Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1265/17.4T8FAR.E1
Relator: ISABEL PEIXOTO IMAGINÁRIO
Descritores: REGULAÇÃO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS
ALIMENTOS
Data do Acordão: 09/26/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: - o âmbito do dever que recai sobre os pais de prover o sustento dos filhos é conformado pelo princípio da responsabilidade parental, princípio este com garantia constitucional e decorrente de instrumentos de tutela internacional, que impõe que a fixação da prestação de alimentos e a respetiva exigibilidade se sobreponha aos interesses patrimoniais de cada um dos pais, a quem incumbe adequar as despesas inerentes a si mesmos a montantes que permitam o cumprimento integral daquele dever;
- por outro lado, importa apurar o montante de despesas que se afigura razoável para prover o sustento dos filhos, levando em conta o nível de rendimentos dos pais, não se justificando impor sacrifícios aos pais para proporcionar aos filhos extravagâncias e um modo de vida que supera o adequado à respetiva condição de monetariamente dependente.
(Sumário da Relatora)
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes no Tribunal da Relação de Évora


I – As Partes e o Litígio

Recorrente principal / Requerido: (…)

Recorrente subordinada / Requerente: (…)

Trata-se de uma ação de regulação do exercício das responsabilidades parentais e para a fixação de alimentos a (…), filha comum dos litigantes, tendo a Requerente pugnado pela fixação da obrigação de alimentos a cargo do Requerido no montante de € 400,00, alegando designadamente que este aufere mensalmente € 3.500,00 líquidos como professor universitário na Bélgica.
No decurso dos autos, foi fixada a residência da jovem junto da mãe e convívios desta com o pai, sempre que ocorresse motivação mútua da filha e do pai.
A divergência entre os progenitores mantinha-se, porém, em relação à fixação do valor da pensão alimentícia. Nessa sequência, o Tribunal fixou a título de alimentos a suportar pelo pai o valor mensal de € 325,00, atualizável anualmente a partir de Janeiro de 2018, acrescido de:
- 2/3 das despesas médicas, medicamentosas e escolares (livros, material escolar e explicações), na parte não comparticipada;
- 2/3 das consultas de psicologia caso fossem prescritas por médico;
- 2/3 das despesas extracurriculares desde que ambos os progenitores acordassem na participação da filha nessas atividades;
- 2/3 dos custos inerentes à viagem da filha à China (transporte, seguros e estadia) no âmbito de um curso de mandarim que a (…) iria frequentar.


II – O Objeto dos Recursos

Decorridos os trâmites processuais legalmente previstos, na falta de acordo entre as partes, foi proferida sentença conforme segue:
«Tendo em consideração que a jovem (…) completou, entretanto, dezoito anos, a título de alimentos decide-se:
1. O pai contribuirá a título de alimentos com a quantia mensal de € 332,71 devida à filha, a qual será entregue por transferência bancária para o IBAN: PT (…), no dia 1 de cada mês a que disser respeito a prestação de alimentos.
2. A quantia referida em 1. será anual e automaticamente atualizada a partir de janeiro de 2020, segundo o aumento da taxa de inflação prevista pelo Instituto Nacional de Estatística, relativa ao ano anterior.
3. A quantia mensal de € 325,00 é devida no ano de 2017 (desde Abril a Dezembro) e a de € 329,45 no ano de 2018 (desde Janeiro a Dezembro).
4. O pai suportará na proporção de 2/3 e a mãe de 1/3 o custo com as despesas médicas, medicamentosas e escolares (livros, material escolar e explicações) da filha na parte não comparticipada, mediante a apresentação das cópias dos respetivos recibos.
5. As despesas com as consultas de psicologia prestadas em benefício da jovem (…) serão suportadas na proporção de 2/3 e 1/3 respetivamente pelo pai e pela mãe, caso sejam prescritas por médico.
6. Caso ambos os progenitores se encontrem de acordo quanto à participação da filha em atividades extracurriculares o seu custo será suportado pelo pai e pela mãe respetivamente na proporção de 2/3 e 1/3.
7. Condena-se o pai no pagamento de € 1.265,19 relativo a despesas médicas medicamentosas, escolares e extracurriculares realizadas até ao dia 10.5.2018 e ainda 2/3 da viagem à China caso tal valor ainda não haja sido liquidado.»

Inconformado, o Requerido apresentou-se a recorrer, pugnando pela revogação da decisão recorrida, invocando que deve:
«a) ser revogada a decisão que consta dos pontos 3 a 6 do dispositivo da sentença, que prevê que o recorrente paga 2/3 das despesas da filha e a recorrida 1/3, devendo constar que o pai recorrente paga 1/3 e a mãe recorrida 2/3 das despesas médicas, medicamentosas, escolares e extracurriculares e referente a consultas de psicologia.
b) ser revogada a decisão que consta dos pontos 1. e 3. do dispositivo da sentença, sendo o montante a pagar pelo recorrente de € 200,00.
c) Ser revogado o ponto 7 do dispositivo da sentença, por ser nula a decisão neste ponto.»
Conclui a sua alegação de recurso nos seguintes termos:
«a) O tribunal faz uma errada interpretação dos factos no que concerne aos rendimentos da recorrida referentes ao ano de 2018, uma vez que a sentença analisa o rendimento disponível, no que concerne aos impostos, tendo como premissa a taxa de retenção na fonte e não a taxa de IRS.
b) Os rendimentos da recorrida referentes aos anos de 2018 são superiores aos de 2017.
c) No ponto 57 dos factos provados resulta que a recorrida tem um rendimento mensal líquido de € 2.015,80.
d) A este valor acresce o abono de família conferido pelo Estado Belga de € 118,00 mensais (ponto 60 dos factos provados).
e) O rendimento líquido mensal da Recorrida é de € 2.133,80.
f) A recorrida tem despesas mensais de € 546,50 (ponto 62 dos factos provados)
g) A recorrida tem um rendimento mensal disponível de € 1.587,30 (€ 2.133,80 rendimento líquido - € 546,50 despesas).
h) O requerido teve um vencimento mensal médio líquido de € 3.162,00 no ano de 2017 (ponto 64 dos factos provados).
i) O requerido tem um total de € 2.515,00 de despesas médias mensais excluindo despesas de saúde, lazer, vestuário e calçado (ponto 72 dos factos provados):
j) O recorrente tem um rendimento mensal disponível de € 647,00 (€ 3.162,00 rendimento líquido - € 2.515,00 despesas mensais).
k) Dos factos provados resulta que a recorrida tem um rendimento mensal disponível de € 1.587,30 e o recorrente de € 647,00.
l) Ainda que se considerasse os rendimentos dados como provados no ponto 61 (2018), o rendimento líquido da recorrida sempre seria, sem contar com a prestação alimentícia, de € 1.887,93, que deduzidas as despesas mensais da recorrida de € 546,50, a mesma teria um rendimento disponível de € 1.341,43.
m) Auferindo a recorrida de um rendimento disponível de € 1.587,30 e o recorrente e € 647,00, o valor a pagar pela recorrida deve ser muito superior ao do recorrente, sob pena de violação do artigo 36º, nº 3, da C.R.P., que estabelece o princípio de igualdade de deveres de ambos os progenitores na manutenção dos filhos.
n) A decisão viola, assim, o princípio de equidade na distribuição de despesas entre os progenitores e o artigo 36º, nº 3, da C.R.P.
o) Deve ser revogada a decisão que consta dos pontos 3 a 6 do dispositivo da sentença, que prevê que o recorrente paga 2/3 das despesas da filha e a recorrida 1/3, devendo constar que o pai recorrente paga 1/3 e a mãe recorrida 2/3 das despesas médicas, medicamentosas, escolares e extracurriculares e referente a consultas de psicologia.
p) A recorrida é a responsável pela má relação entre a (…) e o pai.
q) A (…) inquirida disse que o único problema que tinha com o pai era o dinheiro.
r) Pode e deve ponderar a inobservância dos deveres dos filhos para com os pais, em particular, o desrespeito dos deveres de auxílio, assistência e respeito do filho maior para com o progenitor obrigado, como circunstâncias conformadoras do an e do quantum da obrigação/prestação alimentar.
s) Conforme resulta dos pontos 77 a 79, e das suas declarações, a Adriana não fala com o pai, apenas por uma questão monetária, sem que dos autos resulte qualquer razão ou comportamento para tal, que isso pudesse “justificar”.
t) Existe por parte da (…) um claro atropelo ao dever de respeito.
u) As despesas que a (…) apresenta são para uma vida, não de estudante, não para necessidades básicas, mas para caprichos ou luxos supérfluos, veja-se que a (…) não come em cantinas (ponto 39 dos factos provados), tem um personal trainer, etc.
v) Da prova realizada conclui-se que a mãe, juntamente com o apoio prestado pelos seus próprios pais, proporcionou um nível de vida à filha superior às suas próprias forças e, sem que, inclusive como a própria afirmou, o pai contribuísse para esse efeito.
x) Consideram-se extravagantes e excessivos os gastos apresentados pela jovem que mantém um estilo de vida superior ao dos próprios pais e que despende mensalmente um montante muito acima do salário mínimo nacional (cerca de € 1.000,00 mensais a que acrescem despesas de saúde educação e extracurriculares), apesar de frequentar uma escola pública.
w) A jovem foi habituada pela mãe, como filha única, a ter um nível de vida muito superior ao que os pais poderiam e deveriam proporcionar, e que tal se verificou face ao apoio dos avós maternos que para além de fornecerem a título gratuito uma habitação também forneciam alimentação à filha e à neta.
y) O esforço do pai não pode ser superior a € 200,00, e considerando este valor, o pai passa a dispor de € 347,00 para fazer face às despesas médicas, medicamentosas e escolares da filha, e para as suas despesas de despesas de saúde, lazer, vestuário e calçado.
z) Nas suas alegações apresentadas em 2 de Novembro de 2017, o recorrente fez ver ao tribunal que não podia pagar a prestação de alimentos, tendo requerido expressamente a sua alteração para um valor abaixo dos € 200,00.
aa) Devem assim as cláusulas 1. e 3. do dispositivo da sentença serem revogadas, sendo o montante a pagar pelo recorrente de € 200,00.
bb) os factos dados como provados nos pontos 31 e 48 baseiam-se exclusivamente nas declarações da recorrida, não estando o recorrente presente nessas audiências.
cc) O mandatário do recorrente estava presente, mas conforme referiu não tinha conhecimento se existiam alguns valores em dívida e se aqueles valores estavam em dívida.
dd) Após a audiência de 10/05/2018, o recorrente foi ouvido pelo tribunal em 20.12.2018 e não foi confrontado com esta questão.
ee) Ao decidir esta matéria sem notificar o recorrente para se pronunciar, e sem confrontar o mesmo com esta questão, violou o tribunal o princípio do contraditório previsto no artigo 3.º do CPC.
ff) O tribunal decidiu com base no depoimento da recorrida, mas não ouviu o recorrente, violando o princípio da igualdade das partes, consagrado no art. 4.º do CPC, na medida em que garante a igualdade das mesmas ao nível da possibilidade de pronúncia sobre os elementos suscetíveis de influenciar a decisão.
gg) A decisão neste ponto é, assim, nula.»

A Recorrida sustenta que deve ser negado provimento ao presente recurso, confirmando-se a sentença recorrida, mais pugnando pela condenação do Recorrente como litigante de má-fé. A litigância de má-fé assente na falta à verdade (nega os factos n.ºs 31, 43, 48 e 83 da sentença, que não impugnou).

