Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
7/14.0GDSTC.E1
Relator: ANA BARATA BRITO
Descritores: DECLARAÇÕES INCRIMINATÓRIAS DE CO-ARGUIDO
PROVA CORROBORANTE
Data do Acordão: 11/15/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PROVIDO UM DOS RECURSOS.
Sumário:
I - As declarações incriminatórias de co-arguido constituem prova permitida, e podem valer contra o arguido bastando que este tenha a possibilidade de as poder contraditar em julgamento.

II - Questão diferente da legalidade da prova por co-arguição é a sua credibilidade: as declarações de co-arguido, embora sujeitas a livre apreciação, requerem uma verificação especial que contribua para uma “mais correcta realização da livre convicção”, que tenderá a passar por uma “procura de corroboração”.

III - As declarações incriminatórias de co-arguido revelam-se concretamente insuficientes para fundamentar a prova dos factos da acusação num caso em que, sendo impossível dissociar o interesse pessoal do co-arguido na incriminação do arguido, pois a própria lei prevê a premiação do agente que contribua para “a identificação ou a captura de outros responsáveis”, essas declarações incriminatórias se encontram absolutamente desacompanhadas de um mínimo elemento de prova corroborante. [1]
Decisão Texto Integral:
Acordam na Secção Criminal:

1. No Processo comum colectivo n.º 7/14.0GDSTC, da Comarca de Setúbal, foi proferido acórdão em que se decidiu, entre outros, condenar:

A., como autor de um crime de furto simples do art. 203º do CP (Toyota Hilux), na pena de um (1) ano e três (3) meses de prisão; de quatro crimes de furto qualificado dos arts. 203º, nº 1, e 204º, nº 2, e), do CP nas penas respetivamente de três (3) anos e oito (8) meses de prisão (Café Campos), quatro (4) anos e seis (6) meses de prisão (Ourivesaria), dois (2) anos e seis (6) meses de prisão (Monte da Barragem), de dois (2) anos e oito (8) meses de prisão (residência de MV); de um crime de roubo simples, na forma tentada, dos arts. 210º, nºs 1 do CP, na pena de três (3) anos de prisão; de um crime de detenção de arma proibida, do art. 86º, nº 1, c), por referência aos arts. 2º, nº 1, p) e s), 3º, nºs 1 e 6, a), 8º e 15º, do RJAM, na pena de um (1) ano e seis (6) meses de prisão; de três crimes de condução de veículo automóvel sem habilitação legal, do art. 3º, nºs 1 e 2 do DL nº 2/98, de 02-01, na pena, para cada um deles, de oito (8) meses de prisão; de um crime de tráfico de estupefacientes, do art. 21º e do DL 15/93, de 22-01, na pena de seis (6) anos e seis (6) meses de prisão, de tudo o mais que lhe vinha imputado, se absolvendo. Em cúmulo de penas parcelares, foi o arguido condenado na pena única de doze (12) anos de prisão.

B, como autor de um crime de tráfico de estupefacientes, do art. 21º do DL 15/93, de 22-01, na pena de sete (7) anos de prisão, de tudo o mais que lhe vinha imputado o absolvendo.

D, como co-autor de um crime de furto simples do art. 203º do CP (Toyota Hilux) na pena de um (1) ano prisão; de três crimes de furto qualificado dos arts. 203º, nº 1, e 204º, nº 2, e), do CP, nas penas respetivamente de três (3) anos e quatro (4) meses de prisão (Café Campos), três (3) anos e oito (8) meses de prisão (Ourivesaria), dois (2) anos e quatro (4) meses de prisão (Monte da Barragem), de um crime de roubo simples tentado, do art. 210º, nºs 1 do C.P, na pena de quatro (4) anos de prisão. Em cúmulo de penas parcelares, foi o arguido condenado na pena única de sete (7) anos de prisão.

Inconformados, recorreram estes três arguidos pela ordem que segue, concluindo:

D:
“1ª - A prova produzida que conduz á condenação do recorrente não suporta a matéria de facto provada, é insuficiente para tal, por errada valoração e credibilidade que o Tribunal a quo atribui às declarações da co-arguida J. evidenciando-se erros de direito na produção da prova e o uso inadequado e distorcido do princípio da livre apreciação da prova quando se alicerça a condenação do recorrente exclusivamente em tais declarações da co-arguida.

2ª – Nessa senda, o arguido não se conforma com a condenação pelos crimes de furto simples, p. e p. pelo artº 203º do C.P. (Toyota Hilux) na pena de um (1) ano de prisão; e de três crimes de furto qualificado, p. e p. pelos artºs 203º nº 1, 204º nº 2, e) do C.P., nas penas respectivamente de três (3) anos e quatro (4) meses de prisão (Café Campos), três (3) anos e oito (8) meses de prisão (Ourivesaria) dois (2) anos e quatro (4) meses de prisão (Monte da Barragem)

3ª - Insurgindo-se ainda contra a aplicação da pena de quatro (4) anos de prisão pela prática de um crime de roubo simples, na forma tentada, p. e p. pelos artºs 210º nº 1 do C.P.

4ª - E, ainda que viesse a ser condenado por todos os imputados crimes, em nenhuma circunstância aceita que a pena única, decorrente do cúmulo das penas parcelares, excessivas e desadequadas, exceda 5 anos de prisão, cuja execução deverá ficar suspensa.

5ª - O limite mínimo da pena única de prisão aplicável ao recorrente, por respeito ao disposto nos artºs 77º e 78º do C.P., segundo o juízo do Tribunal a quo é de 4 anos de prisão, por corresponder à mais elevada das penas concretamente aplicáveis aos vários crimes (um crime de roubo simples, na forma tentada, p. e p. pelos artºs 210º nº 1 do C.P.) e não de 4 anos e seis meses como se fixou.

6ª - Quanto à condenação pela prática dos crimes de furto simples, p. e p. pelo artº 203º do C.P. (Toyota Hilux) na pena de um (1) ano de prisão; de três crimes de furto qualificado, p. e p. pelos artºs 203º nº 1, 204º nº 2, e) do C.P., nas penas respectivamente de três (3) anos e quatro (4) meses de prisão (Café Campos), três (3) anos e oito (8) meses de prisão (Ourivesaria) dois (2) anos e quatro (4) meses de prisão (Monte da Barragem).

Sustenta-se a decisão nos factos dados como provados em 1) a 20) (situações I e II), 41) a 44) (situação IV), 74), 75) e 76) – II - Da fundamentação – 2.1. Os Factos Provados.

7ª - Prova escorada, no que ao recorrente diz respeito, exclusivamente nas declarações da co-arguida J. e que nessa óptica justificam a reponderação por este Tribunal superior.

8ª - Fundamentação que o teor do Acórdão evidencia até à exaustão. As declarações da co-arguida J. António mereceram inteira e inabalável fé ao julgador.

9ª - As vantagens oferecidas à co-arguida J. durante a fase de inquérito e o tratamento benevolente que lhe foi sendo garantido por todas as autoridades judiciárias até á fase de julgamento, caso falasse, como declarou, teria necessária e criteriosamente que ser sopesado pelo Tribunal a quo.

10ª - Contudo, injustamente, a fiabilidade dessas circunstâncias incentivadoras ao discurso da co-arguida J. não foram sequer consideradas.

11ª - A arguida declarou o que viu, o que ouviu, o que lhe contaram e o que admitiu ou podia ter visto mesmo quando nada presenciou ou nem sequer se encontrava no local aquando dos factos que relatou (maxime no furto da Ourivesaria).

12ª - E ainda no que foi induzida a discorrer sempre com uma mal disfarçada encenação de arrependimento contando em contrapartida com a prometida benevolência da decisão final.

13ª - Em depoimento caracterizado por um discurso ziguezagueante, fantasioso, ao ritmo e sabor das conveniências da acusação mas sempre com a mira apontada a um tratamento penal favorável que quis justificar e convencer o Tribunal que merecia.

14ª – As declarações da co-arguida que se revestem de carácter fundamental e decisivo para incriminar e condenar o recorrente teria inapelavelmente que ser submetido a um crivo mais rigoroso e apertado.

15ª - E ser, ainda que indiciariamente, corroborado por outros meios de prova.

16ª - Porém, relativamente ao co-arguido D. não se alcançam os demais meios de prova produzidos em que se suportam as declarações da co-arguida J.

17ª - E não se alcançam nem a decisão em crise os evidencia porque não foram produzidos.

18ª - As declarações da co-arguida J. não têm, no que ao recorrente diz respeito, suporte nos demais meios de prova porque não existem.

19ª - Assim sendo o recorrente vem condenado pela prática dos crimes de

- furto simples, p. e p. pelo artº 203º do C.P. (Toyota Hilux) na pena de um (1) ano de prisão ; e de três crimes de furto qualificado, p. e p. pelos artºs 203º nº 1, 204º nº 2, e) do C.P., nas penas respectivamente de três (3) anos e quatro (4) meses de prisão (Café Campos), três (3) anos e oito (8) meses de prisão (Ourivesaria) dois (2) anos e quatro (4) meses de prisão (Monte da Barragem) exclusivamente com base nas declarações da arguida J.

20ª - O que de forma manifesta o texto da decisão em crise abraça e evidencia socorrendo-se para o fundamentar no princípio da livre apreciação da prova.

21ª - Perfilhamos a tese, propugnada por importante parte da Doutrina e da Jurisprudência que se justifica uma especial prudência no aproveitamento da informação prestada por um co-arguido, sobretudo para fins da decisão de condenação de outro ou outros e por regra essas declarações só devem ser valoradas quando estejam escoradas com outros elementos de prova

22ª - Admitimos ser incontroverso na Doutrina e na Jurisprudência que nada impede que um arguido preste declarações sobre factos de que possua conhecimento directo, tanto sobre os factos que só a ele digam respeito, como sobre os factos que também respeitem a outros arguidos.

23ª - E também não há qualquer limitação ao exercício do direito de livre apreciação da prova resultante das declarações do arguido.

24ª - Assim sendo, também entendemos que não há qualquer impedimento do arguido depor nessa qualidade contra os co-arguidos do mesmo processo e, consequentemente, de se valorar a prova feita por um arguido contra os seus co-arguidos.

25ª - Na senda dos ensinamentos do Prof. Marques Ferreira, in “Jornadas de Direito Processual Penal – CEJ”, a pág. 249, ao esclarecer que as declarações sobre o objecto do processo prestadas por um arguido constituem um meio de prova a apreciar livremente pelo tribunal, de acordo com o disposto no art.º 127.º (no mesmo sentido, Germano Marques da Silva, “Processo Penal”, 2002, III-191-192).

26ª - Tal princípio significa afirmar que o julgador é livre, ao apreciar as provas, embora tal apreciação seja “vinculada aos princípios em que se consubstancia o direito probatório e às normas da experiência comum, da lógica, regras de natureza científica que se devem incluir no âmbito do direito probatório” (Prof. Cavaleiro Ferreira, em Curso de Processo Penal, 1986, 1° vol., pg. 211).

27ª - É pacífico o entendimento que a apreciação livre da prova não pode ser confundida com a apreciação arbitrária da prova nem com a mera dúvida gerada no espírito do julgador pelos diversos meios de prova.

29ª - Trata-se da liberdade de decidir segundo o bom senso e a experiência da vida, temperados pela capacidade crítica de distanciamento e ponderação, ou no dizer do Prof. Castanheira Neves da “liberdade para a objetividade”.

30ª - Na esteira deste entendimento, salienta o Prof. Figueiredo Dias “a liberdade de apreciação da prova é uma liberdade de acordo com um dever - o dever de perseguir a verdade material - de tal sorte que a apreciação há-de ser, em concreto, recondutível a critérios objetivos e, portanto, em geral susceptível de motivação e controlo”. (Direito Processual Penal I, 202.)

31ª - É na audiência de julgamento que tal princípio assume especial relevo, tendo, porém, que ser sempre motivada e fundamentada a forma como foi adquirida certa convicção, impondo-se ao julgador o dever de dar a conhecer o seu suporte racional, o que resulta do art. 374° n° 2 do Código de Processo Penal.

32ª - Assim, a livre convicção não pode confundir-se com a íntima convicção do julgador, impondo-lhe a lei que extraia das provas um convencimento lógico e motivado, avaliadas as provas com sentido da responsabilidade e bom senso.

33ª - Porque assim é as declarações do co-arguido só podem fundamentar a prova de um facto criminalmente relevante quando existe alguma prova adicional a tornar provável que a história do co-arguido é verdadeira e que é razoavelmente seguro decidir com base nas suas declarações.

34ª - A apontada exigência de corroboração significa que as declarações dos co-arguidos nunca podem, só por si, e por mais inequívocas e credíveis que sejam, suportar a prova de um facto criminalmente relevante.

35ª - Exige-se para tanto que as declarações sejam confirmadas por outro autónomo contributo que “fale” no mesmo sentido, em abono daquele facto.

36ª - Na esteira deste entendimento que se perfilha viola o princípio da presunção da inocência a fundamentação exclusiva da condenação na valoração do depoimento do co-arguido (Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 12-7-2006 e 7-12-2005, na Colectânea de Jurisprudência dos acórdãos daquele tribunal, respectivamente de 2006, II-241 e de 2005, III-227).

37ª - É pois necessária uma corroboração probatória das declarações da co-arguida J.

38ª - O que in casu quanto ao recorrente falece em absoluto.

39ª - Nesta senda, não tendo o depoimento de J. sido corroborado por outras provas, no que ao recorrente diz respeito, a sua credibilidade é nula.

40ª - É inquestionável que o tribunal “a quo” para fundamentar o juízo condenatório do co-arguido D. se escorou exclusivamente nas declarações da arguida J, como, aliás, declara e enfatiza quando explicita o porquê da decisão e o processo lógico-mental que serviu de suporte ao respectivo conteúdo decisório.

41ª - E nesta medida subsistem fundadas razões para questionar o acerto da decisão em matéria de facto.

42ª - O acórdão recorrido ao fundamentar quanto à apreciação crítica que fez da prova produzida no que respeita ao co-arguido D assenta a sua convicção exclusivamente na factualidade relatada pela arguida J.

43ª - A prova produzida que se materializa nos factos provados de 1) a 20) (situações I e II), 41) a 44) (situação IV), 74), 75) e 76) alicerçada exclusivamente nas declarações da arguida J. é manifestamente insuficiente e dúbia não podendo servir de alicerce aos factos julgados provados pelo Tribunal "a quo", pelo que, consequentemente, o recorrente não deve ser condenado pela prática dos crimes de furto simples, p. e p. pelo artº 203º do C.P. (Toyota Hilux) e de três crimes de furto qualificado (Café Campos, Ourivesaria e Monte da Barragem), p. e p. pelos artºs 203º nº 1, 204º nº 2, e) do C.P.

44ª - Sendo inquestionável que nos termos do disposto no art° 127° do C.P.P., a regra é a de que a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente.

45ª - Porém, tal significa, basicamente, uma ausência de critérios legais que predeterminem ou hierarquizem o valor dos diversos meios de prova (Prof. Figueiredo Dias, in "Direito Processual Penal", I Vol. 1974, págs. 202 e segs.).

46ª - Aliás, "a livre convicção do julgador não pode significar, nem significa, a substituição da certeza objectiva como finalidade da prova, por uma convicção subjectiva, incondicionada, e desligada de regras legais, de regras de lógica baseadas na experiência, que formam o conteúdo de um direito probatório substantivo" (Prof. Manuel Cavaleiro de Ferreira, in "Curso de Processo Penal", Vol. Io, Lisboa 1986, pág. 204 a 205).

47ª - Deverão assim ser dados como não provados os factos imputados ao co-arguido D. elencados de 1) a 20) (situações I e II), 41) a 44) (situação IV), 74), 75) e 76) – Fundamentação – Dos factos provados - que determinam a condenação do recorrente pelos crimes deles decorrentes por se revelarem suportados exclusivamente nas declarações da co-arguida J.

48ª - Quanto à aplicação da pena de quatro (4) anos de prisão pela prática de um crime de roubo simples, na forma tentada, p. e p. pelos artºs 210º nº 1 do C.P., arrimada nos factos descritos de 21 a 40 dos factos provados (situação III) que o recorrente não impugna por corresponderem na essencialidade á verdade dos factos, a medida da pena concretamente determinada é contudo excessiva e desproporcionada.

49ª - Entende o Tribunal a quo, sem motivo para reparo que à prática do indicado crime de roubo, na forma simples e tentada, cabe pena de prisão de 1 mês a cinco anos e 4 meses.

50ª - Quanto às condições pessoais, sociais e familiares do recorrente o que vem plasmado nos factos pessoais e antecedentes criminais de 140) a 161) (por lapso indicado no Acórdão com o nº 170) é revelador que não se mostram incisivas as exigências de prevenção especial.

51ª - Estes são factos que importa ter em conta, relacionados com o percurso de vida familiar e profissional e interacção social, aos quais há que acrescentar as circunstâncias dos factos relacionados com os crimes porque foi condenado e a culpa com que actuou.

52ª - Ora a culpa constitui o limite máximo inultrapassável da pena, enquanto a prevenção geral de reintegração fornecerá uma moldura de prevenção dentro da moldura legal, acabando a pena concreta por ser encontrada, dentro destes limites, de acordo com as exigências da prevenção especial de ressocialização.

53ª - As finalidades da aplicação de uma pena residem primordialmente na tutela dos bens jurídicos e, na medida do possível, na reinserção do agente na comunidade.

54ª - A fórmula impositiva do art. 40.º do C.P. determina, por isso, que os critérios do art. 71.º e os diversos elementos de construção da medida da pena que prevê sejam interpretados e aplicados em correspondência com o programa assumido na disposição sobre as finalidades da punição.

55ª - Na determinação da medida concreta da pena, o tribunal está vinculado, nos termos do art. 71.º do C.P., a critérios definidos em função de exigências de prevenção, limitadas pela culpa do agente.

56ª - Salvo o merecido respeito e melhor opinião, afigura-se-nos que o tribunal “a quo” não sopesou de forma criteriosa as circunstâncias apuradas e relevantes nesta sede, sendo desajustada e desproporcionada a pena de quatro (4) anos de prisão, a qual ultrapassa de forma inusitada e excessiva a medida da culpa do arguido e as exigências reclamadas pela prevenção, pelo que consequentemente deve ser reduzida.

57ª - O arguido confessou a participação nestes factos, mostrou-se arrependido e é primário, mostrando-se inserido familiar e socialmente.

58ª - Ponderada a ilicitude global do facto, a culpa do recorrente e as exigências de prevenção requeridas, uma pena que fique ligeiramente abaixo do ponto médio da moldura penal abstracta aplicável, ainda realizará, de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição, considerando-se mais adequada e justa ao caso concreto e à medida da culpa do arguido, a pena de 2 anos e 6 meses de prisão.

59ª - Por respeito a igual raciocínio e entendimento, ainda que se venha a confirmar, o que, sem conceder, por mera cautela e hipótese se configura, a condenação do recorrente pela prática dos crimes de furto simples, p. e p. pelo artº 203º do C.P. (Toyota Hilux) e de três crimes de furto qualificado, p. e p. pelos artºs 203º nº 1, 204º nº 2, e) do C.P. as penas parcelares aplicadas devem ser substancialmente reduzidas, por excessivas e desproporcionadas.

60ª - Assim, em caso de eventual condenação, por se afigurarem justas e adequadas, as penas parcelares a aplicar concretamente deveriam cingir-se para o crime de furto simples, p. e p. pelo artº 203º do C.P. (Toyota Hilux) na pena de 10 meses de prisão, enquanto para os três crimes de furto qualificado, p. e p. pelos artºs 203º nº 1, 204º nº 2, e) do C.P., nas penas respectivamente de 2 (2) anos e quatro (4) meses de prisão (Café Campos), dois (2) anos e seis (6) meses de prisão (Ourivesaria) e um (1) ano e quatro (4) meses de prisão (Monte da Barragem).

61ª - Decorrentemente, justifica-se que a pena única dentro da moldura abstracta indicada na decisão recorrida, seja substituída considerando o intervalo de 2 anos e 6 meses (a mais elevada das penas parcelares) a 9 anos e seis meses de prisão (a soma das penas parcelares concretamente aplicadas aos diversos crimes), sendo reduzida para 5 anos de prisão.

62ª - Fixada que seja pena única em 5 anos de prisão, como se tem por justo e adequado, impõe-se ponderar a aplicação do disposto no nº 1 do art. 50º do C. Penal, que estabelece que “o tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 5 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.

63ª - De acordo, com os factos pessoais e antecedentes criminais apurados no que respeita ao arguido (140 a 161 do Acórdão) afigura-se ser justificado fazer um juízo de prognose acerca do comportamento futuro do arguido e, se concluir que se pode esperar que ele não voltará a adoptar novas condutas desviantes, suspendendo-se a execução da pena.

64ª - Concluindo-se pela adequação e suficiência desta pena de substituição, é justo e razoável que a mesma fique subordinada ao cumprimento de deveres destinados a reparar o mal do crime, com a imposição ao condenado do cumprimento de regras de conduta destinadas a facilitar a sua reintegração na sociedade, sendo a suspensão acompanhada de regime de prova, assente num plano individual de readaptação.

65ª - A suspensão da execução da pena de prisão salvaguardará a melhor ressocialização e interiorização do desvalor da conduta do arguido, conferindo esta uma melhor e mais ampla garantia que não mais voltará a praticar os factos que ora lhe são imputados, voltando assim a reconduzir a sua vida (aliás como sempre ocorreu nos seus 39 anos de vida) ao respeito pelas normas jurídicas e valores que norteiam a nossa sociedade.

66ª - O artigo 50° do Código Penal impõe a suspensão da execução da pena, sobretudo tendo em conta a ausência de antecedentes criminais, como ocorre no presente caso.

67ª - Em face das circunstâncias supra referidas o arguido reúne todas as condições para que lhe seja aplicada uma pena suspensa na sua execução, pois é crível que a simples ameaça da pena e o tempo de privação da liberdade já decorrido (17 meses – desde 10/02/2015), o afastem da prática de novos crimes mantendo-o assim social, familiar e profissionalmente inserido.

68ª - A suspensão da execução da pena de prisão é um poder-dever ao qual o julgador se encontra vinculado, sendo que, sempre que aplique uma pena de prisão não superior a 5 anos, deverá, obrigatoriamente, ponderar a respectiva suspensão, fundamentando quer a concessão, quer a denegação da suspensão, realizando, para tal efeito, um juízo de prognose do comportamento futuro do arguido, pesando as necessidades de prevenção geral e de prevenção especial aplicáveis ao caso

69ª - Cabe assim, um juízo de prognose social favorável ao arguido, a esperança de que sentirá a condenação como uma advertência e que não cometerá no futuro nenhum crime, o que deverá levar à suspensão da execução da respectiva pena de prisão.

70ª - Este juízo de prognose favorável ao comportamento futuro do arguido assenta numa expectativa razoável de que a simples ameaça da pena de prisão será suficiente para realizar as finalidades da punição e consequentemente a ressocializacão (em liberdade) do arguido recorrente

71ª - Ao decidir como fez o Tribunal a quo violou os artigos 127º, 355º e 374º nº 2 do C.P.P., 40º, 71º e 77º do C.P. e 32º nº 2 da CRP.

Nestes termos e nos que V. Exªs Douta e superiormente melhor suprirão, deverá o presente recurso merecer integral provimento, por tempestivo, legítimo, fundado e subsistente, determinando-se a revogação do Douto Acórdão posto em crise no que tange à condenação do arguido recorrente pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de furto simples, p. e p. pelo artº 203º do C.P. (Toyota Hilux) na pena de um (1) ano de prisão; de três crimes de furto qualificado, p. e p. pelos artºs 203º nº 1, 204º nº 2, e) do C.P., nas penas respectivamente de três (3) anos e quatro (4) meses de prisão (Café Campos), três (3) anos e oito (8) meses de prisão (Ourivesaria) dois (2) anos e quatro (4) meses de prisão (Monte da Barragem), de um crime de roubo simples, na forma tentada, p. e p. pelos artºs 210º nº 1 do C.P., na pena de quatro (4) anos de prisão e em cúmulo de penas parcelares, na pena única de SETE (7) anos de prisão, substituindo-a, por decisão que condene o arguido recorrente pela prática em co-autoria material e na forma consumada de um crime de roubo simples, na forma tentada, p. e p. pelo artº 210º nº 1 do C.P. na pena de dois (2) anos e seis (6) meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, absolvendo-o dos demais crimes que lhe são imputados e pelos quais vem condenado.

