Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
2720/16.9T8ENT.E1
Relator: CRISTINA DÁ MESQUITA
Descritores: ACÇÃO EXECUTIVA
SANÇÃO PECUNIÁRIA COMPULSÓRIA
OPERAÇÃO AUTOMÁTICA
Data do Acordão: 01/17/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário:
1 - Executando-se uma obrigação pecuniária, o valor devido por força do disposto no preceituado no art. 829.º-A, n.º 4, do Código Civil não tem de ser requerido pelo exequente no respetivo requerimento executivo para ser ali considerada, devendo a sua liquidação ser feita a final pelo agente de execução.
2 - Resulta do art. 815.º, do CPC que o exequente que adquira bens pela execução só é dispensado de depositar «a parte do preço que não se mostre necessária para pagar aos credores graduados antes dele» conquanto aquela parte do preço não exceda o que tem a receber.
3 - A sanção pecuniária compulsória prevista no art. 829-A, n.º 4, do CC traduz-se num adicional de juros, calculados à taxa de 5%, destinada em partes iguais ao Estado e ao credor, juros que são devidos automaticamente desde o trânsito em julgado da sentença condenatória, isto é, juros devidos por força da lei. E, como tal, deverão ser pagos antes do capital devido ao exequente/adquirente dos bens, como resulta do art. 875.º, do Código Civil.
4 - Estamos perante um crédito que, tal como aqueles que estão previstos no art. 815.º, do CPC, deve ser pago antes do crédito do exequente. Logo, a semelhança das situações deve determinar, ao abrigo do disposto no art. 10.º, do Código Civil, a aplicação a analógica do art. 815.º, do CPC ao caso em que ao Estado são devidos juros por força do disposto no art. 829.º-A, n.º 4, do CC.
5 - Uma vez que o adquirente do bem é o próprio exequente deverá este proceder ao depósito da parte do preço que se mostre necessária para pagar, para além das custas do processo e demais despesas, o valor referente aos juros que são devidos ao Estado por força do disposto no art. 829.º-A, n.º 4, do Código Civil.
(Sumário elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Integral:

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Évora:


I. RELATÓRIO

I.1.

BB, Unipessoal, Lda. interpôs recurso do despacho proferido pelo juízo de execução do Entroncamento, Juiz 1, do Tribunal Judicial de Santarém, no âmbito do processo executivo movido pela recorrente contra CC, Lda., o qual indeferiu a reclamação apresentada pela recorrente contra a liquidação de juros compulsórios realizada pelo sr. agente de execução, mantendo a mesma.

O despacho sob recurso tem o seguinte teor:

«Com os fundamentos constantes da promoção que antecede indefere-se a reclamação apresentada mantendo-se a liquidação de juros compulsórios efetuada nos autos

A promoção referida no despacho sob recurso tem o seguinte teor:

«Vem o Exequente questionar a oportunidade da liquidação dos juros compulsórios devidos, por entender que tais juros não são devidos – e caso sejam devidos não devem ser pagos pelo Exequente mas sim pelo Executado.

Conforme resulta do disposto no artigo 829.º-A, n.º 4 do Código Civil «4- Quando for estipulado ou judicialmente determinado qualquer pagamento em dinheiro corrente, são automaticamente devidos juros à taxa de 5% ao ano desde a data em que a sentença de condenação transitar em julgado, os quais acrescerão aos juros de mora, se estes forem também devidos…».

Tais juros destinam-se em partes iguais ao credor e ao Estado (sendo entregue a este último através de DUC).

Compete ao agente de execução /cf. o artigo 716.º n.º 3 do C.P.Civil/ calcular mensalmente e no momento da cessação a aplicação o valor dos juros compulsórios (e das custas que devam ser antecipadamente asseguradas).

Por outro lado, decorre do disposto no artigo 785.º, n.º 1 do C. Civil que «1. Quando, além do capital, o devedor estiver obrigado a pagar despesas ou juros, ou a indemnizar o credor em consequência da mora, a prestação que não chegue para cobrir tudo o que é devido presume-se feita por conta, sucessivamente das despesas, da indemnização, dos juros e do capital.»

