Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
3232/16.6T8FAR.E1
Relator: JOÃO NUNES
Descritores: CONTRA-ORDENAÇÃO LABORAL
CONTRA-ORDENAÇÃO LEVE
ADMOESTAÇÃO
RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA
ADMINISTRADOR
Data do Acordão: 11/22/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário: I – O n.º 3 do artigo 551.º do Código do Trabalho, ao estabelecer que se o infractor for uma pessoa colectiva ou equiparada, respondem pelo pagamento da coima, solidariamente com aquela, os respectivos administradores, gerentes ou directores, não imputa a estes qualquer solidariedade quanto à infracção, mas apenas a solidariedade quanto ao pagamento da coima, de forma a garantir o pagamento desta face a quaisquer riscos decorrentes do funcionamento da pessoa colectiva.
II – Decorre do artigo 48.º da Lei n.º 107/2009, de 14-09, que a sanção de admoestação só pode ser aplicada se, cumulativamente, (i) a infracção consistir em contra-ordenação classificada como leve, e (ii) houver reduzida culpa do arguido.
(Sumário do relator)
Decisão Texto Integral:
Proc. n.º 3232/16.6T8FAR.E1
Secção Social do Tribunal da Relação de Évora[1]

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:

I. Relatório
BB, devidamente identificado nos autos, na qualidade de responsável solidário, impugnou judicialmente a decisão da Autoridade para as Condições de Trabalho (Unidade Local de Faro) que condenou CC, S.A., em cúmulo jurídico, na coima de € 6.000,00 e ainda na sanção acessória de publicidade.
A referida condenação resulta de infracção ao disposto (i) no artigo 263.º, n.º 1 do Código do Trabalho (falta de pagamento a alguns trabalhadores do subsídio de Natal de 2012), (ii) no artigo 264.º, n.º 2, do mesmo compêndio legal (falta de pagamento a alguns trabalhadores do subsídio de férias de 2012) e (iii) no artigo 278.º, n.ºs 2 e 4, também do Código do Trabalho (falta do pagamento da retribuição devida a alguns trabalhadores a partir de Março de 2013).
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Por sentença de 09 de Fevereiro de 2017, da Comarca de Faro (Juízo do Trabalho de Faro – J2) foi negado provimento ao recurso e confirmada a decisão administrativa impugnada.
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De novo inconformado, o recorrente interpôs recurso para este Tribunal da Relação, tendo na respectiva motivação formulado as conclusões que se transcrevem:
«a) a sentença recorrida, ao concluir pela imputação subjectiva das contra-ordenações, enferma de erro de julgamento, na medida em que não considera devidamente á efectiva situação de impossibilidade de pagamento tempestivo por parte da sociedade arguida, derivada de factos temporalmente definidos (dividas de enorme volume e situação de insolv[ê]ncia [i]minente) causais do não pagamento imediato, mas da celebração de acordos de pagamento, não concretizados pela inviabilidade de pagamento preferencial imanente á insolvência, estando-se, assim, perante uma situação de exclusão de responsabilidade contra-ordenacional;
c) no que ao recorrente directamente concerne, o seu accionamento é derivado do nº 3 do artigo 551º do Cód. do Trabalho/2009, norma essa que padece de inconstitucionalidade material por violar o disposto no nº 3 do artigo 30º Constituição da Rep. Portuguesa, devendo ser recusada a sua aplicação;
d) quando assim se não entenda, por se mostrarem reunidos os pressupostos do art. 51º do DLCO, á luz do art. 20º do mesmo Regime Juridico, apta se revela a aplicação de uma admoestação;
e) a sentença impugnada viola os comandos legais acima assinalados.
Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a sentença recorrida, com as legais consequências, por ser de JUSTIÇA».
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Por despacho de 07-03-2017, o recurso foi admitido na 1.ª instância, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
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Ainda na 1.ª instância, o Ministério Público respondeu ao recurso, a pugnar pela sua improcedência, assim concluindo a respectiva motivação:
«A. A sem razão da recorrente vem largamente demonstrada na decisão administrativa e na sentença.
