Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
971/15.2T8LLE-A.E1
Relator: VÍTOR SEQUINHO
Descritores: DOMICÍLIO CONTRATUAL
INJUNÇÃO
NOTIFICAÇÃO
Data do Acordão: 11/21/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: Tendo as partes de um contrato de mútuo estipulado que quaisquer comunicações escritas que a mutuante remeta aos mutuários “serão enviadas, por meio de carta simples e sem aviso de recepção, para os endereços por estes indicados no contrato, que se obrigam, desde já, a manter actualizados, os quais, para efeitos das referidas comunicações, incluindo citação ou notificação judicial, se consideram ser os domicílios convencionados”, deve concluir-se que estabeleceram um domicílio convencionado nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 2.º, n.º 1 e 12.º-A, respectivamente, do diploma preambular e do anexo constantes do Decreto-Lei n.º 269/98, de 01.09.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: Processo n.º 971/15.2T8LLE-A.E1

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(…) deduziu a presente oposição à execução e à penhora contra Caixa Económica Montepio Geral, a qual foi liminarmente admitida. A embargada contestou, pugnando pela improcedência da oposição. Realizou-se audiência prévia, na qual foi proferido saneador-sentença, julgando improcedentes, quer a oposição à execução, quer a oposição à penhora.

O embargante recorreu do saneador-sentença, tendo formulado as seguintes conclusões:

1. Por sentença datada de 13.02.2019 foram os presentes embargos de executado julgados totalmente improcedentes por não provados.

2. O embargante não se conforma com a sentença recorrida, andou mal o tribunal a quo ao julgar que na notificação levada a cabo no requerimento de injunção foram observadas as formalidades prescritas na lei, pelo que não se verifica a nulidade da citação.

3. E que existindo domicílio convencionado, a notificação do requerimento de injunção segue o regime previsto no citado artigo 12.º-A, sendo remetida carta simples dirigida ao notificando para o domicílio convencionado e foi isso que foi feito, porquanto resulta dos autos que o Balcão Nacional de Injunções emitiu a nota de notificação datada de 12 de Maio de 2014 que faz fls. 46 a 46 verso destes autos, a qual remeteu ao Embargante/executado para a morada indicada no contrato (Sitio … Faro) por via postal com prova de depósito e resulta também destes autos que a referida notificação ficou depositada no respectivo receptáculo postal no dia 13 de Maio de 2014, conforme certificado pelo senhor distribuidor do serviço postal que lavrou o escrito que faz fls. 47.

4. Sucede que o oponente ora recorrente nunca foi citado de tal injunção, nem tão pouco tinha domicílio convencionado, contrariamente ao que foi indicado no requerimento de injunção, tendo-se ausentado do nosso país para França por inúmeros períodos de tempo interpolados.

5. E só aquando da citação nos presentes autos de execução é que o ora oponente teve conhecimento do requerimento de injunção apresentado em 30.04.2014.

6. Pelo que somos do entendimento de que a notificação efectuada é nula.

7. O tribunal a quo violou assim o artigo 2.º do Decreto-lei n.º 269/98, de 1 de Setembro (diploma que aprovou o regime dos procedimentos destinados a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos, que rege o processo de injunção) e o artigo 12.º do regime anexo ao Decreto-lei n.º 269/98, de 1 de Setembro.

8. Na esteira de Salvador da Costa (in A Injunção e as Conexas Acção e Execução, Almedina, 6ª edição, p. 56 e 57) consideramos que a convenção de domicílio com os efeitos processuais pretendidos pela norma “traduz-se necessariamente em clausulado inserido no texto do contrato, em que cada uma das partes aceita, para o caso de litígio dele derivado, que certo lugar de domicílio valha para o efeito de receber a citação ou a notificação no quadro do respectivo processo.”, sendo que “a referida cláusula de domicílio visa e permite evitar a dificuldade de comunicação de actos de processo, com a consequente vantagem da celeridade do procedimento da causa que tenha por objecto o litígio decorrente do contrato”.