Ou, Caso porventura assim se não entenda, o que por mera hipótese e cautela de patrocínio se configura, Substituindo-a, por decisão que condene o arguido recorrente pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de furto simples, p. e p. pelo artº 203º do C.P. (Toyota Hilux) na pena de dez (10) meses de prisão; de três crimes de furto qualificado, p. e p. pelos artºs 203º nº 1, 204º nº 2, e) do C.P., nas penas respectivamente de dois (2) anos e quatro (4) meses de prisão (Café Campos), dois (2) anos e seis (6) meses de prisão (Ourivesaria) um (1) ano e quatro (4) meses de prisão (Monte da Barragem), de um crime de roubo simples, na forma tentada, p. e p. pelos artºs 210º nº 1 do C.P., na pena de quatro (2) anos e seis (6) meses de prisão e em cúmulo de penas parcelares, na pena única de CINCO (5) anos de prisão, suspendendo-se a sua execução subordinada ao cumprimento de deveres destinados a reparar o mal do crime, com a imposição ao condenado do cumprimento de regras de conduta destinadas a facilitar a sua reintegração na sociedade, sendo a suspensão acompanhada de regime de prova, assente num plano individual de readaptação.”

A.,
“1º O tribunal a quo violou os artigos 40º, 71º e 77 do C.P;
2º A pena única de doze (12) ANOS é excessiva e desproporcional aos fins da prevenção especial, ultrapassa a medida da culpa, deve ser reduzida.”

e B.,
“1. Os pontos 57, 64 e 65 contêm matéria de facto genérica, conclusiva e conceitos de direito, não concretizada, e que por este motivo deve ser removida dos factos provados.

2. Não se concretiza a factualidade genérica provada.

3. A concretização é feita em relação a outros co-arguidos, mas nunca em relação ao recorrente B – que aliás em grande parte veio a ser dada como não assente no j) da matéria de facto não provada.

4. Mesmo o dinheiro que lhe foi apreendido na busca, não resultou provado que fosse resultante do tráfico de estupefacientes;

5. Não se prova em concreto uma única situação desde data não determinada antes do verão de 2014 até à sua detenção em Fevereiro de 2015!!!

6. ... de resto, as afirmações genéricas, contidas no elenco desses «factos» provados do acórdão recorrido, não são susceptíveis de contradita, pois não se sabe os locais em que os citados arguidos venderam os estupefacientes, quando o fizeram, a quem, o que foi efectivamente vendido, se era mesmo heroína ou cocaína, etc. Por isso, a aceitação dessas afirmações como «factos» inviabiliza o direito de defesa que aos mesmos assiste e, assim, constitui uma grave ofensa aos direitos constitucionais previstos no artigo 32º da Constituição.

7. Violaram-se em consequência, os direitos de defesa dos arguidos – art. 32º da C.R.P. - pois os factos acima referidos deveriam ter sido dados como não provados. É esta a melhor interpretação que deve ser dada às normas constantes dos artigos 283º, nº3, al. b), 374º, nº2, 410º, nº2 e 412º, nº3, do CPP, sob pena de as mesmas padecerem de inconstitucionalidade material por contenderem com o estatuído nos artigos 205º, nº1 e 32º, nº1, da CRP.

8. Com efeito, a interpretação que foi dada pelo tribunal, às referidas normas, a prova dos factos basta-se com uma descrição genérica dos factos sem um mínimo de concretização dos mesmos designadamente no que concerne à data concreta em que o recorrente adquiriu, deteve ou vendeu os produtos estupefacientes, a quantidade e qualidade e a especificação dessas vendas.

9. Impugna-se expressamente os factos dados como provados nos pontos 57, 64 e 65 da matéria dada como provada.

10. O único elemento de prova usado pelo acórdão recorrido foram as declarações da coarguida J.

11. Foi aliás neste sentido que opinou o MP em sede alegações quando pediu a absolvição deste arguido por ausência de qualquer corroboração das imputações verbais da coarguida J;
12. Como admite o acórdão recorrido, o MP e desde sempre o arguido, as declarações da coarguida J não são corroboradas por qualquer elemento de prova que vá no mesmo sentido, ou seja, de que o arguido B. vendia droga todas as semanas desde data não determinada antes do verão de 2014 ao arguido A..

13. Todos os elementos de prova recolhidos pelo OPC são totalmente e integralmente omissos em relação a qualquer tipo de ligação entre o B, a J ou o A;

14. Mesmo a prova testemunhal – essencialmente do OPC GNR – é totalmente omissa em relação a este recorrente;

15. A testemunha JR disse: a.20160223140816_3376565_2871781.wma; b. Que o B. nunca foi suspeito da investigação; c. Não fizeram nenhuma diligência de prova em relação ao B; d. As suspeitas que conduziram à busca tinham que ver apenas com a TV furtada no café campos – referida pela arguida J. e que depois se confirmou que não era a TV furtada; e. Depois das declarações incriminatórias da J. quanto ao B., não fizeram mais nenhuma diligência de prova;

16. Em todo o caso, a J. disse em julgamento que nunca viu qualquer droga, nos dias em que diz que foi a casa do B: a. MJP -Olhe, nas deslocações que eram feitas à casa do arguido B. a senhora via, via o estupefaciente, vias as placasse haxixe, via cocaína? Visualizava a substância que ia ser ou que era entregue lá em casa? b. Arguida- não.

17. Como bem resultou das alegações do MP, as declarações J. não obtiveram a necessária corroboração de outro elemento objetivo.

18. Com efeito, no período de tempo em que a J. diz que o arguido B. vendeu droga a A. – desde antes do verão de 2014 e até esta data – não existe um único elemento de prova ou dado objetivo que relacione sequer estas pessoas: a. Nunca foram vistos pelo OPC; b. Não era o B. sequer suspeito, ao contrário do A.; c. Não existe um único contacto telefónico entre estas pessoas – seja de voz ou escrito; d. Nada foi apreendido que ligasse estas duas pessoas; e. Nada para além da imputação verbal da J; f. Nem mesmo o resultado das buscas ao A. e J. pode ser confirmativo da sua história com o B., pois de acordo com as declarações da coarguida, o A. e o B. deixaram de se relacionar a partir do Verão de 2014 e a busca foi efetuada em finais de 2015 – pontos 56 a 58 da matéria provada;

19. O douto acórdão admitiu, aliás frontalmente e com enorme honestidade intelectual, que não existia nenhuma prova adicional a corroborar a história da coarguida J.

20. As declarações dos coarguidos nunca podem, só por si, e por mais inequívocas e credíveis que sejam, suportar a prova de um facto criminalmente relevante.

21. Pelo exposto, devem os factos aqui impugnados julgar-se como não provados, nomeadamente quanto a uma qualquer intervenção do arguido B. nos factos provados nos pontos 57, 64 e 65 da matéria provada.

22. Absolvendo-se o recorrente B. do crime de tráfico de estupefacientes.

23. Em todo o caso, não se deu como provado o elemento do tipo subjetivo do dolo;

24. Tal resulta de modo claro do provado em 65 e da fundamentação de direito na página 161, 163 e 165.

25. Dizer-se que o arguido sabia que haxixe/cocaína/heroína/etc. têm natureza estupefaciente está bem longe da demonstração de que o arguido Joaquim Fortes sabia que essas condutas constituíam um crime.

26. Faltou demonstrar o elemento intelectual e volitivo do dolo;

27. Pelo que também por este motivo deve o recorrente ser absolvido do crime de tráfico de estupefacientes;

28. Em todo o caso, embora o arguido nunca possa aceitar – pessoalmente bem entendido – uma condenação, pois não cometeu o crime, temos por dever de ofício rogar que a pena seja substancialmente reduzida e suspensa na sua execução.

Violaram-se as seguintes normas jurídicas: artigo 127º do Código de Processo Penal; artigos 13º, 14º, 50º, 71º e 72º do Código Penal; artigo 21º do DL 15/93 de 22.1. Nestes termos e demais de direito deverá o presente recurso obter provimento e em consequência anular-se o acórdão recorrido ou absolver-se o recorrente do crime de tráfico de estupefacientes em que foi condenado.”

O Ministério Público respondeu aos recursos pronunciando-se sempre no sentido da confirmação do acórdão. Concluiu:

Relativamente a D.,
“1. O arguido foi condenado, além do mais, pela prática de um crime de roubo na forma tentada p. e p. pelo art. 210º nº1 do CP, na pena de 3 anos de prisão, um crime de detenção de arma proibida p. e p. pelo art. 86º nº1 alinea c) por referencia 2º nº1 p) e s), 3º nº1 e 6 a), 8º e 15º todos do Regime Jurídico de Armas e Munições, na pena de 1 ano e seis meses de prisão e por um crime de trafico de estupefacientes previsto e punido pelo art. 21º do DL 15/93 de 22/01, na pena de 6 anos e seis meses de prisão.

2. Considerando as molduras penais abstractamente aplicáveis aos citados ilícitos penais desde já se pode concluir que as penas concretamente aplicadas ao arguido foram adequadas e proporcionas à culpa do mesmo.

3. Na douta sentença recorrida foram profundamente analisados os critérios a ter em consideração para determinação da medida da pena nos termos do art. 40º e 70º do Código Penal, com os quais concordamos na íntegra.

4. O dolo do arguido, bem como dos co-autores é directo e de intensidade normal, considerando porém o dolo de intensidade acentuada no crime de tráfico de estupefaciente, porquanto o arguido não se absteve de obter proventos económicos com essa actividade.

5. O grau de ilicitude mostrou-se em todas as situações criminogenas elevado, sendo especialmente elevado no que concerne ao crime de tráfico de estupefaciente, em face do tipo de droga em causa – cocaína.

6. Não obstante, não ter condenações anteriores por crimes de crimes de tráfico de estupefaciente, roubo e crime de detenção de arma proibida, o recorrente já havia sido condenado por diversas vezes e em pena de prisão, condenações que essas não serviram de advertência ao arguido.

7. Conclui-se que as necessidades de prevenção especial são elevadas pelo que as penas concretamente aplicadas mostram-se adequadas e proporcionais.”

a A.,

“1. O arguido foi condenado, além do mais, pela prática de um crime de roubo na forma tentada p. e p. pelo art. 210º nº1 do CP, na pena de 3 anos de prisão, um crime de detenção de arma proibida p. e p. pelo art. 86º nº1 alinea c) por referencia 2º nº1 p) e s), 3º nº1 e 6 a), 8º e 15º todos do Regime Jurídico de Armas e Munições, na pena de 1 ano e seis meses de prisão e por um crime de trafico de estupefacientes previsto e punido pelo art. 21º do DL 15/93 de 22/01, na pena de 6 anos e seis meses de prisão.

2. Considerando as molduras penais abstractamente aplicáveis aos citados ilícitos penais desde já se pode concluir que as penas concretamente aplicadas ao arguido foram adequadas e proporcionas à culpa do mesmo.

3. Na douta sentença recorrida foram profundamente analisados os critérios a ter em consideração para determinação da medida da pena nos termos do art. 40º e 70º do Código Penal, com os quais concordamos na íntegra.

4. O dolo do arguido, bem como dos co-autores é directo e de intensidade normal, considerando porém o dolo de intensidade acentuada no crime de tráfico de estupefaciente, porquanto o arguido não se absteve de obter proventos económicos com essa actividade.

5. O grau de ilicitude mostrou-se em todas as situações criminogenas elevado, sendo especialmente elevado no que concerne ao crime de tráfico de estupefaciente, em face do tipo de droga em causa – cocaína.

6. Não obstante, não ter condenações anteriores por crimes de crimes de tráfico de estupefaciente, roubo e crime de detenção de arma proibida, o recorrente já havia sido condenado por diversas vezes e em pena de prisão, condenações que essas não serviram de advertência ao arguido.

7. Conclui-se que as necessidades de prevenção especial são elevadas pelo que as penas concretamente aplicadas mostram-se adequadas e proporcionais.”

e a B,
“1. Quando fundamenta e concretiza a sua discordância com a decisão proferida o recorrente confunde insuficiência da prova para a decisão de facto proferida com erro notório na apreciação da prova.

2. As questões que o recorrente suscita como “insuficiência da prova para a matéria de facto produzida” não se enquadram no âmbito do disposto no art. 410º n.º2 alínea a) do Código de Processo Penal, atento o âmbito desta insuficiência, considerando-se que o Douto Acórdão contém todos os factos necessários para a decisão de facto relativamente aos factos integradores no crime que cometeu e atenta a dinâmica desses mesmos factos.

3. O vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada ocorre quando os factos apurados são insuficientes para se decidir sobre o preenchimento dos elementos objectivos e subjectivos dos tipos legais de crimes verificáveis e demais requisitos necessários à decisão de direito.

4. O recorrente não indica quais os elementos em falta e quais as provas que, em seu entender, deveriam ser produzidas para superar a alegada insuficiência.

5. Não existe matéria que permita concluir pela existência desta insuficiência, tratando-se de conclusão do recorrente que não fundamentou nem demonstrou.

6. O vício do erro notório na apreciação da prova existe quando a matéria de facto sofra de uma irrazoabilidade passível de ser patente a qualquer observador comum, por se opor à normalidade dos comportamentos e às regras da experiência comum, o que não é o caso do douto Acórdão ora em crise.

7. Da leitura dos pontos 57, 64 e 65 da matéria de facto provada desde logo se retira que os mesmos não são genéricos nem contém conceitos de direito, antes concretizando temporalmente os factos, a natureza do estupefaciente modo de actuação.

8. Contrariamente ao que alega o recorrente o Exmo. Colectivo não fundamentou a sua condenação em exclusivo nas declarações da co-arguida J., as antes e naturalmente em todas a prova produzida em audiença de julgamento, nomeadamente testemunhal, bem como nos documentos e exames periciais já juntos aos autos que se encontram detalhadamente discriminados no douto Acórdão como se retira de fls. 66 a 85 do mesmo e concretamente relativamente ao ora recorrente a fls. 66 e 67. Assim, na habitação do arguido, além do mais, foram encontrados os telemóveis cujas comunicações foram alvo de intercepção, entre outros com relevância para a prova do crime em que o arguido veio a ser condenado.

9. Conforme resulta do texto o Exmo. Colectivo efectuou um rigoroso e exaustivo exame critico das provas, nomeadamente da prova testemunhal, descrevendo quais os depoimentos que lhe mereceram credibilidade ou não, e expondo as respectivas razões lógicas e de ciência de forma clara e perceptível.

10. Assim ficou devidamente demonstrado e explicado no douto Acórdão qual a razão de ciência porque o Tribunal atribuiu credibilidade ao depoimento da co-arguida J.

11. Não obstante o Exmo Colectivo fundamentou de forma exaustiva a credibilidade atribuída ao depoimento de J., porquanto se verifica: a) ausência de incredibilidade subjectiva das relações entre co-arguidos que possam conduzir à dedução da existência de um móbil de ressentimento, inimizade ou tentativa de exculpação; b) verosimilhança: as declarações hão-de estar rodeadas de corroborações periféricas de caracter objectivo que as dotem de aptidão probatória e c) persistência na incriminação: prolongada no tempo e reiteradamente expressa e exposta sem ambiguidades ou contradições e discutida pelos sujeitos processuais, no desenho máximo princípio do contraditório.

12. Com efeito, a fundamentação de facto é bastante clara e exaustiva sobre a forma conjugada como todas as provas foram examinadas e apreciadas e ainda demonstrativa das razões de ciência que conduziram à formação da convicção do Tribunal em ordem à decisão sobre a matéria de facto.

13. O recorrente veio, no fundo, por em causa a convicção formada pelo Tribunal.”

Neste Tribunal, a Sr. Procuradora-geral Adjunta pronunciou-se também no sentido da confirmação do acórdão, relativamente a todos os recorrentes.

Apenas o recorrente B. respondeu ao parecer. Reiterou a posição defendida em recurso, e mais uma vez sinalizou o silêncio do Ministério Público, nas duas instâncias, relativamente à problematização que colocara em recurso, de um comportamento “ziguezagueante” do mesmo Ministério Público que, em alegações finais de julgamento, defendera a absolvição do arguido face à inadmissibilidade de condenação suportada exclusivamente em declarações incriminatórias de co-arguida.

Colhidos os vistos, teve lugar a conferência.

2. No acórdão, consideraram-se os seguintes factos provados:
“1) Os arguidos A, D, M. e JG, decidiram subtrair bens móveis pertencentes a terceiros guardados no interior de estabelecimentos comerciais e residências particulares, sem o consentimento e contra a vontade dos seus proprietários, engendrando previamente um plano para cada ação a desenvolver.

- Situação I - Dos autos principais (NUIPC --/14.0GDSTC e 15/14.1GCSTC):
2) Na concretização de plano previamente delineado, na noite de 18 para 19 de Fevereiro de 2014, em hora não determinada, os arguidos A., M. e D., acompanhados da arguida J, dirigiram-se à Rua ---, sita na Quinta da Mimosa, Mimosa, Alvalade do Sado, onde se apropriaram da carrinha da marca Toyota, modelo Hilux, com a matrícula ----BF, com o valor de 5.000€, pertencente a IM, que ali se encontrava estacionada.

3) Para o conseguirem, o arguido M. forçou os canhões das fechaduras das duas portas da viatura e colocou o veículo em funcionamento utilizando um vareta de óleo na ignição, vulgo “gazua”, com o auxílio do arguido D. que empurrou o veículo.

4) Os arguidos D. e M. levaram tal carrinha e os arguidos A. e J. fizeram-se transportar no veículo automóvel, da marca Fiat, modelo Stilo, cor cinzenta, de matrícula ---TH (pertencente ao arguido A.), até à zona de Cercal do Alentejo.

5) Aí chegados, os arguidos A., D e M dirigiram-se ao Café Campos, sito na Rua …, em Sonega, explorado por MC, ficando a arguida J. a aguardar dentro do veículo FIAT, e de vigia a quem aparecesse.

6) Então, D e M saltaram o muro do quintal, forçaram uma janela das traseiras e passando pela mesma, introduziram-se no estabelecimento comercial, de onde retiraram, com a ajuda de A. que se encontrava no lado exterior de uma janela do estabelecimento, os objetos que fizeram seus:- um televisor da marca LG 32”, no valor de 299,90€;- uma máquina de tabaco de cor vermelha, da marca Azkoyen, pertencente a “Armazéns Apolo do Cercal, Lda”, com o valor de 1.500€ e que no seu interior tinha 606€ em tabaco de várias marcas e 75€ em dinheiro;- 20 € em moedas que se encontravam na máquina registadora;- um expositor contendo diversos produtos alimentares, tais como chipicaos, bolicaos, chocolates e gelados, no valor de 60€.

7) Os três arguidos D e M. transportaram os objetos na carrinha de matrícula ----BF;

8) E forçaram a abertura da máquina de tabaco utilizando um pé de cabra, subtraindo o tabaco e dinheiro que se encontrava no seu interior, que colocaram na bagageira do veículo Fiat.

9) Após, abandonaram a máquina e a carrinha de matrícula ---BF, que vieram a ser encontradas num local ermo, a cerca de 500m do Km 4 da EN 390, próximo da localidade de Abela, e regressaram a casa do arguido A., sita em Montes Velhos, na viatura Fiat, onde também se encontrava a arguida J.

10) Aí chegados, os arguidos A., D. e M. dividiram o dinheiro e o tabaco entre si, o arguido M. ficou com os produtos alimentares e deram não mais que três maços de tabaco à arguida J, que comeu 1 ou 2 dos bolicaos retirados.

11) A reparação das fechaduras das portas da carrinha de matrícula ----BF foi orçada em 250€.

12) Nas referidas deslocações, o arguido A. conduziu sempre o seu veículo automóvel, da marca Fiat, modelo Stilo, cor cinzenta, de matrícula ----TH, apesar de, à data, não ser titular de carta de condução.

13) Em data não concretamente apurada, entre os dias 1 e 19 de Fevereiro de 2015, os arguidos A., M, D, J estiveram na casa de MARTA onde CÁTIA estava a ser tatuada.

- Situação II - Apenso A (NUIPC ---/14.5GESTC)
14) Na noite de 19 para 20 de Fevereiro de 2014, os arguidos A., M, D e JG, fazendo-se transportar novamente no referido veículo automóvel Fiat Stilo, dirigiram-se à ourivesaria de MS, sita na Av.---, em Ermidas-Sado.

15) Aí chegados e fazendo uso de chave de fendas, lograram abrir uma porta do estabelecimento e entrar do seu interior.

16) Daí retiraram e apropriaram-se de várias peças em ouro e prata, relógios, braceletes de cabedal e pilhas de relógios, no valor total de 50.000€.

17) Após, os arguidos deslocaram-se para Espanha, já acompanhados da arguida J, no mesmo veículo automóvel.

18) Chegados a Espanha, os arguidos M, acompanhado por outro dos arguidos, dirigiram-se à loja “Oro y Plata”, sita na Av. Adolfo Dias Ambrona, Badajoz, Espanha, onde venderam pelo valor de 944€, os seguintes artigos subtraídos da referida ourivesaria: 2 pulseiras de aro, 4 pulseiras, 1 gancho, 31 anéis e 3 fechos, tudo em ouro.

19) Os arguidos A, M, D e JG dividiram entre si o produto da venda do ouro, dividiram as pratas, os relógios, braceletes, pilhas, sendo que deram alguns relógios a desconhecidos, atiraram fora alguns artigos e deram à arguida J €10 em dinheiro, dois relógios e um pequeno anel de ouro.

20) No dia 18.12.2014, a arguida J, através da sua avó, entregou na GNR os referidos dois relógios e ainda um fio de metal dourado, que foram apreendidos.
- Situação III - Do apenso C (correspondente ao NUIPC ---/14.8GESTC):

21) Os arguidos A, D, M e TB engendraram um plano para, no dia 18.03.2014, subtraírem a GM os objetos em ouro e dinheiro que esta tinha na sua posse e cujo valor era seguramente superior a 102€.

22) De acordo com esse plano, os arguidos D e J abordariam a ofendida fingindo que lhe queriam arrendar uma casa, a imobilizariam e, depois, os outros arguidos dirigir-se-iam a casa da ofendida para daí retirarem os seus bens.

23) Assim, no dia 18.03.2014, a hora não concretamente apurada mas entre as 14h00 e as 16h00, os arguidos A., D, M, TB e J, fazendo-se transportar novamente no referido veículo automóvel de marca Fiat, modelo Stilo, conduzido também pelo arguido A., deslocaram-se até à Travessa …., em Ermidas do Sado onde residia a ofendida GM.

24) Aí chegados, o arguido D. entregou à arguida J, uma navalha e um rolo de fita adesiva grossa de cor cinzenta, combinando entre eles que iam fingir que arrendavam uma casa a GM e que quando ele a agarrasse, a arguida deveria utilizar a fita adesiva para tapar a boca da ofendida e atar-lhe as mãos e os pés.

25) Enquanto isso, os arguidos A, M e TB permaneceram no interior do referido veículo, que estacionaram noutra rua próxima da casa da ofendida.

26) Acedendo ao pedido dos arguidos J e D, a ofendida GM levou então os arguidos D e J até ao interior da habitação vazia que tinha para arrendar.

27) Ao entrarem nessa casa, o arguido D dirigiu-se, pelo corredor, ao interior da habitação, aproximando-se da ofendida;

28) Após, o arguido D agarrou a senhora por trás, colocando um braço à volta do pescoço dela, tapou-lhe a boca com a mão, fê-la cair ao chão, enquanto dizia à arguida J para amordaçar e atar a ofendida.

29) No momento em que colocava a fita adesiva à volta dos pés da ofendida, a arguida J assustou-se com a aflição da ofendida, cortou a fita e foi tentar colocá-la de volta na sua mochila, mas a ofendida agarrou a camisola da arguida, sendo que esta mordeu a mão da ofendida para se soltar.

30) Nesse momento, CX, que havia sido alertada pelos gritos da ofendida, entrou pelas traseiras da referida habitação e perguntou em voz alta o que é que se estava a passar.

31) Então, os arguidos D e J colocaram-se em fuga, primeiro a pé e, após, no mencionado veículo conduzido pelo arguido A, afastaram-se todos desse local até junto a uma ponte, sita nos arredores da localidade de Ermidas-Sado, onde o arguido D deixou o seu casaco sujo de sangue.

33) Após, os arguidos dirigiram-se a Montes Velhos e depois a Monchique para deixar a arguida J na casa da avó desta, tendo sido intercetados pela GNR, cerca das 18H, junto à igreja matriz de Aljustrel.

