Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
265/15.3PAVRS.E1
Relator: ANA BARATA BRITO
Descritores: CRIME DE DESOBEDIÊNCIA
EXAME DE PESQUISA DE ÁLCOOL
Data do Acordão: 07/05/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSOS PENAIS
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário:
I - Do cotejo dos artigos 153.º e 156.º do Código da Estrada com a Lei nº 18/2007 resulta que a taxa de alcoolemia se pode demonstrar por teste ao ar expirado (em equipamento qualitativo, a despistagem, e em equipamento quantitativo, a prova ou a contraprova), por análise ao sangue (a prova ou contraprova) e por exame médico (a prova ou contraprova), e que existe uma obrigatoriedade de notificação do condutor após teste de alcoolemia, por escrito ou verbalmente, do resultado, das sanções legalmente decorrentes daquele resultado e de que pode, de imediato, requerer contraprova e que, caso positivo, deve suportar todas as despesas originadas por essa contraprova.

II - Se o condutor sinistrado se encontrar em condições de recusar (de poder recusar, de manifestar uma recusa) rege o nº 3 do 156.º. Os nºs 2 e 3 do art. 156.º, têm de ser lidos e interpretados em conjunto, aplicando-se o nº 2 aos casos em que o visado não está em condições de se manifestar sobre a recolha e utilização do seu sangue para prova da alcoolemia. Ou seja, aplica-se aos casos de inconsciência do condutor, regendo o nº 3 para os restantes. Pois só assim faz sentido o nº 3, com a previsão do visado poder recusar a colheita.

III - A prova da alcoolémia obtida através do sangue não pode ser alcançada coercivamente. O visado não pode ser sujeito, contra sua vontade e à força, à colheita de sangue com vista à demonstração da taxa de alcoolemia. Só que a sujeição a exame médico consequente à recusa pressuporia também a deslocação a meio hospitalar, deslocação que o arguido também recusou.
Decisão Texto Integral:
Acordam na Secção Criminal:

1. No processo sumário nº 265/15.3PAVRS, da Comarca de Faro, foi proferida sentença em que se decidiu condenar o arguido A. como autor de um crime de desobediência do arts. 348º, nº 1, al. a), e 69º, nº 1- al. c), do Código Penal e 152º, nºs 1-a) e 3, do Código da Estrada, na pena de 60 dias de multa à taxa diária de € 5,00 (multa total de € 330,00) e em 5 meses de proibição de condução de veículos com motor.

Inconformado com o decidido, recorreu o arguido, concluindo:

“1 – O presente recurso tem por fundamento o decidido por sentença oral proferida em 06/01/2016, após realização de Audiência de Julgamento em que se condenou o arguido A. pela prática de um crime de desobediência previsto e punido pelos artigos 348º n.º 1 e 69º n.º 1 c) ambos do Código Penal e na sanção acessória de inibição de condução.

2 – Tem por objecto a reapreciação da matéria que foi considerada provada, nomeadamente onde se declara que “o arguido se negou submeter-se a exame ao sangue, que se recusou submeter-se a teste de álcool”

3 – Tem por objecto aferir-se da nulidade do auto de notícia da detenção. Por desrespeito pelo preceituado no artigo 156º n.º 3 do Código da Estrada.

4 – O Tribunal não andou bem ao condenar o arguido pela prática de um crime de desobediência.

5 – O Tribunal violou o disposto no artigo 71º do Código Penal, por incorrecta e imprecisa aplicação.

6 – O Tribunal violou o disposto no artigo 156º n.º 3 do Código da Estrada.

7 – O Tribunal desrespeitou o disposto no artigo 348º n.º 1 do Código Penal por incorrecta avaliação dos factos

8 – O Tribunal não andou bem ao não tomar em linha de conta a condição de debilidade física (doença obstrutiva aérea) do arguido.

9 – O auto de detenção e condução…. Como está formulado, é nulo.

10 – Nestes termos e nos mais de direito e sobretudo com o vosso douto suprimento deve a sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que absolva o arguido com todas as consequências legais. .”

O Ministério público respondeu ao recurso, concluindo:

1 – A sentença ora recorrida, bem andou, ao condenar o arguido A., pela prática, em autoria material, de um crime de desobediência, previsto e punido pelos artigos 348.º, n.º 1 e 69.º, n.º 1, alínea c) ambos do Código Penal.

2 – O arguido bem sabia que a sua recusa a cumprir uma ordem legítima, e legalmente imposta, o faria incorrer na prática de um crime de desobediência, tendo agido, de forma livre, de acordo com essa determinação e vontade.

