Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
192/13.9EAEVR.E1
Relator: FÁTIMA BERNARDES
Descritores: JOGOS DE FORTUNA OU AZAR
CRIME
CONTRA-ORDENAÇÃO
DEPOIMENTO DE TESTEMUNHA
Data do Acordão: 06/23/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Sumário:


1 - A ligação ou não à internet dos computadores instalados nas máquinas que estão em causa nos autos, atento o modo de funcionamento de tais máquinas que resultou  apurado com base na prova pericial, não se mostra essencial ou relevante para que se possa aferir da eventual subsunção da conduta da arguida, ora recorrente, à previsão normativa do artigo 159º do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de dezembro e para que se possa afastar o respetivo enquadramento na previsão do artigo 108º do mesmo diploma legal.

2 - O Decreto-Lei n.º 66/2015, de 29 de abril, que aprovou o Regime Jurídico dos Jogos e Apostas Online, não afastou a definição de jogo de fortuna e azar estabelecida no Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de dezembro.

3 - A distinção entre os jogos de fortuna ou azar e as modalidades afins, no âmbito da aplicação do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de dezembro, deverá fazer-se tendo por base o conceito de jogo de fortuna ou azar estabelecido no artigo 1º, conjugado com os exemplos de “tipos de jogos que de fortuna ou azar” previstos no artigo 4º, por um lado, e o conceito de modalidades afins, estabelecido no n.º 1 do artigo 159º, conjugado com os exemplos padrão do n.º 2 do mesmo artigo, por outro lado.

4 - Para o preenchimento do crime de exploração ilícita de jogo previsto no artigo 108º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de dezembro, não se exige que o prémio retribuível seja pecuniário ou que a pontuação/créditos obtida(os) nas máquinas possa(m) ser convertida(os) em dinheiro (ainda que, como é sabido, neste tipo de jogos, normalmente, sejam atribuídos prémios pecuniários), pelo que, a circunstância invocada pela recorrente de não estar demonstrada a natureza pecuniária dos prémios atribuídos, é irrelevante em termos de poder afastar o preenchimento do crime.

5 - Por outro lado, o maior ou menor valor da quantia pecuniária que o jogador tem de despender para poder jogar nas máquinas, não constitui critério a que se deva atender para aferir se a conduta do agente que explora essas máquinas integra o crime de exploração ilícita de jogo previsto no artigo 108º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 422/89, ou a contraordenação prevista no artigo 159º do mesmo diploma legal.

6 - Os agentes policiais não estão impedidos de depor sobre os factos que constataram, no âmbito das diligências efetuadas, durante a fase investigatória ou de inquérito e ainda antes destas fases, na recolha de indícios de uma infração de que acabam de ter conhecimento, competindo-lhes “praticar os actos necessários e urgentes para assegurar os meios de prova”, nomeadamente, “colher informações das pessoas que facilitem a descoberta dos agentes do crime” (cf. artigo 250º, n.º 1 e n.º 2, al. b) e artigo 250º, n.º 8, ambos do CPP), podendo, nesse contexto, as conversas tidas entre os órgãos de polícia criminal e essa(s) pessoa(s), mesmo que, posteriormente esta(s) última(s), venha(m) a ser assumir a qualidade de arguido(s) e desde que não consubstanciem «declarações obtidas à margem das formalidades e das garantias que a lei processual impõe», ser reproduzidas em audiência de julgamento.

Decisão Texto Integral:

Acordam, em conferência, na Secção Criminal, do Tribunal da Relação de Évora

1. RELATÓRIO
1.1. Nestes autos de processo comum, com intervenção do Tribunal Singular, n.º 192/13.9EAEVR, do Tribunal Judicial da Comarca de Évora, Juízo Local Criminal de Évora, Juiz 2, foram submetidos a julgamento os arguidos (…), melhor identificados nos autos, estando acusados da prática, em coautoria, na forma consumada e em concurso efetivo de seis crimes de exploração ilícita de jogo, p. e p. pelo artigo 108º, n.º 1, com referência aos artigos 1º, 3º e 4º, n.º 1, al. g), todos do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de dezembro, na redação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 114/2011, de 30 de novembro.
1.2. No decurso da audiência de discussão e julgamento, finda a produção da prova, foi comunicada aos arguidos a alteração «da acusação constante do apenso A», conforme consta da ata da audiência referente à sessão de 23/05/2019, inserta a fls. 947 a 949 dos autos, nada tendo sido requerido pelos arguidos.
1.3. Nessa mesma data, 23/05/2019, foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo:
«(…), decido julgar a acusação procedente e, em consequência:
1) Absolvo o arguido (…) da prática de 4 (quatro) crimes de exploração ilícita de jogo, p. e p. pelo artigo 108.º n.º 1, com referência aos artigos 1.º, 3.º e 4.º, n.º 1, alínea g), todos do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de Dezembro, referentes aos processos supramencionados em A.1., A.2., AA. e A.6.
2) Absolvo a arguida (…) da prática de 1 (um) dos crimes de exploração ilícita de jogo, p. e p. pelo artigo 108.º, n.º 1, com referência aos artigos 1°, 3.º e 4.º, n.º 1, alínea g), todos do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de Dezembro, referentes ao processo mencionado em A.6.
3) Condeno (…) pela prática de 5 (cinco) crimes de exploração ilícita de jogo, previstos e punidos pelo artigo 108.°, n.º 1, em conjugação com o artigo 1.°, 3.° e 4.°, n.º 1, alínea g), todos do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de Dezembro, na redacção introduzida pelo Decreto-lei n.º 114/2011, de 30 de Novembro, nas penas de prisão 06 (seis), 09 (nove), 12 (doze), 15 (quinze) e 18 (dezoito) meses e nas penas de multa de 60 (sessenta), 90 (noventa), 120 (cento e vinte), 150 (cento e cinquenta) e 180 (cento e cinquenta) dias, relativamente aos factos ocorridos em 15.11.2013, 07.03.2014, 10.04.2014, 18.03.2015 e 22.12.2015.
4) Em cúmulo jurídico, condeno (…) nas penas únicas de 36 (trinta e seis) meses de prisão e 360 (trezentos e sessenta) dias de multa à taxa diária de €6,00 (seis euros), suspendo a execução da pena de prisão com subordinação à obrigação de não terem em seu poder, em nome próprio e/ou em representação legal, objectos capazes de facilitar ou constituir a prática de crimes previstos no Decreto-Lei n.º 422/89, e de entregar €600,00 (seiscentos euros) à Associação (…), em prestações mensais sucessivas de €50,00 (cinquenta euros), respectivamente, a título de conduta judicial, após o trânsito em julgado da decisão condenatória, mediante comprovação nos autos.
