Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
214/14.6T8BJA.E1
Relator: ELISABETE VALENTE
Descritores: CASO JULGADO
Data do Acordão: 06/16/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Decisão: REVOGADA
Sumário: I - Nas acções executivas para entrega de coisa certa, o direito de retenção da coisa traduz um ónus processual dos executados a exercer nos Embargos desde que já existentes à data e a falta de alegação nessa sede gera a sua preclusão.
II - Se assim não fosse, assistiríamos a uma reversão da ordem de entrega que transitou em julgado, pondo em causa a sua autoridade com a invocação de fundamentos omitidos antes pelas partes e já invocáveis na altura e nunca se conseguindo alcançar a paz jurídica sobre a situação em causa.
Decisão Texto Integral:

1 - Relatório.

A) Nos autos nº 128/00, AA e mulher BB, CC e mulher DD e EE, fizeram ingressar em juízo, no dia 05.06.2000, contra FF e GG, um pedido de passagem de mandado de despejo relativamente a prédios rúisticos:
Os executados deduziram embargos de executado (128-A/00) invocando a inexistência e inexequibilidade do título, a inexigibilidade e incerteza da obrigação e a falta de pressuposto processual essencial.
Alegaram que os embargados não possuíam qualquer título executivo, que não foi respeitado o prazo de denúncia previsto na lei e que não foi cumprida qualquer fase extra-judicial.
Foi proferido despacho saneador, no qual se conheceu do pedido formulado, tendo os embargos sido julgados procedentes, mas por Acórdão do Tribunal da Relação de Évora e do STJ essa decisão foi revogada e os Embargos julgados improcedentes, decisão transitou em julgado.
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B) - A presente acção declarativa de condenação, sob a forma ordinária foi intentada por FF e GG contra AA e mulher BB, CC e mulher DD e Castro e EE, pedindo os AA. que:
a) Fosse reconhecido e declarado que a carta de denúncia escrita pela mãe dos RR. ao A. marido é extemporânea, sendo nula e de nenhum efeito, não respeitando a antecedência legal;
b) Fosse reconhecido e declarado que, não podendo o A. opor-se à denúncia nos termos da lei, os RR. só podiam obter título executivo de denúncia através de acção judicial própria;
c) Sejam os RR. condenados a reconhecer que, aquela denúncia só poderia proceder eventualmente para 15 de Agosto de 2006.;
d) Seja reconhecido e declarado o direito de indemnização por benfeitorias dos AA., com base no enriquecimento no valor de € 319000 e os RR. condenados a pagarem aos AA. aquele valor.
e) Fosse reconhecido e declarado que os AA. têm direito de retenção dos imóveis, pelo valor das benfeitorias, constituindo garantia a ser exercida enquanto não lhes forem pagas as quantias respectivas.
Por despacho proferido na audiência preliminar decidiu- se julgar procedentes a exceção do caso julgado quanto aos pedidos formulados em a), b) e c) com a consequente absolvição dos réus da instância.
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C) - Posteriormente foi intentada a acção nº 183/06.6TBSRP, que após a apensação a estes autos tomou o nº 92-B/2002.
Nessa acção são AA. AA e mulher BB, CC e mulher DD e EE e RR. FF e GG.
E os AA. pedem que se:
a) Condenem os RR no pagamento de uma indemnização devida pela perda das ajudas previstas no Regulamento de Aplicação da Intervenção «Medidas Agro-Ambientais», no valor de € 71.671,20.
b) Condenem os RR no pagamento de uma indemnização devida pelos prejuízos causados com a perda dos lucros decorrentes da produção de azeite, no valor de € 41.967,4 7.
c) Condenem os RR no pagamento de uma indemnização devida pela perda das ajudas concedidas pela produção de azeite no valor de € 48.917,90.
d) Condenem os RR no pagamento de uma indemnização devida pela perda das ajudas complementares à produção de azeite, no valor de € 3.644,08.
e) Condenem os RR no pagamento de uma indemnização devida pela perda dos lucros decorrentes da produção de culturas arvenses, nos anos agrícolas de 2004/2005 e de 2005/2006, no valor de € 4.836,35.
f) Condenem os RR no pagamento de uma indemnização devida pela perda de apoios concedidos à produção de culturas arvenses, no valor de € 13.757.56.
g) Condenem os RR no pagamento de uma indemnização devida pela perda da ajuda complementar aos produtores de culturas arvenses, no valor de € 1.007,86
h) Condenem os RR no pagamento de uma indemnização devida pelos prejuízos decorrentes da impossibilidade de implementação do projecto de turismo rural, no valor de € 50.480,82.
i) Condenem os RR. no pagamento de uma indemnização devida pela ocupação ilícita do imóvel desde 1998/1999 até 19 de Maio de 2003, no valor de € 21.634,16;
l) Condenem os RR. no pagamento de juros, sobre a quantia em dívida, até ao seu efectivo e integral pagamento.
m) Condenem os RR. no pagamento das custas, preparos, despesas, taxas e encargos do processo.
Mais tarde, os autores ampliaram a causa de pedir e o pedido requerendo a condenação dos réus em mais € 47 080, quantia correspondente à que gastaram na recuperação dos imóveis.
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Relativamente aos três primeiros pedidos formulados nesta acção nº 92/2002 os AA. alegaram, em síntese, que em 10 de Abril de 1987 tomaram de arrendamento a HH 3 prédios rústicos e quatro prédios urbanos, sendo que o contrato se iniciou em 15 de Agosto de 1986 e foi celebrado por um período de 6 anos, renovável por períodos de 3 anos, no âmbito da Lei n.º 76/77, de 29 de Setembro, então em vigor.