3 – O arguido bem sabia que o teste ao sangue, para aferir a taxa de álcool, deveria ser feito num estabelecimento de saúde, e nunca numa Esquadra da Polícia.

4 – O arguido foi devidamente advertido de que caso não fizesse o teste ao sangue, dirigindo-se ao Hospital com o agente policial que o fiscalizava, incorreria na prática de um crime de desobediência, o qual recusou, peremptoriamente.

5 – A pena principal à qual o arguido foi condenado na sentença ora recorrida, mostra-se justa, proporcional e adequada às circunstâncias em que os factos concretos ocorreram, bem como, à culpa do agente e exigências de prevenção geral e especial que a situação impõe, nos termos e com respeito pelo disposto nos artigos 40.º, 70.º e 71.º do Código Penal e artigos 374.º, n.º 2 e 375.º, n.º 1 do Código de Processo Penal.

6 – No que respeita à pena acessória, entendemos ser adequado e proporcional, por satisfazer as necessidades de prevenção especial e de socialização do arguido, a aplicação ao mesmo de uma pena acessória não inferior a oito meses de proibição de conduzir veículos com motor, sendo também este o limite suficiente para assegurar as necessidades de prevenção geral de intimidação.

O Ministério Público recorreu também, concluindo:

“1 – A pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor deverá, in casu, ser fixada por um período não inferior a oito meses.

2 – Para a aplicação em concreto da medida da pena acessória dever-se-á ter em consideração, para além dos critérios gerais previstos nos artigos 40.º e 71.º do Código Penal, o facto da mesma ter uma finalidade mais restritiva, em relação à finalidade da pena principal, a de prevenir a perigosidade do agente, não se esgotando na intimidação da generalidade.

3 – Apenas assim se respeitará o normativo previsto no artigo 69.º do Código Penal. .”

O arguido respondeu ao recurso do Ministério Público, concluindo:

“a. A situação pessoal do Agente, pessoa idosa, com 85 anos de idade, doente crónico, oncológico, com obstrução grave das vias respiratórias – com grave dificuldade em respirar – e com necessidade de se deslocar a Faro, a 60 Km da sua residência habitual, para tratamentos médicos (conf. doc. Junto aos autos);

b. O modo como os factos ocorreram nomeadamente o facto de o arguido não ter sido conduzido a centro hospitalar para ser visto por médico, em obediência ao disposto no artigo 156º Código da Estrada.

c. Não faz sentido falar-se numa “perigosidade especial” do arguido, perigosidade que não se encontra espelhada nos autos.

Assim, entendemos não ter razões de ser a pretensão da digna Magistrada do Ministério Público, não devendo em consequência, ser dado provimento à sua pretensão.”

Neste Tribunal, o Sr. Procurador-geral Adjunto emitiu parecer, pronunciando-se no sentido da improcedência do recurso do arguido e da procedência do recurso interposto pelo Ministério Público. Não houve resposta ao parecer. Colhidos os vistos, teve lugar a conferência.

2. Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente, sem prejuízo do conhecimento oficioso dos vícios do art. 410º, nº 2 do Código de Processo Penal (AFJ de 19.10.95), as questões a apreciar no(s) recurso(s) são (a) o erro de subsunção e (b) a medida da pena acessória.

a) Do erro de subsunção

Defende o recorrente arguido que não cometeu o crime pelo qual foi condenado uma vez que inexistiu qualquer recusa da sua parte em se submeter ao teste de alcoolemia. Simplesmente não conseguiu realizar o teste através do ar expirado, devido a doenças de que padece (doença respiratória e doença oncológica), e não permitiu que lhe fosse feita a colheita de sangue por pensar que esta ocorreria na esquadra policial, o que poria ainda mais em perigo a sua saúde.

Como desenvolve na motivação, o acidente ocorreu cerca das 17.00 horas e ter-se-ia mantido em tentativas de realização do teste até às 20h30m. Mais refere que “não foi conduzido a Centro de Saúde para colheita de sangue porque o Agente da PSP não entendeu, em desrespeito pelo dispositivo legal vigente – art. 156º nº 3 do Código da Estrada que o devesse fazer”, que “a entidade autuante não cumpriu aquilo a que estava legalmente obrigada – conduzir o arguido, interveniente em acidente de viação e cujo teste de despiste da amostra de álcool no sangue não tenha sido validado, a estabelecimento de saúde para ser sujeito a exame médico - artigo 156º n.º 3 do Código da Estrada.

