Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
181/18.7T8STB-A.E1
Relator: VÍTOR SEQUINHO
Descritores: EMBARCAÇÃO
RECLAMAÇÃO DE CRÉDITOS
Data do Acordão: 01/31/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: O concurso de credores constitui a sede própria para se julgar se os créditos reclamados existem, se a hipoteca invocada pelo reclamante garantia, inicialmente, todos aqueles créditos e se a mesma hipoteca subsiste após a reversão da embarcação decorrente da cessação do contrato de concessão de exploração.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: Processo n.º 181/18.7T8STB-A.E1


No âmbito de um pedido para demolição de embarcação apresentado nos termos dos artigos 92.º e seguintes do Regulamento Geral das Capitanias, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 265/72, de 31.07, veio “Caixa de Crédito Agrícola Mútuo da (…), CRL”, ao abrigo do disposto no artigo 94.º, n.º 3, do mesmo diploma legal, apresentar uma reclamação de créditos, alegando ser titular de uma hipoteca, incidente sobre a referida embarcação, denominada “(…)”, constituída para garantia de créditos seus contra “(…), Transportes Fluviais do Sado, SA”, créditos esses vencidos e não pagos. Concluiu pedindo o reconhecimento dos créditos reclamados, no montante global de € 1.206.562,87, acrescido de juros vincendos contabilizados desde o dia 30.01.2018 até integral pagamento, e a sua graduação no lugar que lhes compete.

“APSS – Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra, SA”, apresentou impugnação, na qual, além de alegar desconhecer se os créditos reclamados existem, sustentou, por um lado, que dos próprios documentos juntos pela reclamante resulta que alguns desses hipotéticos créditos nunca estiveram garantidos por hipoteca sobre a embarcação em causa e, por outro, que, em qualquer caso, a mesma hipoteca deveria ser considerada extinta por efeito da reversão da mesma embarcação decorrente da cessação do contrato de concessão de exploração que manteve com a “(…)”. A impugnante concluiu pugnando pela improcedência da reclamação de créditos.

A Caixa de Crédito Agrícola Mútuo apresentou resposta à impugnação, mantendo a posição inicialmente assumida, à qual a APSS, por seu turno, respondeu.

Em seguida, o tribunal a quo proferiu a seguinte sentença:

“A reclamação de créditos apenas visa a verificação e graduação dos créditos.

Não é neste incidente que se apreciam e julgam factos e direito que impliquem uma sentença de mérito sobre respeita a extinção da hipoteca pelo termo do referido Contrato de Concessão.

Esta questão não foi ainda julgada pelo Tribunal Cível.

Termos em que, decido remeter as Partes para os meios comuns para, antes de mais, ser julgada a extinção da hipoteca pelo termo do referido Contrato de Concessão, declarando extinta a presente instância incidental.

Custas, pelo mínimo legal, a cargo das Partes, na proporção de metade.

Valor: o indicado no requerimento inicial executivo.

Registe.


*


Suspendo por 30 dias a instância executiva por ocorrer motivo justificado – art. 272º, nº 1, do CPC.

Findos esses 30 dias, deverá uma a requerente do presente incidente ou a exequente comprovar nos autos de execução a instauração da ação declarativa cível para resolução da extinção da hipoteca pelo termo do referido Contrato de Concessão.

Após trânsito em julgado, extraia cópia da presente decisão final e junto à execução.

Not.”

A APSS recorreu desta decisão, tendo formulado as seguintes conclusões:

I. O processo executivo em que foi apresentada pela Caixa Agrícola a reclamação de créditos que deu origem ao presente apenso, iniciou-se com a remessa pela Capitania do Porto de Setúbal, nos termos do art. 94.º/3 do Regulamento Geral das Capitanias, de processo de desmantelamento/demolição da embarcação em causa, face ao seu estado de degradação que, além do mais, coloca em risco o ambiente e o funcionamento do Porto de Setúbal – cfr. n.ºs 1 a 4 do texto supra;

II. Conforme estabelece aquele preceito, o processo é remetido para tribunal, para, aplicando-se as regras do processo de execução, serem, nomeadamente, convocados os credores, verificados e graduados os créditos – cfr. n.ºs 1 a 4 do texto supra;

