Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
6330/11.9TBSTB.E1
Relator: SÍLVIO SOUSA
Descritores: CONTRATO DE PERMUTA
REPARAÇÃO DOS DEFEITOS
CADUCIDADE DO DIREITO À ELIMINAÇÃO DO DEFEITO
Data do Acordão: 03/12/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: Em matéria de defeitos em imóvel adquirido, por troca ou permuta, é aplicável o regime da compra e venda; por isso, devem ser denunciados no prazo de um ano depois de conhecidos e de cinco após a entrega da coisa; como facto extintivo direito do adquirente, compete ao alienante a sua alegação e prova; o desgaste psicológico típico, decorrente da verificação de defeitos em imóvel adquirido e da sua não eliminação, não merece a tutela do direito, para efeitos de compensação por danos morais.
Sumário do Relator
Decisão Texto Integral: Apelação nº 6330/11.9TBSTB.E1

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Évora:


Relatório

(…) e (…), casados, residentes na Rua das (…), nº 24, (…), (…), intentaram a presente ação, na forma de processo sumário, contra (…), Construções, Lda., com sede na Rua da (…), na mesma localidade, pedindo, nomeadamente, a sua condenação na reparação de defeitos que identificam, existentes no prédio urbano onde habitam, descrito na Conservatória do Registo Predial de (…), sob o nº (…), da freguesia de (…), e inscrito na matriz sob o artigo (…), e indemnizá-los “pelos constrangimentos e prejuízos causados pela delonga da resolução dos defeitos mencionados”, nos valores de € 1.228,69 (a título de prejuízos) e € 1.500,00 (a título de constrangimentos /danos não patrimoniais), para tanto articulando factos, que, em seu critério, conduzem à sua procedência, a qual foi julgada parcialmente procedente, sendo, em consequência, a demandada condenada “(…) a eliminar os defeitos de construção identificados nos factos provados, verificados na moradia sita na Rua das (…), nº 24, (…), (…), descrita na Conservatória do Registo Predial de (…) sob o nº (…) e inscrita na respetiva matriz sob o artigo … (…), no prazo de 75 (…) dias após o trânsito em julgado da sentença” e “a pagar uma indemnização com vista ao ressarcimento dos danos morais por si sofridos em consequência da verificação dos defeitos da moradia e da delonga da sua reparação, em montante a liquidar em execução de sentença”.


Inconformada com a sentença, apelou a demandante, culminando as suas alegações, com as seguintes conclusões:

- Em consequência da impugnação da decisão recorrida sobre a matéria de facto, deve o Tribunal ad quem decidir que: a) a redação do facto nº 2 passará a ser o seguinte: o prédio referido em 1) foi adquirido à Ré por escritura pública de permuta e mútuo com hipoteca, datada de 30 de Agosto de 2007; b) seja eliminado o facto nº 31[1] dado como provado e que era do teor seguinte: o portão de passagem destinado a pessoas não fecha devidamente; c) seja considerado provado o facto referido na alínea g) dos factos não provados, isto é, que “os Autores construíram no topo da piscina um bar que impede a circulação das águas pluviais adjacentes àquele e tapou o seu escoamento”;

- O contrato em discussão nestes autos, na parte relevante, é um contrato de permuta, em que é típico e essencial dar-se uma coisa por outra, inexistindo um preço, ainda que as coisas tenham valores diferentes, como, aliás, sucede no caso;

- Não está ele incluído na lista de contratos tipificados no artigo 1º.-A do Decreto-Lei nº 67/2003, na redação da Lei nº 84/2008, de 21 de Maio, e que são contratos de compra e venda celebrados entre profissionais e consumidores, os bens de consumo fornecidos no âmbito de contrato de empreitada ou de prestação de serviços ou à locação de bens de consumo;

- O regime do citado Decreto-Lei nº 67/2003, quer na versão originária, quer na versão resultante da Lei nº 84/2008, é inaplicável ao contrato de permuta dos autos, quer por esse contrato não estar previsto na versão originária, quer porque a resultante da citada lei não tem eficácia retroativa e não pode ser aplicada ao contrato de permuta de 30 de Agosto de 2007;

- Decidindo como o fez, a sentença recorrida violou o preceituado no artigo 12.º do Código Civil e os preceitos dela invocados;

- O referido contrato de permuta é um contrato oneroso a que a lei manda aplicar as normas adaptadas da compra e venda, nos temos do artigo 939.º do Código Civil;