O arguido não teria, por tudo, actuado com dolo, e a sua conduta não configuraria a prática de qualquer crime.

O Ministério Público pronunciou-se no sentido da confirmação da condenação.

A invocação do erro de subsunção assenta num quadro factual diverso daquele que se provou em julgamento. Ou seja, de acordo com a sentença oral a cuja audição se procedeu nesta Relação, ficou provado que o arguido, interveniente em acidente de viação nas circunstâncias de tempo, modo e lugar referidas no auto de notícia, foi sujeito a teste qualitativo de alcoolémia, que deu resultado positivo. Conduzido depois à esquadra onde foi sujeito a teste quantitativo, frustrou-se a realização deste por incapacidade física do arguido, que foi então informado de que teria de ser efectuado o teste por meio de análise de sangue, o que o arguido se recusou a fazer.

Mais se provaram os factos pessoais do arguido, designadamente os relativos ao seu estado de saúde e ao padecimento de doença oncológica e respiratória.

O arguido questiona a incriminação por falta de preenchimento do elemento típico subjectivo, mas não procede a uma correcta impugnação da matéria de facto que lhe está subjacente, nos termos do art. 412º, nº 3 do CPP. Limita-se a especificar alguns pontos do depoimento do agente da PSP autuante, em que este reconhece que o arguido referiu na esquadra o seu estado de saúde e que a testemunha do mesmo se apercebeu.

No entanto, o excerto de prova especificado nada altera ao decidido na sentença, pois nunca seria dele que resultaria o eventual erro de facto.

O que o recorrente problematiza em recurso é uma pretensa omissão de informação relativa a ida a estabelecimento hospitalar ou a centro de saúde para colheita de sangue, e que o arguido se teria recusado apenas a que lhe fosse colhida a amostra de sangue na esquadra (por polícias, presume-se).

Tendo-se procedido nesta Relação, não só à audição da sentença oral, mas também à audição das gravações de toda a prova produzida em julgamento, ao abrigo do disposto no art. 412º, nº 6 do CPP, constata-se que pela testemunha agente da PSP autuante foi dito que o arguido foi por si devidamente informado de que se teria sujeitar a recolha da amostra de sangue em meio hospitalar ou centro de saúde e foi a esta diligência que manifestou recusa.

A testemunha foi ouvida por duas vezes, pois o arguido pediu para prestar de novo declarações sobre este ponto, e das duas vezes depôs no sentido referido.

O tribunal, confrontado com as duas versões antagónicas (antagónicas apenas quanto ao ponto de facto referido, que é o único que está em discussão no recurso), considerou mais verosimilhante e credível a da testemunha de acusação, por razões que se explicam na sentença e que o recorrente não coloca suficientemente em causa em recurso.

Não é, pois, vislumbrável qualquer erro de facto na sentença, pois esta não enferma de erro na apreciação da prova.

Consequentemente, não ocorreu também erro na aplicação do direito, pois não só foram cumpridos todos os procedimentos legais, como o auto de notícia não padece de qualquer nulidade.

Senão, reveja-se o quadro legal de referência.

Os condutores intervenientes em acidente de viação encontram-se legalmente obrigados à detecção do estado de influenciado pelo álcool.

O artigo 152º, nº 3, do Código da Estrada preceitua que os condutores e peões intervenientes em acidentes de viação “que recusem submeter-se às provas estabelecidas para a detecção do estado de influenciado pelo álcool ou por substâncias psicotrópicas são punidos por crime de desobediência”.

A detecção do estado de influenciado pelo álcool ou por substâncias psicotrópicas processa-se de um modo sempre legalmente vinculada.

Do artigo 153º do mesmo diploma decorre que “o exame de pesquisa de álcool no ar expirado é realizado por autoridade ou agente de autoridade mediante a utilização de aparelho aprovado para o efeito” (nº 1); que “se o resultado do exame previsto no número anterior for positivo, a autoridade ou o agente de autoridade deve notificar o examinando, por escrito, ou, se tal não for possível, verbalmente, daquele resultado, das sanções legais dele decorrentes, de que pode, de imediato, requerer a realização de contraprova e de que deve suportar todas as despesas originadas por esta contraprova no caso de resultado positivo” (nº 2); e que “a contraprova referida no número anterior deve ser realizada por um dos seguintes meios, de acordo com a vontade do examinando: a) novo exame, a efectuar através de aparelho aprovado; b) análise de sangue” (nº 3).

Decorre também deste artigo que “se o examinando preferir a realização de uma análise de sangue, deve ser conduzido, o mais rapidamente possível, a estabelecimento oficial de saúde, a fim de ser colhida a quantidade de sangue necessária para o efeito” (nº 5).

