Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | JOSÉ MANUEL BARATA | ||
Descritores: | PROVA PERICIAL ASSINATURA LETRA | ||
Data do Acordão: | 01/12/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Sumário: | I.- Uma recolha de autógrafos, para fins periciais com o objetivo de determinar a autoria da letra ou assinatura de um escrito, deve incluir a escrita de um texto ditado e não relacionado com a questão que vai ser analisada, devendo ainda quem produz os autógrafos pegar na caneta que utiliza de diversas formas, de maneira a obviar que se possa orientar a escrita no sentido pretendido por quem produz os autógrafos. II.- Se um relatório pericial conclui ser provável que uma assinatura não tenha sido aposta pelo punho da embargante, esse facto, só por si, não é suficiente para afastar a certeza processual de que foi a embargante a autora da assinatura, se, ao mesmo tempo, tiver sido produzida prova testemunhal, segura e credível, bem como prova documental que a confirma que, conjugadas, possibilitem ao tribunal formar a convicção segura da autoria do escrito, ao abrigo do princípio da livre apreciação motivada das provas – artigo 607.º/5, do CPC. (Sumário do Relator) | ||
Decisão Texto Integral: | Proc.º 1191/17.7T8LLE-A.E1 Acordam os Juízes da 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora Recorrente: (…) Recorrido: Banco (…), S. A. * No Tribunal Judicial da Comarca de Faro, Juízo de Execução de Loulé – Juiz 1, no âmbito da oposição à execução proposta por Banco (…), S. A., contra (…) e «(…), Unipessoal, Lda.» e (…), veio a primeira executada embargar pedindo a procedência da oposição e que seja julgada extinta a execução.Para tanto alegou, em suma, que não reconhece como sua a assinatura aposta na livrança. Contestou o Exequente, alegando, em suma, que, em 03/08/2009, o embargado celebrou com a sociedade “(…), Unipessoal, Lda.” o contrato de empréstimo CLS n.º (…), do qual a embargante (…) se constituiu avalista, e no âmbito do referido contrato, e em garantia das obrigações emergentes do mesmo, foi subscrita uma livrança, avalizada pela embargante e quando assinou o contrato de empréstimo tinha conhecimento que se constituía avalista do mesmo, e não podia ignorar que assinava igualmente uma livrança que, em caso de incumprimento, viria a ser preenchida. Termina pedindo a improcedência dos embargos e o prosseguimento da execução. Após instrução realizou-se audiência, tendo sido proferida a seguinte decisão: Nos termos expostos, o Tribunal decide: a) Julgar os embargos de executado improcedentes, por não provados e, em consequência, a execução deverá prosseguir os seus trâmites também contra a Embargante/executada (…), o que se determina; b) Condenar a Embargante/executada (…)no pagamento das custas e demais encargos com o processo, sem prejuízo da proteção jurídica que lhe foi concedida. Registe e notifique, sendo também o (a) Senhor (a) Agente de Execução. Loulé, 30 de agosto de 2022. * Não se conformando com o decidido, a recorrente apelou da sentença formulando as seguintes conclusões, que delimitam o objeto do recurso sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, artigos 608.º/2, 609.º, 635.º/4, 639.º e 663.º/2, do CPC: 1. A prova testemunhal produzida pelo embargado em audiência de julgamento, ainda que conjugado com a prova documental, no sentido de que a assinatura aposta na livrança é da embargante, foi insuficiente. 2. Na verdade, ouvidos os depoimentos das testemunhas do embargado e contidas nos ficheiros áudio 20220602104831-3890082-3993059-3 e 20220602110501-3890082-3993059, nos períodos de gravação acima transcritos e identificados, concluímos que nenhuma das testemunhas tinha conhecimento direto dos factos ou deles se recordava, nomeadamente do momento da assinatura da livrança por parte da embargante. 3. O Mmº Juiz obteve a prova por presunção, mas, salvo melhor opinião, neste caso, não o devia ter feito. 