5) Condeno (…) pela prática em co-autoria, sob a forma consumada, dois crimes de exploração ilícita de jogo, previstos e punidos pelo artigo 108.°, n.º 1, em conjugação com o artigo 1.°, 3.° e 4.°, n.º 1, alínea g), todos do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de Dezembro, na redacção introduzida pelo Decreto-lei n.º 114/2011, de 30 de Novembro, nas penas de prisão de 14 (catorze) e 16 (dezasseis) meses e na pena de multa de 140 (cento e quarenta) e 160 (cento e sessenta) dias, para os factos ocorridos em 11.04.2014 e 22.12.2015, respectivamente.
6) Em cúmulo jurídico, condeno (…) nas penas únicas de 27 (vinte e sete) meses de prisão e 270 (duzentos e setenta) dias de multa à taxa diária de €12,00 (doze euros), suspendo a execução da pena de prisão com subordinação à obrigação de não terem em seu poder, em nome próprio e/ou em representação legal, objectos capazes de facilitar ou constituir a prática de crimes previstos no Decreto-Lei n.º 422/89, e de entregar €2.000,00 (dois mil euros) à Associação (…), em prestações mensais sucessivas de €100,00 (cem euros), respectivamente, a título de conduta judicial, após o trânsito em julgado da decisão condenatória, mediante comprovação nos autos.
7) Condeno os arguidos a suportar as custas processuais cuja taxa de justiça fixo em 3 UC - art.º 513.º e 514.º do Cód. Proc. Penal.
8) Declaro perdidos a favor do Estado as quantias e os objectos apreendidos e ordeno a entrega das quantias ao Instituto de Turismo de Portugal IP e a destruição das máquinas pelas entidades apreensoras, mediante comprovação nos autos.
(…).»
1.4. A arguida (…) interpôs recurso para esta Relação do despacho referido em 1.2., extraindo da motivação apresentada, as seguintes conclusões:
(…)
1.5. O recurso do despacho interlocutório foi regularmente admitido, com subida diferida, a final.
1.6. O Ministério Público apresentou resposta ao recurso do despacho interlocutório, pronunciando-se pela sua improcedência e manutenção do decidido, formulando, a final as seguintes conclusões:
(…)
1.7. Os arguidos interpuseram recurso da sentença para esta Relação, extraindo da motivação do recurso que, respetivamente, apresentaram, as conclusões que se passam a transcrever:
1.7.1. Conclusões do recurso apresentado pela arguida (…):
«I. (…), foi condenada por cinco dos seis crimes pelos quais vinha acusada, em cúmulo jurídico, nas penas únicas de 36 (trinta e seis) meses de prisão e 360 (trezentos e sessenta) dias de multa, à taxa diária de €6,00 (seis) euros, suspendendo a execução da pena de prisão com subordinação à obrigação de não ter em seu poder, em nome próprio e/ou em representação legal, objectos capazes de facilitar ou constituir a prática de crimes previstos no Decreto-Lei n. o 422/89, de 2 de Dezembro, e de entregar €600,00 (seiscentos euros) à Associação (…), em prestações mensais sucessivas de €50,00 (cinquenta euros), respectivamente, a título de conduta judicial, após o trânsito em julgado da decisão condenatória, mediante comprovação nos autos.
II. Na verdade, a arguida não se conforma ou aceita com a matéria de facto e de Direito dada como provada, quer com a pena que lhe foi aplicada, considerando não ter sido devidamente levado em conta a prova produzida e não produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, tendo mesmo sido apreciada de forma errada aquando da motivação da decisão sobre a matéria de facto, nomeadamente quanto aos pontos 2 a 14, 16 a 29 dos factos dados como provados, devendo os mesmos serem dados como não provados, absolvendo-se a arguida dos crimes que injustamente foi condenada.
III. Entende a arguida, salvo melhor opinião, que o Tribunal "a quo" limitou a sua convicção quanto aos factos provados baseando-se nas regras de experiência comum, cujo critério jamais poderá neste tipo de ilícito ser aplicado, considerando que estão em causa máquinas de diversão/jogo que deverão obrigatoriamente passar por uma avaliação e peritagem técnica, sem explicar a sua concreta valoração e em que medida as mesmas contribuíram para que esses factos fossem dados como assentes, dando credibilidade aos depoimentos dos militares da GNR e inspectores da ASAE, bem como se alicerça em declarações que a arguida prestou perante aqueles, já na qualidade de arguida, aquando das ações de fiscalização, tirando conclusões de meras "presunções" apresentadas por aqueles.
IV. Não teve o Tribunal "a quo" o cuidado e o rigor de analisar toda a prova produzida na sua plenitude e cuja valoração era legalmente passível e exigível.
V. Dos próprios factos provados resulta erro notório na valoração da prova produzida que põe em causa a decisão de condenar a recorrente nas penas que lhe foram impostas.
VI. "O erro notório na apreciação da prova, previsto no art.° 410°, n° 2, al. c), do CPP, como se vem reafirmando constantemente, não reside na desconformidade entre a decisão de facto do julgador e aquela que teria sido a do próprio recorrente e, só existe quando, do texto da decisão recorrida, por si ou conjugada com as regras da experiência comum, resulta por demais evidente a conclusão contrária àquela a que chegou o tribunal. ... " (cfr. Acórdão do S.T.J. de 24-03-1999, Proc. n° 176/99 - 3.ª Secção).
VII. Existe erro notório na apreciação da prova quando esse erro é de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores, ou seja, quando o homem médio facilmente dele se dá conta. Por isso é notório e não só visível aos juristas.
VIII. No entanto, estabelece o artigo 127.º do Código Processo Penal, que salvo quando a Lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente.
IX. Como diz Maia Gonçalves, in "Código de Processo Penal, anotado", 9.ª ed., pág 322, " ... na livre apreciação da prova não se confunde de modo algum com apreciação arbitrária da prova nem com a mera impressão gerada no espírito do julgador pelos diversos meios de prova; a prova livre tem como pressupostos valorativos a obediência a critérios da experiência comum e da lógica do homem médio suposto pela ordem jurídica ... " Num segundo nível referente à valoração da prova intervêm as deduções e induções que o julgador realiza a partir dos factos probatórios e agora já as inferências não dependem substancialmente da imediação, mas hão-de basear-se nas regras da lógica, princípios da experiência e conhecimentos científicos, tudo se podendo englobar na expressão "regras da experiência".
