Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
338/13.7GEALR.E2
Relator: FELISBERTO PROENÇA DA COSTA
Descritores: COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
PENA UNITÁRIA
Data do Acordão: 06/16/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: A al. c) do nº 1 do artigo 432º do Código de Processo Penal deve ser interpretada no sentido de que é suficiente para fixar a competência do STJ para conhecer de todas as penas de cujas medidas se recorre que a pena única seja superior a 5 anos de prisão.
Decisão Texto Integral:


Recurso n.º 338/13.7GEALR.

Acordam, em Conferência, os Juízes que constituem a Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora.
Nos autos de Processo Comum com intervenção de Tribunal Colectivo, com o n.º 338/13.7 GEALR, a correrem termos pelo Tribunal Judicial da Comarca de A, o Ministério Público deduziu acusação contra os arguidos:
AMCC, solteiro, servente de pedreiro, filho de (…) Leiria;
IESG, solteiro, cortador de lenha, filho de (…) Leiria;
TIOBN, solteiro, mecânico, filho de (…) Leiria.
Imputando-lhes a prática, em co-autoria material, na forma consumada e em concurso real, de:
- Um crime de roubo agravado, p. e p. pelo art.º 210.º, n.ºs 1 e 2, al. b), com referência ao art.º 204.º, n.º 2, al. f), e 26.º do Cód. Pen;
-Um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art.º 86.º, n.º 1, al. c), com referência ao art.º 2.º, n.º 1, al. v) e art.º 3.º, n.º 2, al. l), do Regime Jurídico das Armas e Munições.

O arguido IG apresentou contestação escrita, na qual ofereceu o merecimento dos autos e arrolou testemunhas – cfr. fls. 468 dos autos.
O arguido TN apresentou rol de testemunhas - cfr. fls. 453 dos autos.

Procedeu-se à realização de julgamento com observância de todas as formalidades legais, vindo-se, no seu seguimento, a prolatar Acórdão, onde se Decidiu:
1. – Condenar o arguido AMCC pela prática, como co-autor material, de um crime roubo na forma agravada, p. e p. pelo art.º 210.º, n.º 2, al. b), com referência ao art.º 204.º, n.º 2, al. f) do Cód. Pen., na pena de cinco (5) anos e seis (6) meses de prisão.
2. – Condenar o arguido AMCC pela prática, como co-autor material, de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art.º 86.º, n.º 1, al. c), com referência ao art.º 2.º, n.º 1, al. v) e art.º 3.º, n.º 2, al. l), da Lei 5/06, de 23.02, na redacção dada pela Lei 12/11, de 27.04, na pena de um (1) ano e nove (9) meses de prisão.
3. – Em cúmulo jurídico, condenar o arguido AMCC na pena única de seis (6) anos e três (3) meses de prisão.

4. – Condenar o arguido IESG pela prática, como co-autor material, de um crime roubo na forma agravada, p. e p. pelo art.º 210.º, n.º 2, al. b), com referência ao art.º 204.º, n.º 2, al. f) do Cód. Pen., na pena de quatro (4) anos e nove (9) meses de prisão.
5. – Condenar o arguido IESG pela prática, como co-autor material, de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art.º 86.º, n.º 1, al. c), com referência ao art.º 2.º, n.º 1, al. v) e art.º 3.º, n.º 2, al. l), da Lei 5/06, de 23.02, na redacção dada pela Lei 12/11, de 27.04, na pena de um (1) ano e seis (6) meses de prisão.
6. – Em cúmulo jurídico, condenar o arguido IESG na pena única de cinco (5) anos e seis (6) meses de prisão.

7. – Condenar o arguido TIOBN pela prática, como co-autor material, de um crime roubo na forma agravada, p. e p. pelo art.º 210.º, n.º 2, al. b), com referência ao art.º 204.º, n.º 2, al. f) do Cód. Pen., na pena de quatro (4) anos e nove (9) meses de prisão.
8. – Condenar o arguido TIOBN pela prática, como co-autor material, de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art.º 86.º, n.º 1, al. c), com referência ao art.º 2.º, n.º 1, al. v) e art.º 3.º, n.º 2, al. l), da Lei 5/06, de 23.02, na redacção dada pela Lei 12/11, de 27.04, na pena de um (1) ano e seis (6) meses de prisão.
9. – Em cúmulo jurídico, condenar o arguido TIOBN na pena única de cinco (5) anos e seis (6) meses de prisão.

10. - Declarar perdidos a favor do Estado: a arma caçadeira de canos serrados, com 51 centímetros de comprimento e com o n.º de série 7560, dois pares de luvas, um gorro de cor cinza, tipo “passa-montanhas” e uma gola de pescoço em lã de cor preta.

11. - Após trânsito:
a) Ordenar a entrega da viatura apreendida da marca Opel, modelo Corsa, de matrícula 00-00-XX a DFMV, devendo o mesmo fazer prova nos autos de que tem seguro de responsabilidade civil válido e inspecção periódica ao veículo.
b) Ordenar a entrega da quantia de 30,00 € a IAMM e a restante quantia monetária apreendida ao legal representante da empresa que explora o posto de abastecimento “T”, sito em BR.
c) Ordenar a remessa de boletins à D.G.S.J./S.I.C – art.º 5.º, n.º 1, al. a) da Lei n.º 57/98, de 18 de Agosto).
d) Ordenar o cumprimento do disposto no art.º 8.º, n.ºs 1 e 2 da Lei 5/08, de 12.02, procedendo-se à recolha de amostras para a Base de Dados de ADN relativamente a todos os arguidos.
e) Ordenar a remessa de certidão do presente acórdão ao processo n.º 21/12.0 GACCH, do Tribunal de B.
f) Ordenar que se abra vista ao Ministério Público a fim de se dar destino aos restantes bens apreendidos nestes autos.

Inconformados com o assim decidido recorreram os arguidos IESG e TIOBN.
Por Aresto deste Tribunal, datado de 14 de Outubro de 2014, veio Decidir-se:
1- Conceder provimento ao recurso trazido pelo arguido/recorrente TIOBN e, em consequência, revogar o Acórdão recorrido o qual deverá ser substituído por outro que supra a nulidade apontada e venha a decidir em conformidade;
2- Conceder parcial provimento ao recurso trazido pelo arguido/recorrente IESG, alterando-se a matéria de facto nos termos retro definidos e bem assim revogar o Acórdão recorrido, o qual deverá ser substituído por outro que supra a nulidade apontada e venha a decidir, em conformidade.
No mais, vai confirmado o Acórdão sindicado, nos termos supra mencionados.

