Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
3775/15.9T8STB.E1
Relator: JOÃO NUNES
Descritores: CONTRATO DE UTILIZAÇÃO DE TRABALHO TEMPORÁRIO
ADMISSIBILIDADE
Data do Acordão: 09/07/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: i. O contrato de utilização de trabalho temporário só pode ser celebrado nas situações previstas no n.º 1 do artigo 175.º do CT, designadamente para uma actividade sazonal ou outra cujo ciclo anual de produção apresente irregularidades decorrentes da natureza estrutural do respectivo mercado;
ii. mas para que tal actividade possa justificar a contratação nos termos referidos é necessário, sempre, nos termos previstos no n.º 1 do artigo 140.º, que esteja em causa uma necessidade temporária da empresa e o contrato seja celebrado pelo período estritamente necessário à satisfação dessa necessidade;
iii. tal não se verifica se a recorrente/empresa utilizadora justificou a celebração dos contratos com o facto de ter apenas um cliente, cujo ciclo de produção de veículos por parte deste apresenta irregularidades, o que se reflecte directamente na actividade da recorrente e a impossibilita de ter a manutenção e planeamento dos postos de trabalho do seu quadro de efectivos estável.
(Sumário do relator)
Decisão Texto Integral: Proc. n.º 3775/15.9T8STB.E1
Secção Social do Tribunal da Relação de Évora

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:

I. Relatório
BB (residente na Rua … intentou, na Comarca de Setúbal (Setúbal – Instância Central – 1.ª Secção do Trabalho – J1), a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra CC (com sede…), pedindo:
a) que seja declarado ilícito o seu (do Autor) despedimento promovido pela Ré;
b) a condenação da Ré a reintegrá-lo, sem prejuízo da sua antiguidade e categoria profissional, ou a pagar-lhe uma indemnização de antiguidade, calculada à razão de 45 dias de retribuição base, por cada ano ou fracção de antiguidade, conforme opção que venha a fazer;
c) a condenação da Ré no pagamento das retribuições devidas desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão que julgar ilícito aquele.
Alegou para o efeito, muito em síntese, que celebrou com a Ré contratos de utilização de trabalho temporário sem fundamento legal, o que determina a nulidade dos mesmos, considerando-se vinculado por contrato de trabalho por tempo indeterminado, e que tendo a Ré feito cessar o mesmo sem precedência de processo disciplinar tal configura um despedimento sem justa causa, com as consequências legais daí decorrentes.

Tendo-se procedido à audiência de partes e não se tendo logrado obter o acordo das mesmas, contestou a Ré, sustentando, também muito em síntese, a regularidade dos contratos de utilização celebrados com o Autor, incluindo quanto à sua cessação.
Acrescentou ainda que o Autor agiu em abuso do direito ao recusar a assinatura do contrato a termo certo de 12 meses que lhe foi apresentado para assinar em 28-01-2015, pugnando, por consequência, pela improcedência da acção.

Foi fixado valor à causa (€ 8.922,83) e proferido despacho saneador tabelar.
Procedeu-se à audiência de julgamento, no âmbito da qual o Autor declarou optar pela indemnização de antiguidade em detrimento da reintegração, e em 18-01-2016 foi proferida sentença, na qual se respondeu e se motivou a matéria de facto, sendo a parte decisória do seguinte teor:
“Destarte, condeno a Ré CC, no seguinte:
a) reconhecer como ilícito o despedimento do A. BB;
b) pagar-lhe uma indemnização de antiguidade no valor de € 2.550,00;
c) pagar-lhe, ainda, as remunerações que deixou de auferir desde 30 dias antes da propositura da petição inicial e até ao trânsito em julgado da decisão final do processo, incluindo proporcionais dos subsídios de férias e de Natal, mas com dedução das importâncias referidas nas als. a) e c) do n.º 2 do art. 390.º do Código do Trabalho, o que será liquidado no competente incidente;
d) pagar ao A. os juros de mora, à taxa do art. 559.º n.º 1 do CCivil, desde a data do despedimento, quanto ao valor indicado na al. b), e desde a data da liquidação, quanto ao valor indicado na al. c).
Julgo improcedente o pedido de indemnização por danos não patrimoniais.
Custas pela Ré, na proporção de 9/10. O A. está isento”.