X. Entende a recorrente que inexistem factos provados imputados à mesma, no que respeita à verificação dos elementos objectivo e subjectivo do tipo do crime em apreço e pelo qual foi condenada. As próprias testemunhas e a decisão recorrida reconhecem que as testemunhas ouvidas e cujos depoimentos supra se transcreveram, resultam de conversas obtidas pelas testemunhas no âmbito da fiscalização operada em que a recorrente já era arguida (considerando o número de fiscalizações e autos existente e apensos ao processo principal), conforme resulta das seguintes passagens e testemunhos (Testemunha (…): minutos 04.08 a 5.55; 12.16.8 a 14.13.6;17.09.2 a 17.40.2; 19.17.4 a 24.31.9; Testemunha (…): minutos 3.01.4 a 6.10.2; 13.58 a 14.55.1; Testemunha (…): minutos 3.58.1; Testemunha (…): 04.33.5; Testemunha (…): minutos 4.47.2 a 6.40.4; 7.25.6 a 9.11.9; 18.06.7; 19.11.8 a 20.57.5; Testemunha (…): minutos 03.12.8)
XI. Ora estas conversas não podem ser reproduzidas em sede de julgamento, uma vez que a recorrente exerceu o direito ao silêncio, a acrescer o facto de as testemunhas não tomaram conhecimento directo e pessoal com determinados factos, antes receberam informações da recorrente, que as reproduziram no auto de notícia, ao mesmo momento em que a recorrente era arguida. As testemunhas sobre os factos que lhe foram relatados pela arguida, falam pela "boca da arguida" o que equivale a dizer que essas passagens não podiam ser valoradas pela decisão recorrida e foram-no, em violação do n.º 7 do art.º 356.º do CPP.
XII. Em segunda via da leitura atenta da sentença recorrida observam-se menções conclusivas de que as "máquinas", mais concretamente os computadores de acesso à internet existente no estabelecimento fiscalizado, eram precisamente isso mesmo, um ponto de acesso à internet e não máquina de jogo (a douta decisão recorrida omite qualquer reflexão ou sequer análise a essa questão, que é de maior importância para a qualificação final da, alegada, actuação da recorrente), como vem descrito na sentença com programas que desenvolvem jogos ilegais: este jogo era desenvolvido por ferramentas de software físicas inseridas nesse mesmo computador ou era desenvolvido por acesso à internet? Questão que não está explicada na douta decisão recorrida e que é da maior importância para qualificar em termos jurídicos a alegada conduta da recorrente que até pode nem sequer ser criminosa, conforme resulta das seguintes passagens e testemunhos supra descritos.
XIII. De suma importância é o facto de não ter ficado demonstrado que a recorrente tinha conhecimento da existência desses jogos naqueles computadores (a douta decisão recorrida, limita-se a presumir esse conhecimento, o que se mostra descrito na motivação, pela utilização das regras de experiência comum); note-se e tal afirmação não carece de ser demonstrada por ser notória e consabidamente aceite na sociedade, que nas páginas do conhecido site facebook existem todos estes jogos disponíveis para os utilizadores da internet, em que, inclusivamente, os jogos são explicados e jogados com créditos, conforme resulta das seguintes passagens e testemunhos supra descritos.
XIV. No que concerne, aos factos provados números 14, 16, 17 e 18, a sentença recorrida limita-se a presumir que os "prémios" são "pecuniários", já que de nenhuma prova concreta resulta esta prova, veja-se a sentença que conclui tais e apresenta a motivação quanto a estes factos de acordo e " ... através das regras da experiêncía comum e de normal devir de acontecímentos ... ".
XV. A omissão de reflexão e análise da ligação à internet do equipamento, e sendo esse um facto essencial para a análise da conduta do agente e qualificação jurídica final da sua actuação, determina a verificação de uma manifesta omissão de pronúncia e, portanto, uma violação do art.º 374.º, n.º 2 do CPP, o que torna a douta decisão recorrida nula, levando também a erro de julgamento.
XVI. A intervenção dos peritos afasta a possibilidade do recurso à aplicação das regras de experiência comum nesta matéria da prova específica do conhecimento / verificação do dolo, como se dá como provado na douta sentença recorrida por referência à actuação da recorrente.
XVII. Na douta sentença, menciona-se por diversas vezes em sede de fundamentação a aplicação das regras de experiencia comum, no entanto entende a recorrente estarem violados os PRINCÍPIOS DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA E O PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REO, dois princípios que andam intimamente ligados entre si e se completam e fundamentam o acima vertido, porquanto em sede de inquérito o titular do mesmo e depois em julgamento, o julgador não entendeu que as máquinas dos autos contivessem jogos de fácil percepção, requisitando os serviços de um perito para que viesse aos autos transmitir para que serviria o objecto apreendido, acaso assim não tivesse sido, nunca a douta decisão recorrida se serviria da perícia para fundamentar ou motivar o funcionamento do equipamento.
XVIII. Nessa medida está por demonstrar a verificação do dolo (que é especifico) na actuação que é imputada à recorrente, sendo que este tipo de crime só é punível a título de dolo.
XIX. Está erradamente julgada a matéria de facto dos artigos 12 a 25 da decisão recorrida.
XX. A recorrente entende que foi violado o art.º 127.º do CPP, o art.º 108.º do DL 422/89 e não trata a questão da eventual inclusão da conduta da recorrente nos art.ºs 159.º e seguintes do DL 422/89 e portanto era matéria que a sentença deveria apreciar e não o fez, o que determina também nesta parte a nulidade da mesma, pois deveria ter sido dado como provado que o equipamento funciona com ligação à internet (independentemente do software do disco e dos ficheiros que lá pudessem estar, já que a douta sentença recorrida e a própria perícia parecem estar incompletas ou suprimir a análise de um facto importante e que é descortinar-se se esses ficheiros são temporários ou não e quando foram descarregados para os pc's analisados e que estavam no local das fiscalizações).
XXI. Importa referir que, ficheiros como " ... windows xp, dm32api.dll ..." não são jogos, e esta matéria é facto notório e público e não carece de prova, já que aquelas expressões correspondem a isso mesmo ficheiros e ferramentas de executáveis e que pode resultar de um donwload de internet, pelo que existe omissão de julgamento e análise deste tema, constituindo os factos 2 a 11 e 27 e 28 meras conclusões e não, propriamente, factos.
XXII. Era impossível para a recorrente ou quem quer que estivesse no estabelecimento conhecer previamente ou controlar os sites acedidos pelos clientes do estabelecimento e nessa medida não é possível dar-se como provado que a recorrente teria o domínio do acesso à internet por parte dos utilizadores do computador que estava no estabelecimento, que foi alvo de fiscalização e de posterior apreensão, até porque quando questionadas as testemunhas responderam que a Arguida lhes tinha dito desconhecer o que estava na máquina ou como funcionariam.
XXIII. Acresce ainda que das análises/perícias às máquinas não se logrou a visualização de quaisquer jogos, pelo que se instala a dúvida sobre se aqueles computadores apreendidos teriam no seu interior qualquer elemento físico que permitisse o desenvolvimento de jogos ilícitos e nessa medida um internet poínt ou um ponto de acesso à internet não permite dar a conhecer à recorrente ou a quem quer que seja que sites ou conteúdos são visitados pelos utilizadores desses mesmos computadores.