Neste seguimento, veio a ser proferido novo Acórdão, onde se Decidiu:
1. Condenar o arguido AMCC pela prática, como co-autor material, de um crime roubo na forma agravada, p. e p. pelo art.º 210.º, n.º 2, al. b), com referência ao art.º 204.º, n.º 2, al. f) do Código Penal, na pena de cinco (5) anos e seis (6) meses de prisão.
2. Condenar o arguido AMCC pela prática, como co-autor material, de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art.º 86.º, n.º 1, al. c), com referência ao art.º 2.º, n.º 1, al. v) e art.º 3.º, n.º 2, al. l), da Lei 5/06, de 23.02, na redacção dada pela Lei 12/11, de 27.04, na pena de um (1) ano e nove (9) meses de prisão.
3. Condenar, em cúmulo jurídico, o arguido AMCC na pena única de seis (6) anos e três (3) meses de prisão.
4. Condenar o arguido IESG pela prática, como co-autor material, de um crime roubo na forma agravada, p. e p. pelo art.º 210.º, n.º 2, al. b), com referência ao art.º 204.º, n.º 2, al. f) do Código Penal, na pena de quatro (4) anos e nove (9) meses de prisão.
5. Condenar o arguido IESG pela prática, como co-autor material, de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art.º 86.º, n.º 1, al. c), com referência ao art.º 2.º, n.º 1, al. v) e art.º 3.º, n.º 2, al. l), da Lei 5/06, de 23.02, na redacção dada pela Lei 12/11, de 27.04, na pena de um (1) ano e seis (6) meses de prisão.
6. Condenar, em cúmulo jurídico, o arguido IESG na pena única de cinco (5) anos e seis (6) meses de prisão.
7. Condenar o arguido TIOBN pela prática, como co-autor material, de um crime roubo na forma agravada, p. e p. pelo art.º 210.º, n.º 2, al. b), com referência ao art.º 204.º, n.º 2, al. f) do Código Penal, na pena de quatro (4) anos e nove (9) meses de prisão.
8. Condenar o arguido TIOBN pela prática, como co-autor material, de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art.º 86.º, n.º 1, al. c), com referência ao art.º 2.º, n.º 1, al. v) e art.º 3.º, n.º 2, al. l), da Lei 5/06, de 23.02, na redacção dada pela Lei 12/11, de 27.04, na pena de um (1) ano e seis (6) meses de prisão.
9. Condenar, em cúmulo jurídico, o arguido TIOBN na pena única de cinco (5) anos e seis (6) meses de prisão.
10. Declarar perdidos a favor do Estado: a arma caçadeira de canos serrados, com 51 centímetros de comprimento e com o n.º de série 7560, dois pares de luvas, um gorro de cor cinza, tipo “passa-montanhas” e uma gola de pescoço em lã de cor preta.
Após trânsito:
a) Ordenar a entrega da viatura apreendida da marca Opel, modelo Corsa, de matrícula 00-00-XX a DFMV, devendo o mesmo fazer prova nos autos de que tem seguro de responsabilidade civil válido e inspecção periódica ao veículo.
b) Ordenar a entrega da quantia de 30,00 € a IAMM e a restante quantia monetária apreendida ao legal representante da empresa que explora o posto de abastecimento “T”, sito em BR.
c) Ordenar a remessa de boletins à D.G.S.J./S.I.C – art.º 5.º, n.º 1, al. a) da Lei n.º 57/98, de 18 de Agosto).
d) Ordenar o cumprimento do disposto no art.º 8.º, n.ºs 1 e 2 da Lei 5/08, de 12.02, procedendo-se à recolha de amostras para a Base de Dados de ADN relativamente a todos os arguidos.
e) Ordenar a remessa de certidão do presente acórdão ao processo n.º 21/12.0 GACCH, do Tribunal de B.
f) Ordenar que se abra vista ao Ministério Público a fim de se dar destino aos restantes bens apreendidos nestes autos.

Uma vez mais inconformado traz o arguido IESG o presente recurso, onde formula as seguintes conclusões:
1. O arguido, ora recorrente, tendo sido julgado em Processo Comum com intervenção de Tribunal Colectivo, veio a ser condenado por Douto Acórdão, como co-autor material em concurso real, pela prática de um crime de roubo na forma agravada, p. e p. pelo art. 210º, n.º 2, al. b) com referência ao art. 204, n.º 2, al. f) do Código Penal, na pena de quatro (4) anos e nove (9) meses de prisão e um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art. 86º, n.º 1, al. c) com referência ao art. 2º, n.º 1, al. v) e art. 3º, n.º 2, al. l), da Lei 5/06 de 23/02, na redacção dada pela Lei 12/11 de 27/04, na pena de um (1) ano e seis (6) meses de prisão, sendo em cúmulo jurídico, condenado na pena única de cinco (5) anos e seis (6) meses de prisão.
2. Com tal decisão condenatória, não se conforma o arguido uma vez que não pode concordar por razões de justeza, com o critério e medida da pena que lhe foi aplicada, tendo em consideração o seguinte:
3. Desde logo, atendendo às circunstâncias em que ocorreram os factos em apreço, nomeadamente ter sido dado por assente, não ter havido premeditação por parte dos arguidos na prática dos factos ocorridos.
4. E do mesmo modo, que a caçadeira em causa não se encontrava municiada, circunstância que não pode deixar de ser levada em consideração e atendida, na ponderação do seu grau de culpa e consequentemente, na medida da pena.
5. Contudo, não pode o recorrente concordar quando no douto acórdão se dá a entender não ter o recorrente cumprido voluntariamente com uma condenação anterior em trabalho a favor da comunidade, a qual em verdade, só não foi realizada adequadamente, por entretanto ter sido sujeito a prisão preventiva no âmbito destes autos.
6. De resto, refira-se que apenas tem duas condenações por ilícitos de natureza completamente diferentes do objecto destes autos e de manifesta menor gravidade.
7. E do mesmo modo, não pode também o recorrente conceder, quando se refere no Douto Acórdão, que as lesadas não foram ressarcidas, tendo em consideração ter sido todo o dinheiro recuperado.
8. E que se considere, por manifestamente desmedido, a actuação dos arguidos como “um grau de violência excessivo, desnecessário para a concretização da apropriação dos objectos que aquela tinha consigo”.
9. Porquanto a arma não se encontrava municiada, não ocorreu qualquer acto de violência física e da parte do arguido Ivo, ter ficado ainda provado não ter este empunhado ou apontado a arma em questão, bem como nunca ter ordenado, ameaçado verbalmente ou apalpado fisicamente a funcionária do posto abastecimento, circunstâncias essas, que deverão ser atendidas no seu grau de culpa e medida da pena.
10. Posto isto, deveria ainda ter-se levado em consideração na medida da pena, o facto de e conforme ficou provado, toda esta situação ter ocorrido quando o arguido IG, se encontrava numa fase bastante delicada e conturbada da sua vida.
11.Bem como os factos de ser um jovem completamente inserido socialmente/familiarmente e além do arrependimento demonstrado, apresenta ainda um comportamento exemplar e adequado desde que se encontra em clausura desde há quase dois (2) anos.
12.Pelo que, deveria o Tribunal a quo na determinação da medida concreta da pena a aplicar ao arguido Ivo, ter feito um juízo mais consentâneo à situação em causa e ponderado no sentido da aplicação de uma pena mais reduzida do que a efectivamente decidida.
13. Tendo em consideração que, as finalidades subjacentes à aplicação e condenação numa pena, são a reintegração do agente na sociedade, sendo que em caso algum, a pena deve ultrapassar a medida da culpa - art. 40º do Código Penal.
14. Devendo nessa senda, ser dada preferência a uma pena não privativa da liberdade, sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição - art. 70º do Código Penal.
15. Pena essa na sua medida, determinada dentro dos limites definidos na lei, em função da culpa e das exigências de prevenção; atendendo-se a todas as circunstâncias, que não fazendo parte do crime, depõem a seu favor ou contra o agente - o art.º 71 do Código Penal.
16. Pelo que, no nosso entender in casu e com o devido respeito, o Douto Acórdão errou ao não ponderar correctamente os princípios subjacentes à escolha e determinação das penas aplicadas - consagrados no Código Penal nos artigos 40º, 70º e 71º - uma vez que as circunstâncias atinentes diminuem significativamente o grau de culpabilidade do arguido.
17. Crendo-se sinceramente, por todo o exposto, que existe inequivocamente uma forte e séria expectativa favorável de actuação futura do arguido, no sentido de vir a ter a sua vida ordenada e conforme ao Direito.
18. Devendo pois, a medida da pena que lhe foi aplicada ser reduzida em conformidade, na senda dos princípios da proporcionalidade e da adequação, uma vez que revela-se manifestamente desproporcional e excessiva, nomeadamente a prisão efectiva em que foi condenado.
19. Extravasando claramente as necessidades de prevenção geral, bem como as necessidades de prevenção especial da mesma, as quais deverão ser consideradas substancialmente mais diminutas, porquanto não existe peremptoriamente o perigo para a sociedade de o arguido voltar a realizar o mesmo tipo de ilícito.
20. Pelo que, entende-se assim mais adequado, uma pena a aplicar pelo crime de roubo agravado a situar-se sempre no seu limite mínimo, ou seja, três (3) anos de prisão;
21.E pelo crime de detenção de arma proibida (pelo acima referido, nomeadamente nunca teve qualquer contacto com a mesma), ainda uma pena de multa cujo montante deverá ter em consideração as condições sócio-económicas do arguido ou caso assim não se entenda, uma pena de prisão também no seu mínimo, nomeadamente um (1) ano de prisão.
22. Sendo que em cúmulo jurídico e mesmo que Vexas. entendam ser de manter as penas parcelares aplicadas, ter sido aplicada uma pena única sempre no seu limite mínimo e abaixo dos cinco (5) anos de prisão, nomeadamente fixando-se em quatro (4) anos e 9 (nove) meses.
23. Tendo em consideração que, todas as circunstâncias acima expostas, devem ser valoradas no sentido de as exigências de prevenção especial atinentes ao arguido Ivo serem diminutas e consequentemente, ser manifestamente evidente que na personalidade deste, não radica qualquer tendência ou propensão criminosa.
24. Pelo que se entende, não ter o Tribunal a quo, ponderado correctamente o estatuído no art. 77º do Código Penal.
25. Posto isto e tendo em consideração o princípio norteador do sistema penal português - a ressocialização do agente – e sendo a pena única a aplicar ao ora recorrente inferior a cinco (5) anos de prisão, deverá a mesma ser suspensa na sua execução, sujeita a regime de prova, alicerçado num plano de reinserção social, nos termos do artigo 50º e seguintes do Código penal, uma vez que desse modo, não se irá descurar as necessidades de prevenção e nem as finalidades da punição, promovendo-se seguramente a sua plena reintegração na sociedade.
26. Porquanto, existe uma forte e séria expectativa favorável de actuação futura do arguido no sentido de vir a ter a sua vida ordenada e conforme o Direito, o que justifica plenamente a pretendida suspensão da execução da pena, a qual será a reacção penal por excelência ao caso sub judice, satisfazendo desse modo, simultaneamente, as necessidades de reprovação e prevenção do crime.
27. Sem esquecer que este, já se encontra há quase dois anos em prisão preventiva, período esse que já exerceu um forte efeito intimidativo e retributivo no mesmo, ainda que não seja esta a função principal da pena, como já atrás se referiu.

