Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
3188/21.3T8LLE-B.E1
Relator: JOSÉ MANUEL BARATA
Descritores: TÍTULO EXECUTIVO
SENTENÇA CONDENATÓRIA NÃO TRANSITADA
SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO
Data do Acordão: 03/16/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: Proposta execução com base em sentença condenatória e revogada a sentença, na pendência da execução, por acórdão do Supremo Tribunal de Justiça quanto ao pedido principal, mas não quanto ao pedido subsidiário, cuja apreciação foi ordenada, a execução deve ser suspensa até ao trânsito em julgado da decisão acerca do pedido subsidiário.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: Processo n.º 3188/21.3T8LLE-B.E1


Acordam os Juízes da 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora


Recorrente: (…) Limited – Sucursal em Portugal


Recorrido: (…) e mulher (…)

*

No Tribunal Judicial da Comarca de Faro Juízo de Execução de Loulé - Juiz 1, na execução proposta pelos recorridos contra a recorrente, cujo título executivo é constituído por uma sentença que condenou a executada no pedido, após interposição de recurso, o Tribunal da Relação de Évora revogou a sentença, o que foi confirmado em revista para o Supremo Tribunal de Justiça.
Contudo, não se pronunciaram as instâncias acerca do pedido subsidiário formulado pelos então autores e aqui recorridos, pelo que foi ordenada a baixa dos autos a fim de ser eliminada a omissão de pronúncia.
Com fundamento na revogação da decisão quanto ao pedido principal, a executada e ora recorrente formulou o seguinte requerimento no tribunal onde a sentença da primeira instância se encontrava em execução, em 21-10-2022:
(…) Limited - Sucursal em Portugal, executada nos autos à margem identificados intentados por:
(…) e mulher, (…), vem requerer a junção aos autos do acórdão proferido nos autos principais pelo Supremo Tribunal de Justiça em 14/07/2022, já transitado em julgado, que confirmou o acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação de Évora nos autos principais em 10/03/2022, que revogou a sentença proferida em primeira instância e aqui trazida à execução.
Correndo a execução nos próprios autos esta matéria é de conhecimento oficioso do tribunal.
Assim, confirma-se que a sentença trazida à execução se encontra revogada.
Encontrando-se confirmado que a sentença trazida à execução foi revogada, os presentes autos encontram-se desprovidos de título executivo e a execução deve ser julgada extinta, por falta de título executivo - artigos 704.º, n.º 2 e 277.º, alínea e), do Código de Processo Civil.