Inconformada com a decisão, a Ré dela interpôs recurso para este tribunal, tendo nas alegações apresentadas formulado as seguintes conclusões:
“A) Nos termos do Artigo 140º nº 1 do Código do Trabalho, a celebração do contrato de trabalho a termo poderá ter lugar para satisfação de necessidades temporárias da empresa e pelo período de tempo necessário à satisfação dessas necessidades, apenas sendo admissível a contratação a termo incerto, designadamente na situação expressamente elencada na alínea e) do no nº 2 daquele preceito legal: Actividade sazonal ou outra cujo ciclo anual de produção apresente irregularidades decorrentes da natureza estrutural do respectivo mercado, incluindo o abastecimento de matéria-prima;
B) Acresce que nos termos do artigo 141.º, n.º 1, al. e), do CT, na celebração de contrato de trabalho a termo, tem o Empregador o dever de indicação do termo estipulado e do respectivo motivo justificativo, esclarecendo o n.º 3 que «a indicação do motivo justificativo do termo deve ser feita com menção expressa dos factos que o integram, devendo estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado.»
C) A tarefa do tribunal, na incursão sobre a validade do termo aposto ao contrato de trabalho, impõe assim duas análises distintas: (i) a de saber se o motivo invocado e o prazo previsto têm correspondência com a realidade prestacional do trabalhador contratado e com a conjuntura laboral da empresa; (ii) a de saber se o texto contratual obedece ao pressupostos legais da contratação a termo;
D) Para efeitos da alínea e) do nº 2 do artigo 140º do CT, o ciclo de produção legalmente atendível é o ciclo anual, tornando-se ainda necessário que as suas irregularidades decorram da natureza estrutural - que não conjuntural - do respectivo mercado.
E) Ora, a douta decisão, por um lado, não vislumbra como pode a actividade da R ter um ciclo anual de produção que apresenta irregularidades decorrentes da natureza estrutural do respectivo mercado. E, como resulta da decisão que supra se transcreveu, o Mmº Juiz conclui que assim é em face de a R. desenvolver actividade no mercado automóvel e não na agricultura.
F) Sucede que, o conceito do que seja uma actividade que tem um ciclo de produção anual irregular não é preenchível com o objecto da sociedade mas sim com factos de onde se possa concluir se a actividade económica que é desenvolvida pela sociedade, tem ou não cinclos de produção, se os mesmos têm ou não carácter regular e qual a causa de uma eventual irregularidade.
G) E nessa medida provou que a R. não controla a variação dos ciclos de produção semanais do Eos, que dependem exclusivamente do cliente final, Volkswagen, Autoeuropa, Lda., não tendo esta qualquer obrigação de pré-aviso da R. quanto a essa variação.
H) Ou seja, a R. conseguiu provar que efectivamente o seu ciclo anual de produção não é regular, ou seja a variação de produção da R. não é a mesma em todos os meses e nem em todos os anos, e que essa irregularidade não é conjuntural, mas sim estrutural, porque resulta da própria estrutura do negócio/actividade económica que está directamente dependente da AutoEuropa.
I) E, esta irregularidade do ciclo de produção da R. constitui, antes de mais e nos termos e para os efeitos do disposto no nº 1 do artigo 140º do CT uma necessidade temporária da empresa, entendendo-se como tal por contraposição a necessidade permanente, entendemos que serão aquelas que sejam, quer pela sua natureza, quer pela sua duração, transitórias, limitadas no tempo, no contexto da atividade da empresa, sendo essa transitoriedade que justifica que o princípio da segurança no emprego, constitucionalmente consagrado, e da consequente perenidade do vínculo laboral, possa ser postergado pela aposição de um termo ao contrato de trabalho.
J) Ficou assim preenchido o primeiro aspecto de que depende a validade da aposição de termo. Mas, ao contrário do que entendeu o Mmº Juiz a quo, ficou preenchido igualmente o segundo daqueles aspectos: ter o texto contratual obedecido aos pressupostos legais da contratação a termo;
K) Note-se que como justificação para a sua celebração a termo se faz constar que: “«Alínea e) Art.º 140 n.º 2 por remissão do Art.º 175 nº 1 do código do trabalho “Actividades sazonais ou outras actividades cujo ciclo anual de produção apresente irregularidades decorrentes da natureza estrutural do respectivo mercado, incluindo o abastecimento de matérias-primas, ou de outra causa relevante” devido aos seguintes pontos: Nos termos do disposto da alínea b) do número 1 do artigo 177º, e do número 1 do artigo 175º, remetendo para o número 2 e número 3 do artigo 140º, todos do código do trabalho, a estipulação do termo tem por fundamento a contratação do utilizador por parte do seu cliente Autoeuropa Automóveis, Lda., nas seguintes condições. O utilizador CC (2ª outorgante) tem por objecto a montagem de módulos para a indústria automóvel, o fabrico, distribuição e comercialização de produtos, peças ou componentes fabricados, total ou parcialmente, em materiais plásticos ou derivados, ou afins de tais materiais, e a logística das referidas peças, bem como a criação e o desenvolvimento das linhas de Pintura para os citados componentes, tendo como cliente final a Volkswagen/Autoeuropa a quem fornece peças e módulos para os veículos automóveis que aquela produz e que para todos os efeitos são considerados matérias-primas ou subsidiárias relativamente ao produto final do cliente Autoeuropa, Automóveis Lda., respectivamente para os modelos VW 465 Volkswagen EOS, VW 351 Volkswagen Scirocco, VW 428 Volkswagen Sharan e SE 428 Seat Alhambra e destacando especialmente o modelo VW 465 Volkswagen EOS, modelo o qual apresenta maior irregularidade e possui picos de produção derivados pela natureza cíclica regular e previsível do seu mercado. Sendo um modelo cabriolet/descapotável e comercializado mundialmente unicamente em países do hemisfério norte é previsível que apresente picos no aumento da procura pelas condições climatéricas no período de verão, bem como, uma vez que devido às suas características é também um modelo procurado como ofertas de Natal pode apresentar picos em Dezembro ou outras épocas festivas. É imprescindível ainda reforçar o espaço temporal decorrente desde pedido/ordem de produção/produção/shipping variar entre 4 a 6 meses até o modelo ser vendido no país de destino. A Planificação da produção da 2ª outorgante é, em regra, feita a partir de contratos globais e encomendas JIT por modelo de viatura a um ritmo pré definido, designado “Just In Time”. Contudo tais exigências de fornecimento JIT estão condicionadas à instabilidade e irregularidade decorrente da natureza estrutural do respectivo mercado de venda e exportação de veículos automóveis dos mercados internacionais, acrescido da variância de componentes fornecidos por modelo e referências de modelos, designado “Mix”. Respectivamente sendo a actividade da 2ª outorgante composta por processos produtivos assentes em linhas de produção balanceadas e nas quais são produzidas peças/componentes para todos os modelos do cliente final Autoeuropa Automóveis, Lda., respectivamente VW 465 Volkswagen EOS, VW 351 Volkswagen Scirocco, VW 428 Volkswagen Sharan e SE 428 Seat Alhambra. Reforçado pelo facto da variância do número de peças/componentes produzidos para cada modelo é como tal também irregular e variável tanto a mão-de-obra como o tempo de ciclo necessários, de acordo com o modelo a produzir. O ciclo anual de produção com irregularidades diárias e semanais, que conta ainda com períodos sem trabalho designados de “Down Days”, torna muito difícil à manutenção e planeamento dos postos de trabalho do quadro de efectivos da 2ª outorgante. Os dias de paragem obrigatórios que obrigam à manutenção de uma cadência de produção mais elevada nos dias de trabalho tornam necessários também, reforços temporários da capacidade produtiva. Assim, para o referido modelo, prevê-se uma produção, em 2014, com variações na produção semanal, entre 0 e 195 unidades produzidas para o modelo VW 465 Volkswagen EOS podendo ser ou não complementadas com aumentos no volume de produção dos restantes modelos mencionados. São pois estas variações condicionadas pelo fornecimento JIT, particularmente significativas na actividade do Empregador dificultando a planificação e alocação de recursos humanos e que, nos termos do disposto na alínea e) do número 2 do artigo 140.º do Código do Trabalho, fundamenta a presente contratação a termo incerto»;
L) Ficou provado que a produção tem variações e é por não se divisar o momento das quebras e aumentos de produção, ou seja o momento certo em que tais variações ocorrem que o contrato é celebrado a termo. Soubesse a R. antecipadamente que o planeamento feito pelo Cliente ia sofrer variações no período determinado e a R. saberia planear a sua actividade distintamente;
M) A R. conhece algumas dessas variações – por exemplo os dias de paragem – porque isso faz parte do negócio – é estrutural – mas o Cliente da R. a AutoEuropa tem uma margem de 15% de variação que se reflecte na R. e que a R. não controla. E a R. não conhece e não controla essa variação porque o seu negócio está assim estruturado.
N) A douta decisão considera que a R. não pode invocar esta situação de desconhecer as variações da Autoeuropa quando foi a própria R. quem escolheu prestar assim a sua actividade. Não pode no entanto colher este entendimento pois que a R. emprega a título efectivo 85% a 90% da sua força de trabalho que corresponde ao número de trabalhadores necessários para garantir o volume base ou “garantido” de produção.
O) A questão só se coloca quando, de uma semana para a outra e por período curtos, a produção aumenta e a R. não consegue com a sua força de trabalho efectiva fazer face à exigência do seu cliente.
P) Caso a R. contratasse a título definitivo estes trabalhadores, logo que a produção baixasse a R. ficava com excesso de mão-de-obra e a curto, médio prazo teria de fazer cessar os contratos mediante um processo de despedimento colectivo.
Q) É a própria actividade que determina a existência destes necessidades meramente temporárias, mas se a R. não escolhesse desenvolver a sua actividade, nem os 85% de trabalhadores efectivos estariam empregados.
R) Garantir postos de trabalho efectivos nos termos pretendidos é dotar a estrutura de recursos que esta não carece a título permanente e acabará por conduzir a empresa para um cenário de dificuldades económicas graves que podem mesmo afectar a sua subsistência.
S) Daqui decorre que, sendo o motivo justificativo do termo verdadeiro e tendo o contrato cumprido com a exigência legal de estabelecer uma relação necessária entre duração do contrato e motivo que o justifica e verificando-se de facto essa relação, o contrato é plenamente válido como contrato a termo, produzindo como tal os devidos efeitos jurídicos.
T) Nos termos do disposto no artigo 140º do CT, o contrato de trabalho a termo resolutivo só pode ser celebrado para a satisfação de necessidades temporárias da empresa e pelo período estritamente necessário à satisfação dessa necessidade.
U) O contrato estabelece de forma objectiva o critério para aferir das necessidades empresariais e da temporalidade do contrato: os ciclos de produção dos modelos da Volkswagen que têm, semanalmente variações muito grandes no número de viaturas.
V) Porque a R. não controla essa variação, porque não está na sua disponibilidade e integra as condições contratuais do fornecimento ao Cliente final, a Autoeuropa, a R. apenas pode contratar trabalho no âmbito de contratos temporalmente limitados, sob pena de se extinguir a necessidade (já de início temporária) e a R. não poder ocupar os seus funcionários.
W) O recurso da R. ao trabalho temporário, integra a previsão da alínea e do nº 2 do artigo 140º, nos termos da qual considera-se nomeadamente necessidade temporária da empresa a actividade sazonal ou cujo ciclo anual de produção apresente irregularidades decorrentes da natureza estrutural do respectivo mercado, incluindo o abastecimento de matéria prima,
X) Razão porque se fez constar nos contratos de trabalho e nos CUTT, precisamente que os produtos, peças ou componentes fabricados, total ou parcialmente em materiais plásticos ou derivados ou afins de tais materiais, dos modelos Volkswagen são, para todos os efeitos considerados matérias-primas ou subsidiárias relativamente ao produto final do cliente Autoeuropa Automóveis, Lda..
Y) Daqui resulta desde logo que não se verifica na situação sub judice qualquer situação de acréscimo excepcional da actividade que permitisse, a aplicação do nº 2 do artigo 175 do CT, designadamente para efeitos de determinação do período de duração do CUTT ou do contrato de trabalho temporário.
Z) E resulta igualmente que ambos os contratos, ou seja os CUTT e os contratos de trabalho temporários foram celebrados em observância das disposições dos artigos 175 e 180 do CT, pelo que não ocorre a nulidade pela qual a douta decisão conclui.
AA) E nem a conversão do contrato em contrato por tempo indeterminado.
BB) De acordo como artigo 178º do CT, a duração do contrato de utilização de trabalho temporário, incluindo renovações, não pode exceder a duração da causa justificativa nem o limite de dois anos, ou de seis ou 12 meses em caso de, respectivamente, vacatura de posto de trabalho quando já decorra processo de recrutamento para o seu preenchimento ou acréscimo excepcional da actividade da empresa.
CC) Porque os motivos justificativos do recurso ao trabalho temporário não foram nem a vacatura de posto de trabalho quando já decorra processo de recrutamento para o seu preenchimento e nem o acréscimo excepcional da actividade da empresa, aplica-se à situação em apreço o limite máximo de dois anos de duração ali estabelecido.
DD) Os contratos de trabalho temporário celebrados com o A. e os CUTT, tiveram uma duração total aproximada de 22 meses e 20 dias.
EE) Pelo que, importa aqui desde já concluir que os limites máximos de duração dos CUTT e dos contratos de trabalho temporários não foram ultrapassados, ficando por esta via mais uma vez afastada a pretendida conversão do contrato em contrato por tempo indeterminado.
FF) O nº 4 do já mencionado artigo 178º, prescreve que no caso de o trabalhador temporário continuar ao serviço do utilizador decorridos 10 dias após a cessação do contrato de utilização sem a celebração de contrato que o fundamente, considera-se que o trabalho passa a ser prestado ao utilizador com base em contrato de trabalho sem termo.
GG) O último dos contratos de trabalho temporário celebrado com o A. cessou no dia 27 de Janeiro de 2015.
HH) E é certo que o A. se manteve ao serviço da R., mas fê-lo porque no dia 23 de Janeiro, ou seja ainda antes da cessação do contrato de trabalho temporário, o A. se comprometeu a assinar um contrato de trabalho a termo certo, pelo período de 12 meses e com início a 28 de Janeiro de 2015.
II) O A. manteve-se ao serviço da R. porque existia um contrato de trabalho a termo certo que suportava essa prestação de funções. Para a R., esse contrato, em cumprimento da promessa de 23 de Janeiro, estava em vigor, faltando tao só o cumprimento de um procedimento administrativo.
JJ) Ainda que houvesse desorganização, como refere a douta decisão, o A. podia e devia, na data de 23 de Janeiro, ter logo repudiado a assinatura desse contrato por considerar que já era efectivo, o que nunca fez para assim fazer decorrer o período de 10 dias a que alude o artigo 178 nº 4 e vir depois prevalecer-se desse regime.
KK) Não pode prevalecer-se desse regime quem ao mesmo deu azo em abuso de direito, aqui na modalidade de venire contra factum proprium.
LL) E no abuso de direito, não há direito que mereça a tutela legal, razão porque não colhe a pretensão do A..
MM) A cessação do contrato de trabalho do A. é pois lícita e não configura despedimento ilícito.
NN) A decisão recorrida violou o disposto nos artigos 140 nº 1 e nº2 alínea e) e 175º, 177º e 180º do Código do Trabalho.
Nestes termos e nos mais de direito que doutamente serão supridos, se requer a V. Exas. seja o presente recurso julgado procedente por provado e em consequência seja a decisão recorrida revogada e substituída por outra que julgue a licitude da cessação do contrato de trabalho em virtude de ter ocorrido a respectiva caducidade, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!!!”.