4. Acresce que a prova pericial, realizada por duas vezes e tendo como objeto o exame à letra e assinatura da embargante concluiu sempre no mesmo sentido: há probabilidade da assinatura aposta no contrato e livrança não ser da embargante. 5. E as assinaturas da embargante foram colhidas de momentos temporais distintos e distanciados como consta do ultimo relatório pericial. 6. A prova documental tida em conta pelo Mm Juiz foi o contrato e no que se refere às assinaturas aí apostas, nomeadamente a da embargante, o Mm Juiz partiu do facto conhecido de que no contrato existia um carimbo de conferência de assinaturas onde constava o número mecanográfico da segunda testemunha do embargado para concluir que isto é suficiente para provar que a embargante esteve no banco e aí assinou com o seu punho e letra a livrança. 7. Refira-se, de novo, que a mencionada segunda testemunha da embargada de nada se recorda como decorre do seu depoimento, nomeadamente aos ficheiro de gravação 20220602110501-3890082-3993059 ao 09:17. a instâncias da mandatária da embargante que perguntou” Não se recorda em particular como ocorreu a assinatura deste contrato?”, respondeu aos 09:19” Não”, “E desta letra?” pergunta a mandatária da embargante aos 09:20, tendo a testemunha respondido aos 09:23 “Não faço a mínima ideia”. 8. Entende a embargante que esta prova é insuficiente tanto mais que a embargante impugnou a letra e assinatura da livrança e não confessou ter assinado tal título. Termos em que deve ser revogada a decisão de que se recorre, considerando-se não provado que a embargante assinou a livrança dada à execução, procedendo os presentes embargos, com o que se fará Justiça. * 1.- A impugnação da matéria de facto. 2.- A consequência quanto ao julgamento de direito, em caso de procedência da matéria de facto. * A matéria de facto fixada na 1ª instância é a seguinte:1. Factos provados: Com interesse para a decisão, consideram-se assentes os seguintes factos: 1. O «Banco (…), S. A.» intentou em 04/04/2017 a execução contra «(…), Unipessoal», (…) e (…), apresentando como título executivo a Livrança n.º (…), no valor de € 11.677,27, com data de emissão de 03/08/2009 e data de vencimento de 21/12/2016 subscrita pela sociedade “(…), Unipessoal, Lda.” e avalizada por (…) e (…) que apuseram as respetivas assinaturas no verso da Letra de Câmbio a seguir à expressão “Bom por aval à firma subscritora”; 2. A Livrança referida em 1), não foi paga na data do seu vencimento, nem posteriormente; 3. Foi celebrado acordo reduzido a escrito, no essencial com o seguinte teor “(…) Exmos. Srs. (…), Unipessoal Lda., Rua (…), 8125-171 Quarteira. No seguimento das conversações que tivemos o prazer de manter com V. Exas. comunicamos ter este Banco aceite conceder a V. Exas uma facilidade de crédito, sob a forma de um empréstimo, destinado a liquidação da Conta Dinâmica e necessidades pontuais de tesouraria e que se regerá pelas condições gerais de crédito do Banco, subscritas por V. Exas. em 22-01-2008 e pelas seguintes condições especificas: 1. Montante: O Banco concede a V. Exas um empréstimo no montante de Eur 20.000,00 (vinte mil euros), quantia da qual se confessa devedora ao Banco. 2. Forma. Este empréstimo funcionará através da conta empréstimo n.º (…) aberto em nome de V. exas, sendo o montante mutuado, por débito naquela, creditado na conta D. O., com o n.º (…). O extrato de conta emergente do empréstimo será documento bastante para a prova da dívida e da sua movimentação. O empréstimo é utilizado integralmente e de uma só vez, com data de valor de 03-08-2009. 