B. Esta merece total confirmação».
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Recebidos os autos neste tribunal, presentes à Exma. Procuradora-Geral Adjunta neles emitiu parecer, que não foi objecto de resposta, no qual, louvando-se na resposta ao recurso apresentada pelo Ministério Público na 1.ª instância, se pronunciou pela improcedência do recurso.
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II. Objecto do recurso e factos
Sabido como é que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso, que aqui não se colocam [cfr. artigos 403.º e 412.º, n.º 1, ambos do Código de Processo Penal, ex vi do artigo 41.º, do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro (Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas) e do artigo 50.º, n.º 4, da Lei n.º 107/2009, de 14 de Setembro (diploma que estabelece o regime jurídico processual aplicável às contra-ordenações laborais e de segurança social)], no caso são as seguintes as questões a decidir:
1. saber se é de imputar a título negligente a contra-ordenação a CC, S.A.;
2. se o n.º 3 do artigo 551.º do Código do Trabalho padece de inconstitucionalidade material, por violação do disposto no n.º 3 do artigo 30.º da CRP;
3. caso assim se não entenda, se ao caso será de aplicar apenas uma sanção de admoestação.
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Com vista a tal decisão, importa atender à matéria de facto dada como provada na instância recorrida:
A) A arguida CC, S.A. tem como actividade o transporte rodoviário de mercadorias e sede na Estrada Nacional … e um local de trabalho em …, Albufeira;
B) Neste último local, a arguida CC, S.A. mantinha ao seu serviço, sob as suas ordens e direcção e no exercício da sua actividade os trabalhadores …., sem que lhes tenha pago os vencimentos desde Março de 2013;
C) Os trabalhadores …comunicaram à arguida, através de cartas registadas com aviso de recepção datadas de 24 e 31 de Maio de 2013, a suspensão do contrato de trabalho que havia celebrado com a mesma a partir de 01 de Junho de 2013, com fundamento na falta de pagamento pontual das retribuições desde Março de 2013, de subsídios de férias e de Natal 2012/2013;
D) O montante das retribuições referentes ao trabalho prestado pelos trabalhadores… deveria estar à disposição dos mesmos, respectivamente, nos últimos dias de cada mês;
E) A arguida não colocou à disposição dos trabalhadores … os subsídios de férias e de Natal do ano de 2012;
F) A arguida foi notificada, através de carta enviada com aviso de recepção e datada de 13.06.2013 e recepcionada em 17.06.2013, para proceder à entrega na unidade de Faro da Autoridade Administrativa, até ao dia 01.07.2013, dos recibos de retribuição dos trabalhadores … demonstrativos do pagamento dos subsídios de férias e de Natal do ano de 2012 e do pagamento dos salários desde Março de 2013;
G) Na sequência de tal notificação, a arguida assumiu que tinha em dívida aos trabalhadores … as quantias referentes ao pagamento dos subsídios de férias e de Natal do ano de 2012 e do pagamento dos salários desde Março de 2013;
H) A título de subsídio de Natal a arguida deve aos trabalhadores … € 3.820,84 e € 1.327,74 à Segurança Social;
I) A título de subsídio de férias a arguida deve aos trabalhadores … € 3.820,84 e € 1.327,74 à Segurança Social;
J) A empresa não procedeu ao pagamento dos salários dos meses de Março, Abril e Maio de 2013 aos trabalhadores …, devendo aos mesmos € 12.390,30 e à Segurança Social € 4.305,67;
K) Tendo em conta os anos em que exerce a sua actividade e o número de trabalhadores que tem ao seu serviço, tem capacidade técnica e organizativa para se informar e cumprir as disposições que lhe são legalmente impostas, nomeadamente as regras relativas ao vencimento dos créditos remuneratórios e subsídios dos trabalhadores;
L) A arguida no ano de 2011 teve um volume de negócios de € 4.157.050,00;
M) A empresa arguida foi declarada insolvente em 24.06.2013 pelo 2º. Juízo do Tribunal do Comércio de Lisboa;
N) Os trabalhadores … reclamaram créditos no processo de insolvência da arguida, tendo-lhes sido atribuída a natureza de créditos privilegiados;
O) BB é administrador da empresa arguida TNC2 – Logistica e Distribuição, S.A..
