Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1906/17.3T8STR.E1
Relator: CRISTINA DÁ MESQUITA
Descritores: CONTRATO DE INTERMEDIAÇÃO FINANCEIRA
BANCO
RESPONSABILIDADE CONTRATUAL
DEVER DE INFORMAR
BOA-FÉ
Data do Acordão: 12/20/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário:
1. Transmitir a segurança de um produto financeiro é diferente de transmitir que o próprio Banco garantia com o capital próprio o reembolso do capital investido.
2. Porém, para um declaratário normal, colocado na posição do autor — que não possuía qualificação ou formação técnica que lhe permitisse à data conhecer os diversos tipos de produtos financeiros e que até à data sempre aplicara o seu dinheiro em depósitos a prazo — dizer que «o capital é garantido» significa que o é a 100% e dizer que «é equivalente a um depósito a prazo» significa que se trata de um produto do Banco, logo por ele garantido, porque, de facto, nos depósitos a prazo é o banco que responde com a sua liquidez pela liquidação do depósito na data do respetivo vencimento e pelos respetivos juros.
3. O simples facto de os autores serem «clientes de depósito à ordem» deveria ter levado o banco recorrente, em conformidade com os deveres de diligência, de lealdade e de adequação, a prestar ao autor uma informação detalhada e verdadeira sobre o tipo de investimento que lhe estava a propor, dando-lhe conta dos riscos relevantes, sem subestimar os elementos que eram importantes para o cliente (cfr. art. 312.º-A, n.º 1, do CdVM).
4. Ainda que a informação exígivel sobre o risco da operação não fosse a de que a entidade emitente das obrigações poderia vir a ser declarada insolvente, até porque não foi alegado que essa fosse uma hipótese que já estivesse no horizonte conhecido do Banco recorrente, o risco de investimento na subscrição de obrigações envolve sempre um risco superior ao dos depósitos a prazo porquanto as “obrigações” representam um direito de crédito sobre a entidade emitente (art. 348.º, do Código das Sociedades Comerciais) o que implica que é aquela que fica obrigada a restituir ao titular da obrigação (credor obrigacionista) quer o montante que lhe é mutuado quer os juros respetivos, quando convencionados, restituição que dependerá sempre da «solidez financeira» da entidade emitente. E ao passo que os depósitos a prazo estão cobertos pelo Fundo de Garantia, o mesmo não sucede com as obrigações subordinadas — como são as dos autos -, riscos que foram absolutamente desconsiderados pelo Banco, que não tratou de informar o autor dos mesmos.
(Sumário elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Integral:

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Évora:

I. RELATÓRIO
I.1.
O Banco BB, SA interpôs recurso da sentença do Juízo Central Cível – Juiz 3, do Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, proferida no âmbito da ação declarativa sob a forma de processo comum que contra ele-recorrente foi proposta por CC e DD, a qual, julgando a ação parcialmente procedente, o condenou a pagar aos autores a quantia de cem mil euros (€100.000,00), acrescida de juros, à taxa legal, contados desde 06.07.2017 e até integral pagamento.

A sentença recorrida tem o seguinte teor:
«I - Relatório
CC e DD intentaram a presente acção contra Banco BB, S.A., pedindo a sua condenação a pagar-lhes a quantia de € 100.000,00, de capital e juros vencidos, que liquida no valor de € 10.000,00, acrescida de juros contados desde a citação e, subsidiariamente, que seja declarado nulo o eventual contrato de adesão que o R. invoque para ter aplicado o montante de € 100.000,00 que os AA. lhe entregaram, condenando-se o R. a restituir aos AA. a quantia de € 110.000,00 , acrescida de juros desde a citação e a pagar-lhes uma indemnização por danos não patrimoniais, no valor de e 5.000,00.
Alegam para o efeito que, em Outubro de 2008, o A. marido foi abordado por um funcionário do BPN para que aplicasse a quantia de € 100.000,00 que dispunha, numa aplicação em tudo igual a um depósito a prazo, com capital garantido e com rentabilidade assegurada, juros semestrais, podendo proceder ao levantamento do capital quando entendesse, bastando avisar a agência com três dias de antecedência.
O A. marido, que não dispunha de conhecimentos sobre produtos financeiros, aceitou, vindo o seu dinheiro a ser aplicado em Obrigações SLN 2006, sem que o A. marido soubesse concretamente do que se tratava, movido pela confiança no referido funcionário, que lhe garantiu ter a mesma garantia do que um depósito a prazo. Nunca lhes foi lido ou explicado qualquer contrato, nem entregue cópia donde constasse as respectivas cláusulas. A existir, trata-se de contrato com cláusulas gerais, que não correspondem à vontade dos AA., tendo sido omitido e distorcido o processo informativo quanto à liquidez do capital, vencimento e prazos de reembolso.
Ao longo do tempo e até Novembro de 2015, foram-lhe pagos os juros, deixando o R. de o fazer a partir dessa data, não tendo o R. procedido à restituição do montante entregue, atribuindo a responsabilidade pelo pagamento à SLN.
Com a actuação do R. os AA. ficaram preocupados e com ansiedade, receando não recuperar o seu dinheiro.
Citado, o R. apresentou contestação, arguindo a incompetência em razão do território, a ineptidão da petição inicial, a prescrição, por o negócio constituir um acto de intermediação financeira e ter decorrido mais de dois anos desde o conhecimento da conclusão da operação, a caducidade da anulabilidade do negócio de subscrição do produto e o abuso do direito, por os AA. terem vindo a beneficiar de uma remuneração muito acima da média, sem qualquer reclamação, apenas reclamando quando findou a remuneração, e impugnando os factos.
Alega que o A. marido conhecia a natureza do produto vendido e foram-lhe explicados os termos para reembolso, e que as Obrigações SLN 2006 eram, à data, um produto seguro, tendo o incumprimento ocorrido por circunstâncias imprevisíveis e anormais. Tal produto foi apresentado ao A. marido e explicadas as respectivas condições e foi acordado entre o A. marido e a SLN.
Os AA. pronunciaram-se quanto às excepções, mantendo o alegado na petição inicial.
Foi dispensada a realização de audiência prévia, tendo sido proferido despacho saneador, que declarou improcedente a excepção de ineptidão da petição inicial, competente o tribunal, relegando a apreciação da prescrição e da caducidade para momento ulterior, considerando o articulado apresentado pela A., enquanto resposta às excepções e não escrito quanto ao demais.
Procedeu-se à realização da audiência final, mantendo-se os pressupostos de validade e regularidade da instância, nada havendo que obste ao conhecimento do mérito da causa.
II - Questões a decidir
Responsabilidade do R. pela intermediação no processo de subscrição de obrigações adquiridas pelos Autores.
Prescrição, por o negócio constituir um acto de intermediação financeira e ter decorrido mais de dois anos desde o conhecimento da conclusão da operação.
Caducidade da anulabilidade do negócio de subscrição do produto
Abuso do direito, por os AA. terem vindo a beneficiar de uma remuneração muito acima da média, sem qualquer reclamação.
III - Fundamentação A - Factos Provados
Com relevância para a acção consideram-se provados os seguintes factos:
1 - Os AA. eram clientes do R. (BPN), na sua agência de Caxarias, com a conta à ordem n° …, onde movimentavam parte dos dinheiros, realizavam pagamentos e efectuavam poupanças. (art. 1.º da petição inicial)
2 - Em 13 de Outubro de 2008 o gerente do Banco Réu da agência de Caxarias, disse ao A. marido, que tinha uma aplicação em tudo igual a um depósito a prazo e com capital garantido pelo BPN e com rentabilidade assegurada. (arts. 2° e 10° da petição inicial)
3 - O dito funcionário do Banco Réu sabia que o A. marido não possuía qualificação, ou formação técnica que lhe permitisse à data conhecer os diversos tipos de produtos financeiros e avaliar os riscos de cada um deles, a não ser que lhos explicassem. (art. 3° da petição inicial)
4 - E que por isso, tinha um perfil conservador no que respeitava ao investimento do seu dinheiro, sendo que até essa data, sempre o aplicou em depósitos a prazo. (art. 4° da petição inicial)
5 - O Réu foi apresentado pelo seu gerente como garante da aplicação financeira em causa. (art. 32° da petição inicial)
6 - As orientações e comunicações internas existentes no BPN e que este transmitia aos seus comerciais nos respectivos balcões consistiam em afirmar a segurança da aplicação financeira em causa, a sua solidez, a boa rentabilidade e assegurar que o Banco garantia o capital investido. (arts. 33° e 35° da petição inicial)
7 - Um dos argumentos invocados pela Direcção Comercial do BPN e que os funcionários da rede de balcões do banco R. repetiam junto dos seus clientes, como o fez com o A. marido, era o de que se tratava de um investimento seguro e, por isso, este assegurava o reembolso do capital investido e juros. (art. 34° da petição inicial)
8 - O Réu pretendia que os seus funcionários tivessem especial empenho na colocação destes produtos e passassem a ideia de que aos mesmos não estavam associados quaisquer riscos quanto ao reembolso do capital e juros, garantindo ele próprio a satisfação de tais encargos. (art. 36° da petição inicial)
9 - O dinheiro dos AA. - 100.000,00€ -, viria a ser colocado em obrigações SLN 2006, sem que os AA. soubessem em concreto o que era (art. 5° da petição inicial - parte)
10 - Os AA. não foram informados sobre a compra das obrigações subordinadas SLN 2006. (art. 18° da petição inicial)
11 - Os AA. nunca assinaram qualquer documento. (art. 22° da petição inicial - parte)
12 - Nunca qualquer contrato lhes foi lido nem explicado, nem entregue cópia que contivesse cláusulas sobre obrigações SLN 2006, nem que contivesse prazos de resolução unilateral pelos AA; e nem nunca conheceram os AA. qualquer título demonstrativo de que possuíam obrigações SLN, não lhes tendo sido entregue documento correspondente. (arts. 19° e 23° da petição inicial)
13 - O que motivou a autorização, por parte do A. marido, foi o facto de lhe ter sido dito pelo gerente que o capital era garantido pelo Banco Réu, com juros semestrais e que poderia levantar o capital e respectivos juros quando assim o entendesse, bastando avisar a agência com a antecedência de três dias. (art. 6° da petição inicial)
14 - O A. marido, actuou convicto de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação segura e com as características de um depósito a prazo, por isso, num produto com risco exclusivamente Banco. (art. 7° da petição inicial)
15 - Se o A. marido tivesse percebido que poderia estar a dar ordem de compra de obrigações SLN 2006, produto de risco e que o capital não era garantido pelo BPN, não o autorizaria. (arts. 8° e 17° da petição inicial)
16 - Nunca foi intenção dos AA. investir em produtos de risco, como era do conhecimento do gerente e funcionários do Réu, e os AA. sempre estiveram convencidos que o Réu lhes restituiria o capital e os juros, quando os solicitassem. (art. 9° da petição inicial)
17 - Os juros foram sendo semestralmente pagos, o que transmitiu segurança aos AA. e nunca os alertou para qualquer irregularidade, face ao que tinha sido dito pelo referido gerente da agência de Caxarias. (art. 11° da petição inicial)
18 - E que manteve até Novembro de 2015, data em que o Banco Réu deixou de pagar os juros respectivos. (art. 12° da petição inicial)
19 - O Banco Réu atribui a responsabilidade pelo pagamento à SLN (art. 13° da petição inicial)
20 - O Banco R. é depositário de 100.000,00€, que mantém aplicados em obrigações SLN 2006. (art. 20° da petição inicial)
21 - Na data de vencimento contratada, o R. não lhes restituiu o montante que os AA. lhe confiaram, sendo que na agência de Caxarias lhes diziam que era melhor esperar até à maturidade das obrigações. (art. 30° da petição inicial)
B - Factos não provados
Da petição inicial:
5° (parte)
desconhecendo inclusivamente que a SLN era uma empresa.
15°
Os AA. não sabiam o que era a SLN; pensavam que era uma mera denominação de conta a prazo, que o Banco Réu utilizava.
22° (parte)
ou deram qualquer ordem de compra de obrigações SLN.
31°
Também não tem cumprido o pagamento dos juros acordados, uma vez que contrataram uma taxa de 4,5% ao ano ilíquida e foram pagos juros na ordem de 1 %, desde Maio de 2009 e até Novembro de 2015.
40°
Além disso, com a sua actuação, o Réu colocou os AA. num permanente estado de preocupação e ansiedade, com o receio de não reaverem, ou de não saber quando iam reaver o seu dinheiro;
41.º
E tem provocado nos AA. ansiedade, tristeza e dificuldades financeiras para gerir a sua vida;
42.º
Pelo que os AA. andam em permanente estado de "stress", doentes e sem alegria de viver, por terem sido desapossados das suas economias de uma vida, e sem perspectivas de futuro;
C - Matéria irrelevante, conclusiva ou de direito da petição inicial:
(…).
D - Motivação
(…).
E - O Direito
(…).
IV - Decisão
Nestes termos, julgo a acção parcialmente procedente, por parcialmente provada, e condeno o R. Banco BB, S.A., a pagar aos AA. CC e DD Alves a quantia de € 100.000,00, acrescida de juros, à taxa legal, contados desde 06.07.2017, até integral pagamento.
Custas por A. e R., na proporção do respectivo decaimento.»