3. Prazo, Reembolso de capital e pagamento de juros: 2557 dias, desde 03-08-2009, vencendo-se a última prestação deste contrato com data de valor de 03-08-2016. O reembolso de capital e pagamento dos juros será efetuado em prestações sucessivas e postecipadas, conforme plano, Anexo I, que para os devidos e legais efeitos faz parte integrante do presente contrato (…) 4. Taxa de juro anual. O capital mutuado ao abrigo desta facilidade de crédito, vencerá juros calculados dia a dia à taxa a que corresponder a Euribor (European Interbank Rate) a 30 dias, em vigor no inicio de cada período de contagem de juros, acrescida de 4.250000 pontos percentuais... (…) 12. Caução. Para garantia das obrigações emergentes deste contrato V. Exas. comprometem-se desde já, a entregar ao Banco: 12.1 Uma livrança subscrita por V. exas e avalizada por (…) e (…), ficando o Banco expressamente autorizado, através de qualquer um dos seus funcionários, a preenche-la designadamente no que se refere à data de vencimento, ao local de pagamento e aos valores, até ao limite das responsabilidades emergentes deste contrato (capital e juros) e assumidas por V. Exas perante o Banco, acrescido de todos e quaisquer encargos com a selagem, caso se verifique o incumprimento por parte de V. Exas de qualquer das obrigações que lhe competem e que aqui são referidas (…) 13. Juros moratórios. Em caso de mora ou incumprimento do pagamento do capital e/ou juros, incidirá sobre o respetivo montante e durante o tempo em que o incumprimento se verificar, a taxa de juro moratória (taxa de juro remuneratória fixada na cláusula taxa de juro anual, acrescida da sobretaxa legal em vigor à data do incumprimento). 14. Antecipação do vencimento, resolução e “cross default”. 1. A falta de cumprimento pontual por V. Exas. de quaisquer das obrigações emergentes deste contrato, nomeadamente a falta de pagamento pontual de qualquer prestação de reembolso de capital e/ou de pagamento dos respetivos juros, confere ao Banco o direito de pôr termo imediato ao presente contrato, e de considerar imediatamente vencido, independentemente de interpelação para cumprimento, a totalidade do capital em divida, cujo pagamento se tornará, então, consequente e imediatamente exigível, acrescido dos juros remuneratórios e/ou moratórios devidos, bem como os demais encargos ou despesas legal ou contratualmente exigíveis (…) 15. Acordo. O acordo de V. Exas. e dos Avalistas ao clausulado deste contrato, decorre da devolução do duplicado anexo, devidamente assinado por V. Exas. e por cada um dos Avalistas (…) Porto, 03 de agosto de 2009. Banco (…), S. A. (Por Procuração) (…) O Subscritor (Carimbo e/ou assinatura) …, Unipessoal Lda. (…) Os Avalistas: (…) e (…) As assinaturas conferem com as existentes nos nossos ficheiros. Banco (…). As assinaturas conferem por semelhança com as existentes nos nossos arquivos. 03 de agosto de 2009. Banco (…), S.A. (…)”; 4. O «Banco (…), S.A.» subscreveu e remeteu por via postal registada com aviso de receção, à executada “(…), Unipessoal, Lda.”, a missiva que faz fls. destes autos, no essencial com o seguinte teor “Exmos. Srs. (…), Unipessoal, Lda. Rua (…), 8125-171 Quarteira. Porto, 29 de novembro de 2016. Assunto: contrato de empréstimo CLS n.º (…) Exmos. Senhores, Por não aprovisionamento da conta D. O., para efeitos de débito das sucessivas prestações vencidas do contrato de financiamento com o número … celebrado entre V. Exas. e o Banco (…), S.A., vimos por este meio informar que, nesta data foi efetuado o preenchimento da livrança de caução em branco para o efeito subscrita por V. Exas. Nesta conformidade, e nos termos do acordo de preenchimento constante do aludido contrato, informamos que a mesma se encontra a pagamento na morada abaixo indicada com vencimento fixado para o próximo dia 21 de dezembro de 2016, pelo montante de € 11.677,27, assim discriminado: Capital: Eur. 8.684,23. Juros. Eur. 2.245,80. Imposto Selo. Eur. 89,82. Selagem do título. Eur. 58,38. Despesas/comissões/IS Eur. 599,04. Caso o pagamento não ocorra na data de vencimento indicada, ver-nos-emos forçados a promover as diligências necessárias à cobrança coerciva do valor em dívida. Para eventual esclarecimento sobre este assunto, queria contactar: (…), telefone: (…) Banco (…), S.A. (…)”; 5. O «Banco (…), S.A.» subscreveu e remeteu por via postal registada com aviso de receção, ao executado (…), a missiva que faz fls. destes autos, no essencial com o seguinte teor “Exmo. Senhor (…). Rua (…), 8125-171 Quarteira. Porto, 29 de novembro de 2016. Assunto: contrato de empréstimo CLS n.