Por seu turno, a Lei nº 18/2007 dispõe, no seu art. 1º, que “a presença de álcool no sangue é indiciada por meio de teste no ar expirado, efectuado em analisador qualitativo (nº 1); a quantificação da taxa de álcool no sangue é feita por teste no ar expirado, efectuado em analisador quantitativo, ou por análise de sangue (nº 2); a análise de sangue é efectuada quando não for possível realizar o teste em analisador quantitativo (nº 3)”.

De acordo com o artigo 2º da mesma lei, “quando o teste realizado em analisador qualitativo indicie a presença de álcool no sangue, o examinando é submetido a novo teste, a realizar em analisador quantitativo, devendo, sempre que possível, o intervalo entre os dois testes não ser superior a trinta minutos” (nº 1); “para efeitos do disposto no número anterior, o agente da entidade fiscalizadora acompanha o examinando ao local em que o teste possa ser efectuado, assegurando o seu transporte, quando necessário” (nº 2).

Por último, o art. 156º do CE prevê os “exames em caso de acidente”:

"1 - Os condutores e os peões que intervenham em acidente de trânsito devem, sempre que o seu estado de saúde o permitir, ser submetidos a exame de pesquisa de álcool no ar expirado, nos termos do artigo 153.º; 2 - Quando não tiver sido possível a realização do exame referido no número anterior, o médico do estabelecimento oficial de saúde a que os intervenientes no acidente sejam conduzidos deve proceder à colheita de amostra de sangue para posterior exame de diagnóstico do estado de influência pelo álcool e ou por substâncias psicotrópicas; 3 - Se o exame de pesquisa de álcool no sangue não puder ser feito ou o examinando se recusar a ser submetido a colheita de sangue para análise, deve proceder-se a exame médico para diagnosticar o estado de influência pelo álcool e ou por substâncias psicotrópicas. 4 - Os condutores e peões mortos devem também ser submetidos ao exame previsto no nº 2.”

Do cotejo das referidas normas do Código da Estrada com a Lei nº 18/2007 resulta que a taxa de alcoolemia se pode demonstrar por teste ao ar expirado (em equipamento qualitativo, a despistagem, e em equipamento quantitativo, a prova ou a contraprova), por análise ao sangue (a prova ou contraprova) e por exame médico (a prova ou contraprova), e que existe uma obrigatoriedade de notificação do condutor após teste de alcoolemia, por escrito ou verbalmente, do resultado, das sanções legalmente decorrentes daquele resultado e de que pode, de imediato, requerer contraprova e que, caso positivo, deve suportar todas as despesas originadas por essa contraprova.

Independentemente de se tratar já de uma prova com relação estreita com a pessoa e o seu corpo - que pode incidir sobre o corpo (extracção de sangue) ou sobre manifestações deste (o ar expirado) o que justificaria logo procedimentos ou regras especiais à luz da lei geral (vide art. 154º do CPP) -, o direito especial rodoviário sujeita-a a formas vinculadas de aquisição e de obtenção.

A lei prevê detalhadamente o modo como pode fazer-se a demonstração da alcoolemia e do seu grau, no âmbito do direito estradal, e obriga ainda a um dever de comunicação e informação, impondo um procedimento assumidamente transparente. O modus de obtenção da taxa de alcoolemia para o processo traduz-se, pois, numa actividade vinculada e subtraída ao critério livre da autoridade policial ou judiciária.

Mas o regime probatório é aqui também, claramente, de imposição – imposição ao arguido de sujeição à verificação (através do seu sopro, do seu sangue ou do seu corpo) com ligações sensíveis ao princípio do nemo tenetur, que se encontram abstractamente resolvidas na lei com pronúncia de conformidade constitucional da parte do Tribunal Constitucional.

Do art. 156º do CE resulta que o exame através do sangue se justifica perante uma impossibilidade de se proceder ao exame através do ar expirado, atento o estado físico do condutor sinistrado, como sucedia. Da norma não resulta a possibilidade de se proceder à imediata extracção do sangue para prova da alcoolemia sem o conhecimento ou o consentimento do visado, ou seja, sem o esclarecimento sobre a finalidade e o destino da colheita, encontrando-se o mesmo perfeitamente consciente, como sucedia no caso presente.

