Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
148/17.2GBABT.E1
Relator: LAURA MAURÍCIO
Descritores: JULGAMENTO NA AUSÊNCIA DO ARGUIDO
NULIDADE INSANÁVEL
Data do Acordão: 11/22/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: DECLARADA A NULIDADE DE DESPACHO
Sumário:
I - Ocorre uma compressão ou limitação desproporcionada do núcleo essencial dos direitos de audição, de defesa e de contraditório, garantidos no artigo 32º, n.ºs 1, 2, 5, e 6 da Constituição e no artigo 11º, n.º 1, da Declaração Universal dos Direitos do Homem, se o tribunal recusa a designação de nova data para audição do arguido em sede de julgamento, após ter considerado justificada a falta deste na 2.ª data designada para a realização do julgamento, a que este devia comparecer para ser ouvido.

II – Assim, ao indeferir-se a pretensão do arguido de ser ouvido em data posterior à agendada, por aquele estar impossibilitado de a esta comparecer, foi cometida a nulidade insanável prevista na al. c) do artigo 119.º do CPP.
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora

Relatório

No Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, Juízo Local Criminal de Abrantes, no âmbito dos autos com o NUIPC nº148/17.2GBABT, foi o arguido SP submetido a julgamento em Processo Comum e Tribunal Singular.

Após realização de audiência de discussão e julgamento, o Tribunal decidiu:

- Condenar o arguido SP, na pena de 3 (três) anos de prisão, pela prática, em autoria material e na forma consumada, do crime violência doméstica, previsto e punido art. 152°, n° 1 al, a) e n.? 2, do Código Penal.

- Suspender a execução da pena aplicada em 1 por igual período, determinando que a suspensão seja acompanhada pelo cumprimento das seguintes regras de conduta:

i. Responder a convocatórias do magistrado responsável pela execução e do técnico de reinserção social;

ii. Receber visitas do técnico de reinserção social e comunicar-lhe ou colocar à sua disposição informações e documentos comprovativos dos seus meios de subsistência;

iii. Informar o técnico de reinserção social sobre alterações de residência;

iv. Não contactar, de qualquer forma, ou aproximar-se de CP (Art. 50°, nº 2 e 3, 52.°, nº 1, al, b) e c) e nº 2 al. d) do CP), cuja proibição deverá ser compatibilizada com o exercício efetivo, pelo arguido, do exercício das responsabilidades parentais relativamente ao filho menor;

- Condenar o arguido na pena acessória:
i. de proibição de todo e qualquer contacto com CP pelo período de 5 anos compatibilizada com o exercício efetivo, pelo arguido, das responsabilidades parentais relativamente ao filho menor;

ii. de frequentar programas específicos de prevenção de violência doméstica (cfr. art. 152.°, n° 4 do CP).

- Julgar o pedido de indemnização cível parcialmente procedente e, em consequência condenar o arguido ao pagamento da quantia de 3 000,00 (três mil) euros à demandante CP a título de compensação pecuniária dos danos não patrimoniais sofridos, acrescido da quantia devida a título de juros legais, vencidos desde a data da presente decisão até integral pagamento, nos moldes referidos, absolvendo o demandado do demais peticionado.

Inconformado com a decisão, o arguido interpôs recurso, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões:

1. O presente recurso, versando de facto e de direito, tem por objecto a sentença proferida nos autos acima identificados e que condenou, no essencial, o arguido SP pela prática, em autoria material e na forma de consumada, do crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152º, nº 1, alínea a) e nº 2 do Código Penal.

2. Por despacho proferido em audiência de discussão e julgamento e registado no sistema de gravação sonora com o número 20180628165043_2773237_2871737, decidiu o Tribunal “a quo” julgar improcedente a invocada nulidade prevista no artigo 119, alínea c) do CPP.

3. Na primeira data designada para a realização da audiência de discussão e julgamento, o arguido, residente na Suíça, onde trabalha, não compareceu na audiência de discussão e julgamento.

4. Iniciada a sessão de julgamento, na ausência do arguido por se entender, como entendeu o Tribunal “a quo” não ser imprescindível a presença do mesmo para a descoberta da verdade material, veio este requerer lhe fosse admitida a prestação de declarações em momento posterior, sugerindo-se a marcação de nova data, que não a já designada para a segunda data, uma vez que para esta se antevia novamente a impossibilidade do arguido poder comparecer.

5. Não admitindo a sugestão, e mostrando-se indisponível o Tribunal “a quo” para a marcação de data, veio o arguido, ainda assim requerer lhe fosse admitida a prestação de declarações na segunda data designada – registo de gravação sonora com o número 20180604132537, entre os minutos 00.00 e 07.32.

6. Sem embargo da urbanidade exigida a qualquer um dos intervenientes na administração e realização da justiça, que in casu lastimosamente não se verifica, como se pode, de resto, constatar, e dos eventuais compromissos de ética subjacentes ao exercício das mais variadas atividades profissionais, o facto é que reiteradamente o arguido solicitou ao Tribunal lhe fosse concedido o direito de ouvir a sua versão dos factos.

7. Concretizando-se factualmente a suspeita da impossibilidade de comparência do arguido à segunda data designada para a realização da audiência de discussão e julgamento, veio este, por requerimento datado de 06 de junho de 2018, com a referência 29351452, informar a Mma. Juiz “a quo” da impossibilidade de se deslocar a Portugal naquela data em razão de compromissos profissionais, que justificou por documento, devidamente traduzido, em obediência ao despacho com a referência 5018304.

8. Mais reiterou, por requerimento datado de 11 de junho de 2018, com a referência 29390738, a circunstância de pretender prestar declarações para garantia da sua defesa, sugerindo para o efeito que, uma vez tratar-se de processo urgente, e por esse facto tramitado em ferias judiciais, lhe fossem tomadas declarações no período compreendido entre 24 de Julho de 2018 e 08 de Agosto de 2018, período durante o qual estaria em Portugal.

9. Requerimento que viu indeferido, por inadmissibilidade legal, com fundamento no artigo 333º, nº 3 do CPP.

10. Nesta sequência, por requerimento apresentado em 20 de junho de 2018, com a referência 29476340 veio o arguido invocar a nulidade insanável supra identificada, alegando, para o efeito ter comunicado ao Tribunal a impossibilidade de estar presente na segunda data designada, dando a conhecer a sua intenção de prestar declarações e oferecer a sua versão dos factos.

11. Salvo melhor entendimento, na qualidade de arguido, o então requerente e ora recorrente tem direito de prestar declarações e ser ouvido em Tribunal sempre que esteja em causa uma decisão que pessoalmente o afete, nos termos previstos no artigo 61, nº 1 do CPP.

12. A realização da audiência de discussão e julgamento sem a presença do arguido, regulada no artigo 333º do CPP, cinge-se apenas a duas situações:

1) uma por iniciativa do Tribunal, em virtude da ausência voluntaria do arguido, que tanto pode ser justificada, como injustificada, por estar impossibilitado de comparecer (nº1) e outra 2) por iniciativa e com o consentimento do arguido (nº4).

13. Em qualquer das circunstâncias, determina de modo imperativo o nº 3 do mesmo artigo que (…) o arguido mantem o direito de prestar declarações até ao encerramento da audiência.

14. De resto, a Constituição da República Portuguesa consagra no seu artigo 32º, nº 1 uma clausula geral de garantia de defesa ao determinar que o processo penal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso, especificando depois em que consistem tais garantias, entre as quais encontramos o direito de presença do arguido na audiência de discussão e julgamento.

15. Este direito – que não pode ser reconhecido apenas e só como dever, como parece fazer a Mma. Juiz “a quo” quando refere que “quem está, está, quem não está, estivesse” [quando se refere em concreto à impossibilidade de realização do relatório social- v. a supra referida passagem registada no sistema de gravação sonora com o número 20180604132537, entre os minutos 00.00 e 07.32] – está, de resto, consagrado no artigo 14, nº 3 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e muito embora não esteja expressamente reconhecido na Convenção Europeia dos Direitos Humanos, tem vindo a ser reconhecido esse mínimo de defesa a partir do artigo 6º, nº 3, alíneas c), d) e e) como uma das dimensões essenciais da existência de um processo justo e equitativo.

16. Não tendo marcado nova data, o Tribunal “ a quo” deu continuidade à audiência na segunda data previamente designada, depois de saber que o arguido não iria estar presente, depois de recusar a marcação de nova de data, e depois de tomar conhecimento da intenção do arguido em que lhe fossem tomadas declarações.

17. Não tendo, como devia, tomado as medidas necessárias e legalmente admissíveis para obter a comparência do arguido, a realização da audiência nos sobreditos termos contende com o exercício pleno do direito de defesa do arguido e o princípio da procura da verdade material que se impõe ao julgador.

18. Dispõe o artigo 118.°, n.º 1, do CPP que a violação ou inobservância das disposições da lei do Processo Penal só determina a nulidade do ato quando esta for expressamente cominada na lei, sendo que o artigo 119.° estabelece que constituem nulidades insanáveis, que devem ser oficiosamente declaradas em qualquer fase do procedimento, além das que como tal forem cominadas em outras disposições legais, «c) A ausência do arguido (…), nos casos em que a lei exigir a respetiva comparência.»

19. Assim, tendo-se realizado o julgamento do arguido – do qual saiu condenado – na sua ausência, apesar de estar notificado da data da audiência e a esta ter faltado, sendo obrigatória a sua presença, é nula a audiência de julgamento, efetuada na ausência do arguido sem que a Mma.Juiz “ a quo” tenha tomado as medidas necessárias e legalmente admissíveis para obter a sua comparência.

