua vida (...) familiar (...). 2. Não pode haver ingerência da autoridade pública no exercício deste direito senão quando esta ingerência estiver prevista na lei e constituir uma providência que, numa sociedade democrática, seja necessária (...) para a proteção da saúde ou da moral, ou a proteção dos direitos e liberdades de terceiros”.
37. Cfr. Ac. da RC de 12/10/2004 (relator Isaías Pádua), Ac. da RC de 02/06/2009 (relator Costa Fernandes) e Ac. RP de 29/04/2014 (relator Vieira e Cunha), todos consultáveis in www.dgsi.pt.
38. Cfr. Clara Sottomayor, Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais (…), pp. 92/95, cujo ensinamento vimos seguindo de perto na exposição em apreço.
39. Cfr. Ac. desta Relação de 9/11/2017 (processo n.º 776/12.2TBEPS-C.G1), relatado pelo mesmo relator deste.
40. Cfr. Solomíc judgements - Studies on the limitations of rationalíty, Cambridge University Press, 1989, p. 133, citado na sentença de 1995.11.16, do Tribunal Judicial da Comarca de Beja, in Causas, Out.-Dez./1996, nº 4, p. 100.
41. Cfr. Causas, Out.-Dez./1996, nº 4, p. 100.