34) Feitas buscas no veículo e revistas pessoais, na posse dos arguidos A, D e J foram encontrados os seguintes objetos utilizados na prática do crime, os quais foram apreendidos:

a) O arguido D tinha consigo:- dois telemóveis da marca Samsung, associados aos cartões telefónicos 964.-- e 969.---- um rolo de fita cola preta;

b) O arguido A. tinha consigo:- um telemóvel Sony Ericsson, associado ao cartão telefónico nº 967----

c) A arguida J tinha consigo:- um telemóvel ZTE, associado ao cartão telefónico nº 963---;- uma navalha com cabo de cor preta, cuja lâmina media 9,5 cm; - uma camisola azul escura com a inscrição, em cor-de-rosa, “Pull & Bear 1991”, que envergava quando abordou a ofendida GM;

35) Como consequência das referidas agressões, GM sofreu dores, traumatismo torácico bilateral, facial e cervical, múltiplas escoriações na face, incluindo escoriação com crosta na hemiface direita na região mandibular direita, hematoma infra-mentoniano com extensão cervical anterior, algumas equimoses nos membros superiores e inferiores, equimose em fase de resolução no ombro direito e equimose em fase de resolução no quadrante superior interno da mama esquerda, o que lhe determinou 8 dias de doença sem incapacidade para o trabalho.

36) Como consequência das referidas agressões, a prótese dentária da ofendida ficou quebrada, sendo que a aquisição de uma nova prótese custou 210€.

37) Os arguidos A, D, M TB e J sabiam que GM era pessoa de idade e, ainda assim, tal não os dissuadiu de prosseguirem os seus intentos.

38) Os arguidos A, D, M, TB e J agiram sempre de forma concertada e em conjugação de esforços e vontades.

39) Bem sabendo que ofendiam o corpo e saúde de GM, o que fizeram o intuito de subtrair bens pertencentes a esta, por saberem que não lhos entregaria de livre vontade, o que não lograram inteiramente por razões alheias às suas vontades.

40) O arguido A. só obteve carta de condução em 10.07.2014.

- Situação IV - Do apenso B (NUIPC ---/14.2GJBJA)

41) Na noite de 10 para 11 de Julho de 2014, em hora não concretamente determinada, os arguidos A, D e J dirigiram-se a uma residência sita em Monte da Barragem – São João de Negrilhos – Aljustrel, pertencente a MS.

42) Enquanto a arguida J ficou no exterior do carro em vigia, no caminho de acesso à dita residência, os arguidos A e D dirigiram-se à mesma, saltaram a vedação da propriedade, forçaram as portadas de uma janela e partiram os respetivos vidros (lançando sobre eles pedras) por onde passaram para se introduzirem no interior da residência.

43) Os arguidos retiraram daí e levaram consigo os seguintes objetos que fizeram seus: - um televisor da marca LG modelo 29MN33D número de serie 302MALF58984, de 29”, de cor preto, com respetivo comando, no valor de 299,99€,- vários DVD’s de filmes infantis no valor de 25 € - várias garrafas de bebidas alcoólicas no valor de 160€.

44) A reparação dos referidos danos na porta custou 450€.

- Situação V - Do apenso E (NUIPC ---/14.2GJBJA):

45) Na noite de 04 para 05 de Novembro de 2014, em hora não determinada, os arguidos A e JG dirigiram-se à residência do avô deste último, MV, sita na EM 530, ---, S. João de Negrilhos, e ali chegados saltaram a vedação da referida propriedade, forçaram as portadas da janela e partiram os respetivos vidros.

46) E dessa forma, aproveitando a ausência dos avós, que pernoitaram na casa da mãe do arguido JG, acederam ao interior da habitação.

47) De onde os arguidos retiraram os objetos pertencentes a MV, os quais fizeram seus: - uma espingarda de caça, da marca Zamacola Hermanus, nº de série 52213, dois canos com o comprimento de 70 cm, canos de alma lisa e com funcionamento de tiro a tiro, com o valor de 70€; - um televisor LCD da marca Hannspree, modelo HSG 1074, com o valor de 180€;

48) Posteriormente, os arguidos guardaram a espingarda na casa da mãe do arguido JG, sita na Rua…, Gasparões, e guardaram o televisor numa casa pertencente a AL, sita na Rua …., Montes Velhos.

49) No dia 18.12.2014 realizaram-se buscas nesses locais, onde foram encontrados os referidos objetos, apreendidos e devolvidos ao seu proprietário.

50) Os arguidos A. e JG não são titulares de qualquer autorização ou licença que lhes permita deter armas de fogo, o que era do seu conhecimento.

51) Não obstante, os arguidos A. e JG quiseram subtrair e deter na sua posse a aludida arma de fogo, o que conseguiram, guardando-a noutra morada.

52) Parte da grade da proteção da janela da porta das traseiras da residência de MV encontrava-se arrancada, o vidro quebrado e o postigo apresentava-se forçado.

- Situação VI - Do apenso D (NUIPC ---/14.7GAFAL):

53) Em data e hora não concretamente determinadas, entre os dias 10 e 12 de Novembro de 2014, pessoa cuja identidade não se apurou dirigiu-se ao prédio sito na Rua ----, Ferreira do Alentejo.

54) Aí chegado e por forma não determinada entrou nesse prédio e daí retirou e fez sua uma bicicleta de BTT, da marca Sting, cor vermelha e cinza, no valor de 700€, pertencente a SD, que se encontrava guardada no hall de entrada do referido prédio.

55) No dia 18.12.2014, cerca das 07H, realizaram-se buscas na casa dos arguidos A. e J, sita em Rua …. – São João de Negrilhos – Aljustrel, onde foram encontrados os seguintes objetos que estavam na posse destes arguidos, os quais foram obtidos com a prática dos referidos crimes e colocados ao serviço dos mesmos, tudo o que foi apreendido:

a) NA RESIDÊNCIA COM O N.º 10 (Quarto dos arguidos A. e J):

i) Em cima da mesa-de-cabeceira: - Um telemóvel de marca ZTE mobile, de cor preto com o IMEI 3556----, contendo um cartão SIM da operadora MEO com o contacto 92---, com o PIN 7385, utilizado pelo arguido A.; - Um telemóvel de marca Samsung modelo GT-I9301, versão Android 4.4.2, cor Azul, com o IMEI 3558----, contendo um cartão SIM da operadora MEO com o contacto 968 ----, com o código de proteção de ecrã 7289, utilizado pelo arguido A.

ii) Na gaveta de mesa-de-cabeceira:- Duas placas de canábis em resina, com a inscrição “2014”, com um peso líquido total de 180,73 gramas, com um grau de pureza de 7%THC, suficiente para 253 doses médias individuais diárias;

- Dois rolos de Celofane, utilizados;- Um maço de notas do banco central europeu, contendo, 4 notas de 50,00 euros, 15 notas de 20,00 euros, 43 notas de 10,00 euros, 34 notas de 5,00 euros, perfazendo o valor total de 1,100,00 euros.

iii) Em cima da mesa de centro:- Um telemóvel de marca Samsung, modelo GT-S7580, versão Android 4.2.2. cor azul e preto com capa cor rosa, IMEI 35373----, contendo um cartão SIM da operadora MEO com o contacto 963 ----, com o PIN 1217, código de proteção de ecrã 7289 e respetivo carregador, utilizado pela arguida J (cfr. fls. 316, 317 e 1087).

iv) Em cima do móvel da televisão: - Uma televisão de marca LG modelo 29MN33D número de serie 302MALF58984, de 29 Polegadas, de cor preto, com respetivo comando, subtraídos da residência de MR sita em São João de Negrilhos;- Uma faca de marca OPINEL, com punho cor azul e lâmina com 7,5cm de cumprimento; - Uma bolsa de cor preta, contendo uma balança digital de cor cinzenta e um pedaço de canábis em resina com o peso líquido de 36,58g, com um grau de pureza de 14,3%THC, suficiente para 104 doses médias individuais diárias.

b) NA RESIDÊNCIA COM O N.º 12 (Quarto pertencente ao arguido A.), em cima de uma aparelhagem de som:- Um relógio de marca “Radiant” de cor preto e cor de laranja, o qual havia sido subtraído da ourivesaria de MS sita em Ermidas do Sado;- Um relógio de marca “Quartz” de cor prateado e verde, o qual havia sido subtraído da ourivesaria de MS sita em Ermidas do Sado;- Nove autos de contraordenação rodoviária referente ao Arguido A. e veículo ----TH, não pagos.

- A arguida J. tinha ainda na sua posse os seguintes objectos que foram apreendidos:- um par de brincos de prata, em forma de argola, e - um anel de ouro, o qual havia sido subtraído da ourivesaria de MS sita em Ermidas do Sado.

- Situação V
56) Desde meados de 2013, que o arguido A. passou a vender cocaína e canábis em resina a várias pessoas que o procuraram na sua casa ou em outro local previamente acordado, chegando a comprar e vender entre 3 a 4 kg de canábis no período compreendido entre uma ou duas semanas, cobrando entre 150€ a 180€ cada placa de canábis em resina com o peso de cerca de 100g, e comprar e vender 50 g de cocaína por cada dois meses, cobrando 50€ por cada grama.

57) O arguido A. passou a adquirir desde data não determinada, mas antes do verão de 2014, ao arguido B., cerca de 2 a 4 kg de canábis em resina por mês, pagando o valor de 150€ cada placa de canábis com o peso de 100g – 1kg por 1500 euros) e cocaína em quantidade não apurada, para o que lhe pagava o valor de 40€ por cada grama.

58) Em meados de 2014, o arguido A. começou a comprar canábis em resina a indivíduo não identificado, deslocando-se ao Algarve para o efeito, pelo menos uma vez por semana, sendo que pagava o valor de 90€ por cada placa, o que lhe permitia maiores margens de lucro e viver desafogadamente.

58) Com o mesmo intuito, o arguido A. também começou a abastecer-se de cocaína em Badajoz, a uma mulher desconhecida de etnia cigana, pagando cerca de 50€ por cada grama de tal substância com maior qualidade, que posteriormente vendia a 60€ por grama.

59) A arguida J auxiliava o arguido A. na venda de estupefacientes, seja atendendo o telemóvel quando os adquirentes os contactavam, seja entregando-lhes o estupefaciente, o que sucedeu por duas vezes, em casa e uma vez, a seu pedido no exterior e recebendo o respetivo preço, bem como acompanhava o arguido A. nas viagens que este empreendia para comprar tais estupefacientes destinados à revenda.

60) Na noite de 16.12.2014, o arguido A. vendeu a um indivíduo não identificado várias placas de canábis em resina, tendo sido a arguida J. quem entregou o estupefaciente e recebeu o respetivo pagamento.

61) Na noite de 17.12.2014, o arguido A, vendeu a H, conhecido por “Sapo”, residente em Vila Nova de Santo André, quatro placas de canábis em resina;

62) O arguido A., por várias vezes, também vendeu estupefacientes a outros indivíduos, designadamente, a NC e RC, residentes em Ermidas-Sado, a RP, conhecido por “Al Chorne”, a BV, conhecido por “Impek”, a LG, a TS (cocaína) e a dois outros indivíduos conhecidos por “Canelas” e “Bocas”, estes residentes na zona de Aljustrel.

63) Por várias vezes, a arguida J trocava pequenos pedaços de canábis em resina por tabaco com pessoas que conhecia em Montes Velhos.

64) Os arguidos A. e J conheciam a natureza estupefaciente das referidas substâncias que cederam a terceiros, fazendo-a a arguida em estreita colaboração com o arguido.

- Situação VI -
64) O arguido B, pelo menos desde meados do ano de 2014 vendeu cocaína e canábis em resina ao arguido A., nos termos descritos em 57), o que fazia a outros indivíduos que para o efeito o procuravam, sendo que, pelo menos ao arguido A, nunca vendeu quantidades inferiores a 100g de canábis.

65) O arguido B. conhecia a natureza estupefaciente das substâncias que cedeu e pretendia continuar a fazê-lo.

66) O arguido A. não desenvolvia qualquer atividade laboral nem era titular de qualquer fonte de rendimento lícito que lhe permitisse prover o seu modo de vida desafogado financeiramente.

67) Assim, com os proveitos obtidos com o tráfico de estupefacientes, desde o verão de 2014 o arguido A, comprou: - uma moto 4 com a matrícula --EB---, pelo valor de cerca de 4.000€, e - um veículo automóvel da marca Citroen, modelo Saxo, com a matrícula ----JP, pelo valor de cerca de 2.000€, cuja propriedade registou no dia 24.11.2014 a favor da arguida J.

68) Após a sua detenção, a moto 4 de matrícula ----EB--- foi cedida, por valor não concretamente apurado, pelo arguido B, que dela dispunha e a guardava no interior da sua residência, a HS, sendo que este no dia 20.01.2015 a registou em seu nome, e de seguida vendeu-a a terceiros, sendo que atualmente se encontra na posse de NF que a adquiriu pelo valor de 3.950€.

69) O arguido B circulava ao volante de um veículo automóvel ligeiro de passageiros, da marca BMW, modelo série 6 coupé, cor cinzenta, de matrícula –FF---, viatura que usava no seu dia-a-dia para se deslocar e parqueava na sua garagem e junto à sua casa e se encontrava registado na conservatória de registo automóvel a favor de ME.

70) No dia 10.02.2015 realizaram-se revistas e buscas, nas pessoas, residências e veículos dos arguidos, tendo sido encontrados e apreendidos os bens adquiridos com o proveito da prática dos factos supra descritos e colocados ao serviço dos mesmos:

a) O arguido JG tinha na sua posse:- consigo o arguido tinha 1 telemóvel Samsung, associado ao cartão telefónico 962.---;- no quarto do arguido: 1 telemóvel de cor branca, o qual se encontrava danificado, e 2 telemóveis Samsung, todos sem cartões telefónicos;

b) O arguido D tinha na sua posse:- no seu quarto: 1 telemóvel Nokia, associado ao cartão nº 925.--- e 1 telemóvel Alcatel, sem cartão telefónico;- no quarto da mão: um relógio digital dourado, da marca Casio, subtraído da Ourivesaria de MS;

c) O arguido B. tinha na sua posse: i. No automóvel da Marca BMW, matrícula --FF---: - um telemóvel da marca Nokia, IMEI 3530---, associado ao cartão telefónico Espanhol nº +034.---- (fls. 718 e 1410); - um carregador USB para Iphone; ii. No interior da residência sita na Rua… S. João de Negrilhos: - 1 televisor da marca LG, nº de série 320CAW9801KNU881B, monitor de 32” e respectivo comando universal, que se encontrava na cozinha (cfr. fls. 1780 e 1781);- 1 telemóvel da marca Samsung, com o IMEI 3565---, associado ao cartão telefónico nº 926.---, que se encontrava na cozinha/sala;- 1 cartão com PIN e PUK do cartão telefónico do nº 963.---(SIM 0000570116259), que se encontrava na cozinha/sala (fls. 720, 721 e 1513); iii. No quarto do arguido sito na referida casa:- 1 televisor da marca LG, nº de série 011LUYMOK130, monitor de 32” e respectivo comando da marca LG;- 1 telemóvel Samsung, com o IMEI 3565----, associado ao cartão telefónico nº 967---- (fls. 720 e 1513 )- 1 telemóvel Iphone; - 765€ em dinheiro no bolso do casado do arguido;- 1 cartão identificativo de segurança privado emitido pelo MAI (cfr. fls. 734);- 1 espingarda caçadeira da marca Browning, modelo FN, nº de série 27151, com um cano, medindo 70 cm de comprimento, calibre 12, funcionamento semi-automático, manifestada e registada a favor de “herdeiros de JR”, avô materno do arguido (fls. 735 a 738), que este guardava no seu roupeiro;- 7 cartuchos da marca Eley Grand Prix nº 7, de calibre 12, que o arguido guardava no seu roupeiro;

71) No dia 11.02.2015 realizaram-se revistas e buscas, na residência da arguida MS tendo sido encontrado e apreendido 1 telemóvel associado ao cartão telefónico nº 926.--- que se encontrava na sua posse.

72) O arguido B. não é herdeiro legítimo nem testamentário do seu avô materno JR, nem é titular de qualquer autorização ou licença que lhe permita deter aquela arma de fogo e respetivas munições, o que era do seu conhecimento.

73) Não obstante, na mesma residência, residia, para além do arguido B, a sua progenitora, que por óbito de seu pai, JR, se encontrava devidamente licenciada para manter na sua posse a aludida arma de fogo e respetivas munições.

74) Nas situações supra descritas, os arguidos A, M, D, TB, JG e J agiram com a intenção de se apropriarem de bens que sabiam não lhes pertencerem, que o faziam contra a vontade dos seus proprietários e causando-lhes prejuízos.

75) Atuaram os arguidos em conjugação de esforços e vontades para subtrair bens alheios, o que sempre fizeram de forma livre e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.

76) Todos os arguidos agiram sempre de forma deliberada, livre e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei, mais sabendo o arguido TA. que só podia conduzir um veículo a motor na via pública se estivesse legalmente habilitado para o efeito. Não obstante não ser titular de carta de condução conduziu o veículo automóvel Fiat Stylo com a matrícula ---TH, nas circunstâncias supra referidas.
(…)

Do arguido A:
92) Natural de S. João de Negrilhos (Aljustrel) é o último descendente de uma fratria composta por 4 (quatro) elementos, fruto do segundo relacionamento marital da progenitora, tendo ainda ter um irmão mais velho, fruto do primeiro relacionamento marital da progenitora, com o qual nunca habitou devido à grande diferença de idades.

93) O processo de socialização primário de A. foi desenvolvido no seio de uma família aparentemente estruturada, constituída, à data, pelos progenitores e os irmãos, inserida numa localidade rural, aldeia de S. João de Negrilhos, no concelho de Aljustrel.

94) Este grupo familiar residia numa casa térrea da propriedade do progenitor, sendo a economia do grupo familiar sobretudo centrada nos rendimentos deste, o qual exercia funções laborais na Junta de Freguesia de …, como cantoneiro de limpezas, por seu turno, a progenitora, após a falência da entidade patronal (fabrica de tecidos), para a qual laborou alguns anos, dedicou-se aos afazeres domésticos e ao acompanhamento dos descendentes.

95) O arguido iniciou o percurso escolar em idade regular, inserido na comunidade escolar de S. João de Negrilhos, sendo o percurso caracterizado como normativo até ao 4.° ano de escolaridade.

96) Após a transição para o 2° ciclo de estudos, o arguido foi inserido na comunidade escolar de Aljustrel, frequentando a Escola Básica do 2° /30 Ciclo Dr. Manuel Brito Camacho, altura em que começou a revelar falta de motivação e desinteresse para a continuidade dos estudos, fatores que determinaram o abandono da frequência do ensino, aos 16 anos de idade, ainda assim, conseguiu lograr concluir o 6° ano de escolaridade.

97) A dinâmica familiar foi descrita como harmoniosa, contudo, sofreu um desequilíbrio emocional e financeiro após o falecimento do progenitor, quando o arguido tinha cerca de 16 anos de idade (2005), figura de referência para o mesmo, altura em que iniciou o consumo de produtos estupefacientes, nomeadamente haxixe e bem ainda consumos abusivos de álcool, acompanhando grupos de indivíduos referenciados com práticas ilícitas.

98) Nesta fase, o grupo familiar era constituído pela mãe e dois irmãos mais velhos, de 27 e 21 anos de idade, sendo a economia deste grupo familiar caracterizada como muito deficitária, sobrevivendo através da pensão de viuvez atribuída à progenitora e das bolsas de formação dos irmãos do arguido, que, à data, frequentavam cursos profissionais.

99) Aos 17 anos de idade o arguido teve o seu primeiro contato com o sistema da administração da justiça.

100) Em termos afetivos, o arguido A. mantinha à data da afetação ao Estabelecimento Prisional (2014) um relacionamento afetivo com J, coarguida no presente processo, com ela residindo num anexo contíguo à habitação da progenitora, com acessos comuns (morada constante nos autos).

101) A vivência diária do casal era sobretudo centrada naquele espaço, apesar dos mesmos efetuarem tanto a higiene como as refeições na sua residência.

102) O arguido encontrava-se maioritariamente desocupado, apresentava rotinas pouco estruturadas e organizadas, associando-se no contexto residencial e comunitário a pares com comportamentos desviantes, face aos quais manifestava necessidade de reconhecimento e gratificação, registando hábitos noturnos e consumos de haxixe e álcool em contexto das relações paritárias, revelando que por vezes ausentava-se da localidade de residência, para vários pontos do país, maioritariamente para a região do Algarve.

103) Ao nível das características e competências pessoais, revela-se um indivíduo imaturo e com fraco sentido de responsabilidade, que tendencialmente revela adesão a um estilo de vida pró-delinquencial, aparentemente como forma de afirmação e como forma de satisfazer as suas necessidades imediatas.

104) O arguido apresenta ainda um défice ao nível da resolução de problemas, reduzida motivação para adquirir competências que contribuam para a sua inserção socioprofissional, reduzida adesão/motivação para a manutenção regular de uma função laboral que implique esforço e dedicação, demonstrando ainda reduzida capacidade de pensamento alternativo e consequencial.

105) Durante o período de reclusão, o arguido A. vêm mantendo um comportamento genericamente adequado apesar de se encontrarem instaurados dois processos disciplinares, que tiveram na sua génese a apreensão de produto destilado (chicha), na camarata que o arguido partilha com outros reclusos.

106) Neste ano letivo, o arguido denotou investimento na aquisição de competências habilitacionais, estando atualmente a frequentar o ensino publico, através da Escola Secundaria du Bocage, inserido no 2° ciclo de estudos integrados na Escola de Formação de adultos, que a concluir, proporcionará o 9° ano de escolaridade.

107) Ao longo da vivência prisional, o arguido tem recebido parcas visitas dos familiares e amigos, devido às condições económicas do agregado familiar de origem mas futuramente o arguido pretende reinserir-se no agregado familiar de origem e inserir-se profissionalmente.

108) O arguido A. regista as seguintes condenações:
. Por sentença proferida em 29/09/2008, transitada em julgado em 29/10/2008, no âmbito do processo comum nº. ---/08.4GJBJA, do Tribunal Judicial de Ferreira do Alentejo, pela prática, em 27/01/2008, de um crime de furto qualificado, na pena de 6 meses de prisão, substituída por 180 horas de trabalho a favor da comunidade. Tal pena foi declarada extinta, pelo cumprimento, por despacho proferido em 16/09/2009.

. Por sentença proferida em 03/02/2012, transitada em julgado em 23/02/2012, no âmbito do processo sumário nº. ---/12.0GJBJA do antigo Tribunal de Ferreira do Alentejo, pela prática, em 27/01/2012, de um crime de condução sem habilitação legal na pena de 80 dias, à razão diária de 5 euros. Tal pena foi declarada extinta, por despacho de 01/03/2012.

. Por sentença proferida em 09/04/2013, transitada em julgado em 09/05/2013, no âmbito do processo sumário nº. ---/13.7GJBJA do antigo Tribunal de Ferreira do Alentejo, pela prática, em 08/04/2013, de um crime de condução sem habilitação legal na pena de 100 dias, à razão diária de 6 euros. Tal pena foi declarada extinta, por despacho de 27/01/2014.

. Por sentença proferida em 26/11/2013, transitada em julgado em 13/01/2014, no âmbito do processo comum singular nº. --/13.9GJBJA do antigo Tribunal de Ferreira do Alentejo, pela prática, em 05/02/2013, de um crime de condução sem habilitação legal na pena de 6 meses, substituída por 180 dias de multa, à razão diária de 6 euros. Tal pena foi declarada extinta, após o cumprimento de 108 dias de prisão;

. Por sentença proferida em 01.06.2015, transitada em julgado em 01/07/2015, no âmbito do processo comum singular nº. --/14.8GJBJA da Instancia Local, Secção Criminal – J1 da Comarca de Beja, pela prática, em 10/02/2014, de um crime de condução sem habilitação legal na pena de 4 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 ano.

Do arguido B
109) O processo de socialização de B, decorreu junto do agregado familiar de origem, composto pelos pais e pela irmã.

110) O desequilíbrio emocional entre os progenitores desencadeou uma dinâmica familiar conflituosa, caracterizada pela agressividade verbal e física por parte do pai que culminou com a rutura da relação quando o arguido tinha cerca de 12 anos. Posteriormente, sempre viveu com a mãe.

111) O arguido abandonou a frequência escolar no 7º ano, optando posteriormente pela formação profissional.

112) Foi neste âmbito que frequentou um curso de serralharia civil que lhe conferiu o 9º ano de escolaridade.

113) Iniciou o consumo de haxixe desde a adolescência, ativos durante alguns anos.

114) Os seus tempos livres nunca foram estruturados, preenchendo-os na companhia do grupo de pares.

115) O percurso laboral do arguido caracterizou-se por alguma instabilidade, privilegiando, porém, os trabalhos em oficina-auto, por conta própria, num espaço devidamente preparado e adaptado, contiguo ao espaço residencial.