20. Tal declaração – de nulidade, que ora se invoca - implica a invalidade da audiência de julgamento e dos atos que dela dependem (designadamente, a sentença condenatória), devendo o mesmo tribunal proceder à respetiva repetição (artigo 122.º, n.ºs 1 e 2, do CPP).

Sem conceder,
21. O arguido recorrente discorda totalmente da decisão proferida pelo Tribunal a quo, no que respeita aos dados como provados, que por referência à numeração utilizada na sentença recorrida constam dos artigos 6º a 20º, 32º a 38º, e 25º a 31º no que toca ao preenchimento do tipo subjetivo de ilícito.

22. Com efeito, tais factos não se adequam, de todo, à prova produzida em audiência de discussão e julgamento.

23. O Tribunal “ a quo” formou a sua convicção com base na análise crítica e conjugada da prova produzida e examinada em audiência de julgamento globalmente considerada, atendendo aos dados objetivos fornecidos pelos documentos juntos aos autos.

24. A certidão extraída do processo de divórcio nº ---/16.0T8TMR, que permitiu especificamente dar como provado o facto 2, poderia e deveria o ter permitido ao Tribunal aperceber-se que, uma vez no referido processo, nada tendo sido decidido quanto à utilização da casa de morada de família, já que o divorcio decorreu sem consentimento dos cônjuges, o arguido não precisava de ser convidado para entrar em sua casa, e que morava/partilhava a casa com a ex-mulher, mesmo depois de separados e divorciados, pelo que não tinha de entregar os filhos, porquanto com os mesmos residia durante o seu período de ferias em Portugal, ainda que na mesma casa da ex-mulher, ofendida nos autos.

25. Pelo que tal perceção teria naturalmente de impor ao Tribunal “ a quo” uma decisão diversa da que decorre com a factualidade provada no ponto 18, 19 e 20.

26. Baseou-se igualmente o Tribunal “ a quo” no relatório social de fls. 152 o qual permitiu concluir que o arguido em 04/05/2018 não se mostrou contactável para a elaboração do relatório social, pelo que não foi possível apurar as suas condições económicas.

27. Refira-se antes de mais que ao contrario do que vem referido, o arguido não se mostrou indisponível para a realização do relatório social. O arguido, ora recorrente, é residente na Suíça, morada constante do TIR prestado nos autos, pelo que cumpre retificar que, uma vez mais, não foram tomadas pelo Tribunal “ a quo” as medidas necessárias para a obtenção do relatório que serve antes de mais o propósito de auxiliar o Tribunal ou juiz no conhecimento da personalidade do arguido ( artigo 1º, alínea g do CPP).

28. Ademais sempre se dirá que tal documento, ou melhor tal informação, de fls. 152 dos autos, não foi, como deveria, notificada ao arguido, razão pela qual não foi a mesma impugnada.

29. Da análise de toda a prova produzida em audiência de julgamento plasmada na sentença de que se recorre, facilmente se se constata a sua fragilidade e inconsistência, reveladoras de que o Tribunal a quo não apreciou crítica e racionalmente as provas, de acordo com as regras da experiência, da lógica e do senso comum.

30. Saliente-se o facto de o Tribunal a quo, na formação da sua convicção, ter dado especial relevância, ou melhor, ter dado única relevância às declarações prestadas pela ofendida, aliás única testemunha arrolada na douta acusação publica.

31. Assim entendeu o Tribunal que as declarações da ofendida e demandante civil permitiram dar como provados os factos 4 a 22 e 32 a 43, sendo que alguns deles de forma conjugada com a prova documental inserta nos autos.

32. Conclui a Mma. Juiz “ a quo” que “ se o arguido, não comparecendo às duas sessões de julgamento, alheando-se por completo ao desfecho do processo judicial que sobre si impendia, prescindindo desta forma, de dar a sua visão pessoal sobre os factos, e eventualmente, esclarecer factos de que tem conhecimento pessoal, não pode pois pretender ser prejudicado com a sua ausência, quando a prova documental supra mencionada reunida e as declarações da demandante civil é de tal forma contundente que apenas se pode inferir que não as pode negar.

33. Além de não corresponder à verdade, tal inferência resulta claramente infirmada pelos requerimentos apresentados pelo arguido, e a que acima demos conta, e que demonstram com evidência que o mesmo manifestou perante o Tribunal “ a quo” a sua vontade em prestar declarações até ao encerramento do processo, sugerindo inclusivamente datas para o efeito, sendo uma vez residente no estrangeiro.

34. Relativamente à prova testemunhal, em concreto, entendeu a Mma. Juiz “ a quo” que os depoimentos das testemunhas AA e CC, cujos registos se encontram gravados com os números 20180604112854_2773237_2871737 e 20180604114427_2773237_2871737, vieram corroborar o estado de animo apresentado pela ofendida, sendo certo que os demais factos por si relatados apenas vieram ao seu conhecimento por lhes terem sido transmitidos pela ofendida.

35. Não obstante, os depoimentos prestados, no entender da Mma. Juiz “ a quo”, foram consonantes com o depoimento prestado pela ofendida, pelos que as declarações das testemunhas permitiram concluir pela veracidade dos factos reportados por aquela, pelo que permitiram dar como provados os factos 4 a 22.

36. Sublinhe-se que ambas referem, por diversas vezes, no excurso dos seus depoimentos que a nada assistiram. Assim, por exemplo, a testemunha AA refere que nunca assistiu a nada, apenas sabe o que lhe foi contado pela CP [04.35m]; refere igualmente que foi a partir de 2016 que a CP lhe começou a contar mais coisas [08.30], e que a sistematicidade com que descreve a ocorrência de episódios de agressão, afinal era apenas quando o SP estava em Portugal, o que coincide normalmente com o mês de agosto [10.00 – 12.00].

37. Outrossim, a testemunha CC veio referir nunca ter assistido a nada [02.00 – 02.50], circunstanciando o seu contacto com a ofendida demandante na altura em que o filho mais novo do casal frequentava o jardim de infância, entre os 3 e os 6 anos de idade, sensivelmente. Nessa altura, refere a testemunha, lembra-se da CP se queixar um bocadinho do ex-marido, que a injuriava e a maltratava verbalmente [04.30]. A CP chegava triste, chorosa, porque o ambiente em casa não tinha sido dos melhores. [05.00], não podendo a testemunha assegurar quantas vezes aconteciam tais episódios de violência verbal, uma vez que já passou algum tempo, desde que o Renato esteve no jardim de infância [06.47].

38. Uma vez que o Renato nasceu em 2008 (cf. facto 3), presumivelmente terá o mesmo frequentado o jardim de infância no período compreendido entre 2011 e 2014. Ora, este período não só não é coincidente com o período referido pela anterior testemunha mencionada, a quem a CP começou a contar mais coisas depois de 2016, como igualmente não é coincidente com os períodos temporais e os factos dados como provados de 4 a 22 e 32 a 43.

39. As declarações da ofendida denotam, em nosso entendimento, uma postura clara e naturalmente tendenciosa, num contexto inflacionado, o que obrigava por parte do Tribunal “a quo” a uma criteriosa análise dos demais meios de prova (objetivos), por forma a tentar captar, de entre os relatos emotivos e tendenciosos da ofendida e das testemunhas arroladas, aquilo que, com a segurança que se impõe, pode dar-se como assente.

40. Configura pois, em nosso entendimento, e salvo melhor opinião, uma situação de erro manifesto no julgamento da matéria de facto, considerar provados todos os factos da acusação, como considerou o Tribunal “ a quo” – factos 4 a 22 e 32 a 43 - porquanto, além da ofendida nenhuma outra testemunha, que aliás não foi arrolada pela acusação, pode confirmar a sua versão dos factos, sendo que, em qualquer circunstância, todos os factos por estas descritos lhes foram relatados pela ofendida, o que consubstancia uma valoração de meio de prova proibido (art 129º e 130° do CPP).

41. Postas estas considerações acerca da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgam, duvidas não podem restar que, para além das declarações da assistente inexiste qualquer outra prova produzida em julgamento que permita sustentar a factualidade dada como prova pela Mma. Juiz “ a quo”.

42. É certo que o artigo 127.º do C.P.P. consagra o princípio da livre apreciação da prova, não se encontrando o julgador sujeito às regras rígidas da prova tarifada. Todavia tal não significa que a actividade de valoração da prova possa ser arbitrária, pois sempre estará vinculada à busca da verdade, sendo limitada pelas regras da experiência comum e por algumas restrições legais.

43. Este princípio concede ao julgador uma margem de discricionariedade na formação do seu juízo de valoração, mas que deverá ser capaz de fundamentar de modo lógico e racional.

44. É portanto essencial que o julgador aprecie a credibilidade das declarações e depoimentos, com fundamento no seu conhecimento das reacções humanas, atendendo a uma vasta multiplicidade de factores: as razões de ciência, a espontaneidade, a linguagem (verbal e não verbal), as hesitações, o tom de voz, as contradições, etc.

45. As razões pelas quais se confere credibilidade a determinadas provas e não a outras dependem desse juízo de valoração realizado pelo juiz, com base na imediação, ainda que condicionado pela aplicação das regras da experiência comum.

46. Ora no caso dos autos, a Mma. Juiz “ a quo” fundamenta a prova dos factos, acima mencionados, apenas com base nas declarações da assistente que não são isentas de incongruências e contrariedades.