º (…) Exmo. Senhor, Por não aprovisionamento da conta D. O., para efeitos de débito das sucessivas prestações vencidas do contrato de financiamento com o número (…) celebrado com o Banco (…), S.A., vimos por este meio informar que, nesta data foi efetuado o preenchimento da livrança de caução em branco para o efeito avalizada por V. Exa. e subscrita por (…), Unipessoal, Lda. Nesta conformidade, e nos termos do acordo de preenchimento constante do aludido contrato, informamos que a mesma se encontra a pagamento na morada abaixo indicada com vencimento fixado para o próximo dia 21 de dezembro de 2016, pelo montante de € 11.677,27, assim discriminado: Capital: Eur. 8.684,23. Juros. Eur. 2.245,80. Imposto Selo. Eur. 89,82. Selagem do título. Eur. 58,38. Despesas/comissões/IS Eur. 599,04. Caso o pagamento não ocorra na data de vencimento indicada, ver-nos-emos forçados a promover as diligências necessárias à cobrança coerciva do valor em dívida. Para eventual esclarecimento sobre este assunto, queria contactar: (…), telefone: (…), Banco (…), S.A. (…)”; 6. O «Banco (…), S.A.» subscreveu e remeteu por via postal registada com aviso de receção, à executada (…), a missiva que faz fls. destes autos, no essencial com o seguinte teor “Exma. Senhora. (…) Rua (…), 8125-171 Quarteira. Porto, 29 de novembro de 2016. Assunto: contrato de empréstimo CLS n.º (…) Exma. Senhora, Por não aprovisionamento da conta D. O., para efeitos de débito das sucessivas prestações vencidas do contrato de financiamento com o número (…)celebrado com o Banco (…), S.A., vimos por este meio informar que, nesta data foi efetuado o preenchimento da livrança de caução em branco para o efeito avalizada por V. Exa. e subscrita por (…), Unipessoal, Lda. Nesta conformidade, e nos termos do acordo de preenchimento constante do aludido contrato, informamos que a mesma se encontra a pagamento na morada abaixo indicada com vencimento fixado para o próximo dia 21 de dezembro de 2016, pelo montante de € 11.677,27, assim discriminado: Capital: Eur. 8.684,23. Juros. Eur. 2.245,80. Imposto Selo. Eur. 89,82. Selagem do título. Eur. 58,38. Despesas/comissões/IS Eur. 599,04. Caso o pagamento não ocorra na data de vencimento indicada, ver-nos-emos forçados a promover as diligências necessárias à cobrança coerciva do valor em dívida. Para eventual esclarecimento sobre este assunto, queria contactar: (…), telefone: (…) Banco (…), S.A. (…)”; 2. Factos não provados: Inexistem quaisquer factos não provados. *** Conhecendo.1.- A impugnação da matéria de facto. Alega a recorrente que o ponto 1. da matéria e facto provada dever ser considerado não provado quanto à assinatura, aposta na livrança, por (…) na qualidade de avalista. Fundamenta tal pretensão na circunstância de nos depoimentos das testemunhas, (…) e (…), se inferir que nenhuma teve conhecimento direto dos factos ou deles se recorda, nomeadamente do momento da assinatura da livrança pela recorrente. Para além disso, a prova pericial à letra e assinatura da recorrente concluiu “há probabilidade da assinatura aposta no contrato e livrança não ser da embargante”. Acresce que o tribunal a quo se baseou para prova deste facto apenas no teor do contrato junto aos autos, com especial relevância para o facto de neste constar o número mecanográfico da testemunha (…) quanto à conferência de assinaturas da recorrente, entre a efetuada à sua frente e a existente na ficha de cliente existente no banco, concluindo que tal prova é suficiente para demonstrar que a recorrente esteve no banco e assinou a livrança em causa nos autos. Mas esta testemunha afirmou que nada se recordava acerca deste contrato, pelo que a prova apreciada se revela insuficiente para dar como provada a factualidade em causa. É a seguinte a factualidade, que se destaca em itálico: 1.- O «Banco (…), S.A.» intentou em 04/04/2017 a execução contra «(…), Unipessoal, Lda.», (…) e (…), apresentando como título executivo a Livrança n.