I.2.
O recorrente formulou alegações que culminam com as seguintes conclusões:
«I. Assim deverá ser alterada a matéria de facto retirando a referência à garantia pelo BPN constante dos factos provados nº 2, 5, 6, 7, 8, 13, 15 e 16.
II. Tal alteração resulta da análise do depoimento da testemunha Jorge S… nos trechos acima transcritos em conjugação com o teor da comunicação de cliente assinada pelo Autor, bem como com o teor da nota informativa do produto.
III. Pelos mesmos elementos de prova devem ainda ser dados como não provados os factos constantes do ponto 10 dos factos dados como provados.
IV. Deveria ainda ser considerado como não provado o facto 11 dado como provado uma vez que o próprio Autor reconheceu nas suas declarações de parte da sua assinatura, que aliás não foi impugnada, no documento 2 junto com a Contestação - comunicação de cliente.
V. E consequentemente deveriam ter sido dados como provados o seguinte facto: a) O Autor tinha conhecimento que estava a colocar o seu dinheiro em Obrigações SLN 2006, que vencia em 2016, que se tratava de um produto da dona do banco, facto da qual advinha a sua segurança, e que a liquidez poderia ser obtida através da venda do produto a outro cliente.
VI. Deveria assim ter sido dado como provado, com base nas declarações do Autor, que: b) O Autor teve conhecimento das características do produto subscrito em Novembro de 2008.
VII. Nos termos do disposto no art. 342º, n.º 1 do Cód. Civil, o ónus da prova daquilo que terá sido transmitido no momento da venda impendia sobre o Autor.
VIII. Caberia aos Autores a prova (i) da deficiência ou omissão de informação relevante, susceptível de integrar a violação da obrigação do intermediário financeiro, ou outra violação de obrigações do Réu que julgasse relevantes; (ii) da causalidade adequada entre o dito facto ou omissão, sua ilicitude e ao dano produzido; (iii) do dano! Ao Banco-Réu caberia a contraprova da sua culpa na prático do dito acto ou omissão!
IX. Dos factos dados como provados não consta qualquer facto que suporte a conclusão de que o banco actuou com dolo ou culpa grave.
X. Não logrou assim o Autor também provar qualquer facto consubstanciador do dolo ou culpa grave do Banco Recorrido.
XI. O Tribunal a quo condenou o Recorrente por considerar que o facto do gerente bancário do Réu ter dito ao Autor que a aplicação financeira tinha “garantia de capital e juros” no termo do prazo configura a prestação de uma informação falsa.
XII. O uso dessa expressão apenas pode ser visto como referencia à mecânica de funcionamento do investimento, que é feito por um determinado prazo, findo o qual o capital é reembolsado na totalidade, acrescido da rentabilidade.
XIII. É utópico pretender ver nessa singela referência qualquer espécie de garantia absoluta do investimento, até porque essa garantia não existe.
XIV. Mesmo que se compare o investimento efectuado com aquele que é afirmado como paradigma de investimento seguro – o depósito a prazo – essa garantia não existe, sobretudo até considerando que uma hipótese de insolvência da instituição bancária sempre redundaria na cobertura pelo Fundo de Garantia de Depósitos que, à data do investimento se cifrava em apenas 25.000,00 euros, o que seria fraco consolo para ressarcir uma perda de investimento de 50.000,00 euros.
XV. O Tribunal a quo parece considerar que a aplicação financeira era afinal um “produto de risco”, pelo facto do Autor não ter recebido o capital investido no final do prazo.
XVI. Porém esse raciocínio é uma falácia, pois confunde a causa com a consequência. Não é porque um investimento se possa vir a revelar ruinoso, que o mesmo pode ser classificado como investimento de risco.
XVII. Tal juízo tem que ser feito retroagindo ao momento da subscrição e tendo por base a prognose que então era possível fazer com os dados conhecidos.
XVIII. As obrigações eram então, como são ainda, um produto conservador, com um risco normalmente reduzido, indexado à solidez financeira da sociedade emitente. Ao que acrescia, no caso concreto, o facto de a entidade emitente pertencer ao mesmo Grupo que o Banco Réu, detendo-o até a 100%.
XIX. O investimento efectuado era assim um investimento seguro e não um investimento em qualquer “produto de risco”.
XX. Pelo que o investimento efectuado era então adequado a alguém como o Recorrente.
XXI. A sentença recorrida merece censura por tratar indistintamente os deveres que incidem sobre o intermediário financeiro, sem cuidar de perceber o momento ou o negócio a que dizem respeito e em função do qual devem ser cumpridos.
XXII. Os deveres de informação podem ser categorizados segundo o momento em que devem ser cumpridos (informação pré-contratual ou informação contratual) ou também segundo a estrutura própria dos negócios de intermediação financeira.
XXIII. Trata-se, em suma, de sistematizar os deveres de informação, consoante se referem: i) ao negócio de cobertura – a saber, o contrato de intermediação propriamente dito celebrado entre o intermediário financeiro e o cliente –; ii) ao negócio de execução – a saber, os contratos que o intermediário celebra com terceiros com base nos poderes que lhe foram conferidos pelo negócio de cobertura, ou até mesmo os contratos celebrados entre o cliente e o terceiro, com intermediação do intermediário –; iii) ao instrumento financeiro propriamente dito.
XXIV. Esta segmentação do dever de informação pode ser claramente vista no corpo do nº 1 do art. 312º do CdVM, donde resulta que os deveres de informação aí previstos dizem respeito ao negócio de cobertura, com excepção da alínea d) do referido nº 1 que se refere aos instrumentos financeiros propriamente ditos.
XXV. O art. 312º do CdVM serve como verdadeiro índice programático dos deveres de informação que são aí genericamente afirmados, para depois serem densificados nos preceitos seguintes. Por isso, não tem qualquer cabimento a alegação do Recorrente de que o Recorrido violou as disposições vertidas no art. 312º nº 1 alíneas d) e e). A afirmação desses deveres não assume qualquer autonomia, tendo antes que se buscar na densificação desses preceitos o conteúdo do dever de informação aí genericamente afirmado.
XXVI. A menção do art. 312º nº 1 alínea e) quanto aos riscos especiais envolvidos nas operações a realizar refere-se necessariamente ao negócio de intermediação financeira, enquanto negócio de cobertura e não pode nunca equivaler ao dever de informação sobre o instrumento financeiro em si. Por isso o art. 312º nº 1 alínea e) em nada se relaciona com a situação aqui em crise, de nada servindo a sua invocação para aí estribar um ilícito do Banco Réu.
XXVII. O dever de informação previsto no art. 312º nº 1 alínea d) do CdVM respeitante aos instrumentos financeiros e às estratégias de investimento propostas é depois densificado no art. 312º-E nºs 1 e 2.
XXVIII. A referência do nº 1 deste artigo à natureza do instrumento financeiro refere-se às características e funcionamento do instrumento financeiro.
XXIX. O que, no caso presente, foi suficientemente cumprido pelo Banco Recorrido, conforme resulta da boa análise da facto provada.
XXX. A menção do art. 312º-E nº 1 do CdVM quanto aos riscos do tipo do instrumento financeiro remete para o nº 2 do mesmo preceito, onde o legislador esclareceu a que riscos se refere e sobre os quais está o intermediário financeiro obrigado a informar o investidor, desde que tais riscos sejam aplicáveis, claro está, ao tipo de instrumento financeiro escolhido para o investimento.
XXXI. Nos termos da lei, são estes e apenas estes os riscos do tipo do instrumento financeiro sobre os quais o intermediário financeiro tem que prestar informação.
XXXII. Os riscos a que se refere o art. 312º-E nº2 são riscos endógenos e próprios do tipo de instrumento financeiro e não motivados por quaisquer factores extrínsecos aos mesmos.
XXXIII. Ora, o investimento sobre que versa o presente processo foi feito em Obrigações e é, portanto, um investimento de baixo risco por se tratar de investimento não sujeito a qualquer volatilidade.
XXXIV. Logo, não há necessidade de que a advertência do risco da perda da totalidade do investimento seja feita, porque a mesma não é aplicável ao caso, porque não é inerente ao produto!
XXXV. E não se confunda o cumprimento do dever de informação quanto ao risco da perda da totalidade do investimento com a necessidade de advertência do investidor sobre os riscos de incumprimento pelo obrigado da obrigação de compra decorrente do cumprimento da opção de venda, ou sequer com qualquer advertência sobre uma hipotética insolvência desse mesmo obrigado.
XXXVI. É que essa característica excludente do risco de perda da totalidade do investimento em nada se confunde ou exclui o risco geral de incumprimento de toda e qualquer obrigação.
XXXVII. De facto, esse é um RISCO GERAL e latente de toda e qualquer obrigação e não qualquer risco específico do tipo de instrumento financeiro escolhido e, portanto, não se insere naquela previsão do art. 312º-E nº 2 alínea a).
XXXVIII. A redacção do CdVM anterior à DMIF era muito mais ligeira na obrigação de informação do intermediário financeiro.
XXXIX. E, então, não estava sequer tão densificado o dever de informação, conforme hoje resulta das disposições dos arts. 312º-A a 312º-G, que apenas foram aditadas com o já referido D.L. 357-A/2007 de 31/10.
XL. À data da subscrição das Obrigações, não existia sequer qualquer dever de informação quanto aos riscos associados ao instrumento financeiro, ou quanto ao risco de perda da totalidade do investimento, conforme hoje decorre do art. 312º-E nº 2 alínea a)!
XLI. Para além disto, a anterior redacção do CdVM apenas afirmava no art. 323º uma regra geral quanto ao dever de informação nos negócios de execução, donde resultava a obrigação do intermediário informar o cliente sobre a execução e resultados da operação, da ocorrência de dificuldades especiais na execução ou a inviabilidade da operação, ou de qualquer circunstância que pudesse justificar a modificação ou revogação da ordem.