III. Na sequência de reclamação de créditos pela Caixa Agrícola, a APSS, ora recorrente, apresentou impugnação à mesma, em que, além do mais, (i) impugnou a existência dos alegados créditos da Caixa Agrícola (v. art. 13.º da referida impugnação); invocou que, mesmo se tais créditos existissem (ii) não estariam garantidos pela hipoteca invocada pela Caixa Agrícola (v. arts. 13.º a 29.º impugnação) e que, em qualquer dos casos, (iii) aquela hipoteca sempre se encontraria extinta (arts. 30.º e segs. da impugnação) – cfr. n.ºs 1 a 4 do texto supra;

IV. Pela douta sentença recorrida, proferida pelo tribunal a quo, em 08.07.2018, aludindo à questão da “extinção da hipoteca”, decidiu “remeter as partes para os meios comuns” e declarar “extinta a presente instância incidental” – cfr. n.ºs 1 a 4 do texto supra;

V. Com o devido respeito – e é verdadeiramente muito –, a douta sentença recorrida, enferma de nulidade e de erros de julgamento – cfr. n.ºs 1 a 4 do texto supra;

VI. A sentença enferma de nulidade, nos termos do art. 615.º/1/b) do CPC, por não se especificarem os fundamentos de direito que justificam a decisão – cfr. n.ºs 5 a 7 do texto supra;

VII. Por outro lado, conforme acima referido, na impugnação apresentada, a APSS, ora recorrente, previamente à questão da “extinção da hipoteca” (arts. 30.º e segs. da Impugnação), (i) impugnou a existência dos alegados créditos da Caixa Agrícola (v. art. 13.º da referida impugnação); e (ii) invocou que os alegados créditos invocados pela Caixa Agrícola não estariam garantidos por aquela hipoteca (v. arts. 13.º a 29.º impugnação) – cfr. n.ºs 7 e 8 do texto supra;

VIII. Ora, estas duas questões são prévias àquela (da “extinção da hipoteca”), e caso fossem julgadas procedentes verificar-se-ia a inutilidade da apreciação da questão da “extinção da hipoteca”, pois, por um lado, não existiria o crédito (alegadamente garantido), ou, por outro lado, esses alegados créditos não estariam garantidos pela hipoteca (mesmo se esta não se tivesse extinguido) – cfr. n.ºs 7 e 8 do texto supra;

IX. Assim sendo, por não ter apreciado aquelas duas questões prévias (além de também não ter apreciado a questão da “extinção da hipoteca”), a douta sentença padece de omissão de pronúncia, o que também é gerador de nulidade (v. art. 615.º/1/d) do CPC) – cfr. n.ºs 7 e 8 do texto supra;

X. Por outro lado, com o devido respeito, a douta sentença enferma de erros de julgamento – cfr. n.º 9 do texto supra;

XI. Em primeiro lugar, o fundamento para a extinção da instância não se integra em nenhum dos taxativamente previstos no art. 277.º do CPC, com a epígrafe “Causas de extinção da instância”, bem como no art. 278.º do CPC, com a epígrafe “Casos de absolvição da instância” – cfr. n.º 10 do texto supra;

XII. Em segundo lugar, as normas aplicáveis ao presente incidente impunham decisão diversa – cfr. n.ºs 7 e 8 do texto supra;

XIII. A remessa do processo de demolição/desmantelamento da embarcação para tribunal – como se verificou in casu –, visa a convocação dos credores, a verificação e graduação dos créditos com garantia sobre as embarcações em causa – cfr. n.ºs 10 a 13 do texto supra;

XIV. Nos termos dos arts. 788.º/1/3 e 8, 789.º/2 a 4 e 791.º/4 do CPC o processo de reclamação dos créditos e respetiva impugnação tem precisamente por objecto, não só a apreciação do crédito reclamado, mas também a respectiva garantia real – no caso a hipoteca invocada pela Caixa Agrícola (v. Professor Lebre de Freitas, na sua obra “A Ação Executiva à Luz do Código de Processo Civil de 2013”, 6ª edição, pág. 364) – cfr. n.ºs 10 a 13 do texto supra;