47. Neste contexto, sempre deveria ser aplicado o princípio in dubio pro reo, enquanto correlato processual do princípio da presunção da inocência do arguido, gozando o arguido da presunção de inocência (artigo 32° n°2, da Constituição da República Portuguesa), toda e qualquer dúvida com que o tribunal fique reverterá a favor daquele.

48. Resulta ainda da sentença sob recurso que as regras da experiencia comum permitiram dar como provados os factos 25 a 31, no que se refere designadamente ao tipo subjetivo do ilícito.

49. Ora, as “regras da experiência comum” não são, nestes assuntos, abstratas e imutáveis, não podendo traduzir qualidades e circunstâncias desligadas das realidades presentes em cada situação, e, sobretudo, não sendo apreensíveis a partir do contexto e da realidade vivencial do observador (no caso, o julgador).

50. Não ignoramos como os tribunais superiores têm chamado a atenção que uma das grandes limitações do tribunal de recurso quando é chamado a pronunciar-se sobre uma impugnação de decisão relativa a matéria de facto, sobretudo quando tem que se debruçar sobre a valoração, efectuada na primeira instância, da prova testemunhal, decorre da falta do contacto directo com essa prova, da ausência de oralidade e, particularmente, de imediação.

51. Não obstante, acreditamos também que o papel fiscalizador do Tribunal da Relação não fica inteiramente prejudicado, pois sempre pode apreciar se a valoração dos depoimentos foi feita de acordo com as regras da lógica e da experiência, isto é, se os juízos de racionalidade, de lógica e de experiência confirmam ou não o raciocínio e a avaliação feita em primeira instância sobre o material probatório de que o Tribunal “ a quo” dispôs.

52. Sabendo-se que a violência de que são vítimas as mulheres ocorre sobretudo no seio do agregado familiar, escapando em larga medida ao conhecimento público, tem vindo a receber progressivamente aceitação geral a ideia de que estando em causa crimes cuja prática é menos visível ou rodeado até de certo secretismo os depoimentos dos ofendidos devem merecer especial relevo probatório.

53. Todavia, tal não pode significar, porém, que se deva ter como certo que, neste particular, a ofendida conta sempre a verdade, sobretudo quando se nega a possibilidade de o arguido vir apresentar a sua versão dos factos.

54. Há, portanto, que ser cauteloso e evitar visões maniqueístas das situações: nem sempre o arguido é o demónio e a(o) ofendida(o) o anjo, a vítima cândida, inocente e indefesa que merece todo o crédito.

55. Consideramos ainda que o Tribunal “ a quo” não obedeceu aos critérios fixados para a determinação da medida concreta da pena a aplicar que, conforme preceituado nos artigos 71.º e 77.º do Código Penal, deve ser fixada em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, bem como de todas as circunstâncias que não fazendo parte do tipo do crime, deponham a favor ou contra o agente.

56. Em concreto, o arguido recorrente não apresenta quaisquer antecedentes criminais.

57. Tem actividade laboral regular, com residência fixa no estrangeiro.

58. O recorrente tem comprovadamente um excelente relacionamento com os seus filhos e vive integrado familiar e socialmente.

59. O Tribunal a quo ao condenar o Recorrente nas penas concretas em questão não considerou todos os elementos que jogam a favor dele.

60. Ademais, considera, certamente por lapso, que o arguido é autoritário, o que ajuda a compreender o seu temperamento, em face do teor das mensagens e das fotografias que enviou, o que releva ausência de arrependimento e não ter interiorizado a gravidade da conduta.

61. Desconhecendo nós a que mensagens e das fotografias se refere a Mma. Juiz “ a quo”, permitimo-nos concluir com elevado grau de certeza que a sentença sob recurso não se refere, neste passo, ao caso dos autos, facto de nos merece especial desagrado, em particular quando em causa está a condenação numa pena de prisão.

62. Mais adianta a Mma. Juiz “ a quo”, reforçando a nossa posição, que “ neste momento, o arguido evidencia capacidade de autocensura, que sustenta o seu actual entendimento relativamente à forte censurabilidade jurídica e social dos factos.

63. Ora, como pode o Tribunal “ a quo” ter chegado a tal conclusão sem nunca ter ouvido o arguido? Certamente, por presunção, com base nas regras da experiencia comum, de igual forma como fez para concluir pela existência do tipo subjetivo de ilícito.

64. No caso concreto, e violando ainda o disposto no n.º 2. do art. 32.º da Constituição da República Portuguesa, o Tribunal “a quo” simplesmente fundamentou a condenação em juízos de probabilidade, sendo certo que, no momento da decisão, o juiz, sem partis pris ou prejuízo, deve basear-se apenas em provas para estabelecer a culpabilidade, não devendo partir da convicção ou da suposição de que o arguido é culpado.

65. Assim, porque não se encontram devidamente fundamentadas, na sentença sob recurso, as exigências de prevenção especial, deverá concluir-se que ao condenar o Recorrente pela prática de um crime de violência doméstica previsto e punido pelo artigo 152.°, n.° 1, a) e n.° 2 do Código Penal, na pena de 3 (três) anos violou o Tribunal “ a quo” o disposto nos artigos 40.°, 71.°, 72.°, 73.° e 77.° do Código Penal.

66. Em face de tudo quanto expusemos afigura-se-nos não se encontrar reunida prova bastante, apreciada em sede de julgamento, que sustente igualmente a responsabilidade civil do arguido, não devendo proceder, neste passo o pedido de indemnização contra o mesmo formulado.

Sem prescindir,
67. Quanto aos danos não patrimoniais peticionados rege o artigo 496.º do CC, de onde resulta que são indemnizáveis os que pela sua gravidade mereçam a tutela do direito.

68. A gravidade do dano deve medir-se por um padrão objectivo (devendo, porém, considerar-se as circunstâncias de cada caso) e não à luz de factores subjectivos.

69. E, porque neste tipo de danos é evidente a impossibilidade de reparação natural dos mesmos, no cálculo da respectiva indemnização deve recorrer se à equidade, tendo em conta os danos causados, o grau de culpa, a situação económica do lesante e do lesado e as circunstâncias do caso (art.496.º, n.º 3, do CC).

70. Ora, nenhuma destas circunstâncias se nos afigura devidamente circunstanciada na sentença, com relevo especialmente para o apuramento das condições económicas do demandado recorrente, e da própria demandante.

71. Pelo que, e em face da ausência de prova, consideramos, pois, excessivo o montante indemnizatório arbitrado à demandante, com expressa violação do artigo 496.º, n.º 3, do CC.

72. O Tribunal a quo violou, na sentença recorrida, o disposto nos artigos 61º, 333ºdo CPP, o artigo 32º da CRP, o artigo 14º do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, coartando os direitos de defesa do arguido, com a expressa cominação da nulidade prevista no artigo 119º, alínea c) do CPP, com os efeitos previstos no artigo 122º do mesmo diploma.

73. Viola igualmente os artigos 129º e 130º do CPP, e ainda os artigos 40.°, 71.°, 72.°, 73.° e 77.° do Código Penal.

Por conseguinte,
74. Devem Vossas Excelências declarar a nulidade da sentença recorrida, com as inerentes consequências legais, e caso assim não se entenda, nestes termos e nos demais de Direito, que doutamente se suprirão, deverá ser dado provimento ao presente recurso e, por via dele em consequência, ser revogada a sentença recorrida, tudo com as legais consequências assim se fazendo a já costumada e almejada, JUSTIÇA!

Por despacho de 13 de agosto de 2018, o recurso foi admitido e fixado o respetivo regime de subida e efeito.

O Ministério Público respondeu ao recurso interposto nos seguintes termos:

Com o devido respeito, entendemos que não assiste razão ao recorrente pelos motivos que se passarão a aduzir.

- Da nulidade invocada:
O arguido recorre antes de mais do despacho proferido em sede de audiência de julgamento no dia 28-06-2018 que indeferiu a nulidade invocada pelo arguido por requerimento datado de 20-06-2018.

Em suma, em 20-06-2018, o arguido invocou a nulidade insanável do despacho datado de 13-06-2018 que indeferiu a sua audição no período de 24-07-2018 a 08-08-2018, e reiterou o seu requerimento para ser ouvido quando se encontrasse em Portugal.

Em decisão, entendeu o Tribunal a quo que a referida nulidade não se verificava, uma vez que o arguido encontrava-se regularmente notificado da primeira e segunda datas designadas para julgamento desde 28-04-2018, sendo que não invocou qualquer impossibilidade até ao dia em que se iniciou o julgamento, ou seja, no dia 04-06-2018.

Nesse dia, a ilustre defensora do arguido, requereu o prazo de 5 dias para juntar aos autos autorização assinada pelo arguido para realização do julgamento na sua ausência, o que foi indeferido, sendo o arguido condenado em multa por falta injustificada, atendendo o disposto no artigo 117°, nº 2, 1 a parte.

Nesse mesmo dia, pela ilustre defensora do arguido foi requerido que o mesmo prestasse declarações na segunda data designada, ou seja, no dia 18-06-2018, o que foi deferido, com o alerta de que o arguido já estaria notificado de ambas as datas.

Posteriormente, no dia 06-06-2018, o arguido veio manifestar a sua impossibilidade de comparecer, por motivos profissionais, manifestando a vontade de ser ouvido noutra data, se tal lhe fosse "legalmente permitido" (sic).

