Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
3070/20.1T8LLE-A.E1
Relator: FLORBELA LANÇA
Descritores: RELAÇÃO CAMBIÁRIA
RELAÇÃO JURÍDICA SUBJACENTE
AVALISTA
Data do Acordão: 04/07/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: I. A obrigação do avalista caracteriza-se como autónoma e independente da obrigação avalizada, logo não confundível com a relação obrigacional que está por detrás da emissão da livrança.
II. Consequentemente e com ressalva do pagamento, o avalista não pode opor ao portador excepções filiadas na relação subjacente à emissão do título cambiário.
III. Trata-se, no fundo, de uma decorrência do princípio ínsito no artigo 17.º da Lei Uniforme sobre Letras e Livranças (segundo o qual, em regra, só aos obrigados cambiários imediatos é possível a invocação da relação subjacente) e do conceito de que a relação cartular vale por si própria, em paralelo com a relação fundamental.
IV. Aos embargantes – que, reforce-se, não figuram como devedores no contrato de mútuo em que se consubstancia a relação subjacente à subscrição da livrança – é defeso invocar a excepção peremptória da prescrição, na medida em que os respectivos fundamentos assentam exclusivamente na relação subjacente, não derivando, outrossim, da relação cambiária.
(Sumário da Relatora)
Decisão Texto Integral: Proc. n.º 3070/20.1T8LLE-A.E1
Loulé – Juízo de Execução – Juiz 2
Comarca de Faro

ACORDAM NA 1.ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA


I.Relatório
(…), (…) e (…) deduziram a presente oposição à execução por embargos, por apenso aos autos de execução contra si instaurados por Caixa Geral de Depósitos, S.A., nos seguintes termos:
“(…)
I – A PRESCRIÇÃO
1 - O título dado à execução é uma livrança, subscrita pelos devedores com o aval da executada … (Cfr. doc. n.º 1 da petição).
2 – Esta livrança foi subscrita em 02/05/2000 (Cfr. doc. n.º 1 da petição)
3 – A referida livrança foi preenchida, para fins de execução, em 28 de Outubro de 2020.
4 – Ora, em 28 de Outubro de 2020, já haviam dívidas de mais de 20 (vinte) anos, sobre a data em que a livrança foi subscrita.
5 – A prescrição de direitos está prevista nos artigos 300.º e seguintes do Código Civil.
6 – Nos termos do previsto no artigo 309.º do Código Civil, o prazo ordinário da prescrição é de 20 (vinte) anos.
7 – Nos termos do previsto no artigo 304.º, n.º 1 do Código Civil refere-se que, completada a prescrição, tem o beneficiário a faculdade de recusar o cumprimento da prestação ou de se opor, por qualquer modo, ao exercício do direito prescrito.
8 – Comprovadamente, o prazo de vinte anos já decorreu, entre as datas em que a livrança foi assinada pelos devedores e a data em que a livrança foi preenchida pela exequente e ora dada à execução.
9 – Atento o exposto, verificado que está o decurso do prazo de 20 (vinte) anos, deve a prescrição ser declarada, com todos os efeitos legais, decorrente de tal verificação de prescrição extintiva de direitos.
II – AUTORIZAÇÃO DE PREENCHIMENTO DE LIVRANÇA
(…)
TERMOS,
Em que os executados requerem que os presentes embargos sejam julgados procedentes, por provada, a exceção perentória de prescrição, absolvendo-se os executados dos pedidos contra eles formulados, devendo a exequente ser condenada ainda nos pagamentos das custa.
(…)” (sic).
A Embargada contestou, alegando que o prazo prescricional se conta da data de vencimento da livrança, pelo que ainda não decorreu o prazo de 3 anos e, nessa medida, não prescreveu o direito da exequente.
Alega que a livrança foi preenchida de acordo com a autorização de preenchimento constante na cláusula 24.º do contrato.
Conclui pela improcedência dos embargos deduzidos.
Por despacho proferido em 11.10.2021 foi suspensa a instância quanto à Embargante (…), por virtude da declaração de insolvência, e determinado que a instância prosseguiria relativamente aos demais Embargantes
Realizou-se a audiência prévia, onde, a final, as partes pronunciaram-se nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 591.º do Código de Processo Civil.
Foi, então, proferida sentença que, julgando “improcedentes os presentes embargos de executado quanto aos Embargantes (…) e (…)”, determinou “o prosseguimento da execução quanto aos Embargantes/Executados (…) e (…)”.