O recorrido respondeu ao recurso, a pugnar pela sua improcedência.
Para o efeito, nas contra-alegações que apresentou formulou as seguintes conclusões:
“I – A indicação do motivo justificativo, no contrato de trabalho a termo certo, deve mencionar os fatos que determinam a sua necessidade, não bastando a menção de expressões vagas, por mais extensas que sejam;
II – A indicação do nexo de causalidade entre os fatos que integram o motivo justificativo e o termo do contrato é fundamental para que possa ser aferida a sua validade;
III – Não tendo os contratos de trabalho temporário obedecido a tais bases legislativas, nos termos do artigo 177.º n.º 2 do Código do Trabalho, respeitando o n.º 4 do retro citado artigo, o contrato de trabalho é estabelecido entre o trabalhador e a empresa utilizadora;
IV – Possuindo um contrato de trabalho por tempo indeterminado, era lícito ao Recorrido recusar a celebração de um contrato de trabalho a termo certo, como lhe foi proposto pela Recorrente.
V – Qualquer contrato de trabalho a termo, deve ser celebrado por escrito, não o sendo, nos termos do artigo 147.º n.º 1 alínea c) do C.T., o mesmo é considerado como sendo celebrado sem termo;
VI – A comunicação pela recorrente ao Recorrido, da denúncia do seu contrato de trabalho, decorridos mais de 90 dias sobre a data da constituição do seu contrato de trabalho sem termo, constitui um despedimento ilícito, artigo 381 do C.T.
Pelo exposto, deve negar-se a Apelação, confirmando-se a sentença recorrida, como é de JUSTIÇA!”.