Atendendo ao disposto no artigo 333°, nO 3, do CPP, foi tal pretensão indeferida por despacho datado de 13-06-2018, sendo que no entanto no dia 18-06-2018, foi considerada justificada a ausência do arguido.

Após, no dia 20-06-2018, por requerimento, veio o arguido invocar a nulidade insanável do despacho proferido a 13-06-2018.

Assim, entendeu, e bem, a Mma. Juiz a quo que não foi coartado o direito ao arguido de ser ouvido, sendo que a sua conduta ao longo do processo foi de completo alheamento relativamente ao mesmo, considerando-se que a realização da audiência de julgamento na sua ausência foi feita em estrita obediência ao disposto no artigo 333° do CPP.

Ora, tal como o Ministério Público já havia defendido aquando da invocação da referida nulidade, esta não se verifica, tendo sido cumprido o legalmente exposto no artigo 333° do Código de Processo Penal.

- Da apreciação da prova produzida:

Alega o recorrente que a Mma. Juiz a quo deu como provados os factos que levaram à sua condenação apenas com base nas declarações da assistência/ofendida e que, portanto, tal não seria suficiente para dar como provados os factos. Discordamos.

Em primeiro lugar, é largamente sabido que nas mais das vezes, em situações de violência doméstica, não existem testemunhas, porque os factos ocorrem no seio da intimidade da vida privada e familiar, situação que é apontada pela Mma. Juiz a quo na douta sentença (fls. 128), o que, aliás, justifica a agravação contida no nº 2 do artigo 1520 do Código Penal.

Portanto, muitas vezes, passa pela credibilidade que é dada à vítima e que resulta do seu depoimento em sede de julgamento, e da apreciação que do mesmo é feita pelo julgador, através da imediação e da oralidade.

Injusto seria que não se atribuísse suficiência ao testemunho da vítima quando inexistissem outras testemunhas.

Assim, a prova tem que ser analisada caso a caso, sendo muitas vezes suficiente o relato da vítima.

Diga-se que, quanto às testemunhas AA e CC, os seus depoimentos serviram para atestar o estado de ânimo apresentado pela ofendida, aquilo que puderam constatar - o choro, a tristeza - sendo que quanto ao mais apenas sabiam aquilo que lhes foi relatado pela ofendida, tal como referido na douta sentença.

Quanto às demais testemunhas, o Tribunal a quo explicou de forma clara e objectiva porque as mesmas não contribuíram para a descoberta da verdade material.

Ora, "quando a atribuição de credibilidade a uma fonte de prova pelo julgador se basear numa opção assente na imediação e na oralidade, o tribunal de recurso só a poderá criticar se ficar demonstrado que essa opção é inadmissível face às regras da experiência comum" (acórdão da Relação de Coimbra de 06 de Março de 2002, publicado na CJ, ano 2002, II, 44.)

Consequentemente, a crítica à convicção do Tribunal a quo sustentada na livre apreciação da prova e nas regras de experiência não pode ter sucesso se se alicerçar apenas na diferente convicção do recorrente sobre a prova produzida.

Efectivamente, o julgador aprecia as provas livremente.
Como fica patente da análise da motivação de facto que consta da douta decisão de que se recorre, o Tribunal a quo recorreu às regras de experiência e apreciou a prova de forma objectiva e motivada.

Destarte, a decisão recorrida não se mostra ilógica, arbitrária ou notoriamente violadora das regras da experiência comum. Pelo contrário, assenta em operações intelectuais válidas e justificadas e com respeito pelas normas processuais atinentes à prova.

Na senda do acórdão nº 7/95 do Plenário da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça de 28 de Dezembro de 1995 "é oficioso, pelo tribunal de recurso, o conhecimento dos vícios indicados no artigo 410°, nO 2, do Código de Processo Penal, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito".

Compulsada a douta decisão sindicada, não se vislumbra a verificação de qualquer um daqueles vícios, nomeadamente a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, a contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão ou erro notório na apreciação da prova.

- Da medida da pena:
No que diz respeito às penas aplicadas, entende o recorrente que o tribunal a quo violou o disposto nos artigos 40°,71°,72°,73°, e 77° do Código Penal.

Ora, o arguido foi condenado na pena de 03 anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, sujeita ao cumprimento de regras de conduta e ainda nas penas acessórias de proibição de contacto com a vítima e de frequentar programas específicos de prevenção da violência doméstica.

Do que parece resultar do recurso, o recorrente apenas põe em causa o quantum da pena principal, ou seja, os 03 anos de prisão (suspensa na sua execução).

Ora, no nosso entendimento, o tribunal a quo teve em conta, tal como legalmente exigido, todos os factores que militam a favor e contra o arguido, tendo em consideração a gravidade da factualidade provada, concluindo pela pena de três anos de prisão (suspensa na execução), quantum esse que não nos merece reparo, que é proporcional e adequado às circunstâncias do caso concreto, e que nem sequer é elevado face à moldura penal do ilícito em causa (que vai de 02 a 05 anos de prisão).

Assim, entendemos que a decisão recorrida não é passível de censura, por inviolabilidade de qualquer preceito legal.

Termos em que se conclui sufragando a posição adoptada pelo Tribunal a quo na douta decisão sindicada, julgando-se o recurso interposto pelo arguido improcedente, como é de toda a
JUSTiÇA.
*
No Tribunal da Relação o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu Parecer nos seguintes termos:
“ (…)
Questão prévia (prejudicial)
Na sequência da prolação do Despacho de 13.06.2018 (cfr. fls.173) que indeferiu requerimento do Arguido (Despacho esse confirmado por Despacho proferido a sessão de julgamento de 18.6.2018 – cfr. Acta respectiva, a fls.175), veio aquele, por Requerimento de 20.6.2018, além do mais, arguir a (pretensa) nulidade insanável do Despacho de 13.6.2018.
(…)
Não obstante, o Tribunal não se pronunciou sobre a referida arguição (nada constando no suporte físico do processo, nem na plataforma), antes consignando na Sentença que “Inexistem nulidades ou outras excepções ou questões prévias ou incidentais que cumpra decidir e que obstem ao conhecimento do mérito da causa.”
(…)
Não tendo sido decidida a arguição de nulidade, o Tribunal podia e devia tê-la apreciado e decidido em sede de Sentença.

Ao omiti-lo, a Sentença é nula, posto ter deixado de se pronunciar sobre questão que estava obrigado a conhecer e decidir – cfr.379º, nº1, c) do CPP.

Em conformidade, somos de parecer que como tal deve ser declarada, determinando-se a devolução do processo à Iª Instância, a fim de ser apreciada e decidida a arguição de nulidade suscitada pelo Arguido, proferindo-se, ou não, nova Sentença, em função do que sobre a referida questão vier a ser decidido.

Por mera cautela, caso esta Relação assim não venha a entender, o MP subscreve a Resposta do MP na Iª Instância, pugnando pela improcedência do Recurso do Arguido e pela consequente confirmação da Sentença recorrida.

Cumprido o disposto no art.417º, nº2, do CPP, responderam o arguido e a demandante.

Respondeu o arguido “reiterando toda a argumentação de facto e de direito que consta da motivação de recurso apresentada, designadamente a que, sob a epígrafe “D –Das nulidades insanáveis”, circunstancia a forma como se realizou o julgamento sem que fossem tomadas pelo Tribunal “a quo” as medidas necessárias e legalmente admissíveis para se obter a comparência do mesmo – sendo certo que por várias vezes o arguido manifestou a sua vontade de prestar declarações – mantem igualmente o arguido recorrente a sua posição, no sentido de que deve ser declarada a nulidade invocada com as demais consequências legais.”

Respondeu a demandante que, “Salvo o devido respeito, por despacho judicial proferido aos 28 de Junho de 2018, devidamente notificado ao arguido, o Tribunal pronunciou-se sobre o requerimento de 20.06.2018, que arguiu a nulidade do despacho de 13.06.2018, sendo que foi indeferida a nulidade invocada, por não se julgar verificada”.

Realizado o exame preliminar e colhidos os vistos legais foram os autos à conferência.

Cumpre decidir
Fundamentação

Delimitação do objeto do recurso
O âmbito do recurso é delimitado em função do teor das conclusões extraídas pelo recorrente da motivação apresentada, só sendo lícito ao Tribunal “ad quem” apreciar as questões desse modo sintetizadas, sem prejuízo das que importe conhecer oficiosamente, como são os vícios da sentença previstos no artigo 410º, nº2, do CPP, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito (cfr. Ac. do Plenário das Secções Criminais do STJ de 19/10/1995, DR I-A Série, de 28/12/1995 e artigos 403º, nº1 e 412º, nºs 1 e 2, ambos do CPP).

São, pois, as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas conclusões da respetiva motivação que o Tribunal ad quem tem de apreciar.

No caso sub judice o recorrente limita o recurso às seguintes questões:
-saber se a audiência de julgamento e a subsequente sentença se encontram inquinadas por nulidade insuprível em virtude o tribunal ter impedido o exercício pelo arguido do direito de defesa e do direito de contraditório, constitucionalmente garantidos.

- erro de julgamento;

- violação do princípio in dubio pro reo;

- medida da pena;

- montante da condenação no pedido de indemnização civil.