Respondeu ao recurso o Senhor Procurador da República, dizendo:
1. Interpôs o arguido IESG recurso do douto acórdão prolatado a fls. 822-856 dos autos supra epigrafados, que o condenou pela prática, como co-autor material e em concurso efectivo, de um crime de roubo, na forma agravada, p. e p. pelo art.º 210.º, n.º 2, al. b), com referência ao art.º 204.º, n.º 2, al. f), do Código Penal, na pena de quatro (4) anos e nove (9) meses de prisão, e de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art.º 86.º, n.º 1, al. c), com referência aos art.ºs 2.º, n.º 1, al. v), e 3.º, n.º 2, al. l), da Lei n.º 5/06, de 23.02, na redacção dada pela Lei n.º 12/11, de 27.04, na pena de um (1) ano e seis (6) meses de prisão, sendo que, em cúmulo jurídico, foi o primeiro condenado na pena única de cinco (5) anos e seis (6) meses de prisão;
2. Pugna o ora recorrente, no essencial, pela revogação e consequente substituição daquele douto acórdão por outro que o condene em penas parcelares e única inferiores – sendo as penas parcelares de três (3) anos de prisão, relativamente ao crime de roubo, na forma agravada, e de multa ou um (1) ano de prisão, no que tange ao crime de detenção de arma proibida, e a pena única sempre inferior a cinco (5) anos de prisão, no caso de entender-se ser de manter as penas parcelares aplicadas de quatro (4) anos e 9 (nove) meses de prisão –, determinando, a final, a suspensão da execução da pena única de prisão, sujeita a regime de prova;
3. Estará aqui em causa, no que ora mais interessa relativamente ao douto acórdão recorrido, aquilatar do acerto e justeza das penas aplicadas (das penas parcelares impostas pela prática dos crimes de roubo, na forma agravada, e de detenção de arma proibida e, bem assim, da pena única), designadamente, da sua correspondência, ou não, à medida da culpa do arguido IG, e, por outro lado, caso tal seja admissível em face do quantum da pena única imposta, da possibilidade da suspensão da execução da pena única de prisão, sujeita a regime de prova;
4. Relativamente ao acerto e justeza das penas parcelares aplicadas correspondentes aos crimes de roubo, na forma agravada, e de detenção de arma proibida, refira-se, desde já, que, concatenando o critério geral estatuído no n.º 1 do art.º 71.º do Código Penal – devendo, assim, ser sopesadas as circunstâncias do caso com a ponderação da culpa e da prevenção – com o próprio enunciado sobre os fins das penas plasmado no art.º 40.º do mesmo diploma legal – a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, sendo que o quantum da pena não poderá nunca exceder a medida da culpa do agente –, temos comummente visto ser tomado como um ponto de partida de referência do julgador, na actividade intelectual desenvolvida para encontrar a sanção adequada (o que, todavia, não configurará um critério geral), a média entre o limite máximo e mínimo da moldura ou dosimetria penal abstractamente aplicável;
5. Veio o ora recorrente in casu salientar determinadas circunstâncias que entende não terem sido devidamente valoradas, a saber: não ter havido premeditação por parte dos arguidos na prática dos factos ocorridos; não se encontrar a caçadeira utilizada municiada; só não ter cumprido uma das penas de prestação de trabalho a favor da comunidade em que foi condenado por ter sido entretanto sujeito a prisão preventiva no âmbito do presente processo; ter apenas duas condenações por ilícitos de natureza completamente diferente do objecto destes autos e de manifesta menor gravidade; ter sido recuperado todo o dinheiro subtraído; não ter sido excessivo ou desnecessário o grau de violência subjacente à actuação dos arguidos; não ter ocorrido qualquer acto de violência física e, da parte do próprio arguido IG, não ter este empunhado ou apontado a arma em questão, nem ameaçado verbalmente ou apalpado fisicamente a funcionária ofendida; ter esta situação ocorrido quando o mesmo arguido se encontrava numa fase bastante delicada e conturbada da sua vida; ser um jovem completamente inserido socialmente/familiarmente e, além do arrependimento demonstrado, apresentar ainda um comportamento exemplar e adequado desde que se encontra em clausura desde há quase dois (2) anos;
6. Ora, desde logo se diga que: existiu acordo prévio entre os arguidos no que tange ao cometimento dos crimes; é indiferente, sob o ponto de vista da funcionária ofendida, que a caçadeira não se encontrasse municiada, já que aquela desconhecia tal facto; tendo já em conta o número e o sexo dos arguidos comparativamente com a funcionária do posto de abastecimento “assaltado” constituiu, assim, a utilização dessa arma, visando a concretização da apropriação dos objectos que a referida ofendida tinha consigo, um excessivo e desproporcionado grau de intimidação e de violência; sendo o recorrente co-autor dos ilícitos, sempre a utilização (designadamente, o empunhar e o apontar) da mencionada arma, intimidação/ordem verbal e abordagem física (ainda que sem “agressões” propriamente ditas) à mesma ofendida por parte de um comparticipante responsabilizará de igual modo (ainda que, admita-se, não de modo igual) o referenciado IG; o declarado arrependimento, conquanto desacompanhado de comportamentos disso efectivamente demonstrativos, será pouco mais do que inócuo;
7. Sucede que as ditas circunstâncias salientadas pelo ora recorrente, podendo algumas delas ser, efectivamente, consideradas como favoráveis ao mesmo, não serão, porém, senão uma parte das circunstâncias a atender em sede de determinação concreta da medida da pena;
8. Assim, sendo certo que as demais circunstâncias então feitas notar no douto acórdão ora posto em crise militarão, grosso modo, contra o recorrente (sendo desfavoráveis a este), não temos como excessivas, designadamente, face à medida da culpa que é possível observar, as correspondentes e supra aludidas penas parcelares de quatro (4) anos e nove (9) meses de prisão, relativamente ao crime de roubo, na forma agravada, e de um (1) ano e seis (6) meses de prisão no que tange ao crime de detenção de arma proibida, notoriamente aquém daquela “média entre o limite máximo e mínimo”;
