Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
2053/18.6T8STR-A.E1
Relator: JOSÉ MANUEL BARATA
Descritores: INCIDENTE DE QUALIFICAÇÃO DA INSOLVÊNCIA
INSOLVÊNCIA CULPOSA
Data do Acordão: 02/09/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: I.- Mostrando-se provado que os administradores da insolvente conheciam, há vários anos, o incumprimento generalizado de dívidas descritas na alínea g) do n.º 1 do artigo 20.º do CIRE, não se apresentaram à insolvência e não foi ilidida a presunção a que alude o artigo 186.º/1 e 3, do mesmo diploma, a insolvência deve ser qualificada como culposa.
II.- Se os factos provados na sentença devem ser integrados numa norma jurídica diversa da que foi encontrada pelo tribunal a quo, o tribunal de recurso deve proceder à correta aplicação do direito, nos termos preconizados pelo artigo 5.º/3, do CPC, mormente quando se fundamentou na mesma factualidade, se aplicou o mesmo instituto jurídico e a norma aplicada foi objeto das alegações do recorrente.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: Proc.º 2053/18.6T8STR-A.E1


Acordam os Juízes da 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora


Recorrentes: (…) e (…).

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No Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, Juízo de Comércio de Santarém - Juiz 2, no âmbito da insolvência de (…) – Comércio e Indústria de (…) e (…), Lda., foi deduzido incidente de qualificação culposa da insolvência contra os ora recorrentes e a sua consequente afetação, com fundamento nas alíneas a), d), f), g) e h), do artigo 186.º/2, do CIRE.
O Sr. AI e o Ministério Público não acompanharam o pedido de qualificação da insolvência como culposa.
A requerida insolvente foi notificada na morada da sede, e os requeridos foram regularmente citados, tendo apresentado oposição.
Procedeu-se à elaboração de despacho saneador, com seleção do objeto do litígio e dos temas de prova.
Realizado o julgamento foi proferida a seguinte decisão:
Por tudo o exposto decide-se:
a) Qualificar a presente insolvência da (…) – Comércio e Indústria de (…) e (…), Lda. como culposa;
b) Julgar afetados pela qualificação da insolvência os requeridos (…) e (…), inibindo-os quer para administrar patrimónios de terceiros, quer para exercer o comércio bem como para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de atividade económica, empresa pública ou cooperativa, pelo período de 5 (cinco) anos;
c) Determinar a perda de quaisquer créditos sobre a insolvência ou sobre a massa insolvente detidos pela pessoa afetada pela qualificação e a sua condenação na restituição dos bens ou direitos já recebidos em pagamento desses créditos;
d) Condenar as pessoas afetadas a indemnizarem os credores da insolvente até ao montante máximo dos créditos não satisfeitos, considerando as forças dos respetivos patrimónios, sendo tal valor a apurar em sede de liquidação de sentença, de acordo com aquilo que não seja satisfeito com a liquidação do ativo da massa insolvente e a força dos patrimónios dos afetados, apurado após a realização do rateio pelos credores.
Custas a cargo da massa insolvente, nos termos do artigo 304.º do Código de Insolvência e Recuperação de Empresas.
Proceda-se às comunicações referidas no artigo 189.º, n.º 3, do Código de Insolvência e Recuperação de Empresas.
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Não se conformando com o decidido, os recorrentes apelaram, formulando as seguintes conclusões que delimitam o objeto do recurso, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, artigos 608.º/2, 609.º, 635.º/4, 639.º e 663.º/2, do CPC:
a) Vem o presente recurso impugnar a sentença proferida nos autos, versando essencialmente sobre a fundamentação de Direito que lhe está subjacente, por discordarem os Recorrentes da interpretação que faz a douta sentença a quo das normas legais aplicáveis, e que concretamente aplicou, o que consubstancia uma violação do regime jurídico da qualificação da insolvência, conforme se demonstrará.
b) A Mma. Juiz a quo que “no caso dos autos, a qualificação da insolvência como culposa estriba-se nas alíneas a), d), f), g) e i), do artigo 186.º/2, do CIRE, considerando, no mais, o limite temporal dos 3 anos que antecederam a instauração do processo de insolvência, está em causa apenas factualidade praticada pelos requeridos … (como gerente em representação da "Empresa Editora … ") e … (como gerente em representação da "Empresa Editora … ") após 16-7- 2015.”
c) Da factualidade dada como provada entendeu a Mma. Juiz a quo que não se provou a existência de bens da insolvente que esta, após 16-7-2015, tenha ocultado ou feito desaparecer, sendo os mesmos parte considerável do património da devedora.
d) Motivo pelo qual ficou prejudicada a qualificação da insolvência nos termos da alínea a) do artigo 186.º/2, do CIRE.
e) “Também nada se provou quanto à disposição de bens da devedora após 16-7-2015, nem a utilização de créditos ou bens da devedora contrariamente aos interesses da mesma, já que nesta data não existiriam, de acordo com a prova produzida, quaisquer bens da devedora.”
f) Outrossim, “relativamente à prática de irregularidades contabilísticas com prejuízo relevante para a compreensão da situação patrimonial e financeira da devedora, após 16-7-2015, a mesma não ficou provada porquanto a única irregularidade apontada pela AT na sua inspeção tributária às contas de 2015 foi alvo de retificação, e o Sr. AI, com base na contabilidade de 2015 e anos seguintes não detetou qualquer indício de irregularidade que lhe permitisse concluir nesse sentido.
g) Ficando, por isso, igualmente prejudicada a qualificação da insolvência nos termos das alíneas d), f) e g) do artigo 186º/2 do CIRE.
h) Não obstante, concluiu a Mma. Juiz a quo que “(…) produzida a prova, resultou à saciedade que desde 2002 que as contas da insolvente a reconduziam à situação do artigo 35.º do CSC, de falência técnica. Em 2008 a devedora deixou de pagar pontualmente os salários dos seus trabalhadores. Em 2012 duas trabalhadoras da insolvente despedem-se com justa causa por terem salários em atraso. Durante o ano de 2013 a insolvente deixa de desenvolver a sua atividade no lugar da sede e passa a ocupar a sede da sócia maioritária, com quem faz acordo de pagamento de rendas por encontro de contas; todos os bens que tinha são vendidos em processo executivo e, no caso da carrinha, pela própria pelo valor de € 200,00; e, por fim, cessa a sua atividade para efeitos de IVA e IRS em 30-12-2013; e deixa de laborar em 2-1-2014. Já com toda a atividade paralisada, no balancete geral analítico de dezembro de 2017 da “(…) – Comércio e Indústria de (…) e (…), Lda. constam como resultados transitados - € 173.913,59 (valor negativo). Sendo os únicos gerentes da devedora, os aqui requeridos, um advogado e um contabilista, que estão nessas funções desde a constituição da mesma, não há forma de duvidar do conhecimento dos mesmos quanto ao dever de apresentarem, há largos anos, a sociedade à insolvência. O prazo para o devedor se apresentar à insolvência é, atualmente, e em 2015, fixado em 30 dias e, ao tempo dos factos, a contar do seu conhecimento da situação de insolvência, ou da data em que a devesse conhecer (artigo 18.º, n.º 1). No entanto, sendo o devedor titular de empresa, é estabelecida uma presunção iuris et de iure quanto ao seu conhecimento generalizado das suas obrigações previstas na alínea g) do n.º 1 do artigo 20.º (n.º 3 do artigo 18.º), isto é, das suas obrigações tributárias, ou das suas obrigações à segurança social, ou das suas obrigações de retribuição laboral, ou das rendas devidas por locação, etc.… Desta forma, desde pelo menos 2015 que existe um incumprimento reiterado, pelos requeridos, do dever de apresentarem a devedora à insolvência. Consequentemente, ao abrigo do artigo 186.º/2-i), do CIRE, tem a vertente insolvência de ser qualificada como culposa.”