XXIV. Por outro lado, não pode o Tribunal com o fundamento nas afirmações produzidas pelas testemunhas alicerçada em alegadas declarações da arguida aquando das apreensões das máquinas quando esta, em julgamento, se remeteu ao silêncio presumir que existiram ganhos, lucros ou eventuais repartições de lucros e proveitos.
XXV. Estamos, assim, perante uma situação de não verificação do elemento subjectivo do crime de exploração ilícita de jogo, por falta absoluta de prova, existindo apenas ilações e presunções por parte do Tribunal "a quo" no que a esta matéria diz respeito.
XXVI. No âmbito deste processo, ocorreu uma peritagem que analisou e qualificou as máquinas apreendidas, o que é sintomático de que o conhecimento para a classificação do aparelho não está ao nível do cidadão comum e, portanto, não está esse conhecimento cimentado no seio da sociedade, nem se encontra ao nível das regras de experiência comum.
XXVII. E a punição deste ilícito criminal - que não cremos que sequer exista nos presentes autos só será possível se se verificar demonstrado, de forma inequívoca, o dolo e o dolo especifico e não qualquer outra forma de dolo.
XXVIII. Nos presentes autos, salvo o devido respeito, nada se demonstrou quanto a este tema e do texto da própria douta sentença apenas se extraem presunções em conformidade com a falta de prova em contrário e de acordo com a experiência.
XXIX. Sobre a Arguida apenas consta da motivação da convicção do Juiz, o que foi dito pelas testemunhas, que não mais se trata de um depoimento indirecto que não pode ser admitido.
XXX. A decisão recorrida contém um erro notório na apreciação da prova, que impõe a modificação da decisão recorrida nos termos do artigo 437.º, alínea a), do CPP.
XXXI. Assim, atendendo ao supra exposto, dúvidas não resultam que os factos que serviram para condenar a Recorrente deverão ser dados como não provados, pois não se pode concluir a sua participação com fundamento nas regras da experiência comum.
XXXII. Inexistindo, assim, a prática de qualquer crime nos presentes autos.
XXXIII. A douta sentença recorrida violou, assim, as normas constantes dos arts. 127° do C.P.P.; 1.º, 3.º, 4.º, e 108.º do D.L. 422/89, assim como os principio da presunção de inocência da arguida e do "in dubío pro reo".
XXXIV. Por outro lado e por mera cautela e dever de patrocínio, no que respeita à medida da pena, uma vez que a arguida apela pela sua inocência e consequente absolvição, entende aquela ser excessiva a medida da pena que concretamente lhe foi fixada, considerando que inclusive inexiste qualquer condenação averbada no registo criminal daquela, acrescendo que se trata de uma cidadã inserida social, profissional e familiarmente na sociedade.
XXXV. O que quer dizer que não se mostram sobremaneira colocadas em crise as razões de prevenção especial, mostrando viver conforme com o direito.
XXXVI. Afigurando-se assim que a pena é excessiva, inadequada, desproporcionada e desprovida de qualquer finalidade ressocializadora, antes visando finalidades primacialmente retributivas, mesmo aí excedendo-as, e, como tal, gravemente violadoras do princípio da culpa e da razoabilidade.
XXXVII. Por fim desconhece o critério de condenação em custas processuais, uma vez que o facto de a recorrente ter exercido o direito ao silêncio a prejudicou, porquanto foi por este motivo (e não só) que a recorrente foi condenada em 3 UC´s de custas, quando em regra e por norma a condenação em custas é em 2 UC´s. O critério para condenação em custas não tem explicação na decisão recorrida, o que gera, também a nulidade do n.º 2 do art.º 374.º do CPP, pois que esta, sendo uma condenação, deve estar motivada e in casu a motivação é em violação do direito ao silêncio exercido pela recorrente e que jamais a deveria prejudicar.
XXXVIII. Sendo que, pelas razões e fundamentos supra elencados, caso a arguida não venha a ser absolvida nesta instância, sempre a sua pena se deverá fixar pelos mínimos legais, considerando os seguintes dispositivos legais arts. o 70.º e 71.º ambos do Código Penal.
Nestes termos e nos demais de Direito que Vossas Excelências, Venerandos Desembargadores, doutamente suprirão, deverá o presente recurso ser julgado procedente, revogando a decisão recorrida que deverá ser substituída por outra consentânea com o ora alegado, assim fazendo a já costumada, JUSTIÇA!»
1.7.2. Conclusões do recurso apresentado pelo arguido (…):
«I. O arguido discorda em absoluto da condenação de que foi alvo, considerando não ter sido devidamente levado em conta a prova produzida e não produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, tendo mesmo sido apreciada de forma errada aquando da motivação da decisão sobre a matéria de facto, impondo-se decisão diversa da proferida no que respeita aos pontos 6, 7 e de 10 a 28, dos factos dados como provados, devendo os mesmos serem dados como não provados, absolvendo-se o arguido do crime que injustamente foi condenado.
II. Resulta apenas da prova documental a existência de duas faturas da empresa do Recorrente, facto este que não prova de per si qualquer envolvimento do recorrente na situação, nem prova que as máquinas eram efetivamente da empresa, nem que ele as tenha colocado no café, nem que sabia da existência destas máquinas, nem que conhecia a co-arguida, nem que com esta tinha uma colaboração no que respeita à exploração e repartição de lucros da referida máquina. Sendo certo que, as testemunhas nada disseram sobre a relação entre os arguidos. As perícias que recaíram sobre as máquinas e os documentos juntos aos autos, não permite ao Tribunal inferir qualquer facto referente à vontade e predisposição do arguido e ao seu conhecimento sobre as máquinas.
III. Não fundamenta a Sentença a sua concreta valoração e em que medida as mesmas contribuíram para que esses factos fossem dados como assentes, deixando a análise da prova à mercê de depoimentos indiretos, cujos depoimentos integrais se transcrevem supra.
IV. Dá credibilidade aos depoimentos, em sede de levantamento dos autos de notícias no que toca às declarações que a co-arguida terá prestado às testemunhas em sede de inquirição destas, já na qualidade de arguida, nos dias das fiscalizações 28/10/2014 e 22/12/2015, sem fundamentar como chegou à conclusão que as faturas alegadamente por esta apresentada e emitidas pela sociedade comercial (…) seriam concreta e sem margem de dúvida referente às máquinas apreendidas nesses mesmos dias.
V. O tribunal deixou por explicar como, com base nas referidas faturas, consegue concluir que as datas constantes das mesmas correspondem às máquinas apreendidas, distando entre uma fatura e a apreensão cerca de um mês e na segunda fatura cerca de dois meses, inexistindo qualquer indício que permita efetuar estas ligações entre as faturas e as máquinas apreendidas no dia 10 de Abril de 2014 e 22 de Dezembro de 2015.