116) Sempre revelou apetência para trabalhos nesta área de atividade, e procura de estabilidade laboral e material.

117) Em termos afetivos, B, mantém uma relação desde há cerca de 8 anos, com coabitação.

118) Desta relação marital tem um filho com 2 anos de idade. Esta relação tem-se pautado pelos desentendimentos e ruturas frequentes, mas atualmente mais estabilizada com manifestações de apoio e laços de solidariedade.

119) À data dos factos subjacentes ao presente processo, B residia na morada de família, onde sempre residiu. Trata-se de uma casa herança dos avós maternos, situada em localidade de cariz rural no concelho de Aljustrel, detentora de adequadas condições de habitabilidade.

120) O arguido tem como coabitantes a sua companheira e o filho menor, a progenitora, a irmã, a avó materna e um tio.

121) No seio do agregado são visíveis os laços de solidariedade entre os vários elementos, embora o arguido seja referenciado como individuo por vezes impulsivo na condução do seu estilo de vida.

122) Em termos laborais, no momento da detenção à ordem dos presentes autos, o arguido trabalhava por conta própria, em mecânica-auto e na compra/venda de veículos motorizados, num espaço contiguo à sua habitação do qual é proprietário.

123) A mãe do arguido (atualmente desempregada), a avó e o tio (estes reformados) sempre assumiram o pagamento das despesas fixas.

124) Neste momento, o arguido não dispõe de rendimentos fixos; por vezes, refere a execução de pequenos trabalhos de mecânica-auto no quintal adjacente à residência permitindo-lhe auferir pequenos quantitativos canalizados integralmente para as despesas pessoais, inclusive, com o filho menor.

125) As atuais receitas gerais do agregado, não quantificadas, são consideradas suficientes para assegurar as despesas básicas do núcleo familiar.

126) O arguido B foi julgado e condenado:
. Por acórdão proferido em 24.10.2011, transitada em julgado em 23.11.2011, no âmbito do processo comum coletivo nº. --/10.0GCCUB do Tribunal de Cuba, pela prática, em 14/03/2010, de um crime de roubo qualificado, na pena de 3 anos e 8 meses de prisão, suspensa na respetiva execução por igual período de tempo, sendo a suspensão sujeita a regime de prova.

. Por sentença proferida em 07/05/2014, transitada em julgado em 06/06/2014, no âmbito do processo comum singular nº. ---/14.TBMTL, do Tribunal de Mértola, pela prática, em 08/12/2012, de um crime de resistência e coação sobre funcionário, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão, suspensa na execução por igual período subordinada a regime de prova e a injunção pecuniária;

Do arguido D.
140) Este arguido é proveniente de um agregado de condição modesta, deteve um processo de crescimento e desenvolvimento pautado pela tolerância e permissividade nas regras intrafamiliares.

141) Sempre viveu em Aljustrel, integrado no agregado familiar de origem.

142) Logo após o abandono da escolaridade, com cerca de 15/16 anos, no final do 5º ano, o arguido iniciou um percurso laboral, indiferenciado, com vista a auferir alguns quantitativos para as despesas pessoais.

143) Vivenciou uma fase problemática em consequência da prisão do pai (3 anos preso pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes) quando tinha cerca de 22 anos de idade.

144) Iniciou-se nessa idade no consumo de estupefacientes (heroína, por via intravenosa), recorrendo aos serviços de saúde especializados em Beja (ETET – equipa de tratamento especializada à toxicodependência), integrando o programa de tratamento com metadona, cujo termo ocorreu há cerca de 5 anos.

145) Todavia e não obstante os consumos, desde cedo revelou alguma capacidade em manter ajustadas áreas determinantes da sua vida, tais como, o trabalho, preservando a imagem social, assumindo estratégias de gestão dos consumos para obter efeitos positivos.

146) O arguido exerceu várias atividades profissionais, algumas devidamente credenciadas e vinculadas, das quais se destaca o exercício de funções na empresa “Serrabritas – comércio de inertes, construção civil e obras públicas, Lda” na área de residência, entre Ago2001 a Jul2010 (cerca de 9 anos).

147) Neste contexto, D recebeu uma prestação mensal decorrente da situação de desempregado, entre Ago2010 a Mai2012 (num total diário de 13,97€ totalizando cerca de 420€ mês) que canalizava maioritariamente para as suas despesas pessoais.

148) Em Novembro de 2011, no âmbito da sua frequência de cursos profissionais (educação e formação de adultos) concluiu no centro de formação em Aljustrel o segundo ciclo do ensino básico (nível 1) com equivalência ao 6º ano de escolaridade.

149) Frequentou outros cursos de formação profissional, devidamente subsidiados com bolsa e realização de estágios em entidades locais, destacando-se o curso de fabricação e montagem de estruturas metálicas (serralharia civil) entre Nov2011 e Abr2013 e o curso de instalações elétricas, entre Junho de 2013 e Setembro de 2014.

150) Desempenhou ainda outros trabalhos indiferenciados na construção civil, sem qualquer vínculo contratual, em diferentes locais e empresas distintas, na zona de residência.

151) Foi referenciado como trabalhador responsável na execução das tarefas, cumpridor de horários, mantendo uma relação, com colegas e superiores hierárquicos, avaliada como humilde e cordata.

152) Tendo iniciado assim um percurso de autonomia financeira, procurou sempre uma melhoria da sua situação, embora o ascendente nos consumos de estupefacientes tivesse determinado todo o seu quadro vivencial nos últimos anos.

153) À data dos factos subjacente ao atual processo, D, já vivia na mesma residência, tendo exclusivamente como coabitantes os progenitores. Trata-se de habitação própria permanente, propriedade do agregado, situada na malha urbana de Aljustrel.

154) Pese embora as despesas mensais fixas, decorrentes da manutenção do núcleo familiar, a economia doméstica, atualmente, assente no vencimento da mãe (funcionária na santa casa da misericórdia local) e na pensão de reforma do pai foi avaliada como suficiente (cerca de 1300 € / mês) para fazer face às necessidades quotidianas.

155) Atualmente, o arguido mantém-se totalmente dependente dos progenitores, uma vez que não dispõe de quaisquer rendimentos ou prestações mensais.

156) A sua dinâmica familiar pauta-se pela entreajuda, mantendo com ambos os progenitores uma relação coesa e solidária.

157) Mantem uma relação afetiva recente, considerada como um suporte emocional no seu atual quadro de vida.

158) Após a alteração da medida de coação, de prisão preventiva para OPHVE, D, manteve de forma assídua e regular o acompanhamento terapêutico na ETET em Beja, essencialmente, com o objetivo de prevenção de recaídas.

159) É assíduo e pontual na comparência às consultas com o terapeuta.

160) O arguido tem demonstrado capacidade no cumprimento de regras, respeitando os compromissos e obrigações inerentes à situação de confinamento.

170) O arguido D não tem antecedentes criminais averbados.”

A motivação da matéria de facto foi a seguinte:
“A convicção do Tribunal quanto à prova dos factos que deram por assentes – e por não assentes - alicerçou-se no conjunto da prova produzida e/ou examinada, na audiência de julgamento, bem como na prova pericial e documental juntas aos autos, e respetiva apreciação crítica à luz das regras da experiência comum e da normalidade da vida.( …)

Na convicção da matéria de facto, o tribunal atendeu, em conjunto aos seguintes elementos probatórios existentes nos autos: Ao nível da prova pericial, aos Relatórios dos exames de toxicologia de fls. 1159 no que se refere às caraterísticas do produto de estupefaciente apreendido; Perícia clínica de avaliação do dano corporal de fls. 122 a 129 do apenso C; Perícias dactiloscópicas e biológicas de fls. 180 a 204 do apenso C; Perícias forenses sobre os telemóveis de fls. 302 e seguintes e 339 e seguintes e 350 do apenso C, e de fls. 1216, 1217. No que respeita à prova por reconhecimento, atentamos nos Autos de reconhecimento de objeto de fls. 361-362, 447-448, 683-685, 791-792, 1743; no Auto de reconhecimento de objetos de fls. 24 do apenso D; no Auto de reconhecimento de objetos de fls. 78 do apenso E; nos autos de reconhecimento pessoal de fls. 55 a 65 do apenso E; nos autos principais, nos autos de notícia aditamentos, relatórios e informações policiais de fls. 3, 4, 8, 9, 42, 43, 61, 62, 88-90, 165-166, 237-239, 351-355, 357-358, 363-364 e 368-372, 444-445, 599-604, e 799 e seguintes dos autos principais; Nos Autos de busca e apreensão, com reportagem fotográfica, de fls. 10, 12, 316-332, 367, 433 e seguintes, 508 e seguintes, 718 e seguintes, 747, 758-761, 780, 782, 827, 1727, 1840, nomeadamente, quanto ao arguido B (fls. 720 e 721, onde foram encontrados os telemóveis cujas comunicações foram alvo de interceção, a espingarda no roupeiro, os cartuchos e a quantia monetária apreendida no bolso do casaco – e fotografado o veículo de marca BMW utilizado pelo arguido mas registado em nome de pessoa diversa); nos Autos de exame e avaliação de fls. 347-350, fls. 735-737, 1731, 1780-1781, 1841, nos Termos de entrega de fls. 11, 13, 1744, 1893, nas Guias depósito bancário de fls. 525 e sg., 933 e sg., 979; nas Fotografias de fls. 44-50; nos Clichés fotográficos dos arguidos – fls. 1420 a 1432.

Fizemos igualmente fé nos relatórios técnicos de inspeção ocular, com reportagem fotográfica, de fls. 53 e seguintes, 440 e seguintes; nas faturas, recibos e orçamentos de fls. 70, 78, 86, 87, 793-794, 1648-1651; na Certidão de fls. 124-157, - autos de leitura de telemóveis de fls. 580 e seguintes, 943-955, 1563-1605; Análise das localizações celulares e contactos telefónicos dos telemóveis dos arguidos – fls. 1828 e 1834; nas informações da segurança social, centro de emprego e finanças de fls. 398, 399, 559-563, 660 e seg. 691, 695, 698, 855-860, 1218-1277, 1280, 1290-1326, 1786-1802, 1946 e 1954-1959; nas Informações de IMTT e conservatória registo automóvel de fls. 365, 366, 701-703, 727-730, 861-865; nas informações e extratos bancários de fls. 1146-1156, 1370, 1379-1406, 1464-1466, 1490-1502, 1506-1509, na resposta a carta rogatória de fls. 1849-1891, por via da qual ali se declarou, em resposta ao solicitado – vide tradução de fls. 2879, em que se fez fé – 2 em relação ao assunto referido em epígrafe (…) informa-se que depois de comprovados os registos de compra e venda do estabelecimento “Oro y Plata, datados de 20.02.2014, MG vendeu joias (em ouro) no valor de €994,00 – vide o teor de fls. referida e de fls. 2870, em que se fez fé.

Relativamente à prova documental que consta do apenso A, consideramos o Auto de denúncia de fls. 3 e 4 e o Relatório técnico de inspeção judiciária – fls. 14 e seguintes do apenso referido;

No que respeita ao apenso C, atentamos no Auto de notícia e aditamentos de fls. 4 a 9, 176 e ss., os Relatórios de fls. 256 e ss., e 298 do apenso C; a Reportagem fotográfica de GM de fls. 17, a ficha clinica e fls. 142-143 do apenso C; Autos de busca e apreensão, com reportagem fotográfica, de fls. 20 a 25, 33 a 35, 43, 51 a 53; os Autos de exame direto de fls. 34 e 35; o relatório tático de inspeção ocular, com reportagem fotográfica – fls. 84 a 87 do apenso C; os Autos de inspeção judiciária com reportagem fotográfica de fls. 165 a 172 do apenso C; as Informações telefónicas de fls. 134-137, 205-210, 215, 216, 279 a 290 do apenso C; Autos de leitura de memória de telemóvel de fls. 232 a 240 do apenso C; Análises de contactos telefónicos de fls. 241 e ss, de fls. 296 e do apenso C; Informação do IMTT de fls. 153.

No que se refere aos factos do apenso B, consideramos o teor do Auto de notícia de fls. 3 e ss. ; fatura de fls. 5;
Valorizamos, no que se reporta à factualidade investigada no apenso D, o Auto de notícia e aditamento de fls. 3, 4, 10 e 11, o Auto de busca e apreensão de fls. 16 e 17, o Auto de entrega de fls. 25, o Auto de exame direto e avaliação de fls. 26.

E no que se refere aos factos do Apenso E, consideramos o Auto de notícia e aditamento de fls. 19 e 60 e ss; o Relatório táctico de inspeção ocular, com relatório fotográfico, de fls. 25 a 32; o Relatório técnico de inspeção judiciária, com relatório fotográfico, de fls. 35-38 e 43-48; os Autos de busca e apreensão de fls. 65 a 75; os Autos de exame direto e avaliação de fls. 76, 77, 82 e 83, importando este para a demonstração do valor do furto que se decidiu provado, os documentos de fls. 79 a 81 e os Termo de entrega de fls. 84 do apenso E;

Atentamos ainda na cota datada de 11 de Agosto de 2014 (ANALISE REGISTO COMUNICAÇÕES E LOCALIZAÇÃO CELULAR) elaborada tendo por base a análise da documentação recebida da operadora de telecomunicações móveis “MEO”, constante a fls. 158 a 161, apurando-se com relevo.

(…) de 7 comunicações telefónicas, entre os dias 09 de Maio de 2014 e 06 de Outubro de 2014, entre os contactos 925-- e o 968---, pertencentes a testemunha LS e o arguido A.. (Ver Ficheiro Excel constante no CD a fls. 1088), testemunha que como se verá adiante, admitiu a aquisição de haxixe ao arguido A..

(…) E assim, o Tribunal, ante a produzida prova opta por dividir os meios de prova, em quatro grandes grupos: a) os depoimentos dos militares da GNR que tiveram em mãos as diligências da investigação, que explicaram a forma de se proceder à articulação entre os diversos meios de prova, tendo em conta que presenciaram muito do referido pelas restantes testemunhas; b) os depoimentos das demais testemunhas de acusação – ofendidos - e das que por razões porque tomaram de algum modo – porque os presenciaram, ou assistiram parcialmente - conhecimento dos factos; c) as testemunhas da defesa, fundamentalmente inquiridas ao percurso de vida do arguido JG e M que as indicaram; d) as declarações prestadas pelos arguidos declarantes, J, M, D e, parcialmente sobre os factos, B; e) sendo atendido, no mais o extenso acervo de documentos e relatórios juntos ao processo e abaixo indicados, sobre os quais os vários sujeitos processuais tiveram ampla oportunidade de se pronunciarem sobre os mesmos no decurso da audiência de discussão e julgamento, que para cada situação se referirão.

Assim, neste primeiro elenco, encontramos os depoimentos dos militares JR – Referindo que a investigação se iniciou com o conhecimento da subtração de uma máquina de tabaco num Café na Sonega e o furto de uma carrinha de caixa aberta. Depois, o relato que no dia 18 de Março, nas Ermidas, uma senhora de idade teria sido alvo de um roubo, tendo nessa situação sido avistada uma viatura Fiat Stylo, relacionada com os factos e que os conduziu aos suspeitos. Encontraram nas coisas deixadas, uma fita adesiva que serviu para manietar a ofendida, Sra. GM. Foram efetuadas diligências para localização dos suspeitos. Na noite de 18 para 19, encontraram a localização do A, vindo as diligencias que realizaram na investigação a associa-lo também ao furto da viatura de carrinha de matrícula BF com que foi realizado o assalto ao café da Sonega, viatura que veio a ficar abandonada e na proximidade desta, a máquina de tabaco de lá retirada. Confirma ter Participado na Busca à residência do A., onde apreenderam 2 placas de haxixe, 1100 euros em dinheiro, mais pedaços pequenos de haxixe, 2 relógios e uma TV, proveniente de um outro furto, no Monte da Barragem. A sorte da investigação e do que foi possível alcançar em termos probatórios assentou na colaboração prestada pela arguida J esclareceu todos os factos e colaborou na identificação dos restantes arguidos, sendo também da prestada, no desempenho dos factos, pelo arguido A. A arguida J. procedeu ainda a entrega de uma aliança – furtada na ourivesaria, através da sua avó. Procederam a inspeção ao local ao estabelecimento – ourivesaria – comprovando que a entrada no estabelecimento foi feita com o recurso a chave de fendas. A arguida J afirmou ter sabido que a C e a M teriam sido as pessoas que teriam indicado os locais para os furtos da ourivesaria e que a venda dos objetos teria sido feita em Espanha, o que comprovaram através da análise das localizações celulares aos telefones dos arguidos A. e M, que os posicionam nesses factos.

Relativamente ao episódio imputado ao arguido A. Sena e João Gonçalves – furto de bicicleta, arma e TV do avô furtados – confirma as diligencias feitas no inquérito, sendo confrontado com o teor de fls. 62 e , com fls. 163-164 – localizações celulares, referindo ser sua crença que no episódio da Sonega, a arguida J. deve ter estabelecido contacto com a Joana, mencionando onde estavam. Quanto à Localização dos objetos subtraídos, refere que com uma exceção, das buscas feitas não chegaram a ser recuperados. A arguida J referiu que a televisão retirada do café Campos tinha sido entregue ao arguido B. Na busca que realizaram à morada deste arguido, encontravam-se lá duas televisões com o número de série retirado. Os referidos aparelhos foram abertos e concluíram que os televisores não pertenciam aquele furto. Foi confrontado com a análise de localizações celulares – fls. 1828 e seguintes, de fls. 1831, sobre o resumo de todas as localizações celulares dos arguidos. No respeitante ao Furto da Ourivesaria e ao furto da carrinha, referiu-se a apurada localização dos 3 arguidos, atentando ainda no teor de fls. 1891: cliché fotográfico. Relativamente aos reconhecimentos dos arguidos, refere que a ofendida G reconheceu os arguidos – 2 – J e D. Realizou também a busca à morada do B. A J não era conhecida até a data da detenção, nem suspeita da prática de qualquer facto. O M., desde 2007, foi dos primeiros que foi detido pelo NIC de SanA., por furtos de máquinas de tabaco. Referente ao arguido B. aperceberam-se que acompanhava ultimamente o A. A C e a M eram conhecidas na vila por acompanhar indivíduos mais velhos. Uma das pessoas que acompanharia com ela – M - seria o ofendido da ourivesaria e seriam pontualmente trabalhadoras em restaurantes. Relativamente ao Fiat Stylo – confrontado com Fls. 316 e – refere que a data da detenção, o arguido A. era já portador de carta de condução. Era, por lhe pertencer, habitualmente o condutor da viatura e dizia aos outros arguidos que não possuíam kit de unhas para conduzir o carro.

Em casa do A. realizaram buscas, declarações de J. localizações, mensagens em que se fala de cd´s de música e se combinam as entregas – foi confrontado a fls. 720 e seguintes – volume 4 – auto de busca – e 1513. Confirma também, no respeitante a espingarda caçadeira encontrada em casa do arguido B, que nesta morada residia a mãe, a irmã e uma avó, a companheira e o filho. O A. teria um Fiat, um Citroen (em nome da arguida) e uma moto 4. Ainda quanto às viaturas, o arguido B. circulava com um BMW (registado em nome de um tal de ME) mas que se encontrava na posse do arguido – tinha as chaves e um telemóvel e um carregador. O arguido B. foi apanhado num radar a circular com o BMW. Diligenciaram o contacto com o proprietário do mesmo que lhes disse que o carro se encontrava ali, porque não possuía garagem. Foi confrontado com o teor de Fls. 1606 e 1957 – cedência da moto 4. A PSP fez a apreensão e ouviu os proprietários da mota. Pediram a apreensão da mesma. Não fizeram vigilâncias a nenhum dos arguidos. Foi confrontado com os Autos de busca de fls. 718-725, 747 e 758 e seguintes, cujo teor integralmente confirmou – de JB, sargento da GNR, Chefe do NIC - tomou conhecimento do processo através da participação de uma carrinha furtada na Mimosa e do assalto a um café na Sonega; toda a parte operacional da investigação foi articulada por si. Foram a Aljustrel dar voz de detenção ao A, J. e D., nas Ermidas do Sado. Quanto às diligências efetuadas na investigação: o veículo furtado na mimosa teve intervenção no assalto do café Campos, porque partes da máquina de tabaco encontravam-se no interior da carrinha e a própria maquina ao pé da viatura que ficou abandonada. Para além da máquina do tabaco furtaram ainda um televisor. Chegou a deslocar-se ao café, explicando o modo como acederam os arguidos ao seu interior. Foi confrontado com o relatório de fls. 35 a 38 e fls. 55 a 58, fls. 44 a 50. Confirma ser o relatório do furto do veículo e encontrou-se ali parte da máquina de tabaco que se encontrava colocada no café Campos. A máquina foi retirada pela janela da frente, mas os assaltantes entraram por trás. Acredita que a televisão tenha sido retirada do interior da mesma forma. Quanto ao roubo da D. G., refere que foi dado um alerta para a rede da GNR, dando conta da ocorrência da situação e que no local tinha sido avistado uma viatura de marca Fiat, modelo Stylo.

Os indivíduos foram detidos em Aljustrel: O A, o D, a J. Pensa que quem ia a conduzir era o D. Foi apreendida uma arma de fogo através da busca numa residência, na sequência de uma indicação da arguida J. A arma correspondia a um furto noutra residência de um familiar do arguido que a furtou. O veículo furtado na Mimosa foi encontrado na Abela. Nele, transportaram-se da Sonega para a Abela, trazendo com eles e na viatura, a máquina do tabaco. Quanto ao café Campos refere que a janela traseira estava partida. Havia vidros caídos e o muro que dividia o espaço tinha meio metro de altura - SS, militar da GNR, NIC de SanA. de Cacem – realizou as buscas ao A. e de um individuo que se encontrava detido (M). Outras diligências foram feitas pela GNR de Aljustrel. Foi confrontado com o auto de fls. 33 e 43 do apenso C – confirma integralmente não obstante as diligencias tivessem sido feitas pela GNR de Aljustrel. Confirmou o auto de apreensão relativo ao A – e RC– que participou nas buscas a casa do A e J. O A. residia na dependência de uma habitação da casa da mãe. No âmbito das buscas em que participou, encontraram uma bicicleta, uma arma e televisão proveniente de um furto em ocorrido Jungeiros. Na sequência de indicação dada pela arguida J recuperaram a arma na casa que pertencia à mãe do arguido JG, guardada no local referido no auto de busca, que integralmente confirma. Referiu ainda que esta habitação não se encontrava habitada. Pediram autorização à mãe do arguido JG para realizar a busca na referida residência. Anteriormente a estes episódios haviam feito, por duas vezes apreensões na morada do B, tendo sido encontrada uma arma, que restituíram, a primeira vez, à sua legítima proprietária, que se encontrava habilitada a detê-la.

No conjunto do depoimento dos testemunhos prestados, encontramos comprobatório da subtração da carrinha ----BF, o trazido por IJ - referiu-se à viatura envolvida no assalto ao café, de sua propriedade, identificando a respetiva matricula. Reportando-se à subtração explicou ter dado falta da carrinha e ter participado o furto às autoridades, que a vieram a encontrar abandonada na Abela. Recorda-se que o dia em que terá sido encontrada foi 20 ou 21 de Fevereiro de 2014 e que a mesma terá sido aberta com o recurso a uma vareta de óleo. Quanto aos prejuízos sofridos, referiu que não foram muitos e que a reparação da fechadura terá sido avaliada em €250, recordando-se de um orçamento que juntou, não se recordando de qualquer outro objeto que tenha deixado na viatura e que tenha sido subtraído. Relativamente a esta, foi levantá-la ao Posto da GNR de SanA..

(…) No que respeita ao encontro entre os arguidos J, D, M, A, CÁTIA e MARTA, na morada desta, JR, desempregado, operador de porto, assim o confirmou.

(…) LS, serralheiro, solteiro; Consumiu haxixe, comprou ao A., uma vez ou duas e sabia que ele vendia. Isto sucedeu há cerca de 3 ou 4 anos. Comprava uma ripa de 10 euros de haxixe, ele vendia numa rua em Montes Velhos. Confirma o seu número de telefone. Ligava-lhe e perguntava se ele estava em casa para irem beber o cafezinho. Chegou a ver lá a J. Foi lá uma vez com companhia, para ver uma mota – uma KTM.