Este requerimento foi objeto da seguinte decisão, em 25-11-2022:
Refª CITIUS 43635215 e requerimento do senhor Agente de Execução de 03/11/2022:
Do expediente junto pela executada não consta a nota do trânsito em julgado do douto acórdão do Colendo Supremo Tribunal de Justiça.
Acresce que resulta desse douto acórdão “Decisão. Termos em que acordam (…) ordenar a baixa do processo ao Tribunal da Relação de Évora a fim de ali ser apreciado, em substituição do Tribunal de primeira instância recorrido, nos termos previstos no artigo 665.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, o pedido formulado pelos autores a título subsidiário…”, pelo que, ao contrário do alegado pela executada, a nosso ver, salvo o devido respeito por opinião contrária, não se pode afirmar, pelo menos por ora, que a sentença trazida à execução se encontra revogada e que os presentes autos se encontram desprovidos de título executivo, havendo que aguardar pelo douto acórdão que venha a ser proferido pelo Venerando Tribunal da Relação de Évora na sequencia do doutamente decidido pelo Colendo Supremo Tribunal de Justiça.
Em suma, diremos que não estão reunidos os pressupostos legais para que seja declarada extinta a execução, até porque está ainda pendente recurso interposto nestes autos pela executada tendo por objeto a apreciação da regularidade da sua citação, recurso esse que foi autuado por apenso (Apenso A).
Notifique, sendo também o senhor Agente de Execução.
*
Não se conformando com o decidido, a recorrente apelou do despacho formulando as seguintes conclusões, que delimitam o objeto do recurso sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, artigos 608.º/2, 609.º, 635.º/4, 639.º e 663.º/2, do CPC:
1- O presente recurso vem interposto do despacho datado de 25/11/2022, que julgou improcedente o que tinha sido requerido pela executada em 21/10/2022.
2- Entende a recorrente que, salvo o devido respeito por melhor opinião em contrário, não terá sido efetuada uma correta valoração dos elementos constantes dos autos e depois também não se fez uma correta aplicação do direito. O presente recurso é assim interposto da decisão quanto à matéria de direito.
3- No requerimento datado de 21/10/2022, a recorrente, em suma, deu conhecimento nos autos de execução do acórdão proferido nos autos principais pelo Supremo Tribunal de Justiça em 14/07/2022, já transitado em julgado em 12/09/2022, que confirmou o acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação de Évora nos autos principais em 10/03/2022, que revogou a sentença proferida em primeira instância e que é objeto da presente execução e que consequentemente a ação executiva se encontrava desprovida de título executivo e deve ser julgada extinta.
4- Encontrando-se confirmado pelo Supremo Tribunal de Justiça que a sentença de primeira instância que foi trazida à execução foi revogada, os presentes autos encontram-se desprovidos de título executivo e a execução deve ser julgada extinta por falta de título executivo – artigos 704.º, n.º 2 e 277.º, alínea e), do Código de Processo Civil.
5- Isto é matéria que é de conhecimento oficioso do tribunal e não carecia de ser trazida aos autos pela executada.
6- Todavia, o tribunal a quo que tinha conhecimento oficioso do que tinha sido determinado pelo Supremo Tribunal de Justiça – revogação definitiva da sentença de primeira instância que constitui o objeto da presente execução– mesmo depois de ter sido alertado para esse facto considera que não deve proceder à extinção da execução porquanto no referido acórdão do Supremo Tribunal de Justiça foi igualmente ordenada “… a baixa do processo ao Tribunal da Relação de Évora a fim de ali ser apreciado, em substituição do Tribunal de primeira instância recorrido, nos termos previstos no artigo 665.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, o pedido formulado pelos autores a título subsidiário…”
7- A decisão proferida pelo tribunal a quo não se encontra fundamentada de direito e é nula – artigo 615.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Civil.
8- A decisão proferida pelo tribunal a quo viola o disposto no artigo 10.º, n.º 5, do Código de Processo Civil.
9- Se bem que o Supremo Tribunal de Justiça também tenha ordenado a baixa do processo ao Tribunal da Relação para apreciação do pedido subsidiário que tinha sido formulado pelos AA., tal não suplanta o facto de que o Supremo Tribunal de Justiça revogou definitivamente a sentença que constitui o objeto da presente execução.
10- Seja o que for que venha a ser determinado pelo Tribunal da Relação nos autos principais tal já não terá reflexo na presente execução, porquanto o acórdão do Tribunal da Relação será um novo título e não será a sentença do tribunal de primeira instância datada de 11/10/2021, que constitui o objeto da presente execução e que foi revogada pelo acórdão proferido pelo Tribunal da Relação em 10/03/2022 e definitivamente revogada pelo acórdão do Supremo Tribunal de Justiça datado de 14/07/2022.
11- O despacho recorrido efetuou uma incorreta aplicação do direito, ainda por cima suportando a decisão que foi proferida por considerar que ainda estava pendente o recurso autuado por apenso, quando a decisão neste recurso tinha sido proferida em 10/11/2022 e determinou a suspensão da execução.