Os embargantes, não se conformando com a decisão prolatada, dela interpuseram recurso, apresentando alegações e formulando as seguintes conclusões:
1 – Estando em causa uma execução de uma livrança, quando o Contrato de Mútuo foi assinado em 02/05/2000, e a execução deu entrada em Juízo a 28/10/2020, sem que tenha havido qualquer causa de interrupção do prazo prescricional a dívida subjacente derivada do contrato de mútuo, está extinta por prescrição extintiva pelo decurso do prazo de 20 anos.
2 – Tendo os embargantes, alegado a prescrição da obrigação subjacente, a douta sentença que julgou improcedentes os embargos apenas se pronunciou sobre a prescrição de 3 anos de obrigação cartular, constante da livrança apresentada em juízo em 2/10/2020, decidindo-se pela não verificação da prescrição da livrança quando esta livrança já estava prescrita pelo decurso do prazo, por maioria de razão, da prescrição ordinária.
3 – Quando em 02/05/2020 foi assinado o contrato de mútuo, e assinada em branco a livrança pelos avalistas/recorrentes, o preenchimento da livrança seria em escudos, mas em 2/10/2020 configurando o preenchimento abusivo dado que se apresenta em juízo um título preenchido em euros.
4 – Tendo a exequente dado à execução uma livrança em que esta é preenchida, incluindo todos os juros vencidos desde a data de emissão, até à data em que foi dada à execução, existe um fundamento para declarar que os juros que deveriam ser incluídos na quantia exequenda, deveriam ser apenas relativos aos últimos 5 anos e não os juros da totalidade do prazo.
Assim será feita justiça”.
O apelado respondeu às alegações, pugnando pela confirmação da decisão recorrida.
Dispensados os vistos e nada obstando ao conhecimento do mérito do recurso, cumpre apreciar e decidir.

II. Objecto do Recurso
Sendo o objecto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pelo recorrente e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras (artigos 608.º, n.º 2, 609.º, 635.º, n.º 4, 639.º e 663.º, n.º 2, do Código de Processo Civil).
- Prescrição da obrigação subjacente;
- Preenchimento abusivo da livrança.

III. Fundamentação
1. Os Factos
A decisão recorrida julgou provados os seguintes factos:

1.1. Na execução de que estes autos constituem um apenso, foi apresentado como título executivo uma livrança, onde foi aposto como valor a quantia de € 171.444,71, como data de emissão 2/5/2000 e como data de vencimento 28/10/2020 (cfr. livrança junto aos autos);
1.2. Na livrança acima referida consta como subscritora “(…) – Rent a Car, Unipessoal, Lda.” e no verso da mesma foi aposto o aval, sob a expressão “bom por aval ao subscritor” dos Embargantes (…), (…) e (…);
1.3. A acima referida livrança foi entregue para garantia do cumprimento de todas as responsabilidades emergentes do contrato de abertura de crédito em conta corrente de utilização simples, a o qual foi atribuído o número PT (…), que a Embargada Caixa Geral de Depósitos, S.A. celebrou em 2/5/2000 com a sociedade (…) – Rent a Car, Unipessoal, Lda., na qualidade de mutuária, e com os ora Embargantes na qualidade de avalistas (cfr. documento junto com o requerimento executivo que aqui se dá por reproduzido).
1.4. No contrato acima referido sob a sua cláusula 24.1 consta:
«Para titulação de todas as responsabilidades decorrentes da conta-corrente, o 1º contratante e os avalistas atrás identificados para o efeito entregam à Caixa uma livrança em branco subscrita pelo primeiro e avalizada pelos segundos, e autorizam desde já a Caixa a preencher a sobredita livrança, quando tal se mostre necessário, a juízo da própria Caixa, tendo em conta, nomeadamente, o seguinte:
a) A data de vencimento será fixada pela Caixa em caso de incumprimento pelos devedores das obrigações assumidas ou para efeitos de realização coactiva do respectivo crédito;
b) A importância da livrança corresponderá ao total das responsabilidades decorrentes da presente abertura de crédito, nomeadamente em capital, juros remuneratórios e moratórios, comissões, despesas e encargos fiscais, incluindo os da própria livrança;
c) A Caixa poderá inserir cláusula “sem protesto” e definir o local de pagamento.»