Neste tribunal, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer, que não foi objecto de resposta, no sentido da improcedência do recurso.
Preparando a deliberação foi remetido projecto de acórdão aos exmos. Juízes desembargadores adjuntos.
Realizada a conferência, cumpre decidir.
II. Objecto do recurso
Consabido que é que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações [cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2003, de 26 de Junho, aplicável ex vi dos artigos 87.º, n.º 1 e 1.º, n.º 2, alínea a), ambos do Código de Processo do Trabalho], no caso a questão essencial a decidir consiste em saber se os contratos de utilização de trabalho temporário celebrados em 18-08-2014 e em 05-01-2015 se mostram devidamente justificados e se a justificação tem correspondência com a realidade, com as consequências legais daí decorrentes.
Caso a resposta à questão seja afirmativa importa subsequentemente apurar se o Autor/recorrido incorreu em abuso do direito ao se comprometer a assinar um contrato de trabalho a termo, pelo período de 12 meses, em 28 de Janeiro de 2015 e, continuando ao serviço da Ré, posteriormente se recusar a assinar o mesmo e invocar a existência de um contrato de trabalho sem termo por terem decorrido 10 dias sobre a cessação do contrato de utilização e ter continuado ao serviço da Ré.
Realce-se que apenas estão em causa no recurso os contratos de utilização de trabalho temporário celebrados em 18-08-2014 e em 05-01-2015, únicos que a sentença recorrida considerou não conterem factos concretos justificativos da celebração dos mesmos.