XLII. Ao contrário do que hoje sucede, não havia na anterior redacção do CdVM qualquer norma que taxativamente obrigasse o intermediário financeiro a prestar informações acerca dos riscos do tipo de instrumento financeiro em que se pretendia investir. Essa foi a grande inovação da D.M.I.F. e do diploma que a transpôs!
XLIII. O incumprimento do dever de informação implica uma presunção de culpa do intermediário financeiro, nos termos do art. 304º-A nº 2 do CdVM, porém não existe qualquer presunção de ilicitude a este respeito, cabendo portanto ao lesado e aqui Autor alegar e provar o que concretas informações é que o Réu deveria ter dado que não deu.
XLIV. O que, como não foi feito, condena a presente acção ao fracasso.
XLV. A ideia que fica de toda a prova produzida é que a referência que foi feita pelo funcionário do Banco Réu à garantia de capital e juros tinha que ver com o modo de funcionamento da aplicação financeira (que não estava sujeita a volatilidade de preço/cotação no termo do prazo) e que, findo o prazo de investimento, haveria o retorno integral do capital, acrescido dos juros.
XLVI. A expressão garantia tem que ver por isso com um retorno certo do capital e não com qualquer caução que o Banco prestasse.
XLVII. E aliás diga-se que, o próprio funcionário do Banco associou essa garantia de capital e juros com o reembolso dos títulos ser efectuado ao valor nominal acrescido dos respectivos juros na data de vencimento de cada emissão, conforme consta da nota informativa!
XLVIII. Fica assim suficientemente esclarecido o que o funcionário pretendia dizer!
XLIX. Ora, esta expressão do funcionário do Banco Réu tem também que ser vista no contexto em que foi proferida. De facto, no início do 2008 ainda não tinha deflagrado a crise financeira de Setembro de 2008 (com a falência do Lehman Brother’s). Nessa altura não era vulgar o incumprimento das obrigações assumidas em títulos, ou a insolvência dos emitentes.
L. Por isso, esse risco não era algo que o público em geral tivesse consciência e que se buscasse certificar ou fosse necessário elucidar.
LI. E tal terá sucedido também com o Autor, que se importou mais com a melhor rentabilidade oferecida, do que propriamente com a identidade de quem ficaria perante si obrigado.
LII. E a informação a prestar pelo intermediário financeiro tem que ser prestada segundo o critério objetivo previsto no art. 312º-Anº 1 alínea c) CdVM, ou seja, de forma a ser perceptível pelo destinatário médio.
LIII. Nada obrigando a que o intermediário financeiro tenha, para além do dever de informar, o dever também de se assegurar que o investidor compreendeu a informação!
LIV. Por tudo isto é necessário concluir que o Banco Réu agiu sem culpa.
LV. Não está provado que se tenha tornado total ou parcialmente impossível receber o montante investido pelo Autor nas Obrigações SLN.
LVI. Daí resulta, portanto, que a condenação do Banco Réu no pagamento da integralidade do valor desembolsado pelo Autor é manifestamente excessiva e não cumpre com o critério teoria da diferença prevista no art. 566º nº 2 do CC, uma vez que dá azo a que o Autor venha depois a receber o que lhe couber da SLN e que acrescerá ao valor da indemnização já porventura pago pelo Réu e equivalente ao montante por ele desembolsado na subscrição do valor mobiliário.
LVII. Ainda que se censure a conduta do Banco Réu (o que não se concede), essa censura NUNCA poderá ser reconduzível a um dolo ou a uma culpa grave.
LVIII. De facto, lida e relida a matéria de facto, a sensação que fica é que o funcionário do Banco Réu nem sequer concebeu a possibilidade de estar a faltar ao dever de informação acerca da aplicação financeira e que, com essa falta, poderia estar a determinar o investimento do cliente num produto que este não quereria se estivesse devidamente informado. A ideia que perpassa é que o funcionário do Banco Réu estava absolutamente convencido da segurança do investimento e da adequação do mesmo ao perfil de investidor do Autor.
LIX. Terá havido portanto (e quando muito) uma indução do Autor em erro, sem que por parte do funcionário do Banco Réu houvesse intenção ou consciência de o fazer – trata-se portanto de uma indução negligente em erro –.
LX. Uma tal conduta apenas pode ser reconduzível à mais leve das formas de negligência - a negligência inconsciente -, pois revela que o agente agiu por imprevidência, descuido, imperícia ou ineptidão, não chegando sequer a conceber a possibilidade do facto se verificar, podendo e devendo prevê-lo e evitar a sua verificação, se usasse da diligência devida.
LXI. Esta graduação da culpa do intermediário financeiro tem particular interesse, sobretudo em sede da prescrição, pois o art. 324º do CdVM permite o advento mais precoce da prescrição nos casos em que, como o presente, não há dolo ou culpa grave.
LXII. E considerando a matéria de facto provada, constatamos que já estavam volvidos mais de dois anos entre a data em que o Autor tomou conhecimento da concreta aplicação efectuada e a data em que propôs a acção.
LXIII.E portanto, já se encontrava prescrita qualquer putativa responsabilidade do Banco Réu!
LXIV. Não é porque foi afirmado ao Recorrido que a aplicação financeira tinha “capital garantido e juros garantidos”, que podemos legitimamente concluir que o Banco assumiu a dívida da SLN!
LXV. Conforme dispõe o art. 595º nº 1 alínea b) do Código Civil, a assunção de dívida pode verificar-se por contrato entre o novo devedor e o credor, com ou sem consentimento do antigo devedor. Acrescenta depois o n.º 2 que “em qualquer dos casos a transmissão só exonera o antigo devedor havendo declaração expressa do credor; de contrário, o antigo devedor responde solidariamente com o novo obrigado.”
LXVI. A assunção da dívida pode ser liberatória nos casos previstos na primeira parte do n.º 2 do art. 595º do CC. Isto é, dependendo de declaração expressa do credor, o devedor originário pode ficar dela exonerado, pela assunção da dívida por novo devedor. Ou então, como acontece na maioria dos casos, ser uma assunção cumulativa da dívida, em que devedor originário e novo devedor se obrigam simultaneamente, sendo ambos solidariamente responsáveis perante o credor.
LXVII. Um dos indícios que pode apontar para a assunção cumulativa da dívida é o facto de, aquando da declaração do novo devedor, tanto o credor quanto o declarante terem conhecimento de que o devedor principal não estava em condições de pagar, uma vez que não se verifica a característica essencial da fiança, traduzida na esperança de que o devedor principal pagará ao fiador sub-rogado.
LXVIII. Não estaria certamente na mente do Banco Recorrente prescindir do direito de ficar sub-rogado nos direitos do credor, por qualquer pagamento que porventura fizesse em prol do emitente do papel comercial, se tivesse assumido a dívida deste.
LXIX. Essa assunção de dívida alheia como se fosse própria, não era inócua nas contas do Banco Réu!
LXX. Não se vislumbra que o Recorrente pudesse ter qualquer interesse real, directo e objectivo próprio no cumprimento dessa obrigação pois, apesar de integrar o mesmo grupo, a aportação de capitais à SLN em nada beneficiava o Réu Banco, sendo antes e apenas útil à cadeia hierárquica societária que estava a montante daquela.
LXXI. Tratando-se de uma fiança, estaria a mesma sujeita à mesma forma exigida para a obrigação principal, nos termos do art. 628º do C.C.
LXXII. A garantia a, para ser válida, teria necessariamente que constar do documento de subscrição.
LXXIII. Não constando, mais não resta do que concluir que a mesma é NULA, nos termos do art. 220º do C.C.
LXXIV. Os subscritores de valores mobiliários estão numa situação de paridade entre si, não sendo possível a emissão dos mesmos com características ou garantias diferentes, sob pena de traição da identidade da figura e violação do princípio par conditio creditorum ou princípio da igualdade dos credores.
LXXV. Se o Banco Apelante tivesse prestado qualquer garantia, ela não poderia ser privativa dos AA., mas teria isso sim que se estender à generalidade dos subscritores e, por isso, estar contida na nota informativa do papel comercial, figurando o aqui Apelante como garante do reembolso, o que, tal qual resulta da nota informativa junta aos autos a fls., não sucedeu!
LXXVI. A condenação do Banco Réu com base na assunção de uma dívida extravasa em muito quer a causa de pedir, quer o pedido dos presentes autos, não sendo por isso viável e legal.
LXXVII. A declaração de uma garantia deve ser especifica e expressamente emitida, não sendo consentânea com declarações vagas e de sentido dúbio…
LXXVIII. Uma declaração negocial corresponde a uma vontade de uma parte em se vincular negocialmente de acordo com o teor dos termos da mesma.
LXXIX. Claramente uma declaração negocial não resulta apenas da impressão do declaratário e do valor que lhe possa dar. Resulta antes de mais da vontade do declarante em se vincular negocialmente, o que não vislumbramos no caso!
LXXX. Não foi feita a prova de que a declaração em causa - capital garantido - não fosse mais do que uma mera caracterização do produto - que até era!
LXXXI. Falta, em suma, a prova de que o Banco, ou o seu funcionário em seu nome, se queria vincular a uma obrigação jurídica.
LXXXII. Não havendo declaração negocial, bem ou mal emitida, não pode haver obrigação jurídica - seja ela qualquer for - de fonte contratual, pelo que não pode, em qualquer circunstância, entender-se que o Banco assumiu uma obrigação de reembolso ou que a afiançou!
LXXXIII. A decisão recorrida violou e fez errada aplicação e interpretação do disposto nos arts. 236º, 570º, 595º, 628º, 220º do Código Civil, 7º, 290º nº 1 alínea a), 304º, 304º-A e 312º a 314º-D e 323º a 323º-D do CdVM e 4º, 12º, 17º e 19º do D.L. 69/2004 de 25/02 e da Directiva 2004/39/CE.»

