Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1361/16.5T8STR-A.E1
Relator: PAULO AMARAL
Descritores: REGULAÇÃO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS
PROVAS
Data do Acordão: 12/21/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: No processo tutelar cível de alteração da regulação das responsabilidades parentais, se a parte indicou a sua prova na alegação a que se refere o artigo 42.º do RGPTC, não fica obrigada a apresentá-la no momento previsto no seu artigo 39.º, n.º 4.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: Processo n.º 1361/16.5T8STR-A.E1
Acordam no Tribunal da Relação de Évora

(…) propôs contra (…) acção de alteração da regulação das responsabilidades parentais a respeito do menor (…).
Apresentou a sua prova.
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Na sua alegação, a requerida contestou o pedido e apresentou a sua aprova.
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As partes foram notificadas, nos termos do art.º 39.º, n.º 4, RGPTC, para, em 15 dias, apresentarem alegacões ou arrolarem até 10 testemunhas e juntarem documentos.
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O requerente apresentou testemunhas e a requerida não.
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O rol do requerente foi admitido.
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Uma vez que o tribunal não se pronunciou sobre o rol da requerida, esta requereu que sobre ele recaísse decisão.
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Foi, então, proferido o seguinte despacho.
«Fls. 352: Indefiro o requerido pela progenitora.
«A progenitora foi expressamente notificada em 3 de Março de 2017 para alegar no prazo de 15 dias, ao abrigo do disposto no artigo 39/4 da Lei 141/2015, de 8 de Setembro. Como refere expressamente este artigo “o juiz notifica as partes para, no prazo de 15 dias, apresentarem alegações ou arrolarem até 10 testemunhas e juntarem documentos”.
«A progenitora não alegou nem arrolou testemunhas.
«E são as testemunhas arroladas nas alegações, após notificação nos termos do artigo 39/4 da lei 141/2015, de 8 de Setembro, que são consideradas como prova indicada para a audiência de julgamento.
«E por isso as testemunhas indicadas inicialmente não foram e não são consideradas».
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Deste despacho recorre a requerida alegando, em suma:
No âmbito dos presentes autos, após a realização da conferência de pais, foi a requerida notificada, em 03/03/2017, para, nos termos do despacho de 02/03/2017, apresentar alegações ou arrolar até 10 testemunhas e juntar documentos.
Acontece que a requerida já tinha apresentado as suas alegações em 01/09/2016, onde indicou o seu rol de testemunhas, constituído por cinco pessoas, bem como prova documental, pelo que entendeu que as alegações, prova testemunhal e prova documental já se encontravam devidamente apresentadas e juntas aos autos.
Nos termos do disposto no artigo 411º do CPC: “Incumbe ao juiz realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quanto aos factos de que lhe é lícito conhecer.”
Mais se dirá que, caso sejam ouvidas apenas as testemunhas apresentadas pelo progenitor, poder-se-á correr o risco de ser tomada uma decisão que não prossiga os superiores interesses da criança.
Causando danos irreparáveis na vida do menor e da requerida/apelante.
Estando assim vedado o direito à prova, previsto no art.º 20 da Constituição da República Portuguesa e o princípio do contraditório, previsto no n.º 3 do art.º 3 do CPC.
Bem como o Princípio da Igualdade, consagrado no artigo 13º da Constituição da República Portuguesa.
Atendendo ao acima exposto deverá o despacho recorrido ser revogado e consequentemente substituído por outro que admita a audição das testemunhas devidamente identificadas nas Alegações da recorrente.
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O recorrido contra-alegou defendendo o seguinte:
A Recorrente invoca a aplicação in casu do artigo 411.º CPC por remissão do artigo 33.º, n.º 1 RGPTC.
Mas sem razão, pois não há qualquer omissão no presente caso para que seja necessário recorrer ao Código de Processo Civil, uma vez que a lei especial, no artigo 39.º, n.º 4, RGPTC prevê expressamente a notificação das partes para, no prazo de 15 dias, apresentarem, querendo, as suas alegações e o rol de testemunhas.
A Recorrente após ter sido notificada para apresentar alegações no prazo de 15 dias, não o fez, nem sequer remeteu para as primeiras testemunhas apresentadas, só o tendo feito em 5-05-2017 (já muito depois do terminus do prazo que lhe foi concedido).