- Assim, é-lhe aplicável o regime previsto nos artigos 913.º a 932.º do mesmo Código;

- Tendo sido julgados como factos não provados que “todas as supra referidas anomalias foram comunicadas logo que eram detectadas, os Autores deixaram de dar cumprimento ao preceituado no nº 2 do artigo 916.º do Código Civil, que exige que o comprador faça a denúncia até 30 dias depois de conhecido o defeito e dentro de seis meses após a entrega;

- Aliás, os Autores não alegaram, como lhes competia, por ser elemento constitutivo do seu direito, as datas em que eles tiveram conhecimento dos defeitos ou anomalias detectadas;

- Quando a presente ação foi instaurada em 29 de Setembro de 2011 estavam esgotados os prazos previstos naquele artigo 916.º, nº 2 e mesmo os constantes das normas invocadas na sentença recorrida por desconhecimento do seu termo inicial;

- Em consequência, deve ser julgada procedente a deduzida excepção da caducidade e a Ré absolvida do pedido, com todas as consequências legais, sendo sua convicção que tal procedência já deveria ter sido declarada no despacho saneador;

- Decidindo o contrário, a sentença recorrida violou todas as disposições legais que invoca e, bem assim, o disposto nos artigos 916.º, 917.º e 342.º, nº 1, todos do Código Civil, por erro da interpretação e de aplicação da lei aos factos provados e não provados;

- Em sede de responsabilidade contratual, só haverá responsabilidade por danos patrimoniais quando estes forem exorbitantes ou excepcionais, o que parece não ser o caso dos autos, afigurando-se à recorrente que o contrato de permuta não está abrangido pelos normativos da Lei nº 24/96, de 31 de Julho;

- Por isso, a condenação constante da alínea b) da decisão recorrida infringiu o disposto nos artigos 1225.º, 496.º, nº 1 do Código Civil e 12.º, nº 1, da Lei nº 24/96, por errada interpretação da lei e aplicação aos factos apurados;

- A alínea a) da decisão da sentença recorrida apresenta alguma ambiguidade ou obscuridade que a torna menos inteligível, pelo que seria nula, nos termos da 2ª parte da alínea b) do nº 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil.


Termos em que deve revogar-se a sentença recorrida, absolvendo-se a Ré do pedido, “com todas as consequências legais”.


Contra-alegou a recorrida, votando pela manutenção do decidido.

Face às conclusões das alegações, o objecto do recurso circunscreve-se à apreciação das seguintes questões: a) existência ou não de erro na apreciação da prova, que determine alteração da matéria de facto vertida no facto nº 31 [2] dos dados como provados e na alínea g) [3] dos não provados; b) o alegado erro na aplicação do direito aos factos (caducidade ou não do direito dos Autores à reparação dos defeitos e eventual não verificação dos pressupostos da reparação, por danos não patrimoniais).


Foram colhidos os vistos legais.

Fundamentação


A - Os factos


Na sentença recorrida, foi considerado provado o seguinte quadro factual:


1 - Os Autores são os legítimos proprietários do imóvel urbano, sito na Rua das (…), nº 24, (…), (…), freguesia de (…), o qual se encontra descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de (…), sob o nº (…) da respectiva freguesia e inscrito na respectiva matriz sob o artigo (…);


2 - O prédio antes referido foi adquirido à Ré, por escritura pública datada de 30 de Agosto de 2007;


3 - Os Autores habitam no referido prédio, desde 01 de Setembro de 2007;


4 - O imóvel referido foi recebido em 30 de Agosto de 2007;


5 - Logo após a ocupação do imóvel, os Autores apresentaram reclamação relativa ao vazamento de água da piscina;


6 - A Ré, em meados de Setembro de 2007, procedeu ao esvaziamento total da piscina, retirou e substituiu o evinel na zona do ralo e à volta dos skimmers, e procedeu ao isolamento e recolocação destes, bem como à betumagem total da piscina;


7 - Apesar da referida intervenção, os Autores continuaram a reclamar perdas de água da piscina;


8 - Em Março de 2008, a Ré procedeu à colocação de silicone à volta dos skimmers;


9 - Após o enchimento da piscina, em 18 de Junho de 2008, verificou-se que a piscina perdia água;


10 - Apesar desta intervenção, os Autores continuaram a reclamar perdas de água da piscina;


11- Em meados de Maio de 2008, apareceu uma mancha de ferrugem, no tanque da piscina, junto ao ralo;