9. Ante a gravidade dos factos – arguidos com luvas, gorros “passa-montanhas” e uma caçadeira de canos serrados que “assaltaram” um posto de abastecimento de combustíveis, logrando, mediante a utilização (designadamente, o empunhar e o apontar) da mencionada arma, intimidação/ordem verbal e abordagem física a uma funcionária do mesmo posto, entrar na posse de, pelo menos, € 400,00 –, sempre se refira, ainda, não se compreender, de todo, como poderiam, in casu, ser, conforme sustenta o recorrente, aplicadas penas parcelares absolutamente coincidentes com os limites mínimos abstractamente aplicáveis correspondentes aos ilícitos perpetrados – três (3) anos de prisão, relativamente ao crime de roubo, na forma agravada, e um (1) ano de prisão, no que tange ao crime de detenção de arma proibida –, tão pouco sendo, desde logo, compreensível, em face do disposto no art.º 70.º do Código Penal e considerando os antecedentes criminais do recorrente, bem assim as intensas exigências de prevenção geral, «dada a proliferação de armas proibidas na posse do comum cidadão e usadas na prática de outros crimes», que pudesse ter tido lugar, ab initio, qualquer preferência pela imposição de pena de multa quanto ao crime de detenção de arma proibida;
10. No que tange ao acerto e justeza da pena única aplicada, comece-se por dizer que o art.º 77.º, n.º 2, do Código Penal dispõe que «[a] pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos tratando-se de pena de prisão (…); e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes»;
11. Atentos os critérios previstos no art.º 77.º, n.º 1, do Código Penal, importa considerar, em conjunto, a gravidade de todos os factos praticados pelo arguido, bem como a personalidade que este reflecte e as respectivas condições pessoais apuradas;
12. Na « (...) avaliação da personalidade - unitária - do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma “carreira”) criminosa, ou tão só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta. De grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização)» – Figueiredo Dias, As consequências jurídicas do crime, págs. 291-292;
13. Sendo fundamental, ao efectuar o cúmulo jurídico, atender ao conjunto dos factos e à personalidade do agente, como se dispõe na 2.ª parte do n.º 1 do art.º 77.º do Código Penal, como a pena se traduz, afinal e a final, numa expressão aritmética, num número, é aconselhável o auxílio de regras também aritméticas para, com mais rigor, encontrarmos a pena concreta;
14. «O critério proposto não é, propriamente, um “critério matemático” mas um critério jurídico, que, na sua operacionalidade, recorre ao auxílio da ciência matemática» – Manuel Simas Santos, As penas no caso do concurso de crimes, Temas de Direito Penal e Processual Penal, C.E.J., Lisboa, 3 de Fevereiro de 2010;
15. Assim, afigura-se-nos como critério razoável e abrangente aquele que atenda a uma ponderação, em conjunto, da personalidade e dos factos apurados/praticados pelo agente em conjugação com um critério aritmético, apenas auxiliar na concretização, mais rigorosa, em termos quantificativos/quantitativos, da medida concreta da pena, a qual, necessariamente, terá que se traduzir numa expressão aritmética;
16. Poder-se-á adoptar o seguinte critério: «Em regra, a ponderação da imagem global dos crimes imputados e da personalidade é feita nos seguintes termos: tratando-se de uma personalidade mais gravemente desconforme com o Direito o tribunal determina a pena única somando à pena concreta mais grave metade (ou, em casos excepcionais, dois terços) de cada uma das penas concretas aplicadas aos outros crimes em concurso; tratando-se de uma personalidade menos gravemente desconforme ao Direito o tribunal determina a pena única somando à pena concreta mais grave um terço (ou, em casos excepcionais, um quarto) de cada uma das penas concretas aplicadas aos outros crimes em concurso» – vide Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código Penal, Dez. 2008, pág. 244, em anotação ao art.º 77.º, nota 3;
17. Como já ficou referido, deflui do art.º 77.º, n.º 2, do Código Penal que a pena parcelar mais elevada em concurso constitui o limite mínimo da moldura do concurso e o limite máximo desta moldura resulta da soma de todas as penas parcelares em concurso, mas sempre sem exceder os vinte e cinco anos, quando em causa estão penas de prisão;
18. Assim, a moldura legal aplicável ao concurso cifrou-se no mínimo de quatro (4) anos e nove (9) meses de prisão e no máximo de seis (6) anos e três (3) meses de prisão, tendo a pena única, como se vê, sido, in casu, encontrada somando à pena parcelar mais grave/elevada, de quatro (4) anos e nove (9) meses de prisão, metade da restante pena parcelar, o que se nos afigura adequado, de acordo com os factos apurados e a personalidade do arguido IG;
19. De resto, deveremos, mesmo, realçar que a pena única/conjunta ora encontrada, atentas aquelas penas parcelares, foi correta e justamente determinada, não destoando, até, dos critérios propostos pela jurisprudência e pela doutrina, auxiliares do rigor e da segurança jurídica, bem assim na procura da igualdade ou uniformidade que deve nortear a determinação das penas, em face da especificidade de cada caso;
20. Ante todo o exposto, podemos concluir, no presente caso, pela razoabilidade/justeza daquela decisão, de cominação da supra referida pena única de cinco (5) anos e seis (6) meses de prisão;
21. Sempre se refira, ainda, não se compreender, de todo, como poderia, in casu, conforme sustenta o recorrente, ser a pena única, mesmo entendendo-se ser de manter as penas parcelares aplicadas, de quatro (4) anos e 9 (nove) meses de prisão (isto é, coincidente com a pena parcelar correspondente ao crime de roubo, na forma agravada), tal equivalendo a ter como absolutamente irrelevante (no fundo, esquecer) o crime de detenção de arma proibida;
22. Quanto à suspensão da execução da pena única de prisão, sujeita a regime de prova, dispondo o art.º 50.º, n.º 1, do Código Penal que «O tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição», fácil é constatar que, em face do quantum da pena única imposta, cuja manutenção ora se defende, não será, ab initio, admissível, sequer, ponderar semelhante suspensão;
23. Admitindo, todavia, por mera hipótese de raciocínio, a aplicação, in casu, de uma pena única não superior a cinco anos de prisão, refira-se que, ainda assim, entendemos não se verificar o demais circunstancialismo legal previsto no preceito legal supra transcrito, designadamente, sendo certo que a predisposição revelada pelo recorrente para o cometimento de factos com a gravidade daqueles retratados nos autos inquinam, irremediavelmente, a possibilidade de se «concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição».