I.3
Os autores/recorridos apresentaram resposta ao recurso, sustentando a improcedência do recurso e a manutenção da decisão recorrida.
(…).
O recurso foi admitido pelo tribunal recorrido.
Corridos vistos nos termos do artigo 657.º, n.º 2, do Código de Processo Civil (CPC), cumpre decidir.

II. FUNDAMENTAÇÃO
II.1.
As conclusões das alegações de recurso (cfr. supra parágrafo I.2) delimitam o respetivo objeto de acordo com o disposto nos arts. 635.º, n.º 4 e 639.º, nº 1, ambos do CPC, sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (cfr. art. 608.º, n.º 2 e art. 663.º, n.º 2, ambos do CPC), não havendo lugar à apreciação de questões cuja análise se torne irrelevante por força do tratamento empreendido no acórdão (cf. artigos 608.º, n.º 2, e 663.º, n.º 2, do CPC).

II.2.
As questões suscitadas pelo recorrente e que importa apreciar e decidir são as seguintes:
1 – Impugnação da matéria de facto.
2 – Saber se estão verificados os pressupostos da responsabilidade civil do recorrente.
3 – Saber se se encontra prescrita uma eventual responsabilidade civil do réu/recorrente.

II.3.
II.3.1
Questões atinentes à matéria de facto
A primeira questão suscitada pelo recorrente prende-se com a valoração da prova efetuada pelo tribunal de primeira instância.
Um dos princípios basilares, em termos de apreciação de prova, é o da liberdade de julgamento, segundo o qual o tribunal aprecia livremente as provas (art. 607.º, n.º 5, do CPC) e decide apenas com base na sua prudente convicção acerca de cada facto.
O tribunal de 2.ª instância deve, também ele, fazer pleno uso do princípio da livre apreciação das provas, nos mesmos termos em que o deve fazer a 1.ª instância, ponderando e valorando as provas produzidas de acordo com as regras da experiência, os critérios da lógica e os seus próprios conhecimentos.
O princípio da livre apreciação da prova não implica que o juiz adquira uma certeza absoluta sobre a verdade dos factos alegados, bastando-lhe formar um juízo de suficiente probabilidade ou verosimilhança.
In casu, o julgamento sobre a matéria de facto compreendeu como meios de prova as provas documentais juntas aos autos, as declarações de parte do autor e os depoimentos das testemunhas Jorge Miguel Marques Sousa, Carlos Ferreira da Graça e Jorge Pessoa, todos eles funcionários do Banco BPN à data da aquisição, pelos autores, do produto financeiro em causa nos autos, tendo a primeira das testemunhas supra referidas sido o funcionário do Banco recorrente quem interagiu profissionalmente com o autor-marido no negócio de aquisição de obrigações SLN 2006.
Quanto às declarações de parte de Carlos Silva Pereira há que salientar que o mesmo relatou factos de conhecimento pessoal, compatíveis com a prova documental e testemunhal.
O julgamento sobre a matéria de facto compreende uma apreciação global da prova e das narrativas em confronto, articulada com uma análise atomizada de cada específico facto controvertido.
Este tribunal ouviu o registo áudio das gravações quer da testemunha indicada pelo recorrente, quer da testemunha Carlos Graça e ainda das declarações de parte do autor, e analisou a prova documental junta aos autos, pelo que se encontra em condições para sindicar a valoração da prova que foi realizada pelo tribunal a quo.
II.3.1.1.
O recorrente defende que deve ser alterada a matéria de facto constante dos factos provados n.ºs 2, 5, 6, 7, 8, 13, 15 e 16 «retirando a referência à garantia pelo BPN».
Sustenta a alteração pretendida no depoimento da testemunha Jorge S… em conjugação com o teor da «comunicação de cliente» assinada pelo Autor e com o teor da «nota informativa» do produto.
Na sua motivação de recurso, o recorrente alega que «de nenhum elemento de prova se retira, e muito menos do depoimento desta testemunha, única aliás que assistiu à contratação e deu nota do que foi transmitido, que o Banco Réu tenha prestado qualquer garantia de pagamento do empréstimo obrigacionista em causa. Em parte alguma se fala na garantia do BPN».
Quanto aos factos ora em apreço, o tribunal recorrido fundou a sua convicção no depoimento da testemunha Jorge M… «que se apresentou claro, coerente e seguro» «complementado com as declarações do A. e com a documentação supra referida».
O recorrente pretende que não seja dado como provado que o Banco BPN garantiu o reembolso do capital aplicado com o seu próprio capital (o que, desde já se adianta, é diverso de o Banco ter dito aos clientes que o capital era garantido).
Vejamos se lhe assiste razão.
Os factos provados ora em análise têm a seguinte redação:
«Em 13 de Outubro de 2008 o gerente do Banco Réu da agência de Caxarias, disse ao A. marido, que tinha uma aplicação em tudo igual a um depósito a prazo e com capital garantido pelo BPN e com rentabilidade assegurada» (facto provado n.º 2)
«O Réu foi apresentado pelo seu gerente como garante da aplicação financeira em causa» (facto provado n.º 4).
«As orientações e comunicações internas existentes no BPN e que este transmitia aos seus comerciais nos respetivos balcões consistiam em afirmar a segurança da aplicação financeira em causa, a sua solidez, a boa rentabilidade e assegurar que o Banco garantia o capital investido» (facto provado n.º 6).
«Um dos argumentos invocados pela Direção Comercial do BPN e que os funcionários da rede de balcões do banco R. repetiam junto dos seus clientes, como o fez com o A. marido, era o de que se tratava de um investimento seguro e, por isso, este assegurava o reembolso do capital investido e juros» (facto provado n.º 7).
«O Réu pretendia que os seus funcionários tivessem especial empenho na colocação destes produtos e passassem a ideia de que aos mesmos não estavam associados quaisquer riscos quanto ao reembolso do capital e juros, garantindo ele próprio a satisfação de tais encargos» (facto provado n.º 8).
«O que motivou a autorização, por parte do A. marido, foi o facto de lhe ter sido dito pelo gerente que o capital era garantido pelo Banco Réu, com juros semestrais e que poderia levantar o capital e respetivos juros quando assim o entendesse, bastando avisar a agência com a antecedência de três dias» (facto provado n.º 13).
«Se o A. marido tivesse percebido que poderia estar a dar ordem de compra de obrigações SLN 2006, produto de risco e que o capital não era garantido pelo BPN, não o autorizaria» (facto provado n.º 15).
«Nunca foi intenção dos AA. investir em produtos de risco, como era do conhecimento do gerente e funcionários do Réu, e os AA. sempre estiveram convencidos que o Réu lhes restituiria o capital e os juros, quando os solicitassem» (facto provado n.º 16).