12 - Os Autores enviaram à Ré, em 28 de Abril de 2009, uma carta com aviso de recepção, que foi recepcionada, com o teor constante do documento 3 junto com a petição inicial, nomeadamente: “lista de anomalias à data de 21 de Julho de 2009 (entregue ao Sr. Manuel da Graça Ferreira): 1. sala - a porta de acesso está empenada. 2. hall do 1º andar – o remate do estuque do corrimão está danificado. 3. WC da suíte – já vertia água após os banhos, depois de substituída a cabine de duche, abriu uma fissura do lado esquerdo. 4. Quarto 1 (suite) – “linhas”/fissuras de estuque. 5. Quarto 2 - “linhas”/fissuras de estuque. 6. 1º Andar – existem “linhas”/fissuras no estuque, suíte e corredor. 7. casa das máquinas – colocar o tubo de escoamento da caldeira. 8. chaminé – substituir o cabeçote da chaminé (a entrar água). 9. telhado da casa das máquinas da piscina – falta pintar a reparação da telha partida. 10. Casa das máquinas da piscina – continua a entrar água pelo skimmer do lado direito. 11. varanda da frente – foi colocado o betume em falta mas não foi pintada. 12. piscina - após a última intervenção registou-se uma aparente redução nas perdas de água, contudo por dia a água que desaparece é em média 256 L. O abaixamento diário de água anda ente os 8 mm e os 10 mm (…)”;


13 - No dia 14 de Julho de 2009, a Ré procedeu ao isolamento dos skimmers;


14 - Após a intervenção de Julho de 2009, a piscina continuou a perder água;


15 - Sendo ainda visível a mancha de ferrugem;


16 - Em Julho de 2009 a Ré procedeu ao levantamento do pavimento da casa das máquinas;


17 - Os Autores reclamaram junto da Ré a entrada de água da chuva pela chaminé;


18 - A Ré procedeu a intervenções na chaminé;


19 - Os Autores enviaram à Ré, em 10 de Março de 2011, uma carta registada, com aviso de receção, que foi rececionada, com o teor constante do documento 4, junto com a petição inicial;


20 - O escoamento das águas pluviais, no espaço traseiro ao imóvel, é realizado através de aberturas feitas pela Ré, tem escoamento para o solo e é deficiente;


21- A Ré alertou os Autores para o facto da eliminação na zona jardinada ou arrelvada, por onde se faria o escoamento natural das águas pluviais, acarretar problemas futuros;


22 - Não obstante o alerta referido, os Autores persistiram em proceder à pavimentação da referida zona;


23 - O dito escoamento não pode ser canalizado para o sistema de escoamento de águas pluviais que está definido na planta final de construção do prédio ora dos Autores, porque a Câmara Municipal de (…) não o permite;


24 - A casa das máquinas da piscina apresentava, em Novembro de 2007 e ainda apresenta, infiltrações, com origem na deficiente estanquicidade da piscina;


25 - As referidas infiltrações provocaram a degradação do equipamento de sal da piscina;


26 - A cabine do duche verte água;


27 - As pedras da cantaria encontram-se partidas;


28 - A base da porta da varanda do escritório apresenta infiltrações de água;


29 - As infiltrações antes referidas provocaram o apodrecimento de parte do estuque;


30 - O teto do escritório apresenta manchas de humidade;


31- O portão de passagem destinado a pessoas não fecha devidamente;


32 - O encaixe (carril) do portão de acesso ao imóvel destinado aos veículos abateu;


33- O muro lateral que serve de divisória com o nº 26 e o muro frontal do imóvel apresentam várias rachas;


34 -Todas as anomalias referidas supra foram comunicadas à Ré;


35 - Para além da carta referida em matéria assente, as anomalias eram comunicadas à Ré, de forma oral;


36 - Por força da não eliminação das anomalias supra referidas, os Autores sofreram desgaste psicológico;


37 - Ficaram frustrados, em face de não eliminação dos problemas verificados no imóvel.