Em 18 de Janeiro de 1989 o A. marido e o então senhorio procederam a um aditamento ao contrato inicial, alterando o prazo para 20 anos a contar do início do contrato a alterando o montante da renda inicial.
Em 1998 a então senhoria dos prédios escreveu ao A. marido dizendo que não estava interessada na renovação do contrato, denunciando o mesmo e pedindo a sua devolução até 15 de Agosto de 1999.
O A. marido, insurgindo-se com esta missiva, procedeu à notificação judicial avulsa da mãe dos RR.
Alegaram também que a carta escrita pela mãe dos RR não respeitou o prazo de 18 meses de antecedência relativamente ao termo do prazo ou da sua renovação - arts. 5°, 18° n.º 1 al. b) da LAR - , que a lei, nestes casos, não consente qualquer oposição pelo que, sem que o A. marido tivesse anuído à entrega só restaria aos RR a proposição da acção competente, não tendo existido qualquer fase extra-judicial.
Os RR. contestaram esta acção, alegando, no que diz respeito aos 3 primeiros pedidos formulados, a existência de um recurso pendente no Tribunal da Relação de Évora (na sequência da decisão proferida nos autos de embargo de executado apensos à execução a correr termos neste tribunal) no qual foi decidido que a denúncia operou os seus efeitos por falta de oposição dos arrendatários.
Invocaram também excepção de caso julgado, de litispendência e preclusão do direito a deduzir os pedidos formulados, em virtude da existência dos autos de embargos de executado apensos aos autos de execução em que foi pedida a passagem de mandados de despejo.
Em resposta, os AA. vieram dizer que foi interposto recurso de revista com julgamento ampliado para uniformização de jurisprudência, relativamente ao acórdão proferido nos autos de embargo, reafirmando a inexistência de qualquer título executivo, não havendo pois qualquer situação de caso julgado ou litispendência.
Foi designado dia para realização da audiência preliminar.
Nessa mesma audiência preliminar, foi decidido suspender a presente instância em virtude de se encontrar ainda pendente um recurso para o Supremo Tribunal de Justiça (de uniformização de jurisprudência) do processo 128/00-A (processo de embargos dos ora M. a um requerimento de passagem de mandado de despejo dos RR.), relativamente ao prédio objecto da acção, processo este onde, de forma lateral, se iria apreciar a validade da denúncia e mesmo a do contrato de arrendamento, nos termos do disposto no art. 279º nº 1 do C. Processo Civil.
Após decisão do STJ ,a decisão final de improcedência dos Embargos transitou em julgado, motivo pelo qual foi declarada cessada a suspensão da instância.
No saneador foram proferidas várias decisões quanto às várias excepções, nomeadamente com o seguinte teor interessando para o recurso as seguintes:
«Da excepção de caso julgado relativamente aos pedidos formulados nas alíneas a) a c) da p.i.:
- Os ora RR. fizeram ingressar em juízo, no dia O5.06.2000, um pedido de passagem de mandado de despejo relativamente aos seguintes prédios:
(…)
Por despacho de tis. 28 daqueles autos (128/00), foi determinado que se deveriam observar as regras da execução para entrega de coisa certe, ordenando-se assim a citação dos executados, ao abrigos do disposto nos arts. 9280 e 9290 do C. Processo Civil.
Os executados deduziram embargos de executado (128-A/OO) invocando a inexistência e inexequibilidade do título, a inexigibilidade e incerteza da obrigação e a falta de pressuposto processual essencial.
Alegam que os embargados não possuíam qualquer título executivo, que não foi respeitado o prazo de denuncia previsto na lei e que não foi cumprida qualquer fase extra-judicial.
Foi proferido despacho saneador, no qual se conheceu do pedido formulado, tendo os embargos sido julgados procedentes.
Inconformados os embargados recorreram de tal decisão para o Venerando Tribunal da Relação de Évora.
A decisão proferida naquele Tribunal transitou em julgado.
Compulsados os autos verifica-se que os 3 primeiros pedidos formulados nestes autos são idênticos aos formulados nos autos de embargos supra referidos.
A causa de pedir é a mesma.
Existe identidade de sujeitos em ambos os casos.
Dispõe o art. 4970 nº 1 do C. Processo Civil "As excepções da litispendência e do caso julgado pressupõem a repetição de uma causa; se a causa se repete estando a anterior ainda em curso, há lugar à litispendência; se a repetição se verifica depois de a primeira causa ter sido decidida por sentença que já não admite recurso ordinário, há lugar à excepção de caso julgado".
Os requisitos da litispendência e do caso julgado são nos fornecidas pelo art. 498º do C.P. Civil, que reza:
"1- Repete-se uma causa quando se propõe uma acção idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir.
2- Há identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica.
3- Há identidade de pedido quando numa e noutra causa se pretende obter o mesmo efeito jurídico.
4- Há identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas acções procede do mesmo facto jurídico. Nas acções reais a causa de pedir é o facto jurídico de que deriva o direito real; nas acções constitutivas e de anulação é o facto concreto ou a nulidade específica se invoca para obter o efeito pretendido".
Face ao teor dos supra citados preceito legais dúvidas não temos que se mostram verificados, neste momento, os requisitos do caso julgado.
Com efeito, e conforme resulta do que atrás foi dito, confrontado os autos de embargos de executados com a presente acção, verifica-se que, relativamente aos três primeiros pedidos formulados existe uma identidade de sujeitos, de pedidos e de causa de pedir.
Quando a presente acção deu entrada, a decisão proferida nos autos de embargos de executado ainda não tinha transitado em julgado, verificando-se pois, nessa altura, uma situação de litispendência.
