Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
485/18.9IDFAR.E1
Relator: MARIA MARGARIDA BACELAR
Descritores: CONVERSÃO DA MULTA EM PRISÃO SUBSIDIÁRIA
CONTRADITÓRIO
Data do Acordão: 11/09/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário:
O incidente da conversão da multa em prisão subsidiária inicia-se com a promoção do Mº Pº nesse sentido.
No entanto, antes de mais, deve ser ordenada a audição do arguido para vir dizer o que tiver por conveniente sobre a possibilidade de lhe vir a ser aplicada a supra mencionada prisão subsidiária, urgindo, pois, neste incidente de conversão da multa em prisão subsidiária, observar o contraditório (cfr. Art.°s 61°, n.° l, alínea b) do C.P.Penal e 32°, n.º 5 da C.R.P.).
Decisão Texto Integral:

Acordam, em conferência, os juízes da Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:

No Processo nº 485/18.9IDFAR.E1 do Tribunal Judicial da Comarca de Portimão - Juízo Local Criminal de Portimão – J3, o Recorrente (…), por não se conformar com o despacho de 20.04.2021, dele interpôs o presente recurso, extraindo da concernente motivação as seguintes conclusões:

«1º Por douto Despacho de Fls., veio o douto Tribunal a quo, determinar que, por a pena de multa no valor de €1.560,00, e transitada em julgado a 09.09.2020, após fracionamento em prestações, não ter sido oportunamente liquidada, inclusive sem pagamento de qualquer prestação, face à impossibilidade de cobrança coerciva, deverá a pena ser convertida em pena de prisão subsidiária pelo tempo de 173 dias, caso, a multa não seja paga no todo ou em parte.

2º Não se conforma o Arguido ora Recorrente, em virtude das circunstâncias atuais do País e do Mundo, concatenadas com a sua própria condição, resultando, supervenientemente, situação de manifesta impossibilidade de cumprimento tempestivo do pagamento da multa em que veio condenado.

3º O Arguido trabalha na área de limpezas, que desenvolve em Hotéis e imóveis explorados como alojamento local, atividade esta fustigada de forma severa e continuada desde Março de 2020.

4º Coincidiram as obrigações penais do Arguido com o início da última fase “comatosa” do Turismo no Algarve. Sem Turismo não há ocupação, sem ocupação não são necessárias limpezas. Desde novembro que o Arguido não aufere qualquer rendimento.

5º É por demais evidente e notório que o Arguido não contribuiu para a situação de incapacidade financeira que obsta a satisfação da multa penal, pelo que ao não diferir no tempo a exigência do cumprimento da obrigação, optando pela prisão subsidiária, violou o disposto no artigo 47º nº 4 do Código Penal.

6º Poderia sempre, por legalmente preferível, o Tribunal a quo, bem sabendo da circunstâncias do País e do Arguido, optar pela suspensão da prisão subsidiária, determinando injunções ao Arguido,

7º O que, não fazendo como não fez, o despacho ora recorrido viola o disposto no artigo 49º 8 nº 3 do Código Penal.

8º Em data posterior ao prolação do despacho ora em crise, o Arguido requereu novo prazo para pagamento da multa em que veio condenado, em prestações, tendo entregue ao Tribunal a quantia de 350,00 €, tudo conforme consta de Requerimento e seus anexos de 12/05/2021 com Ref. CITIUS 8914002.

9º Em suma e por fim, sempre se realçará que o Arguido, ora Recorrente, não paga porque não TEM, não TEM porque não pôde trabalhar por mais de 7 meses, nem é suscetível de apoios, certo sendo que a sua situação precária é ulterior à sentença e decorre de factos públicos, notórios e alheios ao seu domínio, o que obsta à aplicação de prisão subsidiária.

Nestes termos, e nos demais que Vs. Exas. doutamente suprirão, deverá o douto Despacho ora recorrido ser revogado e substituído por Venerando Acórdão que conceda ao Arguido, ora Recorrente, assim merecendo integral provimento o presente Recurso.

Porém Vs. Exas decidirão como for de JUSTIÇA.

O Digno Magistrado do Ministério Público respondeu, concluindo pela improcedência do recurso.