9. Este acordo está previsto apenas no caso de existir contrato escrito e deverá revestir também forma escrita.

10. No entanto, não basta que conste de um qualquer contrato escrito a morada das partes, ou até que estas convencionem que, para efeitos de execução do próprio contrato estabelecem a comunicação entre elas para aquelas moradas.

11. Com efeito, necessário se torna que as partes tenham presente que esta “convenção”, que este acordo de domicílio – como bem refere o artigo 2.º – tenha em vista os “procedimentos susceptíveis de ser desencadeados por efeito dos referidos contratos”, ou seja, a acção declarativa de condenação e o procedimento de injunção (em caso de litígio), o que não sucedeu nos presentes autos.

12. Este também tem sido o entendimento dominante na nossa jurisprudência, nomeadamente do acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 29.05.2012, processo n.º 927/09.4TBCNT-A.C1, disponível em www.dgsi.pt.

13. Motivos pelos quais a exequente, ora recorrida, não poderia ter indicado no seu requerimento de injunção a existência de “domicílio convencionado”, pois não provou a existência de um acordo das partes - através de uma cláusula - com vista a estabelecer um local certo e estável que permita um contacto mais expedito, em caso de litígio.

14. Assim, inexistindo a dita convenção, concluiu-se que a forma correcta para se proceder à notificação era a carta registada com aviso de recepção.

15. A realização da notificação por via postal simples constitui a omissão de uma formalidade que a lei prescreve para a notificação. A notificação do requerimento de injunção é equiparada à citação, sendo-lhe aplicáveis as respectivas normas legais.

16. Nos termos do artigo 198.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, “é nula a citação, quando não hajam sido, na sua realização, observadas as formalidades prescritas na lei”. No entanto, conforme decorre do n.º 4 do mesmo preceito, “a arguição só é atendida se a falta cometida puder prejudicar a defesa do citado”.

17. Ora, no caso em apreço, não tendo o executado, ora recorrente, deduzido oposição à injunção, nem sendo possível demonstrar que a notificação foi atempada e efectivamente recebida, a omissão da formalidade em apreço prejudicou a defesa do mesmo.

18. Nestes termos, e uma vez que a mesma foi invocada, andou mal o tribunal a quo ao não concluir pela nulidade da notificação, nos termos do artigo 198.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, por se ter utilizado a via postal simples, em vez da carta registada com aviso de recepção.

19. Nos termos do artigo 814.º, alínea d) do Código de Processo Civil, a nulidade da citação para a acção declarativa quando o réu não tenha intervindo no processo, constitui um dos fundamentos de oposição à execução baseada em sentença.

20. Ora, o mesmo efeito jurídico, mutatis mutandis, deve ter a execução baseada no requerimento de injunção, com a aposição da fórmula executória, mas em cujo procedimento a notificação padece de nulidade.

21. O título executivo, não tendo sido regularmente constituído, é inválido e, como tal, é inexequível, pelo que existe justo fundamento para a oposição à execução, nos termos do artigo 816.º do Código de Processo Civil (vide ac. da Relação de Lisboa de 13 de Março de 2008, in www.dgsi.pt).

22. Veja-se ainda o vertido no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 99/2019 de 12 Fevereiro de 2019, que declara a inconstitucionalidade com força obrigatória geral dos n.º 3 e 5 do artigo 12.º do regime constante do anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de Setembro.

23. Termos em que deverá a sentença recorrida ser revogada por violação da nossa jurisprudência dominante e dos supra citados preceitos legais e deverá o presente recurso ser julgado procedente, por provado em consequência deverá ser determinada a extinção da execução.

Não foram apresentadas contra-alegações.

O recurso foi admitido.


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Na sentença recorrida, foram julgados provados os seguintes factos:

1. A exequente «Caixa Económica Montepio Geral» intentou a execução contra (…) e contra «(…), Unipessoal, Lda.», apresentando como título executivo o requerimento de injunção n.º 62330/14.2YIPRT, apresentado em 30.04.2014 e ao qual foi conferida força executiva em 07.07.2014.