B - O direito


Quanto à existência ou não de erro na apreciação da prova, que determine alteração da matéria de facto vertida no facto nº 31 dos dados como provados e na alínea g) dos não provados


- “Se o juiz fica em dúvida sobre determinado facto, por não saber se ele ocorreu ou não, o non liquet do julgador converte-se, na sequência da diretiva traçada pelo nº 1 do artigo 8.º do Código Civil, num liquet contra a parte a quem incumbe o ónus da prova do facto” [4];


- “A reapreciação da matéria de facto por parte da Relação tem de ter a mesma amplitude que o julgamento de primeira instância pois só assim poderá ficar plenamente assegurado o duplo grau de jurisdição; para que o segundo grau reaprecie a prova, não basta a alegação por banda dos recorrentes em sede de recurso de apelação que houve erro manifesto de julgamento e por deficiência na apreciação da matéria de facto devendo ser indicados quais os pontos de facto que no seu entender mereciam resposta diversa, bem como quais os elementos de prova que no seu entendimento levariam à alteração daquela resposta” [5];


-“No uso dos poderes relativos à alteração da matéria de facto (…), a Relação deverá formar e fazer refletir na decisão a sua própria convicção, na plena aplicação e uso do princípio da livre apreciação das provas, nos mesmos termos em que o deve fazer a 1ª instância, sem que se lhe imponha qualquer limitação, relacionada com convicção que serviu de base à decisão impugnada, em função do princípio da imediação da prova” [6].


- “A prova, no processo, pode (…) definir-se como a atividade tendente a criar no espírito do juiz a convicção (certeza subjetiva) da realidade de um facto. Para que haja prova é essencial esse grau especial de convicção, traduzido na certeza subjetiva[7].


Quanto ao alegado erro na aplicação do direito aos factos (caducidade ou não do direito dos Autores à reparação dos defeitos e eventual não verificação dos pressupostos da reparação, por danos não patrimoniais)


- “A quem invoca um direito em juízo incumbe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado, quer o facto seja positivo, quer negativo. À parte contrária compete provar os factos impeditivos, modificativos ou extintivos desse direito” [8];


- As partes, para além das faculdades de contratarem ou não e, na hipótese positiva, de escolher o outro contraente, gozam ainda da “(…) possibilidade de, na regulamentação convencional dos seus interesses, se afastarem dos contratos típicos ou paradigmáticos disciplinados ma lei (celebrando contratos atípicos) ou de incluírem em qualquer destes contratos paradigmáticos cláusulas divergentes da regulamentação supletiva contida no Código Civil. A admissibilidade de contratos-mistos é, ainda, uma afirmação da regra da liberdade contratual”[9];


- O contrato de permuta é um contrato atípico, permitido pelo princípio da liberdade contratual, ao qual são aplicáveis “as disposições do contrato de compra e venda, devidamente adaptadas” [10]; os seus efeitos reais e obrigacionais são, assim, ”traçados a partir do regime do contrato de compra e venda” [11]; “elemento característico dum contrato de permuta é a ausência de qualquer objeto monetário que no contrato desempenhasse a função de meio de pagamento, isto é, na ausência de qualquer objeto que se posa qualificar como preço” [12]; “ é da essência da compra o pagamento a dinheiro da coisa vendida … é da essência da troca, ou escambo como se dizia na velha Ordenação, dar uma coisa que não seja dinheiro, por outra” [13];


- “No âmbito do contrato de permuta de coisa imóvel defeituosa, a que é aplicável o regime da compra e venda, recai sobre o adquirente o dever de denunciar os defeitos relevantes ao alienante, exceto se este houver usado dolo, no prazo de um ano depois de conhecido o defeito e de cinco após a entrega da coisa” [14];


- Incumbe à Ré “provar o esgotamento de qualquer dos prazos de caducidade sem que a denúncia jamais lhe tenha sido feita ou o decurso desse prazos sobre a denúncia que eventualmente lhe tenha sido feita” [15];


-“A venda da coisa pode considerar-se defeituosa quando, numa perspetiva de funcionalidade, contém vício que desvaloriza ou impede a realização do fim a que se destina, manifesta falta das qualidades asseguradas pelo vendedor ou necessárias para a realização do fim a que se destina” [16];


- A tese da ressarcibilidade dos danos não patrimoniais está limitada “àqueles que pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito. A gravidade do dano há-de medir-se por um padrão objetivo (conquanto a apreciação deva ter em linha de conta as circunstâncias de cada caso), e não à luz de fatores subjetivos (de uma personalidade particularmente embotada ou especialmente requintada” [17].


C- Aplicação do direito aos factos


Quanto à existência ou não de erro na apreciação da prova, que determine alteração da matéria de facto vertida no facto nº 31 dos dados como provados e na alínea g) dos não provados.


Num parêntesis, importa referir que a alteração do facto provado nº 2, no sentido de nele passar a constar que a escritura aí referida é de “permuta e mútuo com hipoteca”, escapa à matéria de impugnação, pela simples razão de o modo de aquisição da propriedade do prédio em causa não ter sido objeto de julgamento.