P) A sociedade CC é fruto da cisão da sociedade DD, S.A., a qual deu origem a duas sociedades, a primitiva DD e a CC;
Q) Por sentença datada de 13.05.2009, foi a DD, S.A. condenada a pagar à sociedade ora arguida o montante de € 2.400.000,00, o que não fez.
R) A CC e BB foram acusados, em processo comum, com, intervenção do tribunal colectivo, da prática, o segundo de um crime de fraude fiscal qualificada, previsto e punido pelos artigos 103º., nº. 1, alínea c) e 104º., nº. 2 do RGIT, sendo a empresa ora arguida co-responsável pela infracção praticada nos termos do artigo 7º., nº. 1 e 3 do mesmo diploma legal, tendo sido absolvidos.
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III. Fundamentação de direito
1. Da prática pela arguida das contra-ordenações
A decisão recorrida concluiu que a arguida CC, S.A. ao não proceder ao pagamento do subsídio de férias e de Natal de 2012, bem como as retribuições a partir de Março de 2013, aos trabalhadores referidos, cometeu as contra-ordenações em causa e, por consequência, condenou-a, em cúmulo jurídico, na coima de € 6.000,00 e na sanção acessória de publicidade.
Desenvolveu, para tanto e no essencial, a seguinte fundamentação:
«Face os factos considerados provados, é possível imputar a violação destas disposições legais à arguida, o que, aliás, não é colocado em causa na presente impugnação.
E é possível a imputação subjectiva das mesmas?
Alega o recorrente que a falta de pagamento de vencimentos e subsídios não ocorreu por acto voluntário, não ocorrendo qualquer facto culposo susceptível de ser assacado à sociedade ou aos seus gerentes, pelo que se está perante uma cláusula de exclusão da responsabilidade contra-ordenacional.
Vejamos.
Ora, é certo que existiu uma sentença de condenação da DD, S.A. a pagar à sociedade ora arguida o montante de € 2.400.000,00, podendo concluir-se que efectivamente esta última tinha créditos de montantes elevados a receber.
Por outro lado, a sentença de declaração de insolvência da empresa arguida é datada de 24.06.2013.
As contra-ordenações imputadas à arguida datam de 2012 no que respeita à falta de pagamento dos subsídios de férias e de Natal e de Março de 2013 quanto aos salários.
E a decisão de não pagamento é um acto voluntário, ao qual não é possível excluir a culpa.
Daqui se conclui pelo preenchimento do elemento subjectivo das infracções, já que a sociedade arguida apresentou em 2011 um volume de negócios superior a € 4.157,050,00, tem capacidade técnica e organizativa para se informar e cumprir as disposições que lhe são legalmente impostas, nomeadamente as regras relativas ao vencimento dos créditos remuneratórios e subsídios dos trabalhadores.
Em 2012 e Março de 2013, face a tal volume de negócios, não pode concluir-se que a empresa arguida não tinha possibilidade de cumprir as sua obrigações de pagamentos de salários e subsídios aos seus trabalhadores.
Caso não tivesse tal capacidade deveria ter-se apresentado à insolvência logo em 2012, o que não fez. Mas também não o fez mais tarde, já que a sua insolvência foi requerida por um terceiro.
E nem se diga que a sua declaração de insolvência inviabilizou o cumprimento das suas obrigações já que a mesma só foi declarada em Junho de 2013, ou seja, após a prática das infracções aqui em causa».
O recorrente rebela-se contra tal entendimento, argumentando, ao fim e ao resto, que o não pagamento em causa decorre de uma “situação fora do alcance da sociedade” e não de qualquer acto voluntário ou negligente desta.
Analisemos, então, a questão.
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Importa antes de mais ter presente, nunca é demais recordá-lo, que este tribunal apenas conhece da matéria de direito, sendo que na matéria de facto não se detecta a existência de qualquer dos vícios a que alude o artigo 410.º do Código de Processo Penal (cfr. artigo 51.º, n.º 1, da Lei n.º 107/2009, de 14-09).