2. No requerimento de injunção referido em 1) e que serve de base à execução, consta como domicílio do requerido (…) “Sitio (…), 8005-000 Faro” e é feita menção de que existe domicílio convencionado.

3. No requerimento de injunção a exequente reclama o pagamento de € 14.313,89, sendo € 9.004,23 a título de capital, € 3.356,34 a título de juros de mora, € 1.851,32 a título de outras quantias e € 102,00 a título de taxa de justiça paga.

4. O Balcão Nacional de Injunções emitiu e remeteu ao requerido, ora embargante/executado, por via postal registada com prova de depósito, o escrito que faz fls. 46 a 46 verso destes autos, no essencial com o seguinte teor: “Exmº Senhor. (…). Sitio (…) 8005-000 Faro. Registado com P. D. Injunção nº 62330/14.2YIPRT. Data: 12-05-2014. Requerente: Caixa Económica Montepio Geral. Requeridos: (…), Unipessoal, Lda. (…). Assunto: Notificação para pagamento ou oposição. O requerente acima identificado apresentou no Balcão Nacional de Injunções um requerimento de injunção onde Vª Exª figura como requerido (devedor), solicitando que lhe seja pago o montante de € 14.313.89, correspondente à quantia pedida, acrescida da taxa de justiça por ele paga, conforme discriminação e causa a seguir indicadas: Capital: € 9.004,23 juros de mora: € 3.356.34 (…) Outras quantias: € 1.851,32. taxa de justiça paga: € 102,00. Contrato de: Mútuo. Data do contrato: 04-03-2011. Período a que se refere: 04-09-2011 a 25-04-2014. Exposição dos factos que fundamentam a pretensão: 1º A Autora é uma sociedade anónima que tem por objecto social a realização das operações bancárias e financeiras autorizadas por lei aos bancos comerciais, 2º No exercício da sua actividade, a Autora, em 4 de Março de 2011, celebrou com os Réus um contrato de mútuo, no valor de € 10.000,00 (dez mil euros), pelo prazo de 48 meses. 3º Os Réus aceitaram todas as condições constantes do contrato em causa, tendo procedido à aposição da sua assinatura no referido documento. 4º Os Réus deixaram de proceder ao pagamento das prestações devidas no âmbito do contrato. 5º São assim os Réus devedores da Autora da quantia de € 9.004,23 (nove mil e quatro euros e vinte e três cêntimos), a título de capital em dívida. 6º Quantia essa, à qual acresce, nos termos contratualmente estabelecidos entre as partes, a quantia referente a juros de mora, calculados à taxa de juros directamente aplicável, desde a data do incumprimento 04-09-2011 até à data de 25-04-2014, que ascende a € 3.356,34 (três mil, trezentos e cinquenta e seis euros e trinta e quatro cêntimos), a quantia de € 700,81 (setecentos euros e oitenta e um cêntimos), a título de cláusula penal de 4% contabilizado desde 04/10/2011, até 25/04/2014, a quantia de € 840,00 (oitocentos e quarenta euros) a título de mutuários conta despesas, € 110,23 (cento e dez euros e vinte e três cêntimos) a título de juros moratórios sobre mutuários conta despesas, a quantia de € 38,01 (trinta e oito euros e um cêntimo) a título de imposto sobre as despesas a quantia de € 162,27 (cento e sessenta e dois euros e vinte e sete cêntimos) referente a imposto do selo. 7º O que perfaz, assim, a quantia de € 14.211,89 (catorze mil, duzentos e onze euros e oitenta e nove cêntimos). 8º Quantia cuja condenação ora se peticiona. 9º E à qual acresce, nos termos contratualmente estabelecidos entre Autora e Ré, a quantia correspondente a juros de mora, calculados à taxa contratual e legalmente aplicável, desde 25/04/2014, até efectivo e integral pagamento e, bem assim, todas as quantias que a Autora tenha de despender para recuperar o seu crédito, nomeadamente o valor referente a taxa de justiça devida pela presente acção. Nestes termos, e nos demais de Direito, deve a presente acção ser julgada procedente e provada e em consequência serem os Réus condenados no pagamento à Autora a quantia de capital e juros de mora vencidos até à presente data no valor global de € 14.211,89 (catorze mil, duzentos e onze euros e oitenta e nove cêntimos) e, bem assim, dos juros de mora vincendos ate efectivo, integral e completo pagamento. Fica, pois, por este meio notificado de que tem o prazo de 15 dias para: a) Pagar ao requerente o montante por este solicitado; ou b) Deduzir oposição a essa pretensão, caso em que o Balcão Nacional de Injunções remeterá os autos à distribuição no tribunal competente. Faz-se notar, no entanto, que a dedução de oposição cuja falta de fundamento não deva ser ignorada por si determina a condenação – na sentença que vier a ser proferida na acção declarativa que se lhe seguir – em multa de valor igual ao dobro da taxa de justiça devida nessa acção. Findo o referido prazo de 15 dias sem que tenha efectuado o pagamento do montante acima indicado ou deduzido oposição: a) Será aposta fórmula executória no requerimento de injunção, tendo o requerente a faculdade de intentar contra si acção executiva; e b) Passa ainda a dever juros de mora à taxa legal desde a data da apresentação do requerimento de injunção e juros à taxa de 5% ao ano a contar da data da aposição da fórmula executória (…)”.