III. Factos
A 1.ª instância deu como provados os seguintes factos, que se aceitam, por não virem impugnados e não se vislumbrar fundamento legal para a sua alteração:
1. Por escrito datado de 28.01.2013, celebrado entre a Ré e a DD – Empresa de Trabalho Temporário, Unipessoal, Lda. (adiante designada apenas como ETT), aquela recorreu à utilização do trabalho do A., enquanto trabalhador temporário, invocando para o efeito a substituição do trabalhador EE, que se encontrava de baixa por motivo de acidente de trabalho;
2. Por escrito da mesma data, o A. foi contratado pela ETT, para prestar a sua actividade profissional de “técnico de manutenção”, a termo incerto, sendo cedido à Ré enquanto empresa utilizadora, ali se fazendo constar como motivo justificativo o supra referido;
3. A ETT comunicou ao A. a caducidade deste contrato com efeitos a 26.07.2013;
4. Em 12.08.2013, a Ré voltou a celebrar com a ETT novo escrito, pelo qual recorria à utilização do trabalho do A., com a mesma categoria profissional e enquanto trabalhador temporário, continuando a invocar para o efeito a substituição do trabalhador EE, que se encontrava de baixa por motivo de acidente de trabalho;
5. Por escrito da mesma data, o A. foi readmitido pela referida ETT, igualmente a termo incerto, sendo cedido à Ré enquanto empresa utilizadora, ali se fazendo de novo constar como motivo justificativo o supra referido;
6. De novo foi comunicada ao A. a caducidade deste contrato, com efeitos a 01.08.2014;
7. Pela terceira vez, em 18.08.2014, a Ré voltou a celebrar com a ETT novo escrito, recorrendo mais uma vez à utilização do trabalho do A., com a mesma categoria e enquanto trabalhador temporário;
8. Por escrito da mesma data, o A. foi mais uma vez readmitido pela referida ETT, igualmente a termo incerto, sendo cedido à Ré enquanto empresa utilizadora;
9. Em adenda a estes dois contratos de 18.08.2014, constava o seguinte motivo de recurso ao trabalho temporário:
«Alínea e) Art.º 140 n.º 2 por remissão do Art.º 175 nº 1 do código do trabalho “Actividades sazonais ou outras actividades cujo ciclo anual de produção apresente irregularidades decorrentes da natureza estrutural do respectivo mercado, incluindo o abastecimento de matérias-primas, ou de outra causa relevante” devido aos seguintes pontos:
Nos termos do disposto da alínea b) do número 1 do artigo 177º, e do número 1 do artigo 175º, remetendo para o número 2 e número 3 do artigo 140º, todos do código do trabalho, a estipulação do termo tem por fundamento a contratação do utilizador por parte do seu cliente Autoeuropa Automóveis, Lda., nas seguintes condições. O utilizador CC. (2ª outorgante) tem por objecto a montagem de módulos para a indústria automóvel, o fabrico, distribuição e comercialização de produtos, peças ou componentes fabricados, total ou parcialmente, em materiais plásticos ou derivados, ou afins de tais materiais, e a logística das referidas peças, bem como a criação e o desenvolvimento das linhas de Pintura para os citados componentes, tendo como cliente final a Volkswagen/Autoeuropa a quem fornece peças e módulos para os veículos automóveis que aquela produz e que para todos os efeitos são considerados matérias-primas ou subsidiárias relativamente ao produto final do cliente Autoeuropa, Automóveis Lda., respectivamente para os modelos VW 465 Volkswagen EOS, VW 351 Volkswagen Scirocco, VW 428 Volkswagen Sharan e SE 428 Seat Alhambra e destacando especialmente o modelo VW 465 Volkswagen EOS, modelo o qual apresenta maior irregularidade e possui picos de produção derivados pela natureza cíclica regular e previsível do seu mercado. Sendo um modelo cabriolet/descapotável e comercializado mundialmente unicamente em países do hemisfério norte é previsível que apresente picos no aumento da procura pelas condições climatéricas no período de verão, bem como, uma vez que devido às suas características é também um modelo procurado como ofertas de Natal pode apresentar picos em Dezembro ou outras épocas festivas. É imprescindível ainda reforçar o espaço temporal decorrente desde pedido/ordem de produção/produção/shipping variar entre 4 a 6 meses até o modelo ser vendido no país de destino.
A Planificação da produção da 2ª outorgante é, em regra, feita a partir de contratos globais e encomendas JIT por modelo de viatura a um ritmo pré definido, designado “Just In Time”.
Contudo tais exigências de fornecimento JIT estão condicionadas à instabilidade e irregularidade decorrente da natureza estrutural do respectivo mercado de venda e exportação de veículos automóveis dos mercados internacionais, acrescido da variância de componentes fornecidos por modelo e referências de modelos, designado “Mix”. Respectivamente sendo a actividade da 2ª outorgante composta por processos produtivos assentes em linhas de produção balanceadas e nas quais são produzidas peças/componentes para todos os modelos do cliente final Autoeuropa Automóveis, Lda., respectivamente VW 465 Volkswagen EOS, VW 351 Volkswagen Scirocco, VW 428 Volkswagen Sharan e SE 428 Seat Alhambra. Reforçado pelo facto da variância do número de peças/componentes produzidos para cada modelo é como tal também irregular e variável tanto a mão-de-obra como o tempo de ciclo necessários, de acordo com o modelo a produzir.
O ciclo anual de produção com irregularidades diárias e semanais, que conta ainda com períodos sem trabalho designados de “Down Days”, torna muito difícil à manutenção e planeamento dos postos de trabalho do quadro de efectivos da 2ª outorgante. Os dias de paragem obrigatórios que obrigam à manutenção de uma cadência de produção mais elevada nos dias de trabalho tornam necessários também, reforços temporários da capacidade produtiva.
Assim, para o referido modelo, prevê-se uma produção, em 2014, com variações na produção semanal, entre 0 e 195 unidades produzidas para o modelo VW 465 Volkswagen EOS podendo ser ou não complementadas com aumentos no volume de produção dos restantes modelos mencionados. São pois estas variações condicionadas pelo fornecimento JIT, particularmente significativas na actividade do Empregador dificultando a planificação e alocação de recursos humanos e que, nos termos do disposto na alínea e) do número 2 do artigo 140.º do Código do Trabalho, fundamenta a presente contratação a termo incerto»;
10. Mais uma vez, foi comunicada ao A. a caducidade deste contrato, com efeitos a 16.12.2014;
11. Pela quarta vez, em 05.01.2015, a Ré voltou a celebrar com a ETT novo escrito, recorrendo mais uma vez à utilização do trabalho do A., com a mesma categoria e enquanto trabalhador temporário;
12. Por escrito da mesma data, o A. foi de novo readmitido pela referida ETT, igualmente a termo incerto, sendo cedido à Ré enquanto empresa utilizadora;
13. Em adenda a estes dois contratos de 05.01.2015, constava o seguinte motivo de recurso ao trabalho temporário:
«Alínea e) Art.º 140 nº2 por remissão do Art.º 175 nº1 do código do trabalho “Actividades sazonais ou outras actividades cujo ciclo anual de produção apresente irregularidades decorrentes da natureza estrutural do respectivo mercado, incluindo o abastecimento de matérias-primas, ou de outra causa relevante” devido aos seguintes pontos:
Nos termos do disposto da alínea b) do número 1 do artigo 177º, e do número 1 do artigo 175º, remetendo para o número 2 e número 3 do artigo 140º, todos do código do trabalho, a estipulação do termo tem por fundamento a contratação do utilizador por parte do seu cliente Autoeuropa Automóveis, Lda., nas seguintes condições. O utilizador CC (2ª outorgante) tem por objecto a montagem de módulos para a indústria automóvel, o fabrico, distribuição e comercialização de produtos, peças ou componentes fabricados, total ou parcialmente, em materiais plásticos ou derivados, ou afins de tais materiais, e a logística das referidas peças, tendo como cliente final exclusivo a Volkswagen/Autoeuropa a quem fornece peças e módulos para os veículos automóveis que aquela produz e que para todos os efeitos são considerados matérias-primas ou subsidiárias relativamente ao produto final do cliente Autoeuropa, Automóveis Lda., respectivamente para os modelos VW 465 Volkswagen EOS, VW 351 Volkswagen Scirocco, VW 428 Volkswagen Sharan e SE 428 Seat Alhambra.
O ciclo anual de produção com irregularidades diárias e semanais, que conta ainda com períodos sem trabalho designados de “Down Days”, torna muito difícil a manutenção e planeamento dos postos de trabalho do quadro de efectivos da 2ª outorgante. Os dias de paragem obrigatórios que obrigam à manutenção de uma cadência de produção mais elevada nos dias de trabalho tornam necessários também, reforços temporários da capacidade produtiva.
A Planificação da produção da 2ª outorgante é, em regra, feita a partir de contratos globais e encomendas JIT por modelo de viatura a um ritmo pré definido, designado “Just In Time”.
Contudo tais exigências de fornecimento JIT estão condicionadas à instabilidade e irregularidade decorrente da natureza estrutural do respectivo mercado de venda e exportação de veículos automóveis dos mercados internacionais, acrescido da variância de componentes fornecidos por modelo e referências de modelos, designado “Mix”. Assim, para os referidos modelos, prevê-se uma produção, em 2015, com variações na produção semanal, entre 0 e 150 unidades produzidas para o modelo VW 465 Volkswagen EOS, entre 0 e 450 unidades produzidas para o modelo VW 351 Volkswagen Scirocco, entre 720 e 1440 unidades produzidas para o modelo VW 428 Volkswagen Sharan e entre 360 e 720 unidades produzidas para o modelo SE 428 Seat Alhambra. São pois estas variações, particularmente significativas na actividade do Empregador dificultando a planificação e alocação de recursos humanos e que, nos termos do disposto na alínea e) do número 2 do artigo 140.º do Código do Trabalho, fundamenta a presente contratação a termo incerto»;
14. Estes contratos de trabalho temporário e de utilização do mesmo cessaram em 27.01.2015;
15. No dia 23.01.2015, a Ré apresentou ao A. uma proposta de contrato de trabalho, consubstanciada no documento de fs. 25 v.º e 92, no qual se menciona, para além do mais, a retribuição base bruta mensal e anual, a data de admissão a 28.01.2015 e ainda que o contrato seria celebrado a termo certo de 12 meses;
16. Esta proposta foi aceite pelo A., o qual colocou ali a sua assinatura, na mesma data;
17. Com data de 26.01.2015, o A. preencheu e assinou a ficha de inscrição de fs. 93, contendo os dados pessoais necessários à redacção do contrato de trabalho, entregou cópia do seu cartão de cidadão, indicou o n.º da sua conta bancária e preencheu a declaração para efeitos de retenção na fonte de IRS;
18. A Ré adopta este procedimento para admissão de novos trabalhadores, e fornece um formulário indicando a documentação necessária à redacção do contrato de trabalho;
19. A partir de 28.01.2015, o A. continuou a desempenhar nas instalações da Ré as mesmas funções, passando esta a processar e a pagar-lhe as respectivas retribuições;
20. Nesse dia, a Ré entregou ao A. uma minuta do contrato de trabalho, a fim de ser assinada por este;
21. O A. não assinou então a referida minuta, informando que pretendia levá-la para casa, para a ler e analisar;
22. O A. não devolveu o contrato assinado nas semanas seguintes, continuando a desempenhar as suas funções na Ré, até que, em 17.03.2015, deslocou-se ao departamento de recursos humanos da Ré e informou que não assinava o contrato, invocando desacordo com algumas das suas cláusulas;
23. No diálogo que se seguiu, o director de recursos humanos incitou o A. a solicitar esclarecimentos junto do respectivo sindicato, o que este fez;
24. No dia 20.03.2015, verificando que o A. ainda não tinha entregado a minuta assinada, o director de recursos humanos a Ré diligenciou no sentido de o contactar, recebendo a resposta do A. de que nesse dia estava ocupado num trabalho urgente e assim que terminasse o seu horário teria de se ir embora;
25. No dia 23.03.2015, o A. apresentou-se no departamento de recursos humanos da Ré e transmitiu ao respectivo director que não traria qualquer contrato assinado, porque se tinha aconselhado com o seu advogado, tendo recebido indicações para não assinar aquela minuta, uma vez que se considerava trabalhador efectivo da empresa;
26. O dirigente sindical do SITE-SUL, …, entregou à Ré a carta de fs. 27 v.º, datada de 23.03.2015 e subscrita pelo Advogado do A., informando que o seu constituinte estava contratado mediante contrato de trabalho a tempo indeterminado, não sendo justificável a celebração de qualquer contrato de trabalho a termo;
27. No dia 26.03.2015, pelas 15h00, teve lugar uma reunião com a presença daquele dirigente sindical, de dois delegados sindicais, do A., da sua chefia de departamento e do director de recursos humanos da Ré;
28. A Ré convocou esta reunião, com o objectivo de obter do A. a assinatura da minuta do contrato de trabalho a termo certo, o que este recusou;
29. A 27.03.2015, a Ré comunicou ao A. que denunciava o seu contrato de trabalho, fundamentando tal decisão no decurso do período experimental, nos termos que melhor constam de fs. 35;
30. O A. auferia a retribuição mensal de € 850,00, à qual acrescia um subsídio de refeição no valor de € 6,83 diários, um subsídio de transporte de € 3,00 diários e um prémio de assiduidade de € 10,00 mensais;
31. O A. gozou as suas férias nos períodos que decorreram entre o termo de cada um dos contratos de trabalho temporário de 28.01.2013, de 12.08.2013 e de 18.08.2014, e a celebração dos seguintes;
32. Em tais períodos ocorreu também a paragem de produção da AutoEuropa,
33. O trabalhador EE encontrava-se efectivamente de baixa, na sequência de acidente de trabalho, aquando da celebração dos contratos de 28.01.2013 e de 12.08.2013;
34. A Ré dedica-se à montagem de módulos para a indústria automóvel, ao fabrico, distribuição e comercialização de produtos, peças, componentes fabricados, total ou parcialmente em materiais plásticos ou derivados ou afins de tais materiais;
35. A Ré destina a sua produção a diversos clientes, sendo a AutoEuropa – Automóveis, Lda., o principal cliente, a quem dedica cerca de 80% da sua actividade;
36. Os ciclos de produção dos modelos fabricados na AutoEuropa têm, semanalmente, variações no número de viaturas;
37. A Ré não controla essa variação, porque não está na sua disponibilidade e integra as condições contratuais do fornecimento àquele cliente;
38. Quando a AutoEuropa tem dias de paragem da produção, a Ré limita a sua actividade, mantendo-se activos alguns sectores, nomeadamente o da manutenção, em que se aproveita a ocasião para a realização de grandes trabalhos de manutenção;
39. O A. desde sempre desempenhou funções fixas na estrutura operacional da Ré, no sector da manutenção;
40. De acordo com o descritivo das suas funções de técnico de manutenção, cabia ao A. “assegurar a manutenção preventiva e correctiva dos equipamentos que constituem as diferentes linhas de produção, dos equipamentos de apoio às linhas de produção e dos restantes equipamentos de apoio instalados na fábrica, por forma a permitir atingir os níveis de produção e de qualidade requeridos e a operacionalidade geral da fábrica”;
41. No organigrama da empresa datado de 02.02.2015, o A. surge integrado no sector da manutenção;
42. Nos organigramas de 01.05.2014, 28.08.2014 e de 05.01.2015, o A. surgia integrado no mesmo sector, mas com a menção “a.i. = ad interim”.