Uma vez que não foi declarada nessa fase e atendendo a que a primeira causa (embargos de executados) já foi decidida, não havendo lugar a recurso ordinário, estamos perante uma situação de caso julgado.
O caso julgado constitui uma excepção dilatória que determina a absolvição da instância - cfr. arts. 494° aI. i) e 493° nº 1 e 2, ambos do C. Processo Civil.
Termos em que julgo procedente por provada a excepção de caso julgado relativamente aos pedidos formulados nas aI. a) a c) da petição inicial, absolvendo os RR. da instância relativamente aos mesmos.
Custas a cargo dos AA., cuja proporção será fixada a final. Registe e Notifique
***
Da excepção de Iitispendência e caso julgado relativamente aos pedidos formulados nas aI. d) e e) da p.i (Decisão Recorrida):
- Nos presentes autos os AA. vieram reclamar o seu direito a benfeitorias realizadas nos prédios arrendado e o direito de retenção sobre os mesmos até que se mostre paga a quantia reclamada.
Na sua contestação, os RR. vieram deduzir excepção de Iitispendência e caso julgado, alegando para o efeito que, nos autos de embargos de executados, os ora M. não invocaram oportunamente o seu direito a benfeitorias, não fazendo referência a quaisquer obras realizadas nos prédios, apelando para o disposto no art. 929º nº 3 do C.P.C., de acordo com o qual os embargos com fundamento em benfeitorias não serão admitidos quando, baseando-se a execução em sentença condenatória, o executado não haja oportunamente feito valer o seu direito quanto a elas, pelo que, sendo a cessação do contrato de arrendamento rural discutida em acção judicial, poderiam os ora AA. invocar as benfeitorias realizadas. Não o tendo feito, precludiu esse direito.
Em resposta os AA. vieram dizer que não houve qualquer sentença condenatória onde pudessem discutir o seu legítimo direito às benfeitorias, e que somente nesse caso os embargos que aí deduzissem não seriam admitidos com fundamento nessas mesmas benfeitorias se o não tivesse feito valer oportunamente.
Conclui pela improcedência das invocadas excepções. Cumpre decidir.
No que respeita à excepção de litispendência e de caso julgado, remetemos para o que supra ficou dito acerca da noção e requisitos.
Assim sendo, desde logo se afigura não se verificar, relativamente aos pedidos ora em causa, qualquer situação de litispendência ou de caso julgado, uma vez que tal pedido não foi nunca formulado no âmbito dos embargos de executado.
Assim sendo, e sem necessidade de mais considerações, deverão as aludidas excepções improceder.
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Da excepção de preclusão do direito (Decisão Recorrida):
Nos termos já supra referidos, os RR. vieram também alegar que o direitos às benfeitorias e direito de retenção já precludiu.
Efectivamente, o art. 9290 nº 1 do C. Processo Civil prevê a possibilidade de serem deduzidos embargos à execução com o fundamento, além de outros, benfeitorias a que o embargante tenha direito.
Consagra também que os embargos com fundamento em benfeitorias não serão admitidos quando, baseando-se a execução em sentença condenatória, o executado não haja oportunamente feito valer o seu direito a elas.
Da análise de tal normativo legal não resulta, contrariamente ao defendido pelos RR., que haja uma obrigação de deduzir embargos com fundamento em benfeitorias, sob pena de preclusão de tal direito.
O que tal normativo consagra é a possibilidade da dedução de embargos com tal fundamento, não significando que, caso o embargante não opte por tal possibilidade, não possa intentar uma acção própria para o efeito.
Não tem também aplicação ao caso concreto o disposto no nº 4 na medida em que a execução que deu origem ao embargos não teve por base qualquer sentença condenatória proferida em acção declarativa onde os ora M. pudessem ter reclamado o seu direito a benfeitorias.
Assim sendo, considera-se não haver qualquer preclusão do direitos a benfeitorias e retenção.
Termos em que se julga improcedente por não provada a aludida excepção (…).
Foi realizado a audiência de julgamento.
Após foi proferida sentença que julgou a acção nº 92/2002 parcialmente provada e procedente e :
A) Declarou o direito de indemnização por benfeitorias dos autores no valor de € 161 921,2 e os RR. condenados a pagarem aos AA. aquele valor.
B) Reconheceu que os AA. têm direito de retenção dos imóveis pelo valor das benfeitorias.
C) Absolveu os RR. dos restantes pedidos;
E Julgou a acção nº 92-B/2002 (antigo nº 183/06.6TBSRP) totalmente improcedente absolvendo os réus de todos os pedidos formulados.
Logo após o saneador, vieram os RR. na nossa acção 92/2002 interpor recurso das decisões do saneador com as seguintes conclusões ( transcrição):
Alegações (Conclusões) Fls. 474 e ss:
«A - Vem o presente recurso interposto da Decisão que julgou improcedente a excepção de caso julgado deduzida pelos ora Agravantes no que respeita aos pedidos d) e e) deduzidos pelos AA., ora Agravados na sua Petição Inicial.
B - Com efeito, em sede de Audiência Preliminar, o Digníssimo Tribunal a quo considerou que, no que respeita ao direito a benfeitorias realizadas nos prédios arrendados e o consequente direito de retenção sobre os mesmos (alíneas d) e e)), nunca foi formulado tal pedido no âmbito dos embargos de executado, pelo que deveriam as excepções de caso julgado e litispendência improceder.
C - Sucede que os RR., ora Agravantes interpuseram acção executiva para entrega de coisa certa no Tribunal Judicial de Serpa, no dia 08.06.2000 (cfr. documento n.º 4 da Petição Inicial).
D – Os aqui Agravados, executados naquele processo, apresentaram embargos de executado no dia 11.07.2000 (cfr. documento n.º 5 da Petição Inicial).