2. O Direito
1.ª Questão Solvenda
A primeira questão decidenda está intimamente relacionada com a prescrição[1].
Sustentam os apelantes que, entre a data em que foi celebrado o contrato de mútuo entre a exequente (como mutuante) e “(…) – Rent a Car, Unipessoal, Lda.” (como mutuária) e a data aposta na livrança, já decorreu o prazo prescricional ordinário de 20 anos (art.º 309.º do Código Civil). Nessa medida e na qualidade avalistas da livrança então entregue, assistia-lhes a faculdade de recusarem a prestação.
A sentença apelada enfrentou a questão colocada à luz do disposto no artigo 70.º da Lei Uniforme sobre Letras e Livranças (ex vi artigo 77.º do mesmo diploma).
Crê-se que esse não é o melhor enquadramento, já que aquele preceito se refere ao prazo de prescrição do título de crédito enquanto tal e não à prescrição respeitante à relação subjacente.
É essoutra prescrição que os apelantes pretendem ver apreciada.
Vejamos.
Decorre inequivocamente dos factos provados que os apelantes avalizaram uma livrança subscrita por uma mutuária, no contexto de um contrato de mútuo bancário, por aquela firmado com a exequente, ora apelada.
A livrança constitui um título de crédito à ordem que consubstancia uma promessa de pagamento pela qual o emitente, subscritor ou sacador se compromete a pagar determinada importância em certa data a certa pessoa. Ao subscritor incumbe assinar a livrança, assumindo a respectiva obrigação (artigo 75.º, n.º 7, da LULL), tornando-se responsável na mesma medida que o aceitante de uma letra (artigo 78.º da LULL). Por conseguinte, assinando a livrança, torna-se um obrigado cambiário que, em primeira linha, responde pelo montante titulado no título.

A livrança constitui um título de crédito rigorosamente formal, onde avultam, entre outros, os princípios da literalidade (a reconstituição da obrigação faz-se pela simples inspecção do título cambiário), da incorporação (a obrigação e o título constituem uma unidade), da autonomia (do direito do portador que é considerado credor originário), da independência (recíproca das obrigações que estão incorporadas no título) e da abstracção (a livrança é independente da sua causa debendi[2].
Sendo o subscritor da livrança responsável nos mesmos termos do aceitante de uma letra (cfr. artigo 78.º, I, da LULL), aquele obriga-se, desde logo, a pagá-la no vencimento[3].
Assim, os subscritores de uma livrança estão, em princípio, vinculados ao pagamento da mesma.
Como se disse, uma das características dos títulos de crédito é a da abstracção. Contudo, a criação da obrigação cartular não aparece por si só, antes pressupõe uma relação jurídica anterior, que constitui a chamada “relação subjacente, fundamental ou causal”, causa remota da assunção da obrigação cambiária[4].
Contudo, por força do princípio da abstracção, a causa debendi em que se traduz a obrigação subjacente encontra-se separada do negócio jurídico cambiário, decorrendo de uma convenção extra-cartular.
O que isto significa é que a obrigação cartular vincula, independentemente, dos vícios de que padeça a sua causa: as excepções causais são inoponíveis ao portador do título, pois, não assentam nele, sendo-lhes estranhas.
Só assim não será no caso das chamadas relações imediatas, i.e. aquelas que se estabeleçam entre um dos subscritores do título e o sujeito cambiário imediato, dado que entre essas pessoas é conhecido o negócio causal (subjacente à emissão dos títulos de crédito) e os eventuais vícios de que ele padeça.