Não há assim qualquer preterição do direito de defesa, tendo em conta que a Recorrida, após ser notificada para apresentar alegações, optou por não o fazer, motivo pelo qual não pode agora alegar prejuízo da sua defesa.
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Foram colhidos os vistos.
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O relatório contém os elementos necessário para julgar o recurso.
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O regime legal é o seguinte:
Se houver, no seu entendimento, razões para alterar a regulação das responsabilidades parentais, o requerente pedirá nova regulação, expondo sucintamente os fundamentos do seu pedido (art.º 42.º, n.º 2). O requerido é citado para alegar o que tiver por conveniente (n.º 3).
Depois disto, o juiz ou manda arquivar ou ordena o prosseguimento dos autos, «observando-se, na parte aplicável, o disposto nos artigos 35.º a 40.» (n.º 5).
Por seu turno, estes preceitos determinam que se siga uma conferência onde os pais podem chegar a acordo ou não chegar; neste último caso, «o juiz notifica as partes para, em 15 dias, apresentarem alegações ou arrolarem até 10 testemunhas e juntarem documentos» (art.º 39.º, n.º 4).
Daqui resulta que a lei não exige, para o requerimento de alteração nem para as alegações do requerido, que logo seja indicada prova. Esta indicação apenas tem lugar quando não haja acordo – o que se compreende.
Conclui-se daqui que só naquele momento do art.º 39.º, n.º 4, é que é permitido às partes apresentarem prova? Conclui-se também que só a prova apresentada naquele momento pode ser considerada e admitida?
Parece-nos que não pois cremos que se trata de uma interpretação demasiado rigorosa.
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A recorrente defende que é aplicável ao caso o art.º 411.º, Cód. Proc. Civil; em contrário, o recorrido alega que não existe lacuna pelo que o recurso ao direito subsidiário não é necessário.
O artigo citado confere ao juiz a obrigação de «realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quanto aos factos de que lhe é lícito conhecer».
Trata-se antes de um princípio geral de prova, sob a égide do princípio do inquisitório. E tanto bastaria para o poder aplicar ao caso dos autos pois que não se trata de uma norma específica mas antes de uma regra de conduta no processo.
Mas, além disto, temos o art.º 12.º do RGPTC que dispõe que os «processos tutelares cíveis têm a natureza de jurisdição voluntária». Isto significa que se lhes aplica o regime deste tipo de processos, designadamente o estatuído no art.º 986.º, n.º 2: o «tribunal pode, no entanto, investigar livremente os factos, coligir as provas, ordenar os inquéritos e recolher as informações convenientes; só são admitidas as provas que o juiz considere necessárias».
Se o tribunal pode investigar livremente os factos e coligir provas, por que razão não o há-de fazer com as provas oferecidas pelas partes? Há aqui alguma proibição de atender às provas que elas indicam mesmo que o tenham feito num momento processual não adequado?
Cremos que esta proibição não existe e que, chamando também à colação o princípio do aproveitamento dos actos processuais, o juiz deve mesmo atender a todos os meios de prova que as partes indiquem.
Cremos com isto dizer que o momento processual do art.º 39.º, n.º 4, não estabelece uma fenda inultrapassável entre um antes e o depois. O que existe no processo anteriormente àquela fase pode ser aproveitado e não tem que ser qualificado como inexistente.
Se a parte apresentou a sua prova em momento anterior ao devido (não cuidamos aqui da apresentação tardia) (e note-se, até, que também o requerente apresentou prova com o seu requerimento inicial), deve tal requerimento ser inutilizado com o argumento apenas de que não foi apresentada no momento certo? E repare-se que é perfeitamente legal que o juiz ouça mais pessoas do que as indicadas e que venham a ser sugeridas pelas partes; o citado art.º 986.º, n.º 2, permite-o.
O que o juiz tem a fazer é aproveitar os elementos fornecidos no processo.
Entendemos, pois, que a decisão recorrida não se pode manter.
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Pelo exposto, julga-se procedente o recurso e admite-se a prova oferecida pela requerida nas alegações que apresentou ao abrigo do art.º 42.º, n.º 3, RGPTC.
Custas pela parte vencida a final.
Évora, 21 de Dezembro de 2017
Paulo Amaral
Francisco Matos
José Tomé de Carvalho