i) Nos termos do artigo 186.º, n.º 1, do C.I.R.E., a «insolvência é culposa quando a situação tiver sido criada ou agravada em consequência da atuação, dolosa ou com culpa grave, do devedor ou dos seus administradores, de direito ou de facto, nos três anos anteriores ao início do processo de insolvência».
j) Para Ana Prata, Jorge Morais Carvalho e Rui Simões (in Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, Almedina, 2013, pág. 508), o artigo 186.º, n.º 1, do CIRE consagra-se uma «cláusula geral aberta» que exige, para a qualificação da insolvência como culposa, não apenas uma conduta dolosa ou com culpa grave do devedor e seus administradores mas também um nexo de causalidade entre essa conduta e a situação de insolvência, consistente na contribuição desse comportamento para a criação ou agravamento da situação de insolvência» (Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, Direito da Insolvência, 3ª edição, Almedina, 2011, pág. 283-4) – cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 01-02-2018, disponível em www.dgsi.pt
k) São, por isso, requisitos cumulativos da qualificação de um insolvência como culposa, nos termos do artigo 186.º, n.º 1, do CIRE: (i) o facto inerente à atuação, por ação ou por omissão, do devedor ou dos seus administradores, nos três anos anteriores ao início do processo de insolvência; (ii) a ilicitude desse comportamento; (iii) a culpa qualificada do seu autor; (iv) e o nexo causal entre aquela atuação e a criação ou o agravamento da situação de insolvência – cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 01-02-2018, disponível em www.dgsi.pt
l) Uma vez considerada a dificuldade de apurar o dolo ou a negligência grave do devedor ou dos seus administradores, e da relação de causalidade entre essa conduta e a criação ou o agravamento da situação de insolvência, o legislador permite o recurso a um conjunto tipificado (e taxativo) de factos-índices da mesma (reportados a factos/situações tidos como graves), fazendo-o nos números 2 e 3 do artigo 186.º em causa.
m) Assim, nos termos do artigo 186.º, n.º 2 – que é que aquele que ora releva, uma vez que a decisão em crise qualifica a insolvência pelo artigo 186.º/2, alínea i), conforme resulta do ponto h) destas conclusões – parece ter sido entendimento da Mma. Juiz a quo que da verificação dos factos-índices nele estabelecidos, designadamente da alínea i), resulta iniludivelmente o carácter culposo da insolvência, prescindindo-se assim de um juízo de culpa (que se afigura aqui presumida normativamente), e da demonstração da existência do nexo de causalidade entre a conduta culposa e a sua adequação para a criação ou para o agravamento da insolvência.
n) Entendemos, porém, que a recondução da realidade de facto a uma aplicação simplista desta norma, que como veremos resulta em manifesto erro do Tribunal, levar-nos-ia porventura a considerar culposas a esmagadora maioria das insolvências do tecido empresarial português, constituído, consabidamente, por pequenas e médias empresas que esbarram em esforços inimagináveis para honrar os compromissos assumidos.
o) Sem conceder, ressalve-se que nos presentes autos não se demonstraram preenchidos, ainda que alegados, quaisquer outros dos restantes factos índices do artigo 186.º, n.º 2, como supra se referiu nos pontos c) a g) das presentes conclusões, por referência à factualidade dada como provada.
p) Mas além destes também não se encontra devidamente fundamentado o preenchimento do dito “facto-índice” a que se reporta a alínea i) do n.º 2 do artigo 186.º, ao qual se encontra subsumido o incumprimento do dever de apresentação à insolvência.
q) Concluindo a decisão sob recurso que ao abrigo do artigo 186.º/2-i), do CIRE, tem a vertente insolvência de ser qualificada como culposa.”
r) Em anotação ao Código de Insolvência e Recuperação de Empresa, Luís A. Carvalho Fernandes e João Labareda, sustentam “(…) as situações previstas nas várias alíneas do n.º 2 não suscitam problemas de interpretação, sem prejuízo de, na sua aplicação concreta, se dever atender às circunstâncias próprias da situação do devedor (…) há contudo um caso em que se impõe uma nota adicional, por estar em causa a sua articulação com outro preceito do CIRE (…)” que é justamente a dita alínea i) – pág. 719.
s) Segundo os mesmos Autores, nos termos desta alínea i) que é a mesma pela qual vem qualificada a presente insolvência, “(…) a insolvência considera-se sempre culposa se os administradores do devedor, a quem é aplicável o artigo 83.º, ex vi do n.º 4 tiverem “incumprido de forma reiterada, os seus deveres de apresentação e de colaboração até à data da elaboração do parecer referido no n.º 2 do artigo 188.º”.
t) Os referidos deveres de apresentação e colaboração até à data da elaboração do parecer referido no nº 2 do artigo 188º estão previstos no artigo 83.º do CIRE, nos termos do qual: “O devedor insolvente fica obrigado a: a) Fornecer todas as informações relevantes para o processo que lhe sejam solicitadas pelo administrador da insolvência, pela assembleia de credores, pela comissão de credores ou pelo tribunal; b) Apresentar-se pessoalmente no tribunal, sempre que a apresentação seja determinada pelo juiz ou pelo administrador da insolvência, salva a ocorrência de legítimo impedimento ou expressa permissão de se fazer representar por mandatário; c) Prestar a colaboração que lhe seja requerida pelo administrador da insolvência para efeitos do desempenho das suas funções.”
u) Mais dispõe o n.º 3 deste artigo 83.º que “A recusa de prestação de informações ou de colaboração é livremente apreciada pelo juiz, nomeadamente para efeito da qualificação da insolvência como culposa.”
v) Em bom rigor, e segundo entendemos, é justamente esta recusa na apresentação e prestações de informações ou de colaboração que pode desencadear a qualificação da insolvência nos termos do artigo 186.º, n.º 2, alínea i), ainda que a conjugação destas duas normas imponha uma fundamentação acrescida da decisão, já que sujeita à livre apreciação do juiz, esta norma impõe que tal omissão não seja uma circunstância de verificação automática.
w) Só que esta recusa, por parte dos administradores, aqui Recorrentes, não se encontra provada ou sequer alegada.
x) Pelo que se impõe constatar que na fundamentação da decisão sob recurso em nenhum trecho se concretiza tal recusa na apresentação e prestações de informações ou de colaboração.
y) Desde logo porque ela não existiu!
z) E depois porque os administradores da insolvente prestaram aos órgãos da insolvência e ao próprio Tribunal todos os elementos de vária ordem para o exercício adequado das duas funções e desenvolvimento do processo (idem, pág. 441) e em todos os momentos que os mesmos foram solicitados.