E - Ora, nos termos do artigo 929.º, n.º 1 do C.P.C., os embargos às acções executivas para entrega de coisa certa podem também ter como fundamento o direito a benfeitorias.
F - Sucede que os então embargantes, ora Agravados, não invocaram oportunamente o seu direito a benfeitorias nos embargos que deduziram, não fazendo qualquer alusão a quaisquer obras realizadas nos prédios objecto da presente acção.
G - Acresce ainda que o artigo 929.º, n.º 3 do C.P.C. que "3. Os embargos com fundamento em benfeitorias não serão admitidos quando, baseando-se a execução em sentença condenatória, o executado não haja oportunamente feito valer o seu direito a elas.
H - Verifica-se, pois, que esta norma nada mais é do que uma concretização dos princípios da preclusão do direito e do caso julgado.
I - Quer isto dizer que, sendo a cessação do contrato de arrendamento rural discutida em acção judicial, poderiam e deveriam os arrendatários, ou seja, os ora Agravados, ter invocado as benfeitorias realizadas.
J – Se não o fizeram (como acontece no caso em apreço), precludiram aquele direito de acordo com o artigo 489.º, n.ºs 1 e 2 do C. P. C., e já não poderão ser deduzidos embargos, em sede de execução, com esse mesmo fundamento.
K - Da mesma forma é imperativo concluir que se a cessação do contrato de arrendamento rural foi discutida em sede de uma execução, a forma adequada para que os arrendatários pudessem ter invocado o seu alegado direito a benfeitorias, seria no âmbito dos embargos, de acordo com o já citado artigo 929.º do C. P. C.
L - No entanto, sabendo que o meio adequado para se deduzir a sua pretensão, seria nos embargos de executado, os Agravados não o fizeram, precludindo, por essa razão, o direito de invocar benfeitorias, também de acordo com o referido artigo 489.º, n.ºs 1 e 2 do C.P.C.,
M - Sendo este artigo aplicável, pois os embargos mais não o que uma acção ordinária que corre por apenso à execução (cfr. artigo 817.º, n.º 1 do C.P.C.).
N – Com efeito, o recebimento dos embargos origina uma tramitação processual semelhante à do processo declarativo.
O - Ou seja, é uma fase processual que, caso se verifiquem os pressupostos legais previstos nos artigos 813.º, 814.º e 815.º do C.P.C., vem possibilitar o exercício do contraditório nos precisos termos do processo declarativo. Apenas após aquela discussão prévia, e dependendo da decisão relativamente aos embargos deduzidos, é que a execução poderá prosseguir (cfr. artigo 817.º, n.º 2).
P - Ora, atendendo a que os embargos já foram considerados totalmente improcedentes por decisão transitada em julgado, as questões que aí foram decididas, ou que aí se deveriam ter discutido, já não podem ser alvo de novo processo judicial,
Q - Pelo que, quanto àqueles pedidos, opera a excepção dilatória invocada em sede de articulados, prevista nos artigos 494.º, alínea i) e 498.º do C. P. C. e que deverá conduzir à absolvição dos RR., ora Agravantes, na instância, de acordo com o disposto no artigo 493.º, n.º 2 do C.P.C..
R - Em consequência de tudo o que foi exposto, também já não podem os ora Agravados opor um eventual direito de retenção que teriam em virtude do alegado direito a benfeitorias.
S - Diga-se, aliás, que o direito a benfeitorias a que os Agravados se arrogam sempre estaria prescrito, nos termos e para os efeitos do artigo 482.º do Código Civil, o que se alegou em sede de articulados para todos os efeitos legais.
T – Por conseguinte, se os AA., ora Agravados, pretendiam que o Digníssimo Tribunal a quo apreciasse o seu direito à indemnização pelo valor das benfeitorias antes de ser consumado o despejo, deveriam, como já se referiu, tê-lo peticionado em sede de embargos de executado, nos termos do artigo 929.º, n.º 1 do C.P.C..
U – Na verdade, como não tiveram a suficiente diligência para, em sede de embargos de executado, deduzir a título subsidiário o vertido nas alíneas d) e e) da Petição Inicial, desdobram-se agora os Agravados em múltiplos esforços para retardar o inevitável, isto é, o mandado de despejo emitido na sequência do trânsito em julgado do Douto Acórdão que julgou aqueles embargos improcedentes.
V – Assim, os ora Agravantes não podem deixar de discordar com o teor da decisão proferida pelo Digníssimo Tribunal a quo que decidiu que "No que respeita à excepção de litispendência e de caso julgado, remetemos para o que supra ficou dito acerca da noção e requisitos.
Assim sendo, desde logo se afigura não se verificar, relativamente aos pedidos ora em causa, qualquer situação de litispendência ou de caso julgado, uma vez que tal pedido não foi nunca formulado no âmbito dos embargos de executado."
W - Ora, salvo o devido respeito, a excepção de caso julgado não ocorre somente nas situações em que são formulados determinados pedidos numa acção, quando os mesmos pedidos já tinham sido formulados e decididos em causa anterior.
X - Com efeito, se uma das partes em litígio, neste caso os ora Agravados, tinha o ónus de alegar os factos constitutivos do seu direito a benfeitorias em sede de embargos de executado (cfr. dispõe o artigo 929.º n.º 1 do C.P.C.), e não o fez, então, o seu direito às benfeitorias fica precludido, ficando, naturalmente, a preclusão daquele direito abrangida pelo caso julgado!
Y - Por ser directamente aplicável o artigo 489.º do C.P.C. à dedução de embargos de executado, os Agravados deveriam ter, nesse momento, alegado todos os factos constitutivos do seu direito a serem ressarcidos pelas benfeitorias alegadamente realizadas.