Isso mesmo é, claramente, reafirmado no artigo 17.º, ex vi artigo 77.º da LULL, o qual dispõe que: “As pessoas accionadas em virtude de uma letra não podem opôr ao portador, as excepções fundadas sobre as relações pessoais delas com o sacador ou com os portadores anteriores, a menos que o portador, ao adquirir a letra, tenha procedido conscientemente em detrimento do devedor”.
O aval, por sua vez, “é um negócio jurídico cambiário autónomo, que faz nascer uma obrigação materialmente autónoma, dependente da obrigação principal apenas quanto ao aspeto formal”[5].
Como decorre do primeiro parágrafo do artigo 30.º, ex vi art. 77.º da Lei Uniforme sobre Letras e Livranças, o aval, enquanto negócio jurídico cambiário, desempenha uma função de garantia, cobrindo ou caucionado a obrigação assumida por um interveniente na letra ou na livrança.
Por via da sua independência e autonomia, a obrigação do avalista, firmada perante a obrigação cartular e não perante a relação subjacente, mantém-se, mesmo no caso de a obrigação que ele garantiu ser nula por qualquer razão que não seja um vício de forma. O que quer dizer que, tudo o que ocorra na relação subjacente não possui a virtualidade de se transmitir à obrigação cambiária, pelo que esta se mantém inalterada e plenamente eficaz, podendo o beneficiário do aval agir, mediante acção cambiária.
Por via dessa autonomia, o avalista não pode defender-se com as excepções que o seu avalizado pode opor ao portador do título, salvo a do pagamento.[6]
E, como decorre do primeiro parágrafo do artigo 32.º da Lei Uniforme sobre Letras e Livranças, o dador de aval é responsável da mesma maneira que a pessoa por ele afiançada.
Por isso, é corrente afirmar-se que a medida da responsabilidade do avalista é idêntica à medida da responsabilidade do avalizado[7], respondendo solidariamente com os demais subscritores (primeiro parágrafo do artigo 47.º da LULL). Por outras palavras, o aval não se caracteriza como uma obrigação acessória.
Cabe salientar que o avalista não é sujeito da relação jurídica estabelecida entre o portador e o subscritor da livrança, apenas tendo intervenção na relação jurídica que funda a prestação do aval, a qual só pode ser invocada nas relações entre avalista e avalizado.
Nessa medida, compreende-se que, de acordo com o segundo parágrafo do mesmo artigo 32.º, a obrigação do avalista se mantenha ainda que a obrigação avalizada seja nula (a não ser que a nulidade radique em vício de forma).
Assim, a obrigação do avalista caracteriza-se como autónoma[8] e independente da obrigação avalizada[9], logo não confundível com a relação obrigacional que está por detrás da emissão da livrança.
“(…)
O avalista não é responsável ou não se obriga ao cumprimento da obrigação constituída pelo avalizado, mas tão só ao pagamento da quantia titulada no título de crédito. A obrigação firmada pelo avalista é perante a obrigação cartular e não perante a relação subjacente.
Do que ficou dito supra, o avalista não se obriga perante o avalizado, mas sim perante o titular da letra ou livrança, constituindo uma obrigação autónoma e independente e respondendo como obrigado cartular, pelo pagamento da quantia titulada na letra ou livrança.
(…)”[10].
Consequentemente, e com ressalva do pagamento, o avalista não pode opor ao portador excepções filiadas na relação subjacente à emissão do título cambiário[11].