(…) J, na mesma linha de colaboração que tomou em fase de inquérito, como aliás resulta da leitura dos autos de declarações que nessa fase prestou perante a autoridade judiciária e que em audiência renovou, pedindo que se dessem por integralmente reproduzidas, mas concretizando-as como se impunha em audiência, respondendo a todas as questões que lhe foram colocadas, em cumprimento do mais estrito contraditório, confessou integralmente e sem reservas os factos que lhe são imputados. Mas não o fez só, mencionando, de igual porte, com um aporte probatório de registo, em que não faltam os detalhes e pormenores que relacionam todos os arguidos e os envolvem numa participação, em coautoria, como sumariamente se descreve.

(…) Assumiu a sua participação na atividade de cedência de estupefacientes, referindo que, às vezes, quando o A. não se encontrava em casa ajudava-o nas entregas de estupefaciente – placas de pólen vendidas à unidade, e de acordo com os consumidores que o procuravam entre os €150 a €180. O A. comprava as placas por €1500/Kg, €150 uma placa, ou então €90, quando ia buscar a outro sítio, que não ao B. O A. abasteceu-se também no Algarve, onde se deslocava por vezes semanalmente, outras vezes quinzenalmente. Chegou a trazer entre 3 ou 4 Kg de placas de haxixe, dependendo do dinheiro que tinha. Por semana, vendia cerca de 1 kg. Guardava o estupefaciente fora de casa. As placas pesavam 100 g. No Algarve comprava-as mais baratas, a €90. Comprava também a cocaína em Badajoz e noutro sítio, de que (inicialmente) preferiu não falar, mas que acaba por esclarecer ser ao coarguido B, a quem comprava o grama de cocaína a €40 e vendia-o a €50. Quando começou a namorar com o arguido A. deixou de fumar pólen de haxixe e erva.

Quando ele não se encontrava em casa, atendia o telefone e abria a porta aos consumidores. O seu namorado (A) vendia haxixe e cocaína em casa; Fora de casa, era ele quem usualmente entregava e ela acompanhava-o. Recorda-se de ele ceder uma placa ou várias placas, o que fez ao R e NC, RS, o Impek, TS, o Bocas e o Canelas. Não se recorda de HS (sapo), nem do MR, nem do DS, e não reconhece os demais referidos na acusação, tendo duvidas sobre se estes lhe adquiriram haxixe ou cocaína.

O arguido A. entregava à TS cocaína, aos outros era haxixe. Ela trocava tabaco por pequenos pedaços de haxixe, a quem lhe pedia, pedaços que sobravam do corte.

O A. dedicava-se à venda destes produtos quando adquiriu a moto 4, em Lisboa. Não sabe a quem foi a mesma posteriormente vendida, nem a quem lhe foi entregue. Relativamente ao carro, refere que se encontrava registado em seu nome, por que não queria, na sua opinião, que desconfiassem de muitas coisas em nome dele, e pediu-lhe que o registasse em nome próprio.

É como referido, na sequência da leitura das declarações fls. 233 e seguintes que confirmou que antes de Outubro de 2013, o A. já vendia haxixe, sendo que passou, pelo menos, a adquirir droga ao B – Pópó – antes do verão de 2014. Quando o A. ia a casa do B. fazer o negócio acompanhava-o e permanecia na sala. Tal sucedeu por uma vez ou duas, eles ausentavam-se para o quarto fazer o negócio e ela aguardava. O A. dizia-lhe que o B. guardava a droga ao pé da Ribeira de Canhestros. O A. deslocava-se duas vezes por mês a casa do B. – Pópó – nessas ocasiões comprava entre 1 a 2 kg de cada vez, pagava a €150 por placa de 100 gr. Das vezes que se deslocou com o arguido A. a casa do arguido B. nunca visualizou o estupefaciente. Sabia que o propósito era esse e depois via o que o A. trazia de casa do B. – placas de haxixe e cocaína.

Ouvia-se falar também na aldeia que outras pessoas para além do A. compravam droga ao B.
Também um rapaz chamado DM – conhecido por Zuca – comprava droga ao B, que só vendia resina de cannabis em quantidade superior a 100 gramas (1 placa para cima); se quisessem comprar menos, o B encaminhava as pessoas para o A. ou para o Zuca. Ele também vendia a um rapaz de Montes Velhos, o FB (Chicago). Antes de fazerem a rusga, o A. ia vender 500 gr, a um rapaz de apelido Coelho. O A. vendia a várias pessoas que o procuravam haxixe. O A. comprava também cocaína ao B e ia outras vezes a Espanha comprar a uma mulher de etnia cigana. Vendia cerca de 50 gr. de cocaína em dois meses. Ele vendia a grama a 50 euros, comprava a grama ao Pópó a €40. A cocaína de Espanha era mais cara – €50 – mas era melhor, porque tinha menos corte.

O A. vendia ao DB, ao Impek, a um rapaz com alcunha de Russo, ao Canelas (que comprava também ao Pópó), ao Bocas, o R ou NC (costumavam levar 2 ou 3 placas).

Diz também ter sido avisada por uma pessoa que o Pópó lhe “queria fazer a folha”, depois do A. ter sido preso e por isso receia pela sua segurança e integridade, como pela dos seus.

Quanto ao arguido B. refere possuir uma oficina. Para si trabalha um mecânico – ME - que só lá vai depois da oficina estar fechada, desenrasca os amigos do Pópó e é pago em placas e em branca (cocaína) e outras vezes em dinheiro.

Diz que nunca preparou a droga, o A. não a deixava cortar as barras de haxixe, nem ela queria. Limitava-se a entregar, em casa a quem lá ia buscar, o que apenas fez por 2 vezes em casa e uma vez fora de casa. Atendia também telefonemas. O A. dizia que sendo ela a falar ao telefone ninguém desconfiava. As aparas das placas que ficavam caídas em cima da máquina eram por si trocadas por 5 ou 6 cigarros. Relativamente à moto 4 diz que o A. a comprou no verão de 2014, por 4000 ou 4.300 euros e ficou registada em nome dele. O Citroen foi comprado por dois mil e cem euros. A Moto 4 está registada em nome de um tal de Santos.

Na altura que residia em Montes Velhos, avistava o B circular num BMW X5, num Audi de cor escura, várias motas. A mãe deste arguido explora um café - o Café--- em Montes Velhos - que está sempre praticamente vazio. As pessoas aguardavam à porta do café que o B e depois acompanhavam-no até casa.

Relativamente a sua participação nos factos, disse que nunca a obrigaram a participar, tendo-o feito porque estava acompanhada por eles, não se sentir ameaçada pelo arguido A. e que do produto dos furtos nunca recebeu muito, apenas ficava com o que sobrava.

Refere que após a passagem do Citroen Saxo para o nome dela, chegou depois a assinar uma declaração de venda para a viatura ser registada em nome do A., mas a irmã do A. não veio buscar essa declaração.

O Tribunal procedeu ainda à leitura das declarações prestadas pelo arguido A. em 20 de Maio de 2015 [fls. 32 do auto de interrogatório judicial] das quais resulta a sua confirmação sobre a propriedade e posse do telemóvel Sony Ericsson, aquando da detenção, que trazia num bolso, e que manteve sempre consigo na data referida, referindo que nunca o emprestou a ninguém.

Aqui chegados e previamente à análise e examinação crítica da prova produzida, tendo em conta o relevo que se assinala às declarações prestadas pela coarguida J - relevo e essencialidade já apontada em fase de inquérito - cremos que se impõe tomar posição quanto à valoração das declarações dos arguidos em caso de co arguição, quando as mesmas se revelam co-incriminatórias, ou seja, considerar da validade probatória das declarações do arguido em relação aos coarguidos no processo.

Importa, desde logo, considerar o decidido no Ac. do TC 133/2010,de 18 de Maio de 2010, DR - II série, n.º 96, que decidiu pela constitucionalidade da valoração de declarações de um co-arguido em desfavor de outro que se remeteu ao silêncio, consignando [como ali se lê] que “ o recorrente exerceu, como livremente entendeu, o seu direito ao silêncio. O facto de essa sua estratégia de defesa sair debilitada ou, porventura, não surtir o mesmo efeito que teria se o arguido que prestou declarações tivesse igualmente optado pelo silêncio sobre os factos deixa intacta aquela livre opção do recorrente por não prestar declarações. O arguido tem o direito a não se auto-incriminar; não a que não seja produzida prova contra si ou que os demais arguidos conjuguem com a sua a estratégia de defesa deles. A prestação de declarações pelo seu co-arguido e a sua valoração como demonstração da realidade dos factos que a acusação imputou ao recorrente será um acontecimento desagradável para si, mas não constitui ameaça de um mal dirigido a demovê-lo da atitude que escolheu assumir”.

No mesmo sentido, se decidiu no Ac. da Relação de Guimarães proferido em 16.05.2011, relatado pelo Desembargador Paulo Fernandes da Silva, em cujo sumário se escreveu “É nosso entendimento que as declarações de coarguido livremente prestadas e contraditadas por todos os sujeitos processuais devem ser livremente apreciadas pelo Tribunal e por ele valoradas caso mereçam credibilidade segundo um processo racional e inteligível de ponderação da prova produzida que tenha em conta a especial situação de coarguido: ele não está sujeito ao dever de verdade e aos efeitos da sua inverdade, sendo certo que ele tem um particular interesse no desfecho dos autos. As declarações prestadas por coarguido, que decida livremente prestá-las, após o exercício do contraditório, podem, pois, ser valoradas como meio de prova para a formação da convicção do juiz em temos probatórios, dentro dos poderes de livre apreciação, naturalmente ponderadas e avaliadas todas as contingências sobre a credibilidade que tais declarações comportem: o problema é, assim, de valoração e credibilidade da prova e não de prova proibida - conforme o referido acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21.03.2007, tirado no Proc. n.º 24/07 – 3.ª Secção, relatado pelo Exmo. Conselheiro Henriques Gaspar.

Com efeito, vem se defendendo jurisprudencialmente que a admissibilidade como meio de prova do depoimento de um coarguido, em relação aos demais coarguidos, não colide minimamente com o catálogo de direitos que integram o estatuto inerente àquela situação, mostrando-se adequada à prossecução de legítimos e relevantes objetivos de política criminal, nomeadamente no que toca à luta contra a criminalidade organizada. Mas se o direito ao silêncio não pode ser valorado contra o arguido, o que assim resulta da presunção de inocência, já a proibição de valoração incide apenas sobre o silêncio que o arguido adotou como estratégia processual, não podendo repercutir-se na prova produzida por qualquer meio legal, designadamente aquela que, livre e criticamente apreciada em arrimo ao disposto no art. 127.º do CPP, venha a precisar e demonstrar a responsabilidade criminal do arguido silenciado, revelando a falência daquela estratégia. É evidente que, tal como em relação ao depoimento da vítima, é preciso ser muito cauteloso no momento de pronunciar uma condenação baseada somente nas declarações de um coarguido – não só porque este pode ser impulsionado por razões aparentemente suspeitas, o anseio de obter um trato policial ou judicial favorável em detrimento do “destrato” do coarguido, um ânimo de vingança, de ódio ou ressentimento ou o interesse em auto exculpar-se, mediante a incriminação de outro ou outros acusados – vide neste sentido o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 18.02.2015, relatado pela Exma. Desembargadora Eduarda Lobo, no Proc. n.º 200/12.0GAMSF.P1.

Ali se escreve, “para dissipar qualquer dessas suspeitas objetivas, é razoável que o coarguido transmita algum dado externo que corrobore objetivamente a sua manifestação incriminatória, com o que deixará de ser uma imputação meramente verbal para se converter numa declaração objetivada e superadora de um eventual défice de credibilidade inicial, seja pela ausência de motivos de incredibilidade subjetiva, seja inexistência de motivos espúrios e existência de uma autoinculpação.

Por isso é defensável que, na ausência de regra tarifada sobre prova por declaração de coarguido, a credibilidade do declarado deve ser sempre aferida em concreto, à luz do princípio da livre apreciação, temperado pela corroboração por outros elementos de prova. Todavia, sempre se dirá que a procura de corroboração não terá de passar necessariamente por prova externa no sentido de prova exterior a toda a co arguição, ou seja a prova da prova.

Na perspetiva do que vimos defendendo, temos que o depoimento de coarguido pode ser suficiente para desvirtuar a presunção de inocência desde que ocorram as seguintes notas: a) ausência de incredibilidade subjetiva derivada das relações entre coarguidos que possam conduzir à dedução da existência de um móbil de ressentimento, inimizade ou tentativa de exculpação; b) verosimilhança: as declarações hão-de estar rodeadas de corroborações periféricas de carácter objetivo que as dotem de aptidão probatória e; c) persistência na incriminação, prolongada no tempo e reiteradamente expressa e exposta sem ambiguidades ou contradições e discutida pelos sujeitos processuais, no desenho do máximo princípio do contraditório.

E é o que manifestamente sucede, se avaliado, de acordo com as regras de experiencia comum e da normalidade da vida, as declarações prestadas pela arguida J. que, relativamente aos factos que lhe vem imputados os confessa e, sem que se associem ressentimentos ou qualquer condicionante de ordem subjetiva, explica cada uma das situações que teve conhecimento ou que com os arguidos esteve no plano da coautoria envolvida, encontrando as suas declarações suporte nos demais meios de prova produzidos, mantendo o envolvimento dos demais arguidos nos factos, como relatou, sem ambiguidades ou contradições que serviram de pleno como contributo para a investigação.

Traz este elemento à luz e discussão, a questão da colaboração do arguido durante a investigação criminal. Sobre esta, com assaz interesse, lê-se no texto de Ferreira Leite que o arguido “colaborador” é aquele que contribui de modo decisivo para a atividade probatória das autoridades, sendo irrelevante a reparação posterior do dano. E, se a figura do “arrependido” pode surgir no âmbito de crimes de execução singular, já a figura do arguido “colaborador” só terá relevância em situações de comparticipação criminosa e de criminalidade organizada [pag. 4].

Como escreve a autora citada, referindo a lei portuguesa ao fornecimento de “provas decisivas” para a identificação e a captura de outros agentes do crime, e não a “provas decisivas”, a avaliação do carácter decisivo das provas indicadas pelo “arguido colaborador” deverá ser feito através de um juízo de prognose póstuma, valendo isto a dizer-se que o juízo deverá ser feito a final, pelo tribunal, uma vez que é ao tribunal que compete a determinação da pena e da sua medida, mas numa perspectiva ex ante.

Por isso num juízo semelhante ao subjacente à dedução de acusação, deverá exigir-se que as informações do coarguido tenham dado origem, exclusivamente ou em conjunto com outras entretanto recolhidas, a um “pacote probatório” suscetível de conduzir a uma condenação contra os restantes agentes do crime, sendo que na fase de investigação já (i) constituíram, conjugadas com outros meios de prova, prova indiciária suficiente para sustentar uma acusação contra, pelo menos, um outro agente do crime; (ii) constituíram, através de uma atividade de recolha de prova levada a cabo pelas autoridades, um elemento relevante para a construção de um “pacote probatório” suscetível de sustentar uma acusação contra, pelo menos, um outro agente do crime (um elemento sem o qual tal construção não teria sido possível, ou teria sido extremamente difícil e muito mais morosa); (iii) conduziram, isoladamente ou através de uma atividade de recolha de prova levada a cabo pelas autoridades, à identificação de outro ou outros agentes do crime e à posterior captura dos mesmos, permitindo, de modo imediato, a cessação da atividade criminosa.

Assim se consideram, enquanto prova declaratória, as prestadas pela arguida J em audiência de julgamento, elemento essencial que renovou e integram o referido “pacote probatório” recolhido pelo Ministério Público, a serem valoradas nos mesmos termos que qualquer outro meio de prova, testemunhal, documental, pericial dos produzidos nos autos e são reveladoras de uma chamado “arrependimento” sincero e quiçá, utilitário, demonstrando que a arguida, por essa via “se reencontra com os valores vigentes e impostos por uma dada ordem jurídica e, de certo modo, se inicia o processo de “reparação do dano”.

De facto, sendo evidente que as palavras da arguida, culpabilizadoras da sua conduta, mas também dos demais envolvidos, não colocam dúvidas ao Tribunal sobre o carácter livre da sua confissão, nem sobre a veracidade dos factos declarados, a examinação que infra se fará, merecerá por certo, a aplicação desta evidência.

Assim, no que se refere aos factos provados respeitantes à subtração da carrinha Toyota Hilux e furto no Café Campos, na Sonega – máquina de tabaco, televisão, e outros objetos que se deram por apurados e que foram subtraídos - que se encontram imputados aos arguidos A, M, D e J (furto simples e qualificado), o tribunal considerou, na articulação dos meios de prova a que procedeu e quanto às circunstâncias de tempo e de lugar em que os furtos ocorreram e em que foi recuperado o veículo e a máquina de tabaco e para além da prova documental junta aos autos, acima referenciada a fatura de fls. 70 e 794, quanto ao televisor e ainda a relação dos valores da máquina, dinheiro e tabaco, constante de fls. 78, os depoimentos de IM, MC (que para além dos valores subtraídos, mencionou as dimensões das janelas, referindo que a das traseiras permitiu o acesso ao interior do estabelecimento e a abertura da janela da frente do lado de dentro, permitindo a passagem dos objetos subtraídos e de pessoas, como aliás veio a suceder) e JM (quanto às dimensões da máquina de tabaco, ao valor e à posterior recuperação e as circunstâncias respetivas); as declarações da arguida J, prestadas em sede de inquérito, quer presididas pelo JIC, quer pelo Ministério Publico, cujas transcrições foram parcialmente lidas em audiência e declarações prestadas em audiência, detalhadas, credíveis, em que se coloca e aos demais nos mencionados locais, descrevendo as funções de cada um dos intervenientes, explicando o papel dos coarguidos D e M na subtração da carrinha, o modo como a colocaram em funcionamento e em marcha, que a mesma serviu para carregar a maquina de tabaco, o local onde a mesma ficou aberta e abandonada, muito próximo carrinha subtraída, quem entrou no interior do Café Campos (M e D) e quem ficou no exterior (A) a receber o produto do crime, a repartição do tabaco e dos bolicaos; a análise da localização celular do telemóvel de A. que o coloca no local, bem como do da J (vide fls. 163-164), que a coloca no Café Campos e no local onde foram recuperados o veículo e a máquina de tabaco, mantendo conversação com a irmã de M, Joana; a par, os depoimentos dos militares JB e JR (sobretudo o deste último, detalhado e preciso, sequenciando os episódios e as diligências efetuadas, também no seguimento das declarações prestadas em inquérito pela arguida J, credibilizando-as, demonstrando um profundo conhecimento da investigação levada a cabo desde o início, uma excelente memória e boa capacidade de sistematização, no que concorre ainda a informação de serviço de fls. 61. Sem qualquer relevo, as declarações prestadas pelos arguidos M e D, que negaram os factos, em oposição às que, livremente apreciadas, foram prestadas pela referida arguida, que se nos afiguraram, neste particular, como nos demais em que nos apoiaremos, absolutamente credíveis e irrefutáveis por qualquer outro meio de prova.

Pela ausência de prova, vista a declaração negatória de IM, provada não ficou a subtração pelo arguido M de um gorro e de um canivete multifuncional, sem valor, como também prova não foi feita da venda do televisor subtraído no Café Campos, a B, pois que seja do teor do auto de busca e apreensão de fls. 720 e de reconhecimento a fls. 795 (à exceção do comando) não resulta que qualquer um dos apreendidos na morada deste fosse o aparelho em referencia, mormente pelo facto de o televisor apreendido não dispor das placas identificadoras do nº de série, o que sendo suspeito e aponte precisamente para a origem ilícita na sua obtenção, não permite concluir pela identidade do aparelho. A par, o RDE de fls. 1780 afasta a possibilidade de que o televisor apreendido seja o subtraído no Café Campos (entre o mais, o numero de série não é coincidente). No que respeita ao valor despendido na reparação da fechadura da carrinha -BF, o tribunal considerou o depoimento de IM e documento de fls. 87.

Bem assim, no que importa à imputação da condução sem carta de veículo automóvel que se decidiu apurada em 12), a nossa convicção assentou na informação do IMTT e os autos de contra ordenação encontrados aquando da busca domiciliária à residência de A, que permitem concluir que o mencionado veículo era por si tripulado no lapso de tempo referido, corroborado pela confirmação isenta e sem reservas desse facto pela coarguida declarante.

No que respeita ao acervo de factos descritos na acusação, dos quais resultaram apenas provados os elencados em 13) e que envolvem os arguidos A, M, D e J, Marta e Cátia – preparação do furto na Ourivesaria de Manuel dos Santos e do assalto a GM, entendemos que não se mostrou demonstrada, com a certeza que se exige para efeitos de condenação penal qualquer forma de comparticipação ou de autoria moral (ou a cumplicidade, de acordo com a acusação), por parte das arguidas. Com efeito, ainda que JR (SYD Zuca), confirmasse que estivera em casa da Marta a fazer uma tatuagem e que todos eles se encontrassem na referida morada e que depois saíram (credibilizando o depoimento de J), não é menos verdade que a arguida declarante confirmou em audiência o que escutou da boca do coarguido M, pelo que, na semelhança da declaração indireta com o regime do depoimento indireto, a valoração da mesma estava dependente da observância de certos procedimentos que visassem a assegurar o contraditório e a sua confirmação, só podendo as declarações prestadas pela arguida, valoradas neste segmento como meio de prova, se o tribunal procedesse à sua confirmação através da audição das pessoas a quem a testemunha ouviu dizer, no caso de um arguido – M, que negou os factos, sendo que da leitura atenta do conteúdo das mensagens trocadas entre as arguidas Marta e Cátia, presentes a fls. 1583, nada nos faz, para além da mera indiciação concluir pelo envolvimento de ambas nos referidos factos.

Sobre os factos que se deram por apurados praticados pelos arguidos A, M, D e JG, na Ourivesaria de Manuel dos Santos, nas Ermidas, em conjunto e na concretização de um plano previamente desenhado, fizemos fé integral nas declarações prestadas pela arguida J (não se prova neste caso que era o A. quem conduzia o Fiat Stylo, a arguida não os acompanhou, nem sabe precisar quem conduziu a viatura): ouviu a conversa mantida entre todos e assistiu à reunião dos quatro antes de partirem de carro, ainda que tenha permanecido em casa do arguido M, esteve com eles depois, acompanhando-os a Badajoz para procederem à venda dos objetos ali subtraídos, tendo escutado de viva voz o modo como se introduziram no interior do estabelecimento por arrombamento da porta de entrada – detalhando, inclusivamente, as mossas e deformações na caixilharia de alumínio, confirmadas por MS e a referencia a que a porta não estaria trancada – como lhe foi referido pelos arguidos – e confirmado pelo proprietário da ourivesaria. Bem assim, atentamos nas análise das localizações celulares dos telemóveis de A e M, que os colocam na zona das Ermidas entre as 19h00 de 19/02 e as 10h00 de 20/02 (fls. 1831) e depoimento do Cabo JR que nos explicou o resumo das localizações e a cota que elaborou, que acima fizemos referencia, e que permite colocar os arguidos nos locais e momentos que se decidiram apurados, sendo estes, o do assalto à ourivesaria, convergente a esses elementos. Com relevo bastante, pelo modo como o prestou, de forma isenta e objetiva resulta o depoimento de MS, o reconhecimento de objetos referidos (entre eles, o de fls. 361-362, entre os quais a aliança, entregue voluntariamente pela J e os relógios Lorus e Radiant, reconhecidos a fls. 684-685, entregues por um familiar desta a seu pedido; e ainda, o relógio Casio apreendido no quarto da mãe de D, conforme relatório de fls. 747 e auto de reconhecimento de fls. 791), acreditando-se igualmente nas suas palavras para dar por provado o valor total dos bens subtraídos - €50000 – que não se encontravam seguros.

No que se refere à deslocação a Espanha, mais concretamente a Badajoz, consideramos na sua extensão o depoimento de J, referiu os arguidos que se deslocaram – os que furtaram e a própria, a venda do ouro pelo arguido M (que este confirma, dando para a posse do ouro uma versão absolutamente irreal, desprovida de assento em outro meio de prova, que estateia na venda pela arguida perante a evidencia da sua identificação pela firma Oro y Plata, no que se mostra essencial o documento junto a fls. 1890, onde se declara quem vendeu determinados artigos em ouro – o arguido M – e o valor conseguido (produto da venda) e o próprio depoimento de M – a divisão dos bens, a ela cabendo dois relógios e uma aliança de aro pequeno, que restituiu, sendo do depoimento de J, resulta provada a participação de todos os arguidos, no que inclui o JG, quer na deslocação a Espanha, quer na divisão dos bens, permitindo concluir que também este arguido interveio no furto; mais se considerou para a demonstração da entrega de artigos por parte de J, o teor de fls. 508).