Z - Da mesma forma, deveria ter sido peticionada a condenação dos ora Agravantes ao ressarcimento daquelas benfeitorias.
AA - Mas, os Agravados não o fizeram, pelo que não podem neste momento, em sede de acção declarativa de condenação, pretender obter a condenação dos RR. ora Agravantes, com fundamento nas eventuais benfeitorias realizadas.
BB - Face a todo o exposto, a Decisão proferida pelo Digníssimo Tribunal a quo não poderá ser mantida, uma vez que não se coaduna com os diversos preceitos legais citados, devendo, por esse motivo, ser dado integral provimento ao presente recurso.
Nestes termos (…) deverá ser dado provimento ao presente recurso de agravo, e, em consequência, deverá ser alterado Douto Despacho recorrido (…) »
Alegações (Conclusões) Fls. 507 e ss:
«A - Vem o presente recurso interposto da Decisão que julgou improcedente a excepção de preclusão do direito deduzida pelos ora Apelantes no que respeita aos pedidos d) e e) deduzidos pelos AA., ora Apelados, na sua Petição Inicial.
B - Com efeito, os RR., ora Apelantes, intentaram acção executiva para entrega de coisa certa no Tribunal Judicial de Serpa, no dia 08 de Junho de 2000 (cfr. documento n.º 4 da Petição Inicial).
C - Os aqui Apelados, executados naquele processo, apresentaram embargos de executado no dia 11 de Julho de 2000 (cfr. documento n.º 5 da Petição Inicial).
D - Ora, nos termos do artigo 929.º, n.º 1, in fine, do Código de Processo Civil (doravante, abreviadamente, C.P.C.), os embargos às acções executivas para entrega de coisa certa têm também como fundamento o direito a benfeitorias.
E - Sucede que os então embargantes, ora Apelados, não invocaram oportunamente o seu direito a benfeitorias nos embargos que deduziram, não fazendo qualquer alusão a quaisquer obras que eventualmente tenham sido realizadas nos prédios objecto da presente acção.
F - Acresce ainda que, dispõe o artigo 929.º, n.º 3 do C.P.C. que, os embargos com fundamento em benfeitorias não serão admitidos quando, baseando-se a execução em sentença condenatória, o executado não haja oportunamente feito valer o seu direito a elas.
G - Verifica-se, pois, que esta norma nada mais é do que uma concretização dos princípios da preclusão do direito e do caso julgado.
H - Quer isto dizer que, sendo a cessação do contrato de arrendamento rural discutida em acção judicial, poderiam e deveriam os arrendatários, ou seja, os ora Apelados, ter invocado as benfeitorias realizadas.
I - Se não o fizeram (como acontece no caso em apreço), precludiram aquele direito de acordo com o artigo 489.º, n.ºs 1 e 2 do C.P.C., e já não poderá ser intentada acção declarativa de condenação pelos executados com o propósito de obter dos Apelantes uma indemnização pelas benfeitorias realizadas.
J - Da mesma forma é imperativo concluir que se a cessação do contrato de arrendamento rural foi discutida em sede de uma execução, a forma adequada para que os arrendatários pudessem ter invocado o seu direito a benfeitorias, seria no âmbito dos embargos, de acordo com o já citado artigo 929.º do C.P.C..
K - No entanto, sabendo que o meio adequado para deduzir a sua pretensão, seria nos embargos de executado, os Apelados não o fizeram, precludindo, por essa razão, o direito de invocar o ressarcimento pelas benfeitorias alegadamente realizadas, também de acordo com o referido artigo 489.º, n.ºs 1 e 2 do C.P.C..
L - Dúvidas não se suscitam quanto à aplicabilidade daquele artigo, na medida em que os embargos mais não do que uma acção ordinária que corre por apenso à execução (cfr. artigo 817.º, n.º 1 do C. P.C.).
M - Com efeito, o recebimento dos embargos origina uma tramitação processual semelhante à do processo declarativo.
N - Ou seja, é uma fase processual que, caso se verifiquem os pressupostos legais previstos nos artigos 813.º, 814.º e 815.º do C.P.C., vem possibilitar o exercício do contraditório nos precisos termos do processo declarativo.
O – Apenas após aquela discussão prévia, é dependendo da decisão relativamente aos embargos deduzidos, é que a execução poderá efectivamente prosseguir.
P - Ora, atendendo a que considerados totalmente os embargos já foram improcedentes por decisão transitada em julgado, as questões que aí foram decididas, ou que aí se deveriam ter discutido, já não podem ser alvo de novo processo judicial distinto,
Q - Pelo que, quanto àqueles pedidos, opera a excepção peremptória da preclusão, anteriormente invocada em sede de articulados, prevista nos artigos 493.º, n.º 1 do C.P.C., e que deverá conduzir à absolvição dos RR., ora Apelantes, no pedido, de acordo com o disposto no artigo 493.º, n.º 3 do C.P.C..
R - Em consequência de tudo o que foi exposto, também já não podem os ora Apelados opor um eventual direito de retenção que teriam em virtude do direito a benfeitorias.
S – Por conseguinte, se os AA., ora Apelados, pretendiam que o Digníssimo Tribunal a quo apreciasse o seu direito à indemnização pelo valor das benfeitorias antes de ser consumado o despejo, deveriam, corno já se referiu, tê-lo peticionado em sede de embargos de executado, nos termos do artigo 929.º, n.º 1 do C.P.C..