Das conjugação destas normas legais decorre que só após ter sido assegurado o pagamento das custas e demais despesas processuais e da quota parte dos juros compulsórios, designadamente, na parte em que são devidos ao Estado, estão na nossa perspetiva reunidas as condições para o Sr. Agente de Execução liquidar o capital ao Exequente.

Assim, somos de parecer que a liquidação dos juros foi corretamente realizada pelo Sr. Agente de Execução e o seu pagamento deverá ter lugar nos termos determinados pelo artigo 785.º, n.º 1 do Código Civil, pelo produto do bem penhorado – não podendo o adquirente do bem ser dispensado do depósito do valor de tais juros, a saber, na parte que é devida ao Estado.»

II.2

A recorrente culmina as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões:

«a) A decisão em recurso obriga a Exequente - Apelante ao pagamento de juros compulsórios no montante de € 17.535,37, o que representa um absurdo;

b) Com efeito, os juros compulsórios foram liquidados na nota de custas e honorários do Sr. Agente de Execução ao abrigo do regime previsto no art. 829°A, n.ºs 3 e 4 do Código Civil;

c) Contudo, tais juros são devidos apenas e só pelo devedor executado, não pelo exequente ou pelo licitante do bem penhorado e vendido;

d) Como já foi decidido em várias ocasiões, os juros compulsórios destinam-se a pressionar o devedor ao cumprimento da obrigação e da decisão judicial que a reconhece e impõe o seu pagamento: Decorre do disposto nos n.ºs 1 e 4 do art. 829°-A do Código Civil que compete ao devedor o pagamento dos juros compulsórios, estabelecendo o art. 716, n°. 3 do NCPC que cabe ao agente de execução proceder à liquidação da quantia devida a título de juros compulsórios e notificar o executado da dita liquidação - Ac. do Tribunal da Relação de Guimarães de 11 de Maio de 2017, in dgsi.pt, Proc. n° 90/14.9TBVFL-E.G;

e) Assim também decidiram o Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 9 de Maio de 2002, in dgsi.pt, Proc. 02B666. o Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 15 de Março de 2012, in dgsi.pt, Proc. 554/07, o Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 23 de Janeiro de 2003, in dgsi.pt, Proc. n.º 02B4173 e o Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 12 de Abril de 2012, in dgsi.pt, Proc. n° 176/1998.Ll.S1;

f) Os juros compulsórios não fazem parte da dívida exequenda e teriam de ter sido incorporados na quantia em execução para que pudessem acrescer na conta final, mas a exequente e aqui Apelante não os incorporou na quantia exequenda, nem o Sr. Agente de Execução o fez.

g) E mesmo que o tivesse feito, isso não lhe seria permitido uma vez que a imposição de juros compensatórios não tem lugar em processo executivo: cfr. ac. do Tribunal da Relação de Lisboa de 15-05-2016 (http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf!¬/EB35A7049FF2B22280257FDAo0412B33) onde se decide justamente neste sentido;

h) Em qualquer caso, repete-se e sublinha-se, é um absurdo que a aqui Apelante, que é credora exequente, seja obrigada a pagar uma verba a título de juros compulsórios que é devida apenas e somente pelo devedor e neste caso executado;

i) Pelo que a decisão em recurso interpretou e aplicou erradamente o disposto no art. 829° A, n° 3 e 4 do Código Civil, devendo por isso ser revogada e substituída por outra que ordene a remoção da rúbrica "juros compulsórios" da nota de honorários e despesas do Sr. Agente de Execução, assim se praticando a mais nobre e elevada

JUSTIÇA !!!»

II.3.

O Ministério Público apresentou resposta ao recurso, pugnando pela inadmissibilidade do recurso e pela improcedência do recurso, em caso da sua admissão.

Culmina a resposta com as seguintes conclusões:

«1.º

O artigo 723.°, n.º 1, alínea c) do novo Código de Processo Civil estabelece a irrecorribilidade das decisões judiciais que incidem sobre reclamações dos atos do Agente de Execução.

2.º

Pelo que, recaindo sobre uma decisão judicial que se pronunciou sobre a reclamação da «nota de liquidação, honorários e despesas» do Agente de Execução, tal decisão não é recorrível, devendo o recurso apresentado pela Exequente ser rejeitado.