º (…), no valor de € 11.677,27, com data de emissão de 03/08/2009 e data de vencimento de 21/12/2016 subscrita pela sociedade “(…), Unipessoal, Lda.” e avalizada por (…) e (…) que apuseram as respetivas assinaturas no verso da Letra de Câmbio a seguir à expressão “Bom por aval à firma subscritora”; Acerca desta questão o tribunal a quo fundamentou como segue: “(…) o Tribunal valorou o título dado à execução, a Livrança n.º (…), no valor de € 11.677,27, com data de emissão de 03/08/2009 e data de vencimento de 21/12/2016, subscrita pela executada “(…), Unipessoal, Lda.” e avalizada por (…) e (…) que apuseram as respetivas assinaturas no verso da livrança a seguir à expressão “Bom por aval à firma subscritora”, valorou o Contrato de empréstimo no montante de € 20.000,00, datado de 03/08/2009, do qual resulta que o “Banco (…), S.A.” a pedido da executada “(…), Unipessoal, Lda.”, emprestou-lhe o montante de € 20.000,00, a reembolsar em prestações mensais de capital e juros, vencendo-se a primeira prestação em 03/09/2009 e a última em 03/08/2016, mais resultando desse contrato que para garantia das obrigações emergentes do contrato foi entregue ao “Banco (…), S.A.” uma livrança em branco, subscrita pela mutuária “(…), Unipessoal, Lda.” e avalizada por (…) e (…), ficando o “Banco (…), S.A.” autorizado a preenchê-la, em caso de incumprimento do contrato, constando nesse contrato as assinaturas de (…) e (…), e a certificação, por parte do “Banco (…), S.A.” que essas assinaturas de (…) e (…) conferem com as existentes nos seus ficheiros, (…) e foi valorado o relatório pericial e os respetivos esclarecimentos, constando nesse relatório “Conclusão: Com base nas evidências observadas na comparação das amostras problema e de referência, e face aos resultados obtidos, conclui-se como provável que a escrita suspeita da assinatura (doc. 1 deste relatório) não seja da autoria de (…)”. Foi valorado o depoimento de (…), depoimento que se revelou sério e credível, esclarecendo que conhece a embargante (…) como cliente do Banco, a qual tinha um estabelecimento comercial em Quarteira, sendo que as assinaturas nos documentos bancários são feitas presencialmente e o colaborador do Banco verifica se a assinatura corresponde à assinatura da pessoa que está a outorgar o documento, e quando existe livrança associada ao contrato, a livrança é assinada no mesmo momento em que é assinado o contrato, não tendo a depoente tido intervenção no contrato de empréstimo junto aos autos, mas confrontada com o mesmo reconheceu as rúbricas dos colaboradores do Banco, (…) e (…), já falecido. O Tribunal valorou o depoimento de (…), depoimento que se revelou sério e credível, denotando a testemunha conhecimento direto dos factos, esclarecendo que a embargante (…) tinha conta na agência da Rua (…), em Quarteira e a depoente teve intervenção no contrato de empréstimo junto aos autos, com o também colaborador do Banco, (…), entretanto falecido, sendo que as assinaturas constantes no contrato foram feitas presencialmente e foram conferidas pela depoente e por (…) e a livrança foi assinada em simultâneo com o contrato e foi dada uma cópia do contrato e todos os intervenientes. Mais referiu que, ao que se recorda, a embargante tinha contraído outros empréstimos junto do “Banco (…), S.A.”, e confrontada com o contrato junto aos autos, confirmou que o mesmo contém a sua rúbrica e a rúbrica do já falecido (…). Foram valoradas as declarações de parte da embargante (…), de 67 anos de idade, divorciada, esclarecendo que o seu então marido (…) constituiu a sociedade “(…)” e a declarante era sócia gerente da mesma e em 1991/1992 abriu uma conta conjunta com o seu então marido na agência do Banco situada na Rua (…), em Quarteira, e separou-se de (…) em 2007 e depois disso não foi ao Banco com ele para assinar quaisquer documentos, nomeadamente o contrato e a livrança junto aos autos, os quais nunca assinou.” Vejamos. Esta análise crítica da prova produzia quanto à questão em apreço não merece censura. Com efeito, os depoimentos das duas testemunhas