Neste Tribunal o Exmo. Procurador-Geral Adjunto teve vista dos autos, emitindo parecer no sentido do provimento do recurso.

O recorrente, notificado nos termos e para os efeitos previstos no art.º 417º, nº 2 do CPP, quedou-se pelo silêncio, nada tendo vindo alegar.

Efectuada a conferência prevista no art.º 419º do CPP, cumpre agora apreciar e decidir.

O OBJECTO DO RECURSO

Como se sabe, é pelas conclusões que o recorrente extrai da sua motivação que se determina o âmbito de intervenção do tribunal ad quem, sem prejuízo para a apreciação de questões de oficioso conhecimento e de que ainda se possa conhecer (Cfr., neste sentido, o Ac do STJ de 3/2/99 (in BMJ nº 484, pág 271); o Ac do STJ de 25/6/98 (in BMJ nº 478, pág 242); o Ac do STJ de 13/5/98 (in BMJ nº 477, pág 263); SIMAS SANTOS/LEAL HENRIQUES (in “Recursos em Processo Penal”, p. 48); GERMANO MARQUES DA SILVA (in “Curso de Processo Penal”, vol. III, 2ª ed., 2000, p. 335); JOSÉ NARCISO DA CUNHA RODRIGUES (in “Recursos”, “Jornadas de Direito Processual Penal/O Novo Código de Processo Penal”, 1988, p. 387); e ALBERTO DOS REIS (in “Código de Processo Civil Anotado”, vol. V, pp. 362-363) («São só as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas conclusões da respectiva motivação que o tribunal ad quem tem de apreciar» (GERMANO MARQUES DA SILVA, ibidem).

A questão suscitada pelo Recorrente (nas conclusões da sua motivação) é a seguinte:

1) Não se deveria ter ordenado imediatamente a conversão da pena de multa em prisão subsidiária, nos termos do disposto no Art.º 49º, nº 1, do C. Penal?

Apreciando:

Numa brevíssima resenha dos autos, e seguindo de perto a explanação feita pelo Digno Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal recorrido, verificamos que:

O arguido (...) foi condenado, nos presentes autos, por sentença transitada em julgado, pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelo art. 105º, nºs 1, 2 e 4, 6º e 7º do Regime Gera das Infracções Tributárias, com referencia aos arts. 27º/1, 29º/1, al. c), e 41º/1 do C.I.V.A. e art. 30º/2 do C. Penal, na pena de 260 (duzentos e sessenta) dias de multa, à taxa diária de € 6,00 (seis euros), o que perfaz a quantia de € 1.560,00 (mil, quinhentos e sessenta euros).

O arguido requereu, em 05/10/2020, o pagamento da pena de multa em que foi condenado em 12 prestações mensais, iguais e sucessivas, no valor de130,00 € cada, o que lhe foi deferido, por despacho de 22/10/2010, tendo recebido as guias para iniciar o pagamento dessas prestações em Outubro/Novembro de 2020 e sido advertido que a falta de pagamento de uma prestação determinaria o imediato vencimento das restantes (cfr. fls. 513).

Contudo, até fevereiro de 2021, o arguido não efectuou o pagamento voluntário de nenhuma dessas prestações nem veio aos autos informar o motivo desse não pagamento ou requerer algo, tendo sido declaradas vencidas todas e o arguido sido notificado para proceder ao pagamento da totalidade da referida pena de multa, sob pena de a mesma vir a ser cobrada coercivamente ou convertida em 173 dias de prisão subsidiária (cfr. fls. 519).

Pese embora tal notificação, o arguido, uma vez mais, nada pagou ou requereu, motivo pelo qual foi determinada a conversão da pena de 260 dias de multa em 173 dias de prisão subsidiária.

Foi, então, proferido o despacho recorrido, que se transcreve:

Como se promove, quanto à sociedade arguida.


*

O Ministério Público pronunciou-se relativamente à inviabilidade da cobrança coerciva das quantias em divida pelo(a) arguido(a) (…).

*

Por sentença transitada em julgado em 09.09.2020, foi o(a) arguido(a) condenado(a) na pena de 260 dias de multa, no montante total de € 1.560,00.