Face a todo o exposto, e sendo certo que concordamos com o teor das considerações expendidas no douto acórdão posto em crise, bem assim com o decidido neste, entendemos que não deverá ser dado provimento ao recurso ora interposto pelo arguido IESG.

Nesta Instância, a Senhora Procuradora Geral-Adjunta emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso.

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.


Em sede de decisão recorrida foram considerados os seguintes Factos:
Factos Provados
1. No dia 14 de maio de 2013, pelas 16 horas, os arguidos fazendo-se transportar no veículo ligeiro de passageiros, da marca Opel, modelo Corsa, de cor preta, com a matrícula 00-00-XX, deslocaram-se ao posto de abastecimento de combustível “T”, sito na Rua Direita, em BR, tendo sido atendidos por IM, que abasteceu o referido veículo, sendo esta a única funcionária do mesmo naquele dia e hora.
2. De seguida, abandonaram o referido posto de abastecimento de combustível, combinando entre si que voltariam mais tarde com o propósito de se apoderarem de todos os objectos e valores que estivessem no interior do mesmo.
3. No mesmo dia 14 de maio de 2013, cerca das 21 horas, em execução daquele plano e em comunhão de esforços e de intentos, os arguidos IG e TN calçaram luvas pretas, de lã, ocultaram o rosto com um gorro de cor cinza, tipo “passa-montanhas” e, os três arguidos, munidos de uma caçadeira de canos serrados, de cor castanha, com 51 centímetros de comprimento e com o n.º de série 7560, que se não encontrava municiada, fazendo-se transportar na mesma viatura, dirigiram-se novamente ao referido posto de abastecimento, onde ainda se encontrava IM.
4. Os arguidos IG e TN dirigiram-se ao referido posto de abastecimento de combustível e o arguido AC ficou a aguardar na viatura, que ficou em funcionamento, pronta a arrancar assim que regressassem aqueles arguidos.
5. Assim que entraram no posto de abastecimento de combustível, o arguido TN empunhou na direcção de IM a referida arma de fogo e ordenou-lhe, em voz alta e num tom firme e sério, que lhes fizesse a entrega do dinheiro que estivesse em caixa, o que aquela fez, por temer pela sua vida, tendo-lhes feito a entrega da quantia de pelo menos 400,00 € (quatrocentos euros), 30 dos quais pertenciam à própria funcionária, IM.
5. De seguida, os arguidos IG e TN abandonaram posto de abastecimento de combustível, entraram no veículo acima identificado, e, juntamente com o arguido AC, puseram-se em fuga, levando consigo o dinheiro e as chaves do posto referido posto.
6. De imediato os militares da G.N.R. de A encetaram perseguição aos arguidos, vindo a localizá-los na residência sita na Rua do Olival, n.º 16, em M, pertença de HF, familiar do arguido AC.
7. Na sequência da busca ao veículo, com a matrícula 00-00-XX, foi localizado um saco de plástico com várias moedas, dois pares de luvas pretas de lã, um gorro de cor cinza, tipo “passa-montanhas” e uma gola de pescoço em lã de cor preta.
8. Na sequência da busca domiciliária realizada na residência de HF, foi ali localizada a arma de fogo utilizada na prática dos factos acima descritos, bem como um saco de cartuchos, que se encontravam na parte de cima de um móvel.
9. Na casa de banho foi recuperado dinheiro (380,00 €) e na sala foram recuperadas as chaves do posto de abastecimento de combustível.
10. A arma de fogo foi reconhecida por IM, assim como as chaves do posto de abastecimento de combustível, que lhe foram entregues.
11. Os arguidos agiram em comunhão de esforços e de intentos, com o propósito concretizado de se apoderarem do dinheiro que estivesse na caixa do referido posto de abastecimento de combustível, que sabiam não lhes pertencer, contra a vontade do legítimo dono, tal como sucedeu.
12. Para tanto, através do uso da caçadeira de canos serrados, os arguidos conseguiram intimidar IM de modo a que esta lhes fizesse a entrega do dinheiro que se encontrasse em caixa, na quantia de pelo menos 400,00 € (quatrocentos euros), tal como se propunham, impossibilitando-a de resistir contra tal ato.
13. De igual forma, os arguidos sabiam que por estar modificada, lhes estava vedada a detenção da arma de fogo acima descrita.
14. Os arguidos agiram sempre de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei, e tinham a liberdade necessária para se determinar de acordo com essa avaliação.
15. O arguido AC é um dos sete filhos do casal, trabalhadores agrícolas, tendo, ainda, alguns irmãos uterinos, apresentando o agregado familiar um quadro económico difícil devido ao elevado número de elementos que o compunham.
16. Com 9 anos de idade, o arguido A viu os progenitores separarem-se, tendo ficado entregue aos cuidados do pai que faleceu num acidente quando o mesmo contava com 12 anos de idade.
17. Depois destes factos, o arguido ficou entregue à guarda judicial do patrão do pai que assumiu o cargo de seu tutor.
18. O arguido tem como habilitações literárias o 4.º ano de escolaridade e desde cedo realizou trabalhos agrícolas na propriedade do seu tutor até este ter sido internado num lar local, contava cerca de 17 anos, passando, a partir de então, a trabalhar de modo itinerante em várias feiras ao longo do país, em equipamentos recreativos.
19. Cerca de 4 anos depois, o arguido passou a residir em casa de uma irmã, no concelho de A.
20. Por volta dos 27 anos esteve a trabalhar no Luxemburgo, na construção civil, regressando passados 2 anos.
21. À data dos factos o arguido residia com uma outra irmã, cujo agregado era composto pelo companheiro desta e por 3 filhos do casal, reunindo a habitação condições para todos os elementos.
22. O arguido A encontrava-se inactivo à data dos factos realizando uns biscates no sector da construção civil ou em actividades agrícolas sazonais e, nos meses que antecederam a sua prisão, dedicava-se à desmontagem de ferro velho sem qualquer vínculo laboral.
23. Após regressar do Luxemburgo tem tido um maior apoio da mãe que o visita com regularidade no estabelecimento prisional.
24. Durante a reclusão o arguido tem mantido uma conduta consentânea com as normas da instituição, tendo este facto repercussões na forma como avalia o seu passado, apresentando discurso globalmente mais crítico, reconhecendo a ilicitude e a gravidade dos factos que praticou, referindo-se arrependido.
25. Por decisão datada de 22.07.2010, proferida nos autos de processo sumário n.º 563/10.2 GEALR, do Tribunal de A, transitada em julgado em 30.09.2010, por factos praticados em 22.07.2010, o arguido AC foi condenado pela prática de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, na pena de 90 dias de multa.
26. Por decisão datada de 15.11.2010, proferida nos autos de processo sumário n.º 481/10.4 GEBNV, do Tribunal de B, transitada em julgado em 15.11.2010, por factos praticados em 11.11.2010, o arguido AC foi condenado pela prática de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, na pena de 90 dias de multa.
27. Por decisão datada de 30.03.2011, proferida nos autos de processo abreviado n.º 478/10.4 GEBNV, do Tribunal de B, transitada em julgado em 09.05.2011, por factos praticados em 11.11.2010, o arguido AC foi condenado pela prática de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, na pena de 170 dias de multa.
28. Por decisão datada de 21.11.2012, proferida nos autos de processo abreviado n.º 21/12.0 GACCH, do Tribunal de B, transitada em julgado em 04.01.2013, por factos praticados em 02.04.2012, o arguido AC foi condenado pela prática de um crime de furto qualificado, na pena de 2 anos e 8 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo.
29. O arguido IG é o terceiro de uma fratria de 5 elementos.
30. O seu processo de socialização ocorreu no seio da família de origem, detentora de algumas dificuldades económicas e sociais.
31. Frequentou a escola até aos 15 anos de idade, num percurso caracterizado pelo absentismo a partir do 5.º ano e consequentes reprovações, concluindo apenas o 6.º ano de escolaridade.
32. Após um ano de inactividade, ingressou num curso de formação profissional, de jardinagem, na Santa Casa da Misericórdia, que reprovou por absentismo.
33. Já cumpriu uma pena de prestação de trabalho a favor da comunidade que decorreu de forma adequada, não sucedendo o mesmo com a segunda pena daquela natureza que acabou por ser substituída por pena de prisão.
34. À data da reclusão, o arguido Ivo integrava o agregado constituído pelos pais e 4 irmãos, com idades compreendidas entre os 37 e os 17 anos; o pai encontrava-se em fase terminal de doença oncológica, tendo falecido após a reclusão do arguido.
35. O relacionamento familiar é caracterizado como adequado e de entre-ajuda, manifestando a família disponibilidade para apoiar o arguido.
36. O agregado familiar reside na zona há cerca de 28 anos, habitando num prédio de renda social, constituído por dois andares (r/c e 1.º andar), com 6 assoalhadas e adequadas condições de habitabilidade.
37. Os rendimentos fixos do agregado familiar do arguido são a pensão de viuvez da mãe do arguido (181 €/mês), a pensão por deficiência de um dos irmãos (250 € por mês) e 350 € auferidos por uma irmã, sendo que um dos irmãos do arguido explora um café e entrega à mãe entre 10 € e 15 € diários.
38. A família beneficia do apoio do Centro Paroquial do CRi em géneros alimentares.
39. O arguido prestava trabalho no âmbito de corte e entrega de lenha e da construção civil para JN, sem carácter de regularidade, auferindo semanalmente entre 100 € e 125 €, sendo considerado por este um bom trabalhador.
40. No estabelecimento prisional, o arguido IG apresenta um comportamento normal e respeito pelas regras institucionais; concluiu o programa de competências “Formar para Integrar” e, em caso de permanência no estabelecimento prisional, aguarda possibilidade de ingresso em formação profissional.
41. Embora aparente alguma imaturidade e consequente ligeireza ao nível da avaliação critica, reconhece alguns comportamentos como menos adequados, tendendo a desculpabilizar os mesmos com factores externos, parecendo consciente da necessidade de os alterar.
42. Confrontado com os factos descritos no presente processo, reconhece a sua gravidade e referiu estar arrependido.
43. Por decisão datada de 06.04.2010, transitada em julgado em 20.05.2010, proferida nos autos de processo sumário n.º 202/10.1 GDALM, do Tribunal de A, por factos praticados em 22.03.2010, o arguido IG foi condenado pela prática de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, na pena de 90 dias de multa.
44. Por decisão datada de 26.07.2012, transitada em julgado em 20.09.2012, proferida nos autos de processo sumário n.º 466/12.6 GDALM, do Tribunal de A, por factos praticados em 18.07.2012, o arguido IG foi condenado pela prática de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, na pena de 160 dias de multa.
45. O arguido TN nasceu e cresceu no seio de uma família de condição socioeconómica modesta, estável, com capacidade para lhe transmitir valores e normas sociais, com quem mantém uma relação coesa e gratificante e uma afectividade próxima com todos os elementos.
46. O pai encontra-se actualmente reformado mas trabalha como taxista e a mãe trabalha como auxiliar numa escola.
47. A família residiu sempre numa casa tipo apartamento, situado num bairro social da margem sul do Tejo, onde o arguido manteve uma imagem ajustada até à sua autonomia.
(…).
Factos não Provados
Para além dos supra descritos, e sem prejuízo dos mesmos, não se provaram quaisquer outros factos que estejam em contradição com os dados como provados, com interesse para a decisão da causa, nomeadamente não se provou que:
1. Os arguidos combinaram entre si deslocarem-se a postos de combustíveis localizados na zona de A de modo a perceberem quais os que ofereciam melhores condições para concretizarem os seus intentos, quais fossem os de se apoderarem de todos os objectos e bens de valor que estivessem no interior dos mesmos.
2. IM entregou aos arguidos a quantia de 570,00 € (quinhentos e setenta euros).
3. O arguido TN era o usufrutuário do veículo, com a matrícula 00-00-XX.