Ou seja: dúvidas inexistem quanto ao negócio celebrado pelos Autores (…) e (…) e pela Ré (…), Construções, Lda..


Assim sendo, a definição dos direitos das partes não poderá deixar de considerar o conteúdo de negócio outorgado, não obstante se aludir, na matéria de facto apurada, apenas a “escritura pública”.


Por isso e nesta sede, não se toma conhecimento da requerida alteração.


Devendo a Relação “formar e fazer refletir na decisão a sua própria convicção, na plena aplicação e uso do princípio da livre apreciação das provas, nos mesmos termos em que o deve fazer a 1ª instância”, procedeu-se à audição do registo de todos os depoimentos prestados.


No que concerne ao facto 31 dos provados, a questão foi abordada pelas testemunhas (…), (…), (…) e (…). Esta aludiu que o “defeito” do portão de acesso de pessoas decorre da dilatação do ferro, que pode ser ultrapassado com aplicação de “spray”. A (…), por seu turno, referiu que a dita porta ”tem que levar uns empurrões” para fechar, acrescentando que, não sendo assim, ”volta para trás”. A (…), por seu lado, disse que “a parte onde encaixa o trinco está desnivelada”. A (…) mencionou que o “lingote bate”, pelo que a fechadura, tem de ser “ajustada”.


Deste modo, considerando não só a circunstância de a credibilidade das aludidas testemunhas não ter sido posta em causa pela recorrente (…), Construções, Lda., como também o facto de a prova pericial não ter abarcado a aludida facticidade, a “certeza subjectiva” desta Relação coincide com uma resposta positiva ao artigo 29.º da base instrutória, com a inerente confirmação da data pelo Tribunal recorrido.


Relativamente à alínea g) dos factos não provados, decorre do teor dos artigos 12.º da contestação e 11.º da resposta – admitida pelo Tribunal –, que a construção, pelos Autores, (…) e (…), de um bar, em madeira, no topo da piscina, é um facto em que as partes não divergem.


Quanto à alegada circunstância de o mencionado bar impedir o escoamento das águas pluviais adjacentes, a mesma devia ter sido objeto de prova pericial e não o foi. Daí que perante depoimentos divergentes, a convicção desta Relação terá de coincidir com um non liquet com a inerente consequência.


Sendo a construção do aludido bar, em madeira, um facto assente, deverá a mesma ser aditada ao rol dos factos “provados”, o que se decide.


Pelo exposto, procede este segmento da apelação, apenas nesta parte.


Quanto ao alegado erro na aplicação do direito aos factos (caducidade ou não do direito dos Autores à reparação dos defeitos e eventual não verificação dos pressupostos da reparação, por danos não patrimoniais)


Face à facticidade que emergiu da discussão da causa, os Autores (…) e (…) e pela Ré (…), Construções, Lda. celebraram apenas um contrato de troca ou de permuta.


Como tal, em matéria de defeitos, do imóvel adquirido pelos ditos demandantes, é aplicável o regime da compra e venda.


O recurso da recorrente (…), Construções, Lda., para além da questão da compensação por danos não patrimoniais, coincide, apenas, na alegada caducidade do direito à reparação dos defeitos, uma vez que os demandantes (…) e (…) “não alegaram, como lhes competia por ser elemento constitutivo do seu direito, as datas em que eles tiveram conhecimento dos direitos ou anomalias detetadas”.


Sem razão. Na verdade, os factos constitutivos do direito dos referenciados são apenas os que integram o contrato de troca e os que dizem respeito à existência de defeitos ou vícios.


Sendo o esgotamento dos prazos de caducidade um facto extintivo do já citado direito, o ónus de alegação e prova competia à apelante.


Ora, acontece que, percorrendo o rol dos factos apurados, neles não se vislumbra o esgotamento do prazo para o exercício do direito à reparação – um ano depois de conhecido o defeito e de cinco após a entrega da coisa.


Deste modo, improcede esta parte da apelação.


No que concerne à compensação por danos não patrimoniais, fundamentou-a o Tribunal recorrido no “desgaste psicológico” ou na frustração sofrida pela não eliminação das “anomalias” verificadas no imóvel.


Não se apurando o grau do desgaste sofrido – que cometia aos demandantes demonstrar –, não merece o mesmo a tutela do direito, sob pena de comercialização dos danos morais. Ou seja: o desgaste psicológico típico, decorrente de defeitos em imóvel adquirido e de sua não eliminação não merece a tutela do direito, para efeitos de compensação por danos morais.