O arguido foi pessoalmente notificado da sentença na data da sua leitura e expressamente advertido para as consequências que adviriam do não pagamento da multa da sua responsabilidade.

Requereu o fraccionamento do pagamento da multa e custas, o que lhe foi deferido, não tendo, contudo, liquidado qualquer das prestações da pena de multa, não obstante a advertência relativamente às consequências do não pagamento, considerando-se, por conseguinte, todas vencidas.

Notificado(a) em 01.02.2021 para liquidar integralmente o valor da pena de multa, novamente com a expressa cominação que a ausência de pagamento implicaria o cumprimento de prisão subsidiária, o(a) arguido(a) nada regularizou.

Não justificou, em momento algum, as razões que estiveram subjacentes a tal omissão de pagamento, demonstrando, assim, absoluto desinteresse pelo presente processo e desrespeito pela condenação sofrida.

Em conformidade com o preceituado no art. 49º/1 do C.Penal, atenta a ausência de pagamento voluntário da multa e a impossibilidade de efectuar a sua cobrança coerciva, por inexistência de bens ou rendimentos, determina-se que o(a) arguido(a) cumpra prisão subsidiária, pelo tempo correspondente a 2/3 do remanescente da pena de multa a que foi condenado, o que perfaz 173 (cento e setenta e três) dias de prisão.

Notifique.

Após trânsito, passe os competentes mandados de detenção e condução do(a) arguido(a) ao Estabelecimento Prisional competente e remeta-os à autoridade policial competente para cumprimento, sendo o(a) arguido(a) expressamente advertido de que poderá, a todo o tempo, evitar total ou parcialmente a execução da prisão subsidiária, pagando, no todo ou em parte, a multa a que foi condenado(a) (cfr. art. 49º nºs 2 e 3 do C.Penal).

A pena de multa aplicada nos presentes autos ao arguido (...) é uma pena principal e é regulada pelos art.º 47.º a 49.º do Código Penal e 489.º a 491.º do Código de Processo Penal.

Como é sabido, a execução/cumprimento da pena de multa pode revestir duas modalidades distintas: o pagamento (do quantitativo correspondente ao número de dias fixado), voluntário e coercivo, e a prestação de dias de trabalho.

O art.º 489.º do Código de Processo Penal estabelece que:

1 – A multa é paga após o trânsito em julgado da decisão que a impõe e pelo quantitativo nesta fixado, não podendo ser acrescida de quaisquer adicionais.

2 – O prazo de pagamento é de 15 dias a contar da notificação para o efeito.

3 – O disposto no número anterior não se aplica no caso de pagamento da multa ter sido diferido ou autorizado pelo sistema de prestações.

Por seu turno, preceitua o art.º 47° do CP, que (...) 3 - Sempre que a situação económica e financeira do condenado o justificar, o tribunal pode autorizar o pagamento da multa dentro de um prazo que não exceda um ano, ou permitir o pagamento em prestações, não podendo a última delas ir além dos dois anos subsequentes à data do trânsito em julgado da condenação. 4 -Dentro dos limites referidos no número anterior e quando motivos supervenientes o justificarem, os prazos de pagamento inicialmente estabelecidos podem ser alterados. 5 - A falta de pagamento de uma das prestações importa o vencimento de todas."

Acrescenta o n° 1 do artigo 491° do CPP, que: “ Findo o prazo do pagamento da multa ou de alguma das suas prestações sem que o pagamento esteja efectuado, procede-se à execução patrimonial.”

E é do seguinte teor o art.º 49º do Código Penal: "1 - Se a multa, que não tenha sido substituída por trabalho, não for paga voluntária ou coercivamente, é cumprida prisão subsidiária pelo tempo correspondente reduzido a dois terços, ainda que o crime não fosse punível com prisão, não se aplicando, para o efeito, o limite mínimo dos dias de prisão constante do n° 1 do artigo 41.°. 2 - O condenado pode a todo o tempo evitar, total ou parcialmente, a execução da prisão subsidiária, pagando, no todo ou em parte, a multa a que foi condenado. 3 - Se o condenado provar que a razão do não pagamento da multa lhe não é imputável, pode a execução da prisão subsidiária ser suspensa, por um período de 1 a 3 anos, desde que a suspensão seja subordinada ao cumprimento de deveres ou regras de conduta de conteúdo não económico ou financeiro. Se os deveres ou as regras de conduta não forem cumpridos, executa-se a prisão subsidiária; se o forem, a pena é declarada extinta.