T – Na verdade, como não tiveram a suficiente diligência para, em sede de embargos de executado, deduzir a título subsidiário o vertido nas alíneas d) e e) da Petição Inicial, desdobram-se agora os Apelados em múltiplos esforços para retardar o inevitável, isto é, o mandado de despejo emitido na sequência do trânsito em julgado do Douto Acórdão que julgou aqueles embargos improcedentes.
U – Em conclusão, verifica-se que os Apelados não invocaram o seu direito a benfeitorias quando deviam, isto é, nos embargos que deduziram à oposição, precludindo assim o seu direito.
V - Aliás, todo este processo tem consistindo num conjunto de sucessivas oportunidades judiciais perdidas por parte dos arrendatários, ora Apelados, que, lamentavelmente, insistem em actuar quando já não podem, não o fazendo quando deviam!
W - Face a todo o exposto, a Decisão proferida pelo Digníssimo Tribunal a quo não poderá ser mantida, uma vez que não se coaduna com os diversos preceitos legais já citados, devendo, por esse motivo, ser dado integral provimento ao presente recurso.
Nestes termos (…) deverá ser dado provimento ao presente recurso de Apelação, e, em consequência, deverá ser alterado o Douto Despacho recorrido (…)»
Não houve contra alegações.
Posteriormente foi proferida a sentença nestes autos – supra referida - e interposto recurso da mesma.
Colhidos os vistos legais e nada obstando ao conhecimento do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir.
Para a compreensão e decisão destes recursos, para além dos factos que constam deste relatório, devem considerara-se os seguintes factos assentes:
Em 10 de Abril de 1987, HH e FF celebraram um contrato que intitularam de "arrendamento rural", através do qual o primeiro, intitulando-se dono e legítimo possuidor, declarou dar de arrendamento ao segundo os seguintes prédios:
(…)
Nesse mesmo contrato estipulou-se que o arrendamento teve início em 15 de Agosto de 1986, celebrado por um período de seis anos, renovável por períodos de três anos, enquanto não for denunciado nos termos da Lei do Arrendamento Rural.
Estipulou-se no contrato referido em A) "que a renda anual é no valor de 500.000$00 (quinhentos mil escudos) paga em dinheiro na casa do senhorio ou do seu representante, contra recibo, em 15 de Agosto de cada ano, porém nos anos de 1987 e 1988 o rendeiro só terá de pagar o montante de 300.000$00 (trezentos mil escudos) por cada ano, destinando-se os diferenciais ao pagamento ca comparticipação das despesas com as beneficiações e obras a realizar no monte e anexos, obras que o senhorio desde já autoriza".
Consta também do contrato referido em A) que "O segundo outorgante para obras futuras, designadamente construções, parques para gados, necessita para tal da autorização do senhorio".
Ficou ainda estipulado no contrato referido em A) que o "segundo outorgante fica com a obrigação de proceder à conservação dos prédios urbanos atrás identificados.
Em 18 de Janeiro de 1989, HH como primeiro outorgante e FF como segundo outorgante assinaram uma adenda ao contrato referido em A), nos termos constantes do documento de fls. 14, que aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais.
No passado dia 2 de Maio de 2006 foi efectuada a entrega pelos Autores aos Réus dos prédios identificados em A).
Também foi interposto recurso da sentença final, mas para facilitar a exposição da nossa decisão, só após a análise dos recursos das decisões sobre as excepções, nos debruçaremos sobre tal recurso.


2 – Objecto do recurso relativo às excepções:

Face ao disposto nos artigos 608º, nº 2, 635º, nº 4, e 639º, nº 1 do Código de Processo Civil, as conclusões das alegações de recurso delimitam os poderes de cognição deste tribunal, pelo que a questão a decidir (por ordem lógica e sem prejuízo do conhecimento de questões de conhecimento oficioso, observado que seja, quando necessário, o disposto no artigo 3º, nº 3, do Código de Processo Civil) é a seguinte: Saber se há caso julgado e preclusão do direito dos AA. quanto à indemnização por benfeitorias, decorrente do facto de não terem reagido/invocado o mesmo nos autos de Embargos de executados que intentaram na sequência de anterior execução proposta pelos RR.


3 - Análise do recurso.

Na decisão recorrida foi afastada a existência de caso julgado com o argumento de que os pedidos aqui em causa não tinham sido formulados anteriormente nos Embargos de Executado e afastou-se a excepção de Preclusão do direito com o argumento de que não havia qualquer obrigação de deduzir estes pedidos nos anteriores Embargos, mas apenas uma possibilidade e afastou-se aplicação do art. 929º nº 4 do anterior CPC por não ter existido qualquer sentença condenatória em acção declarativa.
Vejamos:
O caso julgado tem por fim evitar que o tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma decisão anterior – cfr artº 497º, nº2 do Código de Processo Civil anterior. É, assim, “ uma exigência da boa administração da justiça, da funcionalidade dos tribunais e da salvaguarda da paz social, pois que evita que uma mesma acção seja instaurada várias vezes, obsta a que sobre a mesma situação recaiam soluções contraditória e garante a resolução definitiva dos litígios que os tribunais são chamados a dirimir . ”- in Miguel Teixeira de Sousa in Estudos sobre o Novo Processo Civil, Lex, 1997, pág. 558 e também neste sentido Manuel de Andrade “Noções Elementares de Processo Civil pág. 306, 324 e 382, onde se pode ler o seguinte:
“devendo os fundamentos da defesa ser formulados todos de uma vez num certo momento, a parte terá de deduzir uns a título principal e outros in eventu – a título subsidiário, para a hipótese de não serem atendidos os formulados em primeira linha ónus este imposto por razões de lealdade no combate judiciário, a que subjazem também razões de segurança e de certeza jurídica que impedem que, tornada definitiva uma sentença, os seus efeitos sejam postergados com base em novos argumentos que em tal acção não foram - mas poderiam ter sido – invocados (…) ficam precludidos todos os meios de defesa do réu, mesmo os que ele não chegou a deduzir, e até os que poderia ter deduzido com base num direito seu (p. ex., ser ele, réu, o proprietário do prédio reivindicado)...”