aa) Dispõe o artigo 665.º do CPC que a sentença é nula quando: “(…) b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;(…) e quando “(…) c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;”
bb) Entendemos, por isso e sem reservas, que os fundamentos de facto e direito a que o Tribunal a quo recorreu não justificam de forma nenhuma a decisão tomada;
cc) Ou que – o que vai exatamente no mesmo sentido – decisão proferida não encontra respaldo na fundamentação de facto e de direito.
dd)E, por isso, que a fundamentação do aresto impugnado está em manifesta contradição com a decisão proferida que sustenta, e sublinhe-se uma vez mais, a qualificação da insolvência reconduzindo-a ao artigo 186.º/2-i), do CIRE.
ee) As nulidades que ora se invocam, nos termos do n.º 5 do referido artigo 615.º “(...) só podem ser arguidas perante o tribunal que proferiu a sentença se esta não admitir recurso ordinário, podendo o recurso, no caso contrário, ter como fundamento qualquer dessas nulidades.”
ff) Assim e por efeito das invocadas nulidades processuais justifica-se a anulação da sentença sob recurso, que infra se requer, e de todos os atos que, em consequência, venham a ser praticados nos termos do artigo 195.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, considerando que o presente recurso tem efeito devolutivo.
gg) Acresce ainda, e sem prescindir, que, se provada qualquer uma das situações enunciadas nas diversas alíneas deste n.º 2 do artigo 186.º do C.I.R.E., se estabelece de forma automática o juízo normativo de culpa do(s) administrador(s), sem necessidade de demonstração do nexo causal entre a omissão dos deveres constantes das diversas alíneas e a situação de insolvência ou o seu agravamento.
hh) O mesmo não se passa no caso do n.º 3 do artigo 186.º do C.I.R.E., em que, estão «em causa deveres (…) de carácter formal», sem prejuízo de permitirem, «presuntivamente, a ser cumpridos, a detecção mais precoce da situação real da empresa, de insolvência ou de risco de insolvência»; e, por isso, o «seu incumprimento é, assim, razoavelmente indiciador de, no mínimo, um grave desleixo na actuação gestionária, levando a admitir (mas com carácter de presunção juris tantum, rebatível por prova em contrário) estar preenchido o requisito de culpa grave, forma de culpa qualificada, exigível, em alternativa ao dolo, tanto pela lei de autorização (n.º 6 do artigo 2.º), como pelo CIRE (artigo 186.º, n.º 1)» (Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 564/2007, de 13.11.2007, Joaquim de Sousa Ribeiro, com bold apócrifo) – cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 01-02-2018, disponível em www.dgsi.pt)
ii) Também aqui a sentença sob recurso é omissa quanto a uma hipotética valoração de facto e direito que permita a qualificação da insolvência nos termos conjugados do artigo 186.º, nºs 1 e 3, do CIRE.
jj) Pelo que, a considerar-se, por mera hipótese académica, que no espirito do Tribunal a quo estaria antes a presunção de culpa grave em razão da omissão do dever de requerer a declaração de insolvência, prevista no artigo 186.º, n.º 3, alínea a), o que não se concede, também, nesse caso, a sentença sob recurso seria nula por não se achar devidamente fundamentada de facto e direito, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea b), do CPC.
kk) Considerando que em nenhum dos pontos da matéria de facto dada como provada, o Tribunal a quo se pronunciou a circunstância de poder concluir que a situação de insolvência tenha sido criada ou agravada pela referida conduta culposa do(s) administrador(es)”, por referência ao limite temporal dos 3 anos que antecederam a instauração do processo de insolvência, está em causa apenas factualidade praticada pelos requeridos … (como gerente em representação da "Empresa Editora … ") e … (como gerente em representação da "Empresa Editora … ") após 16-7- 2015.
ll) A decisão proferida pelo Tribunal a quo é por tudo isto nula, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alíneas b) e c), do CPC, e viola de forma evidente o disposto no artigo 186.º, n.º 1, n.º 2, alínea i) e n.º 3, do CIRE.
Nestes termos e nos demais de Direito, que doutamente se suprirão, deverá ser dado provimento ao presente recurso e, por via dele em consequência, ser declarada a nulidade a sentença nos exatos termos previstos no artigo 615.º, n.º 1, alíneas b) e c), e violação do artigo 186.º, nºs 1, 2 e 3, tudo com as legais consequências, assim se fazendo a já costumada e almejada Justiça.
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(…) contra-alegou, concluindo:
1. Consta na sentença “considerando o limite temporal dos 3 anos que antecederam a instauração do processo de insolvência, está em causa apenas factualidade praticada pelos requeridos(como gerente em representação da "Empresa Editora ") e(como gerente em representação da "Empresa Editora ") após 16-7-2015”;
2. Neste enquadramento, foi considerada culposa, nos termos do artigo 186.º/2-i), do CIRE, face ao incumprimento reiterado dos seus deveres de apresentação.
3. Para tal, a meritíssima juíza, elencou numa “penada”, um conjunto de factos, demonstrando à evidência, que desde pelo menos 2015, existia um incumprimento reiterado dos requeridos, do dever de apresentarem a devedora à insolvência;
4. De facto, a partir de 2002, as contas da insolvente reconduziam-na à situação do artigo 35.º do CSC, de falência técnica, sendo que esta senda de prejuízos consecutivos, se manteve até às “vésperas” da entrada em juízo destes autos, como resulta do balancete geral analítico de 2017, onde constam resultados transitados de (-) € 173.913,59 (13, 14, 15 e 19 – prova);
5. Ou seja, é uma sociedade, que ao longo de 20 anos de existência, nunca “saboreou” um simples “travo” de lucro, situação agravada pela inação “sistémica” dos gerentes, que nada fizeram para a reverter, apesar de conhecerem a sua real dimensão (16 – prova);
6. Teve de ser uma ex-trabalhadora, que com estoicismo e sacrifícios pessoal e familiar, não teve outra sorte do que calcorrear durante os últimos 10 anos os corredores dos Tribunais, na miragem de receber os seus direitos salariais, que agora – fruto da decisão – se tornaram em algo de concretizável, quase apetecendo dizer, que valeu a pena;
7. Esta, despediu-se com justa causa em 2012; interpôs ação no Tribunal de Trabalho em 2013; neste mesmo ano, foi a insolvente condenada, por homologação de transação judicial, a pagar a quantia de € 15.000,00, tendo sido acordado que, em caso de incumprimento, seria repristinado o original da dívida de € 28.237,00 (30 – prova);
8. O que veio a suceder, pois, das prestações acordadas, lamentavelmente, não foi paga uma única que fosse, vencendo-se todas (31 – prova);
9. Nesta sequência, requereu a insolvência em 2018, que veio agora a ser qualificada como culposa, no mesmo sentido do acórdão proferido por esse Venerando Tribunal, em 30.06.2021, no âmbito do proc. n.º 2287/15.3T8STR.E.E1;
10. Durante este périplo temporal, a insolvente deixou de desenvolver a sua atividade no lugar da sede em 2013, passando a ocupar a da sócia maioritária, com quem fez um acordo de pagamento de rendas por encontro de contas (35, 36 e 37 – prova);