DA DECISÃO RECORRIDA – FACTOS E MOTIVAÇÃO
III - Fundamentação de Facto:

A) Factos Provados:
Da audiência de julgamento resultaram provados os seguintes factos, com interesse para a decisão da causa:
1. O arguido e CP nascida a 01.04.83 casaram um com um outro em 21.12.99.
2. O casamento foi dissolvido por divórcio no âmbito do processo nºl--- / 16.0TSTMR do 1 ° Juízo do Tribunal de Família e Menores de Tomar, mediante decisão datada de 29.10.17.
3. Desta relação nasceram os filhos João, a 07.03.00 e Renato, a 05.O5.O5.
4. Desde Fevereiro de 2004 e até ao presente que o arguido e CP habitaram a casa sita na Rua … no Carvalhal, Abrantes.
5. Durante o tempo do relacionamento conjugal entre o arguido e CP que este emigrou por várias ocasiões, para a Alemanha, Espanha e por fim para a Suíça.
6. Sempre que regressava a Portugal, estando por algum tempo desempregado, o arguido desenvolveu hábitos de consumo de álcool em excesso e desentendia-se com a mulher.
7. E, na sequência desse consumo de álcool e do desentendimento, o arguido passou a chegar a casa embriagado e a desentender-se com CP.
8. Quando o filho mais velho, tinha meses, em junho de 2000, quando o casal ainda residia na mesma Rua mas em casa de uma tia, num prédio próximo, o arguido desentendeu-se com a mulher e desferiu-lhe uma bofetada com a mão aberta e com foça no rosto, facto a que a criança assistiu, tendo a ofendida ficado com a face vermelha e com dores durante um hora.
9. Na situação referida em S, o arguido empurrou, ainda, a ofendida em número não concretamente apurado
10. No verão de 2012, já na casa onde acabaram a viver, acima identificada, ainda tinham apenas o filho Renato que estava próximo, o arguido vendo a mulher a tomar banho, desligou-lhe a água, por um período de 20 minutos impedindo a ofendida de acabar de tomar banho durante esse período, ficando a mesma à sua mercê para terminar o banho e disse-lhe: - "agora sais pela janela, mas sem a partir que eu vou tirá-la que quem a pagou fui eu!".
11. Em Fevereiro de 2004, quando o filho João era pequeno, na casa onde habitaram acima identificada, o arguido chegou a casa cerca da meia noite, estando a ofendida já deitada.
12. Nessa sequência, o arguido exigiu que a ofendida se levantasse para lhe servir o jantar, ao que a arguida lhe respondeu que o jantar estava na mesa e por tal motivo desentendeu-se com a mulher.
13. Ainda assim a ofendida levantou-se da cama e foi sentar-se no sofá.
14. E, no acender do desentendimento, o arguido aproximou-se da mulher que estava sentada num sofá.
15. Então, com energia, o arguido agarrou um dos braços do sofá, empurrando ao ar para que a mulher caísse o que fez com que CP caísse sobre o braço do sofá do lado oposto, em madeira, este se quebrasse contra o seu corpo, causando dor e hematomas no braço direito, os quais duraram uma semana.
16. E, um desses desentendimentos mais próximos, ocorreu em 4 de Agosto de 2017, à noite, em casa, quando o arguido queria que os filhos o acompanhassem à Suíça e a mulher não acedeu.
17. Então, o arguido dirigiu-se a CP em voz alta e em tom agreste e chamou- a de "porca", "cabra", "puta" dizendo ainda que "não prestava para nada".
18. No Natal de 2017, durante quatro noites seguidas em que que o arguido veio à casa da mulher entregar os filhos após ter estado com os mesmos, cerca das 23:00 horas, o arguido, sem que o convidassem a entrar posto que já estavam separados e até divorciados, entrou, despiu-se e deitou-se na cama da mulher, colocando a roupa do corpo sobre uma cadeira.
19. A mulher espreitava e pedia-lhe por várias vezes que saísse dali.
20. Ao que o mesmo respondia "que não saía de casa que também era dele".
21. Os filhos estavam em casa e aperceberam-se.
22. Atualmente o casal não se fala e os contactos acerca dos filhos são realizados através do filho maior.
23. As palavras e os gestos do arguido causaram na mulher, que os sofria perante os filhos, ofensas na honra e consideração que lhe eram devidas, pelo marido e posteriormente o ex-marido bem como um contínuo e enorme sofrimento, físico e psíquico e assim, humilhação.
24. Todas as ocasiões que se dirigiu ao corpo da mulher o arguido causou-lhe dores.
25. Ao dirigir-se à mulher cortando-lhe o fornecimento de água sem acabar o banho, e ainda quando se deitou despido na sua cama, após a separação e o divórcio, o arguido quis atentar contra a intimidade da vida privada da mulher.
26. O arguido agiu deliberadamente querendo causar maus tratos, físicos, psíquicos e corporais, ofender a honra da mulher, assustá-la e criar-lhe insegurança de quem já não tem sequer a intimidade do seu banho ou da sua cama.
27. Quis causar essas mesmas lesões, naquelas condições, por isso agiu da forma descrita.
28. Orientou as suas ações para a concretização destas vontades, tendo logrado concretizá-las.
29. Quando atuava do modo retro descrito, o arguido sabia do maior desvalor da sua conduta, em função da pessoa que agredia, o respetivo cônjuge e depois ex¬cônjuge, do local, o aconchego do lar e ainda da presença dos filhos de ambos.
30. O arguido agiu sempre livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei penal
31. Praticando ainda os factos de forma reiterada, refleti da, premeditada, num crescendo de violência e frequência.

y Mais se provou que:
32. Entre 21.12.99. e 2006, data em que o arguido passou a trabalhar no estrangeiro, este apelidava, diariamente, a ofendida de "porca", "cabra", "puta" dizendo ainda que "não prestava para nada".
33. Quando o arguido regressava do estrangeiro, o ambiente na residência do casal era caraterizado por discussões diárias iniciadas pelo arguido, acusando a ofendida de não lhe servir as refeições ou de colocar à sua disposição a roupa para o mesmo vestir, desferindo-lhe, nessas circunstâncias, empurrões com as mãos (em numero não concretamente apurado) fazendo com que a ofendida caísse ao chão
34. Após os empurrões seguidos de queda, a ofendida ficava com hematomas nas pernas e braços e com dores pelo menos durante uma hora.
35. O arguido controlava permanentemente os movimentos da ofendida, inclusivamente quando esta ia estender a roupa, o mesmo acompanhava-a.
36. O arguido não gostava que a ofendida trabalhasse e quando esta se encontrava laboralmente ativa, este deslocava-se ao seu local de trabalho, causando distúrbios, no claro intuito de a envergonhar, nomeadamente:
36.1 Em 2013, a ofendida trabalhava nas bombas de combustível de ---- e ali se dirigiu e pediu o livro de reclamações, sem motivo que o justificasse;

36.2 Em 2013, o arguido dirigiu-se à Autoridade das Condições de Trabalho e apresentou uma queixa em nome da ofendida, o que implicou uma ação de inspeção junto da sua entidade de trabalho.

37. Quando, e cerca de mais de 30 vezes, a ofendida se despia à frente do marido dizia-lhe que se a vissem despida que fugiam.
38.Após o nascimento do primeiro filho, muitas vezes a ofendida cedia a manter relacionamento sexual como o arguido sem vontade, na expectativa que o relacionamento melhorasse.
39. A ofendida foi mãe aos 16 anos.
40.O arguido não gostava que a ofendida mantivesse contactos com a sua família sanguínea o que levou a mesma a afastar-se da família, no desiderato de evitar que se iniciassem discussões.
41.Com a atitude do arguido, a ofendida sentia uma tristeza enorme, sentindo como se nada valesse, colocando a si própria a questão da razão da sua existência.
42.Das vezes que o arguido lhe desferia empurrões ou chapadas, causando-lhe dor e hematomas nos moldes supra descritos, a ofendida não se dirigia ao médico ou recorria a assistência hospitalar, por vergonha e por acreditar que o comportamento do arguido iria melhorar.
43.Com o comportamento perpetrado pelo arguido, a ofendida sentia medo e massacrada.

Y Das condições pessoais, familiares e sociais

44. Não foram apuradas.
y Dos antecedentes criminais
45. O arguido não tem antecedentes criminais averbados.

B) Factos Não Provados:
Com relevo para a boa decisão da causa, não se provou:
a)Na sequência do desentendimento, o arguido desferiu um empurrão em CP aplicando energia de tal sorte que esta foi embater com o ombro direito na parede.

C) Fundamentação da Matéria de Facto
O Tribunal formou a sua convicção positiva com base na análise crítica e conjugada da prova produzida e examinada em audiência de julgamento globalmente considerada, atendendo aos dados objetivos fornecidos pelos documentos juntos aos autos.

Toda a prova produzida foi apreciada segundo as regras da experiência comum e lógica do homem médio, suposto pelo ordenamento jurídico, fazendo o Tribunal, no uso da sua liberdade de apreciação, uma análise crítica dos meios de prova, destacando-se:

y A prova documental, cujo teor não foi impugnado:
~ Certidões de assento de casamento de fls, 71 e de nascimento de fls, 53 e 55, as quais permitiram dar como provado os factos 1 e 3;
~ Certidão extraída do Proc, de divórcio n° ---/16.0T8TMR de fls, 98 a 112, o qual permitiu dar como provado o facto 2.
~ Relatório social de fls, 152 o qual permitiu concluir que o arguido em 04/05/2018 não se mostrou contactável para a elaboração do relatório social, pelo que não foi possível apurar as suas condições económicas (facto 44).
~ CRC de fls, 159, o qual permitiu dar como provado que o arguido não tem antecedentes criminais (facto 45).
Y O arguido não compareceu à audiência de julgamento, pelo que a mesma se realizou na sua ausência.