Além disso, nos termos do artigo 8.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27-10 (aqui aplicável subsidiariamente), só é punível o facto praticado com dolo ou, nos casos especialmente previstos na lei, com negligência.
E de acordo com o disposto no artigo 548.º do CT, constitui contra-ordenação laboral o facto típico, ilícito e censurável que consubstancie a violação de uma norma que consagre direitos ou imponha deveres a qualquer sujeito no âmbito de relação laboral e que seja punível com coima; nas contra-ordenações laborais a negligência é sempre punível (artigo 550.º do mesmo compêndio legal).
A negligência consubstancia-se na falta do cuidado devido, que tem como consequência a realização do facto proibido por lei (artigo 15.º do Código Penal), mais precisamente, no que às contra-ordenações diz respeito, reside na conduta do agente ao omitir um dever de cuidado a que estava obrigado por lei.
Como se assinalou no acórdão deste tribunal de 09-06-2016 (Proc. n.º 222/16.2T8EVR.E1, disponível em www.dgsi.pt), o elemento subjetivo nas contraordenações, fora os casos de dolo, materializa-se na factualidade imputada ao agente a quem incumbia observar determinado procedimento.
Ora, no caso em apreciação afigura-se pacífico – face aos factos provados sob as alíneas C), D) E) e G) – que se verifica o elemento objectivo das contraordenações em causa.
E quanto ao elemento subjectivo?
Também aqui se entende que o mesmo se mostra presente.
Atente-se para tanto no conteúdo da alínea K) da matéria de facto: «Tendo em conta os anos em que exerce a sua actividade e o número de trabalhadores que tem ao seu serviço, tem capacidade técnica e organizativa para se informar e cumprir as disposições que lhe são legalmente impostas, nomeadamente as regras relativas ao vencimento dos créditos remuneratórios e subsídios dos trabalhadores».
Ou seja, a arguida tinha capacidade técnica e organizativa para cumprir as obrigações legalmente impostas, reconhecendo, de resto – como também resulta da matéria de facto –, que constituía sua obrigação proceder ao pagamento dos subsídios e retribuições em falta.
Por isso, ao omitir tal conduta, o mesmo é dizer ao não observar o procedimento de pagamento das retribuições e subsídios, actuou com negligência.
É certo que também decorre da factualidade que assente ficou (i) que a arguida é fruto da cisão da sociedade DD, S.A., a qual deu origem a duas sociedades, a primitiva DD e a aqui arguida, e por sentença datada de 13.05.2009, foi a DD, S.A. condenada a pagar à arguida o montante de € 2.400.000,00, o que não fez [factos P) e Q)], (ii) que a arguida no ano de 2011 teve um volume de negócios de € 4.157.050,00 [alínea L)] e (iii) que foi declarada insolvente em 24.06.2013 pelo 2º. Juízo do Tribunal do Comércio de Lisboa [alínea M)].
Tais elementos fácticos poderão indiciar a existência de algumas dificuldades económico-financeiras por parte da arguida: porém, já não permitem, sem mais, extrair a ilação que o não pagamento dos subsídios e retribuições decorreu de absoluta impossibilidade da arguida.
Ademais, como se assinalou na decisão recorrida, caso a recorrida não tivesse capacidade de efectuar os pagamentos dos subsídios em causa seria consentâneo que se apresentasse à insolvência: porém não só não o fez em 2012, como não o fez mais tarde, “já que a sua insolvência foi requerida por um terceiro.
E nem se diga que a sua declaração de insolvência inviabilizou o cumprimento das suas obrigações já que a mesma só foi declarada em Junho de 2013, ou seja, após a prática das infracções aqui em causa».
Conclui-se, pois, mais uma vez, pela verificação dos elementos objecto e subjectivo (negligência) das infracções por que a arguida foi sancionada, não se verificando qualquer causa de exclusão da responsabilidade contra-ordenacional, assim improcedendo, nesta parte, as conclusões da motivação de recurso.