IV. Fundamentação
Como se afirmou supra (sob n.º II), a questão essencial a decidir centra-se em saber se os contratos de utilização de trabalho temporário celebrados em 18-08-2014 e 05-01-2015 se mostram devidamente justificados e se tal justificação corresponde à realidade.
A 1.ª instância entendeu, a este propósito, que o motivo justificativo para a celebração dos contratos em causa se apresenta genérico, não contendo a menção concreta dos factos que integram o aludido motivo justificativo.
Respiga-se para tanto da sentença recorrida a seguinte fundamentação:
“Analisando os contratos de trabalho temporário dos autos, em dois deles (os de 18.08.2014 e de 05.01.2015) invocam-se as disposições dos arts. 140.º n.º 2 al. e) e 175.º n.º 1 do CTrabalho, dada a circunstância da Ré ter como cliente a AutoEuropa, estando dependente das suas encomendas, segundo o modelo de produção just in time, sendo a produção sujeita a irregularidades, decorrentes da existência de períodos sem produção (down days) e da existência de um modelo com maior procura nos meses de Verão e nas épocas festivas, obrigando a uma cadência de produção mais elevada nos dias de trabalho. Afirma-se ainda nos referidos contratos de trabalho temporário (e nos correspondentes contratos de utilização) que os módulos, peças, componentes e demais peças plásticas fabricadas pela Ré, devem ser considerados matérias-primas ou subsidiárias relativamente ao produto final da cliente AutoEuropa.
É desde logo notório que esta justificação não menciona qualquer facto que permita formular um juízo de enquadramento do recurso ao trabalho temporário com fundamento no art. 140.º n.º 2 al. e) do CTrabalho. Com efeito, daquela formulação não resulta estar em causa qualquer actividade sazonal ou outra cujo ciclo anual de produção apresente irregularidades decorrentes da natureza estrutural do respectivo mercado, incluindo o abastecimento de matéria-prima.
Por um lado, há a notar que foi a Ré quem planeou o seu modelo de actividade, dependente em cerca de 80% da sua produção das encomendas da sua principal cliente, a AutoEuropa. Logo, se existem irregularidades de produção pela circunstância da Ré ter uma cliente a quem destina 80% da sua actividade, tal reflecte, tão só, uma opção estratégica industrial que à Ré apenas diz respeito – a aceitar-se a validade da motivação aposta naqueles contratos, tal levaria à conclusão da Ré poder utilizar a título precário a totalidade dos seus trabalhadores.
Por outro lado, não se vislumbra que a actividade da Ré seja meramente sazonal, nem a ocorrência de um “ciclo anual de produção” irregular decorrente da natureza estrutural do respectivo mercado – não se deixará de notar que o mercado automóvel não apresenta ciclos anuais, regulares ou irregulares, de funcionamento, e ainda que o modelo EOS não é o único produzido naquela fábrica, nem sequer o veículo de maior procura entre aqueles que são fabricados na AutoEuropa, bem pelo contrário.
Também não se vislumbra que os produtos fabricados pela Ré possam, por algum modo, identificar-se com o conceito de matéria-prima, entendida como o “conjunto de produtos necessários em diversos processos de produção, que são extraídos ou obtidos directamente da Natureza (explorações florestais, agrícolas ou minerais). Estas matérias constituem a primeira fase da cadeia de transformações imprescindíveis para a obtenção do produto final. Dado que o estado em que se encontram as matérias-primas não possibilita a sua utilização directa pela maior parte das indústrias, estas usam produtos semi-elaborados obtidos a partir das matérias-primas, as denominadas substâncias básicas” – cfr. www.infopedia.pt.
No caso, a Ré não identifica entre os bens que produz, qualquer um que seja obtido directamente da Natureza e que integre a primeira fase da longa (por vezes, muito longa) cadeia de transformações que conduzem ao produto final. Mesmo que a Ré não seja o produtor que vende os seus produtos directamente ao consumidor final, numa sociedade industrializada, com produtos cada vez mais complexos, o processo produtivo exige uma longa cadeia produtiva, com os bens a serem sucessivamente transformados, de modo a obter-se o produto final.
A admitir-se a validade dos argumentos da Ré, dos produtos por si fabricados deverem integrar o conceito de matéria-prima, seríamos obrigados a afirmar que os diversos componentes automóveis – baterias, pneus, óleos, travões, pára-choques, faróis, etc., etc., etc. – seriam matéria-prima, para os fins do art. 140.º n.º 2 al. e) do Código do Trabalho, o que nos parece, no mínimo, um exagero…
De todo o modo, as justificações invocadas nos contratos de utilização de trabalho temporário celebrados em 18.08.2014 e 05.01.2015, mencionam irregularidades do processo produtivo decorrentes da Ré ter um “cliente final exclusivo” (já vimos que esta afirmação é inexacta, embora seja certo que a AutoEuropa absorve 80% da produção da Ré) e estar dependente das suas encomendas e dos seus momentos de produção, mas não estabelecem o necessário nexo de causalidade entre o motivo invocado e a duração do contrato, exigida pelo art. 177.º n.º 2, in fine, o qual deveria transparecer da mera apreciação formal da cláusula contratual relativa à estipulação do termo. Com efeito, não se indica qual o período de tempo previsível para dominar a alegada “irregularidade de produção”, ou sequer o motivo pelo qual esse facto exigiria a utilização do trabalho do A. por um período de duração incerta.
(…)
Considerando-se insuficientemente expressa a cláusula de justificação do recurso ao trabalho temporário por parte do utilizador, face aos restritos termos do art. 177.º n.º 2 do CTrabalho – a justificação deve ser feita pela menção expressa dos factos que o integram, devendo estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado – a consequência legal é a consideração do trabalho ser prestado pelo A. à Ré, enquanto empresa utilizadora, em regime de contrato de trabalho sem termo, pelo menos desde a celebração do contrato de 18.08.2014 – art. 177.º n.ºs 4 e 5 do CTrabalho (n.ºs 5 e 6, após a renumeração introduzida pelas Leis 53/2011, de 14 de Outubro, 23/2012, de 25 de Junho, e 69/2013, de 30 de Agosto).
Tanto mais que é nulo o contrato de utilização de trabalho temporário celebrado fora das situações em que tal legalmente é admitido, considerando-se assim o trabalho prestado ao utilizador em regime de contrato de trabalho sem termo – art. 176.º n.ºs 2 e 3 do Código do Trabalho. E no caso, apurou-se que a actividade da Ré não era sazonal, agindo esta no âmbito do mercado automóvel, que efectivamente não apresenta irregularidades de natureza estrutural.
Conclui-se, pois, que o A. deverá ser considerado trabalhador efectivo da Ré desde a celebração do contrato de trabalho temporário de 18.08.2014. Logo, em 28.01.2015, não era lícito à Ré propor a celebração de um contrato de trabalho a termo certo de 12 meses, tendo o A. o direito de recusar a assinatura da minuta que nessa data lhe foi apresentada”.

