Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1/11.3TACCH.E1
Relator: MARTINS SIMÃO
Descritores: NOTIFICAÇÃO DE ACÓRDÃO PROFERIDO PELO TRIBUNAL DA RELAÇÃO
ARGUIÇÃO DE NULIDADES
Data do Acordão: 03/20/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: ARGUIÇÃO DE NULIDADE
Decisão: INDEFERIDA
Sumário:
I - É entendimento jurisprudencial que os acórdãos proferidos, em recurso, pelos tribunais Superiores não têm de ser notificados pessoalmente ao arguido, mas apenas ao respectivo defensor.

II – Quando não for admissível recurso para o STJ, a arguição de nulidades do acórdão recorrido deve ser feita no prazo de 10 dias.
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, os Juízes da 1ª Subsecção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:

No dia 6 de Junho de 2017, foi proferido acórdão nestes autos em que se julgou parcialmente procedente o recurso interposto pelo arguido M., tendo-se reduzido as penas parcelares aplicadas, pelos crimes de tráfico de estupefacientes, p. e p. no art.21º nº 1 do DL nº 15/93, de 22-1 e de detenção de arma proibida, p. e p. no art. 86º nº 1, alínea c) e d) da Lei nº 5/2006, de 23 de Fevereiro, respectivamente para 4 anos e 9 meses de prisão e 1 ano e 3 meses de prisão.

Em cúmulo jurídico foi o arguido condenado na pena única de 5 anos e 3 meses de prisão.

No dia 8 de Junho de 2017 foi enviada carta para notificação do arguido do acórdão proferido em recurso.

Foi junto aos autos documento comprovativo de que a mandatária só recebeu a carta em 16-6-2017, tendo sido alegado que o arguido não tomou conhecimento nesta data do acórdão.

O arguido interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, no dia 4 de Setembro de 2017, invocando a nulidade do acórdão nos termos do art. 379.º, nº 2, do CPPenal com o argumento de que o mesmo não estava fundamentado, no segmento em que face à prova indirecta se concluiu que o arguido procedia à cedência de cannabis a outras pessoas em troca de quantias monetárias.

Em síntese, e para uma melhor compreensão da questão suscitada, que por virtude do arguido, para além de outros objectos, deter:

- no dia 11 de Julho de 2012 na traseira de sua casa, catorze pés da planta canábis (liamba) – folhas e sumidades floridas – com o peso bruto de 3.500 gr. peso liquido de 3.361 gr e um grau de pureza de 1,8% - THC (A9tetrahidrocanabinol);

- noutra residência: duas placas e vários pedaços de canábis (resina), com o peso bruto total de 237,093 gr e o peso líquido de 233,783 gr; três sacos de plástico com canábis (liamba) com o peso bruto de 5,249 gr e o peso líquido de 2,051 gr. e no quintal da residência trinta e seis plantas de canábis – folhas e sumidades floridas-, com o peso bruto de 11.200 grs, peso liquido de 11.061,500 grs e um grau de pureza de 0,7% - THC .

E ainda vários sacos de plástico pequenos, uma faca com resíduos de canabis e um livro com o Título “Cannabis alquimicum – Extraccion Casera de Canabinoides” de R.B. Sancha.

Se ter inferido, pelas razões constantes da motivação, que destinava numa parte não concretamente apurada ao seu próprio consumo e noutra parte à cedência a outras pessoas (factos nºs 15 e 17 de matéria provada).

Por despacho de 10-10-2007, o recurso não foi admitido.

O arguido reclamou para o Supremo Tribunal de Justiça, tendo sido decidido pelo Exmo. Vice-Presidente deste Tribunal que o acórdão da Relação era irrecorrível, nos termos do art, 400º nº 1 al. f) do CPPenal e que a nulidade deve ser arguida perante o Juiz julgador.

O arguido veio requerer a apreciação da nulidade invocada no requerimento de interposição de recurso.

O Ministério Público apôs o visto.

Cumpre apreciar e decidir.

A mandatária do arguido foi notificada do acórdão desta Relação, no dia 16-6-de 2017.

Dispõe o art. 425º do CPPenal, sob a epígrafe “Acórdão” no seu nº 6 que “o acórdão é notificado aos recorrentes aos recorridos e ao Ministério Público”.

Esta constitui a norma que especialmente prevê a notificação das decisões proferidas por tribunais superiores e do teor da mesma resulta que a notificação dos acórdãos (diversamente da notificação da sentença) aos recorrentes e aos recorridos pode ser feita ao respectivo defensor (art. 113º nº 10).

Aos defensores cabe o dever funcional e deontológico de transmitir ao arguido o resultado do julgamento feito no tribunal superior.

Como se refere no acórdão do Tribunal Constitucional nº 59/99 in www.tribunal constitucional.pt “de harmonia com tais deveres, há-de concluir-se que o arguido, por intermédio do conhecimento que lhe é dado pelo seu defensor… ficará ciente dos motivos fácticos e jurídicos que o levaram a ser considerado com agente de um ilícito criminal e da reação a nível de imposição da pena, que lhe foi aplicada pelo Estado, ao exercer o jus puniendi”.

O Supremo tribunal de Justiça já foi chamado por diversas vezes a pronunciar-se sobre esta questão e tem entendido que o acórdão de um tribunal superior proferido em sede de recurso só carece de ser notificado ao advogado ou ao defensor do arguido (cfr. neste sentido os acórdãos do STJ de 03-05-2007, proc. nº 1594/07- 5ª Secção, de 20-04-2006, proc. nº 1433/06- 5ª Secção, de 06-10-2005, proc.nº 1259/05- 5ª Secção.

No mesmo sentido, se concluiu no acórdão do Tribunal Constitucional nº 512/2014 onde se refere: “ do disposto no art. 113º nº 9 (actual nº 10) do CPP não resulta a obrigação de notificação do acórdão proferido pelos tribunais superiores ao arguido, com ressalva do princípio da suficiência da notificação ao advogado”. E ainda o acórdão nº 667/2014 do mesmo Tribunal refere-se que “do disposto no art. 113º nº 9 do CPP não resulta a obrigação de notificação ao arguido de acórdão proferido pelos tribunais superiores, não colidindo tal interpretação normativa com os arts. 20 e 30 da Constituição.

Deste modo, conclui-se que a lei não exige a notificação pessoal do acórdão proferido em recurso ao arguido.

No caso em apreço, o acórdão foi regularmente notificado à mandatária do arguido, nos termos do art. 425º nº 6 através de carta enviada em 8-06-2007, tendo esta junto aos autos comprovativo de que só recebeu a correspondência em 16-06-2017.

O arguido veio invocar a nulidade da decisão no dia 4-09-2017, já após o decurso do prazo de 10 dias.

Ora, não sendo admissível recurso do acórdão, as eventuais nulidades de que o mesmo possa padecer devem ser arguidas nos termos gerais, no prazo de 10 dias, que é o previsto, no art. 105º, nº 1 do CPPenal.

O arguido apresentou o requerimento de arguição da nulidade do acórdão, depois de decorrido o prazo de 10 dias, após a notificação do seu mandatário, pelo que é de indeferir por intempestivo o referido requerimento.

Assim, em face do exposto, indefere-se o requerimento da arguição da nulidade do acórdão proferido, por intempestivo.

Custas pelo arguido com taxa de justiça que fixamos em duas UCs.

Notifique.

Évora, 20-03-2017

(Texto elaborado e revisto pelo relator).

José Maria Martins Simão

Maria Onélia Neves Madaleno