Por sua vez o artº 498º do mesmo diploma legal estabelecia os requisitos do caso julgado, referindo que o mesmo se verifica quando haja repetição duma causa, sendo que, por sua vez, a repetição da causa pressupõe a identidade dos sujeitos, do pedido e da causa de pedir.
No nosso caso, o que está em causa é a questão dos limites do caso julgado na sua vertente NEGATIVA, ou seja, saber em que medida se pode voltar a discutir questões complementares após o trânsito da decisão da questão principal ou nuclear.
Por outras palavras, saber até que ponto fica precludido o direito de, mais tarde, em nova ação, voltar a pedir ao tribunal que decida questões acessórias que poderiam ter sido introduzidas na acção nuclear.
Desta forma, apesar de terem sido proferidas duas decisões sobre as excepções em causa, afigura-se-nos que se trata de uma única e mesma questão, pelo que ambos os recursos das duas excepções serão apreciados em conjunto, o que faremos de seguida:
Quid Juris?
Sabemos que em 2000, os aqui RR. pediram em tribunal a passagem de mandado de despejo dos prédios em causa – Execução para entrega de coisa certa) e os aqui AA. deduziram Embargos de Executado onde não invocaram o direito a benfeitorias, nem o direito de retenção.
Esses Embargos foram julgados improcedentes por decisão já transitada em julgado.
Foi ordenado o despejo e entregues as chaves dos prédios.
Pretendem os então embargantes invocar agora nesta acção direitos que poderiam ter exercido na acção inicial.
Quid Juris?
Avançamos desde já que, no nosso entendimento não o podem fazer (ao contrário do que foi entendido na decisão recorrida).
Vejamos porquê:
No que toca à execução para entrega de coisa certa determinava o art. 929º, nº 1, que “o executado pode deduzir oposição pelos motivos especificados nos artigos 814º, 815º e 816º, na parte aplicável, e com fundamento em benfeitorias”.
Na acção executiva pode falar-se em ónus de excepcionar do mesmo modo que na acção declarativa, na medida em que está prevista a Oposição à Execução, que é o meio idóneo para a alegação dos factos que em processo declarativo constituiriam a defesa.
É nesta Oposição – com natureza declarativa - que o executado deve invocar os fundamentos de que disponha para se opor à pretensão do exequente, sob pena de não poder intentar outra acção para o efeito.
E isso justifica-se pelo respeito devido ao caso julgado, formado pela sentença da Oposição e no âmbito do qual se devem considerar abrangidos todos os meios de defesa – designadamente as excepções – que podiam ter sido invocados, ainda que o não tenham sido.
Com efeito, nos termos do então art. 489º do CPC, toda a defesa devia (e ainda hoje é assim) ser deduzida na contestação, exceptuados os incidentes que a lei mande deduzir em separado, bem como as excepções, incidentes e meios de defesa que sejam supervenientes, ou que a lei expressamente admita passado esse momento ou de que se deva conhecer oficiosamente, sob pena de ficarem precludidos tais direitos, o que emana do princípio da eventualidade ou da preclusão, no sentido de exigir do réu a exposição de todas as matérias de defesa de forma cumulada e alternativa, fundamenta-se na ideia de “preclusão consumativa”, exigindo-se que a defesa seja apresentada de uma só vez (vícios formais e questões de mérito que no seu entender sejam pertinentes para a solução definitiva do litígio, sob pena de não poder alegá-las posteriormente.
Ou seja, devem esgotar-se na discussão de todos os argumentes existentes factuais e jurídicos referentes àquela relação jurídica, para que a decisão realmente vincule as partes e traga segurança.
O conteúdo do caso julgado não se resume aos meios de defesa que o réu deduziu, mas mesmo aos que ele não chegou a deduzir e até aos que ele poderia ter deduzido com base num direito seu.
Como se pode ler no Ac. STJ de 29.05.2014, proc. nº 1722/12.9TBBCL.G1.S1, disponível em www.dgsi.pt: “vale a máxima, segundo a qual o caso julgado “cobre o deduzido e o dedutível” ou “tantum judicatum quantum disputatum vel disputari debet”.
Esta posição está em sintonia com o entendimento de Castro Mendes, in “Limites Objectivos do Caso Julgado em Processo Civil”, pág. 178.
Com efeito, o caso julgado abrange não só aquilo que foi objecto de controvérsia na acção, mas também os assuntos ou factos que o réu tinha o ónus de trazer à colação.
Só assim se consegue a paz jurídica sobre a situação em causa, não fazendo sentido que, anos depois, se reabra a discussão com questões que já existiam à data da 1ª acção.
Note-se que, os AA. tiveram no âmbito dos Embargos a possibilidade de exercer os seus direitos, pelo que alegam, já existentes à data e não o fizeram.
Como diz Lopes do Rego “Comentários ao Código de Processo Civil”, Almedina, 1999, página 620: “desde que tenha tido oportunidade processual para o fazer – “máxime” porque tal direito não é de considerar superveniente, relativamente ao momento em que era oportuno deduzi-lo na ação declaratória – considera-se o mesmo precludido – não podendo ser invocado no âmbito da execução»
Também a este propósito, se conclui no Ac. do STJ de 10.10.2012, Proc. nº 1999/11.7TBGMR.G1.S1: «constitui uma grave violação da estabilidade da relação jurídica definida pela sentença transitada em julgado a posterior dedução daquela mesma pretensão fundada em factos materiais que na ocasião já se haviam verificado e que, sem qualquer inconveniente ou prejuízo para o direito material, poderiam ter sido alegados, discutidos e apreciados em toda a sua extensão na primeira acção.