XV. Assim sendo, a douta sentença recorrida, ao decidir não apreciar a questão da extinção da hipoteca invocada pela reclamante, Caixa Agrícola, na reclamação de créditos e impugnada pela APSS, violou o disposto nos arts. 789.º/1, 789.º/2 e 3 e 791.º/4 do CPC – cfr. n.ºs 10 a 13 do texto supra;

XVI. Em terceiro lugar, cumpre notar que o processo principal respeita à demolição de embarcação, que, nos termos legais, se fundamenta na degradação da mesma, conforme estipulado nos arts. 91.º e segs. Do Regulamento Geral das Capitanias), pelo que está subjacente a este tipo de processos, se pretende que os mesmos sejam céleres, o que é totalmente frustrado pela decisão da douta sentença recorrida, em que o douto tribunal (sempre com o devido respeito) se recusou a decidir, o que, na prática, remete para uma via de facto consumado, pois, entretanto, não só se acentuará a degradação da embarcação, como esta corre o risco de se afundar com as inerentes graves consequências para o ambiente e para o funcionamento do Porto de Setúbal – cfr. n.º 14 do texto supra;

XVII. Em quarto lugar, precisamente porque é admissível a apreciação desta questão – extinção da hipoteca –, em processo de execução, esse douto Tribunal da Relação de Évora em acórdão, de 20.09.2007, Proc. 2327/06-2, disponível em www.dgsi.pt (e junto como Doc. 17 da Impugnação apresentada pela APSS), decidiu em situação totalmente idêntica à invocada pela APSS, ora recorrente, na sua impugnação, que a hipoteca se extingue com o termo da concessão – cfr. n.º 15 do texto supra;

XVIII. Registe-se, aliás, que, não obstante a extensão da impugnação da APSS, ora recorrente, no que respeita à questão da extinção da hipoteca com o termo da concessão, verifica-se que no requerimento da Caixa Agrícola, de 21.05.2018 (em resposta à impugnação da APSS, de 08.05.2018), reconhece-se o termo da Concessão (v. art. 5.º e 6.º daquela resposta da Caixa Agrícola) e que as embarcações em causa eram as que, no passado, estavam afectas à mesma (v. art. 7.º daquela Resposta da Caixa Agrícola, com referência ao art. 3.º da Reclamação de Créditos da Caixa Agrícola de 05.02.2018), pelo que o tema da extinção da hipoteca restringe-se à questão jurídica de saber se as hipotecas constituídas sobre bens da concessão se extinguem com o termo da concessão – i.e. precisamente a mesma questão que foi decidida naquele Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 20.09.2007, Proc. 2327/06-2 (disponível em www.dgsi.pt e junto como Doc. 17 da Impugnação apresentada pela ora Recorrente em 23.05.2018) – cfr. n.º 15 do texto supra;

XIX. Em quinto lugar, como acima referido, a douta sentença alude à questão da “extinção da hipoteca”, mas nada refere quanto às outras duas questões distintas e prévias àquela, invocadas na impugnação da ora recorrente à reclamação de Créditos da Caixa Agrícola, a saber: a (i) impugnação a existência dos alegados créditos da Caixa Agrícola (v. art. 13.º da referida impugnação); o (ii) invocado quanto aos alegados créditos invocados pela Caixa Agrícola não estariam garantidos por aquela hipoteca (v. arts. 14.º a 27.º impugnação) – cfr. n.º 16 do texto supra;

XX. Ora, estes fundamentos da impugnação integram-se, também, claramente, no previsto nos arts. 789.º/1, 789.º/2 e 3 e 791.º/4 do CPC, pelo que não podiam deixar de ter sido apreciados pelo douto tribunal – cfr. n.º 16 do texto supra;

XXI. Em sexto lugar, de uma leitura conjunta dos arts. 551.º/1, 788.º, 789.º e 791.º, todos do CPC, resulta que a reclamação de créditos é um apenso declarativo da ação executiva, pelo que a questão da “extinção da hipoteca” sempre deveria ser decidida nesse âmbito e não remeterem-se as partes para os meios comuns e declarar-se extinta a instância (v. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 31.03.2009, proferido no Proc. 202-A/1999.L1-1, disponível em www.dgsi.pt, e Professor Lebre de Freitas, “A Acção Executiva à Luz do Código de Processo Civil de 2013”, 6ª edição, pág. 363 – 366 – cfr. n.ºs 17 a 20 do texto supra);