Outro é o entendimento da recorrente, que sustenta, muito em resumo, que os contratos em causa se encontram devidamente justificados e que o motivo invocado e o prazo têm correspondência com a realidade.
Vejamos de que lado está a razão.

Nos termos da alínea a), do artigo 172.º, do Código do Trabalho, considera-se contrato de trabalho temporário o contrato de trabalho a termo celebrado entre uma empresa de trabalho temporário e um trabalhador, pelo qual este se obriga, mediante retribuição daquela, a prestar a sua actividade a utilizadores, mantendo-se vinculado à empresa de trabalho temporário.
E de acordo com o estatuído na alínea c) do mesmo artigo, considera-se contrato de utilização de trabalho temporário o contrato de prestação de serviço a termo resolutivo entre um utilizador e uma empresa de trabalho temporário, pelo qual esta se obriga, mediante retribuição, a ceder àquele um ou mais trabalhadores temporários.
É sabido que o trabalho temporário assenta numa relação triangular, em que incumbe (i) à empresa de trabalho temporário a posição jurídica de empregador, cabendo-lhe as respectivas obrigações contratuais, nomeadamente as remuneratórias, os encargos sociais e a contratação do seguro de acidentes de trabalho, (ii) ao utilizador, por delegação da empresa de trabalho temporário, a direcção e organização do trabalho (iii) e ao trabalhador temporário o acatamento das prescrições do utilizador no que respeita ao modo, lugar, duração de trabalho e suspensão da prestação de trabalho, higiene, segurança e medicina no trabalho.
Assim, o trabalhador temporário é contratado pela empresa de trabalho temporário, mas presta a sua actividade em benefício directo do utilizador.
O contrato de utilização de trabalho temporário só pode ser celebrado, no que ora releva, nas situações referidas nas alíneas a) a g) do n.º 2 do artigo 140.º (por remissão do artigo 175.º, n.º1), situações que se reportam, ao fim e ao resto, a necessidades temporárias, de gestão corrente, das empresas.
Importa ter presente que a Lei Fundamental consagra a garantia à segurança no emprego (artigo 53.º), o que envolve, como assinalam Gomes Canotilho e Vital Moreira (Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. I, 4.ª Edição, Coimbra Editora, pág. 711), não só o direito a não ser despedido sem justa causa ou por motivos políticos ou ideológicos, mas também todas as situações que se traduzam em injustificada precariedade da relação de trabalho, para que possa ocorrer uma contratação que não garanta a referida segurança no emprego, o que impõe, além do mais que agora não releva, a existência de um motivo justificativo para essa contratação, o mesmo é dizer um requisito relacionado, na sua essência, com as situações que legitimam a celebração de contratos a termo.
Como se observou no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19-09-2012 (Proc. n.º 406/10.7TTVCT.P1.S1, disponível em www.dgsi.pt) “A contratação a termo, enquanto instrumento legal de vinculação precária, ditado por uma tríplice ordem de razões (de natureza económica, social e de política de emprego) assume, como é sabido, o compromisso possível entre o princípio programático do “direito à segurança no emprego”, com assento constitucional (art. 53º da C.R.P.), de interesse e ordem pública, e o princípio civilista geral da liberdade contratual”.
Na apreciação do motivo justificativo do contrato de trabalho a termo, como de modo impressivo se assinalou no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10-07-2008 (Proc. n.º 325/08, disponível em www.dgsi.pt) haverá que fazer duas análises distintas: (i) saber se o texto contratual obedece ao pressupostos legais da contratação a termo; (ii) saber se o motivo invocado e o prazo previsto têm correspondência com a realidade prestacional do trabalhador contratado e com a conjuntura laboral da empresa, sendo que, em conformidade com o n.º 1 do artigo 176.º, cabe ao utilizador a prova dos factos que justificam a celebração de contrato de utilização de trabalho temporário.
Ou seja, visa-se com tais exigências legais permitir a verificação ou controle da conformidade da situação concreta com a tipologia legal das situações excepcionais que consentem tal contratação, da veracidade da justificação invocada e até da adequação da duração convencionada para o contrato (neste sentido, acórdão do STJ de 14-01-2015, Proc. n.º 488/11.4TTVFR.P1.S1, disponível em www.dgsi.pt).