Em sede de fundamentação da decisão de facto consignou-se o seguinte:
Ao motivar a decisão de facto que tomou, o Tribunal tem de dizer o porquê decidiu de um modo e não de outro. E esta obrigação é ainda mais obrigação na decisão sobre a matéria de facto.
O Tribunal tem nesta decisão sobre a matéria de facto de deixar claramente expressas as razões do julgamento que fez. Tem obrigação de expor aos destinatários o julgamento que fez. O tribunal não tem qualquer poder arbitrário, secreto, não controlado de dizer este facto está provado e aquele facto não está provado. O Tribunal tem de esclarecer porque é que um está provado e o outro não está. O Tribunal tem de deixar às claras o caminho da decisão. Não basta dizer que a convicção se baseou no depoimento das testemunhas. É necessário esclarecer porque é que um depoimento mereceu crédito e outro não.
O princípio da prova livre só quer dizer que o Tribunal livremente aprecia as provas (mas as provas), sem subordinação a regras ou critérios formais pré- estabelecidos. Não há qualquer convicção íntima do juiz que não se alicerce nas provas produzidas. Está afastado qualquer julgamento com base em meras opiniões ou conjecturas do julgador.
Por outro lado, o Tribunal na apreciação das provas, na reflexão dos factos, deve utilizar o seu saber da experiência, a sua capacidade de raciocínio, a reflexão nas regras da experiência comum, a sua compreensão das coisas.
Mas esta essencial actividade só lícita na apreciação das provas e nunca se lhes substitui.
Volvendo ao caso concreto.
A convicção do Tribunal relativamente aos factos considerados provados formou-se com base, essencialmente, na análise crítica, ponderada e conjugada de toda a prova testemunhal, documental e pericial junta aos autos, concatenada com as regras da lógica e da experiência comum.
Os arguidos prestaram declarações em sede de audiência de julgamento e confessaram a maioria dos factos pelos quais se encontram acusados. Esclareceram as circunstâncias de tempo, modo e lugar em que ocorreram os factos, negando, porém, que a primeira passagem pelo posto de abastecimento de combustível em causa tivesse por objectivo a análise ao mesmo de molde a poder ser alvo de assalto, dado que por ali passaram para abastecer a viatura em que se faziam transportar porque, a pedido do arguido A, dirigiram-se a casa do JL. Afirmaram que cometeram os factos na sequência do visionamento de um maço de notas nas mãos da funcionária do posto de abastecimento da primeira vez que ali se dirigiram.
Negaram, igualmente, em particular o arguido TN, que alguma vez tivessem apontado a arma que levavam consigo para perpetrar o assalto à funcionária do posto de abastecimento, dado que a mesma esteve sempre apontada para o chão, quase na Tidade escondida na manga da direita do casaco que aquele envergava.
Afirmaram, ainda, que a quantia monetária que subtraíram no posto de abastecimento de combustível se cifrou em 300,00 €, que dividiram pelos três.
No que tange à prova testemunhal produzida foi desde logo determinante o depoimento da testemunha IAMM, funcionária do posto de abastecimento de combustível “T” que, de forma circunstanciada, genuína, credível e objectiva, relatou os factos de que foi vítima, esclarecendo ainda o tribunal acerca das características da arma utilizada pelos arguidos (e que reconheceu em inquérito, conforme auto de reconhecimento de fls. 33) e a forma como lhe foi apontada, as palavras que lhe dirigiram, a forma como foi abordada fisicamente (apalpando-a) para lhe ser retirado o dinheiro que tinha consigo no bolso lateral das calças que vestia na altura e, bem assim, acerca dos objectos e valores levados pelos arguidos, fazendo-o de molde a não deixar quaisquer dúvidas ao tribunal acerca de tais factos.
Afirmou que para além da quantia pertença do posto de combustível, os arguidos levaram também consigo 30 € de sua propriedade.
Por outro lado, depondo de forma credível e isenta, e manifestando conhecimento directo sobre alguns factos, a testemunha (…), militar da G.N.R. de A, confirmou as circunstâncias de tempo e lugar onde ocorreram os mesmos, a perseguição que moveram ao Opel Corsa, a abordagem aos arguidos momentos após os factos, na residência sita na Rua do Olival, n.º 16, em M, e as apreensões que nos dá conta o processo, a fls. 26, 47 e 48 e 49, cujos autos subscreveu.
(…)
Para prova dos antecedentes criminais dos arguidos, o Tribunal atendeu aos respectivos certificados de registo criminal, junto aos autos.