Como ponto prévio, impõe-se fazer uma distinção entre o que foi transmitido ao autor-marido no momento em que este deu ordem de aquisição das obrigações SLN 2006 (factos provados n.ºs 2, 5, 6, 7, 8, 13) e a interpretação do autor-marido sobre aquilo que lhe foi dito (factos provados n.ºs 15 e 16).
Como referido supra, o recorrente invoca a «nota informativa» (documento junto à contestação) para sustentar a sua pretensão de alteração da matéria de facto. Contudo, está provado que «nunca qualquer contrato lhes foi lido nem explicado, nem entregue cópia que contivesse cláusulas sobre obrigações SLN 2006, nem que contivesse prazos de resolução unilateral pelos AA.; e nem nunca conheceram os AA. qualquer título demonstrativo de que possuíam obrigações SLN, não lhes tendo sido entregue documento correspondente», facto que não foi impugnado pelo recorrente. Diga-se, aliás, que resultou do depoimento da testemunha Carlos G… que os funcionários do Banco não entregavam a nota informativa do produto aos clientes.
No que respeita à «comunicação de cliente» (documento n.º 2 da contestação) pese embora o autor-marido haja confirmado que a assinou, desconhece-se, porque não foi alegado, quem preencheu os respetivos dizeres e se eles já se encontravam no documento quando o autor o assinou. Pelo que do facto de o autor-marido ter aposto uma assinatura no referido documento do qual consta a seguinte menção «Solicito compra de SLN 2006» não se pode inferir, como pretende o recorrente, que, nessa altura, o autor-marido tomou conhecimento das características do investimento que estava a realizar.
A testemunha Jorge S… — cujo depoimento foi invocado pelo recorrente — começou por referir que embora a colocação das obrigações tivesse sido realizada por ele «não se recorda com precisão sobre o que terá dito ao autor» (sic), acabando por falar da forma como «no âmbito geral, a colocação do produto era realizada» (sic). Por conseguinte, o que esta testemunha explicou ao tribunal foi a forma como as obrigações SLN 2006 eram comercializadas, à data, aos balcões do então BPN, tendo descrito um procedimento semelhante àquele que foi também descrito pela testemunha Carlos G…. O que nos permite retirar a ilação (art. 349.º, do C) de que a forma de atuação da testemunha Jorge S… terá sido idêntica quando abordou o autor-marido, propondo-lhe a aquisição das obrigações SLN 2006.
De acordo com os depoimentos das duas testemunhas mencionadas os funcionários do Banco recorrente (então BPN) transmitiam aos clientes que as referidas obrigações eram um produto seguro, sem risco, com capital garantido, equivalente a um depósito a prazo. Com efeito, Jorge S… declarou: «para nós, a SLN e o Banco eram exatamente a mesma coisa. O que se vendia, na altura, era capital garantido, sem riscos, era equivalente a Banco, a SLN era a dona do banco. Eles saíam dali convictos de que o produto não tinha qualquer risco. A SLN era o Banco. As pessoas acreditavam no que eles lhes diziam». E a testemunha Carlos G… referiu: «colocavam as obrigações SLN como equivalente a um depósito a prazo, com risco zero», «na altura não havia necessidade de distinguir entre a SLN e o Banco e que este não tinha responsabilidade no pagamento, porque não havia qualquer risco de sinistralidade».
Do exposto, se infere que a informação que a testemunha Jorge S… transmitiu ao autor-marido foi a de que o investimento proposto não tinha riscos, o capital era garantido, e que era um investimento equivalente a um depósito a prazo. Inferência que, aliás, vai de encontro ao que o autor afirmou, em sede de declarações de parte: «Tinham dinheiro a prazo que passou para depósito à ordem e o sr. Jorge M… contactou-o e perguntou-lhe se ele queria fazer um novo depósito. Ele respondeu-lhe que queria fazer um depósito por pouco tempo, seis meses, que pudesse levantar quando quisesse. […] Estava convencido de que era um depósito a prazo
Mas, se em face da prova supra mencionada nos parece seguro afirmar que, no momento da contratação, ao autor foi transmitida a informação de que o produto financeiro proposto era seguro, sem risco, com capital garantido, equivalente a um depósito a prazo — pois essa seria, na altura, a convicção daqueles funcionários do Banco para quem não se colocava a hipótese de insolvência da entidade emitente —, já não podemos concluir que foi dito ao autor que o Banco era garante da aplicação financeira em causa, ou seja, que garantia o capital investido no sentido de responder com capital próprio pelo reembolso do montante investido (apesar de o autor-marido assim o ter entendido, como veremos infra).
Transmitir a segurança de um produto financeiro é diferente de transmitir que o próprio Banco garantia com o capital próprio o reembolso do capital investido e quer a testemunha Jorge S…, a única que interagiu com o autor aquando da aquisição pelos autores das obrigações SLN 2006, quer o autor-marido nunca declararam que o primeiro disse ao segundo que o Banco garantia ele próprio o capital investido e os juros convencionados.
Parece-nos pacífico que as duas testemunhas mencionadas estavam de facto convictas na segurança do produto (obrigações SLN 2006), até porque segundo Jorge S… tinha havido transmissão daquele produto, sob a forma de endosso, durante vários anos e sem qualquer problema, facto confirmado, também, pela testemunha Jorge P…, o qual declarou: «estas emissões tinham, por regra, uma remuneração superior à de um depósito a prazo e que apesar de não estarem, na teoria, cotadas, na prática acabavam por ter liquidez informalmente porquanto quando o subscritor as queria resgatar, o respetivo gestor colocava a venda no email geral do Banco e passados que eram, por regra, alguns minutos, aparecia sempre um interessado em assumir a posição, beneficiando, por regra e em geral, dos juros corridos».
Porém, daí a julgar provado que o funcionário do banco afiançou ao autor-marido que o Banco recorrente garantia ele próprio o reembolso do investimento, ou seja, com o seu próprio capital, é um passo que a prova produzida nos autos não nos permite dar.
Questão diversa é a interpretação que o autor-marido fez da informação que lhe foi transmitida pelo funcionário do Banco e a convicção com que ficou relativamente ao investimento que realizou. Ou seja, o que a testemunha Jorge S… disse ao autor-marido seria, ou não, suscetível de nele gerar a convicção de que o investimento proposto era um produto do Banco, por ele garantido?
Para um declaratário normal, colocado na posição do autor-marido — que não possuía qualificação ou formação técnica que lhe permitisse à data conhecer os diversos tipos de produtos financeiros (cfr. facto provado n.º 3) e que até à data sempre aplicara o seu dinheiro em depósitos a prazo (facto provado n.º 4) — dizer que «o capital é garantido» significa que o é a 100% e dizer que «é equivalente a um depósito a prazo» significa que se trata de um produto do Banco, logo por ele garantido, porque, de facto, nos depósitos a prazo é o banco que responde com a sua liquidez pela liquidação do depósito na data do respetivo vencimento e pelos respetivos juros (art. 236.º, n.º 1, do CC).
A própria testemunha Jorge P… acaba por referir que «Quando o Banco captava um depósito a prazo junto de um seu cliente, este está a adquirir e a assumir o Risco Banco, ou seja, o Banco responde com a sua situação líquida pela liquidação do depósito no respetivo vencimento e pelos respetivos juros».
Logo, teremos de concluir que aquilo que foi razoavelmente entendido pelo autor–marido é que estava a adquirir um produto do Banco, garantido pelo próprio Banco.
Não se olvida que a nota informativa permitiria desfazer o «equívoco» do autor-marido se aquela lhe tivesse sido fornecida ou o seu teor explicado no momento ou previamente ao negócio de venda das obrigações SLN 2006. O que não sucedeu (cfr. facto provado n.º 12).
Existe nos autos um email anexo à petição inicial (fls. 15-16.), datado de 26.07.2008.
É um facto que o mesmo se reporta à colocação de uma emissão de papel comercial da SLN Valor, o qual é um produto diverso das obrigações SLN 2006 que estão em causa nos autos e que só foram adquiridas (por endosso), pelos autores, em outubro de 2008.
Contudo, e como é referido na sentença recorrida, o referido email revela «uma estratégia delineada pelo banco BPN para vender produtos destinados a capitalizar-se, transmitindo aos colaboradores que o produto a vender é equivalente a um depósito a prazo, com uma taxa excelente, por ser um produto da SLN, que é a entidade que detém 100% do capital do banco BPN».
A mesma estratégia que foi seguida pelo Banco nos negócios de venda de obrigações SLN 2006, como o evidenciam os depoimentos das testemunhas Carlos G…, Jorge P… e Jorge S…. Com efeito, os argumentos usados por eles juntos dos clientes para a aquisição das obrigações eram, precisamente, a segurança do produto no sentido do reembolso total do capital investido e a sua equivalência a um depósito a prazo, aqueles que estão evidenciados no email supra mencionado, o qual, segundo a testemunha Jorge P… surge «num momento extremamente difícil do grupo SLN, em geral, e do BPN em particular, porquanto tinha acabado de chegar ao Grupo a equipa liderada pelo dr. Miguel Cadilhe, com a missão de o recuperar (o Grupo e o BPN atravessavam graves problemas de liquidez) […]».
No seu depoimento escrito, a testemunha Jorge P… — que tinha funções de Diretor Coordenador da Empresa do Centro BPN – afirmou ainda: «se o BPN não tem sido nacionalizado, com a total separação do restante grupo SLN (que ficou privado do seu braço financeiro), não teria havido nenhum problema com a liquidação de qualquer emissão, fosse ela qual fosse, porquanto ou seria liquidada, com ou sem apoio financeiro do Banco, ou renovada, com acréscimo de remuneração e com toda a normalidade».
Em face do exposto, julga-se parcialmente procedente este segmento do recurso, decidindo que:
1 – O facto provado n.º 2 passará a ter a seguinte redação:
«Em 13 de Outubro de 2008 o gerente do Banco Réu da agência de Caxarias, disse ao A. marido, que tinha uma aplicação em tudo igual a um depósito a prazo, com capital garantido e com rentabilidade assegurada».
2 – O facto provado n.º 5 transitará para os factos não provados.
3 – O facto provado n.º 13 passará a ter a seguinte redação:
«O que motivou a autorização, por parte do autor-marido, foi o facto de lhe ter sido dito pelo gerente que o capital era garantido, com juros semestrais e que poderia levantar o capital e respetivos juros quando assim o entendesse, bastando avisar a agência com a antecedência de três dias»
4 - Mantém-se a redação dos factos provados n.ºs 15 e 16.
5 – O facto provado n.º 6 passará a ter a seguinte redação:
«As orientações e comunicações internas existentes no BPN e que este transmitia aos seus comerciais nos respetivos balcões consistiam em afirmar a segurança da aplicação financeira em causa, a sua solidez, a boa rentabilidade e a garantia do capital investido».
4 – O facto provado n.º 7 passará a ter a seguinte redação:
«Um dos argumentos invocados pela Direção Comercial do BPN e que os funcionários da rede de balcões do Banco R. repetiam junto dos seus clientes, como o fez com o autor-marido, era o de que se tratava de um investimento seguro, com garantia de capital investido e juros».
5 – O facto provado n.º 8 passará a ter a seguinte redação:
«O Réu pretendia que os seus funcionários tivessem especial empenho na colocação destes produtos e passassem a ideia de que aos mesmos não estavam associados quaisquer riscos quanto ao reembolso do capital e juros».