A Recorrida interpôs recurso subordinado pugnando pela alteração da matéria de facto fixada em 1.ª Instância, pela fixação da prestação alimentícia mensal a cargo do pai em € 491,80 e pela condenação do Recorrido por litigância de má-fé. Conclui a sua alegação de recurso nos seguintes termos:
«I – Matéria de facto
1 – Os factos julgados provados nos nºs 3 a 22 sentença proferida na decisão sobre matéria de factos do processo de divórcio da recorrente e recorrido, mencionado no nº 82 dos factos provados, deverão ser acrescidos à matéria de facto, porque relevantes para a decisão da causa e comprovados por decisão junta aos autos, por cópia, não impugnada, levada aos factos provados (nº 82) e com trânsito em julgado, os quais são os seguintes:
3. A casa onde o casal coabitou, da propriedade dos pais da requerida, situa-se na Rua (…), n.º 204 T, (…) – Loulé.
4. O autor é professor na Université Catholique de (…), na Bélgica, onde exerce funções desde 2012.
5. Desde então, o autor passava vários períodos na Bélgica, vindo a Portugal com regularidade e ficando na casa de morada de família.
6. A partir do dia 29 de Dezembro de 2016, A. e R. passaram a dormir em quartos separados.
7. Em Fevereiro de 2017 o autor chamou à mulher «grande puta» e disse-lhe «vai apanhar no cu».
8. O A. e a R. encontram-se separados desde Fevereiro de 2017, altura em que o A. regressou à Bélgica, não mais tendo coabitado com a ré.
9. A R. enviou ao A. os e-mails de fls.45 e 46, que se dão por reproduzidos.
10. No dia 27 de Março de 2017, ao A. Recebeu um e-mail dos pais da ré, que constitui o documento de fls. 7, que refere, nomeadamente, o seguinte: (…) «vimos comunicar-lhe que decidimos fazer cessar o empréstimo da casa que vos cedemos como casa de morada de família, autorizando apenas a que nela se mantenha a nossa filha com a v/filha e n/neta, uma vez que a v/família, enquanto casal está desfeita… e para prevenir conflitos indesejáveis procedemos à mudança da fechadura, ficando-lhe assim inteiramente vedado o acesso àquela casa».
11. No dia 4 de Abril de 2017 o A. deslocou-se à referida casa, tendo chamado a autoridade policial (GNR), a fim de retirar os seus bens da residência, referindo à autoridade que a sua esposa estaria a colocar alguns entraves.
12. No local, a ré informou a GNR que estava disposta a entregar os bens pessoais do seu marido e que já os tinha encaixotado todos em caixas, tendo permitido que o mesmo acedesse à zona da entrada do hall/sala para que carregasse os bens, sem aceder ao resto da residência (cfr. Auto de ocorrência que constitui o doc. de fls. 7/8).
13. Na presença da ré e da GNR, o A. retirou os seus bens pessoais, tendo levado várias caixas, contendo livros, alguns instrumentos musicais, nomeadamente um violino, uma guitarra e um piano de cauda que foi retirado com o auxílio de uma grua de uma transportadora, tendo ainda levado um fio de ouro e uns botões de punho que a ré lhe entregou (doc. de fls. 7/8).
14. O A. residia na Vivenda (…) , nº 182-A, (…), Faro.
15. O A. e a R. tinham um depósito a prazo na conta nº (…) do Banco (…) no montante de € 97.500,00.
16. No dia 23/3/2017 a ré deu ordem de transferência desse montante para a conta à ordem do casal e, no mesmo dia, deu ordem de transferência para a sua conta pessoal e que é única titular n.º … (doc. de fls. 9/10).
17. O A. tem um depósito bancário na Bélgica.
18. Apesar das insistências da R., o A. recusa-se a informá-la do saldo existente na conta bancária que detém na Bélgica, onde é depositado o seu vencimento.
19. Em Fevereiro de 2017, o A. retirou da residência da família uma carteira com dinheiro que se encontrava escondida no piano há vários anos, apoderando-se desse dinheiro, que pertencia à filha do casal.
20. Tal facto deu origem a denúncia efetuada pela ora ré (doc. de fls. 51), vindo o inquérito a ser arquivado em 17/4/2017, em virtude de a ofendida (…) não ter apresentado queixa ou ratificado a denúncia feita pela mãe/ora ré (doc. e fls. 52 verso).
21. O ora A. veio posteriormente a devolver o dinheiro à menor.
22. Em 20/4/2017 a ora ré intentou ação de regulação das responsabilidades parentais contra o ora autor, tendo em 9/6/2017 sido reguladas provisoriamente as responsabilidades parentais da menor (…) no âmbito do P. nº1265/17.4T8FAR, sendo fixada a residência da menor junto da mãe (doc. de fls. 47 verso a 49)”.
2 – Estes factos constituem caso julgado entre os progenitores e contextualizam todo o relacionamento entre os mesmos no período da separação de facto e da rutura definitiva da vida em comum deles, em confronto com os constantes dos nºs os dos nºs 13 a 20 dos factos provados da douta sentença recorrida e inserindo-se essa factualidade no seu contexto.
3 – A importância dessa contextualização e da fixação do contraditório torna-se bem patente no teor do email de 27.3.2017, dado como reproduzido no nº 16 da douta sentença recorrida.
4 – No ponto 27 dos factos provados consigna-se que a requerente se opôs à conversão do regime provisório em definitivo, mas nada se diz sobre a posição do requerido, nomeadamente, se não se opôs a essa conversão, nem se consigna qual a sua posição no tocante ao montante dos alimentos, que nunca expressou, como se pode ver da gravação dessa conferência de 17/10/2017 pelo que, pela manifesta insuficiência do que se consigna para que quer o tribunal a quo, quer o de recurso, possam ajuizar sobre as posições de ambos os progenitores, uma vez que não interessa apenas a posição de um deles, tal facto deverá ser eliminado, tanto mais que o ilustre mandatário do recorrido, com poderes especiais para o fazer, que foi interpelado para o fazer pelo signatário, mas não o fez, nunca o tendo o Tribunal questionado sobre essa questão, como se verifica pela gravação de toda a audiência, do primeiro ao último minuta dessa gravação, podendo verificar-se a interpelação do mandatário da recorrente ao ilustre mandatário do recorrido, que omite qualquer pronúncia nos minuto 00:00:00 ao minuto 00:13:30 (das 10:15:32 às 10:29:09), e sendo que a posição da requerente, não é expressa por si, mas pelo seu mandatário, sem poderes especiais.
5 – Por outro lado, este facto do nº 27 encerra implicitamente o juízo de que o requerido não se opôs à conversão do regime provisório, o que o seu recurso independente da douta sentença que fixou definitivamente veio demonstrar que era erróneo, pelo que deverá ser eliminado esse nº 27;
6 – No nº 28 dos factos provados consigna-se que “28 – A (…) até Outubro de 2017 não falava com o pai, mas após a intervenção técnica e da sua psicóloga recuperou os convívios com o pai”, mas da prova produzida, nomeadamente da gravada, verifica-se que a (…) em Outubro falava com o pai, ao contrário do constante desse nº 28, e que já falava desde as férias escolares, pelo que deverá ser retificado nessa conformidade, pois essa prova assim o impõe, uma vez que a consulta com a psicóloga é anterior à intervenção da técnica gestora, que não teve qualquer influência nesse retomar de comunicação, ao contrário do que aí também é consignado erroneamente, como resulta das próprias declarações dessa técnica, gravadas, constantes do ficheiro áudio da 2ª conferência de, 17 /10/2017, na parte referente à técnica gestora, Sra. Dra. (…), do minuto 00:00 ao minuto 02:55.
7 – O nº 29 dos factos provados e como decorre da mesma gravação das declarações da técnica gestora, deverá igualmente ser alterado, suprimindo-se toda a sua primeira parte, onde se consigna que “Nessa intervenção efetuada pela técnica gestora em articulação com a psicóloga…”, que é contrariada pelas declarações da própria técnica gestora que ficaram transcritas e que são apontadas como seu fundamento probatório, mas que contrariam aquela primeira parte, cuja supressão se pede, mantendo-se apenas o seguinte: “ A (…) recuperou os seus convívios com o pai, antes da intervenção da técnica gestora”.
8 – Deve ser eliminado este nº 30, porque a progenitora nunca declarou que a psicóloga tivesse dado alta a sua filha, nem ela o deu, como se comprova com todas as gravações das declarações da progenitora, que ocorreram nas 1ª e 2 ª conferências e nas audiências de 10 de Maio e de 20 de Dezembro de 2018, nos momentos indicados nas respetivas atas desses atos.
9 – Por outro lado, tal facto não tem qualquer interesse para a decisão da causa, pois que o nº 5 do seu dispositivo contempla as despesas com psicóloga, pelo que não tem interessa para a decisão da causa.
10 – No nº 51 dos factos provados consigna-se que o avô materno é construtor civil com base unicamente nas declarações do progenitor, as quais não são, por si só suficientes para comprovar tal facto, pois não são confessórias, antes respeitam a um facto que lhe seria favorável, embora apenas como princípio de prova, não sendo tal facto comprovado por qualquer outro meio de prova e
11 – Por outro lado, é contrariado pelo documento comprovativo de que o avô materno é reformado e recebe uma pensão mensal de € 318,71, documento que junto com o requerimento de 10/1/2019 e não foi impugnado pelo requerido, que, pelo contrário, declarou que os documentos juntos respeitantes às reformas dos avós maternos da (…) “provam que os pais da requerente têm aquele rendimento, não provam que não tenham mais”, pelo que deverá ser eliminada a 1ª parte desse nº 51, onde se consigna que o avô materno da (…) é construtor civil para passar a constar que é reformado e
12 – Decorre da seleção desse facto que ao tribunal interessa apurar as possibilidades económico-financeiras dos avós maternos da (…), deverá consignar-se, de acordo com a prova produzida o que se apurou, ou seja, que são reformados e que auferem de reforma de € 381,71, o avô e a avó € 365,03, pois esses documentos, sua não impugnação e até a expressa aceitação de sua força probatória plena impõem a sua consignação como factos provados;
13 – Quanto ao facto nº 62 dos factos provados, já se pediu em requerimento de 11/03/2019 a retificação de erro de cálculo contante do final no somatório das parcelas dos gastos mensais da ora requerente, tendo sido foi levada em conta apenas o gasto semanal em gasóleo e não o mensal, este no total de € 130,00 (32,50 x 4 semanas), pelo que o total dos gastos mensais fixos se cifra em € 644,00 e não apenas em € 546,50, como ali se indica, impondo-se por isso a sua correção, caso não seja atendido o pedido da sua retificação que foi formulado.
14 – No nº 71 dos factos provados, não deverão ser considerados provados os alegados valores de € 300,00 do custo dos bilhetes de avião, de Bélgica para Portugal, porque o recorrido alegou esses factos no nº 9 das suas alegações de 2/11/2017 e não juntou os respetivos bilhetes comprovativos do respetivo custo como o impõe a lei e, mesmo depois, veio a juntara apenas dois bilhetes de ida e volta, de cerca de € 300,00 cada, comprado com alguma antecedência e um comprado em cima da hora, de € 500,00, não tendo disso juntos os restantes bilhetes, alegadamente mensais correspondentes a mais de doze meses, custo esse contrariado com os custos das viagens de idas e volta de Bruxelas para Portugal com preços que oscilam entre os cerca de € 90,00 e os € 150,00 e
15 – Por outro lado, o preço de custo do bilhete da ida da filha de Faro para Bruxelas comprado pelo recorrido, em Fevereiro de 2018, para a filha passar as férias da Páscoa com o pai em Bruxelas, no montante de € 57,63 uma ida e que se junta e deverá admitido, nos termos do disposto no art. 651º CPCivil, pois que se torna necessário em virtude do julgamento na primeira instância pelo Tribunal a quo, que não era expetável, de considerar provado um custo muito mais elevado dos bilhetes face à violação da regra do art. 423º do CPCivil sobre a junção de documentos por parte do recorrido, e também à não exigência dos respetivos bilhetes dos alegados bilhetes mensais,
16 – Sendo ainda de destacar que este bilhete foi comprado pelo próprio pai, como dele se vê, em Fevereiro em 2018, numa época em que o seu relacionamento com a filha se processava normalmente, comprovando que não havia então, como nunca houve, influência maléfica da mãe no relacionamento da filha com o pai ao contrário do que inculca a douta sentença recorrida.
Matéria de Direito
17 – Como resulta dos nºs 58 e 59 da douta sentença recorrida os rendimentos da recorrente, no ano de 2018, cifram-se no vencimento mensal líquido de € 1.533,27.
18– O recorrido tem um vencimento mensal líquido de € 3.162,00 no ano de 2017 (ponto 64 dos factos provados), desconhecendo-se o seu vencimento em 2018, ao que acresce um subsídio de transporte no valor mensal de € 100,00, o que perfaz € 3.262,00 e paga € 860,00 por mês de renda de casa, como já pagava antes do divórcio;
19 – Não relevam para a determinação do rendimento disponível as despesas com as viagens a Portugal, para visitar a mãe e a irmã, e o que alega entregar à mãe, num total mensal de € 500,00 ou € 600,00 ainda que tais viagens e entregas correspondessem à realidade, que não correspondem, ao contrário do que pretende o recorrido, que considera que as suas viagens a Portugal para visitar a mãe e a irmã devem prevalecer sobre a satisfação das necessidades de sua filha, o que, para além da ética, o direito não admite, assim como não relevam os exagerados € 1.000,00 mensais em alimentação, que alega no nº 10 das suas alegações de 2/11/2017 e que o tribunal a quo admite que despenderá (nº 70 dos factos provados), ou seja, que poderá ou não despender.
20 – O padrão de vida da requerente e do requerido em nada se alterou após a sua separação e o divórcio, mantendo-se ambos a mesma profissão de professores, ele professor universitário em Bruxelas, ela do ensino secundário, em (…), continuam a viver nas mesmas casas, ele numa casa arrendada em Bruxelas, ela na casa de morada de família, cedida gratuitamente pelos seus pais e ambos mantêm o mesmo padrão de vida diária que mantinham antes da divórcio, ele na Bélgica, ela em Portugal, como resulta de toda a matéria de facto dada como provada.
21 – O rendimento a ter em conta, para efeitos da proporcionalidade nas despesas médicas, medicamentosas, escolares e extracurriculares e referentes a consultas de psicologia é o vencimento do requerido, ora recorrente, mais o acréscimo dos transportes de € 100,00, que representa um valor acrescido ao vencimento, sendo o padrão de vida e as demais despesas de ambos equivalentes, salvo a renda de casa do pai, de € 860,00, pois a mãe não paga renda, o que deduzido ao seu vencimento dá ao recorrente um rendimento disponível de € 2.402,00 sendo o da recorrida de € 1.533,00, pelo que se deve manter a proporcionalidade de 1/3 para a mãe e 2/3 para o pai fixada na douta sentença recorrida.
22 – A douta sentença quando fixa, nos nºs 4, 5 e 6 do seu dispositivo, a proporcionalidade de 2/3 paro o pai e 1/3 para a mãe na comparticipação das despesas que indica, conforma-se, com o dispositivo do nº 5 do art. 36º da CRP, com o critério da equidade e ainda com o disposto no art. 2004º, nº 1, do Cód. Civil, aqui aplicável juntamente com a equidade.
23 – As necessidades da (…), de acordo com o padrão de vida que os pais sempre lhe proporcionaram, num nível social de classe média-alta, são as mesmas que eram até à separação dos progenitores, agora agravadas com as despesas com a psicóloga e com os medicamentos para tratamento da depressão de que sofre após essa separação.
24 – O recorrido não põe em causa, no seu recurso independente, os valores dos gastos mensais da (…), que estão fixados nos pontos 37 e 38 dos factos provados da douta sentença e que totalizam o valor mensal de € 864,62.
25 – Analisando esses gastos verifica-se que os mesmos não correspondem a caprichos ou luxos antes são próprios da sua vida de estudante, com elevadas notas.
26 – No tocante a gastos com alimentação, os € 360,00 mensais que a mãe despende com ela em alimentação (nº 38 dos factos provados), representam € 12,00 por dia, quantia muito inferior aos € 33,33/dia que o pai alega que despenderá com a sua alimentação (nº 70 dos factos provados), sendo que se a filha gastasse menos 25% do que o seu pai, atendendo à alegada diferença de 25% entre o custo de vida na Bélgica e em Portugal (nº 15 das suas alegações de 2/11/2017) a filha gastaria, nas contas do recorrente, € 25,00, por dia, mas, afinal, nas contas da mãe, só gasta € 12,00, o que a experiência comum da vida nos ensina que corresponde à realidade, contrariamente ao que sucede com aqueles € 33,33/dia, que o pai diz que despenderá, que não merecem qualquer credibilidade.
27 – Da análise desses gastos se vê, objetivamente, que o nível de vida da (…) não é superior às possibilidades dos progenitores, que auferem vencimentos médio (a mãe) e elevado (o pai) e que não são gastos extravagantes, nem excessivos, e se situam dentro do padrão que os progenitores lhe proporcionaram desde colégios particulares com a mensalidade de € 500,00/mês, que não eram os avós que proporcionavam até à escola de equitação, ballet e ginástica, que igualmente não lhe eram proporcionados pelos seus avós maternos, mas sim pelos progenitores.
28 – Se subtrairmos àquele valor de € 864,62 os € 118,00 do abono de família do governo Belga, obtemos o valor de € 736,62, valor este que dividido por 3 (para se obter o valor de um terço), dá a quantia de € 245,54, que por seu turno, multiplicado por 2 dá o valor de € 491,80, que corresponde aos 2/3 que o pai deveria pagar e não apenas os € 325,00 que foram fixados na douta sentença, que fica aquém do valor de que a filha carece, só se compreendendo que não o fixe por se ater a um critério da equidade, mas que contraria o dispositivo do nº 1 do art. 2004º do CCivil.
Má fé
29 – Os factos dos nºs 31, 43 a 48 e 83 da douta sentença recorrida demonstram que o recorrido faltou conscientemente à verdade no nº 4, alíneas a) e l) das alegações de 2/11/2017, pois no nº 7 do seu dispositivo, condenou o ora recorrido no pagamento dos € 1.265,00 fixados no nº 48 dos factos provados, quantia essa relativa às despesas a que se referem os nºs 43, 44, 45, 46 e 47 dos factos provados.
30 – Os factos dados como provados nesses nºs 43 a 47 são aqueles que foram alegados nos arts 10, 11, 12 e 14 das alegações da ora recorrente de 2/11/2017, os quais o recorrido expressamente negou naquelas duas alíneas a) e l) do nº 4 das suas alegações do mesmo dia 2/11/2017, afirmando, na alínea l), expressamente, que “…não tem qualquer valor em dívida em relação à pensão de alimentos”, já então fixada desde Junho de 2017, em clara resposta ao alegado nos nºs 6 a 14 das alegações da recorrente do mesmo dia, onde era apontada a dívida.
31– A contradição da douta sentença, salvo o devido respeito, é flagrante, pois não se pode se pode entender que nada se comprovou se a requerente mãe alegou nos arts. 1 a 14 das alegações de 2/11/2017 que o pai não pagou alimentos à filha desde que saiu de casa e continuou a não pagar as despesas aí indicadas, o que ele veio negar expressamente no nº 4, alíneas a) e l) das suas alegações de 2/11/2017, dizendo que sempre pagou alimentos à filha e nada deve dos alimentos em que foi condenado, se a, aliás, douta sentença vem a dar com provados esses factos e até o condena, com fundamento neles, a pagar essas quantias no nº 7 do seu dispositivo.
32– O facto nº 13 dos provados na sentença de divórcio, vem demonstrar a má-fé do requerido quando alega, falsamente, na alínea g) do nº 4 das suas alegações de 2/11/2017, que não lhe foi entregue os botões de punho e o fio de ouro, cuja entrega solicitou, o que não se compagina com a decisão sobre a má-fé, com cujo pedido de condenação apenas se pretendeu que se fizesse justiça verificando e reconhecendo a solerte posição do requerido, sem pretender retirar aí qualquer vantagem patrimonial dessa condenação, que, aliás, a lei reconhece à requerente como sendo um seu direito (artigo 542º, nº 1, CPCivil, in fine);
33 – Outra falsidade, sem fundamento probatório, está na alínea m) do art. 5 das alegações do recorrido de 2/11/2017, como o comprova o bom relacionamento com a filha desde as férias de Verão de 2017, até Maio de 2017, quando o pai recusa a sua comparticipação na viagem à Áustria que tinha autorizado e prometido à filha que comparticipava, o que, aliás, estava implícito na autorização, com o argumento de que não se tinha comprometido por escrito a comparticipar.
34 – O facto nº 13 dos provados na sentença de divórcio, vem demonstrar a má-fé do requerido quando alega, falsamente, na alínea g) do nº 4 das suas alegações de 2/11/2017, que não lhe foi entregue os botões de punho e o fio de ouro, cuja entrega solicitou, o que não se compagina com a decisão sobre a má-fé, com cujo pedido de condenação apenas se pretendeu que se fizesse justiça verificando e reconhecendo a solerte posição do requerido, sem pretender retirar daí qualquer vantagem patrimonial dessa condenação, que, aliás, a lei reconhece à requerente como sendo um seu direito (artigo 542º, nº 1, CPCivil, in fine).
35 – Ora, a alteração da verdade dos factos e a oposição sem fundamento aos factos alegados, por si só e ainda, com isso, fazer do processo e dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objetivo ilegal (de não pagar os alimentos devidos à filha) e impedir a descoberta da verdade (de que nunca pagou alimentos à filha desde que a separação do casal, dando origem ao processo e ao seu prosseguimento para fixação da prestação alimentícia por si devida, são comportamentos que a lei qualifica como litigância de má fé, à luz do disposto no art. 542º, nºs 1 e 2 do CPCivil, dispositivo que a, aliás, douta sentença não observou.»