Como consabido, são as conclusões retiradas pelo recorrente da sua motivação que define o objecto do recurso e bem assim os poderes de cognição do Tribunal ad quem.
Da análise das conclusões formuladas do aqui arguido/recorrente depreende-se pretender o reexame da matéria de direito e dentro de tal âmbito de conhecimento vir discutir as penas parcelares e pena única encontradas pelo Tribunal recorrido e bem assim a suspensão da execução da pena, cfr. art.º 403.º, do Cód. Proc. Pen.
Como decorre dos autos, o aqui impetrante foi condenado pela prática, como co-autor material, de:
- Um crime roubo na forma agravada, p. e p. pelo art.º 210.º, n.º 2, al. b), com referência ao art.º 204.º, n.º 2, al. f) do Código Penal, na pena de quatro (4) anos e nove (9) meses de prisão;
- Um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art.º 86.º, n.º 1, al. c), com referência ao art.º 2.º, n.º 1, al. v) e art.º 3.º, n.º 2, al. l), da Lei 5/06, de 23.02, na redacção dada pela Lei 12/11, de 27.04, na pena de um (1) ano e seis (6) meses de prisão;
Em cúmulo jurídico condenado na pena única de cinco (5) anos e seis (6) meses de prisão.
De pronto, importa discorrer, enquanto questão prévia, face à pena única em presença, ao facto de o recurso se mostrar restrito ao reexame da matéria de direito e o processo provir de Tribunal colectivo, sobre qual o tribunal competente para conhecer dos presentes autos de recurso, se este Tribunal da Relação, se o Supremo Tribunal de Justiça.
Conforme se dispõe no art.º 432.º, n.º1, al. c), do Cód. Proc. Pen., recorre-se para o Supremo Tribunal de Justiça de acórdãos finais proferidos pelo tribunal do júri ou pelo tribunal colectivo que apliquem pena de prisão superior a 5 anos, visando exclusivamente o reexame da matéria de direito.
Numa leitura da norma em questão, tudo parece apontar no sentido de a competência para o conhecimento dos presentes autos de recurso dever ser deferida ao S.T.J. e não a este Tribunal da Relação.
Pois, do inciso normativo citado importa concluir que a competência em tais situações seja deferida ao nosso mais alto tribunal, quando se verifiquem em concreto os requisitos para tal. A saber: se esteja perante decisão de tribunal colectivo, a hipótese que ora nos importa analisar, que a decisão aplique pena de prisão superior a 5 anos e o recurso se encontre restrito á questão de direito.
Ora, no caso em apreço mostram-se verificados os enunciados requisitos e, daí, o ser de deferir a competência ao S.T.J. para proceder ao conhecimento do recurso em apreço.
Como consabido, não tem sido pacífico o entendimento do nosso mais alto tribunal da leitura que se deixou expressa da norma vazada no art.432.º, n1, al.ª c), do Cód. Proc. Pen.
Vem entendendo o S.T.J. que a norma em apreço deve ser lida de forma restritiva, de forma a nela se integrarem somente os casos em que as penas parcelares sejam superiores a cinco anos de prisão e bem assim, por arrastamento, o cúmulo jurídico que se venha a obter em resultado de tais penas parcelares, caso contrário, o recurso deve ser remetido ao Tribunal da Relação, por ser o competente para o efeito.
Pelo que no recurso para o S.T.J. só se podem vir a discutir quer as penas parcelares, quer a pena única, de medida superior a 5anos de prisão, mas já não as fixadas em medida inferior aos 5 anos de prisão; e sempre restrita a sua apreciação ao reexame da matéria de direito.
Isso mesmo se vê referido no acórdão de 21-09-2011,proferido no Processo n.º 7406/04.4TDPRT.P1.S1, da 5.ª Secção, onde se mencionou que «por isso, no caso de ser aplicada mais do que uma pena de prisão, verificando-se, relativamente a uma delas (ou mais do que uma), o pressuposto de recorribilidade para o Supremo, a competência do Supremo só deve ser afirmada se o recurso tiver por objecto, justamente, questões de direito relativas aos crimes por que essa ou essas penas (de medida concreta de prisão superior a 5 anos) foram aplicadas. Daí que, se na decisão final do tribunal de júri ou do tribunal colectivo forem aplicadas penas de prisão iguais ou inferiores a 5 anos e penas de prisão superiores a 5 anos, mas o objecto do recurso se referir – ou, também, se referir – a questões de direito relativas aos crimes por que foram aplicadas as penas de prisão iguais ou inferiores a 5 anos, a competência para conhecer do recurso caiba à relação.»
Para se vir a concluir que « (…) seria um contra-senso, na perspectiva da reforma introduzida, visando a restrição do recurso para o Supremo Tribunal, que o legislador, ao falar de pena aplicada em concreto, pretendesse referir-se tão-somente à pena a cumprir ou à pena única, num caso de concurso de infracções, levando o STJ a conhecer de todos os crimes que formam esse concurso, mesmo que tais crimes correspondessem àquela noção que normalmente se designa de criminalidade bagatelar ou a que tivesse sido aplicada uma pena de gravidade não superior a determinado limite, a que, em geral, se associa a pequena e média criminalidade.»[1]
Este tem sido o entendimento defendido pelo nosso mais alto tribunal em vários arestos, recentemente publicados.[2]
No aresto n.º69/09, já mencionado, vemos que nele se contém voto de vencido, o qual aponta no sentido de ser a competência em tais situações deferida ao nosso mais alto tribunal, desfiando um conjunto de razões, às quais somos sensíveis, em termos de a elas anuir e que aqui se dão por reproduzidas.
Entendendo que o que assume importância na visão actual, para efeito de recorribilidade, é a pena aplicada que o arguido tem efectivamente de cumprir, isto é, a pena única e não as penas parcelares acidentalmente aplicadas.
E tanto assim é, (…) que o legislador tomou posição idêntica quanto à competência funcional do tribunal colectivo (art.º 14.º, n.º 2, al. b, do CPP), pois que se cingiu à pena única e não às penas parcelares, como de resto já era jurisprudência pacífica, embora, naturalmente, como nessa fase ainda não há condenação, se reporte à pena aplicável.
Seria uma incongruência, portanto, que o legislador em matéria de competência tivesse dois critérios díspares: para a do tribunal colectivo, valeria a pena única que se irá formar; para o recurso, as penas parcelares e não a pena única já formada.