II.3.1.2
O recorrente pretende, ainda, que:
1) Seja considerado não provado o facto provado n.º 10;
2) E, consequentemente, que seja dado como provado que:
«O Autor tinha conhecimento que estava a colocar o seu dinheiro em Obrigações SLN 2006, que vencia em 2016, que se tratava de um produto da dona do banco, facto da qual advinha a sua segurança e que a liquidez poderia ser obtida através da venda do produto a outro cliente».
3) Seja considerado como não provado o facto provado n.º 11;
4) E, consequentemente, que seja dado como provado, que:
«O autor teve conhecimento das características do produto subscrito em novembro de 2008».

O recorrente sustenta a sua pretensão no depoimento da testemunha Jorge S… em conjugação com o teor da comunicação de cliente assinada pelo Autor, com as declarações de parte do autor, «uma vez que o próprio Autor reconheceu nas suas declarações de parte da sua assinatura, que aliás não foi impugnada, no documento 2 junto com a Contestação - comunicação de cliente.» bem como com o teor da nota informativa do produto.
Vejamos se lhe assiste razão.
O facto provado n.º 10 é o seguinte: «Os AA. não foram informados sobre a compra das obrigações subordinadas SLN 2006».
O facto provado n.º 11 é o seguinte: «Os AA. nunca assinaram qualquer documento».
O documento que nos autos surge denominado como «comunicação ao cliente», anexo à contestação como documento n.º 2, está, efetivamente, assinado pelo autor. O autor-marido reconheceu que o assinou, quando prestou declarações de parte.
Do referido documento constam os seguintes dizeres: «Solicito compra de SLN 2006. […]». Trata-se, pois, de uma ordem de aquisição de obrigações SLN 2006.
Não foi alegado que tivesse sido o autor quem preencheu os dizeres constantes do referido documento.
A assinatura do documento, por si só, é manifestamente insuficiente para que se possa concluir que, no momento em que o autor-marido, ali apôs a sua assinatura, aquele tomou conhecimento do tipo de investimento que estava a efetuar, concretamente, a natureza do mesmo e riscos associados. Resultou do depoimento das testemunhas Carlos G… e Jorge S… que aquilo que diziam aos clientes e que aquilo que foi dito ao autor-marido, é que as obrigações SLN eram um produto «equivalente a um depósito a prazo». E que não explicavam aos clientes o que eram «obrigações subordinadas» (as obrigações SLN eram-no) ou que distinguiam entre a SLN (e entidade emissora e responsável pelo reembolso do capital e juros convencionados) e o Banco BPN, a face visível do grupo para os seus clientes, o «braço financeiro do grupo» como lhe chamou a testemunha Jorge P…. E também resultou das declarações de parte do autor-marido que este estava convencido de ter realizado um depósito a prazo.
Refira-se, aliás, que o recorrente não pôs em causa o facto provado n.º 12, do qual consta que aos autores nunca foi entregue documento demonstrativo da aquisição de obrigações SLN.
O recorrente socorre-se, também, da nota informativa do produto, da qual consta, efetivamente, a natureza do produto financeiro, o prazo de reembolso, as condições do reembolso antecipado, entre outras informações.
Contudo, o Banco recorrente não provou, como lhe competia, que entregou a «nota informativa» do produto ao autor-marido.
Pelo exposto, afigura-se-nos correta a valoração realizada pelo tribunal a quo quanto ao facto provado n.º 10.
Em declarações de parte, o autor disse que pensava ter realizado um depósito a prazo de 6 meses que podia levantar ao fim de seis meses e que: «Quando recebeu o extrato, dali a um mês, não percebeu nada e foi ao banco e um colega do Jorge explicou-lhe e falou da SLN. Disse-lhe: o seu dinheiro foi para aqui, não pode mexer neste dinheiro».
Das declarações de parte do autor conjugadas com o documento n.º 2 da contestação, pode-se concluir que, cerca de um mês depois da data em que assinou o referido documento - logo, em data não apurada do mês de novembro de 2008 -, o autor tomou conhecimento que não tinha realizado um depósito a prazo, que tinha subscrito obrigações da Sociedade Lusa de Negócios e que não podia levantar o seu dinheiro quando quisesse. Contudo, não se apurou se nessa altura o autor foi informado de todas as características do produto, sendo que o ónus de prova sobre a extensão da tomada de conhecimento, pelo autor, das características do investimento recai sobre o réu/recorrente.
Em face do exposto:
1) Mantém-se o facto provado n.º 10.
2) Julga-se não provado o facto provado n.º 11.
3) Julga-se provado que «O autor teve conhecimento de que havia subscrito obrigações SLN 2006, em novembro de 2008».
E, consequentemente, altera-se a redação do facto provado n.º 17, a qual passará a ser a seguinte:
«Os juros foram sendo semestralmente pagos», transitando a parte restante para os factos não provados.

II.3.2.
Os factos provados são os seguintes:
1 – Os autores eram clientes do réu (BPN), na sua agência de Caxarias, com a conta à ordem n° …, onde movimentavam parte dos dinheiros, realizavam pagamentos e efetuavam poupanças.
2 - Em 13 de Outubro de 2008 o gerente do Banco Réu da agência de Caxarias, disse ao A. marido, que tinha uma aplicação em tudo igual a um depósito a prazo, com capital garantido e com rentabilidade assegurada.
3 - O dito funcionário do Banco Réu sabia que o A. marido não possuía qualificação, ou formação técnica que lhe permitisse à data conhecer os diversos tipos de produtos financeiros e avaliar os riscos de cada um deles, a não ser que lhos explicassem.
4 - E que, por isso, tinha um perfil conservador no que respeitava ao investimento do seu dinheiro, sendo que até essa data, sempre o aplicou em depósitos a prazo.
5 - As orientações e comunicações internas existentes no BPN e que este transmitia aos seus comerciais nos respetivos balcões consistiam em afirmar a segurança da aplicação financeira em causa, a sua solidez, a boa rentabilidade e a garantia do capital investido.
6 - Um dos argumentos invocados pela Direção Comercial do BPN e que os funcionários da rede de balcões do Banco réu repetiam junto dos seus clientes, como o fez com o autor-marido, era o de que se tratava de um investimento seguro, com garantia de capital investido e de juros.
7 - O Réu pretendia que os seus funcionários tivessem especial empenho na colocação destes produtos e passassem a ideia de que aos mesmos não estavam associados quaisquer riscos quanto ao reembolso do capital e juros.
8 - O dinheiro dos autores - 100.000,00€ - viria a ser colocado em obrigações SLN 2006, sem que aqueles soubessem em concreto o que era.
9 - Os autores não foram informados sobre a compra das obrigações subordinadas SLN 2006.
10 - Nunca qualquer contrato lhes foi lido nem explicado, nem entregue cópia que contivesse cláusulas sobre obrigações SLN 2006, nem que contivesse prazos de resolução unilateral pelos autores; e nem nunca conheceram os autores qualquer título demonstrativo de que possuíam obrigações SLN, não lhes tendo sido entregue documento correspondente.
11 - O que motivou a autorização, por parte do autor-marido, foi o facto de lhe ter sido dito pelo gerente que o capital era garantido, com juros semestrais e que poderia levantar o capital e respetivos juros quando assim o entendesse, bastando avisar a agência com a antecedência de três dias.
12 - O autor-marido atuou convicto de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação segura e com as características de um depósito a prazo, por isso, num produto com risco exclusivamente Banco.
13 - Se o A. marido tivesse percebido que poderia estar a dar ordem de compra de obrigações SLN 2006, produto de risco e que o capital não era garantido pelo BPN, não o autorizaria.
14 - Nunca foi intenção dos autores investir em produtos de risco, como era do conhecimento do gerente e funcionários do réu, e os autores sempre estiveram convencidos que o Réu lhes restituiria o capital e os juros, quando os solicitassem.
15 – O autor teve conhecimento de que havia subscrito obrigações SLN 2006, em novembro de 2008.
16 - Os juros foram sendo semestralmente pagos.
17 – O que se manteve até Novembro de 2015, data em que o Banco Réu deixou de pagar os juros respetivos.
18 - O Banco Réu atribui a responsabilidade pelo pagamento à SLN.
19 - O Banco R. é depositário de 100.000,00€, que mantém aplicados em obrigações SLN 2006.
20 - Na data de vencimento contratada, o réu não lhes restituiu o montante que os autores lhe confiaram, sendo que na agência de Caxarias lhes diziam que era melhor esperar até à maturidade das obrigações.

II.3.3.
A segunda questão suscitada pelo Recorrente prende-se com os pressupostos da responsabilidade civil imputada ao recorrente.
O tribunal de primeira instância entendeu que o ora recorrente violou o que dispõem os arts. 7.º e 312.º, do CVM porquanto não esclareceu o autor sobre a natureza do produto que intermediou. Na sentença afirma-se que «Não houve clareza, quando aludindo a tratar-se de um produto com capital garantido, se não esclarece quem responde efetivamente por essa garantia e, muito menos, se presta informação acerca da situação financeira desse garante; não houve verdade, quando se mistura a informação de depósitos a prazo com empréstimos obrigacionistas, nem o A. foi elucidado sobre o caráter subordinado das obrigações e o significado daí resultante».
No cerne do caso em análise encontra-se o dever de informação a cujo cumprimento estão vinculados quer as instituições bancárias, enquanto tal, quer os intermediários financeiros, e a eventual violação daquele dever por banda do recorrente.
Como ponto prévio se dirá que o negócio de aquisição pelos autores/recorridos do produto financeiro em causa nos autos (obrigações SLN 2006) ocorreu em outubro de 2008, altura em que já estava em vigor o Código de Valores Mobiliários, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 486/99, de 13 de Novembro na redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 357-A/2007, de 31 de outubro, diploma que veio reforçar aquele dever de informação.
Com efeito, nos termos do art. 312.º-A, n.º 1 (introduzido por aquele diploma):
«A informação divulgada pelo intermediário financeiro a investidores não qualificados deve:
a) Incluir a sua denominação social;
b) Não dar ênfase a quaisquer benefícios de uma atividade de intermediação financeira ou de um instrumento financeiro, sem dar igualmente uma indicação correta e clara de quaisquer riscos relevantes;
c) Ser apresentada de modo a ser compreendida pelo destinatário médio;
d) Ser apresentada de modo a não ocultar ou subestimar elementos, declarações ou avisos importantes».