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2. Da responsabilização solidária do administrador/recorrente pela coima
A decisão recorrida concluiu pela responsabilidade solidária do administrador da arguida, aqui recorrente, pela coima, para o que desenvolveu a seguinte fundamentação:
«A responsabilidade solidária dos gerentes pelo pagamento da coima decorre do preceituado no artigo 551º, nº 3, do Código do Trabalho, onde se estabelece que: “Se o infractor for pessoa colectiva ou equiparada, respondem pelo pagamento da coima, solidariamente com aquela, os respectivos administradores, gerentes ou directores”.
Não se confundem o arguido com o responsável solidário. Ao primeiro é imputada a autoria de um ilícito contra-ordenacional, e é a esse nível que se situa a sua responsabilidade; o segundo é apenas civilmente responsável, enquanto co-devedor da sanção pecuniária relativa à infracção.
E a própria lei processual é clara a fazer essa distinção, quando no art.º 20º da citada Lei 107/2009 manda aplicar ao sujeito solidariamente responsável pelo pagamento da coima, com as necessárias adaptações, as disposições dos arts.º 17º, 18º e 19º, do mesmo diploma, todas elas respeitantes ao arguido, e apenas a ele.
Essa diferenciada posição processual não significa porém que ao responsável solidário não assista legitimidade para interpor o recurso previsto no já referido art.º 49º, nº 1.
(…)
A discordância manifestada pela recorrente quanto ao sentido condenatório da decisão administrativa, no que respeita concretamente à sua responsabilização solidária como gerente da arguida, prende-se com o facto de, para além da inconstitucionalidade que invoca, não lhe poder ser assacada qualquer actuação culposa ou sequer negligente.
Porém, como ficou dito, a sua responsabilidade é meramente civil, enquanto co-devedor da sanção pecuniária relativa à infracção.
Assim, nada releva que tenha tido conhecimento dos factos relativos à infracção ou que tenha ou não actuado com culpa, bastando a sua qualidade de gerente.
A verdade é que a responsabilidade dos gerentes é meramente obrigacional, pois a solidariedade respeita apenas à obrigação pelo pagamento da coima.
Do já citado art.º 551º, nº 3, resulta obviamente que aos gerentes não são extensíveis outros efeitos da condenação, designadamente as sanções acessórias previstas no artigo 562º. do Código do Trabalho, tal como não poderão ser incluídos no registo a que alude o art.º 565º do mesmo código.
E a conformidade à Constituição daquela norma foi já repetidamente afirmada pelo Tribunal Constitucional nos seus Acórdãos 180/2014, 201/2014, 207/2014, e 321/2014, disponíveis in www.dgsi.tribunalconstitucional.pt..
Nestes Acórdãos decidiu-se: “ (…) não julgar inconstitucional a norma constante do n.º 3 do artigo 551.º do Código do Trabalho (2009), quando aí se estabelece, quanto ao sujeito responsável por contra-ordenação laboral, que, se o infractor for pessoa colectiva ou equiparada, respondem pelo pagamento da coima, solidariamente com aquela, os administradores, gerentes ou directores’..».

No presente recurso o recorrente retoma o argumento de que o artigo 551.º, n.º 3, do Código do Trabalho padece de inconstitucionalidade material, por violação do disposto no artigo 30.º da CRP.
Ora, esta questão, como resulta da transcrição supra, já foi devidamente analisada na decisão recorrida, em termos que merecem a nossa inteira concordância.
Por isso, pouco mais se nos oferece dizer a não ser acentuar alguns elementos em reforço do entendimento adoptado na sentença recorrida.
Como tem sido repetidamente afirmado pelo Tribunal Constitucional (cfr., entre outros, o acórdão n.º 691/2016, Proc. n.º 40/15, de 14-12-2016), «(…) no ilícito de mera ordenação social, as sanções não têm a mesma carga de desvalor ético que as penas criminais, para além de que, para a punição assumem particular relevo razões de pura utilidade e estratégia social, não podendo, invocar-se, por isso, para essa categoria de infrações, um conceito de culpa equivalente ao exigível para a imposição de uma sanção criminal».