Da conjugação dos citados preceitos legais temos que:

A multa, enquanto pena criminal, só pode ser cumprida ou executada depois do trânsito em julgado da respectiva sentença condenatória.

O prazo fixado para o pagamento é o de quinze dias a contar da notificação feita para o efeito ao condenado, salvo no caso de ter sido admitido o seu pagamento em prestações.

As consequências da falta de pagamento da multa no prazo assinalado estão fixadas no supra citado art.º 491º do Código de Processo Penal.

Não sendo possível o cumprimento coercivo, seguir-se-á o cumprimento da prisão subsidiária, sem prejuízo de o condenado a ela poder obstar, pagando a todo o tempo a multa, ou demonstrar que a razão do não pagamento não lhe é imputável, podendo neste caso a execução ser suspensa desde que subordinada ao cumprimento de deveres ou regras de conduta de conteúdo não económico ou financeiro, de acordo com o disposto art.º 49º do Código Penal.

No caso sub judice, a multa não foi paga dentro do prazo legal.

O arguido requereu, tendo-lhe sido deferido, o pagamento da multa em prestações.

Por conseguinte, foram fixadas 12 prestações mensais e sucessivas, tendo recebido as guias para iniciar o pagamento dessas prestações em Outubro/Novembro de 2020

O prazo de pagamento da multa, quando esta for paga em prestações, decorre até se terem vencido todas as prestações.

A falta de pagamento de uma das prestações importa o vencimento de todas – Art.º 47º, n° 5 do C. Penal. O despacho que autorizou o pagamento da multa em prestações refere esta cominação e o arguido foi dela notificado.

O arguido não liquidou qualquer das prestações da pena de multa.

No iter executivo, resta assim o pagamento coercivo ou a conversão da multa em prisão subsidiária.

O pagamento coercivo é o que se obtém pelo produto da venda de bens do condenado em acção executiva, que no caso segue a forma da execução por custas. Mas para tanto importa que ao arguido sejam conhecidos bens exequíveis. Não sendo conhecidos bens penhoráveis segue-se o processo da conversão.

Estatui o Art.° 491°, n° 2 do C.P. Penal que tendo o condenado bens suficientes e desembaraçados de que o tribunal tenha conhecimento ou que ele indique no prazo de pagamento, o Mº Pº promove logo a execução, que segue os termos da execução por custas.

Por seu turno, preceitua o Art.° 116°, n° l do C.C.J. que o Mº Pº instaurará a execução se ao devedor de custas ou multas forem conhecidos bens penhoráveis.

Donde, a contrario, resulta, que não havendo bens conhecidos ou sendo estes insuficientes ou impenhoráveis, o Mº Pº não promove a execução, que redundaria num acto inútil (cfr. Art.º 137° do C.P.Civil).

Desta forma, o incidente da conversão da multa em prisão subsidiária inicia-se com a promoção do Mº Pº nesse sentido.

In casu, a Digna Magistrada do Mº Pº veio promover «… ao abrigo do disposto no artigo 49º, n.º 1, do Código Penal, que a pena de 260 dias de multa seja convertida em 173 dias de prisão subsidiária.

Mais promovo que sejam passados os respectivos mandados de captura do arguido, para cumprimento da pena de prisão subsidiária, sendo certo que o mesmo deverá ser advertido que pode obstar ao cumprimento da prisão subsidiária se efectuar o pagamento da multa em que foi condenado, conforme previsto no artigo 49º, n.º 2, do Código Penal.»

No entanto, antes de mais, deveria a Mm.ª Juiz a quo ordenar a audição do arguido para vir dizer o que tiver por conveniente sobre a possibilidade de lhe vir a ser aplicada a supra mencionada prisão subsidiária, urgindo, pois, neste incidente de conversão da multa em prisão subsidiária, observar o contraditório (cfr. Art.°s 61°, n.° l, alínea b) do C.P.Penal e 32°, n.º 5 da C.R.P.).