referidas, ao contrário do alegado pela recorrente, foram portadores de conhecimento com razão de ciência que se revelaram fundamentais para que fosse dada como provada a assinatura da livrança pela embargante na qualidade de avalista. Ambas descreveram o percurso que na agência bancária onde trabalhavam era seguido sempre que se celebrava um contrato de concessão de crédito, garantido por uma livrança. Este percurso encontra expressão no contrato de mútuo e na livrança que constam dos autos; verifica-se que as assinaturas apostas no contrato e na livrança foram efetuadas na presença de dois funcionários (um deles a testemunha ...) onde constam as assinaturas de contraentes e avalistas, efetuadas na sua presença, confirmado a sua veracidade por semelhança com as existentes nas fichas de assinatura existentes no banco. Se a testemunha (…) descreveu o modus operandi deste processo, a testemunha (…) não só o descreveu como consta no contrato a sua assinatura e confirmou que esteve presente, porque de outro modo não figuraria ali a sua assinatura. Ficou também claro que em caso algum a assinatura do mútuo é efetuada em momento separado da assinatura da livrança que garante o pagamento, uma vez que a livrança faz parte do contrato de mútuo (a única exceção acontece apenas nos casos em que a lei obriga à feitura do documento por notário, o que, como é bom de ver, ainda confere maior credibilidade e segurança ao ato). Assim sendo, não restaram dúvidas ao tribunal a quo de que a assinatura aposta na livrança no lugar do aval foi aposta pelo punho da recorrente, o que também acontece com este tribunal superior, pelas razões invocadas. A grande questão levantada no recurso e de onde a recorrente pretende retirar a conclusão de que não está provado o facto em causa, prende-se com a conclusão do relatório pericial à letra e assinatura aposta na livrança que concluiu: “como provável que a escrita suspeita da assinatura (doc. 1 deste relatório) não seja da autoria de (…)”. Vejamos. Num relatório pericial nunca os peritos atribuem à análise de um documento uma certeza de 100% de que a letra ou a assinatura é de determinada pessoa. Vejam-se as especificações no final do relatório que conferem ao mais alto grau de certeza “Muitíssimo provável” ser ao mínimo “Muitíssimo provável Não” ser, mas nunca concluem por uma certeza absoluta ou o inverso. Tudo porque estamos em presença de uma ciência humana e não de uma ciência precisa, como a matemática (mesmo assim ainda foram detetadas duas semelhanças entre as letras analisadas e os autógrafos recolhidos). A este contexto, juntamente com o facto de a recolha de autógrafos ter sido escassa e pouco diversificada, bem como o número reduzido de letras da escrita a analisar, não permitiram uma comparação segura e mais conclusiva quanto à sua autoria. O relatório também fez notar esta dificuldade: Nota: O traçado de reduzida extensão, apenas dois nomes, com menos características identificativas, da escrita suspeita da assinatura (doc. 1 desse relatório) limitaram muito o confronto com os autógrafos de (…), estes últimos mais fluentes e espontâneos. Ora, como se sabe, o sistema de justiça está obrigado a sempre privilegiar a objetividade e, se, lhe forem fornecidos dados escassos para retirar conclusões, estas sofrerão e revelarão essa escassez. É o caso dos autos. Por isso se não deve dar às conclusões do relatório pericial a relevância que pretende a recorrente, porque se o material para análise fosse mais extenso e diverso e os autógrafos recolhidos também se tivessem baseado num texto ditado sem relação direta com a questão sobre que se deveria debruçar o relatório, a forma de escrever não poderia ser orientada por quem escreve e sabe o que vai ser comparado, sendo que as possibilidades de comparação teriam outras condições de nos proporcionar um resultado mais próximo da realidade. Não obstante, sempre se assinala que o relatório pericial não afirma que é muitíssimo provável que a escrita em causa não tenha sido efetuada pela