Se assim não se entender,

3.º

Sendo o título executivo dado à execução uma sentença judicial condenatória transitada em julgado mediante a qual o Réu/Executado foi condenado a pagar à Autora/Exequente uma quantia em dinheiro, são automaticamente devidos juros compulsórios a liquidar nos termos do artigo 829.0-A, n.º 4 do Civil e artigo 716.°, n.º 3 do Código de Processo Civil.

4.º

Trata-se de juros compulsórios legais, que têm a finalidade de moralidade e de eficácia, pois com ela se reforça a soberania dos tribunais, o respeito pelas suas decisões e o prestígio da justiça, e que, assim, são devidos automaticamente, não carecendo de ser determinados por decisão judicial nem requeridos no requerimento executivo.

5.º

Pelo que, a sua inserção na nota final de liquidação não só é regular como resulta do cumprimento de normas legais que regulam a sua liquidação.

6.º

Os juros compulsórios embora não gozem do benefício da precipuidade previsto no artigo 541.º do C.P.Civil, estão relacionados com a dívida exequenda e o credor tem direito ao seu reembolso por via, não de contrato, mas antes da lei, ao pagamento desses juros aplica-se diretamente o disposto no art. 785.º n.º 1 do CCiv. Com efeito, os juros previstos (. . .) são juros legais que vence o crédito exequendo.

7.º

O seu pagamento é da responsabilidade do executado, sendo que, tendo na execução sido adjudicado um imóvel ao exequente, este não pode ficar dispensado do depósito do preço na estrita medida em que seja necessário ao pagamento das quantias que na execução devem ser liquidadas antes do seu crédito - a saber nos termos do artigo 785.º do C.Civil (custas e juros).

8.º

Tal depósito do preço não pode confundir-se com a exigência do pagamento ao «Exequente» dos juros compulsórios na parte devida ao Estado.

9.º

Trata-se sim de dar pagamento pelo valor da venda às quantias que são devidas antes do capital a que a Exequente tem direito - aliás, em conformidade com o disposto no artigo 815.ºdo Código de Processo Civil.

10.º

Pelo exposto não merece qualquer censura a decisão da Mma Juiz a quo, nem foi violada qualquer norma legal, a saber, o preceituado no artigo 829.° -A n.º 4 do Código Civil.

Termos em que se conclui pela manutenção da decisão recorrida, por a mesma nenhum agravo ter feito à Lei, devendo assim o presente recurso ser julgado improcedente, como é de inteira e acostumada

JUSTIÇA!»

I.4.

O recurso foi admitido pelo tribunal a quo.

Corridos os vistos, nos termos do art. 657.º, n.º 2, do Código de Processo Civil (CPC), cumpre decidir.

II. FUNDAMENTAÇÃO

II.1.

As conclusões das alegações de recurso (cfr. supra I.2) delimitam o respetivo objeto de acordo com o disposto nas disposições conjugadas dos arts. 635.º, n.º 4 e 639.º, nº 1, ambos do CPC, sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (art. 608.º, n.º 2 e art. 663.º, n.º 2, ambos do CPC), não havendo lugar à apreciação de questões cuja análise se torne irrelevante por força do tratamento empreendido no acórdão (arts. 608.º, n.º 2, e 663.º, n.º 2, do CPC).

II.2.

As questões que cumpre decidir são as seguintes:

1 – Saber se os juros compulsórios teriam de ter sido incorporados na quantia exequenda para que pudessem ser liquidados e acrescer na conta final.

2 – Se pode ser exigido à exequente que adquiriu o bem penhorado na execução o depósito do valor necessário ao pagamento daqueles juros compulsórios.

II.3.

Resulta dos autos que:

1 – A exequente/recorrente BB, Unipessoal, Lda. instaurou execução contra a sociedade CC, Lda., apresentando como título executivo uma sentença datada de 3 de fevereiro de 2010, transitada em julgado, que condenou a segunda a pagar à primeira a quantia de 99.760,00€.