«E dizemos isto porque, em nossa opinião, se deve inequivocamente averiguar o motivo de o condenado não cumprir, maxime dando-lhe oportunidade de se pronunciar.

Não se mostrando que o arguido cumpriu a pena de multa (voluntária ou coercivamente), há que saber qual a razão da falta de cumprimento dessa obrigação, e só com esse conhecimento se decidirá sobre a aplicação da prisão subsidiária.

Como resulta do Art.º 49º, n.° 3 do C. Penal, o mero incumprimento não conduz logo e irremediavelmente à aplicação da prisão subsidiária, pois que o condenado pode provar que o não pagamento lhe não é imputável.

Mesmo havendo lugar à aplicação da prisão subsidiária, esta pode ser suspensa, nos termos da predita norma, sendo certo que sempre é preciso dar, ao condenado, oportunidade de se pronunciar e eventualmente provar que o não pagamento lhe não é imputável.

Por sua vez, se a lei exige a audição, a contrario, do arguido quando haja que decidir pela suspensão da execução da prisão subsidiária, com mais pertinência deverá ouvir o mesmo antes de decretar a medida de substituição. Tanto mais que ouvindo-o poderá, desde logo, aferir da possibilidade de suspensão da prisão que tinha como objectivo decretar.

Ora, inexistem dúvidas de que o direito processual penal é verdadeiro direito constitucional aplicado, numa dupla dimensão: na derivada de os fundamentos do processo penal serem, simultaneamente, os alicerces constitucionais do Estado e na resultante de a concreta regulamentação de singulares problemas processuais ser conformada em termos jurídico-constitucionais.

Por isso, o direito a um processo com todas as garantias de defesa respeita à generalidade dos actos processuais e permite que, em cada situação processual concreta, nos possamos interrogar se a garantia constitucional foi efectivamente respeitada.

Se a multa, que não tenha sido substituída por trabalho, não foi paga voluntária ou coercivamente, é cumprida prisão subsidiária.

Cremos, contudo, não se poder dispensar o respeito pelo contraditório, já que isso violaria ditames constitucionais, designadamente o Art.º 27° da C.R.P..

Nos termos do já supra referido Art.º 61º, n.° l, alínea b) do C.P.Penal, o arguido goza em especial, em qualquer das fases do processo e, salvas as excepções da lei, do direito de ser ouvido pelo tribunal ou pelo juiz de instrução sempre que eles devam tomar qualquer decisão que pessoalmente o afecte.

Trata-se, pois, da emanação do Princípio do Contraditório com assento constitucional no também já supra mencionado Art.º 32°, n.° 5 da C.R.P..

No caso em apreciação, os autos demonstram que a Mm.ª Juiz a quo não assegurou a possibilidade de o arguido exercer o contraditório antes de decidir a conversão da pena de multa em prisão subsidiária.

Ora, a falta de audição do arguido no caso em que a lei comina essa obrigatoriedade, por colidir com direitos fundamentais de defesa, constitui nulidade insuprível, passível, de ser suscitada em fase de recurso (cfr. Art.º 410°, n.º 3 do C.P. Penal). (Ac. da Relação de Lisboa, proferido no Proc. 432/08.6POLSB-A.L1 de que foi relator o Exmo Desembargador José Manuel Simões de Carvalho, no qual a presente Relatora foi Adjunta).

O que tudo nos conduz à inevitável conclusão de que o despacho recorrido não pode subsistir.

Eis por que, o presente recurso irá proceder.

Fica, consequentemente, prejudicado o conhecimento das questões suscitadas nas conclusões da motivação do Recorrente.

DECISÃO

Nestes termos, acordam, em conferência, os juízes da Secção criminal do Tribunal da Relação de Évora em conceder provimento ao recurso, ainda que por razões diversas, e em consequência, em declarar nulo o despacho recorrido que deve ser substituído por outro que exerça o devido contraditório nos supramencionados termos.

Sem tributação.

Évora, 9 / 11 / 2021

Maria Margarida Bacelar

Martinho Cardoso