No que respeita aos factos que envolveram a ofendida GM e que mereceram a participação conjugada dos arguidos A, D, M, TB e J, ponderamos como meios de prova, as declarações confessórias prestadas pela arguida J – explicou o plano, que o M incitou o A. para irem às Ermidas, por saber que aquela senhora possuía fama de dispor de objetos e valores em casa, e que todos se deslocaram no carro do A., que este também o conduziu, qual a sua parte no plano juntamente com o D – conduzir a ofendida para uma morada desta que se encontrava devoluta, com o intuito de a amordaçar e amarrar, para o que levou consigo na mala um rolo de fita cinzenta que usou, sem sucesso para amarrar a ofendida, a tática utilizada para a convencer a mostrar a casa – passou a trabalhar na fábrica do peixe e pretendia a casa para arrendar, sendo que a pessoa que a acompanhava era seu tio e mudo – o comportamento do arguido D, que empreendendo uma manobra no pescoço da vitima a fez cair ao chão, bem como as agressões que lhe causaram e sofreram, o aparecimento de uma terceira pessoa na habitação, o que os fez colocar em fuga, o seu sangramento e o de D, a roupa que ficou suja de sangue e o casaco abandonado pelo coarguido D.; que na viatura e a aguardar pela imobilização da vítima, ficaram os arguidos TB, A e M e todos se puseram em fuga, quando se aperceberam da impossibilidade de consumar o furto. Ainda que tenha assumido estes factos, referindo não compreender o que lhe passou pela cabeça, o arguido D aceitou e admitiu o que não podia ser desmentido, atribuindo em jeito de passagem de culpas, à arguida J. a autoria do roubo, que só não alcançaram por não terem conseguido imobilizar a vitima, excluindo dos factos os demais arguidos, como se o Tribunal facilmente se convencesse de um duplo projeto do facto e bem assim que a viatura para a qual o arguido A. referia que os demais não possuíam kit de unhas para a conduzir, lhes fosse, sem mais, simplesmente cedida.

Não só as suas declarações se mostram desprovidas de sentido, como sendo infirmadas em absoluto pelas prestadas pela coarguida, o foram também por DP (quanto ao avistamento do veículo com as características referidas). Também as localizações celulares dos telemóveis de A. D e M, os colocam na zona correspondente à prática dos factos, entre as 16h00 e as 16h30 de 18/03 (fls. 1831), relevando sobre este episódio o depoimento do Cabo JR e do militar SS e ainda interrogatório de A (em sede de inquérito mas cujas transcrições foram lidas em audiência), em que o mesmo assume ter estado sempre com o seu telemóvel (que foi apreendido) na tarde em que os factos ocorreram, facto que o coloca no local na altura do episódio em causa. Particulares, pelo detalhe e relevo de pormenores, encontram-se os depoimentos de CX, que confirmou que a vítima não tinha os pulsos amarrado (confirmando deste modo a versão de J, de que não tinha conseguido amarrá-los), explicou que a presença de pessoas estranhas no lugar foi notada por uma habitante da povoação que a interrogou sobre quem seriam, tendo a viatura sido avistada, ter sido o cão da ofendida que deu sinal e por isso – e porque ela lhe tinha pedido que a procurasse se a deixasse de ver – foi aquela que era a sua morada devoluta encontrando-a a levantar-se do chão, toda ensanguentada e com a prótese dentaria quebrada; o depoimento da vítima, GM, coerente e detalhado, que descreveu toda a atuação dos arguidos, confirmando o depoimento da arguida J e as características físicas do arguido D, os reconhecimentos pessoais de D e da J efetuados por CX e GM, a fls. 55 e 56 do apenso C. Atentou-se ainda na perícia biológica a fls. 180-204 do apenso C, que confirma que nos vestígios recolhidos na bata que a vítima vestia, há identidade de polimorfismos com os do arguido D (credibilizando assim e também as declarações da arguida J), confirmando ainda a identidade de polimorfismos com as da J na camisola que esta vestia, credibilizando, bem assim o seu depoimento no segmento relativo à mordedura levada a cabo no seu dedo pela vítima G. Igualmente firmou o Tribunal a sua convicção nos autos de apreensão aquando da interceção dos arguidos, confirmados pelo depoimento do militar SS e quanto às lesões sofridas pela vítima, o valor dos prejuízos com a prótese na prova documental que se encontra a fls. 142 e 143 do apenso C.

Cremos, todavia, que prova não foi feita sobre os factos vertidos na acusação que visavam o preenchimento da qualificativa da especial debilidade da vítima (art. 204º, nº 1, al. d) CP), que não é automática, já que apesar da idade com que contava, percebeu-se, até pelo seu depoimento, que resistiu bastante, demonstrando uma capacidade de se defender e uma desenvoltura acima do que seria expectável, não se tendo provado que os arguidos tivessem conhecimento da idade da vitima ou de qualquer debilidade que enfermasse – cuja existência também não se provou - e nem que dela se tivessem aproveitado, para mais facilmente alcançarem a finalidade a que se propunham.

Com referência aos factos que respeitam ao furto na residência situada em São João de Negrilhos, imputados aos arguidos A, D e J, a sua demonstração assentou, uma vez mais na confissão realizada pela arguida J, que explicou com quem esteve, como acederam ao interior da habitação – arrombamento – aludindo a um pormenor relacionado com o barulho do arremesso de pedras para quebrar a janela, aproveitando o barulho de fundo que se ouvia, provocado pelo mecanismo instalado no arrozal, cuja cultura se praticava na propriedade. A par, atentamos nos depoimentos de MS e de MR (afigurando-se-nos ser de atribuir maior credibilidade ao do primeiro, quanto às circunstâncias de tempo em que os factos ocorreram, até porque revelou manter preservada a memória quanto a alguns pormenores relativos aos bens subtraídos;

A comprovar o confessado pela arguida, com evidência na participação pelos restantes arguidos, importa atentar nos objetos apreendidos aquando da busca domiciliária efetuada à residência dos arguidos J e A em 18/12/2014, que permitiu a apreensão do televisor LG subtraído na aludida residência e a que se reporta a fatura de fls. 356 e posteriormente reconhecido por MS a fls. 1743.

Também, e no que se refere ao furto na residência do avô de JG em Jungeiros em que foi subtraído um televisor e uma espingarda de caça de marca Zamacola Hermanus, com o n.º de série 52213, de dois canos com o comprimento de 70 cm, de alma lisa e de funcionamento tiro a tiro, imputados aos arguidos JG e A, a prova de tais factos assentou: nos depoimentos de AP e de AL, mormente no que se refere aos locais onde foram encontrados os objetos; que a morada respetiva se encontrava sem habitantes dado que os avôs do arguido JG se encontravam, por razões de saúde, na morada da mãe, mantendo MV as chaves da habitação, o que de igual forma sucedia quanto à morada de Gasparões onde fui escondida a arma, que a testemunha AP refere estar a chave desta morada na sua posse e da qual não foi desapossada, confirmando, tal como referido pela arguida J que não obstante a casa de Gasparões não se encontrar habitada estava mobilada, e inclusivamente se deslocava para realizar a limpeza da mesma, de 15 em 15 dias.

Resulta também do depoimento do militar RC sobre as buscas realizadas após a detenção dos arguidos e tendo em conta a colaboração prestada pela arguida J na indicação dos locais onde foram escondidos os objetos furtados, para o que atentamos no conjunto da prova pericial e documental do apenso E, mormente no auto de busca e apreensão de fls. 65 a 75, que relatou o pormenor da abertura da porta pela mãe do arguido JG, que tinha a chave do imóvel do seu pai; sendo certo que o relatório táctico de fls. 25-26 do Apenso E confirma a ausência de arrombamento da fechadura da porta.

Dizer-se por isso que prova não foi feita quanto à participação dos arguidos nos factos, não pode ser a conclusão do Tribunal, nem que nos ficaram dúvidas sobre se os arguidos tiveram participação nos mesmos.

Retomemos as palavras da arguida J. Encontrava-se em casa quando o A e o JG combinaram ir retirar ao avô deste, a espingarda e o televisor. Saíram e regressaram mais tarde, conversando à sua frente sobre o local onde guardaram os objetos apreendidos – no tal quintal abandonado e na casa da mãe do arguido JG nos Gasparões. Prestada essa informação, é com base nesses elementos que as autoridades empreendem as buscas no local e encontram, com os pormenores referidos pela arguida os objetos subtraídos. Sem que existisse relato sobre qualquer outro assalto à residência de MV, na noite referida pela arguida, são retiradas da morada deste, a arma e o televisor, sendo com base no declarado pelos autores do furto que a arguida faculta a localização dos objetos. A arguida não esteve presente, é um facto. Ninguém assistiu à entrada dos arguidos na morada, é um facto. Mas é pelo recurso às presunções judiciais, admissíveis em processo penal, pode o Tribunal, partindo de factos certos – saída dos arguidos e seu regresso à morada onde se encontrava a arguida a quem relataram os factos e contaram pormenores - inferir, por dedução lógica, um facto desconhecido, neste caso os relacionados com a participação dos arguidos, em coautoria, no furto dos objetos propriedade de MV.

Efetivamente, as presunções de facto - judiciais, naturais ou hominis – fundam-se nas regras da experiência comum, sendo dessa apreciação e da normalidade da vida, que se demonstra igualmente, que a entrada na residência foi feita mediante arrombamento, pois que, dele existindo sinais, sem que os arguidos dispusessem de chave da porta de entrada, quem mais, que não os arguidos, teria criado por essa forma a acesso ao interior da habitação, atenta a descrição do estado da porta de entrada da residência se julgou verificado nos factos provados?

Nem mesmo a justificação trazida pela mãe do arguido e filha do ofendido – sobre a permanência do mesmo em casa durante a noite dos factos, sendo por isso impossível que tivesse neles participado - coloca em crise o declarado pela arguida, tanto que se revela inverosímil e de difícil comprovação prática pela progenitora declarante, que certamente – não o disse é certo – não terá passado toda a noite na companhia do filho e a quem se não censura a dificuldade na compreensão do facto, mercê do elo familiar que os une, a si e ao arguido e a ambos à vitima.

Também na valoração de tal meio de prova (por presunção) devem exigir-se, os seguintes requisitos, que no caso se verificam: - pluralidade de factos-base ou indícios (que existem); - precisão de tais indícios estejam acreditados por prova de carácter direto (idem); - que sejam periféricos do facto a provar ou interrelacionados com esse facto (idem); - racionalidade da inferência (ocorrente); - raciocínio de inferência, que acabamos de produzir, e que se firma também na dedução sobre o acesso privilegiado que o arguido JG teria à residência do avô, com o conhecimento sobre o que no seu interior lhes poderia interessar, o que assim foi, ao se deslocarem para a residência do ofendido com o particular propósito de trazerem, pelo menos, a arma.

No mais e em linha de conta tomamos a informação PSP a fls. 2117, comprovando a falta de licença para detenção de arma por parte dos arguidos A e JG.

(…) No que concerne à atividade de tráfico de estupefacientes por A. e J, os factos que se deram por provados assentaram nas declarações por ela prestadas, esclarecedoras, na mesma linha de valoração e de credibilidade reconhecida pelo Tribunal, na busca domiciliária quanto à detenção de produto estupefaciente, rolos de celofane normalmente usados para o acondicionamento das embalagens, balança digital e faca e ainda, quantias avultadas em dinheiro (sendo certo que nenhum destes arguidos desempenhava, à data, qualquer atividade profissional), confirmada pelos militares JR e SS; bem assim se atentou no relatório pericial de fls. 1159, quanto ao produto apreendido, sendo que a aquisição de estupefacientes ao arguido A. foi confirmada pela testemunha LS, não desmentida pela testemunha TM e decorre da análise de fls. 1986 do apenso F.

A verdadeira dimensão desta atividade – quanto semanalmente o arguido A. comprava, quanto vendia, a quem vendia, como era pela arguida, sua namorada, auxiliado com entregas em casa (duas vezes) ou fora dela (uma vez) e receção de telefonemas que também lhe eram feitos, a quem comprava, que substancias comprava e porque preço – no caso da resina de haxixe e de cocaína, quanto perdurou no tempo esta atividade, mormente durante quanto tempo o arguido B. abasteceu o arguido A., em quilos de haxixe adquiridos semanal ou quinzenalmente, como apurado, o modo como entre ambos era feito o negócio, v.g, assume um relevo probatório só encontrado nas declarações da arguida J, a ponto da mesma recear, pelas ameaças que declarou terem sido recebidas por familiares seus, pela sua integridade e destes, que atribuiu ao arguido B. Também nesta matéria é essencial não perder de vista, que a circunstância de ao arguido B. não terem sido feitas apreensões de estupefaciente, produtos de corte, utensílios e de demais parafernália relacionada à atividade de traficância, não o afasta da prática dos factos, antes revela uma atitude sofisticada e já de alguma preparação, sobre o reservar a droga fora de casa ou estabelecer o negócio no quarto da sua residência, preservado de terceiros e fazendo-o apenas na presença do comprador, ou de selecionar os compradores pela pesagem que vendia, eximindo-se ao tráfico de pouca quantidade e à exposição que a venda de quantia pequenas – mas em numero elevado, pela frequência – potencia.

E na verdade, nem obriga a assinalável raciocínio – dado que no processo causal não encontramos desvio ou interrupção - dizer-se que, ainda que a arguida J acompanhe o arguido A. à residência do arguido B, auxilie aquele na cedência de estupefaciente a terceiros - e por isso tem conhecimento da sua atividade, reconhecendo até que as viaturas apreendidas foram adquiridas com o produto da venda de estupefaciente – viaturas e a moto 4 - e saiba que A. se abastece junto deste arguido - em quantidades superiores para a generalidade, mencionando que o arguido B. só vendia em quantidades acima das 100 gr, reservando para outros vendedores, para quem encaminhava, quantidades mais pequenas - aguarde por ele noutra divisão da residência, enquanto ambos concretizam no quarto o negócio, e regresse com ele para casa, na posse do estupefaciente que acabaram de transacionar, prova não foi feita no sentido desta ter sido cedida pelo arguido B. Então, pergunte-se: por quem foi? Alguém na residência do arguido B. lho cedeu, que não fosse este? Prova se fez sobre qualquer desvio que o arguido A. fizesse, saindo da residência deste arguido, encontrando-se com outros indivíduos, que lançasse a dúvida sobre se as substâncias entregues, o tivessem sido por outrem que não o arguido B? É de meridiana clareza esperar do Tribunal uma resposta negativa.

Não existem interceções telefónicas, é um facto. Não existem contactos – ao invés do que sucede com os demais arguidos – mantidos entre o arguido B e, designadamente, o arguido A, é um facto. Mas que desses factos resulte que os arguidos não se contactassem, é um facto não provado. Não privassem? Não combinassem e ajustassem verbalmente o que pretendiam? Tanto mais quanto, se refere a arguida que quem podia adquirir em maior quantidade aguardava pela sua chegada à porta do Café explorado pela sua mãe, sabido também que é que as interceções telefónicas perdem o seu relevo como meio de obtenção de prova, dado o desuso das conversações faladas, a atravessar as próprias redes de tráfico, onde as comunicações se fazem de modo mais evoluído, com recurso a aplicativos de mensagens multiplataforma, com encriptação dos conteúdos, tanto mais seguro para quem trafica como para quem adquire substâncias ilícitas - não sendo, não obstante de estranhar, que ao arguido tivesse sido apreendido um cartão de uma operadora espanhola, porventura, caso mais tempo a investigação tivesse tido, pudesse consubstanciar um elemento probatório a explorar.

Aliás, impõe-se ainda referir que no perfeito exercício da imediação dos atos produzidos em audiência, o receio retaliação pela prestações de declarações incriminatórias produzidas contra o arguido Joaquim, seja pela coarguida declarante, seja pelas testemunhas que depuseram sobre a aquisição de estupefaciente, ressaltou do que disseram, ou do que não quiseram referir, mas fizeram transparecer em trejeitos e afirmações hesitantes não havendo menção sequer – o que não é vulgar no povo alentejano – sobre o reconhecimento de um facto (a cedência) na comunidade local, pequena e pouco estanque aos segredos.

Sobre, todavia, a qualificação que sobre a participação como cumplicidade, quer no tráfico, quer nos furtos, que se aponta à arguida J, entendemos que a sua medida não é a de cúmplice, como se comunicou, posto que na cumplicidade, há ausência do domínio do facto (princípio da acessoriedade), o agente favorece a prática por outrem de um crime, mas está fora do ato típico, não participando na execução do plano criminoso (Orlando Gonçalves, TJ da Guarda, 11/07/2011). Ora, seja nos furtos, efetuando vigias, seja no roubo, amarrando a vítima, seja na entrega de estupefaciente mostra-se exercida função necessária no plano e que é reveladora da sua autonomia no quadro da cooperação (Ac. TRL de 19/11/2008, Carlos Almeida), razão pela qual se decidiram provados os factos vertidos na acusação, que apontam para a participação desta arguida como coautora e não, cúmplice.

(…) A prova dos factos que se prendem com os elementos intelectual e volitivo do dolo dos arguidos, resulta, não só revelado pelo próprio, sob a forma de confissão, ou resultou claramente da demonstração conseguida dos factos objetivos, mostrando-se inferido através da consideração de determinado circunstancialismo objectivo com idoneidade suficiente para revelá-lo, como decorre, sendo ainda no que respeita aos arguidos que praticaram o assalto na residência de MV e detiveram, por isso a arma de fogo, que guardaram na morada dos Gasparões – A. e JG - não sendo os mesmos titulares de licença de uso e porte de tal tipo de arma ou de autorização que legalmente lhe permitisse deter, guardar, adquirir ou usar tal tipo de armas, foram determinantes as regras da experiência comum e da normalidade da vida, considerando, ante a divulgação generalizada, designadamente, através dos meios de comunicação social, sendo tema de conversa entre os populares, designadamente, nos meios em que é comum a detenção de armas de fogo, após a entrada em vigor do Regime Jurídico das Armas e Munições, em 2006, que a detenção de munições de armas de fogo, por parte de quem não fosse titular de licença ou de autorização para deter arma dessa natureza, passou a constituir crime.”

3. Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente, sem prejuízo do conhecimento oficioso dos vícios do art. 410º, nº 2 do CPP (AFJ de 19.10.95), as questões a apreciar nos recursos interpostos pelos três arguidos são (a) a impugnação da matéria de facto e (b) a determinação da pena.

(a) Da impugnação da matéria de facto
Dois dos três recorrentes procedem à impugnação da matéria de facto. Foi esta a opção dos arguidos D e B.

D defende que deverão ser dados como não provados, na parte referente à sua pessoa, todos os factos elencados de 1) a 20) (situações I e II), 41) a 44) (situação IV), 74), 75) e 76), “por se revelarem suportados exclusivamente nas declarações da co-arguida J”.

Assim, dos factos provados, o arguido apenas aceita como correcta a demonstração da factualidade integrante do crime de roubo (que admitiu nas suas declarações ter praticado). Pede, em consequência, a absolvição de todos os restantes crimes por que foi condenado, uma vez que, nessa parte, o juízo de “provado” se teria formado exclusivamente com base em declarações de co-arguida. Contudo, como se explicitará, esta asserção não é verdadeira.

B problematiza igualmente o (des)valor probatório das declarações da co-arguida J, porque desacompanhadas de corroboração probatória, insurgindo-se por isso contra a demonstração dos factos descritos nos pontos 57, 64 e 65.

Acrescenta que estes pontos, os únicos que contêm matéria de facto a si referente (os factos do tipo objectivo do crime), assumem natureza genérica, conclusiva e com conceitos de direito. A matéria de facto não se encontraria assim suficientemente concretizada, concretização que é feita em relação a outros co-arguidos, mas não em relação ao recorrente B.

Comunica, por último, ter sido também “neste sentido que opinou o Ministério Público em sede alegações quando pediu a absolvição do arguido por ausência de qualquer corroboração das imputações verbais da co-arguida J.”, e conclui que “como admite o acórdão recorrido, o Ministério Público e desde sempre o arguido, as declarações da co-arguida J não são corroboradas por qualquer elemento de prova que vá no mesmo sentido, ou seja, de que o arguido B. vendia droga todas as semanas desde data não determinada antes do verão de 2014 ao arguido A.” e “todos os elementos de prova recolhidos pelo OPC são totalmente e integralmente omissos em relação a qualquer tipo de ligação entre o B, a J ou o A”.

Olhando o recurso do arguido D, constata-se que impugna a matéria de facto sem referência à prova gravada. Este arguido não procedeu ao cumprimento dos ónus de especificação das provas imposto pelo art. 412º, nº 3 do CPP, pelo que a detecção de eventuais erros de julgamento só pode processar-se, aqui, pela via da análise do texto do acórdão, no confronto com a argumentação desenvolvida no recurso. Ou seja, por via da detecção dos vícios previstos no art. 410º, nº 2 do CPP, maxime de um erro notório na apreciação da prova.

O art. 412º, nº 3 do CPP viabilizaria a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto por via do recurso amplo, mas este recorrente não se socorreu dessa via, não foi aquela a sua opção. Não especificou concretas provas por referência a concretas passagens em que fundasse a impugnação e que imporiam decisão diversa da tomada no acórdão. Está, assim, afastada a possibilidade de sindicância do acórdão para lá do seu texto.

Este arguido alicerça toda a impugnação da matéria de facto a que procede suscitando um só problema de prova: limita-se a problematizar o (des)valor probatório das declarações de co-arguido e a afirmar que a sua condenação pelos vários crimes (à excepção do crime de roubo, cuja prática admite) se ficou a dever, exclusivamente, à valoração positiva de declarações incriminatórias da co-arguida J.

Já o arguido B, socorrendo-se de idêntica argumentação, optou pela via ampla de impugnação da matéria de facto.

O art. 412º, nº 3 do CPP viabiliza-lhe uma impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto por via do recurso amplo, e o recorrente especificou as concretas provas que, em seu entender, impõem decisão oposta à tomada no acórdão. Concretizou também os pontos de facto que considera incorrectamente julgados: todos os factos provados que lhe dizem respeito. Considerando-se cumpridos os ónus formais de impugnação da matéria de facto, proceder-se-á, neste caso, à sindicância da decisão para lá do seu texto.

De comum, nos dois recursos, surge a necessidade de avaliação do valor probatório das declarações da arguida J.

É de reconhecer a centralidade que a problemática da prova por declaração de co-arguido assume no caso em apreciação e ela encontra-se, por isso, desenvolvidamente tratada no exame crítico das provas, no acórdão.

Antes de se passar ao exame da decisão, consigna-se que, em processo penal, a prova por declarações incriminatórias de co-arguido é prova permitida. Não se encontra legalmente proibida (art. 125º do CPP) e está por isso sujeita a valoração livre, segundo um princípio de livre apreciação das provas (art. 127º do CPP).

No direito positivado, e como norma especial que trate da valoração das declarações de co-arguido, encontramos apenas a regra do nº 4 do art. 345º do CPP, que preceitua que “não podem valer como meio de prova as declarações de um co-arguido em prejuízo de outro co-arguido quando o declarante se recusar a responder às perguntas formuladas nos termos dos nºs 1 e 2”. Os nºs 1 e 2 tratam da formulação de perguntas pelo tribunal e a solicitação do Ministério Público e do defensor.

Daqui se extrai que para as declarações do co-arguido poderem ser valoradas contra o arguido basta que este tenha a possibilidade efectiva de as poder contraditar, de poder contra instar em audiência de julgamento. Tem de lhe ser assegurado o exercício de um contraditório pela prova, e basta este para viabilizar a valoração. E por imperativo legal a ausência de respostas às perguntas do tribunal e/ou a solicitação do Ministério Público e da defesa neutraliza quaisquer efeitos da declaração incriminatória de co-arguido. A ausência de respostas às perguntas deriva normalmente da recusa do próprio declarante em responder. É o caso previsto literalmente no nº 4 do art. 345º do CPP.

Na hipótese sub judice, a co-arguida J não se recusou a responder às perguntas que lhe foram colocadas, pelo que as suas declarações são passíveis de valoração.

Situação diversa da legalidade (versus proibição) da prova por co-arguição é a sua credibilidade. Neste âmbito, desenvolveu-se na doutrina o denominado princípio da corroboração, consistente numa atenção/preocupação acrescida que deve existir por parte do julgador. Este deve procurar a corroboração dessas declarações em outros elementos probatórios, quando está em causa a prova por declarações incriminatórias de co-arguido.

A teoria da corroboração, avançada no plano nacional por Medina de Seiça, acabou por ser acolhida, em maior ou menor medida, por boa parte da jurisprudência.