No caso em apreciação, os contratos de utilização foram celebrados ao abrigo da alínea e) do n.º 2 do artigo 140.º, por remissão do artigo 175.º
De acordo com a referida cláusula considera-se a existência de necessidade temporária da empresa a [a]ctividade sazonal ou outra cujo ciclo anual de produção apresente irregularidades decorrentes da natureza estrutural do respectivo mercado, incluindo o abastecimento de matéria-prima”.
De acordo com o já referido acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10-07-2008, a “actividade sazonal é aquela que só surge em determinado período do ano, necessariamente limitado, perdendo posteriormente a sua utilidade (…) Em contrapartida, o ciclo de produção legalmente atendível é o ciclo anual, tornando-se ainda mister que as suas irregularidades decorram da natureza estrutural – que não conjuntural – do respectivo mercado”
Escreve Júlio Vieira Gomes (Direito do Trabalho, 1.º Volume, 2007, pág. 595) que[a] noção de actividades sazonais parece ter começado por cingir-se às estações do ano, em termos climatéricos e às suas repercussões em certas actividades, mormente na agricultura (colheitas, sementeiras), estendendo-se depois a outras indústrias em que a actividade também depende da estação do ano (pense-se no turismo balnear ou em certas actividades de turismo de Inverno, como as estâncias de esqui ou na produção de queijos dependente da qualidade do leite, por sua vez condicionada pelo estado dos pastos). A noção foi progressivamente ampliada, abrangendo a pouco e pouco situações cíclicas de aumentos de procura ou relativas, como a letra da lei sugere, ao abastecimento de matérias-primas”.
O que parece poder afirmar-se com segurança é que as actividades sazonais, ou outras cujo ciclo anual de produção apresente irregularidades decorrentes da natureza estrutural do respectivo mercado, ou seja, em que se verifiquem “picos de trabalho”, se deverão caracterizar como actividades que têm uma natureza cíclica, previsível e regular, excluindo-se, pois, as situações em que essas variações sejam imprevisíveis, o que pode suceder em qualquer actividade.
Não pode olvidar-se que a actividade sazonal, ou outra cujo ciclo anual de produção apresente irregularidades da natureza estrutural do respectivo mercado, para justificarem a contratação a termo devem corresponder ao critério geral constante do n.º 1 do artigo 140.º quanto à admissibilidade de contratação a termo, o mesmo é dizer deve estar em causa uma necessidade temporária da empresa e o contrato ser celebrado pelo período estritamente necessário à satisfação dessa necessidade (neste sentido, Maria do Rosário Palma Ramalho, Direito do Trabalho, Parte II, 3.ª Edição, Almedina, pág. 270).
Ora, no caso, lendo e relendo os contratos em apreciação, o que deles consta é, em síntese, que a aqui recorrente se dedica à montagem de módulos para a indústria automóvel, fabrico, distribuição e comercialização de produtos, peças ou componentes fabricados, total ou parcialmente, em materiais plásticos ou derivados, que tem como cliente exclusivo a AutoEuropa Automóveis, Lda., a quem fornece as peças e módulos para os veículos automóveis e que o ciclo de produção desta apresenta irregularidades diárias e semanais, que conta, inclusive, com períodos sem trabalho, o que impede a manutenção e planeamento dos postos de trabalho do quadro de efectivos da recorrente.
Dito de forma directa e simples: a recorrente justificou a celebração dos contratos em apreciação com o facto de ter apenas como cliente a Autoeuropa, e como o ciclo de produção de veículos por parte desta apresenta irregularidades tal reflete-se directamente na actividade da recorrente, impossibilitando-a de ter a manutenção e planeamento dos postos de trabalho do seu quadro de efectivos estável.
Ressalvado o devido respeito por diferente entendimento, tal motivação mais não representa do que a afirmação do risco genérico decorrente de uma determinada empresa – seja por estratégia empresarial, seja por qualquer outro motivo – ter um modelo de negócio com apenas um cliente, em que este pode por circunstâncias várias (crise de mercado, estratégia empresarial, etc.) reduzir ou até suspender a produção.
Da referida leitura da motivação dos contratos não se retira que a celebração dos mesmos se tivesse ancorado numa qualquer concreta necessidade temporária de empresa e que os contratos tivessem sido celebrados pelo tempo estritamente necessário à satisfação dessa necessidade: note-se que é a própria recorrente que ao afirmar que a produção tem variações “e por não se divisar o momento das quebras e aumentos de produção, ou seja o momento certo em que tais variações ocorrem que o contrato é celebrado a termo” [alínea L) das conclusões das alegações de recurso] parece reconhecer não estar em causa qualquer concreta necessidade temporária da empresa, mas antes uma espécie de “bolsa de emprego” em que manteria ou não alguns trabalhadores conforme a maior ou menor necessidade de produção.
Como se assinalou na sentença recorrida, “foi a Ré quem planeou o seu modelo de actividade, dependente em cerca de 80% da sua produção das encomendas da sua principal cliente, a AutoEuropa. Logo, se existem irregularidades de produção pela circunstância da Ré ter uma cliente a quem destina 80% da sua actividade, tal reflecte, tão só, uma opção estratégica industrial que à Ré apenas diz respeito – a aceitar-se a validade da motivação aposta naqueles contratos, tal levaria à conclusão da Ré poder utilizar a título precário a totalidade dos seus trabalhadores”.
Além disso, como também se refere – e bem – na sentença recorrida, não parece que se possa afirmar que está em causa uma actividade sazonal ou um ciclo anual de produção decorrente da natureza estrutural do mercado, assim se justificando a contratação a termo, pois o mercado automóvel não funcionará por ciclos anuais, antes impõe planeamento a mais longo prazo, tendo em conta, designadamente, as orientações e preferências do mercado e, com elas, a opção por determinadas categorias/modelos de veículos.
É certo que, como é público e resulta da matéria de facto (n.º 36), a produção do cliente da Ré/recorrente não é sempre igual, em termos quantitativos, variando semanalmente no número de produção de viaturas; essa variação poderá depender, afigura-se, de diversos factores, designadamente das necessidades do mercado automóvel: mas daí não se retira que embora dependendo a Ré/recorrente em 80% daquele cliente (e, note-se, a Ré havia alegado que aquele era o cliente final exclusivo) tal configure, por si só, qualquer concreta necessidade temporária dela recorrer a contratação a termo e, mais ainda, que os contratos tenham sido celebrados pelo tempo estritamente necessário à satisfação dessa necessidade.
A admitir-se a validade dos contratos de utilização de trabalho temporário em apreciação com fundamento na existência de actividade sazonal ou actividade cujo ciclo anual de produção apresente irregularidades decorrentes da natureza estrutural do mercado, tal equivaleria a possibilitar a manutenção de significativo número de trabalhadores ao serviço da mesma numa situação de precariedade, olvidando a natureza excepcional de tal contratação: seria até uma via de anular o risco empresarial inerente à “mão-de-obra”, transferindo-o para os trabalhadores.
Assim, não só as cláusulas justificativas dos contratos não se encontram suficientemente concretizadas, como nem sequer permitem estabelecer uma relação directa entre essa justificação e a contratação do Autor para o sector da manutenção (facto n.º 39) e por aqueles períodos: atente-se que o Autor desempenhava funções no referido sector, cabendo-lhe no essencial, assegurar a “manutenção preventiva e correctiva dos equipamentos que constituem as diferentes linhas de produção” de forma a garantir os níveis de produção e de qualidade requeridos e a operacionalidade geral da fábrica (facto n.º 40).
Ora, essa manutenção dos equipamentos sempre teria que ser efectuada, independentemente da maior ou menor produção da Ré: será que a maior produção da Ré implicava uma maior necessidade de trabalhadores para fazerem a manutenção dos equipamentos? Seja nas cláusulas justificativas do contrato, seja até na matéria de facto provada nada se mostra esclarecido a tal respeito.
Por isso, sem desdouro pela argumentação da recorrente a mesma não pode proceder.
E assim sendo, como se entende, sendo nulos os contratos de utilização do trabalho temporário, considera-se o trabalho prestado pelo Autor/recorrido à Ré/recorrente em regime de contrato de trabalho sem termo, pelo que a denúncia do mesmo por parte desta configura um despedimento, ilícito por desprovido de prévio procedimento [cfr. n.ºs 2 e 3 do artigo 176.º e 381.º alínea c), do CT].
Face a tal conclusão queda prejudicado o invocado (pela Ré/recorrente) abuso do direito do trabalhador/recorrido ao se recusar a assinar o contrato de trabalho a termo, pelo período de 12 meses, em 28 de Janeiro de 2015 (cfr. artigo 608.º, n.º 2, do Código de Processo Civil).
Nesta sequência, só nos resta concluir pela improcedência das conclusões das alegações de recurso e, por consequência, pela improcedência deste.

Vencida no recurso deverá a Ré/recorrente suportar o pagamento das custas respectivas (artigos 527.º do Código de Processo Civil).

V. Decisão
Face ao exposto, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em negar provimento ao recurso interposto por CC., e, em consequência, confirmam a decisão recorrida.
Custas pela recorrente.

Évora, 07 de Setembro de 2016
João Luís Nunes (relator)
Joaquim António Chambel Mourisco
Moisés Pereira da Silva

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