XXII. Além disso, e também sempre com o devido respeito, a douta sentença recorrida viola o princípio constitucional da tutela jurisdicional efectiva, previsto no art. 20.º da Constituição da República Portuguesa, sendo que, para se considerar cumprido este princípio, não basta a remissão para os tribunais comuns, maxime face ao facto consumado que, entretanto, se verificaria e que, justamente, o regime aqui aplicável procurou afastar, conforme acima demonstrado (cfr., também, o art. 152.º do CPC) – cfr. n.º 20 do texto supra;

XXIII. A douta sentença recorrida enferma, assim, de erros de julgamento, tendo violado o art. 20.º da CRP e os arts. 152.º, 277.º, 278.º, 551.º/1, 789.º/1, 789.º/2 e 3 e 791.º/1 e 4 do CPC – cfr. n.º 21 do texto supra;

XXIV. Finalmente, deve ser atribuído ao processo o valor de € 30.000,01, ou, caso assim não se considere, o valor de € 1.206.562,87 que a Caixa Agrícola atribuiu à reclamação de créditos (v. art. 304.º/1 do CPC) – cfr. n.ºs 22 a 23 do texto supra;

XXV. No último caso, requerer-se a dispensa do remanescente da taxa de justiça, por se verificarem os pressupostos da parte final do n.º 7 do art. 6.º do RCP, conforme acima demonstrado – cfr. n.º 23 a 25 do texto supra.

Termos em que, com o douto suprimento de V. Exas., deve o presente recurso ser julgado procedente, declarando-se nula ou revogando-se a douta sentença recorrida, e, em qualquer dos casos, decidir-se pela procedência da impugnação da APSS, ora recorrente, à reclamação de créditos apresentada pela Caixa Agrícola, como é de lei e Justiça.

O recurso foi admitido.

A questão fundamental a resolver é se a sentença recorrida é nula.

O n.º 3 do artigo 94.º do Regulamento Geral das Capitanias, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 265/72, de 31.07, estabelece que, feito o depósito previsto no n.º 2, o processo para demolição de embarcação (regulado nos artigos 92.º e seguintes do mesmo diploma) é remetido ao tribunal da comarca da sede da repartição marítima a fim de, por apenso, aí se processar, nos termos aplicáveis do processo de execução para pagamento de quantia certa, a convocação dos credores, verificação, graduação e pagamento dos seus créditos. Por via desta remissão, é aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 786.º e seguintes do CPC.

Como anteriormente referimos, a CCAM apresentou, ao abrigo do disposto no artigo 788.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, uma reclamação de créditos, alegando ser titular de uma hipoteca, incidente sobre a embarcação cuja demolição é pretendida, constituída para garantia de créditos seus contra “(…), Transportes Fluviais do Sado, SA”, créditos esses vencidos e não pagos. A APSS apresentou impugnação, nos termos do artigo 789.º do CPC, na qual, além de alegar desconhecer se os créditos reclamados existem, sustentou, por um lado, que dos próprios documentos juntos pela reclamante resulta que alguns desses hipotéticos créditos nunca estiveram garantidos por hipoteca sobre a embarcação em causa e, por outro, que, em qualquer caso, a mesma hipoteca deveria ser considerada extinta por efeito da reversão da mesma embarcação decorrente da cessação do contrato de concessão de exploração que manteve com a “(...)”. Houve lugar a resposta da CCAM, nos termos do artigo 790.º do CPC.

Na sequência da tramitação descrita, cabia, em seguida, ao tribunal a quo, cumprir o disposto no artigo 791.º do CPC. O n.º 1 deste artigo estabelece que, se a verificação de algum dos créditos impugnados estiver dependente de produção de prova, seguem-se os termos do processo comum declarativo, posteriores aos articulados; o despacho saneador declara, porém, reconhecidos os créditos que o puderem ser, embora a graduação de todos fique para a sentença final. O n.º 2 estabelece que, se nenhum dos créditos for impugnado ou a verificação dos impugnados não depender de prova a produzir, profere-se logo sentença que conheça da sua existência e os gradue com o crédito do exequente, sem prejuízo do disposto no n.º 4.