Nas conclusões da sua dissertação publicada em 1999 (Medina de Seiça, O Conhecimento Probatório do Co-arguido, 1999), o autor chamou a atenção para o facto de as declarações de co-arguido constituírem material probatório que deve requerer uma verificação suplementar traduzida numa exigência de corroboração.

“Com a corroboração significa-se a existência de elementos oriundos de fontes probatórias distintas da declaração que, embora não se reportem directamente ao mesmo facto narrado na declaração, permitem concluir pela veracidade desta. A regra da corroboração traduz de modo particular uma exigência acrescida de fundamentação, devendo a sua falta merecer a censura de uma fundamentação insuficiente” (Medina de Seiça, loc. cit., p. 228).

Trata-se, não de uma regra legal de prova – normativamente, continua a reger aqui o princípio da prova livre - mas de algo deixado ao “cuidado deontológico do aplicador” e que pode contribuir para uma “mais correcta realização da sua livre convicção” (Medina de Seiça, loc. cit., p. 189-190).

Uma avaliação positiva (contra o arguido) de declarações incriminatórias de co-arguido desacompanhadas de qualquer outro contributo probatório, pelo menos minimamente corroborante, quando essas declarações se opõem, por exemplo, às declarações de negação do próprio arguido (ou ao seu silêncio, já que este não o pode desfavorecer) alarga a necessidade de reflexão.

Refira-se também que alguns autores têm vindo a defender que, na avaliação das provas, o juízo sobre as potenciais valências da imediação deve ser até mais contido. E que deve combater-se alguma crença exagerada no que através da imediação se pode obter, questionando tanto a aposta nas capacidades de um juiz que vê directamente a prova, para ler os sinais que assim pode apreender directamente, como na incapacidade do juiz que já não pode ver e, logo, apreender directamente esses mesmos sinais (os juízes dos tribunais de recurso). Alertam para que esta sobreavaliação do papel da imediação poderá estar a assentar numa concepção de um juiz “leitor iluminado”, de um juiz “sobredotado ou treinado para distinguir a verdade da mentira”, bastando para tanto encontrar-se em contacto directo com a prova. O sistema apostaria assim num juiz com tais conhecimentos psicológicos de interpretação sobre a credibilidade dos declarantes e a fiabilidade do declarado, próximo de um juiz-adivinho.

Perfecto Ibañez (que é também juiz do Supremo Tribunal de Justiça de Madrid) questiona este “conhecimento de base subliminar que seria relevante na mística da imediação”, considerando que “deve privilegiar-se o que é recebido sob a forma verbal”, mais do que sob a forma visual, “muito mais objectivável no imprescindível cruzamento de toda a informação probatória procedente das diversas fontes” (Sobre a Formação Racional da Convicção Judicial, Rev. Julgar nº 13, pp. 155-173). O autor defende que a linguagem gestual tem um valor, mas essa valia não será a que lhe damos. Será, sim, a de “relevar como orientador de quem efectua o interrogatório ou a inquirição, que em função da atitude do inquirido ou interrogado, poderá orientar ou modelar as suas perguntas, persistindo ou não em determinada linha”. E aí sim, a imediação revelar-se-ia como um plus. Recomenda que o juiz deve apreciar a declaração ou o depoimento, cotejando-os com o conjunto das outras provas, mas “abstendo-se de extrair arriscadas conclusões de psicólogo”.

Tudo alerta para a fragilidade da segurança da leitura dos sinais, para a debilidade duma decisão de facto dependente apenas destas capacidades de juízes pretensamente aptos a avaliarem sinais de verdadeiro e de falso, quando (ou porque, ou desde que) em contacto directo com as testemunhas.

Dá Mesquita fala na “existência de estudos empíricos que apontam até para a mais valia no plano da capacidade analítica da experiência de audição de um testemunho vídeo por comparação com o testemunho ao vivo”. E alerta para que “a tese de que através das regras da experiência comum e do comportamento não verbal se podem extrair conclusões fiáveis sobre a veracidade do testemunho é objecto de profundas dúvidas” e que “por outro lado, a percepção dos sinais emitidos pela testemunha (alegadamente reveladores da sua integridade e segurança) releva-se carecida de relevo gnoseológico relativamente a testemunhas honestas e confiantes mas enganadas” (A Prova do Crime e o Que se Disse Antes do Julgamento, Coimbra Editora, 2011).

Se estas considerações valem para um depoimento abstractamente desinteressado e insuspeito, as mesmas preocupações, reforçadas até, encontram-se presentes nos casos de declarações incriminatórias de co-arguido, sobretudo quando (ou se) se encontrem absolutamente desacompanhadas de qualquer outro elemento de prova corroborante.

A jurisprudência do STJ tem tratado de modo não uniforme o princípio da corroboração.

Como exemplo vejam-se, “a prova por declarações de co-arguido, não sendo uma prova proibida, tem um diminuto valor e, por isso, carece de corroboração por outras provas e acarreta para o tribunal um acrescido dever de fundamentação” (STJ 12.06.2008, Rel. Santos Carvalho) e “a consideração de que as declarações do arguido se revestem à partida de uma capitis diminutio só pelo facto de ser arguido ofende o princípio da igualdade dos cidadãos. (…) O depoimento incriminatório de co-arguido está sujeito às mesmas regras de outro e qualquer meio de prova, ou seja, aos princípios da investigação, da livre apreciação e do in dubio pró reo. Assegurado o funcionamento destes e o exercício do contraditório, nos termos preconizados pelo art. 32º da CRP, nenhum argumento subsiste contra a validade de tal meio de prova” (STJ 03.09.2008, Rel Santos Cabral).

Também com interesse o acórdão do STJ de 21.03.2007 (Rel. Henriques Gaspar), aliás citado na motivação da matéria de facto do acórdão: “As declarações produzidas por co-arguido não constituem um meio proibido de prova, não se enquadrando em qualquer das previsões do art. 126.° do CPP. Não há, por isso, obstáculo legal à valoração de tais declarações em aplicação do princípio de livre apreciação da prova, nos termos do art. 127° do mesmo diploma. Por isso, as declarações prestadas por co-arguido, que decida livremente prestá-las, podem ser valoradas como meio de prova para a formação da convicção do juiz em temos probatórios, dentro dos poderes de livre apreciação, naturalmente ponderadas e avaliadas todas as contingências sobre a credibilidade que tais declarações comportem: o problema é, assim, de valoração e credibilidade da prova e não de prova proibida.”

O mesmo acórdão do STJ prossegue, agora em parte não mencionada já na decisão recorrida: “Mas, porque a valoração das instâncias não é sindicável pelo Supremo Tribunal (salvo os casos previstos no art. 410.°, n.° 2, do CPP), não se verificando, também, afectação das regras da equidade do processo, uma vez que a condenação não resultou, exclusiva ou predominantemente, de declarações de um co-arguido que o recorrente não tivesse possibilidade de contraditar (cf., v.g., Ac. do TEDH de 05-12-2002, caso CRAXI c. Itália), improcede o alegado fundamento do recurso, de que não poderiam ter sido valoradas as declarações de um co-arguido”. Neste caso, o STJ, reconhecendo a sua ausência de poderes de decisão da matéria de facto, não deixou de escrutinar a eventual existência de vícios do art. 410º, nº 2, do CPP, vícios que afastou perante a evidência de que a condenação não assentara exclusivamente em declarações incriminatórias de co-arguido.

Do quadro legal enunciado, da reflexão doutrinária que a questão tem merecido, e do referente jurisprudencial, resulta que a credibilidade da declaração incriminatória de co-arguido, aferida sempre em concreto e à luz do princípio da livre apreciação, deve suscitar cuidados especiais, devendo passar por uma procura de corroboração. A prudência integra, aqui muito expressivamente, a racionalidade do discurso da motivação da matéria de facto.

Por corroboração terá de entender-se o apoio ou suporte em conteúdos probatórios exteriores às declarações do co-arguido, que, juntamente com elas, permitam concluir pela correspondência destas à verdade. Não se trata de uma exigência de prova da prova por co-arguição, ou de prova sobre prova, mas tão só da presença de algum contributo mais que permita confiar na correcção da versão incriminadora.

A procura de corroboração tenderá a passar pela existência de algum elemento externo (prova externa), exterior à co-arguição.

Aquilo que mina a força probatória da declaração do co-arguido residirá numa possibilidade de suspeição. Essa suspeição baseia-se no interesse pessoal que o co-arguido pode ter no resultado da sua própria declaração: o arguido incrimina outro, para se defender (“não fui eu, foi ele”), para dividir a sua responsabilidade (“não fui apenas eu, fomos os dois”) ou para obter um benefício (atenuação ou dispensa da pena). O arguido pode ter, assim, em concreto, um interesse próprio numa (pseudo) contribuição para a descoberta da verdade.

Por tudo, revela-se prudente desconfiar da co-arguição, não como regra jurídica – esta regra não existe –, mas da declaração de co-arguido que se encontre nestas situações especialmente interessadas e/ou suspeitas. Já relativamente a declaração de arguido fora destas situações poderá não se justificar uma fragilização do seu potencial probatório.

No caso presente, relativamente ao arguido B, era desde logo impossível dissociar o eventual interesse pessoal da co-arguida J. na sua incriminação. Pois tendo em conta o concreto crime em apreciação – de tráfico de estupefacientes - é a própria lei que prevê a premiação do agente que “auxiliar concretamente as autoridades na recolha de provas decisivas para a identificação ou a captura de outros responsáveis, particularmente tratando-se de grupos, organizações ou associações”. O art. 31º do D.L. nº 15/93 prevê para estes casos a possibilidade de atenuação especial da pena, e mesmo a dispensa da pena, assim sucedendo independentemente de, em concreto, tal lhe ter sido efectivamente dito ou prometido ao longo do inquérito, como se apontou no recurso.

Perscrutando mais de perto o acórdão recorrido, constata-se que a prova dos factos imputados ao arguido B. resultou exclusivamente das declarações da co-arguida, como se reconhece com toda a evidência na motivação da matéria de facto.

Da análise dos excertos de prova especificados no recurso (que são, aliás, totalmente coincidentes com as percepções do tribunal de julgamento plasmadas no exame crítico das provas) resulta o desacompanhamento evidente, absoluto e total, das declarações incriminatórias da co-arguida, e a um ponto que não permite concluir ter-se logrado ultrapassar, no presente caso, o standard mínimo de prova que permitiria a passagem da fronteira de uma dúvida razoável.

Ou seja, não se percebe por que razão o colectivo de juízes não permaneceu nessa dúvida, sobre a culpabilidade do recorrente, decidindo-a a seu favor, e, ao ter julgado diferentemente, incorreu em violação do princípio do in dubio pro reo.

Na verdade, há que reconhecer como exactas, na realidade do processo e do julgamento, as afirmações feitas nas conclusões do recurso, que se (re)transcrevem: o único elemento de prova usado pelo acórdão recorrido foram as declarações da coarguida J; como admite o acórdão recorrido, as declarações da co-arguida J não são corroboradas por qualquer elemento de prova que vá no mesmo sentido; todos os elementos de prova recolhidos pelo OPC são totalmente e integralmente omissos em relação a qualquer tipo de ligação entre o B, a J ou o A; a prova testemunhal – essencialmente do OPC GNR – é totalmente omissa em relação a este recorrente; a testemunha JR (GNR) disse que o B. nunca foi suspeito da investigação, que não fizeram nenhuma diligência de prova em relação ao B., que as suspeitas que conduziram à busca tinham que ver apenas com uma TV furtada, referida pela arguida J, e que depois se confirmou que não era a TV furtada, que depois das declarações incriminatórias da J. não fizeram mais nenhuma diligência de prova; que a J. disse em julgamento que nunca viu qualquer droga nos dias em que diz que foi a casa do B; no período de tempo em que a J diz que o arguido B vendeu droga a A. – desde antes do verão de 2014 e até esta data – não existe um único elemento de prova ou dado objetivo que relacione sequer estas pessoas: a. Nunca foram vistos pelo OPC; b. Não era o B. sequer suspeito, ao contrário do A; c. Não existe um único contacto telefónico entre estas pessoas – seja de voz ou escrito; d. Nada foi apreendido que ligasse estas duas pessoas; e. Nada para além da imputação verbal da J; f. Nem mesmo o resultado das buscas ao A e J pode ser confirmativo da sua história com o B, pois de acordo com as declarações da co-arguida, o A. e o B. deixaram de se relacionar a partir do Verão de 2014 e a busca foi efetuada em finais de 2015; o acórdão admitiu frontalmente que não existia nenhuma prova adicional a corroborar a história da co-arguida J.

Todas estas afirmações correspondem à realidade do processo e do julgamento, repete-se

Mas a explicação da formação da convicção do colectivo de juízes revela, quanto a este arguido, outras fragilidades Assim, diz-se a dado passo:

Por isso é defensável que, na ausência de regra tarifada sobre prova por declaração de coarguido, a credibilidade do declarado deve ser sempre aferida em concreto, à luz do princípio da livre apreciação, temperado pela corroboração por outros elementos de prova. Todavia, sempre se dirá que a procura de corroboração não terá de passar necessariamente por prova externa no sentido de prova exterior a toda a co arguição, ou seja a prova da prova.

Na perspetiva do que vimos defendendo, temos que o depoimento de coarguido pode ser suficiente para desvirtuar a presunção de inocência desde que ocorram as seguintes notas: a) ausência de incredibilidade subjetiva derivada das relações entre coarguidos que possam conduzir à dedução da existência de um móbil de ressentimento, inimizade ou tentativa de exculpação; b) verosimilhança: as declarações hão-de estar rodeadas de corroborações periféricas de carácter objetivo que as dotem de aptidão probatória e; c) persistência na incriminação, prolongada no tempo e reiteradamente expressa e exposta sem ambiguidades ou contradições e discutida pelos sujeitos processuais, no desenho do máximo princípio do contraditório.

E é o que manifestamente sucede, se avaliado, de acordo com as regras de experiencia comum e da normalidade da vida, as declarações prestadas pela arguida J que, relativamente aos factos que lhe vem imputados os confessa e, sem que se associem ressentimentos ou qualquer condicionante de ordem subjetiva, explica cada uma das situações que teve conhecimento ou que com os arguidos esteve no plano da coautoria envolvida, encontrando as suas declarações suporte nos demais meios de prova produzidos, mantendo o envolvimento dos demais arguidos nos factos, como relatou, sem ambiguidades ou contradições que serviram de pleno como contributo para a investigação.”

Mas como considerar que Na perspetiva do que vimos defendendo, o depoimento de coarguido pode ser suficiente desde que ocorram as seguintes notas: … as declarações hão-de estar rodeadas de corroborações periféricas de carácter objetivo que as dotem de aptidão probatória. E é o que manifestamente sucede”, e, simultaneamente, considerá-lo suficiente apesar de absolutamente desacompanhado da mais ínfima corroboração?

Como reconhecer queNão existem interceções telefónicas, é um facto. Não existem contactos – ao invés do que sucede com os demais arguidos – mantidos entre o arguido B e, designadamente, o arguido A, é um facto. Mas que desses factos resulte que os arguidos não se contactassem, é um facto não provado”, se o que se impunha era, à acusação, demonstrar precisamente o contrário.

Como valorar contra o arguido um aparentado (pela arguida J) receio de retaliação pela prestação de declarações incriminatórias produzidas contra o arguido B”, se esse receio poderia também ocorrer, e em intensidade superior até, no caso de prestação de declarações incriminatórias inverídicas?

De tudo o que se disse resulta já que o acórdão evidencia um erro de facto no que respeita aos pontos de facto especificados pelo recorrente B.

Mas os três enunciados de facto impugnados sempre mereceriam as restantes críticas que o recorrente lhes teceu.

Assim, se olharmos a redacção dos factos imputados a este recorrente e dados como provados no acórdão, ficamos sem saber, com o nível de determinação e concretização exigidos pelo acusatório, que actos concretos teria este arguido afinal praticado. Quando, quantas vezes e durante quanto tempo teria agido do modo como se lhe imputa. Senão, revejam-se os pontos de facto em crise:

“57) O arguido A passou a adquirir desde data não determinada, mas antes do verão de 2014, ao arguido B, cerca de 2 a 4 kg de canábis em resina por mês, pagando o valor de 150€ cada placa de canábis com o peso de 100g – 1kg por 1500 euros) e cocaína em quantidade não apurada, para o que lhe pagava o valor de 40€ por cada grama.

64) O arguido B, pelo menos desde meados do ano de 2014 vendeu cocaína e canábis em resina ao arguido A., nos termos descritos em 57), o que fazia a outros indivíduos que para o efeito o procuravam, sendo que, pelo menos ao arguido A., nunca vendeu quantidades inferiores a 100g de canábis.

65) O arguido B conhecia a natureza estupefaciente das substâncias que cedeu e pretendia continuar a fazê-lo.”

Mas dos factos provados (e da prova produzida em julgamento) resulta também que a partir de meados de 2014 o arguido A. teria deixado de se abastecer junto deste arguido e passado a socorrer-se de outros fornecedores. Senão, reveja-se:

“58) Em meados de 2014, o arguido A. começou a comprar canábis em resina a indivíduo não identificado, deslocando-se ao Algarve para o efeito, pelo menos uma vez por semana, sendo que pagava o valor de 90€ por cada placa, o que lhe permitia maiores margens de lucro e viver desafogadamente. 58) Com o mesmo intuito, o arguido A. também começou a abastecer-se de cocaína em Badajoz, a uma mulher desconhecida de etnia cigana, pagando cerca de 50€ por cada grama de tal substância com maior qualidade, que posteriormente vendia a 60€ por grama.”

Se “o arguido B, pelo menos desde meados do ano de 2014 vendeu cocaína e canábis em resina ao arguido A, nos termos descritos em 57), o que fazia a outros indivíduos que para o efeito o procuravam”, mas se nenhum outro comprador foi identificado no processo ou consta dos factos provados, e se, a A., deixou de vender em “meados de 2014”, ficaria sem se perceber quais teriam sido então os concretos actos de venda que o arguido teria realizado (vende pelo menos desde meados de 2014 a A., mas A. mudou de fornecedor em meados de 2014).

Por último, reitera insistentemente o mesmo arguido em recurso, e repete-o na resposta ao parecer, que finda a prova produzida em julgamento o Ministério Público pediu a sua absolvição, em alegações. Fazendo-o precisamente por considerar, o magistrado acusador, que a prova produzida contra o arguido, circunscrevendo-se exclusivamente às declarações de J, não poderia levar à condenação.

Insurge-se o arguido contra a defesa da posição contrária, agora em recurso. E apela ao AUJ nº 2/2011, em que o Supremo uniformizou a seguinte jurisprudência: Em face das disposições conjugadas dos artigos 48º a 53º e 401º do CPP, o Ministério Público não tem interesse em agir para recorrer das decisões concordantes com a sua posição anteriormente assumida no processo”.

Não resultando deste acórdão uniformizador a proibição do procedimento concretamente adoptado pelo Ministério Público em recurso, não deixa de se constatar o silêncio do Ministério Público, perante a problematização apresentada pelo recorrente, deixando por explicar a inversão do seu entendimento, em fase de recurso, inversão que não negou e não explicou.

O recurso do arguido B. merece provimento. E procedendo-se, agora, à reparação do erro de facto detectado no acórdão, determina-se que os factos descritos em 57), 64) e 65) dos factos provados passem a integrar a matéria de facto não provada do acórdão.

Da alteração da matéria de facto provada, com a eliminação dos pontos em causa, decorrerá a absolvição deste arguido.

Substancialmente diferente é a situação do recurso do arguido D.

Como se disse, este recorrente alicerçou também a sua impugnação (da matéria de facto) na mesma premissa de que a condenação (ou seja, a demonstração dos factos que realizaram os crimes pelos quais foi condenado) teria assentado exclusivamente nas declarações da co-arguida.

Sucede que, quanto a ele, assim não sucedeu.

Valendo aqui todas as considerações sobre impugnação da matéria de facto e valor probatório de declarações incriminatórias de co-arguido já efectuadas, constata-se que as declarações incriminatórias de J encontram-se agora, na parte referente ao recorrente D, abundantemente complementadas por outros meios de prova, por elementos exteriores a essas declarações.

Estão, corroborados por outros meios de prova importantes, como as localizações celulares que permitiram colocar o arguido num locus delicti (tendo o próprio reconhecido não se ter separado do telemóvel em causa), várias apreensões, vigilâncias, outros depoimentos e declarações, tudo conforme detalhada e correctamente analisado no exame crítico de prova já transcrito em 2. (nos excertos que mais relevam nos recursos), e, nesta parte, de fundamentação irrepreensível,

Não deixa de se destacar agora, pela sua expressividade corroborativa, a passagem alusiva ao depoimento da testemunha militar JR:Referindo que a investigação se iniciou com o conhecimento da subtração de uma máquina de tabaco num Café na Sonega e o furto de uma carrinha de caixa aberta. Depois, o relato que no dia 18 de Março, nas Ermidas, uma senhora de idade teria sido alvo de um roubo, tendo nessa situação sido avistada uma viatura Fiat Stylo, relacionada com os factos e que os conduziu aos suspeitos. Encontraram nas coisas deixadas, uma fita adesiva que serviu para manietar a ofendida, Sra. GM. Foram efetuadas diligências para localização dos suspeitos. Na noite de 18 para 19, encontraram a localização do A, vindo as diligencias que realizaram na investigação a associa-lo também ao furto da viatura de carrinha de matrícula BF com que foi realizado o assalto ao café da Sonega, viatura que veio a ficar abandonada e na proximidade desta, a máquina de tabaco de lá retirada. Confirma ter Participado na Busca à residência do A., onde apreenderam 2 placas de haxixe, 1100 euros em dinheiro, mais pedaços pequenos de haxixe, 2 relógios e uma TV, proveniente de um outro furto, no Monte da Barragem. A sorte da investigação e do que foi possível alcançar em termos probatórios assentou na colaboração prestada pela arguida J esclareceu todos os factos e colaborou na identificação dos restantes arguidos, sendo também da prestada, no desempenho dos factos, pelo arguido A. A arguida J. procedeu ainda a entrega de uma aliança – furtada na ourivesaria, através da sua avó. Procederam a inspeção ao local ao estabelecimento – ourivesaria – comprovando que a entrada no estabelecimento foi feita com o recurso a chave de fendas. A arguida J afirmou ter sabido que a Cátia e a Marta teriam sido as pessoas que teriam indicado os locais para os furtos da ourivesaria e que a venda dos objetos teria sido feita em Espanha, o que comprovaram através da análise das localizações celulares aos telefones dos arguidos A. e M,, que os posicionam nesses factos.

Relativamente ao episódio imputado ao arguido A. e JG – furto de bicicleta, arma e TV do avô furtados – confirma as diligencias feitas no inquérito, sendo confrontado com o teor de fls. 62 e , com fls. 163-164 – localizações celulares, referindo ser sua crença que no episódio da Sonega, a arguida J. deve ter estabelecido contacto com a Joana, mencionando onde estavam. Quanto à Localização dos objetos subtraídos, refere que com uma exceção, das buscas feitas não chegaram a ser recuperados. A arguida J referiu que a televisão retirada do café Campos tinha sido entregue ao arguido B. Na busca que realizaram à morada deste arguido, encontravam-se lá duas televisões com o número de série retirado. Os referidos aparelhos foram abertos e concluíram que os televisores não pertenciam aquele furto. Foi confrontado com a análise de localizações celulares – fls. 1828 e seguintes, de fls. 1831, sobre o resumo de todas as localizações celulares dos arguidos. No respeitante ao Furto da Ourivesaria e ao furto da carrinha, referiu-se a apurada localização dos 3 arguidos, atentando ainda no teor de fls. 1891: cliché fotográfico. Relativamente aos reconhecimentos dos arguidos, refere que a ofendida G reconheceu os arguidos – 2 – J. e D. Realizou também a busca à morada do B. A J não era conhecida até a data da detenção, nem suspeita da prática de qualquer facto. O M, desde 2007, foi dos primeiros que foi detido pelo NIC de Santiago., por furtos de máquinas de tabaco. Referente ao arguido B. aperceberam-se que acompanhava ultimamente o A. A Cátia e a Márcia eram conhecidas na vila por acompanhar indivíduos mais velhos. Uma das pessoas que acompanharia com ela – Marta - seria o ofendido da ourivesaria e seriam pontualmente trabalhadoras em restaurantes. Relativamente ao Fiat Stylo – confrontado com Fls. 316 e – refere que a data da detenção, o arguido A. era já portador de carta de condução. Era, por lhe pertencer, habitualmente o condutor da viatura e dizia aos outros arguidos que não possuíam kit de unhas para conduzir o carro.”