O Recorrido sustenta que o recurso deve ser julgado improcedente, inexistindo fundamentos para a peticionada condenação por litigância de má-fé.

Cumpre conhecer das seguintes questões:
- da impugnação da decisão relativa à matéria de facto;
- da nulidade da sentença;
- do fundamento para fixar o valor da prestação alimentícia a cargo do progenitor em € 200,00 ou antes em € 481,80;
- do fundamento para alterar a comparticipação dos progenitores nas despesas extra, passando a cifrar-se em 1/3 a participação do progenitor e em 2/3 a participação da progenitora;
- da litigância de má-fé por parte por parte do Requerido.


III – Fundamentos

A – Os factos provados em 1.ª Instância
1. A requerente e o requerido casaram em 11 de Setembro 1999 respetivamente com 29 e 26 anos de idade (doc. de fls. 5 v).
2. (…) nasceu em 28/12/2000 e encontra-se registada como filha da requerente (…) e do requerido (…) – (doc. fls. 3 v).
3. A (…) sempre residiu na Rua de (…), n.º 204 T, na (…), em Loulé, casa que constituía o lar conjugal dos seus pais continuando ali habitar juntamente com a mãe, desde que o pai passou a exercer funções de docência no estrangeiro (declarações da progenitora a fls. 25, conjugadas com as do progenitor e com as declarações da técnica gestora).
4. A (…) frequentou durante três anos (3º, 4º e 5º ano) um colégio particular cuja mensalidade rondava os € 500,00 mensais (declarações da progenitora).
5. Quando a (…) frequentava o 3º, 4º e 5º ano o pai já se encontrava então no estrangeiro, nessa época, auferindo um salário semelhante ao atual com gastos com renda de casa, alimentação, vestuário e voos para Portugal (declarações da progenitora).
6. Em 2011/12, devido à insatisfação dos pais relativamente à metodologia de ensino do colégio que a filha frequentava, a (…) passou a frequentar o Agrupamento de Escolas (…), onde a mãe trabalha (declarações progenitora).
7. Em 2012 o requerido passou a exercer atividade laboral na Bélgica e a habitar uma casa localizada naquele país e deslocando-se a Portugal onde passava períodos com a filha e a mulher (declarações da progenitora).
8. Durante a sua infância, a (…) frequentou atividades extracurriculares (natação, ginástica, ballet) e já na adolescência, entre 2011 e 2014, praticou equitação no Centro Hípico de (…) e desde Abril de 2016, ou seja, oito meses antes da separação dos pais, passou a frequentar o ginásio, atividade que mantém (declarações progenitora e da testemunha …).
9. Durante a vivência conjunta a requerente e o requerido utilizavam uma conta comum do (…), usando o requerido aquela para pagar a TV, a internet e o alarme da casa que constituía o lar conjugal, num total de cerca de € 110,00 (declarações da requerente).
10. O requerido suportava o custo da casa sita na Bélgica e a requerida suportava o custo das restantes despesas tidas em Portugal (declarações da requerente e do requerido).
11. A requerente pagava as despesas da filha (…) da sua conta-ordenado (declarações da requerente).
12. Desde o final do mês de Dezembro de 2016 que requerente e requerido não partilham nem cama nem mesa (declarações da progenitora conjugadas com as da técnica e com o auto de ocorrência lavrado pela GNR constante de fls. 86).
13. O requerente e a requerida tinham um depósito a prazo na conta n.º (…) do (…) no montante de € 97.500,00 (doc. fls. 88).
14. No dia 23.3.2017 a requerida deu ordem de transferência desse montante para a conta à ordem do casal e, no mesmo dia, deu ordem de transferência para a sua conta pessoal e de que é a única titular nº … (doc. fls. 88 e 88 v).
15. No dia 27 de Março de 2017 o requerido recebeu um email dos pais da requerente a referir que:
tendo ainda em conta os graves desentendimentos entre si e a nossa filha, a que todos desejarão por termo e nós desejamos evitar, para benefício de ambos e da nossas neta, vimos comunicar-lhe que decidimos fazer cessar o empréstimo da casa que vos cedemos como casa de morada de família, autorizando apenas a que nela se mantenha a nossa filha com a v/filha e n/ neta, uma vez que a v/família, enquanto casal, está desfeita.
E para prevenir conflitos indesejáveis, procedemos à mudança da fechadura, ficando-lhe assim inteiramente vedado o acesso aquela casa” (doc. fls. 85 v).
16. Em 27.3.2017 a requerente remeteu correspondência eletrónica ao requerido com o teor constante de fls. 198, cujo teor se dá por integralmente reproduzido (doc. fls. 198).
17. O requerido regressou a Portugal em Abril de 2017 e não conseguiu entrar no lar conjugal (auto e ocorrência de fls. 86).
18. No dia 4 de Abril de 2017 o requerido tentou levantar os seus bens no lar conjugal, sendo-lhe vedada a entrada em casa (doc. fls. 86).
19. O requerido chamou a GNR, que se deslocou ao local, tendo a requerente, disponibilizado os bens, que entendeu dever e poder o requerido transportar, encaixotados, dando-lhe acesso apenas ao corredor para carregar os caixotes (doc. fls. 86).
20. A requerente não permitiu o acesso do requerido a qualquer outra dependência da casa (doc. fls. 86 v).
21. A Caisse d`allocati transferiu para a requerente, nos meses de Fevereiro, Março, Abril e Maio e Junho de 2017 a quantia mensal de € 116,52 a título de abono de família devido à … (docs. fls. 102, 103, 104, 105, 106).
22. A Caisse d`allocati transferiu para a requerente, nos meses de Junho, Julho, Setembro de 2017 a quantia mensal de € 118,85 a título de abono de família devido à … (fls. 107, 109, 110, 111).
23. A Caisse d`allocati transferiu para a requerente, em Agosto de 2017, a quantia de € 181,27 a título de abono de família devido à … (fls. 108). 24. A (…) beneficiava de apoio psicológico semanal e tomava medicação para a concentração, para o stresse, para a depressão e para a ansiedade (declarações da progenitora conjugado com os documentos juntos a fls. 61 v, 62, 64 a 68).
25. Em 9.6.2017 no âmbito da 1ª conferência de pais, atentas as declarações prestadas pela jovem e requerente, foi proferida decisão provisória quanto ao exercício das responsabilidades parentais com o seguinte teor:
Responsabilidades Parentais e Fixação da Residência
1. A jovem (…) ficará a residir com a mãe.
2. As responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida da filha são exercidas em comum por ambos os progenitores, salvo nos casos de urgência manifesta em que qualquer dos progenitores pode agir sozinho, devendo prestar informações ao outro logo que possível.
3. São questões de primordial importância:
a) A fixação da residência da jovem no estrangeiro ou em área distinta do Algarve;
b) A aceitação ou repúdio de herança;
c) A administração de bens recebidos por herança, doação ou jogo; d) A autorização para casamento;
e) A autorização para obter licença de condução;
f) As intervenções cirúrgicas programadas que coloquem em perigo de vida da jovem ou possam causar lesão irreversível;
g) A representação em juízo.
h) A frequência do ensino privado.
4. O exercício das responsabilidades parentais relativas aos atos da vida corrente da jovem cabe à mãe com quem ela reside habitualmente, ou ao pai quando ele se encontrar com a jovem temporariamente, não devendo o progenitor contrariar as orientações educativas mais relevantes tal como elas são definidas pela mãe.
5. A mãe a quem cabe o exercício das responsabilidades parentais relativas aos atos da vida corrente pode exercê-las por si ou delegar o seu exercício, devendo informar o progenitor sobre o modo do seu exercício, designadamente sobre a educação e as condições de vida da filha, preferencialmente através de endereço eletrónico.
6. A mãe exercerá o cargo de encarregada de educação da filha.
7. Ambos os progenitores poderão viajar acompanhados da filha dentro do Espaço Schengen sem necessidade de declaração escrita do outro progenitor. As viagens da jovem para fora do Espaço Schengen carecem de autorização de ambos os progenitores, reconhecida que seja a assinatura por notário ou advogado. Em qualquer dos casos os progenitores deverão prestar informação sobre os horários e locais de partida e chegada da viagem bem como local de alojamento e contactos.
Convívios
8. O pai conviverá e contactará com a filha de acordo com a motivação mútua de ambos pessoalmente, através de telefone ou via eletrónica, nomeadamente podendo a jovem deslocar-se à Bélgica para ali passar férias com o progenitor.
Pensão de alimentos
9. O pai contribuirá a título de alimentos com a quantia mensal de € 325,00 devida à filha, a qual será entregue por transferência bancária para o IBAN: PT (…), no dia 1 de cada mês a que disser respeito a prestação de alimentos.
10. A quantia referida em 9. será anual e automaticamente atualizada a partir de Janeiro de 2018, segundo o aumento da taxa de inflação prevista pelo Instituto Nacional de Estatística, relativa ao ano anterior.
11. O pai suportará na proporção de 2/3 e a mãe de 1/3 o custo com as despesas médicas, medicamentosas e escolares (livros, material escolar e explicações) da filha na parte não comparticipada, mediante a apresentação da cópia do respetivo recibo.
12. As despesas com as consultas de psicologia prestadas em benefício da jovem (…) serão suportadas na proporção de 2/3 e 1/3 respetivamente pelo pai e pela mãe, caso sejam prescritas por médico.
13. Caso ambos os progenitores se encontrem de acordo quanto à participação da filha em atividades extracurriculares (ex: viagem da filha ao Porto, etc.) o seu custo será suportado pelo pai e pela mãe respetivamente na proporção de 2/3 e 1/3.
14. Os custos inerentes à viagem da (…) à China (transporte, seguros e estadia), no âmbito do curso de mandarim que a jovem frequentou, serão suportados pelo pai e pela mãe respetivamente na proporção de 2/3 e 1/3” (ata de fls. 25 e 26).
26. Após a prolação da decisão provisória os progenitores trocaram a correspondência eletrónica constante de fls. 69 v a 74 v, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, e onde nomeadamente a requerente reclamava o pagamento de 2/3 das despesas incluindo a viagem à China (docs. fls. 69 v a 74 v).
27. No decurso da segunda conferência de pais realizada em 17.10.2017 a progenitora entendeu dever a prestação alimentícia ser fixada em € 650,00 mensais, opondo-se à conversão do regime provisório em definitivo (ata de fls. 48).
28. A (…), até Outubro de 2017, não falava com o pai, mas após a intervenção técnica e da sua psicóloga recuperou os convívios com o pai (fls. 26 v; declarações da técnica gestora em sede de instrução conjugada com as da progenitora ao longo do processo e do progenitor).
29. Nessa intervenção efetuada pela técnica gestora em articulação com a psicóloga a jovem declarou gostar muito do pai (declarações da técnica gestora).
30. A psicóloga da jovem deu-lhe alta (declarações da progenitora).
31. No dia do julgamento realizado em 10.5.2018 foram efetuados os cálculos dos valores em dívida pelo progenitor, relativos a despesas, tendo-se apurado cifrarem-se em € 1.265,19 (ata de 10.5.2018).
32. À data da realização dos cálculos das despesas em dívida não foram contabilizadas as faturas de fls. 176 a 178, porquanto aguardavam o reembolso da ADSE.
33. Depois de Maio de 2018, após a audiência em que os avós maternos não quiseram ser ouvidos, a (…) deixou de falar com o pai (declarações da técnica gestora conjugadas com as da mãe em sede de julgamento e com as do pai).
34. A (…) tem para usar no seu dia-a-dia um par de ténis para fazer desporto; um par de ténis para usar no dia-a-dia (usados ao longo de todo o ano); um par de botas de cano alto; um par de botins; um par de sapatos (para o Inverno); dois a três pares de sandálias (para o Verão) – (declarações da progenitora).
35. A progenitora tem gastos com o material escolar da filha (dossiês de arquivo, canetas, lápis, corretor, resmas de folhas, cadernos e folhas de teste) – (declarações da progenitora).