11. À data, todos os bens da recorrente tinham sido vendidos em processo executivo (40 e 41 – prova);
12. Em 30.12.2013, cessou a sua atividade para efeitos de IVA e IRS (17 – prova);
13. Tendo a sua atividade sido cessada fisicamente em 02.01.2014 (18 – prova);
14. Daí a nossa perplexidade, quanto aos prejuízos de 2017, pois mesmo paralisada, é manifesta a sua ânsia em acumular resultados negativos;
15. Não esquecendo que foi no início de 2008, que começou a apresentar sérias dificuldades económicas, com o atraso no pagamento dos salários aos trabalhadores, realidade esta, do conhecimento dos gerentes, que amiúde abordavam com eles (15 e 16);
16. Ora, sendo os requeridos os únicos administradores da devedora, um advogado e um economista, tendo este último desempenhado as funções de TOC de 2001 em diante e estando nessas funções desde a sua constituição, não há forma de duvidar – nas palavras da senhora juíza – do conhecimento dos mesmos, quanto ao dever de apresentarem, há largos anos, a sociedade à insolvência (5, 6 e 7);
17. Não o terão feito por vergonha e constrangimento, por serem pessoas publicamente conhecidas na cidade de Tomar (51 – prova);
18. Não obstante terem confessado no seu articulado de contestação, que tinham pleno conhecimento da situação (21 – prova);
19. Na verdade, seria expectável e exigível outra conduta aos requerentes, que desde a constituição da sociedade, criaram e agravaram, com culpa grave, uma situação económica deficitária, que decorreu durante duas décadas, sem que alguma vez tenham tentado reverter tal situação;
20. Demonstraram uma total incapacidade no exercício das suas funções, dado os sinais inequívocos da situação de insolvência logo em 2002, continuados em 2003 e mais do que confirmados em 2008, quando os funcionários começaram a sentir na “pele”, o que é trabalhar sem receber (13, 14 e 15 – prova);
21. O que os levou a rescindir os contratos de trabalho, como fez a recorrida, que chegada à insolvência viu ser-lhe negado o Fundo de Garantia Salarial, por esse motivo;
22. Fecharam as portas, sem darem uma palavra à recorrida, com quem tinham acordado judicialmente o pagamento dos seus salários, deixando-a com uma mão “cheia de nada”, situação que se agrava a cada dia que passa;
23. O prazo de 30 dias para apresentação à insolvência, decorre desde 2002, data a partir da qual as contas da insolvente a reconduzem à situação do artigo 35.º do CSC;
24. Na verdade, os gerentes optaram por um comodismo inerte, quem nem a falta de pagamento de salários foi suficiente para os sensibilizar;
25. Como refere a decisão recorrida, ao devedor titular de empresa, é estabelecida uma presunção juris et de iure, quanto ao conhecimento generalizado das suas obrigações previstas na alínea g) do n.º 1 do artigo 20.º (n.º 3 do artigo 18.º), entre elas as de retribuição laboral.
26. Reafirmando, que desde pelo menos 2015, existe um incumprimento reiterado, do dever de apresentarem a devedora à insolvência.
27. Ao abrigo do artigo 186.º/2-i), do CIRE, qualificou-a como culposa.
28. Os recorrentes fundamentam o seu recurso, invocando uma nulidade nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alíneas b) e c), do CPC por violação do disposto nos artigos 186.º, n.º 1 e n.º 2, alínea i) e n.º 3, do CIRE;
29. Julgamos não lhes assistir qualquer razão jurídica para tal alegação;
30. Antes do mais, diga-se que o está em causa é o dever de apresentação à insolvência e não outro, como transparece das suas conclusões;
31. Dizer-se que não se demonstra preenchido o “facto-índice” a que se reporta a alínea i) do n.º 2 do artigo 186.º, é pretender desvirtuar os factos provados, sendo certo, que estamos perante um recurso de direito;
32. São muitos os factos revestidos de tal qualidade, que nos permitem subsumir o caso à citada norma, sendo de fácil compreensão a sua qualificação;
33. Só que os recorrentes parecem “afastar os olhos” da realidade que construíram e alimentaram durante 20 anos;
34. Dos factos fixados pela prova, decorre que existe a presunção inilidível de que os gerentes da insolvente tinham conhecimento da situação de insolvência desde 2002, ou pelo menos a partir do dia em que fecharam as portas em 02.01.2014, deixando os seus credores à mingua, sem que a apresentassem a sociedade a juízo;
35. Daqui se conclui que efetivamente incumpriram o dever de apresentação previsto no acima citado artigo 18.º, n.º 1, do CIRE.
36. Para o funcionamento desta presunção é necessário que se demonstre que tal incumprimento criou ou agravou a situação de insolvência, o que julgamos ter sido plenamente realizado, dada a prova produzida, ficando dessa forma preenchido o requisito para operar a presunção da alínea a) do n.º 3 do artigo 186.º do CIRE.
37. Não entendemos a afirmação de que a decisão não encontra respaldo na fundamentação de facto e direito e muito menos, vislumbramos quaisquer contradições;
38. Tanto mais que, o nexo de causalidade entre a atuação ilícita dos administradores e a criação do agravamento da insolvência foi facilmente estabelecido através da prova;
39. A sentença concluiu pela existência do nexo entre os factos praticados ou omitidos e a criação e o agravamento da situação de insolvência, e o nexo de imputação dessa situação às condutas, a título de culpa grave.
40. De acordo com o disposto no artigo 186.º, n.º 1, do CIRE, a conexão causal entre a atuação ilícita dos administradores e a criação ou agravamento da insolvência encontra-se verificada desde que a atuação ilícita dos mesmos contribua para a situação de insolvência, que foi o que sucedeu;
41. Ou seja, bastou que tal atuação contribuísse para a diminuição da capacidade da sociedade para o cumprimento das obrigações e para a diminuição do seu património, para que se verifique a conexão causal exigida;
42. Tudo isto está manifestado no processo;
43. A Senhora Juíza fez uma interpretação crítica e dinâmica, à globalidade da factualidade, segundo as regras da experiência comum e da lógica, para inferir a verificação de factos e dessa forma estabelecer que a conduta dos recorrentes não foi de todo indiferente à verificação do resultado;
44. Assim se fechou a página da história da insolvente, trazendo à recorrida a esperança de que o longo braço da justiça não abandona quem por ela nunca desiste.
Nestes termos e com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve ser negado provimento ao presente recurso, mantendo-se a decisão recorrida. JUSTIÇA!
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O Ministério Público também contra-alegou, concluindo:
1. Considerando o limite temporal dos 3 anos que antecederam a instauração do processo de insolvência, está em causa apenas factualidade praticada pelos requeridos … (como gerente em representação da "Empresa Editora … ") e … (como gerente em representação da "Empresa Editora … ") após 16-7-2015.
2. Não se provou a existência de bens da insolvente que esta, após 16-07-2015, tenha ocultado ou feito desaparecer.
3. O único bem passível de enquadramento na alínea a) do artigo 186.º/2, do CIRE, seria o direito de crédito no valor de € 25.315,88, sobre a Tipografia (…), cuja nota de crédito foi anulada em setembro de 2015.