Tendo o recorrente D centrado a impugnação no pretenso isolamento das declarações incriminatórias da co-arguida, argumentação que não corresponde à verdade do processo e do julgamento, a sua falta de razão na procura da demonstração de um erro de facto é evidente.

Os recursos são sempre remédios jurídicos, que visam detectar e corrigir erros de julgamento, devendo também aceitar-se que existe uma margem de insindicabilidade na decisão do juiz de primeira instância. E constatando-se que não se vislumbram desconformidades entre a prova produzida e a percepção que dela foi feita, que inexistem provas proibidas ou produzidas fora dos procedimentos legais, que o tribunal justificou aqui suficientemente as opções que fez na valoração dos vários contributos probatórios, atribuindo-lhes valor positivo ou negativo de um modo sempre racionalmente justificado, de acordo com regras de lógica e de experiência comum e com respeito pelo princípio do in dubio pro reo, resta à Relação confirmar a decisão da matéria de facto, na parte ora em apreciação. Matéria de facto que é suficiente para justificar, depois, a decisão de direito a que, relativamente a este arguido, se chegou no acórdão.

(b) Da determinação das penas
Recorrem da pena os arguidos A e D.
Concluindo que “o tribunal a quo violou os artigos 40º, 71º e 77 do CP” e que “a pena única de doze anos é excessiva e desproporcional aos fins da prevenção especial, ultrapassa a medida da culpa, e deve ser reduzida”, A. pede “que lhe seja aplicada uma pena mais próxima dos limites mínimos.”

Na motivação do recurso pouco acrescenta, limitando-se a alegar que “a pena que lhe foi aplicada é excessivamente severa e desproporcional aos fins da prevenção especial. Nomeadamente as necessidades de prevenção especial não são tão significativas uma vez que o arguido não tem antecedentes criminais por tráfico de estupefacientes, roubo e crime de detenção de arma proibida. Ou seja, o Tribunal a quo não ponderou todas as circunstâncias a favor do arguido, nomeadamente o passado criminal arguido que não regista alguns antecedentes criminais pela prática de crimes de idêntica natureza, o dolo com que actuou em alguns dos crimes, o modo de execução, tendo em alguns dos casos as penas impostas ultrapassado a medida da culpa.” Não se percebe se está a recorrer apenas da pena única ou se a sua impugnação abarca também as penas parcelares. E é tudo.

Já o arguido D procede claramente à impugnação das penas parcelares e da pena única.

Alega que as penas parcelares são excessivas e desproporcionadas, que as condições pessoais, sociais e familiares do recorrente, conforme o que vem plasmado nos factos pessoais e antecedentes criminais, é revelador que não se mostram incisivas as exigências de prevenção especial, que o arguido confessou a participação nos factos respeitantes ao crime de roubo, mostrou-se arrependido e é primário, estando inserido familiar e socialmente. Justificar-se-ia, assim, a redução de todas as penas parcelares, a fixação da pena única em 5 anos de prisão, e a suspensão na execução.

Reitera-se que os recursos não são re-julgamentos da causa, mas sempre “remédios jurídicos”. E também em matéria de pena o recurso mantém o arquétipo de remédio jurídico.

Daqui resulta que a Relação intervém na pena, alterando-a, apenas quando detecta incorrecções ou distorções no processo aplicativo desenvolvido em primeira instância, na interpretação ou aplicação das normas e princípios legais e constitucionais que regem a pena. Não decide como se o fizesse ex novo, como se inexistisse uma decisão de primeira instância, pois o recurso não visa, não pretende e não pode eliminar alguma margem de actuação, de apreciação livre, reconhecida ao tribunal a quo enquanto componente individual do acto de julgar.

Dentro desta margem de actuação, impõe-se reconhecer o acerto no processo aplicativo da pena desenvolvido em primeira instância, o que se constata em relação aos dois recorrentes.

Assim, a fundamentação da pena foi, no acórdão, a que segue, passando a transcrever-se a parte que mais releva para os dois recursos:

“Realizado o enquadramento jurídico-penal da conduta dos arguidos, cumpre determinar a pena concretamente aplicável atendendo à abstratamente prevista, aos critérios de escolha e de fixação da medida da pena e às suas finalidades.

Nos termos do disposto no n.º 1 do art. 40.º do C. Penal, "a aplicação de penas e de medidas de segurança visa a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade".

Face ao disposto no nosso ordenamento jurídico, «o modelo da determinação da pena mais adequada é aquele que comete à culpa a função de determinar o limite máximo e inultrapassável da pena; à prevenção geral a função de fornecer uma “ moldura de prevenção”, cujo limite máximo é dado pela medida ótima de tutela de bens jurídicos – dentro do que é consentido pela culpa – e cujo limite mínimo é fornecido pelas exigências irrenunciáveis de delegar do ordenamento jurídico: e à prevenção especial a função de encontrar o quantum exato da pena, dentro da referida “ moldura de prevenção” que melhor sirva as exigências de socialização (ou, em casos particulares, de advertência ou de segurança) do delinquente» ( cfr. Ac. do S.T.J. de 9 / 11/ 96, B.M.J. n º 441, pág. 145).

Nesta esteira, não é de mais recordar que o limite abaixo do qual a pena não pode descer é o que resulta da aplicação dos princípios da prevenção geral segundo os quais a pena deve neutralizar o efeito negativo do crime na comunidade e fortalecer o seu sentimento de justiça e de confiança na validade das normas violadas, além de constituir um elemento dissuasor.

Além disso, a medida da pena tem de corresponder às expectativas da comunidade. Desse ponto ideal, para cima, a medida exata da pena é a que resulta das regras da prevenção especial, ou seja, é a medida necessária à reintegração do indivíduo na sociedade, devendo causar-lhe apenas o mal necessário.

Por isso, em nenhum outro momento o Juiz incorpora tão dramaticamente a Justiça, como quando fixa a pena aplicável, sendo certo que a lei não conhece indivíduos, prevendo apenas espécies – cf. R. Salleilles, “ La Individualisation de la Peine”, Étude de Criminalité Sociale, Paris, 1927, pág. 267.

Do teor do referenciado art. 40.º decorrem assim quatro postulados básicos que devem orientar o julgador na escolha e na determinação da medida da pena, partindo do pressuposto de que “culpa e prevenção são os dois termos do binómio com auxílio do qual há-de ser construído o modelo de medida da pena” (Jorge Figueiredo Dias, "Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime", § 280, pp. 214).

O primeiro, consiste no princípio de que as finalidades da pena só podem ter natureza preventiva - seja de prevenção geral, positiva ou negativa, seja de prevenção especial, positiva ou negativa e nunca puramente retributiva.

A pena deve, pois, prosseguir finalidades de prevenção geral e especial, combinando-as da melhor forma, pois ambas visam o mesmo propósito de prevenir a prática de crimes futuros (Jorge Figueiredo Dias, "Temas Básicos da Doutrina Penal", pág. 104 e 105).

A protecção dos bens jurídicos, sendo estes determinados por referência à ordem axiológica jurídico - constitucional, implica a rejeição de uma legitimação da intervenção penal assente numa qualquer ordem transcendente e absoluta de valores. Por isso, a aplicação da pena não pode fundar-se em exigências de retribuição ou de expiação da culpa, sem qualquer potencial de utilidade social, mas apenas em propósitos preventivos de estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma violada (Figueiredo Dias, R.P.C.C., Ano 1, 1991, pp. 17 e 18; Jorge Figueiredo Dias, "Temas Básicos da Doutrina Penal", pp. 106).

Como vimos e configura segundo postulado, encontram-se as exigências da prevenção geral positiva ou de integração, que representam as necessidades de tutela dos bens jurídico - penais no caso concreto, de tutela da confiança e das expectativas da comunidade na manutenção da vigência da norma violada.

Estas exigências fornecem uma moldura de prevenção dentro de cujos limites podem e devem atuar considerações de prevenção especial, estabelecendo um limiar máximo, que coincide com o ponto ótimo de tutela dos bens jurídicos, e um ponto mínimo, que coincide com as exigências mínimas de defesa do ordenamento jurídico (Jorge Figueiredo Dias, ob. cit, pp. 107).

Como terceiro postulado, as exigências da prevenção especial, nomeadamente da prevenção especial positiva ou de socialização determinam que a pena deve corresponder às necessidades de socialização. Excecionalmente, sendo improvável o sucesso de qualquer tentativa de (res)socialização, é possível considerar que a pena tenha por finalidade primordial a prevenção especial negativa, de inocuização ou de protecção social contra a perigosidade do agente (Jorge Figueiredo Dias, ob. cit., pp. 108).

Por fim, como quarto e último postulado, consagra-se no n.º 2 do art. 40.º do C. Penal o princípio de que a culpa representa o limite inultrapassável da pena. A culpa traduz-se, então, no limite máximo de pena ainda compatível com as exigências de preservação da dignidade da pessoa e de garantia do livre desenvolvimento da sua personalidade nos quadros próprios de um Estado de Direito democrático (Jorge Figueiredo Dias, "Temas Básicos da Doutrina Penal", pp. 109 e 110; Jorge Figueiredo Dias, Direito Penal Português, § 282, pp. 216 e segs.).

São estes os parâmetros que, nos termos dos arts. 70.º e 71.º, ambos do C. Penal, devem ser tidos em conta nas operações de escolha e determinação da medida concreta da pena.

Para o efeito de determinação da medida concreta ou fixação do quantum da pena, o juiz serve-se do critério global contido no artigo 71.º do Código Penal, estando vinculado aos critérios de escolha da pena constantes do preceito.

Com Figueiredo Dias, só finalidades relativas de prevenção, geral e especial, não finalidades absolutas de retribuição e expiação, podem justificar a intervenção do sistema penal e conferir fundamento e sentido às suas reações específicas. (...) Prevenção geral, porém, não como prevenção geral negativa, de intimidação do delinquente e de outros potenciais criminosos, mas como prevenção positiva ou de reintegração, isto é, de reforço da consciência jurídica comunitária e do seu sentimento de segurança face à violação da norma ocorrida”. E a “culpa e prevenção são os dois termos do binómio com o auxílio do qual há-de ser construído o modelo da medida da pena em sentido estrito”.

Como referido pelo citado professor “tomando como base a ideia de prevenção geral positiva como fundamento de aplicação da pena, a institucionalidade desta reflete-se ainda na capacidade para abranger, sem contradição, o essencial do pensamento da prevenção especial, maxime da prevenção especial de socialização. Esta (…) não mais pode conceber-se como socialização «forçada», mas tem de surgir como dever estadual de proporcionar ao delinquente as melhores condições possíveis para alcançar voluntariamente a sua própria socialização (ou a sua própria metanoia, enquanto processo de conversão); o que, de resto, supõe que seja feito o possível para que a pena seja «aceite» pelo seu destinatário - o que, por seu turno, só será viável se a pena for uma pena suportada pela culpa pessoal e, nesta aceção, uma pena «justa». (…)

Por isso, a pena orientada pela prevenção geral positiva, se tem como máximo possível o limite determinado pela culpa, tem como mínimo possível o limite comunitariamente indispensável de tutela da ordem jurídica. É dentro destes limites que podem e devem atuar pontos de vista de prevenção especial - nomeadamente de prevenção especial de socialização - os quais, deste modo, acabarão por fornecer, em último termo, a medida da pena. (…) E é ainda, em último termo, uma certa conceção sobre a ordem de legitimação e a função da intervenção penal que torna tudo isto possível: parte-se da função de tutela de bens jurídicos; atinge-se uma pena cuja aplicação é feita em nome da estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma violada; limita-se em seguida esta função pela culpa pessoal do agente; para se procurar atingir a socialização do delinquente como forma de excelência de realizar eficazmente a proteção dos bens jurídicos.

No caso, temos como moldura penal abstrata prevista para o ilícito de:
• furto simples: um (1) mês a três (3) anos de prisão;
• furto qualificado nos termos do n.º 2, al. e) do Código Penal: dois (2) a oito (8) anos de prisão;
• roubo simples, na forma tentada: de um (1) mês a cinco (5) anos e quatro (4) meses de prisão;
• detenção de arma proibida: de um (1) ano a cinco (5) anos de prisão ou multa até seiscentos (600) dias;
• tráfico de estupefacientes: de quatro (4) a doze (12) anos de prisão;
• tráfico de estupefacientes de menor gravidade: de um (1) ano a cinco (5) anos de prisão;
• condução sem carta: pena de prisão até dois (2) anos ou multa até duzentos e quarenta (240) dias.

Desta forma, atender-se-á, in casu, ao:
- O dolo dos arguidos que é, em todas as situações, direto e de intensidade normal, ressaltando a este nivel o dolo dos arguidos J, A e B, para o tipo comum do tráfico, ou do tipo privilegiado, a modalidade de dolo direto, cuja intensidade se revela acentuada, sendo no referente aos arguidos A, e B. que não se abstiveram de alcançar, através da atividade relacionada ao tráfico de droga, a obtenção de proventos económicos;

- O grau de ilicitude do factos apresenta-se, em todas as situações criminógenas, elevado, sendo quanto ao tráfico de estupefacientes (obviamente com referência ao tipo de crime que respetivamente os três arguidos envolvidos perpetraram), em ambos os casos, elevado também ele, tendo em conta, o período de tempo em que, respetivamente, desenvolveram a atividade de tráfico, a natureza do produto objeto da mesma, cocaína, substância altamente tóxica, tratando-se de uma das drogas que mais rápida habituação produz, causando fortíssima dependência psicológica, sendo as consequências do seu consumo altamente perniciosas, tanto para o consumidor como para a sociedade, estando incluídas no grupo das chamadas "drogas duras" e haxixe, que era transacionado entre, pelo menos, os arguidos B e A em quantidades consideráveis, sendo de valorar o papel que cada um assumia na hierarquia do tráfico de droga, em que B. abastece A. e evidencia um código comportamental só praticado por quem está posicionado confortavelmente nessa atividade;

- O modo de execução dos furtos mostra-se homogéneo e o lapso de tempo em que os factos se verificaram mostra-se delimitado a um curto período temporal – Fevereiro, Março, Julho e Novembro de 2014;

- Ao nível do crime de roubo tentado, o modo de execução do facto e a gravidade das consequências que é notória e absolutamente considerável, a reclamar particular exigência ao nível da prevenção geral, tal forma se torna reprovável e censurável a atitude dos arguidos e o alarme social relacionado com os assaltos a residências em que as vitimas integram o estrato da população idosa e por isso, na sua generalidade indefesa, sendo expressivo, dentro do quadro de execução do roubo, o grau de violência usado para com GM, que se vai ponderar acima do ponto médio para os arguidos executores da violência e abaixo, para os outros três arguidos;

- Releva ainda para a determinação concreta da pena a quase inexistente recuperação dos objetos subtraídos, o seu valor, com particular expressão no assalto aos estabelecimentos de Ourivesaria (€50.000) que há de assim ter reflexo concreto e do Café Campos, em que ressalta o valor da máquina de tabaco e respetivo conteúdo, e sua não restituição ao ofendido;

- (…) A assunção pouco genuína e parcial acrescida de uma postura desculpabilize-te a que não se atribui importância por ai além, dada a esmagadora prova dos factos, produzida em audiência e envolvente nos factos do declarante D (…);

- Neste conspecto, as condenações dos arguidos A. (…) por factos anteriores qualificados como crimes (…);

- As exigências de prevenção especial, por seu turno, revelam-se também, no que ao crime de detenção de arma se refere, uma intensidade alta, na medida em que os arguidos detinham esta arma, que a furtaram a um familiar próximo e a guardaram, escondida, sabendo claramente que a não podiam deter.

- Há que ponderar, ainda, as exigências de prevenção geral e especial, sendo indubitavelmente elevadas as necessidades de prevenção geral, numa sociedade em que se assiste a um constante aumento do tráfico e consumo de estupefacientes, com todas as consequências e sequelas incalculavelmente graves daí decorrentes, designadamente ao nível da saúde pública e do aumento da criminalidade, podendo tal fenómeno ser hoje considerado uma verdadeira chaga social e sendo as necessidades de prevenção especial acentuadas, em relação aos arguidos A. e B.
(…)
Tudo visto e ponderado, consideramos ajustadas as seguintes penas que parcelarmente se impõe aos arguidos, sendo desde já diremos que, para os crimes que preveem a aplicação da pena de multa – e porque, face ao princípio da subsidiariedade da intervenção penal, existe um princípio de preferência pelas reações criminais não detentivas face às detentivas – o Tribunal afasta, a aplicação de pena não detentiva, aos arguidos que dela beneficiam na moldura penal, em razão de, atenta a natureza dos factos e os fins das penas, se entender que a imposição de pena de multa se revela inadequada ou insuficiente à prevenção.

Assim: (…)
- A, pela prática em coautoria material, de um crime de furto simples, p. e p. pelo art. 203º do C.P (Toyota Hilux) a pena de um (1) ano e três (3) meses de prisão; de quatro crimes de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203º, nº 1, e 204º, nº 2, e), do C.P, nas penas respetivamente de três (3) anos e oito (8) meses de prisão (Café Campos), quatro (4) anos e seis (6) meses de prisão (Ourivesaria), dois (2) anos e seis (6) meses de prisão (Monte da Barragem), de dois (2) anos e oito (8) meses de prisão (residência de MV), de um crime de roubo simples, na forma tentada, p. e p. pelos arts. 210º, nºs 1 do CP, na pena de três (3) anos de prisão; pela prática de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art. 86º, nº 1, c), por referência aos arts. 2º, nº 1, p) e s), 3º, nºs 1 e 6, a), 8º e 15º, todos do Regime Jurídico das Armas e Munições aprovado pela Lei nº 5/2006, de 23-02, na redação dada pela Lei nº 50/2013, de 24-07, na pena de um (1) ano e seis (6) meses de prisão; pela prática de três crimes de condução de veículo automóvel sem habilitação legal, p. e p. pelo art. 3º, nºs 1 e 2 do DL nº 2/98, de 02-01, na pena, para cada um deles, de oito (8) meses de prisão, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21º e do DL 15/93, de 22-01, na pena de seis (6) anos e seis (6) meses de prisão.
(…)
- D, pela prática pela prática em coautoria material, de um crime de furto simples, p. e p. pelo art. 203º do C.P (Toyota Hilux) a pena de um (1) ano prisão; de três crimes de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203º, nº 1, e 204º, nº 2, e), do C.P, nas penas respetivamente de três (3) anos e quatro (4) meses de prisão (Café Campos), três (3) anos e oito (8) meses de prisão (Ourivesaria), dois (2) anos e quatro (4) meses de prisão (Monte da Barragem), de um crime de roubo simples, na forma tentada, p. e p. pelos arts. 210º, nºs 1 do CP, na pena de quatro (4) anos de prisão.
(…)

V – Da pena única
Aqui chegados, e tratando-se de condenação em penas parcelares, haverá que proceder à realização do cúmulo jurídico ditada pelo artigo 77.º, n.º 1, do Código Penal, ao dispor que quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa única pena.

Delimitados os crimes e penas que integram o cúmulo jurídico, preceitua o citado artigo que, na opção da medida da pena única devem ser considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente.

Os factos e a personalidade do agente são, no dizer de Figueiredo Dias (Direito Penal Português, As consequências Jurídicas do Crime, Editorial Notícias, 1993, fls. 291) as duas faces do binómio que devem fundamentar e determinar a medida exata da pena conjunta a aplicar aos arguidos, impondo-se que a determinação da pena conjunta se faça em função das exigências gerais de culpa e de prevenção, avaliando o conjunto dos factos, a gravidade do ilícito global perpetrado, e decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique.

As circunstâncias referenciadas para a determinação da medida das penas parcelares, valem também para a determinação da pena conjunta, devendo por isso valorar-se a culpa global e as exigências de prevenção.

Dispõe o art. 77.º, n.º 1 do C. Penal que, “quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa única pena. Na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente”.

Por seu turno, o nº 2 do mesmo artigo, dispõe que, “a pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos tratando-se de pena de prisão e 900 dias tratando-se de pena de multa; e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes”.

O limite mínimo da pena única a aplicar, nos termos do art 77.º n.º 2, do C. Penal, será, então, a mais elevada das penas concretas concorrentes, e o limite máximo a soma de tais penas.

No que aqui releva, da avaliação da concreta conduta dos arguidos, do seu modo de atuar junto da vítima GM, da aferição do dolo com que praticaram os factos, da sua postura perante os mesmos de confissão, da análise ponderada da integração pessoal e social do arguidos à data da prática dos factos e do momento atual - o panorama circunstancial da imagem global dos factos – dita a aplicação aos arguidos

(…) A. de uma pena única e conjunta de DOZE (12) anos de prisão – limite mínimo de 6 anos e 6 meses prisão e limite máximo de 25 anos (adição material: 27 anos).

(…) D. de uma pena única e conjunta de SETE (7) anos de prisão – limite mínimo de 4 anos e 6 meses e limite máximo de 14 anos e 4 meses de prisão (…).”

Como se disse, na impugnação da (sua) pena, o arguido A. limitou-se a referir que “o Tribunal não ponderou todas as circunstâncias a favor do arguido, nomeadamente o passado criminal arguido que não regista alguns antecedentes criminais pela prática de crimes de idêntica natureza, o dolo com que actuou em alguns dos crimes, o modo de execução, tendo em alguns dos casos as penas impostas ultrapassado a medida da culpa.”

Mas contrariamente ao alegado, ficou provado (cf. factos do acórdão) que sofreu condenações por crimes de natureza idêntica a alguns dos crimes que voltou agora a cometer, ou seja, reiterou o cometimento de crimes idênticos aos já cometidos e praticou ainda outros de diferente natureza e maior gravidade. Tem uma condenação anterior por crime de furto qualificado, na pena de 6 meses de prisão substituída por 180 horas de trabalho a favor da comunidade, e quatro condenações por crime de condução sem habilitação legal, nas penas de multa (principal e de substituição) e de prisão suspensa.

Independentemente das razões que este arguido tenha ou não alegado, não ficaria a Relação dispensada de proceder à correcção da(s) pena(s) no caso de detectar alguma (outra) distorção no iter aplicativo. Mas revelando-se que as penas parcelares se mostram aplicadas e determinadas de acordo com os princípios da proporcionalidade e necessidade da pena, ajustadas à culpa do arguido e às necessidades preventivas que o acórdão correctamente identificou, nada se impõe alterar.

O mesmo sucede relativamente ao recorrente D.
Este arguido centrou a sua impugnação na afirmação de que as exigências de prevenção especial seriam, no seu caso, mais reduzidas. O que resultaria das circunstâncias de ser primário, ter adequada inserção social e familiar e ter confessado o crime de roubo tentado.

Mas todas estas circunstâncias foram devidamente ponderadas no acórdão. À confissão (de apenas um dos crimes imputados) foi dada a (pouca) relevância que merecia, pelas razões que o acórdão desenvolve; a inserção familiar e social e a ausência de antecedentes criminais conduziu já à fixação de penas mais reduzidas, por comparação, por exemplo, com as penas fixadas ao co-arguido A. pela comparticipação nos mesmos crimes.

E haveria sempre que considerar as prementes exigências de prevenção geral.

Na fixação das penas únicas também o tribunal procedeu à devida reavaliação dos factos em conjunto com a personalidade de cada um dos arguidos (art. 77º, nº1 do Código Penal), procedendo a uma fundamentação “em função das exigências gerais de culpa e de prevenção (Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As consequências jurídicas do crime, 2005, p. 291).

Na conhecida lição de Figueiredo Dias, “tudo deve passar-se como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique. Na avaliação da personalidade – unitária – do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência criminosa ou tão só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta. De grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização) (loc. cit.).

No caso sub judice, as penas únicas mostram-se fixadas significativamente abaixo do ponto médio das molduras abstractas (do cúmulo jurídico), nenhum reparo merecendo.

Resta reconhecer o acerto no processo aplicativo da pena desenvolvido em primeira instância, patente no acórdão, e confirmar todas as penas fixadas pelo colectivo de juízes e agora impugnadas.

4. Face ao exposto, acordam na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora em:

- Julgar procedente o recurso do arguido B, procedendo-se à alteração da matéria de facto a ele respeitante, conforme descrito em 3.a), e absolvendo-o do crime por que estava condenado;

- Julgar improcedentes os recursos dos arguidos A. e D., confirmando-se, quanto a eles, o acórdão.

Custas pelos recorrentes A. e D., que se fixam em 4 UCC e em 5UC, respectivamente (arts 513º /1 e 514º/1 CPP e 8º/5 e Tab. III RCP).

Évora, 15.11.2016

(Ana Maria Barata de Brito)

(Maria Leonor Vasconcelos Esteves)

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[1] - Sumariado pela relatora.