E o n.º 3 do artigo 551.º do Código do Trabalho, ao estabelecer que se o infractor for uma pessoa colectiva ou equiparada, respondem pelo pagamento da coima, solidariamente com aquela, os respectivos administradores, gerentes ou directores, não pretende imputar a estes qualquer solidariedade quanto à infracção, mas apenas a solidariedade quanto ao pagamento da coima, de forma a garantir o pagamento desta face a quaisquer riscos decorrentes do funcionamento da pessoa colectiva.
Como se assinalou no referido acórdão do Tribunal Constitucional de 14-12-2016, com referência ao mencionado n.º 3 do artigo 551.º, «(…) [n]ão se trata aqui de definir a moldura da coima aplicável a um administrador ou gerente com base em elementos de aferição que apenas respeitem à pessoa coletiva e que são necessariamente diferenciados. O que está em causa é uma responsabilidade solidária que confere ao sujeito individual a condição de garante do pagamento da coima, a qual não deixa de ser fixada, no âmbito do processo contraordenacional, em função da moldura ajustável à personalidade coletiva do devedor primário. Não ocorre, por isso, uma parificação, quanto ao objeto, de situações de responsabilidade que, do ponto de vista da natureza do sujeito responsável, sejam desiguais, e pudesse suscitar uma desconformidade com o princípio da igualdade (…) Portanto, estando em causa apenas a solidariedade pelo pagamento, enquanto garantia da satisfação da obrigação pecuniária, e não a responsabilidade pela infração, não há violação da regra constitucional prevista no artigo 30.º, n.º 3 da CRP (…)».
Por isso, face à abundante jurisprudência do Tribunal Constitucional, no sentido de não julgar inconstitucional o n.º 3 do artigo 551.º do Código do Trabalho, segundo o qual os administradores, gerentes ou directores de pessoa colectiva ou equiparada respondem solidariamente pelo pagamento da coima aplicada a esta, só nos resta concluir, também nesta parte, pela improcedência das conclusões da motivação de recurso.
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3. Da aplicação da sanção de admoestação
Finalmente, sustenta o recorrente que, a não procederem as questões analisadas, se justifica a aplicação à arguida de uma admoestação, por, em síntese, a culpa ser particularmente diminuída.
Em relação a esta questão, importa ter presente que nos termos do artigo 48.º da Lei n.º 107/2009, de 14-09, «[e]xcepcionalmente, se a infracção for considerada como leve e a reduzida culpa do arguido o justifique, pode o juiz proferir uma admoestação».
Do citado preceito decorre, pois, que a sanção de admoestação só pode ser aplicada se, cumulativamente:
i. a infracção consistir em contra-ordenação classificada como leve;
ii. houver reduzida culpa do arguido.
Ora, no caso, como resulta do relatório supra, as infracções por que a arguida foi sancionada são classificadas como muito-graves [falta de pagamento do subsídio de férias (artigo 264.º, n.º 4 do CT) e do subsídio de Natal (artigo 263.º, n.º 3, do CT)] e grave [falta de pagamento da retribuição (artigo 278.º, n.º 6, do CT)]: por isso se afigura manifesto não se mostrar desde logo preenchido o primeiro dos requisitos (infracção consistir em contra-ordenação classificada como leve) para que pudesse ser aplicada à arguida a sanção de admoestação.
Nesta sequência, só nos resta concluir, também nesta parte, pela improcedência das conclusões da motivação de recurso.
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4. Vencido no recurso, o recorrente deverá suportar o pagamento das custas respectivas, fixando-se a taxa de justiça em 3 (três) UC (artigo 59.º da Lei n.º 107/2009, de 14 de Setembro, e artigo 8.º, n.ºs 7 e 9, do Regulamento das Custas Processuais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro, e respectiva tabela III anexa).
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V. Decisão
Face ao exposto, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em negar provimento ao recurso interposto por João Augusto dos Reis Mendes Leal, Lda., e, em consequência, confirmam a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC.

(Documento elaborado e integralmente revisto pelo relator – artigo 94.º, n.º 2, do CPP).
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Évora, 22 de Novembro de 2017
João Luís Nunes (relator)
Paula do Paço
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[1] Relator: João Nunes; Adjunta: Paula do Paço.