4. Contudo, tendo sido reconhecidos créditos sobre a insolvência desta credora, no valor de € 91.641.89, concluiu-se que o direito de crédito em causa nunca poderia corresponder a parte considerável do património da devedora.
5. Quanto muito, a existir, o mesmo apenas serviria para compensar parte do crédito detido pela Tipografia sobre a insolvente.
6. Nada se provou quanto à disposição de bens da devedora após 16-07-2015, nem a utilização de créditos ou bens da devedora contrariamente aos interesses da mesma, já que nesta data não existiriam quaisquer bens da devedora.
7. Relativamente à alegada prática de irregularidades contabilísticas com prejuízo relevante para a compreensão da situação patrimonial e financeira da devedora, após 16-07-2015, nada se provou.
8. A única irregularidade apontada pela AT na sua inspeção tributária às contas de 2015 foi alvo de retificação, e o senhor AI, com base na contabilidade de 2015 e anos seguintes, não detetou qualquer indício de irregularidade que lhe permitisse concluir nesse sentido.
9. Nos termos do artigo 186.º/2-i), do CIRE, «Considera-se sempre culposa a insolvência do devedor que não seja uma pessoa singular quando os seus administradores, de direito ou de facto, tenham: (…) i) Incumprido, de forma reiterada, os seus deveres de apresentação e de colaboração previstos no artigo 83.º até à data da elaboração do parecer referido no n.º 6 do artigo 188.º».
10. Apurou-se que, desde 2002, as contas da insolvente a reconduziam à situação do artigo 35.º do CSC, de falência técnica.
11. Em 2008 a devedora deixou de pagar pontualmente os salários dos seus trabalhadores.
12. Em 2012 duas trabalhadoras da insolvente despedem-se com justa causa por terem salários em atraso.
13. Durante o ano de 2013 a insolvente deixa de desenvolver a sua atividade no lugar da sede e passa a ocupar a sede da sócia maioritária, com quem faz acordo de pagamento de rendas por encontro de contas.
14. Todos os bens que tinha são vendidos em processo executivo e, no relativamente à carrinha, pela própria, pelo valor de € 200,00.
15. Cessa a sua atividade para efeitos de IVA e IRS em 30-12-2013, deixando de laborar em 02-01-2014.
16. Já com toda a atividade paralisada, no balancete geral analítico de dezembro de 2017 da (…) constam, como resultados transitados, - € 173.913,59 (valor negativo).
17. Sendo os aqui requeridos os únicos gerentes da devedora, que, de resto, estão nessas funções desde a constituição da empresa, tinham inegável conhecimento do dever de apresentarem a sociedade à insolvência.
18. Todavia, desde 2015 que existiu um incumprimento reiterado do dever de apresentarem a devedora à insolvência.
19. Razão pela qual, face artigo 186.º/2-i), do CIRE, foi a insolvência qualificada como culposa.
20. Deste modo, para além do mais, temos como ajustado ao nível de conhecimento que os requeridos não poderiam deixar e tinha a obrigação de ter nos factos dados como provados, o grau de responsabilidade e a medida da inibição que lhes foi aplicada.
V- Não se vislumbra, portanto, que a douta sentença recorrida padeça de qualquer dos vícios que os recorrentes lhe apontam.
Assim sendo, por não ter sido violada qualquer norma jurídica, deve o recurso interposto ser rejeitado, mantendo-se a douta sentença recorrida.
Porém, Vossas Excelências decidirão, como sempre, com a costumada prudentia.
*
A questão que importa decidir é a de saber se a sentença é nula por falta de fundamentação e por ambiguidade ou obscuridade que a tornam ininteligível – artigo 615.º/1, b) e c), do CPC – com a consequente não verificação do disposto no artigo 186.º, n.º 1, n.º 2, alínea i) e n.º 3, do CIRE.
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A matéria de facto fixada na 1ª instância é a seguinte:
FACTOS PROVADOS
1. A “(…) – Comércio e Indústria de (…) e (…), Lda.”, com o NIPC (…), e única sede desde a sua constituição na Travessa da (…), n.º 27, 2300-522 Tomar, tem um capital social de € 14.963,94 desde a sua constituição – Certidão permanente de fls. 72 e seguintes.
2. Foi constituída em 26-2-1991, e tem como objeto social desde então o comércio e indústria de (...) e (…) – Certidão permanente de fls. 72 e seguintes.
3. O seu capital social, aquando da constituição, foi distribuído por 3 quotas, sendo uma no valor de € 748,20 de (…); outra de € 2.992,79 de (…); e a quota de € 11.222,95 da “Empresa Editora (…), Lda.” – Certidão permanente de fls. 72 e seguintes.
4. Para obrigar a sociedade em todos os atos e contratos e movimentação e abertura de contas em instituições de crédito é necessária a assinatura de um dos representantes da "Empresa Editora (…)" e do sócio gerente (…) – Certidão permanente de fls. 72 e seguintes.
5. Aquando da constituição da “(…) – Comércio e Indústria de (…) e (…), Lda.”, foram nomeados gerentes da mesma: (…), como gerente em representação da "Empresa Editora (…)"; (…), como gerente em representação da "Empresa Editora (…)"; e (…) – Certidão permanente de fls. 72 e seguintes.
6. (…) é contabilista, tendo desempenhado as funções de TOC da insolvente, desde 2001 em diante – doc. fls. 427 e seguintes.
7. (…) é advogado.
8. Em 30-10-2006 foi registada a renúncia de (…), datada de 31-12-2002, ao cargo de gerente – Certidão permanente de fls. 72 e seguintes.
9. Na Empresa Editora (…), Lda., NIF (…), com o capital social de € 5.000,09, (…) e (…) são titulares de três quotas, com os valores nominais de € 318,19 cada, uma delas em partes iguais com (…) – doc. fls. 22/verso e seguintes.
10. A Empresa Editora (…), Lda. tem sede, desde a sua constituição, na Praça da (…), n.º 22-1.º, em Tomar – doc. fls. 22/verso e seguintes.
11. Em 29-9-2011 foram depositadas na Conservatória de Registo Comercial as contas de 2010 da (…) – Certidão permanente de fls. 72 e seguintes.
12. Em 6-7-2012 foram depositadas na Conservatória de Registo Comercial as contas de 2011 da (…) – Certidão permanente de fls. 72 e seguintes.
13. Na assembleia geral de 16-5-2002 da “(…) – Comércio e Indústria de (…) e (…), Lda., foi aprovado o relatório de contas relativo ao exercício de 2001, com um prejuízo no exercício de esc. 2.264.577$40, que foi transferido para a conta dos resultados transitados – doc. fls. 221.
14. Na assembleia geral de 28-5-2003 da “(…) – Comércio e Indústria de (…) e (…), Lda., foi aprovado o relatório de contas relativo ao exercício de 2002, com um prejuízo no exercício de € 39.786,02, que foi transferido para a conta dos resultados transitados, e suscitada a aplicação do artigo 35.º do CSC – doc. fls. 222.
15. A insolvente no início de 2008 começou a apresentar sérias dificuldades económicas e, consequentemente, a atrasar o pagamento dos salários aos trabalhadores.