E o art. 312.º-B, n.º 1, sob a epígrafe Momento da prestação de informação, veio prescrever que:
«1- O intermediário financeiro deve prestar a investidor não qualificado, com antecedência suficiente à vinculação a qualquer contrato de intermediação financeira ou, na pendência de uma relação de clientela, antes da prestação da atividade de intermediação financeira proposta ou solicitada, a seguinte informação:
a) O conteúdo do contrato;
b) A informação requerida nos arts. 312.º-C a 312.º-G relacionada com o contrato ou com a atividade de intermediação financeira.»
Não é controvertido que o Banco réu/recorrente, instituição financeira da qual os Autores já eram clientes, celebrou com estes um contrato de intermediação financeira (cfr. arts. 293.º, n.º 1, al. a), 289.º, n.º 1, al. a) e 290.º, n.º 1, al. b), do CdVM), quando lhes propôs e recebeu uma ordem de compra de obrigações SLN 2006.
Incumbe às instituições de crédito assegurar, em todas as atividades que exerçam, elevados níveis de competência técnica, garantindo que a sua organização empresarial funcione com os meios materiais e humanos adequados a assegurar condições apropriadas de qualidade e eficiência (art. 73.º, do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras aprovado pelo Decreto-Lei n.º 292/92, de 31.12). Em conformidade, incumbe aos administradores e empregados dessas instituições proceder, nas relações com os clientes e nas relações com outras instituições, com diligência, neutralidade, lealdade, discrição e respeito consciencioso dos interesses que lhes estão confiados (art. 74.º, do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras). Incumbe ainda às instituições de crédito informar com clareza os clientes sobre a remuneração que oferecem pelos fundos recebidos e os elementos caracterizadores dos produtos oferecidos (art. 77.º, do diploma supra referido).
No Código dos Valores Mobiliários também está previsto que os intermediários financeiros estão obrigados a providenciar ao investidor todos os elementos necessários à tomada de decisões esclarecidas de investimento. E daí que entre os deveres dos intermediários financeiros previstos expressamente no Código de Mercado de Valores Mobiliários, ressalte o dever de informação ao cliente.
O art. 7.º, n.º 1, do CdVM prescreve que «A informação respeitante a instrumentos financeiros, a formas organizadas de negociação, às atividades de intermediação financeira, à liquidação e à compensação de operações, a ofertas públicas de valores mobiliários e a emitentes deve ser completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita» (itálico nosso).
O critério de exigência da qualidade de informação contido na disposição normativa supra citada atende ao investidor médio e às suas necessidades para formar uma decisão de investimento esclarecida, valendo, em geral, para toda a informação obrigatória e ainda para a informação facultativa que seja suscetível de influenciar as decisões dos investidores — neste sentido, Paulo Câmara, Manual de Direito dos Valores Mobiliários, Almedina, Coimbra, 2011, 2.ª edição, p. 688.
O art. 312.º, do Código de Valores Mobiliários enuncia os deveres de informação a que o intermediário financeiro está adstrito, esclarecendo no seu n.º 2 que a extensão e a profundidade da informação a prestar devem ser tanto maiores quanto menor for o grau de conhecimento e de experiência que o cliente tiver. Com o comando contido nesta disposição normativa pretende-se que o intermediário financeiro obtenha a informação preliminar relevante em relação ao cliente de modo a assegurar que toda a informação prestada subsequentemente seja adequada, porque completa e objetiva, na perspetiva das necessidades de esclarecimento do cliente em concreto.
Como é referido por Gonçalo André Castilho dos Santos, A responsabilidade Civil do Intermediário Financeiro Perante o Cliente, Almedina, Coimbra, 2008, p. 135 «São precisamente as avaliações e recomendações prestadas pelos intermediários financeiros que habitualmente motivam os investidores a fundamentar a sua decisão inicial de investimento ou a modificar uma decisão anterior. (…) A crescente complexidade dos serviços e dos produtos financeiros não só justifica uma gradual sofisticação da informação que tenha de vir a ser recolhido e tratada para efeitos de formulação de juízos sobre a qualidade e quantidade dos investimentos em mercado, como também implica, em termos exponenciais, que os custos e riscos envolvidos nessa operação sejam proibitivos para a esmagadora maioria dos investidores, em geral, e dos clientes, em particular. Esta envolvente repercute-se numa especial posição de confiança e dependência do cliente face ao profissional do mercado que, enquanto intermediário financeiro, assume funções significativas na gestão do património daquele.».
De acordo com o disposto no art. 304.º, do CdVM, o intermediário financeiro deve orientar a sua atividade no sentido de proteção dos legítimos interesses dos seus clientes e da eficiência do mercado, observando os ditames da boa-fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência.
O dever de proteção dos legítimos interesses dos seus clientes implica, nomeadamente, um dever de recolha de todo um conjunto de informações sobre o conhecimento e experiência do cliente em matéria de investimento no que respeita ao tipo específico de produto ou serviço oferecido/solicitado, de modo a permitir ao intermediário determinar se o produto/serviço de investimento considerado lhe é, ou não, adequado, bem como um dever de recolha de toda a informação sobre o instrumento financeiro que é proposto ao cliente, de forma a ficar habilitado para ajuizar da adequação/desadequação entre um determinado produto/serviço de investimento e as características concretas do cliente.
De acordo com o disposto no art. 312.º, n.º 1, do mesmo diploma normativo, a prestação de «todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada, inclui, nomeadamente, informação sobre os riscos especiais envolvidos na operação a realizar, a existência ou inexistência de qualquer fundo de garantia ou de proteção equivalente que abranja os serviços a prestar, sobre o intermediário financeiro e os serviços por si prestados. E, nos termos do n.º 4, a informação prevista no n.º 1, deve ser prestada por escrito, ainda que sob forma padronizada.
«O dever de conhecimento do perfil do cliente, sobretudo, nos casos de investidores não qualificados, a avaliação não só da sua capacidade de investimento como a de suportar o risco inerente ao produto que pretende adquirir, para ajuizar se certa transação é adequada ao cliente – suitability test – impõe ao intermediário financeiro um rigoroso dever pré-contratual de informação, que não se queda pelo padrão do bom pai de família, mas antes, dada a professionalidade do banco/intermediário financeiro, lhe impõe um grau de diligência muito mais acentuado, devendo atuar como “diligentissimus pater famílias” não sendo toleráveis procedimentos que possam sequer ser incursos em culpa leve. […] como decorre do art. 312.º-A, n.º 1, als. c) e d) do CVM, a informação divulgada pelo intermediário financeiro deve ser apresentada de modo a ser compreendida pelo destinatário médio; e ser apresentada de modo a não ocultar ou subestimar elementos, declarações ou avisos importantes» (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10.04.2018[1]).
Dispõe o art. 304.º-A do CdVM que:
«1- Os intermediários financeiros são obrigados a indemnizar os danos causados a qualquer pessoa em consequência da violação dos deveres respeitantes à organização e ao exercício da sua atividade, que lhe sejam impostos por lei ou por regulamento emanado de autoridade pública.
2 – A culpa do intermediário financeiro presume-se quando o dano seja causado no âmbito de relações contratuais ou pré-contratuais e, em qualquer caso, quando seja originado pela violação de deveres de informação.»
O incumprimento dos deveres de informação é, pois, suscetível de gerar responsabilidade civil contratual, nos termos do art. 304.º-A, n.º 1, do CdVM, cujos pressupostos estão previstos no art. 798.º, do CC.
São eles: a) o facto voluntário, b) a ilicitude, c) a culpa, d) o dano; e) o nexo de causalidade entre o facto e o dano.
O “facto voluntário”, enquanto comportamento dominável pela vontade, pode revestir a forma da ação ou a da omissão. A assunção de determinada atividade de intermediação financeira perante o cliente implica que a conduta do primeiro se desenvolva segundo padrões de profissionalismo.
A “ilicitude” resulta da desconformidade entre a conduta devida e o comportamento do intermediário financeiro e essa desconformidade traduz-se na inexecução da obrigação para com o cliente.
A “culpa”, para efeitos de responsabilidade do intermediário financeiro, consiste na não adoção de uma conduta que o agente poderia e deveria ter adotado, de acordo com o comando legal.
Como salientado supra, o art. 304.º, n.º 2, do CdVM introduziu um novo padrão de aferição de culpa que transcende, na sua exigência, o do bom pai de família a que se refere o art. 487.º, n.º 2, do Código Civil: «O art. 304.º, n.º 2 estabelece, pois, um padrão de diligentissimus pater famílias, em que, para efeitos de definição da forma de conduta negligente, estão em causa os cuidados especiais que só as pessoas muito prudentes observam.» — Gonçalo Castilho, ob. cit. p. 210.
Para serem indemnizáveis os danos devem ligar-se causalmente ao incumprimento do dever pré-contratual ou contratual (nexo de causalidade).
Prescreve o art. 563.º, do Código Civil que «A obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão.», ou seja, não fora o incumprimento.
Na disposição normativa supra citada está consagrado o critério da causalidade adequada, pela formulação negativa, ou seja, o incumprimento contratual tem, em concreto, de ter constituído condição necessária ao dano, só se excluindo a responsabilidade se ele for, pela sua natureza, indiferente para a produção daquele tipo de prejuízos, isto é, se o lesante provar que apenas a ocorrência de circunstâncias extraordinárias ou invulgares determinou a aptidão causal daquele facto para a produção do dano verificado.