VI. A atividade comercial da sociedade gerida pelo arguido são as máquinas de diversão, atividade comercial com enquadramento legal, pelo que nenhum elemento que conste da fatura supra indicada, poderá arbitrariamente ser imputada a qualquer máquina que não se encontre regulamentada.
VII. Confrontada a prova produzida em audiência de julgamento com os autos de notícia que deu origem ao presente processo e os autos de inquirição das testemunhas (…), aos quais o tribunal "a quo" atendeu para formar a sua convicção sobre a matéria de facto provada, tais provas apontam em sentido divergente ou contraditório, nomeadamente quanto à responsabilidade criminal do arguido.
VIII. Os depoimentos que transcreveram em sede de motivações, resultam de conversas obtidas pelas testemunhas no âmbito das ações de fiscalização operada em que a co-arguida já era arguida.
IX. Tais conversas não podem ser reproduzidas em sede de julgamento, uma vez que a co-arguida exerceu o direito ao silêncio, acrescendo o facto das testemunhas (…), ouvidas, não terem tomado conhecimento direto e pessoal com determinados factos, violando-se assim o disposto no n.º 7 do art.º 356.º do CPP.
X. Da decisão recorrida extrai-se ainda que as máquinas aprendidas, mais concretamente o computador de acesso à internet existente no estabelecimento de revelante importância para a qualificação final, como vem descrito na sentença, possuía programas que desenvolveriam jogos ilegais tipo "slot machine". Ora, este jogo era desenvolvido por ferramentas de software físicas inseridas nesse mesmo computador ou, por outro lado, era desenvolvido por acesso à internet?
XI. Questão esta que não se encontra explicada na sentença recorrida e que se reveste de especial importância para qualificar em termos jurídicos a alegada conduta do arguido.
XII. Não obstante essa questão, e porque entende o recorrente que, atento no facto de não ter ficado demonstrado que a co-arguida tinha conhecimento da existência desses jogos naquele computador (a decisão recorrida, limita-se a presumir esse conhecimento, o que se mostra descrito na motivação, pela utilização das regras de experiência comum), os quais poderiam ter ali sido colocados pelos próprios jogadores, em acesso a sites desse conteúdo, com downloads desses jogos, que até poderiam ser demonstrativos ou melhor denominados de demos e não efectivos, com créditos a correr, factos estes que não foram provados e que aproveitam o ora recorrente.
XIII. Como é do conhecimento geral, na aplicação facebook, todos estes jogos estão disponíveis para os utilizadores da internet, inclusivamente, os jogos são explicados e jogados com créditos.
XIV. Por outro lado, a sentença recorrida limita-se a presumir que os "prémios" são "pecuniários", já que de nenhuma prova resulta tal facto, conforme absoluta omissão na motivação a este facto na sentença.
XV. A omissão de reflexão e análise da ligação à internet do equipamento, e sendo esse um facto essencial para a análise da conduta do agente e qualificação jurídica final da sua actuação, determina a verificação de uma manifesta omissão de pronúncia e portanto uma violação do art.º 374.º, n.º 2 do CPP, o que torna a decisão que ora se recorre nula, originando erro no julgamento.
XVI. A realização de uma peritagem afasta a possibilidade do recurso à aplicação das regras de experiência comum nesta matéria da prova, específica do conhecimento, como se dá como provado na sentença recorrida, por referência à actuação da co-arguida.
XVII. Na sentença que ora se recorre, por diversas vezes, em sede de fundamentação se refere a aplicação das regras de experiencia comum, no entanto, entende o recorrente, estarem violados os PRINCÍPIOS DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA e o PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REO, dois princípios que se completam e fundamentam o acima vertido, porquanto em sede de inquérito e depois em julgamento, o julgador não entendeu que a máquina dos autos contivesse jogo de fácil percepção, requisitando os serviços de um perito para que viesse aos autos transmitir para que serviria o objecto apreendido.
XVIII. Nessa medida está por demonstrar a verificação do dolo (que é especifico) na actuação que é imputada ao arguido, sendo que este tipo de crime só é punível a título de dolo. Está erradamente julgada a matéria de facto atinente a esta demonstração da decisão recorrida, matéria essa beneficiará o ora recorrente.
XIX. O recorrente entende que foi violado o art.º 127.º do CPP, o art.º 108.º do DL 422/89 e não trata a questão da eventual inclusão da conduta do recorrente nos art.°s 159.° e seguintes do DL 422/89 e portanto era matéria que a sentença deveria apreciar e não o fez, o que determina também nesta parte a nulidade da mesma, pois deveria ter sido dado como provado que o equipamento funciona com ligação à internet (independentemente do software do disco e dos ficheiros que lá pudessem estar), já que a douta sentença recorrida e a própria perícia parecem estar incompletas ou suprimir a análise de um facto importante e que é concluir se esses ficheiros são temporários ou não, e quando foram descarregados para o computador analisado, e se estavam no local das fiscalizações.
XX. "O erro notório na apreciação da prova, previsto no art.° 410°, n° 2, al. c), do CPP, como se vem reafirmando constantemente, não reside na desconformidade entre a decisão de facto do julgador e aquela que teria sido a do próprio recorrente e, só existe quando, do texto da decisão recorrida, por si ou conjugada com as regras da experiência comum, resulta por demais evidente a conclusão contrária àquela a que chegou o tribunal. ... " (cfr. Acórdão do STJ. de 24-03-1999, Proc. n° 176/99 - 3.a Secção).
XXI. As facturas em causa, não provaram ser referente às maquinas apreendidas, nem a data aposta nas mesmas era coincidente ou sequer próxima.
XXII. Ora, este facto corroborado pelo depoimento das testemunhas (…), os quais referem que lhes terá sito dito pela co-arguida que imputou a sociedade a proveniência das maquinas, por si só é manifestamente insuficiente para dar como provada a matéria dos autos.
XXIII. Em momento algum, as testemunhas (…), identificaram sem qualquer dúvida, que o arguido, aqui recorrente forneceu a máquina na data indicada.
XXIV. O que se depreendeu dos seus testemunhos é que identificaram o arguido como possível fornecedor de máquinas de jogo, sem precisar o enquadramento jurídico das mesmas e socorrendo-se das palavras que eventualmente a co-arguida terá dito na data da apreensão quando a mesma já detinha a qualidade de arguida.
XXV. Ora estas conversas não podem ser reproduzidas em sede de julgamento, uma vez que a coarguida exerceu o direito ao silêncio e as testemunhas não tomaram conhecimento directo e pessoal com determinados factos, antes receberam informações daquela, que as reproduziram no auto de notícia.
XXVI. O tribunal "a quo", na formação da sua convicção, não teve o cuidado e o rigor na análise individual de toda a prova documental, nomeadamente a factura bem como a prova testemunhal produzida em audiência de discussão e julgamento.