5. A nota de notificação referida em 4) ficou depositada no receptáculo postal no dia 13 de Maio de 2014, lavrando o senhor distribuidor do serviço postal o escrito que faz fls. 47 destes autos.

6. Foi celebrado acordo reduzido a escrito, o qual faz fls. 31 verso a 34 verso destes autos, no essencial com o seguinte teor: “Entre: 1º Caixa Económica Montepio Geral (…) neste acto representada por (…) que intervém na qualidade de procurador com poderes para o acto: 2º (…), Unipessoal, Lda. (…), adiante designada por Parte Devedora, representada por (…) residente em Cerro (…), adiante designado por Segundo Contraente que intervém por si e na qualidade de sócio-gerente da referida sociedade, com poderes para o acto. Pelos contraentes e nas respectivas qualidades, é celebrado o presente contrato de mútuo, que se rege pelas cláusulas seguintes: Cláusula 1ª (Montante e finalidade do capital mutuado) 1. O Segundo Contraente confessa a sociedade sua representada devedora à CEMG da quantia de € 10.000,00 (dez mil euros), que a título de mútuo dela recebem, destinando-se, segundo declara a reestruturação de empréstimo junto da CEMG, obrigando-se a fazer prova dessa aplicação caso a CEMG o solicite. 2. A quantia mutuada será creditada na conta de depósitos à ordem nº (…), constituída no balcão da CEMG, em Faro-Penha, em nome da Parte Devedora. Cláusula 2ª (Prazo) Este contrato é celebrado pelo prazo de 48 (quarenta e oito) meses, a contar da presente data. Cláusula 3ª (Juros) 1. O capital mutuado vence juros, durante o primeiro trimestre, à taxa anual nominal (TAN) de 12,00%, a qual é calculada, aplicada e revista trimestralmente nos termos dos números seguintes (…) Cláusula 4ª (Amortização) 1. A Parte Devedora obriga-se a reembolsar o presente empréstimo em 48 (quarenta e oito) prestações mensais, constantes e sucessivas, incluindo capital e juros sendo que, o cálculo dos juros a aplicar ao contrato será feito tendo como referencia trezentos e sessenta dias. 2. A primeira das referidas prestações vence-se um mês após a data do contrato e as restantes em igual dia dos meses seguintes, ou no último dia do respectivo mês se neste não houver dia correspondente. 3. Cada uma das prestações será no montante de € 265,70 (duzentos e sessenta e cinco euros e setenta cêntimos), sem prejuízo do disposto na cláusula relativa às alterações do presente contrato (…) Cláusula 7ª (Cláusula penal). 1. Em caso de incumprimento de qualquer obrigação contratual, e se a CEMG recorrer a juízo para recuperação dos seus créditos será devida, além dos juros remuneratórios, uma indemnização com natureza de cláusula penal no montante que resultar da aplicação da sobretaxa de 4% (quatro por cento) ao ano, calculada sobre o capital em dívida desde a data da mora (…) Cláusula 8ª (Responsabilidade por despesas e encargos) 1. São da responsabilidade da Parte Devedora todas as despesas e encargos, nomeadamente de ordem fiscal, emergentes da celebração do presente contrato, bem como as despesas que a CEMG faça para manter, garantir ou haver o seu crédito, ficando as mesmas cobertas pela garantia oferecida como caução da obrigação principal (…) Cláusula 10ª (Fiança) 1. O Segundo Contraente confessa-se e constitui-se fiador e principal pagador das dívidas contraídas pela Parte Devedora no âmbito do presente contrato, renunciando expressamente ao benefício da excussão prévia. 2. O Segundo Contraente, em nome da sua representada, declara aceitar a fiança prestada nos precisos termos (…) Cláusula 15ª (Direito de Resolução) 1. Sem prejuízo de quaisquer outros direitos que lhe sejam conferidos por lei ou pelo presente contrato, constituem causa bastante e fundamentada de resolução do presente contrato, as que, designadamente, se indicam: a) Incumprimento, ainda que parcial, de qualquer das obrigações assumidas ao abrigo do presente contrato e/ou de quaisquer outras obrigações assumidas pela Parte Devedora em quaisquer outras operações de crédito celebradas ou a celebrar com a CEMG ou com quaisquer outras instituições de crédito ou financeiras, nacionais ou internacionais (…) Cláusula 18ª (Comunicações) 1. Quaisquer comunicações escritas que a CEMG remeta aos intervenientes do presente contrato serão enviadas, por meio de carta simples e sem aviso de recepção, para os endereços por estes indicados no contrato, que se obrigam, desde já, a manter actualizados, os quais, para efeitos das referidas comunicações, incluindo citação ou notificação judicial, se consideram ser os domicílios convencionados. 2. Quaisquer alterações aos domicílios convencionados, deverão ser comunicadas à CEMG, no prazo máximo de trinta doas após a verificação das mesmas (…) O original do presente contrato fica na posse da CEMG e os demais contraentes ficam na posse de duplicado, devidamente assinado. Faro, 04 de Março de 2011. A Caixa Económica Montepio Geral (…) A Parte Devedora (…) O Segundo Contraente (…)”.