Procede, assim, este segmento do recurso.


Em síntese[18]: em matéria de defeitos em imóvel adquirido, por troca ou permuta, é aplicável o regime da compra e venda; por isso, devem ser denunciados no prazo de um ano depois de conhecidos e de cinco após a entrega da coisa; como facto extintivo direito do adquirente, compete ao alienante a sua alegação e prova; o desgaste psicológico típico, decorrente da verificação defeitos em imóvel adquirido e da sua não eliminação, não merece a tutela do direito, para efeitos de compensação por danos morais.


Decisão


Pelo exposto, decidem os juízes desta Relação, julgando a apelação parcialmente procedente, aditar aos factos provados a facticidade acima referida e revogar a sentença recorrida, relativamente à condenação por danos morais, mantendo-a, por conseguinte, na parte restante.


Custas a meias.


Évora, 12 de Março de 2015


Sílvio José Teixeira de Sousa


Rui Machado e Moura


Maria da Conceição Ferreira





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[1] A referência ao facto 16º dos provados constitui um lapso.
[2] “O portão de passagem destinado a pessoas não fecha devidamente” (artigo 29 da base instrutória).
[3] “Os Autores construíram no topo da piscina um bar que impede a circulação das águas pluviais adjacentes e tapou o seu escoamento” (artigo 18º da base instrutória).
[4] Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, in Manual de Processo Civil, 2ª edição, pág. 447.
[5] Acórdão do STJ, de 2 de Dezembro de 2013 (processo n.º 34/11.0TBPNL.L1.S1), in www.dgsi.pt..
[6] Acórdão do STJ de 14 de Fevereiro de 2012 (processo nº 6823/09.3TBBRG.G1.S1.), in www.dgsi.pt. (no mesmo sentido, os acórdãos do STJ, de16 de Outubro de 2012 (processo nº 649/04.2 TBPDL.L1.S1), 6 de Julho de 2011 (processo nº 450/04.3TCLRS.L1.S1), 6 de Julho de 2011 (processo nº 645/05.2 TBVCD.P1.S1), 24 de maio de 2011 (processo nº 376/2002.E1.S1), 2 de Março de 2001 (processo nº 1675/06.2TBPRD.P1.S1), 16 de Dezembro de 2010 (processo nº 2410/06.1TBLLE.E1.S1) e 28 de Maio de 2009 (processo nº 4303/05.0TBTVD.S1), no mesmo sítio) e artigo 662º, nº 1 do Código de Processo Civil).
[7] Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, in Manual de Processo Civil, 2ª edição, pág. 436.
[8] Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, in Manual de Processo Civil, 2ª edição, pág. 452, e artigo 342.º, nºs 1 e 2, do Código Civil.
[9] Profs. Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, vol. I, 4ª edição, pág. 355 e artigo 405.º, nºs 1 e 2, do Código Civil.
[10] Artigos 405.º, nºs 1 e 2 e 939.º do Código Civil e acórdão da Relação do Porto, de 5 de Junho de 2014 (processo nº 1946/05.5TVPRT.P1), in www.dgsi.pt..
[11] Acórdão da Relação do Porto de 5 de Junho de 2014 (processo 1946/05.5TVPRT.P1), in www.dgsi.pt..
[12] Acórdão do STJ, de 25 de Março de 2009 (processo nº 2688/07.2TBVCT.G1.S1), in www,dgsi.pt..
[13] Dias Ferreira, in Código Civil Anotado, vol. III, pág. 48 e acórdão da Relação do Porto, de 3 de Fevereiro de 2003, in www.dgsi.pt..
[14] Artigo 916.º, nºs 1 a 3 do Código Civil e acórdão da Relação de Lisboa, de 7 de Julho de 2009 (processo nº 10015/2008-7), in www.dsi.pt..
[15] Artigos 342.º, nº 2 e 343.º, nº 2 do Código Civil e acórdão da Relação de Lisboa, de 7 de Julho de 2009 (processo nº 10015/2008-7), in www.dgsi.pt..
[16] Artigo 913º, nº 1 do Código Civil e acórdão do STJ de 10 de Janeiro de 2013 (processo nº 3097/06.6TBVCT.G1.S1), in www.dgsi.pt..
[17] Artigo 496.º, nº 1 do Código Civil e Profs. Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, 4ª edição, vol. I, pág. 499.
[18] Artigo 663.º, nº 7 do Código de Processo Civil.