XXVII. Ora, entendendo correntemente a jurisprudência que o erro notório na apreciação da prova consiste em se ter dado como provado algo que notoriamente está errado, sendo o erro detetável por qualquer pessoa minimamente atenta, tal vício claramente se verifica pelas razões de facto e de direito infra e supra expostas.
XXVIII. Desta forma, verifica-se ainda que a sentença de que agora se interpõe recurso, padece de nulidade, por violação do disposto no art.° 374.º, n.º 2 do Código de Processo Penal, em virtude de não proceder ao exame crítico das provas, limitando-se o Tribunal "a quo" a efetuar meros juízos conclusivos, salvo melhor entendimento e que apenas foram valoradas na medida e no interesse do tribunal a quo.
XXIX. O recorrente, coloca em causa o princípio da livre apreciação da prova, patente, como acima se referiu, no art.º 127.º do Código de Processo Penal.
XXX. Fica a dúvida e uma dúvida razoável, tão razoável que faz apelo ao princípio constitucional in dúbio pro reo: implica a existência de uma dúvida razoável que, não permite ao julgador afirmar em consciência e com segurança que, determinado indivíduo cometeu os factos pelos quais vinha acusado e, foram objecto de análise em audiência de julgamento.
XXXI. Violando-se nestes termos os direitos de defesa do arguido, consagrados no artigo 32.º, n.º 1 da CRP, designadamente o Princípio in dúbio pro reo, bem como o artigo 374.º, n.º 2 do CPP.
XXXII. A sentença fundamenta o preenchimento do elemento subjectivo do tipo nas regras da experiência e na ausência de prova em contrário, pelo que sendo vedado ao Tribunal provar o elemento subjectivo do crime com as regras da experiência comum, o Tribunal violou o artigo 127.º do CPP, o que significa que na decisão sobre a matéria de facto o Juiz tem de fazer essa valoração de forma racional e critica e não de forma puramente subjectiva ou arbitraria. Cada uma das provas produzidas tem de ser valorada de forma critica e racional em si mesma, mas também no seu confronto com as outras. A motivação da decisão imposta pelo artigo 97 n.º 5 do CPP e pelos artigos 205.º n.º 1, 32.º n.º 1 e 202.º n.º 1 da CRP, para garantir o controlo da actividade decisória exercida permite posteriormente saber se apreciação da prova foi efetuada dentro desses parâmetros legais o que entende o Recorrente não ter sido o caso uma vez que não estão provados os factos que integram o crime p. e p. pelo artigo 108.º, n. ° 1, com referência aos artigos 1°, 3.° e 4.°, n.º 1, alínea g), todos do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de Dezembro, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 114/2011, de 30 de Novembro, devendo em consequência o arguido ser absolvido.
XXXIII. Por outro lado e apenas por mera cautela de patrocínio, se dirá ainda que a pena que lhe foi aplicada foi também excessiva, inadequada, desproporcionada e desprovida de qualquer finalidade ressocializadora, antes visando, salvo melhor opinião, finalidades primacialmente retributivas, mesmo aí excedendo-as, e, como tal, gravemente violadoras do princípio da culpa e da razoabilidade- violando, por isso, o disposto nos arts. 40.º n.º 1 e 2 e 70.º n.º 1, ambos do CP.
XXXIV. Sendo que, pelas razões e fundamentos supra elencados, caso o arguido não venha a ser absolvido nesta instância, sempre a sua pena se deveria ter situado dentro dos seus valores mínimos.
Nestes termos e nos demais de Direito que Vossas Excelências, Venerandos Desembargadores, doutamente suprirão, deverá o presente recurso ser julgado procedente, revogando a decisão recorrida que deverá ser substituída por outra consentânea com o ora alegado, assim fazendo a já costumada, JUSTIÇA!»
1.8. Os recursos foram regularmente admitidos.
1.9. O Ministério Público, na 1ª instância, respondeu aos recursos, pronunciando-se no sentido da sua improcedência e manutenção da sentença recorrida, concluindo nos seguintes termos:
«1. A douta sentença recorrida não padece de qualquer omissão, bastando atentar na respetiva fundamentação em termos de enquadramento jurídico para concluir que o Mmº Juiz analisou a conduta dos arguidos também à luz do art. 159º do DL 422/89, afastando-o.
2. Não existe qualquer outra omissão na douta sentença, designadamente no que toca à questão da existência ou não de ligação à internet das máquinas apreendidas, já que, não tendo sido invocada tal questão em sede de contestação, não teria que constar entre a factualidade e fundamentação da douta sentença.
3. Ao contrário do que os recorrentes pretendem convencer, esta questão não se trata de uma questão essencial porquanto, com ou sem ligação à Internet, tal circunstancialismo não tinha a capacidade de anular qualquer um dos factos constantes da factualidade provada nem de afastar a criminalização das condutas imputadas.
4. A considerar-se relevante esta questão, esta sê-lo-ia apenas para as condutas posteriores à vigência do DL 66/2015 - porquanto antes nenhum vazio legal existiu, como bem explica o Douto acórdão do TRP de 31.1.2018 (in www.dgsi.pt) e, consequentemente, sempre seria de concluir pelo enquadramento jurídico penal das condutas anteriores nos termos em que o mesmo consta da douta sentença recorrida - e imporia a consideração das condutas dos arguidos à luz daquele diploma, sujeitando-os a penas que, em abstrato, se apresentam mais gravosas.
5. A valoração da prova testemunhal obedeceu aos critérios legais, não existindo qualquer violação do nº 7 do art. 356º do CPP, desde logo porque os depoimentos prestados pelos agentes fiscalizadores foram considerados pelo Mmº Juiz, como não podiam deixar de o ser, na estrita medida em que se trataram de depoimentos diretos - isto é, o Mmº Juiz "a quo" tomou em linha de conta aquelas declarações enquanto reprodução das diligências e atos cautelares efetuados e das conversas tidas nesse contexto, nos exatos termos em que a jurisprudência tem vindo a defender em absoluto a licitude de tal prova - cfr. Ac. TRC de 16.6.2015, a título exemplificativo (in www.dgsi.pt).
6. Não se vislumbra em qualquer ponto da fundamentação da douta sentença recorrida o recurso a prova nula.
7. Os recorrentes impugnam a matéria de facto mas limitam-se à transcrição integral dos depoimentos prestados em audiência, não enunciando as passagens que, na sua ótica, impunham um sentido de decisão diverso do da decisão recorrida - assim incumprindo o ónus da impugnação especificada imposto pelo art. 412º do CPP.
8. Ao invés do cumprimento daquele ónus, os arguidos desenvolvem ao longo das suas peças recursivas um esforço argumentativo no sentido de convencer que os factos dados como provados não têm suporte na prova produzida.