36. A impressora existente na casa da requerente é utilizada para imprimir fichas, PowerPoints e outros materiais que os professores enviam por email, materiais de preparação para os testes de avaliação que as editoras disponibilizam online (declarações da progenitora).
37. A (…) tem os seguintes gastos mensais:
- € 100,00 com ginásio (personal trainer);
- € 33,00 com internet e telefone;
- € 25,00 com esteticista;
- € 36,00 em produtos de higiene;
- € 20,00 em gasóleo;
- € 12,33 com produtos de maquilhagem (€ 148,00 anuais – € 44,00 anuais com quatro máscaras de pestanas – entre € 10,00 a € 12,00 cada; € 54,00 anuais com batons –entre € 12,00 a € 15,00 cada;
- € 11,66 (€ 140,00 anuais) com cremes para o rosto e corpo;
- € 2,5 em toalhitas desmaquilhantes (declarações da progenitora);
- € 11,66 com cabeleireira (€ 140,00 anuais – cerca de quatro a cinco vezes por ano, num valor que varia entre os € 16,00 e os € 35,00) – (declarações da progenitora).
- € 10,00 com perfumes (€ 120,00 anuais – dois por ano);
- € 7,67 atividades de lazer (€ 92,00 anuais com a aquisição de livros, material fotográfico – papel para a polaroid, papel para imprimir fotografias, objetivas –, saídas com os amigos e/ou namorado – festas de aniversário, lanches ou almoço com os amigos).
- € 225,00 com vestuário e calçado e acessórios (€ 2.700,00 anuais) – (declarações da requerente).
38. Apesar de a requerente referir despender com € 360,00 mensais a título de alimentos com a filha (cinco refeições diárias), era e é a avó materna (e avô materno), reformada que fazia, faz, fornecia e fornece a maior parte das refeições à (…) desde pelo menos o ano de 2011, tal como à requerente (declarações do progenitor conjugadas com as da …).
39. As senhas na cantina da escola importavam um custo de € 1,40, mas a (…) não toma ali as suas refeições (declarações do progenitor conjugadas com as da progenitora).
40. A (…) sempre teve um computador pessoal, tablet e telemóvel e em Fevereiro de 2017, o pai ofereceu-lhe um iPhone no valor de € 720,00 e anteriormente tinha um Hawei no valor de € 365,00, que ficou para o pai (declarações da progenitora).
41. A (…) tem como hobbies a fotografia, a música, a leitura e a escrita (declarações progenitora e da testemunha …).
42. Relativamente ao vestuário, até por volta dos doze anos a maioria da roupa da (…) era comprada na Massimo Dutti e atualmente na Stradivarius, Tifossi, Mango, Pull&Bear, Oshyo, Woman Secrets e semelhantes (declarações da progenitora).
43. A progenitora enviou um email ao requerido em 2 de Julho de 2017 onde reclama o pagamento das despesas ao requerido, constante de fls. 59 v e 60, email e documentos que aqui se dão por integralmente reproduzidos (doc. fls. 59 v e 60).
44. A progenitora apresentou ao requerido, ainda, as despesas com viagem à China da … (doc. fls. 59 v e 60).
45. A progenitora enviou ao requerido mensagens eletrónicas entre 30 de Julho a 4 de Agosto de 2017, constante de fls. 70 a 73 v, cujo teor se dá por integralmente reproduzido (doc. 24).
46. O remanescente da viagem à China foi reclamado ao pai no correio eletrónico de 30 de Julho e 4 de Agosto, conforme resulta do documento de fls. 69 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido (doc. fls. 69 e segs.).
47. A progenitora, por email de 6 de Outubro, solicitou ao requerido o pagamento de despesas, conforme documento de fls. 74 v, cujo teor se dá por integralmente reproduzido (doc. fls. 74 v).
48. Em 10.5.2018 o tribunal em colaboração com os ilustres mandatários e a progenitora procedeu à elaboração do cálculo das quantias em dívida e apurou ser o progenitor devedor do valor global de € 1.265,19 relativamente às despesas previstas nas cláusulas 11., 12., 13. e 14. da decisão provisória contante da ata de fls. 201 (ata de fls. 201 e gravação).
49. A requerente não apresenta encargos com a habitação (empréstimo bancário ou renda) em Portugal, porquanto reside numa casa cedida gratuitamente pelos seus pais (declarações da técnica gestora conjugadas com as da progenitora).
50. A requerente e a filha fazem maioritariamente as suas refeições na casa dos avós maternos desta última (declarações da progenitora, do progenitor e da …).
51. O avô materno da (…) é construtor civil e a avó reformada (declarações do progenitor).
52. A (…) e a mãe vivem na (…) a cerca de 12 Km de (…), local onde se situa a escola que a (…) frequenta e onde reside a maioria dos seus amigos e colegas (declarações da progenitora e da testemunha …).
53. A (…) frequenta a mesma escola onde a mãe leciona (declarações da progenitora e da testemunha …).
54. Quando a (…) necessita de se deslocar para consultas médicas, realizar trabalhos de grupo, idas ao cinema, saídas com os amigos e/ou namorado, é a mãe que a transporta (declarações da progenitora e jovem).
55. A requerente é professora do ensino secundário, no Agrupamento de Escolas (…), em … (declarações da requerente e da testemunha …).
56. No seu IRS de 2016 a requerente apresentou rendimentos brutos no valor de € 32.032,77 € correspondentes a € 2.669,40 mensais (doc. fls. 291).
57. No seu IRS de 2017 a requerente apresentou rendimentos brutos de € 32.576,35 a que acresceram as pensões alimentícias da filha no valor de € 1.950,00 num total de € 34.526,35 brutos, correspondentes a um valor mensal ilíquido respetivamente de € 2.715,00 e € 2.877,00 e líquido anual de € 24.189,63 e mensal de € 2.015,80 (doc. fls. 318 a 319).
58. Em Novembro de 2018 a requerida auferiu para além do seu vencimento mensal de € 1.533,27 líquidos (€ 1.982,40 brutos) a quantia de € 1.420,00 líquidos de subsídio de Natal (doc. fls. 292, 321).
59. No ano de 2018 ao valor mensal líquido de cerca de € 1.500,00 acresceu o subsídio de férias e de Natal num valor de cerca de € 2.840,00 (€ 1420,00 + € 1420,00), num total mensal de cerca de € 1.769,93 (€ 236,66 + € 1.533,27).
60. A requerente recebe do Estado Belga o abono de família da filha no valor de cerca de € 118,00 (declarações da requerente e requerido e doc. de fls. 102 a 111).
61. Aos rendimentos mensais da requerente no valor de cerca de € 1.769,93 (€ 236,66 + € 1.533,27) mensais acrescem o abono de família da filha, no montante de € 118,00 e a prestação alimentícia paga pelo requerido atualmente fixada no valor de € 332,71, tudo num total mensal de € 2.220,64.
62. A requerente tem os seguintes gastos mensais:
- € 90,00 com água e luz;
- € 41,00 com o alarme da casa.
- € 33,00 com TV e internet;
- € 50,00 de seguro do carro;
- € 32,50 em gasóleo;
- € 200,00 em alimentação (embora se tenha apurado que toma a maior parte das refeições na casa dos seus pais);
- € 100,00 com a personal trainer (declarações da progenitora).
Num total de € 546,50 mensais.
63. A requerida tem ainda despesas com vestuário, calçado, lazer e saúde, produtos de higiene e cosmética, compras supermercado (regras da experiência comum conjugadas com as declarações de ambos os progenitores).
64. O requerido tem a profissão de professor na Université Catholique de (…), na Bélgica, tendo auferido em 2016 um vencimento anual líquido de cerca de € 37.200,00 e em 2017 de € 37.940,00 correspondente a um vencimento mensal médio líquido respetivamente de € 3.100,00 e € 3.162,00 (declarações do progenitor e docs. de fls. 147 a 148 v, 219 e 220, 232 a 238, 242, 243, 251 a 262).
65. Relativamente aos rendimentos do ano de 2016 o requerido foi reembolsado no montante de € 371,82 por parte das finanças da Bélgica (doc. fls. 272 a 275).
66. O requerido tem ainda direito a utilizar um passe para se fazer deslocar nos transportes na Bélgica no valor anual de € 1.200,00 (declarações do progenitor e docs. de fls. 218, 221, 222, 297).
67. O requerido toma o almoço habitualmente na cantina universitária cujo custo importa € 6,15 por refeição, mas se adquirir a refeição “a la carte” despenderá € 7,00 a € 8,00 por refeição o que acontecerá cerca de duas a três vezes por mês, num total de cerca de € 140,00 (€ 6,15 x 19 dias úteis + 3 x € 7,50) – (declarações do progenitor).
68. O requerido despende cerca de € 200,00 por semana em compras no supermercado, nomeadamente para confecionar as refeições que faz em casa (pequeno almoço e jantar), num total de cerca de € 800,00 mensais (declarações do progenitor).
69. O requerido por vezes também come em restaurantes cerca de duas a três vezes por mês despendendo cerca de € 40,00 a € 50,00 por refeição, bem como come sempre um lanche a meio da manhã e café, num total de pelo menos € 135,00 mensais (€ 45,00 x 3 refeições).
70. O requerido despenderá cerca de € 1.000,00 mensais (€ 140,00 + € 800,00 + € 135,00) com a aquisição da sua alimentação e restantes compras de supermercado (declarações do progenitor).
71. O requerido despende em média cerca de € 300,00 com cada deslocação de avião que efetua entre Bruxelas e Portugal, mas dependendo da antecedência com que adquire o bilhete esse custo pode atingir valores superiores a € 500,00 (docs. fls. 138, 139, 330 e declarações do progenitor e da testemunha …).
72. O requerido tem, em média, as seguintes despesas mensais:
- € 860,00 com a renda da casa sita na Bélgica (declarações do progenitor);
- € 65,00 com TV e internet (declarações do requerido);
- € 1.000,00 em alimentação e compras de supermercado (declarações do progenitor).
- € 300,00 com viagens para fora da Bélgica nomeadamente com destino a Portugal (declarações do requerido conjugadas com a testemunha …);
- € 40,00 com lavandaria (declarações do progenitor);
- € 0,58 com o seguro de incêndio (declarações do progenitor)
- € 200/300 em despesas com a sua permanência em Portugal (declarações do progenitor conjugadas com as da testemunha …).
Num total, em média, de € 2.515,00, excluindo despesas de saúde, lazer, vestuário e calçado (declarações do progenitor conjugadas com as regras da experiência).
73. Até Abril de 2017 o requerido suportou também o custo do alarme da casa em Portugal no valor de cerca de € 35,00 mensais (declarações do requerido).
74. O requerido, quando vem a Portugal, permanece na Vivenda (…), Caixa Postal (…), (…), juntamente com a sua mãe (declarações progenitor).
75. A mãe do requerido era funcionária bancária e encontra-se atualmente reformada (declarações do requerido).
76. A jovem continua a ser acompanhada por psicólogo (distinta da anterior que lhe havia dado alta após a reconciliação com o pai) e toma medicamentos para a concentração (desempenho escolar), para o stresse e para a depressão (declarações da progenitora e doc. de fls. 159).
77. Depois da audiência de julgamento ocorrida em 10.5.2018, em que os avós maternos não quiseram ser ouvidos, a jovem deixou novamente de falar com o pai (declarações do pai, da jovem e da técnica gestora).
78. Desde Maio de 2018 a (…) recusa a manter com o pai qualquer contacto (declarações da jovem).
79. Em sede de julgamento a jovem afirmou, dirigindo-se ao pai “ele que fique com o dinheirinho todo para ele”, “a mãe é que paga tudo quando o pai saiu de casa não pagava nada” (declarações da jovem em sede de julgamento).
80. No ano letivo 2017/2018 a jovem (…), no segundo período, teve as seguintes notas: 16 a Português; 17 a Matemática A; 17 a Física Química; 17 a Biologia e Geologia; e anulou a matrícula em Educação Física (doc. fls. 183).
81. A jovem repetiu o 11º ano no ano transato tendo faltado aos exames para poder repetir o ano com o objetivo de melhorar as notas (declarações da jovem).
82. Em 20.9.2018 foi proferida sentença que decretou a dissolução do casamento entre a requerente e o requerido (doc. fls. 303 a 315).
83. Desde a data da fixação do regime provisório o progenitor não pagou os 2/3 das despesas com as consultas de psicologia (prescritas por médico), médicas, medicamentosas e escolares (livros, material escolar e explicações) da filha na parte não comparticipada.