Ora, o tribunal a quo não fez nada disto. Nem ordenou que se seguissem os termos do processo comum declarativo posteriores aos articulados, nos termos do n.º 1 do artigo 791.º do CPC, nem proferiu sentença nos termos do n.º 2 do mesmo artigo, conhecendo da existência e graduando os créditos reclamados. Em vez disso, o tribunal a quo proferiu uma decisão, que apenas qualificamos como sentença atendendo ao momento processual em que essa prolação ocorreu e ao efeito extintivo da instância através dela pretendido, mas que, formal e substancialmente, não apresenta qualquer semelhança como uma sentença de verificação e graduação de créditos. Nessa sentença, o tribunal a quo considerou que não é este o processo adequado para apreciar e julgar a extinção da hipoteca devido ao termo do contrato de concessão de exploração e que esta questão ainda não foi julgada pelo tribunal cível; com esse fundamento, remeteu as partes “para os meios comuns para, antes de mais, ser julgada a extinção da hipoteca pelo termo do referido Contrato de Concessão, declarando extinta a presente instância incidental”.

Salvo o devido respeito, isto não faz qualquer sentido e viola frontalmente o disposto no artigo 791.º do CPC. Resulta com toda a clareza deste preceito legal que, na sentença a proferir neste “processo declarativo de estrutura autónoma, mas funcionalmente subordinado ao processo executivo”[1], o juiz deverá conhecer da existência dos créditos reclamados e graduá-los, para o que, obviamente, terá de conhecer dos factos constitutivos, modificativos e extintivos desses créditos e das garantias reais invocadas que tiverem sido alegados pelas partes. Verificar e graduar créditos é precisamente isso e é isso que tem de ser feito neste processo, não nos “meios comuns” a que a sentença recorrida alude. Sendo certo que, ao contrário daquilo que poderia pensar-se ao ler a sentença recorrida, também este processo corre num tribunal cível.

Flui do exposto que o tribunal a quo deixou de se pronunciar sobre a totalidade das questões que devia apreciar, ou seja, repete-se, se os créditos invocados existem, se a hipoteca invocada garantia, inicialmente, todos aqueles créditos e se a mesma hipoteca subsiste após a reversão da embarcação decorrente da cessação do contrato de concessão de exploração. Consequentemente, a sentença recorrida padece da nulidade prevista no artigo 615.º, n.º 1, al. d), 1.ª parte, do CPC.

A sentença recorrida padece ainda da nulidade prevista na al. b) do n.º 1 deste último artigo, porquanto não especifica os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão tomada. Como resulta do seu cotejo com o disposto no artigo 607.º, n.ºs 2 a 4, do CPC, estamos perante uma decisão de tal forma deficiente que apenas pode ser qualificada como sentença atendendo ao momento processual em que foi proferida e à intencionalidade extintiva da instância através dela concretizada.

Impõe-se, assim, a anulação da sentença recorrida, para que o tribunal a quo cumpra o disposto no artigo 791.º do CPC.

Sumário:

O concurso de credores constitui a sede própria para se julgar se os créditos reclamados existem, se a hipoteca invocada pelo reclamante garantia, inicialmente, todos aqueles créditos e se a mesma hipoteca subsiste após a reversão da embarcação decorrente da cessação do contrato de concessão de exploração.

Decisão:

Acordam os juízes da 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora em julgar o recurso procedente, anulando a sentença recorrida e ordenando que o tribunal a quo cumpra o disposto no artigo 791.º do CPC.

Custas pela parte vencida a final.

Notifique.


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Évora, 31 de Janeiro de 2019

Vítor Sequinho dos Santos (relator)

José Manuel Lopes Barata

Maria da Conceição Ferreira



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[1] JOSÉ LEBRE DE FREITAS, A Ação Executiva à Luz do Código de Processo Civil de 2013, 7.ª edição, página 365.