16. Os seus gerentes conheciam a situação financeira da mesma, abordando-a com os trabalhadores.
17. A “(…) – Comércio e Indústria de (…) e (…), Lda.” cessou a sua atividade para efeitos de IVA e IRS desde 30-12-2013 – Relatório do artigo 155.º do CIRE junto a fls. 215 e seguintes do processo principal e doc. de fls. 26.
18. A atividade da insolvente foi fisicamente cessada em 2-1-2014 – Relatório do artigo 155.º do CIRE junto a fls. 215 e seguintes do processo principal.
19. No balancete geral analítico de dezembro de 2017 da “(…) – Comércio e Indústria de (…) e (…), Lda. constam como resultados transitados – € 173.913,59 (valor negativo) – doc. de fls. 422 e seguintes.
20. Em 16-7-2018, (…) requereu a insolvência da “(…) – Comércio e Indústria de (…) e (…), Lda.” – Processo principal.
21. Pessoal e regularmente citada na pessoa dos seus gerentes, a requerida juntou articulado de contestação, onde invocou a existência da nulidade da p. i. decorrente do não pagamento da taxa de justiça inicial e confessou a situação de insolvência, não obstante refutar a factualidade imputada a título de qualificação da insolvência como culposa – Processo principal.
22. Em 21-11-2018 foi proferida sentença de insolvência da “(…) – Comércio e Indústria de (…) e (…), Lda.”, que transitou pacificamente em julgado – Processo principal.
23. Em 8-1-2019 foi junto o relatório do artigo 155.º do CIRE, donde consta, designadamente, que não existem bens registados em nome da insolvente, e o recheio da empresa foi penhorado e vendido no âmbito do Processo n.º 700/13.5TBTMR – Relatório do artigo 155.º do CIRE junto a fls. 215 e seguintes do processo principal.
24. No referido relatório foi apresentada proposta de encerramento do processo por insuficiência da massa insolvente, atenta a inexistência de ativo da insolvente suscetível de apreensão para a massa insolvente – Relatório do artigo 155.º do CIRE junto a fls. 215 e seguintes do processo principal.
25. Em assembleia de credores de apreciação do relatório, que teve lugar no dia 14-1-2019, foi o relatório do Sr. AI votado favoravelmente pelos credores presentes com direitos de voto – ata de fls. 230 e seguintes do processo principal.
26. Em 23-1-2019 o Sr. AI juntou a lista do artigo 129.º do CIRE da qual consta o reconhecimento de créditos a 12 credores, no valor total de € 226.158,42, entre os quais figura: – lista junta a fls. 234/verso e seguintes do processo principal,
a. o crédito de natureza laboral de (…), no montante de € 34.306,12;
b. o crédito de (…), resultante de pagamentos efetuados em substituição da insolvente, no valor de € 19.793,95;
c. o crédito da “Empresa Editora (…), Lda.”, resultante de fornecimentos e empréstimos, no valor de € 64.885,16;
d. o crédito de (…), resultante de empréstimo pessoal, no valor de € 6.877,15;
e. o crédito de (…) – Tipografia Comercial de (…), Lda., a título de fornecimentos, no valor de € 91.641,89.
27. Em 2-10-2012, a trabalhadora da (…), (…), despediu-se com justa causa, por ter 4 meses de salários em atraso, subsídios de férias e Natal de 2011 e subsídio de férias de 2012 por receber – doc. de fls. 174.
28. Em dezembro de 2012, a (…) devia salários às duas trabalhadoras que tinha ao serviço (… e …).
29. À trabalhadora (…) eram devidos 6 meses e meio de salários em atraso, e respetivos subsídios de férias e Natal, facto esse que, motivou o respetivo despedimento por justa causa da trabalhadora.
30. Na sequência da ação interposta, que correu termos no Tribunal do Trabalho de Tomar sob o n.º 205/13.4TTTMR, foi a insolvente condenada, por homologação de transação judicial, a pagar à sua ex-trabalhadora a quantia de € 15.000,00, em prestações iguais, mensais e sucessivas, no valor de € 500,00, título de compensação pecuniária de natureza global, pela cessação do seu contrato de trabalho. Mais acordaram que, em caso de incumprimento, fosse repristinado o montante original da dívida reclamada, ou seja, € 28.237,72 – doc. de fls. 15 e seguintes.
31. Das prestações acordadas a insolvente não pagou a primeira e seguintes, vencida a primeira a 8 de agosto de 2013, vencendo-se todas.
32. O veículo automóvel com a matrícula (…), que estava registado em nome da (…) desde 2112-1999, foi vendido em 27/12/2012, pelo valor líquido de duzentos euros, à Empresa Editora (…) – doc. de fls. 101/verso do processo principal.
33. Em 27/12/2012, tal veículo automóvel já era utilizado pela Empresa Editora (…), Lda., no exercício da sua atividade.
34. Em 17 de Maio de 2013 foi transferida a propriedade do veículo automóvel, de marca Renault, matrícula (…) para a “Empresa Editora (…), Lda.” – doc. de fls. 29.
35. Algures entre o despedimento de (…) em julho de 2013, a (…) deixou de desenvolver a sua atividade na Travessa da (…) e passou a laborar na Praça da (…), juntamente com a Empresa Editora (…), Lda.
36. O imóvel sito na Praça da (…), n.º 27-1.º, em Tomar foi arrendado por … (na qualidade de senhorio) ao Jornal (…), v. g. Empresa Editora (…), Lda., NIF … (na qualidade de arrendatário), em 17 de julho de 2002 – doc. fls. 87/verso e seguintes do processo principal.
37. Sobre a utilização destas instalações, cedidas pela arrendatária à insolvente, era feito um encontro de contas no qual estavam incluídos os valores devidos pela utilização das mesmas – doc. de fls. 88/verso e seguintes do processo principal.
38. O imóvel foi entregue à proprietária no âmbito do processo de despejo que correu termos no Balcão Nacional do Arrendamento com o n.º 3258/14.4YLPRT.
39. Sobre a dívida de rendas da “Empresa Editora (…), Lda.” foi celebrado um acordo de pagamento no âmbito do processo n.º 120/15.7T8ENT, que correu termos no Juízo de Execução do Entroncamento – doc. fls. 91/verso e seguintes do processo principal.
40. Em 30-4-2014, foram adjudicados à exequente (…) – Indústria (…), Lda., no âmbito da ação executiva n.º 700/13.5TBTMR, que correu termos no Juízo de Execução do Entroncamento - J1, os bens móveis não sujeitos a registo da insolvente penhorados em 10-7-2013, na Praça da (…), n.º 27, em Tomar, aos quias foi atribuído o valor de € 2.800,00 – doc. de fls. 95 e seguintes do processo principal.
41. Os bens em causa consistiam em: – doc. de fls. 95 e seguintes do processo principal a. 2 secretárias;
b. Um computador com teclado e monitor marca LG;
c. Uma Photter Epson Modelo Pro 9000;
d. Uma fotocopiadora multifunções marca Gestener DSM 615.