B – O Direito

Questão prévia
A Recorrente apresenta-se a juntar, em sede de alegações de recurso, um documento cuja admissão requer nos termos do disposto no art. 651.º do CPC. Invoca ser necessária a sua junção em função do julgamento proferido em 1.ª Instância (cfr. n.º 71 dos factos provados), dele se retirando que ascendeu a € 57,63 o custo da ida de Faro para Bruxelas em Fevereiro de 2018.
Ora vejamos.
Nos termos do disposto no art. 651.º, n.º 1, do CPC, «As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o artigo 425.º ou no caso da junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na primeira instância.» O art. 425.º do CPC, por sua vez, determina que «Depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento.»
A apresentação da prova documental encontra-se regulada desde logo no art. 423.º do CPC, nos seguintes termos:
«1 - Os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da ação ou da defesa devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes.
2 - Se não forem juntos com o articulado respetivo, os documentos podem ser apresentados até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, mas a parte é condenada em multa, exceto se provar que os não pôde oferecer com o articulado.
3 - Após o limite temporal previsto no número anterior, só são admitidos os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento, bem como aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior.»
Consagra-se, assim, o ónus de provar os factos alegados em fundamento da ação e da defesa e o dever de apresentar ab initio os documentos que os provem com o articulado em que a alegação seja feita. Não sendo junto o documento a par da alegação do facto probando, a admissão dele em momento posterior está condicionada ao regime legal citado.
Conforme vem sendo unanimemente apontado[1], da concatenação destas normas decorre que a junção de documentos em sede de recurso (junção que é positivamente considerada apenas a título excecional) depende da alegação e da prova, pelo interessado nessa junção, de uma de duas situações: (1) a impossibilidade de apresentação do documento anteriormente ao recurso, alicerçada na remissão do art. 651.º, n.º 1, para o art. 425.º; (2) ter o julgamento da primeira instância introduzido na ação um elemento de novidade que torne necessária a consideração de prova documental adicional, que até aí, ao julgamento em primeira instância, se mostrava desfasada do objeto da ação ou inútil relativamente a este.
Ora, a superveniência dos documentos, que o apresentante tem de invocar e demonstrar, pode ser objetiva, nos casos em que o documento só foi produzido em momento posterior ao do encerramento da discussão, ou subjetiva, quando o documento, apesar de já existir, só chegou ao conhecimento da parte depois desse momento. Estão, assim, em causa, documentos objetiva ou subjetivamente supervenientes, pelo que resulta afastada a admissibilidade da junção de documento que a podia e devia ter sido junto na 1.ª instância.
No que concerne à superveniência subjetiva, não basta invocar que só se teve conhecimento da existência do documento depois do encerramento da discussão em 1ª instância, mas que o desconhecimento não deriva de culpa sua, salvaguardando assim que lhe seja imputada incúria ou falta de diligência.[2] Todavia, só são atendíveis razões das quais resulte a impossibilidade daquela pessoa, num quadro de normal diligência referida aos seus interesses, ter tido conhecimento anterior da situação ou ter tido anteriormente conhecimento da existência do documento.
Regime legal que tem aplicação no âmbito dos processos de jurisdição voluntária.[3]
No caso em apreço, inexiste superveniência objetiva do documento apresentado – a audiência de julgamento teve lugar a 14/01/2019.[4] Por outro lado, a sua junção tem em vista demonstrar o custo a que ascende a viagem de Portugal para Bruxelas, matéria factual que, manifestamente, estava sujeita a instrução. Por conseguinte, carece de fundamento a alegação de que a junção se tornou necessária em virtude do julgamento proferido em 1.ª Instância.
Termos em que se conclui ser de indeferir a requerida junção do documento, pelo que se determina o respetivo desentranhamento, condenando-se a apresentante recorrente em multa que se fixa em 1 (uma) UC – arts. 443.º do CPC e 27.º, n.º 1, do RCP.