2 – No âmbito da execução foi penhorado o prédio rústico denominado “Quinta …”, sito em Marinhais, descrito na Conservatória do registo Predial de Salvaterra de Magos sob o n.º …, propriedade da executada.

3 – A exequente/recorrente adquiriu no âmbito da execução o imóvel penhorado pelo preço de 122.500,00€.

4 – O sr. agente de execução emitiu guia, que enviou à exequente/recorrente, para pagamento da quantia de 17.535,37 € referente a juros compulsórios devidos aos cofres do Estado.

A primeira questão suscitada pelo recorrente prende-se com o facto de os juros compulsórios não terem sido fixados pela sentença condenatória nem terem sido pedidos no requerimento executivo, pelo que, no seu entendimento, não podiam ter sido liquidados pelo agente de execução e de acrescer na conta final.

Desde já se adianta que a recorrente não tem razão.

Dispõe o art. 829.º-A, n.º 4 que: «Quando for estipulado ou judicialmente determinado qualquer pagamento em dinheiro corrente, são automaticamente devidos juros à taxa de 5% ao ano, desde a data em que a sentença de condenação transitar em julgado, os quais acrescerão aos juros de mora, se estes forem também devidos, ou à indemnização a que houver lugar.»

No normativo supra citado está consagrada uma sanção pecuniária compulsória legal para as obrigações pecuniárias – assim, João Calvão da Silva, Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória, Coimbra, 1997, p. 452.

«[…] o legislador, em vez de confiar à soberania do tribunal, nos termos já expostos, a ordenação da sanção pecuniária compulsória, disciplina-a ele próprio, fixando o seu montante, ponto de partida (trânsito em julgado da sentença) e funcionamento automático. Por isso, porque prevista e disciplinada por lei, poderá qualificar-se como sanção pecuniária compulsória legal, enquanto que aquela que é ordenada e fixada pelo juiz poderá chamar-se de sanção pecuniária compulsória judicial. O espírito de ambas, porém, é o mesmo: levar o devedor a encarar as coisas a sério e a não desprezar o interesse do credor e o tribunal.» - João Calvão da Silva, ob. cit., p. 456.

Assim, havendo sentença de condenação no pagamento de determinada soma de dinheiro, são automaticamente devidos juros à taxa de 5% ao ano desde o trânsito em julgado da sentença condenatória, os quais se destinam, em partes iguais, ao credor e ao Estado.

Daí que aquela sanção não careça de ser fixada na sentença condenatória (ao contrário da sanção compulsória prevista no art. 829.º-A, n.º 1, do CC) nem de ser pedida no requerimento executivo – neste sentido, acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 13.07.2017, processo n.º 57/12.1TTLRA-A.C1 [1].

O mesmo entendimento é defendido por Lebre de Freitas, Ação Executiva à Luz do Código de Processo Civil de 2013, 7.ª edição, GESTLegal, p. 117: «A liquidação pelo agente de execução tem também lugar no caso da sanção pecuniária compulsória: executando-se obrigação pecuniária, a liquidação não depende de requerimento do exequente, devendo ser feita a final (art. 716.º-3).»

Por sua vez, o art. 716.º, n.º 3, do CPC dispõe que «Além do disposto no número anterior, o agente de execução liquida, ainda, mensalmente e no momento da cessação da aplicação da sanção pecuniária compulsória, as importâncias devidas em consequência da imposição de sanção pecuniária compulsória, notificando o executado da liquidação.»

Por conseguinte, executando-se uma obrigação pecuniária, o valor devido por força do disposto no preceituado no art. 829.º-A, n.º 4, do Código Civil não tem de ser requerido pelo exequente no respetivo requerimento executivo para ser ali considerada, devendo a sua liquidação ser feita a final pelo agente de execução.

Assim, improcede este segmento do recurso da apelante.

Quanto à questão de saber se pode ser exigido à exequente que adquiriu o bem penhorado na execução o depósito do valor necessário ao pagamento dos juros devidos ao Estado a título da sanção pecuniária compulsória prevista no art. 829.º-A, n.º 4, do CC:

Na ação executiva para pagamento de quantia certa — como é o caso — o exequente pretende obter o cumprimento de uma obrigação pecuniária à custa do património do devedor/executado (art. 817.º, do CC). Para tal desiderato, são apreendidos pelo tribunal os bens deste que foram considerados suficientes para cobrir a importância da quantia exequenda, das custas e dos créditos eventualmente reclamados e graduados a fim de ter lugar a venda desses bens para com o preço obtido se proceder ao pagamento.