O nosso mais alto tribunal tem firmado o entendimento, de valorar só a pena, ou penas, parcelar (es) e não a pena conjunta para definir a sua competência, estribando-se no disposto no art.º 400.º, n-º1, do C.P.P., suas alíneas e) e f), na redacção que lhes foi conferida pala lei n.º 59/98, de 25 de Agosto.
De facto, dessas duas alíneas constava um segmento normativo do seguinte teor”…mesmo em caso de concurso de infracções…”.
Era entendimento que esse segmento normativo queria dizer uma só coisa, a saber, que mesmo em caso de concurso de infracções, essa circunstância seria irrelevante para a determinação da competência do tribunal.
Valendo, somente o critério da pena parcelar aplicada, sendo dessa forma de desprezar o critério da pena única, a não ser que fosse questionada a feitura do cúmulo jurídico e a pena única alcançada.
Nesta situação, e só nela, se poderia deitar mão da pena única para que se viesse a determinar a competência do tribunal.[3]
Porém, nem sempre foi este o entendimento do nosso mais alto tribunal sobre este tema, antes um bem distinto deste, e dos muitos arestos nesse sentido, destacamos o seguinte:
“ … a expressão “mesmo em caso de concurso de infracções”, a que se refere a al.f) do n.º1 do artigo 400.ºdo C.P.P., deve ser entendido como significando que no caso da prática pelo arguido de várias infracções, ainda que cada uma delas não exceda a pena abstracta de 8 anos , se o cúmulo jurídico correspondente exceder também a pena de prisão de 8 anos, o recurso é admissível.[4]
Se se entendia esta tomada de posição do S.T.J. face à redacção dada às citadas alíneas do art.400.º, seu n.º 1, do C.P.P., já se não entende a manutenção do mesmo entendimento perante a alteração de redacção das ditas alíneas, no seguimento da lei n.º48/2007, de 29 de Agosto.
Após tal, a redacção das ditas alíneas é diferente da anterior redacção, tendo-se suprimido o segmento do normativo- o sintagma- que aludia ao concurso de infracções.
O que quer significar, como refere Simas Santos, que em caso de cúmulo jurídico, será a pena única a atendível na determinação da competência do SUPREMO em caso de recurso como o vertido nestes autos.[5]
Porém, se bem lermos o art.º 432.º, al.ª c), do C.P.P., vemos que a lei não fala em pena parcelar ou pena única, antes e tão só em pena de prisão superior a 5 anos.
Ora, o elemento literal do preceito não deixa margem para dúvidas.
Querer ver aí a menção a pena parcelar e não a pena única superior a 5 anos de prisão para que seja permitido o acesso ao S.T.J., em casos como o dos autos, é fazer uma leitura restrita do preceito que o mesmo não consente, sob pena de se estar a restringir de forma abusiva o acesso ao nosso mais alto tribunal, desvirtuando-se o que se dispõe no art.32.º, n.º 1, da C.R.P.
Este o entendimento que atravessa o voto de vencido constante do aresto do nosso mais alto tribunal, com o n.º 7406/04, já citado, e que passamos a transcrever: “
A não cognição de tais penas, na medida em que denegasse um único grau de recurso, colidiria mesmo com a garantia de defesa estabelecida a partir da quarta revisão constitucional - Lei Constitucional n.º 1/97, de 20 de Setembro - com a introdução na parte final do n.º 1 do artigo 32.º da expressão “incluindo o recurso”. Ficou então claramente integrado nas garantias de defesa o direito ao recurso, dando-se corpo ao direito a uma protecção judicial efectiva, com o sentido de que o direito de defesa pressupõe, entre o mais, o acesso a um duplo grau de jurisdição.”
Para concluir: “…. a nosso ver, será preferível incluir na competência do S T J a sindicância das penas mais leves de prisão, sabido que a pena aplicada (no sentido de pena que o condenado vai ter que cumprir), é superior a 5 anos, do que retirar ao S T J a competência para apreciar as penas aplicadas pela prática de crimes, por mais graves que sejam, só pelo facto de com eles estar em concurso um crime menor, a que foi aplicada uma pena de menos de 5 anos, e cuja medida evidentemente também se contesta (vg. dois homicídios com as parcelares de 15 e 18 anos, e um crime de utilização de arma proibida com a parcelar de dois anos de prisão, tudo a conjugar-se numa pena única de 20 anos de prisão).
Entendemos pois que a al. c) do nº 1 do art. 432º do C. P. P. deve se interpretada no sentido de que é suficiente para que o S T J cobre competência para conhecer de todas as penas de cuja medida se recorreu, que a pena conjunta seja superior a 5 anos de prisão.»
A leitura restrita do preceito em causa levada a cabo pelo nosso mais alto tribunal, apelidada de redução teleológica, tem merecido a opinião contrária de alguns Professores de direito, onde se contam F. Dias e Nuno Brandão[6].
Na óptica destes Professores, esta visão da questão redunda em nada mais nem nada menos do que no acolhimento de uma interpretação analógica do preceito, interpretação, aliás, proibida por lei.
Pelo que, e sempre tendo em conta os argumentos esgrimidos no voto de vencido acima aludido, a que se adita o mais aqui referido, somos a entender que no caso vertente a competência para o conhecimento do presente recurso deve ser deferida ao S.T.J. e não a este Tribunal da Relação.
No mesmo sentido, vemos o Acórdão do Tribunal Constitucional, n.º 590/12, de 5 de Dezembro.

Termos são, em que Acordam em ordenar a remessa dos autos ao S.T.J., por ser o competente para conhecer do presente recurso.

Sem tributação.

(elaborado e revisto pelo subscritor).

Évora, 16 de Junho de 2015.
(José Proença da Costa)
(Gilberto Cunha)
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[1] No mesmo sentido, veja-se o Ac. S.t.j. de 3-11.2011, no processo n.69/09.2PAGDM P1SD1.
[2] Ver Ac., de 23.11.2011, no processo n.º56/06.2RLSBL.L1S1 e o Ac., de 15.12.2011, no processo n.º3182 /03.6TDPRT.P1S1.
[3] Ver, entre outros, o Ac. S.t.j., de 22.05.2oo3, na C.J (s.t.j.), ano IX, Tomo 2, págs.190.
[4] Cfr. Ac. s.t.j., de 25.02.2002, no processo n.º220/02.
[5] Cfr. Revisão do processo penal: os recursos, in Que Futuro para o Direito Processual Penal, pags.189 a 195.
[6] Cfr. R.P.C.C., ano 20, n.º 4, págs.629 a 642.