42. Em 24 de Setembro de 2015 a insolvente juntou ao processo n.º 205/13.4TTTMR.1, a conta 21 do balancete de 31-12-2012, da qual resultam diversos créditos detidos pela insolvente nessa altura – doc. fls. 92 e seguintes.
43. Em 12 de Outubro e 16 de novembro de 2015, a requerente requereu, naquele processo, a penhora de alguns dos créditos constantes da referida conta – doc. fls. 95 e seguintes.
44. Entretanto, foi junta àquele processo, a conta 21 do balancete geral analítico de dezembro de 2015, da qual deixou de constar um crédito no valor de € 25.315,88, sobre a Tipografia (…) de Tomar – doc. fls. 101 e seguintes.
45. Crédito esse que a insolvente anulou através da emissão de uma nota de crédito, datada de 30 de setembro de 2015, com o n.º 20110004 – doc. de fls. 117 e seguintes.
46. O gerente da (…) – Tipografia (…), Lda. é (…), sócio fundador da insolvente – doc. de fls. 87 e seguintes.
47. Por esse motivo, as contas da insolvente foram examinadas pela Administração Tributária em 2017, relativamente ao exercício de 2015 – doc. de fls. 227 e seguintes.
48. No decurso de tal ação inspetiva concluiu a AT pelo “desreconhecimento” da dívida ao fornecedor Tipografia, no valor de € 2.262,04, sendo tal valor acrescido ao lucro tributável – doc. de fls. 227 e seguintes.
49. Não tendo detetado outra irregularidade nas contas examinadas.
50. Em consequência, a insolvente procedeu à entrega da declaração de substituição Modelo 22, corrigindo a mesma – doc. de fls. 227 e seguintes.
51. Os gerentes da (…) não a apresentaram à insolvência por vergonha e constrangimento dos mesmos, pessoas publicamente conhecidas na cidade de Tomar – Confissão judicial artigo 45.º da oposição (fls. 135/verso).
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FACTOS NÃO PROVADOS
a) Os requeridos são pessoas influentes, ligadas à política.
b) O veículo com a matrícula (…) foi vendido depois de ter sofrido um acidente no qual foi interveniente o marido da requerente, (…), trabalhador da Empresa Editora (…), Lda..
c) O mesmo tinha um valor comercial superior àquele pelo qual foi vendido.
d) Os requeridos estavam convictos que o incumprimento do dever de apresentação da (…) não punha em causa a satisfação de nenhum crédito, nem prejudicava qualquer credor.
e) A insolvente era proprietária em 16-7-2015 de bens móveis não sujeitos a registo que, entretanto, fez desaparecer.
f) Após 16-7-2015, a insolvente fez desaparecer créditos que detinha sobre terceiros, para além do crédito descrito em 46.
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Conhecendo.
A nulidade da sentença por falta de fundamentação e por ambiguidade ou obscuridade que a tornam ininteligível – artigo 615.º/1, b) e c), do CPC – e a consequente não verificação do disposto no artigo 186.º, n.º 1, n.º 2, alínea i) e n.º 3, do CIRE.
Estipula este dispositivo legal sob a epígrafe “Insolvência culposa”:
1 - A insolvência é culposa quando a situação tiver sido criada ou agravada em consequência da atuação, dolosa ou com culpa grave, do devedor, ou dos seus administradores, de direito ou de facto, nos três anos anteriores ao início do processo de insolvência.
2 - Considera-se sempre culposa a insolvência do devedor que não seja uma pessoa singular quando os seus administradores, de direito ou de facto, tenham: (…)
i) Incumprido, de forma reiterada, os seus deveres de apresentação e de colaboração até à data da elaboração do parecer referido no n.º 2 do artigo 188.º.
3 - Presume-se a existência de culpa grave quando os administradores, de direito ou de facto, do devedor que não seja uma pessoa singular tenham incumprido:
a) O dever de requerer a declaração de insolvência; (…).
4.- O disposto nos nºs 2 e 3 é aplicável, com as necessárias adaptações, à atuação de pessoa singular insolvente e seus administradores, onde a isso se não opuser a diversidade das situações.

Embora as alíneas do n.º 2 expressem de per si a existência de culpa numa presunção iuris et de iure, o que inviabiliza a prova em contrário e torna taxativas as circunstâncias referidas nas diversas alíneas, antes de se retirarem as consequências jurídicas deste regime não se pode dispensar o julgador de conhecer dos factos e da efetiva verificação das circunstâncias descritas.
Enumeram-se neste n.º 2 situações objetivas que tornam impossível a qualificação da insolvência como fortuita, impondo a lei que, verificando-se efetivamente a materialidade que lhes subjaz, a insolvência seja sempre considerada culposa.
No n.º 3 do preceito contemplam-se presunções iuris tantum porque admitem prova em contrário, exigindo-se ainda um nexo causal entre a ação/omissão do administrador e o dano causado à insolvente.
No que concerne à alínea a) do n.º 3: “dever de requerer a declaração de insolvência”, a integração das situações concretas na norma legal deve atender também ao estipulado no artigo 18.º do CIRE, onde se descreve o que o código entende por tal dever, assinalando-se que a insolvência deve ser requerida nos 30 dias seguintes à data do seu conhecimento ou à data em que devia ser conhecida.
Voltando ao n.º 2 do preceito, a presunção é absoluta (iuris et de iure), quer quanto à culpa grave quer quanto ao nexo de causalidade desse comportamento para a criação ou agravamento da situação de insolvência, não se admitindo a produção de prova em sentido contrário – Neste sentido, Luís de Menezes Leitão, Direito da Insolvência, 9ª Ed., 2019, pág. 286, onde cita o Ac. TRL de 9-07-2015, Proc. 519/10.5TYLSB, CJ 40 (2015), 3, pág. 118:
“Uma vez verificados factos integradores das situações contempladas no n.º 2 do artigo 186.º, a insolvência tem que ser declarada como culposa, mesmo que existam outras causas que para ela tenham concorrido, como a crise financeira mundial”.
É também este o entendimento de Carvalho Fernandes e João Labareda, in CIRE Anotado, 3ª. Ed., 2015, pág. 680: “Quando o insolvente não seja uma pessoa singular, o n.º 2 considera a insolvência «sempre culposa», se ocorrer qualquer dos factos enumerados nas suas alíneas, quando praticados pelos seus administradores de direito ou de facto.
Da letra da lei (“considera-se sempre”) resulta claramente que no preceito em anotação se estabelece uma presunção iuris et de iure, em vista do que dispõe o n.º 2 do artigo 350.º do C. Civil (cfr., neste sentido, v.g., o ac. da Rel. Lx., de 27/Nov./2007, in CJ, 2007, V, pág. 104).
Esta circunstância explica, por si só, que o elenco legal tenha de considerar-se taxativo, exatamente para o efeito de as situações contempladas determinarem, inexoravelmente, a atribuição de caráter culposo à insolvência. (…)
De uma maneira geral, as situações previstas nas várias alíneas do n.º 2 não suscitam difíceis problemas de interpretação, sem prejuízo de, na sua aplicação concreta, se dever atender às circunstâncias próprias da situação de insolvência do devedor. Aponta nesse sentido o recurso que nelas se faz a conceitos indeterminados, de que são exemplos significativos os que se identificam nos seguintes termos: «em parte considerável» [alínea a)], «criado ou agravado artificialmente» [alínea b)], «preço sensivelmente inferior» [alínea c)], «incumprido em termos substanciais» [alínea h)].”