recorrente (com o que estaríamos próximos da certeza absoluta), mas não é o caso dos autos. Também se deixa vincado que o funcionário que recolhe os autógrafos deve sempre ter o cuidado de obviar a que o autor dos autógrafos possa orientar o que escreve em determinado sentido, por isso, se deve obrigar a ir alterando a forma como pega na caneta e posiciona a mão em relação à escrita de tal maneira que lhe seja impossível esconder a sua verdadeira forma de redigir letras e fazer a respetiva ligação, o que não parece ter sido seguido no caso presente e é comum em casos semelhantes. É claro que sempre poderia o tribunal ad quem ordenar a baixa do processo para que fosse repetido o relatório pericial com a qualidade acima referida (artigo 662.º/2, do CPC). Contudo, a prova obtida pelo depoimento das testemunhas acima referidas e a análise do contrato e da livrança junta aos autos, onde os depoimentos das testemunhas encontram pleno assentimento e confirmação, tornam inútil o próprio relatório pericial, pelo que a realização de novo relatório se revelaria um ato também inútil, tudo porque a prova assim analisada criticamente satisfaz o princípio da livre apreciação motivada das provas (artigo 607.º/5, do CPC). O que vale por dizer que a impugnação da matéria e facto é improcedente, devendo ser confirmado o acervo probatório do tribunal da primeira instância. Neste sentido, cfr Ac. TRE de 18-10-2018, Proc.º n.º 803/06.2TBVNO-A.E1: I – Devendo a prova pericial, em processo civil, ser apreciada livremente pelo tribunal, cumpre atender, não apenas à conclusão indicada pelos peritos como resultado do exame efetuado, mas também aos demais elementos constantes do relatório pericial, designadamente aos dados extraídos pelos peritos da análise a que procederam; II – Estando em causa um exame pericial à letra e à assinatura e não tendo os peritos logrado alcançar um parecer que, com suficiente certeza técnico-científica, confirme ou negue a aposição pelos embargantes das assinaturas e das expressões que lhes são imputadas, tendo concluído por meros juízos de probabilidade – “provável” e “pode ter sido” –, sem lhes atribuir qualquer grau de certeza científica, deverá o julgador apreciar os dados extraídos pelos peritos da análise comparativa efetuada à letra e às assinaturas em causa, conjugados com outros meios probatórios, à luz do princípio da livre apreciação da prova, de forma a aferir se permitem considerar provados os factos impugnados; III – Se resultou assente, da conjugação da prova pericial com a prova testemunhal, a inexistência de indícios de falsificação grosseira na escrita das expressões e das assinaturas impugnadas, a deteção de várias semelhanças e a não deteção de diferenças relevantes no confronto com as escrita e as assinaturas genuínas, bem como a não colocação em causa pelos embargantes da genuinidade desses escritos e assinaturas no âmbito de contactos anteriormente efetuados pelo embargado com vista à cobrança do montante titulado pela livrança, estes factos indiciam, à luz das regras de experiência comum e dos princípios da lógica, que as expressões e assinaturas em causa foram apostas pelo punho dos embargantes a quem são imputadas. * 2.- A consequência quanto ao julgamento de direito, em caso de procedência da matéria de facto.Não tendo a recorrente logrado demonstrar que a assinatura aposta na livrança dada à execução não foi feita pelo seu punho, e baseando-se a solução de direito na procedência da matéria de facto impugnada, verifica-se que se mostra prejudicada a apreciação da matéria e direito, pelo que a apelação é totalmente improcedente, devendo a execução prosseguir os seus termos. *** Sumário:
(…) *** DECISÃO. Em face do exposto, a 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora julga a apelação improcedente e confirma a decisão recorrida, devendo a execução prosseguir os seus termos. Custas pela recorrente – Artigo 527.º do CPC. *** Évora, 12-01-2023 José Manuel Barata (relator) Cristina Dá Mesquita Rui Machado e Moura |