(…) Fazendo-o, teriam permitido que a sentença apreciasse em toda a extensão a realidade emergente dos factos apurados, para efeitos de confirmar ou infirmar o juízo sobre a existência e a titularidade do direito de propriedade inerente à faixa de terreno litigada ou para afirmar ou negar, com base em todos os factores pertinentes, a obrigação de restituição dessa faixa e de demolição da construção que sobre a mesma fora erigida.
Pensamos que o sistema não pode admitir, sem limites, a discussão eterna de questões jurídicas.
Ou, como se pode ler no Ac. do STJ de 10.10.2012, proc. nº 1999/11.7TBGMR.G1.S1:
“ a autoridade de caso julgado inerente à sentença, efeito que visa preservar o prestígio dos Tribunais e a certeza ou segurança jurídica, evitando a instabilidade das relações jurídicas.
(…) Trata-se de solução para que igualmente aponta Teixeira de Sousa quando refere que com o trânsito em julgado da sentença “ficam precludidos todos os factos que poderiam ter sido invocados como fundamento de uma contestação, tenham ou não qualquer relação com a defesa apresentada”, o que se funda em razões atinentes com a boa administração da justiça, com a funcionalidade dos tribunais e com a salvaguarda da paz social, ficando excluída a possibilidade de confrontar o tribunal com “toda a situação contraditória ou incompatível com aquela que ficou definida na decisão transitada” (Estudos sobre o Processo Civil, 2ª ed., págs. 568, 579 e 586).
Ideia igualmente acentuada por Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, vol. III, pág. 394, e por Mariana França Gouveia, Causa de Pedir na Acção Declarativa, págs. 394, 402 e 495.
Aliás, no nosso modesto entender, nas acções executivas para entrega de coisa certa, o direito de retenção da coisa traduz um ónus processual e a falta de alegação do mesmo gera a sua preclusão.
Se assim não fosse, assistiríamos a uma reversão da ordem de entrega que transitou em julgado, pondo em causa a sua autoridade com a invocação de fundamentos omitidos antes pelas partes e já invocáveis na altura.
Com efeito, ainda que na Oposição á execução os ora AA. tivessem contestado o direito de entrega invocado pelos ora RR., tinham o ónus de se defender em toda a extensão de tal pretensão, ainda que de forma subordinada ou eventual, prevenindo a hipótese – que acabou por se concretizar - de vencer a posição invocada pela contraparte.
Se é pedida a entrega do prédio e se os oponentes entendiam que tinham o direito de retenção (directamente ligado ao pedido de entrega) era aí que o deveriam ter invocado, pois vir mais tarde invocar tal direito, na presente acção, mais não é do que paralisar a decisão anterior de entrega.
Os pedidos em causa afectam toda a relação jurídica controvertida tal como a mesma é apresentada no tribunal e, assim, põe em crise a autoridade de caso julgado da sentença, já transitada, proferida na acção primitiva, que entendeu inexistirem obstáculos à entrega dos prédios.
Salvo melhor opinião e com todo o respeito, pensamos que a decisão recorrida se concentrou apenas no direito a benfeitorias, esquecendo que o mesmo nesta acção não vêm só, mas sim ligado ao direito de retenção e por isso está intimamente conexo com a Execução e Oposição anteriores.
A segurança jurídica não pode consentir que, após a prolação de uma decisão de entrega transitada em julgado, a parte vencida possa instaurar outra acção em que alegue factos, não invocados na acção anterior, que teriam inviabilizado a procedência da primeira causa.
Desta forma, pensamos que nas acções executivas para entrega de coisa certa, o direito de retenção da coisa traduz um ónus processual e a falta de alegação do mesmo nessa sede, gera a sua preclusão.
Se assim não fosse, assistiríamos a reversão da ordem de entrega, que transitou em julgado, pondo em causa a sua autoridade, com a invocação de fundamentos omitidos anteriormente pelas partes, apesar de já existentes na altura.
Decorre do exposto que se mostrava impedido o prosseguimento da acção, por via da autoridade de caso julgado projectada pela sentença judicial proferida nos Embargos.
Sendo suficiente o mencionado princípio da preclusão da dedução da defesa para conduzir, por si só, à improcedência de todos os pedidos (principais e subsidiários) é de considerar prejudicado o conhecimento das demais questões, inclusivamente o conhecimento do recurso relativo á sentença final.


Sumário:
I - Nas acções executivas para entrega de coisa certa, o direito de retenção da coisa traduz um ónus processual dos executados a exercer nos Embargos desde que já existentes à data e a falta de alegação nessa sede gera a sua preclusão.
II - Se assim não fosse, assistiríamos a uma reversão da ordem de entrega que transitou em julgado, pondo em causa a sua autoridade com a invocação de fundamentos omitidos antes pelas partes e já invocáveis na altura e nunca se conseguindo alcançar a paz jurídica sobre a situação em causa.


4 - Dispositivo.

Pelo exposto acordam os juízes da secção cível deste Tribunal da Relação em julgar procedentes os recursos das decisões que julgaram improcedentes as excepções de caso julgado e preclusão do direito e em consequência revogar as mesmas, julgando procedentes tais excepções de caso julgado e preclusão do direito, absolvendo os RR. da instância.

Custas pelos recorridos.

Évora, 16.06.2016


Elisabete Valente


Bernardo Domingos


Silva Rato