Trata-se, no fundo, de uma decorrência do princípio ínsito no artigo 17.º da Lei Uniforme sobre Letras e Livranças (segundo o qual, em regra, só aos obrigados cambiários imediatos é possível a invocação da relação subjacente)[12] e do conceito de que a relação cartular vale por si própria, em paralelo com a relação fundamental.
“A posição cambiária do avalista é duma simplicidade e singeleza como dificilmente se encontra fora do direito cambiário: o avalista tem de pagar, sem discutir. Só pode recusar-se no caso de a sua assinatura ser falsa ou de vício de forma (artigo 32.º, II, LULL), ou em caso de prescrição (artigo 70.º da LULL)”[13].
Aqui chegados, conclui-se que aos embargantes – que, reforce-se, não figuram como devedores no contrato de mútuo em que se consubstancia a relação subjacente à subscrição da livrança – é defeso invocar a excepção peremptória da prescrição, na medida em que os respectivos fundamentos assentam exclusivamente na relação subjacente, não derivando, outrossim, da relação cambiária[14].
Improcedem, pois, as conclusões neste conspecto.

2.ª Questão
Advogam os apelantes que se verifica um preenchimento abusivo da livrança, porquanto a mesma foi preenchida em euros e não em escudos. Mais sustentam que apenas seria viável incluir na livrança os juros vencidos nos últimos 5 anos.
Sucede, porém, que nenhuma destas questões, foi expressa ou implicitamente suscitada na petição inicial (ou, sequer, em momento algum da tramitação dos autos no tribunal recorrido) sendo que esse era, sob pena da preclusão do respectivo conhecimento[15], o momento processualmente adequado para o fazer.
É ainda seguro que não se tratam de questões de conhecimento oficioso ou de fundamentos supervenientes de oposição.
É consabido que os recursos destinam-se a reapreciar as decisões dos tribunais recorridos que incidiram sobre questões que por estes hajam sido (ou devessem ter sido) apreciadas.
Os recursos não servem, pois, para conhecer e decidir questões novas, ou seja, aquelas que não tenham sido atempadamente submetidas à apreciação dos tribunais de grau de jurisdição inferior, com ressalva, naturalmente, das questões que são de conhecimento oficioso.
Ora, sendo os recursos meios de impugnação e de correcção de decisões judiciais e não meios para obter decisões novas, não pode o tribunal de recurso ser chamado a pronunciar-se sobre questões sobre as quais o tribunal recorrido não se pronunciou.
Aliás, a jurisprudência é unânime neste sentido, já que os recursos, como remédios jurídicos que são, não se destinam a conhecer questões novas, não apreciadas pelo tribunal recorrido, mas sim a apurar da adequação e legalidade das decisões sob recurso. Despistam erros in judicando, ou in procedendo, que são expressamente indicados pelo recorrente.
Os recursos destinam-se a permitir que um tribunal hierarquicamente superior proceda à reponderação da decisão recorrida[16], constituindo, assim, um instrumento processual para reapreciar questões concretas, de facto ou de direito, que se consideram mal decididas e não para conhecer questões novas, não apreciadas e discutidas nas instâncias[17], sem prejuízo das que são de conhecimento oficioso.
Daí que, não tendo os apelantes suscitado oportuna e tempestivamente as questões que agora expõem nas conclusões 3. e 4. e não sendo estas de conhecimento oficioso (na medida em que a aplicação do direito aos factos no sentido pretendido pelos recorrentes dependia, primeiramente, da tempestiva alegação destes últimos), seja legalmente inviável, por ocorrência da preclusão, o respectivo conhecimento em sede de apelação.
Destarte, é de meridiana clareza, que está vedado a este tribunal ad quem pronunciar-se sobre as aludidas questões
Consequentemente, decide-se não se conhecer, nesse segmento, do mérito do recurso.
Improcede, pois, a apelação.
As custas serão suportadas, porque vencidos, pelos apelantes (n.ºs 1 e 2 do artigo 527.º do Código de Processo Civil).