Y Declarações da ofendida e demandante civil, as quais permitiram dar como provados os factos 4 a 22 e 32 a 43, sendo que alguns deles, tal como supra se referiu, de forma conjugada com a prova documental inserta nos autos. Em concreto:

Assumiram particular relevância as declarações prestadas pela Demandante civil, a qual narrou os factos de que foi vítima por parte do arguido e as consequências que lhe advieram, o que tudo fez tal como a atinente factualidade resultou provada. Estas declarações afiguraram-se-nos merecedoras de credibilidade, pela forma pormenorizada, sentida e emocionada como foram prestadas, revelando dor ao revivenciar os momentos dolorosos sofridos durante a constância do casamento, nomeadamente, o ambiente amedrontador e agressivo por parte do arguido, a constante imputação de nomes humilhantes causados pelo consumo de álcool, factos estes que se prolongaram pelo menos cerca dezoito anos e cumprindo ainda notar em abono da credibilidade das declarações em apreço o facto de a ofendida ter narrado os episódios em que sofreu sevicias corporais (empurrões e estalos), as quais foram presenciadas pelo filho mais velho, mas quando este era bebé de colo. Cabendo, finalmente, dizer que não se vislumbra qualquer razão/motivo para a ofendida e demandante civil neste momento, em que já findou a sua vida em comum com o arguido, vir à audiência de julgamento relatar factos da sua vida conjugal com o arguido não condizentes com a realidade, até porque a mesma tem medo do arguido, facto notório em face do teor das suas declarações, tomadas na primeira sessão de audiência e julgamento, quando inquirida.

A demandante civil esclareceu que os insultos, as humilhações e as agressões ocorreram na casa de morada de família. Relatou o sofrimento porque passou em resultado do comportamento do arguido, sentimentos que tiveram notórias consequências psicológicas (em face do discurso apresentado), quando se decidiu pelo esclarecimento dos factos. O seu depoimento foi, de igual modo, credível e convincente, pela sua impressibilidade, certeza e localização espacial e temporal, no que tange ao relato dos factos e as circunstâncias em que ocorriam as agressões, injúrias e humilhações, tal como se encontram assentes e acrescentou pormenores que da acusação não constavam.

Concluiu que a agressividade do arguido se intensificou devido à ingestão de bebidas alcoólicas em excesso, declarações que mereceram igualmente credibilidade.

É bom de ver que estamos perante factos que ocorrem no seio da intimidade da vida privada, sem a presença de testemunhas, na casa de morada de família - daí a agravação contida no n." 2 do artigo 152° C Penal, que se teve presente no caso concreto. Aliás, nunca é de mais sublinhar que é a ofendida quem, dadas as circunstâncias em que os factos são praticados (na intimidade do lar e longe da vista de testemunhas, sendo que no caso dos autos foi que o arguido não se inibia de agredir a demandante civil na presença do filho desta), melhor os pode relatar e esclarecer ao Tribunal.

Se o arguido, não comparecendo às duas sessões de julgamento, alheando-se por completo ao desfecho do processo judicial que sobre si impendia, prescindindo, desta forma, de dar a sua visão pessoal sobre os factos e, eventualmente, esclarecer factos de que tem conhecimento pessoal, não pode, pois, pretender ter sido prejudicado com a sua ausência, v.g., quando a prova documental supra mencionada reunida e declarações da demandante civil é de tal forma contundente que apenas se pode inferir que a não pode negar.

Posto isto, em face da prova produzida, conclui-se, sem margem para dúvidas, que, à data em que o fez, o arguido sabia que as sevícias corporais que infligia à demandante civil, bem como as expressões dirigidas à demandante civil eram proibidas bem sabendo que, com a aludida
conduta, praticava um crime.

Y Da prova testemunhal, em concreto:
• O depoimento das demais testemunhas respeitantes ao pedido de indemnização civil (AC) vieram corroborar o estado de ânimo apresentado pela ofendida (tristeza, chorosa), sendo certo que os demais factos por si relatados apenas tinham conhecimento dos mesmos por a demandante civil os transmitir, não obstante de os seus depoimentos serem consonantes com o depoimento prestado pela ofendida, pelo que as declarações das testemunhas permitiram concluir pela veracidade dos factos reportados pela ofendida Daí se ter dado como provado os factos 4 a 22 e 32 a 43).

• As testemunhas apresentadas pelo arguido (irmão e mãe do arguido), por serem desconhecedoras do que se passava dentro das quatro paredes da casa desta família, não trouxeram factos que permitissem deitar por terra a versão da demandante civil. Tal desconhecimento resulta por não frequentarem de forma assídua o lar do arguido e demandante civil, sendo certo que resulta das regras da experiência comum que a vergonha (mais do que o medo) levam a vítima a ocultar a pressão constante em que viveu, nomeadamente em meios pequenos tal como o vertido aqui nos autos. Por outro lado, o depoimento destas duas testemunhas mostrou-se subjetivo e parcial, no claro propósito de proteger o seu irmão/filho e em denegrir a imagem da ofendida, apresentando um depoimento contido e titubeante. Desta forma, os respetivos depoimentos não foram valorados.

• O depoimento de JP, filho mais velho do casal. Primeiro começou por dizer que estava zangado com a mãe por ela dizer que o pai não enviava dinheiro para os sustentar o que era mentira e mencionando que vai deixar de viver com a mãe a partir de julho de 2018, pois irá ter com o pai à Suíça. Posteriormente, acabou por dizer que está zangado com a mãe por esta ter levado o pai a Tribunal e que a mãe só o avisa para se deslocar ao Tribunal um dia antes dos acontecimentos, acabando por revelar ter conhecimento do teor da acusação porque o pai lhe enviou a mesma. Depois a forma como respondia, denotando raiva, adotando uma postura contraída, acabando por revelar que a mãe era a culpada pelo sucedido e que se vingou da mãe prestando depoimento contra a mesma por esta não o deixar ir para a Suíça ter com o pai. Tratou-se de um depoimento que transparecia uma raiva incontrolável contra a ofendida, incongruente e subjetivo, denotando uma intenção clara de se vingar da mãe com o respetivo depoimento, negando que o pai tivesse batido na mãe ou ter assistido a discussões entre ambos, mas acabando por referir que o pai não gostava que a mãe trabalhasse até horas tardias sem ser remunerada, referindo que ambos se insultavam mutuamente.

Estas declarações não foram consideradas, dado que foram frontal e inexoravelmente colocadas em crise pelo depoimento da ofendida.

Por outro lado, colocando paralelamente o depoimento do ofendido com o depoimento da sua mãe (ofendida), ambos descreveram de forma diferente a mesma situação ocorrida em agosto de 2017 - mostrando-se mais compatível com a realidade as declarações prestadas pela ofendida do que as do filho, pois resulta das regras da normalidade da vida que um jovem com 18 anos de idade tome o partido do progenitor que lhe promete uma vida sem regras e controlo do que daquele que lhe impõe regras e educação, contrariando nos seus desejos de liberdade.

A forma como o depoimento deste jovem de 18 anos prestado em sede de julgamento constituem fortes indícios de que houve manipulação das informações, com o objetivo de destruir o vínculo afetivo com a ofendida - ao induzir-se o jovem a reproduzir o falso conteúdo, como forma de manutenção de um vínculo de dependência entre o pai e o jovem.

Por outro lado, à medida que debitava o seu discurso, revelava com o seu olhar, de forma incessante a satisfação de denegrir a imagem da mãe e obter a absolvição do pai. Portanto, o depoimento de JP não foi valorado pelo Tribunal.

Y Das regras da experiência comum, as quais permitiram dar como provados os factos 25 a 31 (elemento subjetivo). O Tribunal considerou-os provados com recurso às regras da experiência comum, as quais permitem inferir a intenção subjetiva do arguido, atentos os factos objetivos dados como provados. De facto, é presunção natural de que quem desfere chapadas e empurrões, pretende ofender a sua integridade física, molestando-a fisicamente e causando-lhe dor. Também quem pressiona o cônjuge a manter relações sexuais contra a sua vontade ou sem desejo sexual, sabe que afeta a sua liberdade sexual.

Sendo ainda presunção natural o facto de alguém apelidar outrem de puta, porca, cabra e que não presta para nada, etc, bem como proferindo a expressões constantes nos pontos 10, 33 a 37 pretende ofender a integridade psíquica da visada bem como provocar temor na mesma e humilhá-la.

Por outro lado, resulta ainda provado pelo depoimento da demandante civil, o arguido agiu da forma descrita sem qualquer justificação, bem sabendo da desproporção entre o motivo que originou as agressões e o método de agressão que utilizou, sem olvidar que o fazia na presença de uma criança.

Medianamente claro e evidente, não é o facto de o arguido maltratar a mulher na sequencia do consumo de bebidas alcoólicas, que, tal facto lhe retira a vontade e o discernimento, de forma a excluir o dolo da sua atuação.

Y Quanto ao facto não provado em a), o mesmo resultou por falta de prova que o confirmasse.”

Apreciando

- Da invocada nulidade insanável

Os elementos processuais relevantes neste âmbito são os seguintes:
-O arguido encontrava-se regularmente notificados, com mais de trinta dias de antecedência, para comparência no Tribunal em 4 de junho de 2018, a fim de se proceder à audiência de julgamento neste processo, tendo sido ainda dado conhecimento que em caso de adiamento, se designava, como segunda data, o dia 18 de junho de 2018.