7. Não foi paga a prestação do acordo referido em 6) vencida em 04.09.2011 nem as que se venceram posteriormente, estando em dívida o capital de € 9.004,23.

8. Nos autos de execução de que estes embargos de executado constituem apenso foi penhorado 1/3 da remuneração auferida pelo Embargante/executado (…) na empresa “(…), Construções, Unipessoal, Lda.”.


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A única questão a resolver consiste em saber se o recorrente foi validamente notificado no âmbito do procedimento de injunção.

O recorrente sustenta, em síntese, que, no caso dos autos, inexiste domicílio convencionado nos termos previstos nos artigos 2.º, n.º 1, e 12.º-A, respectivamente do diploma preambular e do anexo constantes do Decreto-Lei n.º 269/98, de 01.09, pelo que é aplicável o disposto no artigo 12.º do mesmo anexo, que estabelece que a notificação do requerimento de injunção ao requerido deve ser efectuada mediante carta registada com aviso de recepção; não tendo ele, recorrente, sido notificado nos termos do referido artigo 12.º, a notificação efectuada, através de carta simples, é nula; consequentemente, o título executivo não se constituiu regularmente, sendo inválido e, como tal, inexequível.

O artigo 2.º, n.º 1, do diploma preambular constante do Decreto-Lei n.º 269/98 estabelece que, nos contratos reduzidos a escrito que sejam susceptíveis de desencadear os procedimentos previstos no artigo 1.º, as partes podem convencionar o local onde se consideram domiciliadas, para efeito de realização da citação ou da notificação, em caso de litígio. O artigo 12-A do anexo constante do Decreto-Lei n.º 269/98 estabelece que, nos casos de domicílio convencionado, nos termos do n.º 1 do artigo 2.º do diploma preambular, a notificação do requerimento é efectuada mediante o envio de carta simples, dirigida ao notificando e endereçada para o domicílio ou sede convencionado (n.º 1), que o funcionário judicial junta ao processo duplicado da notificação enviada (n.º 2) e que o distribuidor do serviço postal procede ao depósito da referida carta na caixa de correio do notificando e certifica a data e o local exacto em que a depositou, remetendo de imediato a certidão à secretaria (n.º 3).