12- Assim, atento o disposto no 10.º, n.º 5, do Código de Processo Civil, porque o título que servia de suporte à presente execução foi revogado, a execução não dispõe de título executivo e deve ser extinta – artigos 704.º, n.º 2 e 277.º, alínea e), do Código de Processo Civil.
13- A decisão proferida no despacho recorrido não está em conformidade com as normas aplicáveis ao caso e deve ser corrigida por este Venerando Tribunal.
Nestes termos e nos mais de direito, deve o presente recurso ser julgado provado e procedente e por via dele ser revogado o despacho recorrido ordenando-se a extinção da execução por falta de título executivo, assim se fazendo Justiça.
*
A questões que importa decidir é a de saber se deve a execução ser extinta por falta de título executivo.
*
A matéria de facto a considerar é a que conta do relatório inicial.
***
Conhecendo.
Acerca da questão que é trazida à apreciação deste tribunal esta Relação já se pronunciou no Apenso A destes autos, por decisão de 10-11-2022, nos seguintes termos:
“2.2. Se falta título à execução
A segunda questão colocada no recurso prende-se com os efeitos da revogação da sentença condenatória dada à execução.
Sem prejuízo de afirmar a regra geral segundo a qual o exequente, ou qualquer credor, não pode ser pago sem prestar caução enquanto a sentença estiver pendente de recurso, a decisão recorrida não retirou efeitos (processuais) da revogação da sentença condenatória que titula a execução.
A Recorrente, por sua vez, considera que a revogação da sentença dada à execução “deve levar à extinção da execução que se encontra desprovida de título executivo”.
A solução parece estar a meio caminho.
Sobre os requisitos da exequibilidade da sentença o artigo 704.º do CPC dispõe designadamente o seguinte:
“1 - A sentença constitui título executivo depois do trânsito em julgado, salvo se o recurso contra ela interposto tiver efeito meramente devolutivo.
2 - A execução iniciada na pendência de recurso extingue-se ou modifica-se em conformidade com a decisão definitiva comprovada por certidão; as decisões intermédias podem igualmente suspender ou modificar a execução, consoante o efeito atribuído ao recurso que contra elas se interpuser.
3 - Enquanto a sentença estiver pendente de recurso, não pode o exequente ou qualquer credor ser pago sem prestar caução.”
Em princípio só a sentença (condenatória) transitada em julgado pode ser executada, exceciona este princípio a sentença não transitada desde que o recurso dela interposto tenha efeito meramente devolutivo o que, aliás, constitui regra no recurso de apelação e de revista (artigos 647.º, n.º 1 e 676.º do CPC).
Iniciada a execução na pendência do recurso a sorte da execução depende da sorte da sentença que em definitivo (insuscetível de recurso ou de reclamação – artigo 628.º do CPC) vier a ser encontrada pelo tribunal de recurso; se a sentença vier a ser revogada a execução extingue-se; se a sentença vier a ser modificada a execução modifica-se de acordo com ela.
Diferente se a decisão for intermédia, isto é, se o tribunal de recurso proferir decisão que, por sua vez, venha a ser objeto de recurso; nesta situação a execução:
- “suspender-se-á ou modificar-se-á consoante a decisão da instância for total ou parcialmente revogatória da anterior, se ao novo recurso for também atribuído efeito meramente devolutivo”;
- “prosseguirá tal como foi instaurada e poderá ser extinta ou modificada com a decisão definitiva, se, pelo contrário, for atribuído ao recurso efeito suspensivo, o qual se traduz em suspender a execução da decisão intermédia proferida” [Lebre de Freitas, A Ação Executiva, 7ª ed. pág. 53].
No caso, na pendência da execução, a sentença que lhe serve de título executivo foi revogada por acórdão da Relação do qual veio a ser interposto recurso de revista, admitido com efeito meramente devolutivo [cfr. alínea h), supra].
Revogada totalmente a sentença dada à execução por decisão intermédia da qual foi interposto recurso de revista com efeito meramente devolutivo, a execução deve ser suspensa até ao trânsito em julgado da decisão da revista.”
Porque concordamos em absoluto com a decisão proferida acerca da mesma questão na sua essência, a execução suspende-se até ao trânsito em julgado da decisão que vier a recair acerca do pedido subsidiário, formulado na mesma sentença que foi revogada quanto ao pedido principal, mas que o não foi quanto ao pedido subsidiário, desconhecendo-se ainda qual a decisão que merecerá a final.
Tudo porque, para além do mais, enquanto a sentença estiver pendente de recurso, não pode o exequente ou qualquer credor ser pago sem prestar caução.
Quando se estabilizar na ordem jurídica esta decisão, o tribunal a quo, onde corre termos a execução, se pronunciará acerca da extinção ou prosseguimento da execução, consoante seja improcedente ou procedente o pedido subsidiário.
A decisão em crise está suficientemente fundamentada pelo que se não verifica a invocada nulidade por falta de fundamentação.
O que equivale a dizer que improcede a apelação e se confirma o despacho recorrido.
***
Sumário:
(…)
***
DECISÃO.
Em face do exposto, a 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora julga a apelação improcedente e confirma o despacho recorrido.
Custas pela recorrente – Artigo 527.º do CPC
Notifique.
***
Évora, 16-03-2023
José Manuel Barata (relator)
Cristina Dá Mesquita
Eduarda Branquinho