-O arguido apresentou em tempo contestação e rol de testemunhas;

-No dia 4 de junho de 2018 verificou-se que o arguido não compareceu no Tribunal. Na ocasião, dada a palavra à ilustre defensora do arguido, pela mesma foi dito: ”Uma vez que residindo o arguido na Suíça, como claramente se encontra demonstrado nos autos, resulta de manifesto lapso a ausência de requerimento para que o julgamento decorra na ausência do arguido, lapso pelo qual se penitencia, sendo certo que do mesmo não resulta qualquer óbice ao início da presente diligência. Por esse motivo, e porque na realidade por motivos profissionais e de residência no estrangeiro seria de todo impossível estar presente nesta diligência. Requer-se a V.Exª que seja concedido prazo de 5 dias para que, pelo seu próprio punho, o arguido venha a autorizar a realização da diligência sem estar presente, igualmente justificando a falta de hoje”.

E de imediato pela Mª Juiza foi proferido o seguinte despacho: “Compulsados os autos resulta que o arguido se encontra regularmente notificado da data de audiência de julgamento, desde o dia 28/472018 (FLS.151 – REFª 4915003).

Da procuração junta aos autos a fls.87, não obstante da mesma constar poderes especiais para confessar, transigir ou desistir da instância ou de pedido em qualquer ação judicial, a verdade é que não consta o poder especial para representar o arguido nos termos e para os efeitos do disposto no art.334º, nº2, do CPP. Acresce que, apesar de ter sido invocado que se trata de um lapso relativamente ao pedido da realização da audiência na sua ausência, justificando-se assim a sua falta, não se considera haver lapso em face do tempo decorrido entre a data que o arguido foi notificado da audiência de julgamento e a presente data. Ou seja, já o poderia ter feito em devido tempo.

Assim sendo, indefere-se o requerido pelo arguido, considerando-se a sua falta injustificada, atento o prazo constante no art.117º, nº2, 1ª parte (atendendo que o arguido até 5 dias antes do dia de hoje tinha conhecimento que estava a trabalhar no estrangeiro e da sua impossibilidade de estar presente) condenando-se o mesmo em 3 UCs, nos termos do disposto no art.116º, nº1 do CPP.

Em face da posição assumida, quer pelo Mº Pº quer pelo arguido e encontrando-se o mesmo regularmente notificado da presente audiência de julgamento, por ora, não se considera a sua presença absolutamente indispensável para a descoberta da verdade material desde o início da audiência, determinando-se de imediato o início da mesma – (art.333º, nº1, 2 do CPP).

Notifique”.

A Mmª juíza deu prosseguimento à audiência de julgamento, tendo-se procedido à inquirição da demandante e de todas as testemunhas;

Finda a inquirição da demandante e das testemunhas e após o Ministério Público e Ilustres Defensores terem dito considerarem analisada a prova documental aos autos, pela ilustre defensora do arguido foi dito: “Em face da prova produzida, designadamente do depoimento prestado pelo filho do casal, afigura-se-nos necessário que o arguido possa apresentar a sua versão dos factos, o que requer seja admitido faze-lo na próxima audiência de discussão e julgamento, designada para o próximo dia 18/6/2018, pelas 14 horas. Espera deferimento.”

Dada a palavra à Digna Magistrada do MºPº e ao ilustre defensor, pelos mesmos foi dito nada ter a opor.

De seguida a Mmª Juíza de Direito proferiu o seguinte despacho:” Ao abrigo do disposto no art.333º, nº3, do CPP, defere-se o requerido, sendo certo que se alerta para o facto do arguido já estar devidamente notificado quando recebeu o despacho que designou as datas para realização da audiência de julgamento ao abrigo do art.312º, nº2 do CPP e que resulta de fls.151

Notifique.

Para continuação, o próximo dia 18 de junho de 2018, pelas 14 horas.
Notifique.”

Porém, em 6 de junho de 2018 veio o arguido juntar requerimento do seguinte teor:

“ (…) tendo requerido a prestação do seu depoimento na segunda data designada para a realização da audiência de discussão e julgamento, vem informar V.Exa. que, tal como sucedeu na primeira data, não tem autorização para se deslocar a Portugal no próximo dia 18 de Junho, sendo tal facto motivo suficiente para, segundo a lei Suíça, ser contra si deduzido processo disciplinar,

Junta, para o efeito, declaração emitida pela entidade patronal, manifestando, no entanto, a sua vontade de ser ouvido, em data posterior se tal lhe for legalmente permitido.”

Em 13 de junho de 2018 foi proferido o seguinte despacho:

“Refª 5018303 e 5031282
Indefere-se por inadmissibilidade legal – cfr-art.333º, nº3 do CPP, sendo certo que os presentes autos têm caráter urgente.
Notifique:”

E, em 18 de junho de 2018, verificando-se a falta do arguido na audiência de julgamento, foi proferido o seguinte despacho:

“ Uma vez que o arguido referiu não poder estar presente em face das suas obrigações profissionais, o que comprovou por documento, considera-se justificada a sua falta.

No mais mantem-se o despacho já proferido a 13.06.2018 (refª 78523446).
Notifique.”

Após as alegações orais foi proferido o seguinte despacho:
“ Para a leitura da sentença designo o próximo dia 28.06.2018, pelas 16:45 horas, data que mereceu a concordância dos Ilustres intervenientes.
Notifique”.

Em 20 de junho de 2018, o arguido remete expediente aos autos, informando que, notificado da data designada para a leitura da sentença a proferir no dia 28 de junho de 2018, pelas 16.45 h, “não tem autorização de dispensa do trabalho para viajar para Portugal, com destino a este Tribunal, a fim de estar presente no acto ora agendado”, invocar a nulidade insanável subjacente ao despacho notificado ao arguido no dia 13 de junho de 2018 e “requerer que lhe seja assegurada a possibilidade de prestar declarações no período em que estará em Portugal,” e que, “em consequência da nulidade insanável subjacente ao despacho de 13/06/2018, sejam dados sem efeito todos os actos posteriormente praticados”

Em 28 de junho de 2018 foi proferido despacho do seguinte teor:
“O arguido, em 20.06.2018, vem invocar a nulidade insanável do despacho datado de 13.06.2018 que indeferiu que o mesmo fosse ouvido entre 24/07/2018 e 08/08/2018 e requerer, uma vez mais, a sua audição no período em que este se encontrar em Portugal-

Ouvido o MP, o mesmo pugnou pelo indeferimento da nulidade arguida, nos termos e fundamentos da promoção com a refª 78608555.

Ouvida a assistente, a mesma disse nada ter a opor ou a requerer.
Cumpre apreciar e decidir:
(…)
Como se referiu, o arguido encontrava-se devidamente notificado das datas de julgamento desde 28/04/2018.

O mesmo nada disse até ao dia em que se iniciou o julgamento.

Foi determinado, e obediência a todos os preceitos legais supra citados, que o mesmo fosse ouvido na segunda data designada e a requerimento do arguido, o qual, posteriormente veio dizer que, afinal, não poderia estar presente por motivos profissionais.

Nunca foi coartado o direito ao arguido de ser ouvido.

A conduta do arguido ao longo do processo foi de completo alheamento relativamente ao processo crime que corria contra si. Acresce que o arguido não pode exigir do Tribunal que o processo corra de acordo com as suas vontades e disponibilidades.

Quis ser ouvido na segunda data e tal foi deferido por despacho de 04/06/2018.

Se não compareceu, foi porque não quis, pois em face do tempo que já havia sido notificado poderia e deveria ter organizado a sua vida de modo a estar presente na audiência de julgamento.

Deste modo, não se considera verificada a nulidade insanável prevista no art.119º, al.c) do CPP, uma vez que o arguido se encontrava regularmente notificado das datas de julgamento, pelo que a realização da audiência de julgamento na sua ausência foi feita em estrita obediência ao art.333º do CPP.

Pelo exposto, indefere-se a nulidade invocada, por não se julgar verificada.
Notifique.”

Na mesma data – 28 de junho de 2018 - procedeu-se à leitura da sentença.

Vejamos então, perante este circunstancialismo, se houve intolerável desrespeito pelas garantias de defesa do arguido:

Como é sabido, o direito de defesa e o direito ao contraditório traduzem-se fundamentalmente na possibilidade do arguido intervir no processo, invocar as suas razões de facto e de direito, oferecer provas, controlar e contraditar todas as provas e argumentos jurídicos trazidos ao processo. As regras gerais da obrigatoriedade da presença do arguido na audiência (artigo 332.º, n.º 1), da submissão de todos os meios de prova apresentados ou produzidos no decurso da audiência ao princípio do contraditório (artigo 327.º, n.º 2), o direito do arguido prestar declarações em qualquer momento da audiência, em especial, no início e no final da audiência de julgamento (artigos 341.º, alínea a) e 361.º), são normas do Código do Processo Penal, destinadas precisamente a consagrar a garantia constitucional de um processo penal equitativo (artigo 20.º, n.º 4, da CRP), que obrigatoriamente deve assegurar todas as garantias de defesa ao arguido (artigo 32.º, n.º 1 e 5, da CRP).

Concomitantemente, a celeridade processual em matéria penal também beneficia de dignidade constitucional – já que todo o arguido deve ser julgado no mais curto prazo e até pode ser julgado na ausência –, estando o legislador ordinário apenas obrigado a que as soluções adotadas nesse sentido não comprometam as garantias de defesa do arguido (artigo 32.º, n.º 2, 2.ª parte, e n.º 6, da CRP). Por fim, não pode deixar de se ponderar na necessidade de evitar ou de minorar os incómodos das testemunhas, declarantes e sujeitos processuais com sucessivas deslocações e perdas de tempo, pelos sucessivos adiamentos de audiências de julgamento com fundamento na falta de comparência do arguido.