Como vimos, o recorrente sustenta que inexiste domicílio convencionado nos termos previstos nas normas que acabámos de citar. Todavia, os factos provados demonstram o contrário. Consta do n.º 6 da matéria de facto provada que a cláusula 18.ª do contrato de mútuo em que o recorrente e a recorrida são partes, sob a epígrafe “comunicações”, dispõe que: “1. Quaisquer comunicações escritas que a CEMG remeta aos intervenientes do presente contrato serão enviadas, por meio de carta simples e sem aviso de recepção, para os endereços por estes indicados no contrato, que se obrigam, desde já, a manter actualizados, os quais, para efeitos das referidas comunicações, incluindo citação ou notificação judicial, se consideram ser os domicílios convencionados. 2. Quaisquer alterações aos domicílios convencionados, deverão ser comunicadas à CEMG, no prazo máximo de trinta dias após a verificação das mesmas (…)” (sublinhado nosso). A redacção da cláusula não podia ser mais clara na demonstração de que as partes estabeleceram, no contrato, um “domicílio convencionado” para os efeitos previstos nas normas legais acima citadas.

Havendo domicílio convencionado e tendo, como também se provou, a notificação do recorrente, no âmbito do procedimento de injunção, sido efectuada por via postal registada com prova de depósito, nos termos descritos nos n.ºs 4 e 5 da matéria de facto provada, ficou cumprido o que a esse respeito se estabelece no citado artigo 12.º-A. Logo, a notificação efectuada é válida, inexistindo qualquer irregularidade no procedimento de injunção que inquine o título executivo.

Na conclusão 22.ª, o recorrente invoca o acórdão do Tribunal Constitucional n.º 99/2019. Decidiu-se, neste acórdão, “declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma constante dos n.ºs 3 e 5 do artigo 12.º do regime constante do anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de setembro (na redação resultante do artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 32/2003, de 17 de fevereiro), no âmbito de um procedimento de injunção destinado a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias de valor não superior a € 15 000 – na parte em que não se refere ao domínio das alínea a), do referido Decreto-Lei n.º 32/2003 –, quando interpretados no sentido de que, em caso de frustração da notificação do requerido (para pagar a quantia pedida ou deduzir oposição à pretensão do requerente, nos termos do n.º 1 do mesmo artigo 12.º), através de carta registada com aviso de receção enviada para a morada indicada pelo requerente da injunção no respetivo requerimento, por devolução da mesma, o subsequente envio de carta, por via postal simples, para todas as diferentes moradas conhecidas, apuradas nas bases de dados previstas no n.º 3 do artigo 12.º, em conformidade com o previsto no n.º 5 do mesmo preceito, faz presumir a notificação do requerido, ainda que o mesmo aí não resida, contando-se a partir desse depósito o prazo para deduzir oposição, por violação do artigo 20.º, n.ºs 1 e 4, em conjugação com o artigo 18.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa”. É manifesto que esta jurisprudência respeita a uma questão diversa daquela que constitui objecto do presente recurso. Havendo, no caso dos autos, domicílio convencionado, vigora o regime do artigo 12.º-A do anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98, não estando em causa a aplicabilidade do artigo 12.º do mesmo anexo.

Resulta do exposto que o recurso deverá ser julgado improcedente.

Sumário: (…)

Decisão:

Delibera-se, pelo exposto, julgar o recurso improcedente, confirmando-se o saneador-sentença recorrido.

Custas a cargo do recorrente.

Notifique.

Évora, 21 de Novembro de 2019

Vítor Sequinho dos Santos (relator)

Mário Rodrigues da Silva

José Manuel Barata