9. Todavia, tal factualidade tem suporte na prova produzida em audiência, designadamente testemunhal, conjugada com as regras da experiência comum e com os exames periciais, e conduzem à convicção da condenação dos recorrentes na sequência de um processo lógico que facilmente se extrai da motivação de facto da sentença condenatória, seja quanto aos factos alusivos à exploração do estabelecimento por parte da arguida, seja quanto à propriedade de duas das máquinas apreendidas e à sua relação com as faturas exibidas aos agentes fiscalizadores e emitidas pela Finegames, seja quanto ao funcionamento das máquinas apreendidas, seja quanto à atribuição de prémios pecuniários em resultado dos jogos por ela desenvolvidos, seja quanto ao elemento subjetivo de cada um dos arguidos.
10. Ademais, ao contrário do defendido pelo recorrente, ao Tribunal é lícito recorrer à prova por presunção judicial, traduzida esta nas ilações que o julgador tira de um facto conhecido para firmar um desconhecido - art. 349º do CC. - sendo que, no caso só pode concluir-se como o Mmº Juiz concluiu, não só por tal prova mas também pela demais, não olvidando o teor dos relatórios periciais juntos no que respeita à atribuição de prémios pecuniários em consequência do resultado dos jogos desenvolvidos nas máquinas apreendidas.
11. O Mmº Juiz fundamentou de forma clara a factualidade dada por provada, invocando a prova testemunhal, documental e o resultado do exame efetuado às máquinas apreendidas.
12. Não há qualquer vício na decisão recorrida, nem na formação da convicção exposta pelo Mmº Juiz recorrido, havendo sim discordância dos arguidos quanto ao modo como o Tribunal formou a sua livre convicção (compreensivelmente diferente daquela que os arguidos formaram).
13. No que respeita concretamente ao elemento subjetivo, perante o silêncio dos arguidos só poderia o Mmº Juiz concluir como concluiu - e fundamentar como fundamentou -, tendo por base a factualidade objectiva provada e as regras da experiência comum.
14. Com efeito, "exceptuando o caso da confissão, não é possível chegar-se à verificação do elemento intencional, senão por meio de provas indirectas" (“A lógica das Provas em Matéria Criminal", pág. 172, citado no Ac. do TRE de 7.1.2014, in www.dgsi.pt).
15. O Mmº Juiz deu por provado o elemento subjectivo com base nas regras da experiência comum já que, ao dar por provada a exploração do estabelecimento pela arguida, impõe a experiência comum que a mesma tivesse conhecimento do demais, por ser do conhecimento corrente entre os comerciantes de restauração e bebidas a distribuição para exploração de máquinas de jogo em tudo idênticas às apreendidas, sabedores da ilicitude da sua conduta.
16. E ao dar por provada a propriedade de duas das máquinas pelo arguido, contextualizada pelas anteriores condenações por crimes da mesma natureza dos julgados nestes autos, impõem as mesmas regras da experiência comum concluir que o arguido conhecia as caraterísticas e regras de funcionamento das suas máquinas.
17. A formação da convicção do Mmº Juiz quanto ao elemento subjetivo decorre de um processo lógico que nenhuma contradição revela, porquanto a experiência comum e os exames periciais não colidem entre si, antes se complementando e auxiliando.
18. Não foi violada qualquer disposição legal - designadamente as invocadas pelos recorrentes - nem o foram os princípios da presunção da inocência e "in dubio pro reo", sendo que o recurso a este último só se impõe em caso de subsistência de dúvidas no espírito do julgador, dúvidas que neste caso não subsistiram.
19. As penas aplicadas aos arguidos são equilibradas, considerando que as exigências de prevenção geral são expressivas, precisamente por reinar na comunidade o sentimento de impunidade relativamente à prática deste ilícito.
20. Quanto à arguida, o Mmº Juiz teve em consideração a ausência de antecedentes criminais mas não ignorou nem podia ignorar a circunstância de estar em causa a prática de cinco crimes num curto período de tempo, circunstância que eleva necessariamente as exigências de prevenção especial; quanto ao arguido, o Mmº Juiz não podia ignorar os antecedentes criminais registados por crimes da mesma natureza dos DOIS ora julgados.
21. Da matéria de facto provada só podia resultar a condenação dos arguidos nos termos em que a mesma consta, fundamentada mente, da douta decisão recorrida.
22. Atendendo ao grau de ilicitude dos factos, à culpa dos arguidos e às fortes exigências de prevenção geral e especial, conclui-se que a operação de determinação e escolha da pena foi corretamente efetuada, cumprindo o disposto nos arts. 70º e 71º do CPenal.
23. Em matéria de custas não assiste razão à recorrente, não só porque os fatores por si invocados foram valorados pelo Mmº Juiz (ainda que não tenham tido o grau de atenuação pretendido pela arguida) mas também porque perfilhamos o entendimento explanado no douto acórdão do TRP de 10.7.2013 (in www.dgsi.pt) do qual resulta que não existe o ónus de fundamentação da sentença em matéria de custas.
24. Consequentemente, bem andou o Mmº Juiz em condenar os recorrentes nos termos em que o fez.
Pelo que, deve ser mantida a sentença proferida nos presentes autos e negado provimento aos recursos interpostos pelos arguidos, bem como ao recurso intercalar apresentado pela arguida e que mereceu a resposta do Ministério Público já junta aos autos, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA»
1.10. Nesta Relação, o Exmº Sr. Procurador-Geral Adjunto, aderindo aos argumentos expendidos pelo Ministério Público junto da 1ª instância, nas respostas aos recursos apresentadas, emitiu parecer no sentido da improcedência dos recursos e da manutenção das decisões que deles são objeto.
1.11. Foi cumprido o disposto no art.º 417º, n.º 2, do Cód. Proc. Penal, não tendo os recorrentes oferecido resposta.
1.12. Efetuado exame preliminar e colhidos os vistos, vieram os autos à conferência, cumprindo agora apreciar e decidir.

2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. Em matéria de recursos, que ora nos ocupa, importa ter presente as seguintes linhas gerais:
O Tribunal da Relação tem poderes de cognição de facto e de direito (cfr. artº. 428º do C.P.P.).
As conclusões da motivação recursiva balizam ou delimitam o respetivo objeto do recurso (cfr. artºs. 402º, 403º e 412º, todos do C.P.P.), delas se devendo extrair as questões a decidir em cada caso.
Tal não impede o conhecimento, também oficioso, dos vícios enumerados nas als. a), b) e c), do nº. 2 do artigo 410º do C.P.P., mas tão somente quando os mesmos resultem do texto da decisão recorrida por si só ou em sua conjugação com as regras da experiência comum (cfr. Ac. do STJ nº. 7/95 – in DR I-Série, de 28/12/1995, ainda hoje atual), bem como das nulidades principais, como tal tipificadas por lei.