Neste âmbito, o artigo 332º nº 1 do CPP, referindo-se, nos termos já vistos ao princípio geral da obrigatoriedade da presença do arguido, depois acrescenta: “sem prejuízo do disposto nos artigos 333º, nºs 1 e 2, 334º, nºs 1 e 2.” Examinando o artigo 333º que se refere à falta do arguido notificado para a audiência, do seu nº 1 consta: Se o arguido regularmente notificado não estiver presente na hora designada para o início da audiência, o presidente toma as medidas necessárias e legalmente admissíveis para obter a sua comparência, e a audiência só é adiada se o tribunal considerar que é absolutamente indispensável para a descoberta da verdade material a sua presença desde início da audiência.

Para tanto, no despacho que designa a data da audiência, é igualmente designada data para a realização da audiência em caso de adiamento nos termos do artigo 333.º, n.º 1, ou para audição do arguido a requerimento do seu advogado ou defensor nomeado ao abrigo do artigo 333.º, n.º 3.

Com efeito, se o tribunal considerar que a presença do arguido desde o início da audiência não é absolutamente indispensável para a descoberta da verdade material, ou se a falta do arguido tiver como causa os impedimentos enunciados nos n.os 2 a 4 do artigo 117.º, a audiência não é adiada, sendo inquiridas ou ouvidas as pessoas presentes pela ordem referida nas alíneas b) e c) do artigo 341.º, sem prejuízo da alteração que seja necessária efectuar no rol apresentado e as suas declarações documentadas, aplicando-se sempre que necessário o disposto no n.º 6 do artigo 117.º

Nestes casos, o arguido mantém o direito a prestar declarações até ao encerramento da audiência e se esta ocorrer na primeira data marcada, o advogado constituído ou o defensor pode requerer que seja ouvido na segunda data designada pelo juiz nos termos do n.º 2 do artigo 312.º . Assim, nada impede (e até se intui) que a audiência se inicie sem a presença do arguido, “reservando-se a segunda data para a eventualidade de se tornar possível a comparência do arguido”.

Com efeito :
“I - O julgamento na ausência do arguido notificado para a audiência só é possível se aquele para tal der o seu consentimento, como dispõe o n.º 4 do art. 333.° do CPP ao estabelecer que o disposto nos números anteriores não prejudica que a audiência tenha lugar na ausência do arguido com o seu consentimento, nos termos do art. 334.º, n.º 2 do mesmo diploma. Ou seja, o arguido pode requerer ou consentir que a audiência tenha lugar na sua ausência sempre que se encontrar praticamente impossibilitado de a ela comparecer, nomeadamente por idade, doença grave ou residência no estrangeiro.

II - Inexistindo consentimento do arguido, é obrigatória a sua presença, sem prejuízo do disposto no art. 333.°, n.ºs 1 e 2 do CPP.

III - As normas constantes dos n.ºs 1 e 2 do art. 333.° são de interesse e ordem pública, prendendo-se com o cerne das garantias do processo penal, e, por conseguinte, com a validade e eficácia do sistema legal processual penal.

IV - Como todo o verdadeiro direito público, tem o direito processual penal na sua base o problema fulcral das relações entre o Estado e a pessoa individual e da posição desta na comunidade (Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, Lições coligidas por Maria João Antunes, 1988-1989, pág. 33). A via para um correcto equacionamento de evolução do processo penal nos quadros do Estado de Direito material deve partir do reconhecimento e aceitação da tensão dialéctica inarredável entre a tutela dos interesses do arguido e a tutela dos interesses da sociedade representados pelo poder democrático do Estado (idem, pág. 50).

V - Por isso, não exclui a audição do arguido, nem a tomada das medidas necessárias e legalmente admissíveis para obter a sua comparência. Daí que o n.º 6 do mesmo art. 333.° explicite que é correspondentemente aplicável o disposto nos arts. 116.°, n.ºs 1 e 2, e 254.°.
(…)
VII - Por outro lado, o encerramento da discussão da causa apenas ocorre depois das últimas declarações do arguido, pois que, como resulta do art. 361.°, n.ºs 1 e 2, do CPP: «Findas as alegações, o presidente pergunta ao arguido se tem mais alguma coisa a alegar em sua defesa, ouvindo-o em tudo o que declarar a bem dela. Em seguida, o presidente declara encerrada a discussão (...).»

VIII - Na verdade, o arguido é sujeito processual de direitos e de deveres, e é na audiência, mediante o exercício pleno do contraditório, que o arguido pode – e deve – defender-se, confrontado com as provas, já que a discussão da causa vai posteriormente implicar uma decisão, de harmonia com elas e com referência ao objecto do processo, decisão essa em que emite um juízo decisório sobre a conduta jurídico-penal imputada ao arguido, com reflexos notórios na sua vida pessoal e comunitária, pois que, sendo este absolvido, fica desvinculado da imputação havida, e restaurado à normalidade anterior ao juízo incriminatório, mas se for condenado, fica sujeito às consequências jurídicas do crime.

IX - Por outro lado, há que considerar a relevância dos princípios da oralidade e imediação na audiência de julgamento. Só estes princípios permitem o indispensável contacto vivo e imediato com o arguido, a recolha da impressão deixada pela sua personalidade; só eles permitem, por outro lado, avaliar o mais concretamente possível da credibilidade das declarações prestadas pelos participantes processuais. E, por último, só eles permitem uma plena audiência destes mesmos participantes, possibilitando-lhes da melhor forma que tomem posição perante o material de facto recolhido e comparticipem na declaração do direito do caso – Figueiredo Dias, ibidem, pág. 160.” (cfr. Acórdão do STJ de 24/10/2007, in www.dgsi.pt).

Na situação destes autos, o arguido faltou na primeira data designada, tendo o Tribunal considerado injustificada a falta e considerado que não era imprescindível a presença do arguido na audiência desde o início e determinou o prosseguimento da audiência, com a inquirição de todas as testemunhas indicadas.

Requerida a audição do arguido na segunda data designada para realização da audiência, foi a mesma deferida.

Porém, atempadamente, veio o arguido informar da impossibilidade de estar presente em tal data e requerer a sua audição em data posterior.

Notificado da data designada para leitura da sentença veio o arguido, atempadamente, informar da impossibilidade de estar presente em tal data e reiterar a sua intenção de prestar declarações.

Ora, é certo que “segunda data” designada pelo juiz para a realização da audiência constitui o limite para a audição do arguido que até aí não tenha comparecido, ainda que justificadamente, e este é mesmo um termo intransponível, sob pena de se manter um obstáculo à tramitação e de se frustrar o propósito de agilizar e acelerar a justiça penal, desde que garantido o núcleo essencial dos direitos e instrumentos de defesa do arguido.

E, atento o informado e alegado pelo arguido, tendo em vista garantir o núcleo essencial dos direitos e instrumentos de defesa do arguido, o que se impunha era o deferimento da pretensão do arguido com a transferência da data designada como 2ªdata para dia posterior a 18 de junho de 2018 e num lapso temporal que evitasse que toda a prova já examinada e produzida na audiência perdesse validade e impusesse a nova deslocação de todas as pessoas já inquiridas e eternizasse a expectativa de concretização da audiência de julgamento.

Porém, o Tribunal não procedeu assim, omitindo a realização das diligências que em concreto se revelavam necessárias e viáveis para esse efeito.

E deste modo, a circunstância de a audiência de julgamento se iniciar e se concluir sem a presença do arguido, nas circunstâncias supra descritas, ainda que a falta no dia 4 de junho de 2018 tenha sido julgada injustificada e a falta no dia 18 de Junho de 2018 tenha sido julgada justificada, tal significa uma compressão ou limitação desproporcionada do núcleo essencial dos direitos de audição, de defesa e de contraditório, garantidos no artigo 32º, n.ºs 1, 2, 5, e 6 da Constituição e no artigo 11º, n.º 1, da Declaração Universal dos Direitos do Homem.

Assim, com o despacho proferido em 13 de junho de 2018 e atos subsequentes foi claramente violado o direito de defesa do arguido, consagrado nos arts.60º, 61º, nº1, als. a) e b) e 333º, nº3, do, do C.P.P. e 32º da C.R.P., verificando-se a nulidade insanável prevista no art.119º, al. c), do C.P.P..

A consequência é a prevista no art.122º, nº1, do C.P.P. ou seja, a invalidade do ato praticado bem como dos que dele dependerem.

Assim sendo, e face ao disposto no art.122º do C.P.P., impõe-se declarar a nulidade do despacho proferido em 13 de junho de 2018 e dos actos subsequentes, que passam a considerar-se inválidos.

Face ao ora determinado, fica prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas no recurso.

DECISÃO

Pelo exposto e com os fundamentos supra referidos, acordam os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora em:

- julgar verificada a nulidade do despacho proferido em 13 de junho de 2018 e dos atos subsequentes, determinando a remessa dos autos à 1.ª instância com vista à respetiva sanação, seguindo-se, em conformidade, os ulteriores termos do processo, culminando com a prolação de nova sentença.

- Não conhecer, por prejudicado, das demais questões suscitadas no recurso.

- Sem tributação.

Elaborado e revisto pela primeira signatária

Évora, 22 de novembro de 2018

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Laura Goulart Maurício

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Maria Filomena Soares