Da impugnação da decisão relativa à matéria de facto
Importa salientar que a reapreciação do julgamento realizado em 1.ª Instância, no que respeita à matéria de facto, visa apurar se os factos concretos submetidos à instrução, factos esses objeto de decisão que se mostra impugnada em sede de recurso, foram incorretamente julgados, impondo-se decisão diversa. A Relação deve alterar a decisão se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa – cfr. arts. 640.º, n.º 1, als. a) e b) e 662.º, n.º 1, do CPC.
Por via de tal regime legal, «Incumbe ao recorrente a demonstração de que o tribunal recorrido cometeu um erro de julgamento. Para tanto, não lhe basta indicar determinado meio de prova que, no seu entendimento, sustente a versão factual que considere ser a verdadeira, como se nenhum outro existisse. Se se limitar a fazer essa indicação, o recorrente não terá, sequer, tentado demonstrar a existência de erro de julgamento. Tendo o tribunal recorrido formado a sua convicção sobre determinado facto com fundamento num conjunto de meios de prova, incumbe ao recorrente fundamentar a sua discordância em relação a todo o processo de formação da convicção daquele tribunal sobre o mesmo facto. Tal fundamentação passa, necessariamente, pela referência a todos os meios de prova de que o tribunal recorrido se serviu para formar a referida convicção e pela análise crítica dos mesmos, pois só assim o recorrente poderá sustentar devidamente a sua pretensão de alteração da matéria de facto. No fundo, é tarefa do recorrente propor uma análise crítica da prova (entenda-se, de toda a prova relevante para a formação da convicção sobre determinado facto) diversa daquela a que o tribunal recorrido procedeu, procurando, assim, convencer o tribunal de recurso de que é a sua a correta. Só se lograr esse convencimento, o recorrente terá demonstrado a existência de um erro de julgamento por parte do tribunal recorrido. E, como acima referimos, apenas nessa hipótese poderá a Relação alterar a decisão do tribunal de primeira instância.» [5]

A Recorrente subordinada sustenta que devem ser dados como provados os factos que foram dados como provados sob os n.ºs 3 a 22 da sentença que decretou o divórcio mencionado no n.º 82 dos factos provados. Invoca que são relevantes para a decisão da causa e encontram-se comprovados por certidão junta aos autos.
No entanto, não se trata de matéria que estivesse sujeita a instrução no âmbito deste processo de regulação das responsabilidades parentais; não encontra acolhimento nos factos alegados pelas partes nos articulados apresentados, pelo que não há como invocar que está em causa factualidade incorretamente julgada.
Por outro lado, é certo que importa levar em consideração que temos em mãos um processo de jurisdição voluntária.[6] No âmbito destes processos, o tribunal não tem que se orientar por critérios de legalidade estrita e de rigor processual, devendo adotar, no caso, a solução que julgue mais conveniente e oportuna; pode investigar livremente os factos (no que não está circunscrito ao que as partes alegaram no processo), coligir provas, ordenar os inquéritos e recolher as informações convenientes, sendo apenas admitidas as provas que o juiz considerar necessárias[7], resultando mitigado o princípio do dispositivo que norteia o processo contencioso comum.
Ainda assim, analisado o rol de factos que a Recorrente subordinada elenca na 1.ª conclusão do recurso, é de concluir tratar-se de matéria de facto totalmente irrelevante para o litígio, que se cinge à fixação da prestação de alimentos a cargo do progenitor em favor da já maior (…).
Indefere-se a mencionada pretensão da Recorrente.
A Recorrente pugna pela eliminação do n.º 27 dos factos provados. Sustenta que não interessa a posição de um dos progenitores sobre tal matéria quando não há referência à posição do Recorrido, e que a posição da Recorrente foi veiculada pelo mandatário, sem poderes especiais.
Consta do n.º 27 dos factos provados o seguinte:
27. No decurso da segunda conferência de pais realizada em 17.10.2017 a progenitora entendeu dever a prestação alimentícia ser fixada em € 650,00 mensais, opondo-se à conversão do regime provisório em definitivo (ata de fls. 48).
E da ata de fls. 48 consta o seguinte:
«… encontrando-se presentes todas as pessoas notificadas para comparecerem na presente diligência.
(…)
a Mmª Juíza, tentou um acordo entre os progenitores da jovem, com vista à alteração da regulação das responsabilidades parentais, tendo sempre em consideração o primado do interesse da mesma, o que não foi conseguido porquanto a progenitora, em súmula, entende que a prestação alimentícia se deve fixar na ordem dos € 650,00 mensais, opondo-se à conversão do regime provisório em definitivo (momento "00:00 a 02:10")
O teor da referida ata alicerça integralmente a factualidade conduzida ao n.º 27 dos factos provados, donde se retira, efetivamente, que o acordo não foi conseguido por a progenitora se ter oposto à conversão do regime provisório em definitivo por entender que a prestação mensal se devia fixar em € 650,00. Acresce que a posição da progenitora veio a ser reiterada na audiência que teve lugar a 10/05/2018, onde consta que «Dada a palavra à requerente (…), no uso da mesma referiu não estar disponível para homologação do regime provisório em definitivo» – cfr. fls. 201.
Inexiste fundamento para excluir o n.º 27 dos factos provados.
Relativamente ao n.º 28 dos factos provados, onde consta que «A (…), até Outubro de 2017, não falava com o pai, mas após a intervenção técnica e da sua psicóloga recuperou os convívios com o pai», a Recorrente sustenta que o seu teor deve ser alterado, passando a constar o seguinte:
«A (…) não falava com o pai, mas antes mesmo de a técnica gestora ter iniciado as suas diligências para a retoma de comunicação entre pai e filha, tal retoma já estava concretizada, já havia comunicação, já tinha havido um reaproximar relacionar muito gratificante de ambas as partes, tendo sido aproveitado momentos de férias para essa retoma e a Adriana já tinha deixado de ir às consultas de psicologia, sendo que a última tinha sido na presença do pai que também ajudou o retorno da relação...”.
Alude, para tanto, às declarações prestadas na 1.ª Conferência pela técnica gestora, que não foram contrariadas por outro meio de prova.
Auscultadas tais declarações, constata-se que efetivamente foi afirmado que os contactos e convívios entre a (…) e o pai tinham sido retomados sem intervenção técnica. Mais foi afirmado o conjunto de factos que a Recorrente pretende reconduzir ao rol dos factos assentes, mas cujo relevo não se alcança para a resolução do litígio.
Assim, o n.º 28 dos factos provados passará a constar conforme segue:
«Antes de Outubro de 2017 e sem intervenção técnica, (…) e o pai tinham retomado contactos e convívios.»
No n.º 29 dos factos provados menciona-se que «Nessa intervenção efetuada pela técnica gestora em articulação com a psicóloga a jovem declarou gostar muito do pai.»
A Recorrente sustenta que tal segmento deve ser substituído pelo seguinte: «A Adriana recuperou os seus convívios com o pai, antes da intervenção da técnica gestora.»
Ora, não é invocado que o Tribunal incorreu em erro de julgamento, que a Adriana não tenha referido à técnica que gostava muito do pai – o que, aliás, a técnica afirmou ter-lhe sido dito pela menina, ouvida em ambiente neutro – cfr. diligência gravada a 17/10/2017. Por conseguinte, inexiste fundamento para alterar aquele item como pretende a Recorrente.
No que respeita ao n.º 30, a Recorrente pugna pela respetiva exclusão do rol dos factos provados, quer por a progenitora não o ter afirmado quer por se tratar de matéria factual irrelevante para a decisão da causa. Como se alcança do regime legal inserto no art. 640.º do CPC, a irrelevância do facto não constitui fundamento para impugnação da decisão relativa à matéria de facto. Por outro lado, o teor do n.º 30 dos factos provados é consentâneo com o teor do n.º 76, que não foi objeto de impugnação, além de que este segmento contextualiza o que se afirma no n.º 30.
Termos em que se mantém o n.º 30 dos factos provados nos seus precisos termos.
Relativamente ao n.º 51 dos factos provados, a Recorrente sustenta que deve substituir-se a menção de que o avô materno é construtor civil pela menção de que é reformado. Apela ao documento de fls. 353, que não foi impugnado, e que as declarações do progenitor não são só por si suficientes para comprovar tal facto.
Alcança-se de fls. 353 que o avô materno de (…) é pensionista do ISS, IP – CNP, auferindo a pensão por velhice de € 305,96. A Recorrente não demonstra que, para além disso, não exerça a atividade de construtor civil, que foi afirmada em sede de audiência pelo progenitor e que validamente alicerçou a convicção do Tribunal. Não se constatando que a 1.ª Instância incorreu em erro de julgamento quanto a tal factualidade, não cabe excluir a menção daquela atividade, sem prejuízo de se acolher os montantes pecuniários das pensões auferidas, conforme docs. de fls. 353 e 354.
Assim, o n.º 51 dos factos provados passa a contemplar a seguinte redação:
«51. O avô materno da (…), além de reformado (auferindo a pensão mensal de € 381,71), é construtor civil e a avó reformada (auferindo a pensão mensal de € 365,03).»
A recorrente considera existir erro de cálculo no cômputo global inserto no n.º 62 dos factos provados. O que, no entanto, não se verifica, atento o despacho de fls. 476 que implicou na retificação da sentença quanto à verba referente ao custo do gasóleo.
No n.º 71 dos factos provados consta que «O requerido despende em média cerca de € 300,00 com cada deslocação de avião que efetua entre Bruxelas e Portugal, mas dependendo da antecedência com que adquire o bilhete esse custo pode atingir valores superiores a € 500,00 (docs. fls. 138, 139, 330 e declarações do progenitor e da testemunha …).»
Quanto a esta matéria, a Recorrente invoca que os valores de € 300,00 não devem dar-se como provados, quer por o Recorrido ter junto apenas 2 bilhetes e não os bilhetes de todos os outros meses, quer por não se ter atentado nos documentos por si juntos relativos aos custos das viagens entre Faro e Bruxelas, com preços que oscilam entre os cerca de € 90,00 e os € 150,00. Mediante esta alegação, a Recorrente não revela que a 1.ª Instância tenha incorrido em erro de julgamento quando consigna o valor gasto, em média, pelo Recorrido; o que a Recorrente invoca é que existe a possibilidade de realizar aquelas viagens gastando quantia menor. O que assume relevância para a decisão da causa.
Assim, considerando que temos em mãos um processo de jurisdição voluntária, vai aditado o seguinte o rol dos factos provados:
71 a) - Cada deslocação de avião entre Bruxelas e Faro (ida e volta) pode ascender ao custo entre € 90,00 e € 150,00, preço que incluiu desconto limitado a 1 compra em cada três meses, por comprador, passageiro ou número de cartão bancário, contemplando tanto voos direitos como com escalas que chegam a implicar 15h30 min. de viagem, conforme consta de fls. 336 vs. e 345.

Da nulidade da sentença
O Recorrente apresentou-se a arguir a nulidade da sentença. Invoca, para tanto, que os factos provados sob os n.ºs 31 e 48 se baseiam exclusivamente nas declarações da Recorrida prestadas na audiência em que o Recorrente não esteve presente, sendo certo que o respetivo mandatário, apesar de presente, não tinha conhecimento dos factos, como referiu. Tendo o Recorrente sido ouvido posteriormente pelo Tribunal, certo é que não foi confrontado com esta questão, resultando violados os princípios consagrados nos arts. 3.º e 4.º do CPC.
Ora vejamos.
O regime das nulidades da sentença encontra-se estabelecido no art. 615.º do CPC. Nos termos do disposto no n.º 1 do referido preceito legal, «É nula a sentença quando:
a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.»