Por outro lado, as consequências do incidente de qualificação de insolvência, caso se verifique a atuação negligente ou mesmo fraudulenta do devedor, podem ser de natureza penal (artigo 227.º e seguintes do C. Penal) ou de responsabilidade civil (artigo 483.º do CC) a avaliar na sentença de qualificação (artigo 189.º/d) e e), do CIRE).
Neste sentido, Ac. TRE, de 10-07-2014, Proc. 18/12.01BMIL-C.E1: “... Em incidente de qualificação da insolvência, as várias alíneas do n.º 2 do artigo 186.° do CIRE encerram uma presunção juris et de jure – por definição, inilidível e irrefutável – de culpa grave da parte dos administradores/gerentes na criação ou agravamento de uma situação de insolvência. Mas, antes, terá que se fazer a prova segura de que, no caso concreto e em relação a eles, tais situações abstratas descritas efetivamente se verificaram.”
Importa, pois, averiguar se, no caso concreto, a situação abstratamente descrita pela lei se verifica como considerado na sentença em crise, ou seja, quanto à situação da alínea i) do n.º 2 do artigo 186.º do CIRE – não apresentação e colaboração dos administradores da insolvente durante o processo de insolvência.
Ou se, a sentença confundiu esta não apresentação com o que dispõe a alínea a) do n.º 3 do mesmo artigo: incumprimento o dever de requerer a declaração de insolvência.
Esta asserção resulta com clareza do próprio texto da sentença: Sendo os únicos gerentes da devedora, os aqui requeridos, um advogado e um contabilista, que estão nessas funções desde a constituição da mesma, não há forma de duvidar do conhecimento dos mesmos quanto ao dever de apresentarem, há largos anos, a sociedade à insolvência.
Mas esta distinção não é irrelevante, uma vez que na primeira hipótese estamos em presença de uma situação que não admite prova em contrário dos recorrentes/afetados (iuri et de iuri) e a segunda, não obstante se tratar também de uma presunção de que os factos ocorreram com culpa grave dos administradores, admite prova em contrário (iuris tantum), devendo ainda ambas obedecer ao que se dispõe no n.º 1 do preceito – situação criada ou agravada em consequência da atuação dolosa ou com culpa grave, do devedor, ou dos seus administradores, nos 3 anos anteriores ao início do processo.
Com efeito, em face da matéria de facto provada e que foi considerada na sentença em crise, todos os factos que fundamentaram a decisão se dirigem para a segunda hipótese e não para a primeira, uma vez que esta apenas ocorre durante o processo de insolvência e não está demonstrado na factualidade provada que os administradores da insolvente não se apresentaram aos atos processuais quando para tal foram citados ou notificados ou que não tenham colaborado com a instrução do processo.
Veja-se que a insolvência foi requerida em 16-07-2018 (facto 16) tendo a requerida sido citada na pessoa dos seus gerentes, contestou a ação e confessou a situação de insolvência (facto 21, que foi decretada logo em 21-11-2018, transitando em julgado.
Em 08-01-2019 foi junto relatório do sr. AI que propôs o encerramento do processo por insuficiência da massa insolvente, o que foi aprovado em assembleia de credores em 14-01-2019 (factos 24 e 25).
Não se deteta nesta factualidade a situação a que alude o artigo 186.º/1 e 2, i), do CIRE, pelo que a apelação procede quanto à qualificação jurídica que foi considerada pelo tribunal a quo.
Mas deteta-se à outrance a situação a que alude o artigo 3.º, a), do mesmo preceito.
Com efeito, tal como assinalado pelo tribunal a quo na sentença em crise: “Produzida a prova, resultou à saciedade que desde 2002 que as contas da insolvente a reconduziam à situação do artigo 35.º do CSC, de falência técnica.
Em 2008 a devedora deixou de pagar pontualmente os salários dos seus trabalhadores.
Em 2012 duas trabalhadoras da insolvente despedem-se com justa causa por terem salários em atraso.
Durante o ano de 2013 a insolvente deixou de desenvolver a sua atividade no lugar da sede e passou a ocupar a sede da sócia maioritária, com quem fez acordo de pagamento de rendas por encontro de contas; todos os bens que tinha foram vendidos em processo executivo e, no caso da carrinha, pela própria pelo valor de € 200,00; e, por fim, cessou a sua atividade para efeitos de IVA e IRS em 30-12-2013; e deixou de laborar em 2-1-2014. Já com toda a atividade paralisada, no balancete geral analítico de dezembro de 2017 da “(…) – Comércio e Indústria de (…) e (…), Lda. constam como resultados transitados - € 173.913,59 (valor negativo).
Sendo os únicos gerentes da devedora, os aqui requeridos, um advogado e um contabilista, que estão nessas funções desde a constituição da mesma, não há forma de duvidar do conhecimento dos mesmos quanto ao dever de apresentarem, há largos anos, a sociedade à insolvência.
O prazo para o devedor se apresentar à insolvência é, atualmente, e em 2015, fixado em 30 dias e, ao tempo dos factos, a contar do seu conhecimento da situação de insolvência, ou da data em que a devesse conhecer (artigo 18.º, n.º 1).”
Os factos provados levam, na verdade, a concluir que, pelo menos desde 2015, os dois gerentes, pessoas especialmente capacitadas para entender a gravidade para os trabalhadores e fornecedores da empresa que constituía a sua permanência no mercado, nada fizeram para cessar o perigo de trabalhadores e fornecedores se colocarem ao abrigo do incumprimento das obrigações da empresa.”
A insolvente, gerida pelos recorrentes, com o seu conhecimento, deixou de cumprir de forma generalizada, muito para além de 6 meses, as dívidas descritas na alínea g) do n.º 1 do artigo 20.º do CIRE, pelo que, não tendo sido produzida prova em contrário, ou seja que ilidisse a presunção, mostra-se preenchido o que estabelece o n.º 3, a), do artigo 186.º do CIRE, o que implica a qualificação da insolvência como culposa, uma vez que a atuação com culpa grave dos administradores da insolvente ocorreu nos 3 aos anteriores ao início do processo.
Improcedem, assim, as conclusões constantes das alíneas hh), ii) e jj) dos recorrentes que se referiam à não aplicação do artigo 3.º, a), do artigo 186.º do CIRE.
Assim sendo, embora com qualificação jurídica diversa (artigo 5.º/3, do CPC, no sentido do Ac. STJ de 19-01-17, Proc. 873/10), mas com fundamento na mesma argumentação factual, a apelação deve improceder, porque se não verifica qualquer nulidade da sentença, designadamente as previstas no artigo 615.º/1, c), do CPC.
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Sumário:
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DECISÃO.
Em face do exposto, a 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora julga a apelação improcedente e confirma a sentença com a assinalada alteração da qualificação jurídica.
Custas pelos recorrentes – artigo 527.º do CPC.
Notifique.
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Évora, 09-02-2023
José Manuel Barata (relator)
Cristina Dá Mesquita
Rui Machado e Moura