A lei permite, todavia, ao exequente que adquira os bens penhorados não depositar a totalidade do preço pelo qual adquiriu aqueles bens mas tão só aquela parte do preço que seja necessária para pagar a credores graduados antes dele (art. 815.º, do CPC).

A justificação da dispensa do depósito do preço pelo exequente que adquire os bens penhorados é a seguinte: embora aquele deva à execução o preço pelo qual adquiriu os bens, por outro lado, é também credor da execução por determinada quantia, tendo, por isso, o direito a receber do produto da venda do bem penhorado. Assim, em vez de depositar a totalidade do preço para depois o levantar na totalidade, ou em parte, faz-se o encontro das duas verbas — a do seu débito e a do seu crédito — permitindo a lei que ele só deposite aquilo que excede o montante que tem direito a receber.

Resulta do normativo supra referido (art. 815.º, do CPC) que o exequente que adquira bens pela execução — como sucede no caso concreto — só é dispensado de depositar «a parte do preço que não se mostre necessária para pagar aos credores graduados antes dele» conquanto aquela parte do preço não exceda o que tem a receber.

A sanção pecuniária compulsória prevista no art. 829-A, n.º 4, do CC traduz-se num adicional de juros, calculados à taxa de 5%, destinada em partes iguais ao Estado e ao credor, juros que são devidos automaticamente desde o trânsito em julgado da sentença condenatória, isto é, juros devidos por força da lei. E, como tal, deverão ser pagos antes do capital devido ao exequente/adquirente dos bens, como resulta do art. 875.º, do Código Civil.

De acordo com o disposto no art. 875.º, do Código Civil, quando, além do capital, o devedor estiver obrigado a pagar despesas, juros ou indemnização, a imputação do capital é feita em último lugar, salvo se o credor concordar em que se faça antes (n.º 2).

Os juros a que se refere o normativo em causa são os contratuais ou legais que vence o crédito – Pires e Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, volume II, 3.ª edição revista e atualizada, Coimbra Editora, pp. 36-37.

Resulta assim do exposto que o Estado é detentor de um crédito que deve ser pago pelo produto da venda do bem penhorado e antes do pagamento do capital devido ao credor/exequente, nos termos do disposto no art. 875.º, do CC.

Uma vez que o adquirente do bem é o próprio exequente, deverá depositar a parte do preço necessária para satisfazer o crédito do Estado que está em causa.

Não se olvida que a letra do normativo em causa refere-se apenas aos créditos reclamados na execução e graduados, não se referindo, portanto, ao crédito do Estado adquirido por força do disposto no art. 829-A, n.º 4, do CC, o qual não tem de ser reclamado nos autos de execução, uma vez que é devido automaticamente com o trânsito em julgado da sentença condenatória que constitui o título executivo.

Contudo, estamos perante um crédito que, tal como aqueles que estão previsto no art. 815.º, do CPC, deve ser pago antes do crédito do exequente. Logo, a semelhança das situações deve determinar, ao abrigo do disposto no art. 10.º, do Código Civil, a aplicação a analógica do art. 815.º, do CPC ao caso em que ao Estado são devidos juros por força do disposto no art. 829.º-A, n.º 4, do CC. E, por conseguinte, o exequente deverá proceder ao depósito da parte do preço que se mostre necessária para pagar, para além das custas do processo e demais despesas, o valor referente aos juros que são devidos ao Estado por força do disposto no art. 829.º-A, n.º 4, do Código Civil.

Em face do exposto, improcede, também, este segmento do recurso.

III. DECISÃO
Em face do exposto, decide-se julgar improcedente o recurso, mantendo-se o despacho recorrido.
Custas pela recorrente.
Notifique.

Évora, 17 de janeiro de 2019,
Cristina Dá Mesquita
Silva Rato
Mata Ribeiro)

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[1] Publicado em www.wgsi.pt.