II.3.3.1
Tendo presente o exposto supra, vejamos se, in casu, se verificam os pressupostos da responsabilidade civil obrigacional no que respeita à conduta do banco recorrente.
Os autores/recorridos são investidores não qualificados (art. 30.º, a contrario, do CdVM).
O funcionário do Banco Réu que interagiu profissionalmente com o autor-marido no que respeita ao negócio de aquisição das obrigações SLN 2006 sabia que este último não possuía qualificação ou formação técnica que lhe permitisse, à data, conhecer os diversos tipos de produtos financeiros e avaliar os riscos de cada um deles, a não ser que lhos explicassem, bem como sabia que aquele tinha um perfil conservador no que respeitava ao investimento do seu dinheiro, sendo que até essa data, sempre o aplicara em depósitos a prazo (cfr. supra II.3.2).
O simples facto de os autores/recorridos serem «clientes de depósito à ordem» deveria ter levado o banco recorrente — através daquele seu funcionário — e em conformidade com os supra referidos deveres de diligência, de lealdade e de adequação — a prestar ao autor-marido uma informação detalhada e verdadeira sobre o tipo de investimento que lhe estava a propor, dando-lhe conta dos riscos relevantes, sem subestimar os elementos que eram importantes para o cliente (cfr. art. 312.º-A, n.º 1, do CdVM).
Ainda que a informação exígivel sobre o risco da operação não fosse a de que a entidade emitente (SLN) poderia vir a ser declarada insolvente, até porque não foi alegado que essa fosse uma hipótese que já estivesse no horizonte conhecido do Banco recorrente, o risco de investimento na subscrição de obrigações envolve sempre um risco superior ao dos depósitos a prazo porquanto as “obrigações” representam um direito de crédito sobre a entidade emitente (art. 348.º, do Código das Sociedades Comerciais) o que implica que é aquela que fica obrigada a restituir ao titular da obrigação (credor obrigacionista) quer o montante que lhe é mutuado quer os juros respetivos, quando convencionados, restituição que dependerá sempre da «solidez financeira» da entidade emitente (o próprio recorrente admitiu que o risco está indexado à solidez financeira da sociedade emitente (cfr. contestação). E ao passo que os depósitos a prazo estão cobertos pelo Fundo de Garantia, nas obrigações subordinadas — como são as dos autos — não há fundo de garantia nem mecanismos de proteção contra eventos imprevisíveis. Estes riscos foram absolutamente desconsiderados pelo Banco, que não tratou de informar o autor-marido dos mesmos.
Apesar de não se ter provado que o recorrente assegurou/transmitiu ao autor-marido que o capital estava garantido pelo próprio Banco, transmitiu-lhe que se tratava de um produto seguro, com capital garantido, equivalente a um depósito a prazo, o que para um declaratário normal colocado na posição do autor (art. 236.º, n.º 1 do CC) significava que o capital lhe seria restituído a 100% e que estava a colocar o seu dinheiro num produto com risco exclusivamente Banco. O que não era verdade, como se veio, de resto, a verificar, pois findo o prazo do vencimento das obrigações os autores não foram reembolsados do capital que investiram (cfr. supra II.3.2).
Analisando a nota informativa do produto financeiro em causa nos autos, logo se verifica não apenas a dissonância entre o seu teor e a informação que foi prestada ao Autor, como também a insuficiência da informação que lhe foi veiculada quanto às verdadeiras características do produto e cujo conhecimento era crucial para que aquele pudesse tomar uma decisão livre e consciente sobre negócio que lhe estava a ser proposto.
Com efeito, consta daquela nota informativa o seguinte:
«A presente oferta pública de subscrição não foi objecto de notação por qualquer sociedade de prestação de serviços de notação de risco (rating) registada na Comissão do Mercado de Valores Mobiliários.
As condições da emissão obrigacionista objecto desta nota informativa foram aprovadas pelo Banco de Portugal, em 1 de Outubro de 2004, pelo que o presente empréstimo obrigacionista é considerado, para efeitos do cálculo dos fundos próprios da EMITENTE, como empréstimo subordinado. Assim, as condições do empréstimo obrigacionista prevêem que:
. Em caso de falência ou liquidação da EMITENTE, o reembolso das obrigações fica subordinado ao prévio reembolso de todos os demais credores não subordinados da EMITENTE;
. O prazo inicial de reembolso das obrigações é de 10 anos;
. Os obrigacionistas não poderão solicitar o reembolso antecipado da emissão (…)
. O eventual reembolso antecipado da emissão por iniciativa da EMITENTE terá de ser precedido do acordo prévio do Banco de Portugal.
O Banco Efisa, SA não preparou, analisou ou confirmou a informação prestada pela Emitente. Em conformidade, este prospecto não implica qualquer responsabilidade, compromisso ou garantia do banco Efisa, SA quanto à suficiência, veracidade, objectividade e actualidade do conteúdo da informação prestada pela EMITENTE, nem envolve, por parte do Banco Efisa, SA qualquer juízo de valor quanto à situação económica e financeira da EMITENTE, à sua viabilidade ou à qualidade dos valores mobiliários que constituem a presente oferta, nem qualquer avaliação ou juízo de valor quanto à oportunidade e validade do investimento que depende exclusivamente do critério dos investidores. […]
Do referido documento resulta, desde logo, e designadamente, que a “saúde financeira” da entidade emitente – a Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, SA – não foi sujeita a uma prévia análise de risco por parte de entidades com competência para tal desiderato (as chamadas “agências de rating”) e que o Banco Efisa, SA – entidade responsável pela organização e montagem da operação – também não analisou nem confirmou a qualidade da informação prestada pela entidade emitente sobre a sua situação económica e financeira.
Uma explicação do teor da nota informativa ao autor, por parte do funcionário do réu/recorrente a que estava obrigado por força dos deveres de diligência, lealdade, respeito pelos interesses do cliente e dever de informação, teria permitido ao autor-marido aperceber-se de que a entidade responsável pelo pagamento do capital e dos juros convencionados — a ocorrer tão só no prazo de 10 anos e ao contrário do que era convicção dos autores (cfr. supra II.3.2)— não era o banco recorrente e que a «segurança do produto» não tinha sido sujeita a qualquer filtro designadamente por entidades terceiras alheias ao grupo ao qual pertenciam o Banco Réu e a entidade emitente das obrigações.
As obrigações em causa são «obrigações subordinadas», isto é, obrigações em que o titular da obrigação, em caso de insolvência da entidade emitente, apenas se pode pagar sobre o património do emitente depois de satisfeitos todos os credores comuns, informação relevante que também não foi prestada aos autores.
Em suma, o Banco recorrente não só omitiu informação importante como prestou informação incorreta sobre as características do produto, criando no autor a convicção de que estava a adquirir um produto equivalente a um depósito bancário, logo um produto do Banco, garantido por este último, sendo manifesto que violou os deveres de lealdade, de respeito pelos interesses dos clientes e de informação que sobre si impendiam quer na qualidade de instituição financeira, quer na qualidade de intermediário financeiro.
O Banco recorrente não logrou ilidir a presunção de culpa que sobre si impende (art. 799.º, do CC e 304.º-A, do CdVM).
Os autores não foram reembolsados do capital que investiram na aquisição das obrigações SLN, pelo que se se verificou um dano na sua esfera jurídica.
E verifica-se, também o nexo de causalidade entre o dano e a conduta do Banco Réu/recorrente pois provou-se que o autor-marido atuou convicto de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação segura e com as características de um depósito a prazo, por isso, num produto com risco exclusivamente Banco e que se tivesse percebido que poderia estar a dar ordem de compra de obrigações SLN 2006, produto de risco e que o capital não era garantido pelo BPN, não o teria autorizado.
Pelo que se conclui que o Banco Réu, ao contrário do que vem sustentar nesta sede, incorreu, com a conduta supra descrita, na obrigação de indemnizar os autores.

II.3.4.
Agora a questão da prescrição.
Entende o Banco recorrente que a sua conduta nunca poderá ser reconduzível a um dolo ou a uma culpa grave e que a questão da graduação da culpa tem particular interesse sobretudo em sede de prescrição, atento o disposto no art. 324.º, do CdVM, concluindo que estando volvidos mais de dois anos entre a data em que o autor tomou conhecimento da concreta aplicação efetuada e a data em que propôs a ação, já se encontra prescrita qualquer putativa responsabilidade do Banco Réu.
Prescreve o art. 324.º, n.º 2, do CdVM que «Salvo dolo ou culpa grave, a responsabilidade do intermediário financeiro por negócio que haja intervindo nessa qualidade prescreve decorridos dois anos a partir da data em que o cliente tenha conhecimento da conclusão do negócio e dos respetivos termos.»
Nos casos em que ocorra dolo ou culpa grave do intermediário financeiro, dever-se-á aplicar o prazo geral da prescrição da responsabilidade obrigacional previsto no art. 309.º, do CC, ou seja, o prazo de 20 anos (vd., por todos, Acórdão do STJ de 10.04.2018[2]).
Preliminarmente se dirá que pese embora esteja provado que o autor teve conhecimento de que havia subscrito obrigações SLN 2006, em novembro de 2008, não se provou a extensão do conhecimento do autor sobre as características daquele produto financeiro, naquela data, sendo que era sobre o réu/recorrente que incumbia o ónus de prova, nos termos do disposto no art. 342.º, n.º 2, do CC.
Acresce que estando provado que o réu/recorrente não prestou ao autor-marido a informação que era exigível segundo os padrões da boa-fé, pois não o elucidou sobre todas as características do investimento, designadamente que se tratava de obrigações subordinadas, nem sobre os riscos do negócio, passando através dos seus funcionários a ideia de segurança do produto no sentido do reembolso total do capital investido, levando-o dessa forma a julgar, como aquele julgou, que o retorno do investimento realizado estava garantido como se fosse um depósito a prazo, ou seja, como se fosse um produto do Banco, conhecendo o banco o tipo de aplicações que os autores faziam e sabendo que o grau de conhecimentos do autor-marido não lhe permitiria compreender as características do investimento se as mesmas não lhe fossem explicadas, não se pode senão concluir que o Banco agiu com culpa grave.
«Atento o padrão de exigência imposta ao intermediário financeiro no que concerne ao dever de informar em sede pré-contratual e contratual, e considerando que a sua atuação se afere pelo padrão do diligentissimus pater famílias, o Réu é passível de um acentuado grau de censura: o seu dever de informar, integrando o cerne da prestação, implicava um escrupuloso dever de diligência, pelo que a atuação, intencionalmente omissiva de informação, que era devida, exprime culpa grave.» - Ac. STJ de 10.04.2018[3].
Pelo que, não procede a exceção de prescrição invocada.





III. DECISÃO
Em face do exposto, decide-se julgar improcedente o recurso, mantendo-se a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente.
Notifique.

Évora, 20 de dezembro de 2018,
Cristina Dá Mesquita
Silva Rato
Mata Ribeiro
__________________________________________________
[1] Publicado em www.dgsi.pt.
[2] Publicado em www.dgsi.pt.
[3] Publicado em www.dgsi.pt.