Os vícios processuais apontados pelo Recorrente (inobservância do disposto nos arts. 3 e 4 do CPC) consubstanciam antes nulidades processuais sujeitas ao regime inserto nos arts. 195.º e ss do CPC. O objeto de qualquer recurso não são nulidades processuais, mas antes decisões; a decisão é que é impugnada em sede de recurso e é a decisão que o Tribunal ad quem aprecia, confirmando ou revogando.
No entanto, casos há em que, por se encontrarem cobertas, ainda que de modo implícito, por decisão judicial, acabam por se projetar nela, por a inquinar, ferindo-a de nulidade[8] que consome a nulidade processual cometida, podendo então ser esgrimidas em sede do recurso interposto dessa decisão.[9] Efetivamente, «sempre que o juiz, ao proferir a decisão, se abstenha de apreciar uma situação irregular ou omita uma formalidade imposta por lei, o meio de reação da parte vencida passa pela interposição de recurso fundado na nulidade da decisão, por omissão de pronúncia, nos termos do art. 615.º, n.º 1, al. d).»
Ora, o Recorrente considera ter sido violado o princípio do contraditório e o princípio da igualdade das partes.
Constata-se, porém, que o montante da dívida do progenitor a título de alimentos a (…) constituía matéria factual sujeita a instrução, carreada para o processo pela progenitora desde logo nas alegações apresentadas a fls. 51 e ss. Por via disso, cada uma das partes poderia requerer diligências de prova em ordem a confirmar ou a infirmar o alegado, não recaindo sobre o Tribunal o dever de oficiosamente auscultar as partes quanto à realidade daquela alegação.
Como se alcança de fls. 91, teve lugar a audiência de julgamento, para a qual se tinha determinado a comparência dos pais para serem ouvidos (cfr. fls. 91). O ora Recorrente não compareceu, mas fez-se representar por ilustre mandatário (cfr. fls. 200). Da ata dessa audiência consta o seguinte: «De seguida foram efetuados os cálculos dos valores em dívida, tendo-se apurado cifrar-se o mesmo em € 1.265,19». O que foi reconduzido aos n.ºs 31 e 48 dos factos provados.
Mais se alcança da ata que o ilustre mandatário do requerido solicitou prazo para juntar documento relativo ao IRS do seu constituinte e para se pronunciar sobre a comparticipação nas despesas da viagem de (…) à China, não consta qualquer menção de oposição ao montante da dívida apurado.
Termos em que se conclui que os dados processuais sustentam o teor dos n.ºs 31 e 48 dos factos provados, inexistindo fundamento para afirmar a ocorrência da apontada nulidade e, consequentemente, para revogar o ponto n.º 7 do dispositivo da sentença.

Do fundamento para fixar o valor da prestação alimentícia a cargo do progenitor em € 200,00 ou antes em € 481,80
Tendo o Tribunal de 1.ª Instância fixado em € 332,71[10] o valor da prestação alimentícia a cargo do progenitor em favor de (…), que completou entretanto 18 anos de idade, pugna o Recorrente principal pela redução desse montante para € 200,00 e a Recorrente subordinada pelo aumento para € 481,80.
Na ótica do progenitor, o seu rendimento mensal líquido de € 3.162,00 é afeto à satisfação das suas necessidades que implicam na despesa média mensal de € 2.515,00, excluindo custos com saúde, lazer, vestuário e calçado; o rendimento disponível de € 647,00 não lhe permite afetar mais do que € 200,00 a título de alimentos devidos à sua filha Adriana. A satisfação das necessidades desta, no que excede € 200,00, devem ser providas pela progenitora, que aufere o rendimento mensal líquido de € 1.587,30 e suporta despesas no montante de € 546,50.
Já a progenitora invoca que ao rendimento mensal líquido do progenitor acresce a quantia mensal de € 100,00 a título de subsídio de transporte, e que são exorbitantes os custos alegados pelo progenitor, como é o caso de € 1.000,00 com a sua própria alimentação, ainda que se leve em consideração que reside em Bruxelas, onde o nível de vida é superior em 25% ao de Portugal, pagando € 860,00 de renda de casa.
Ora vejamos.
Nos termos do disposto no art. 36.º, n.º 5, da Constituição, os pais têm o direito e o dever de educação e manutenção dos filhos. Em consonância, o 1878.º, n.º 1, do CC estabelece que compete aos pais, no interesse dos filhos, velar pela segurança e saúde destes, prover ao seu sustento, dirigir a sua educação, representá-los, ainda que nascituros e administrar os seus bens. O dever de sustento, respeitando a tudo o que é indispensável ao sustento, habitação, vestuário, instrução e educação do menor (cfr. art. 2003.º do CC), mantém-se mesmo que o filho atinja a maioridade se não tiver ainda completado a sua formação profissional (cfr. art. 1880.º do CC).
E o dever de sustento não contende apenas com as despesas inerentes às necessidades básicas, inerentes à sobrevivência do indivíduo, mas respeita a tudo o que o menor precisa para usufruir de uma vida conforme à sua condição, às suas aptidões, estado de saúde e idade, tendo em vista a promoção do seu desenvolvimento intelectual, físico e emocional. Nas palavras de Vaz Serra alimentos «tudo o que é indispensável à satisfação das necessidades da vida segundo a situação social do alimentando, para o que bastará dar à palavra “sustento” um significado largo ou atribuir carácter exemplificativo ao disposto nos referidos artigos. O que é essencial é que o alimentando careça de alimentos para as necessidades da vida (…) de harmonia com a sua posição ou condição.»[11]
No que respeita à fixação do montante da prestação alimentícia a cargo dos progenitores, a jurisprudência emanada pelo Supremo Tribunal de Justiça aponta os seguintes vetores a considerar:
- o princípio constitucional da igualdade jurídica dos progenitores criou a obrigação de ambos concorrerem para o sustento dos filhos, proporcionalmente, aos seus rendimentos e proventos, e às necessidades e capacidade de trabalho do alimentando, de modo a assegurar, dentro das suas possibilidades e disponibilidades económicas, as condições de vida necessárias ao desenvolvimento dos filhos;[12]
- constituindo a prestação de alimentos, a cargo dos progenitores, simultaneamente, uma obrigação do progenitor e um direito subjetivo do filho, a determinação do seu quantitativo contende apenas com aquele valor que exceda o mínimo, estritamente, indispensável à sua subsistência, porquanto este, por imperativo ético e social inalienável, não suscetível de retórica argumentativa, não pode deixar de ser atribuído a qualquer ser humano, maxime, a um menor, sob pena de se tratar de uma realidade metafísica, a acentuar ainda mais a já débil fragilidade da garantia dos direitos pessoais familiares, e de não constituir um “poder-dever”;[13]
- a essencialidade de que se reveste para o interesse do menor a prestação alimentar impõe ao tribunal que lhe confira o necessário conteúdo, não se podendo dar, e ter, por satisfeita pela constatação da falta de elementos das condições económicas do progenitor requerido, particularmente se por ausência deste em parte incerta ou de colaboração sua;[14]
- a obrigação de alimentos é, igualmente, de interesse e ordem pública, de carácter indisponível, irrenunciável, intransmissível e impenhorável, constituindo preocupação do Estado que quem deles esteja carecido possa recorrer, desde logo, aos seus familiares;[15]
- a lei estabelece um dever de prestação (alimentar), ou seja uma obrigação legal, que decorre do estabelecimento de uma relação natural e biológica constituída e tutelada pelo direito, a relação paternal, e constitui uma obrigação (de prestação de alimentos) que não se compadece com a situação económica ou familiar de cada um dos progenitores mas, outrossim, atina com um dever irremovível e inderrogável de aqueles que deram vida a alguém terem, enquanto durar a incapacidade de eles angariarem sustento pelos seus próprios meios, proverem ao seu sustento, mediante uma prestação alimentar;[16]
- não merece acolhimento a tese de que não tendo o progenitor, considerado devedor da prestação alimentar, condições económicas para prover ou materializar o conteúdo do direito definido, se deva alienar o direito e aguardar por superveniência de um estado económico pessoal que lhe permita substanciar, neste plano fáctico-material, a exigência normativa que decorre da sua condição de progenitor e, pour cause, obrigado a contribuir para um dos segmentos em que se desdobra e completa a responsabilidade parental.[17]
Em sede doutrinal, os estudos de Remédio Marques apontam no sentido de que «os direitos-deveres dos progenitores para com os menores são sempre devidos independentemente dos seus recursos económicos e dos estados de carência económica dos filhos, posto que se trata de direitos cujo exercício é obrigatório e prioritário em atenção à pessoa e aos interesses do menor (…) não tem aplicação, nestas eventualidades, o disposto no art. 2004/1 do CC, de harmonia com o qual, e ao derredor do princípio da proporcionalidade, se deve atender às possibilidades económicas do devedor, para o efeito de fixar a obrigação de alimentos.»[18]
Impera, na verdade, o princípio da responsabilidade parental, princípio este com garantia constitucional e decorrente de instrumentos de tutela internacional, que impõe a fixação da prestação de alimentos e a respetiva exigibilidade ainda que o progenitor não aufira rendimentos ou aufira rendimentos escassos. Dada essa sua concreta qualidade, a de progenitor, que acarreta o inalienável e irrefutável dever de lhe competir prover ao sustento do seu filho, não lhe resta outra sorte ou incumbência premente que não seja diligenciar pela pronta obtenção de meios que sejam aptos ao cumprimento das responsabilidades parentais.
Em acórdão deste Tribunal[19] apontou-se que «Em sede de fixação de pensão de alimentos, há que ponderar que as necessidades dos filhos se sobrepõem à disponibilidade económica do progenitor devedor de alimentos, devendo este adequar as suas despesas aos seus rendimentos, pois, em face da situação de menoridade, a assunção da responsabilidade parental assuma uma importância prevalecente sobre os interesses patrimoniais de cada um dos pais.
Embora seja de salientar que não se deve exigir ao obrigado a alimentos que, para os prestar, ponha em perigo a sua própria manutenção de acordo com a sua condição, exigindo-se aqui, igualmente, a salvaguarda ao seu direito fundamental a uma sobrevivência com um mínimo de dignidade e a compatibilização efetiva deste com o dever de sustento dos filhos.»
No caso em apreço, revela-se adequado o montante da prestação alimentícia a cargo do progenitor fixado em 1.ª Instância.
O nível de rendimentos auferido pelo progenitor sustentam e legitimam a determinação de afetação de € 332,71, atualizável anual e automaticamente, em favor da sua filha (…). Se, porventura, o cumprimento da sua obrigação alimentar nestes moldes implica na compressão de despesas que vem fazendo consigo mesmo, pois caber-lhe-á fazê-lo, adequando os seus gastos à primordial e imperiosa obrigação de prover o sustento da sua filha.
No entanto, atento o enquadramento circunstancial atinente às condições de vida da (…), que, juntamente com a progenitora, beneficia do apoio decorrente da disponibilidade de habitação por parte dos avós maternos, junto de quem tomam maioritariamente as suas refeições, afigura-se inexistir fundamento para fixação alimentícia de montante superior.
Secundamos, na verdade, as considerações tecidas na sentença proferida em 1.ª Instância.
«Segundo a progenitora, a filha carece de quantia na ordem dos € 1.000,00 por mês para manter o nível de vida que detinha enquanto os progenitores se encontravam casados, embora frequente uma escola pública e enquanto ela própria (requerente) gastará consigo cerca de € 550,00 por mês.
(…)
Não se considera, pois, nem equitativo, nem equilibrado, nem de acordo com o correto exercício das responsabilidades parentais, exaurir os rendimentos do pai e da mãe, para satisfazer as despesas com a filha, que não são comportáveis com os rendimentos daqueles, e só possíveis, de acordo com as regras da experiência e os factos apurados, por virtude de existirem despesas significativas, como a alimentação da filha e outras dádivas, garantidas pelo apoio dos progenitores da mãe.
(…)
Da prova realizada conclui-se que a mãe, juntamente com o apoio prestado pelos seus próprios pais, proporcionou um nível de vida à filha superior às suas próprias forças e, sem que, inclusive como a própria afirmou, o pai contribuísse para esse efeito.
Consideram-se extravagantes e excessivos os gastos apresentados pela jovem que mantém um estilo de vida superior ao dos próprios pais e que despende mensalmente um montante muito acima do salário mínimo nacional (cerca de € 1.000,00 mensais a que acrescem despesas de saúde educação e extracurriculares), apesar de frequentar uma escola pública.
Entende este Tribunal que a jovem foi habituada pela mãe, como filha única, a ter um nível de vida muito superior ao que os pais poderiam e deveriam proporcionar, e que tal se verificou face ao apoio dos avós maternos que para além de fornecerem a título gratuito uma habitação também forneciam alimentação à filha e à neta.
Considera-se, assim, que o requerido não tem de suportar as despesas da filha, que vão para além das possibilidades dos progenitores, independentemente de outros benefícios que ela tivesse tido e extrínsecos aos rendimentos dos pais.»
É o que aqui se reitera, improcedendo, nesta matéria, quer o recurso independente quer o recurso subordinado.