Se o condutor sinistrado se encontrar em condições de recusar (de poder recusar, de manifestar uma recusa) rege o nº 3 do 156º. Os nºs 2 e 3 do art. 156º, têm de ser lido e interpretados em conjunto, aplicando-se o nº 2 aos casos em que o visado não está em condições de se manifestar sobre a recolha e utilização do seu sangue para prova da alcoolemia. Ou seja, aplica-se aos casos de inconsciência do condutor, regendo o nº 3 para os restantes. Pois só assim faz sentido o nº 3, com a previsão do visado poder recusar a colheita.

A prova da alcoolémia obtida através do sangue não pode ser alcançada coercivamente. O visado não pode ser sujeito, contra sua vontade e à força, à colheita de sangue com vista à demonstração da taxa de alcoolemia. Só que a sujeição a exame médico consequente à recusa pressuporia também a deslocação a meio hospitalar, deslocação que o arguido também recusou.

Por último, refira-se que nenhum destes procedimentos poderia ser desconhecido deste arguido em concreto. Da leitura dos factos provados constantes da sentença junta a fls 44-55 – ou seja, da condenação que sofreu anteriormente em tribunal – resulta que foi condenado precisamente por factos (cometidos em 2011) em tudo idênticos aos agora apurados.

Rege, por tudo, o art. 152º, nº 3, do Código da Estrada que, como se disse, determina que os condutores e peões intervenientes em acidentes de viação “que recusem submeter-se às provas estabelecidas para a detecção do estado de influenciado pelo álcool ou por substâncias psicotrópicas são punidos por crime de desobediência”.

(b) Da medida da pena acessória

O Ministério Público recorreu da pena acessória, pugnando que esta seja fixada em 8 meses de proibição de condução.

Argumentou que o arguido, quando condenado em 2011 por crime de igual natureza, foi sujeito a uma pena acessória de proibição de veículos com motor pelo período de 4 meses, o que não foi suficiente para evitar que voltasse a reincidir; que 5 meses de proibição de conduzir, apenas mais um mês em relação à condenação anterior, “representaria um prémio para aquele”; que o arguido se recusou a efectuar o teste ao sangue demonstrando uma “atitude de total desprezo para com a Justiça, não podendo por isso ser beneficiado em relação ao agente que, sujeito ao referido teste ao álcool, acusa uma taxa de álcool no sangue elevada, por exemplo de 2,000 g/l e, por isso, logo numa primeira condenação, é condenado a uma pena acessória de, pelo menos, sete meses de proibição de conduzir veículos com motor”.

O Senhor Procurador-geral Adjunto nesta Relação acompanhou este recurso.

No entanto, considera-se que a pena acessória fixada na sentença se revela adequada às exigências de prevenção geral e especial e ainda proporcionada à culpa do arguido.

Sempre na concepção do recurso em processo penal como um recurso-remédio, o que sucede também em matéria de pena, compete à Relação apenas detectar e corrigir de erros de julgamento.

A Relação não fixa a pena como se inexistisse uma decisão de 1ª instância, ignorando a margem de livre apreciação do juiz de julgamento enquanto componente individual do acto de julgar.

Na imediação com o arguido, na satisfação do direito deste a estar pessoalmente perante o juiz que lhe determina a pena e a ver a sua pena decidida por este, a senhora juíza fixou a pena acessória em 5 meses de proibição de condução. Esta medida, é certo, aproxima-se bastante do limite mínimo da moldura abstracta. Aproxima-se do mínimo, é pouco superior a uma pena acessória que o arguido já sofreu anteriormente, mas, mesmo assim, não se situa no mínimo, é superior à pena anterior, e não há fortes razões para considerar que, em concreto, frustre as exigências de prevenção geral e especial.

Acresce que a circunstância que o Ministério Publico invoca - “o arguido recusou-se a efectuar o teste ao sangue demonstrando uma atitude de total desprezo para com a Justiça” – já faz parte do tipo de crime. Junte-se que o arguido é pessoa doente e de idade muito avançada (está prestes a completar 86 anos, sendo o seu “tempo” diferente do tempo de um condutor mais jovem). E apesar da sua longa vida conta apenas com um antecedente criminal (por crime idêntico), sendo diminutas as exigências de prevenção especial, e mostrando-se as de prevenção geral já satisfeitas com a pena acessória determinada na sentença.

4. Face ao exposto, acordam na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora em:

Julgar improcedentes os recursos, confirmando-se a sentença.

Custas pelo recorrente arguido que se fixam em 4UC (arts 513º /1, 514º/1 CPP, 8º/5, Tab. III RCP).

Évora, 05.07.2016

(Ana Maria Barata de Brito)

(Maria Leonor Vasconcelos Esteves)