Sumário:
(…)

IV. Dispositivo
Pelo exposto, acorda-se em negar provimento ao recurso, mantendo-se, embora com diferente fundamentação, a decisão recorrida.
Custas pelos apelantes.
Registe.
Notifique.
Évora, 7 de Abril de 2022
Florbela Moreira Lança (Relatora)
Elisabete Valente (1.ª Adjunta)
Cristina Dá Mesquita (2.ª Adjunta)

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[1] Ao contrário do alegado pelos apelantes, o tribunal não pode suprir ex officio a prescrição, carecendo esta excepção de ser invocada, uma vez que se trata de um meio de defesa pessoal, por quem dela se pretende aproveitar (artigo 303.º do Código Civil).
[2] Assim, Abel Delgado, Lei Uniforme sobre Letras e Livranças, 6.ª ed., 1990, pp. 105.
[3] Neste sentido, vide Abel Delgado, op. cit., pp. 133 e Oliveira Ascensão, Direito Comercial, III, 1992, pp. 135 e seguintes.
[4] Assim, Abel Delgado, op. cit., pp. 105.
[5] Ferrer Correia, Lições de Direito Comercial, III, Universidade de Coimbra, 1975, pp. 215.
[6] Assim, Vaz Serra, RLJ, Ano 113.º, pp. 186, nota 2 e, no mesmo sentido, vide, entre muitos outros, o Ac. STJ de 19.06.2006, CJSTJ, XV, II, pp. 118.
[7] A este respeito, vide Ferrer Correia, Lições de Direito Comercial, III, Universidade de Coimbra, pp. 215.
[8] Assim, Oliveira Ascensão, Direito Comercial, III. AAFDL, pp. 173, para quem o aval nem sequer é uma garantia. No mesmo sentido, vide o Ac. do STJ de 30.09.2010, proferido no proc. n.º 2616/07.5TVPRT-A.P1.S1 e acessível em www.dgsi.pt.
[9] Nas lapidares palavras do Ac. do STJ de 13.04.2011, proferido no proc. n.º 2093/04.2TBSTB-A L1.S1 e acessível em www.dgsi.pt - “O aval é, pois, uma garantia dada pelo avalista à obrigação cambiária e não à relação extracartular”. [10] Acórdão Uniformizador de Jurisprudência do STJ n.º 4/2013, publicado no DR, I Série, n.º 14, de 21 de Janeiro de 2013, pp. 433.
[11] Assim, Vaz Serra, RLJ, Ano 113.º, pp. 186, nota 2 e os Acs. do STJ de 23.01.1986, BMJ 353, pp. 485, de 27.04.1999, CJSTJ, II, pp. 68 e de 19.06.2006, CJSTJ, II, pp. 118 e, mais recentemente, o AUJ n.º 4/2013, publicado no DR, I Série, n.º 14, de 21 de Janeiro de 2013, pp. 433, onde se elenca essa característica como um dos traços diferenciadores relativamente à fiança (cfr. n.º 1 do artigo 637.º do Código Civil).
[12] Assim, vide o Ac. do STJ de 05.12.2006, proferido no proc. n.º 06A2522 e acessível em www.dgsi.pt.
[13] Pedro Pais de Vasconcelos, Aval, informação e responsabilidade, Colóquios STJ – Comércio, Sociedades e Insolvências, CEJ, Abril 2020, pp. 53, acessível em https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2020/04/ebook_cej_coloquioinsolvencias_abr2020.pdf).
[14] Não se localizou qualquer aresto do STJ que, com a data indicada (22.09.2016) versasse sobre a temática em apreço. Acrescente-se que o Ac. da RP de 10.01.2019, proferido no proc. n.º 21800/16.4T8PRT-A.P1, e acessível em www.dgsi.pt, não versou sobre esta temática.
[15] Neste sentido, o Ac. do STJ de 08.03.2005, proferido no proc. n.º 05A373e acessível em www.dgsi.pt.
[16] Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, Novo Regime, pp. 23.
[17] cfr. artigo 676.º, n.º 1, do CPC. Neste sentido, vide Ac. STJ de 28.04.2010, proferido no proc. n.º 2619/05.4TTLSB, acessível em www.gde.mj.pt, Abrantes Geraldes, op. cit., pp. 23, Lopes do Rego, Comentários ao Código de Processo Civil, I, 2.ª ed., pp. 566 e Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em processo Civil, 9.ª ed., pp. 153 a 158.