Do fundamento para alterar a comparticipação dos progenitores nas despesas extra, passando a cifrar-se em 1/3 a participação do progenitor e em 2/3 a participação da progenitora
Na ótica do Recorrente, os n.ºs 4 a 6 do dispositivo da sentença devem ser alterados invertendo-se o montante de comparticipação a cargo de cada um dos progenitores, invocando que tal se impõe por o seu rendimento disponível ascender a € 647,00 e o da Recorrida a € 1.587,30, considerando que recebe do Estado Belga o abono de família de € 118,00.
Ao que se opõe a Recorrida, salientando que ao vencimento mensal do Recorrente acresce a quantia de € 100,00 para transportes, sendo que, excecionando a despesas com a renda de casa, são equivalentes as despesas que cada progenitor tem que suportar. Ora, retirando-se € 860,00 ao rendimento mensal do Recorrente, resta a quantia de € 2.402,00, montante bem superior ao seu rendimento disponível de € 1.533,00, quantias com que cada um deles deverá prover o respetivo sustento. Justifica-se, no seu entender, a proporcionalidade fixada em 1.ª Instância.
Está em causa a medida de comparticipação de cada progenitor nas despesas médicas, medicamentosas e escolares (livros, material escolar e explicações) da filha na parte não comparticipada, as despesas com as consultas de psicologia e com a participação da filha em atividades extracurriculares, caso ambos os progenitores se encontrem de acordo quanto a essa participação.
Ora, se por um lado, o progenitor dispõe de rendimento de montante superior ao da progenitora, por outro lado é sabido que se depara com nível de vida mais dispendioso do que aquele que nos deparamos em Portugal. Acresce que importa que o progenitor disponha de recursos que lhe permitam deslocar-se a Portugal, desde logo dado o superior interesse em manter contactos direitos e convívios com a filha (…), em benefício psicológico, afetivo e emocional desta. Mais há que ponderar que a progenitora encontra apoio nos seus pais, nomeadamente no que respeita às refeições diárias.
Tudo ponderado, afigura-se adequado e equitativo fixar a comparticipação de cada um dos progenitores nas mencionadas despesas na proporção de metade.
Procede, em parte, a pretensão deduzida pelo Recorrente principal.

Da litigância de má-fé por parte por parte do Requerido
A Recorrente sustenta que o Recorrido deve ser condenado por litigância de má-fé por ter alterado a verdade dos factos, o que se alcança do confronto do que deixou exarado no processo com o ter dos n.ºs 31, 43 a 48 e 83 dos factos provados.
Nos termos do n.º 1 do art. 542.º do CPC, tendo litigado de má-fé, a parte será condenada em multa e numa indemnização à parte contrária, se esta pedir. Em face do disposto no n.º 2 do citado preceito, a litigância de má-fé, desde que revestida de dolo ou negligência grave, pode ser considerada sob dois aspetos:
- a má-fé material, que abrange os casos de dedução de pretensão ou de oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar, a alteração da verdade dos factos ou a omissão de factos relevantes para a decisão da causa;
- a má-fé instrumental, relativa à omissão grave do dever de cooperação, ao uso manifestamente reprovável do processo ou dos meios processuais para conseguir um objetivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, para entorpecer a ação da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.
Como ensina Abrantes Geraldes[20], as partes devem estar cientes de que, no âmbito da resolução de conflitos de direito privado, devem pautar-se pelas regras da cooperação intersubjetiva, pela lealdade e pela boa-fé processual. A lei, porém, não pede a nenhuma das partes que se entregue, sem luta. Por isso, a todas é garantida a possibilidade de fazerem vingar as respetivas posições, desde que estejam convencidas da sua legitimidade, mesmo que assentem em normas jurídicas objetivamente injustas, ou desde que não sejam excedidos certos limites para além dos quais se considera ilegítimo o exercício dos direitos processuais. Comportamentos dolosos ou gravemente culposos, materializados na dedução de pretensões ou de oposições manifestamente infundadas, assentes na alteração censurável da verdade dos factos, corporizados na grave violação do dever de cooperação ou, por fim, exteriorizados através do uso ilegítimo de instrumentos do direito adjetivo, com vista à obtenção de objetivos ilegais, à ocultação da verdade ou ao entorpecimento ou retardamento da atividade dos tribunais, são considerados ilícitos e, por isso, merecedores de sanções de natureza cível, independentemente do resultado final da ação ou da execução.
Ora, o citado art. 542.º do CPC, ao referir o dolo ou negligência grave como tipificadores da litigância de má-fé, “passou a sancionar, ao lado da litigância dolosa, a litigância temerária: quer o dolo, quer a negligência grave, caracterizam hoje a litigância de má-fé, com o intuito, como se lê no preâmbulo do diploma, de atingir uma maior responsabilização das partes.”[21] Assim, pode dizer-se que “a má-fé psicológica, o propósito de fraude, exige, no mínimo, uma atuação com conhecimento ou consciência do possível prejuízo do ato; tal conhecimento ou consciência pode corresponder quer a dolo eventual quer a negligência consciente e, neste último quadro, aquela consciência pode reportar-se a uma simples previsão do prejuízo resultante do ato, nada se fazendo para o evitar, isto é, mesmo assim pratica-se o ato que se tem como potencialmente lesante.”[22]
Afirmada que seja a litigância de má-fé, sujeita-se a parte à condenação em multa bem como ao pagamento de indemnização à parte contrária, se tiver sido pedida. Os montantes da condenação do litigante de má-fé têm que corresponder, por um lado, ao grau de culpa do litigante e à maior ou menor censurabilidade do comportamento que adotou, acrescendo, no que concerne à indemnização, que ela deve corresponder ao reembolso das despesas a que a má-fé do litigante tenha obrigado a parte contrária, incluindo os honorários do mandatário, e na satisfação dos restantes prejuízos sofridos pela parte contrária como consequência direta ou indireta da má-fé – art. 543.º do CPC. Sendo que na avaliação e graduação da culpa atender-se-á à diligência do bom pai de família mas atendendo às circunstâncias do caso. Uma vez que a má-fé se traduz na violação do dever de probidade que o art. 8.º do CPC impõe às partes (dever de não formular pedidos injustos, não articular factos contrários à verdade e não requerer diligências meramente dilatórias), é pela intensidade da violação deste dever de probidade que se há de sancionar, através da aplicação da multa, a conduta do litigante de má-fé. A indemnização, se tiver sido pedida, será arbitrada por aplicação de um prudente arbítrio, assente num critério de razoabilidade que deve ter em consideração, sobretudo, a natureza e a complexidade da causa, bem como a dimensão do comportamento processual indevido.[23]
No caso sub judice, a pretendida condenação por litigância de má-fé contende com a vertente material do instituto, já que é apontado ao Requerido que sempre negou estarem em dívida quantias a título de prestação de alimentos.[24]
Efetivamente, nas alegações apresentadas a 02/11/2017, o Requerido afirma que sempre contribuiu para a alimentação, vestuário e outras necessidades da filha (cfr. fls. 83) e que não tem qualquer valor em dívida e, relação à pensão de alimentos (cfr. fls. 83 vs.). Veio, contudo, apurar-se que, a 10/05/2018, o valor em dívida por parte do progenitor, a título de comparticipação nas despesas era de € 1.265,19. Montante que decorre das despesas cujo pagamento a Requerente vinha reclamando do Requerido desde 02/07/2017, na sequência do regime provisório estabelecido quanto ao exercício das responsabilidades parentais por decisão de 09/06/2017 – cfr. fls. 25 e n.ºs 43 a 48 dos factos provados. O Requerido não observou o cumprimento integral das suas obrigações decorrentes desse regime e faltou efetivamente à verdade ao afirmar que não ter qualquer valor em dívida em relação à prestação e alimentos.
Perante tal circunstancialismo factual, é manifesto que a conduta processual dos opoentes se revestiu de dolo, implicando na condenação em multa por litigância de má-fé à luz do disposto no art. 542.º, n.ºs 1 e 2, als. a) e b), do CPC.
Uma vez que, em caso de condenação por litigância de má-fé, o montante da multa se cifra entre 2 UC e 100 UC (cfr. art. 27.º, n.º 3, do RCP), afigura-se adequado condenar o Requerido na multa de 4 (quatro) UC.
No que respeita à indemnização à parte contrária, que visa o reembolso das despesas já elencadas supra, importa notar que, neste caso concreto, a referido conduta processual do Requerido não acarretou despesas acrescidas para a Requerida, seja com honorários ao mandatário ou outras; na verdade, as despesas com o processo são inerentes ao regular processamento da lide, cujo desenvolvimento não foi causado pelas mencionadas afirmações do Requerido quanto aos montantes em dívida a título de alimentos à filha (…), mas antes pela não conversão do regime provisório relativo ao exercício das responsabilidades parentais em definitivo, auscultadas que foram as partes, por mais do que uma vez, nesse sentido e para esse fim.

Termos em se conclui pela parcial procedência do recurso principal e pela procedência do recurso subordinado no que respeita à condenação por litigância de má-fé e, em parte, no que respeita à impugnação da decisão relativa à matéria de facto, embora sem repercussão na decisão da causa.
Assim, as custas do recurso principal serão suportadas na proporção de ¾ pelo Recorrente e de ¼ pela Recorrida; as custas no recurso subordinado serão suportadas na proporção de 5/6 pela Recorrente e de 1/6 pelo Recorrido – art. 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC.

Concluindo:
(…)

IV – DECISÃO

Nestes termos, decide-se pela parcial procedência do recurso principal e pela procedência do recurso subordinado tão só no que respeita à condenação por litigância de má-fé e, parcialmente, à impugnação da decisão relativa à matéria de facto[25], em consequência do que:
- revoga-se a decisão recorrida no que tange à proporção da comparticipação dos progenitores nas despesas elencadas nos n.ºs 4 a 6 do dispositivo da sentença, fixando-se essa proporção em ½ para cada um dos progenitores;
- condena-se o Requerido (…) por litigância de má-fé no pagamento de multa de 4 (quatro UC),
Mantendo-se, no mais, o decidido em 1.ª Instância.

As custas do recurso principal serão suportadas na proporção de ¾ pelo Recorrente e de ¼ pela Recorrida; as custas no recurso subordinado serão suportadas na proporção de 5/6 pela Recorrente e de 1/6 pelo Recorrido.
Évora, 26 de Setembro de 2019
Isabel de Matos Peixoto Imaginário
Maria Domingas Simões
Vítor Sequinho dos Santos
__________________________________________________
[1] Cfr. Acs. TRC de 18/11/2014 (Teles Pereira); TRP de 21/11/2016 (Manuel Domingos Fernandes), entre outros.
[2] Cfr. João Espírito Santo, O Documento Superveniente para efeito de recurso ordinário e extraordinário, p. 47.
[3] Cfr. Ac. STJ de 15/06/2004 (Luís Fonseca); Ac. TRP de 08/03/2019 (Filipe Caroço).
[4] Cfr. fls. 359 e ss.
[5] Ac. TRE de 12/07/2018, proc. n.º 7495/15.6T8STB.E1 (Vítor Sequinho dos Santos).
[6] Cfr. arts. 3.º al. c) e 12.º do RGPTC aprovado pela Lei n.º 141/2015, de 8 de Setembro.
[7] Cfr. arts. 986.º e ss do CPC.
[8] Cfr. Ac. STJ de 22/02/2017.
[9] Cfr. Acs. entre outros, TRL de 11/01/2011, STJ de 13/01/2005, TRP de 18/06/2007, TRE de 10/04/2014.
[10] Quantia atualizada decorrente da fixada provisoriamente em € 325,00 a 09/06/2017 – cfr. fls. 25 e ss.
[11] RLJ ano 102 (1969-1970), n.º 3398, pág. 262.
[12] Ac. STJ de 12/07/2011.
[13] Ac. citado na nota que antecede.
[14] Ac. STJ de 27/09/2011.
[15] Ac. citado na nota que antecede.
[16] Ac. STJ de 22/05/2013.
[17] Acórdão citado na nota que antecede.
[18] Ob. cit., p. 72 e 73.
[19] Ac. TRE de 13/07/2017, relatado por Tomé de Carvalho, subscrito pela ora relatora.
[20] E seguindo de perto o que deixa exposto in Temas Judiciários, I vol., p. 303 e ss.
[21] José Lebre de Freitas, A. Montalvão Machado e Rui Pinto, in “Código de Processo Civil Anotado”, vol. 2.º, Coimbra, 2001, pág. 195.
[22] Ac. STJ de 06/01/2000 (Lúcio Teixeira).
[23] Ac. STJ de 30/09/2004 (Araújo de Barros).
[24] No âmbito deste litígio não assume relevância a questão atinente à entrega dos botões de punho e do fio de ouro.
[25] N.ºs 28, 71 e 71, a), dos factos provados.