2.2. No caso vertente, tendo presentes as considerações que se deixam enunciadas e atentas as conclusões extraídas pelos recorrentes da motivação de recurso que, respetivamente, apresentaram, são suscitadas as seguintes questões:
2.2.1. No recurso do despacho interlocutório interposto pela arguida (…):
(…)

2.2.2. No recurso da sentença interposto pela arguida (…):
- Valoração de prova proibida (n.º 7 do artigo 356º do CPP);
- Impugnação da matéria de facto dada como provada nos pontos 2 a 14 e 16 a 29, por erro notório na apreciação da prova e erro de julgamento;
- Nulidade da sentença por falta de fundamentação, na vertente do exame crítico das provas (artigo 379º, n.º 1, al. a), com referência ao artigo 374º, n.º 2 do CPP);
- Violação dos princípios da presunção de inocência e do in dúbio pro reo e do princípio da livre apreciação da prova, consagrado no artigo 127º do CPP;
- Nulidade da sentença por omissão de pronúncia;
- Medida da pena;
- Valor das custas processuais.

2.2.3. No recurso da sentença interposto pelo arguido (…):
- Valoração de prova proibida (n.º 7 do artigo 356º do CPP);
- Impugnação da matéria de facto dada como provada nos pontos 6, 7 e 10 a 28, por erro notório na apreciação da prova, erro de julgamento e valoração de prova proibida (n.º 7 do artigo 356º do CPP).
- Nulidade da sentença por falta de fundamentação, na vertente do exame crítico das provas (artigo 379º, n.º 1, al. a), com referência ao artigo 374º, n.º 2 do CPP);
- Violação dos princípios da presunção de inocência e do in dúbio pro reo e do princípio da livre apreciação da prova, consagrado no artigo 127º do CPP;
- Nulidade da sentença por omissão de pronúncia;
- Medida da pena.
*
2.3. Para que possamos apreciar as questões suscitadas nos recursos, importa ter presente o teor do despacho interlocutório e da sentença recorridos e que se passam a transcrever:
2.3.1. O despacho interlocutório de que a arguida (…) interpôs recurso, é do seguinte teor:
(…)

2.3.3. A sentença recorrida, nos segmentos que relevam para o efeito, é do seguinte teor:
«(…)
II. FUNDAMENTAÇÃO
1. Factos provados:
A) Da acusação:
A.1.) Processo 192/13.9EAEVR
1. No período compreendido entre o dia 15 de Novembro de 2013 e o dia 22 de Dezembro de 2015, a arguida (…) explorava, geria e dirigia o estabelecimento comercial denominado (…), sito na Rua (…), o que fazia tendo em vista a obtenção de lucro.
2. No dia 15 de Novembro de 2013, pelas 12h00m, no interior desse estabelecimento comercial, ligadas à corrente eléctrica e estando o estabelecimento a funcionar para ser utilizada pelo público encontravam-se duas máquinas de jogo.
3. As referidas máquinas continham as características e os jogos das quais se saliente as seguintes:
1.ª Máquina
I. É uma máquina de cor cinzenta, do tipo vídeo, com a inscrição "Kiosk de Internet", sem referência a modelo, marca ou fabricante. A máquina também não possui qualquer referência quanto a número de fabrico ou de série.
II. É Composta por um móvel com estrutura de madeira de cor cinzenta, possuindo na parte frontal superior um moedeiro, seguido de um monitor táctil de vídeo embutido e numa gaveta situada debaixo do tampo do móvel, no qual se encontra um rato, está instalado um teclado. Na parte inferior situa-se um aceitador de notas e a portinhola do cofre.
III. Através da portinhola no painel traseiro, temos acesso ao computador interno, que possui um disco do tipo "550" de marca "Intel" de 40Gb
IV. Através da leitura do conteúdo do disco duro em busca de software especificamente dedicado ao desenvolvimento de jogos de fortuna ou azar.
V. Assim, num ficheiro denominado "cimbalino.exe" encontram-se elementos indicadores da existência de software para o desenvolvimento de, pelo menos, 2 jogos de fortuna ou azar bem conhecidos, dos quais um denominado "JOLL Y CARD" do tipo poker de cartas e o outro - "HALLOWEEN" do tipo rolos.
VI. Da análise de alguns dos ficheiros legíveis que lhes estão associados, como é o caso do ficheiro "dm32api.dll" e "wina20.dll", existentes no disco duro, constata-se a existência de elementos pertencentes aos referidos jogos
VII. No ficheiro "wina20.dll", por exemplo, são visíveis, no código de programação deste, os elementos pertencentes ao cenário gráfico de um jogo de poker de cartas denominado "Jolly Card".
VIII. No ficheiro "dm32api.dll" observa-se a denominação característica dos ficheiros das imagens que compõem o cenário de jogo do "HALLOWEEN", do tipo rolos.
IX. OS JOGOS DESENVOLVIDOS PELO SOFTWARE:
Trata-se de um jogo de poker de cartas denominado "JOLLY CARD" e de um jogo de rolos, denominado "HALLOWEEN".
A) O jogo de poker "JOLLY CARD"
Este jogo baseia-se numa tabela de sequências premiadas que aparece no próprio cenário de jogo.
- O jogador dispõe de duas tentativas para obter alguma das sequências premiadas. Para tal, aparecem no écran, de modo aleatório, 5 cartas dispostas em linha.
- Após a 1ª tentativa, duas situações podem ocorrer:
1ª situação:
- as cartas que apareceram não constituem uma das sequências premiadas.
O jogador poderá optar por "fixar" as que entender, na expectativa de que, na 2ª tentativa, as que não fixou, sejam substituídas por outras que, juntamente com as já fixadas, venham a constituir uma das sequências premiadas. O jogador também poderá optar por não "fixar" nenhuma das cartas, sendo estas todas substituídas na 2ª tentativa.
2ª situação:
- as cartas que apareceram constituem uma das sequências premiadas.
O jogador deverá "fixar" as cartas que constituem a sequência premiada, para que na 2ª tentativa estas não sejam substituídas.
Serão apenas substituídas as que, eventualmente, não tenham sido fixadas, havendo assim a hipótese de, nalguns casos, vir a obter uma sequência de maior pontuação.
- Após a 2ª tentativa, também 2 situações podem ocorrer:
- 1ª situação:
- Não se obteve uma sequência premiada - O jogo termina!
- 2ª situação:
- Obteve-se, ou melhorou-se uma sequência premiada - O jogador poderá optar, ou por somar (recolher) os créditos ganhos na jogada, aos que já tem, ou por tentar dobrar esses mesmos créditos.
A dobra dos créditos é a etapa final que o jogo proporciona, apresentando-se ao jogador a possibilidade de escolher entre uma carta de valor baixo (de 1 a 6), e uma de valor alto (de 8 a 13 (Rei)), sendo o 7 uma carta neutra (não se perde, nem se ganha).
Se o jogador escolher uma delas e sair a oposta (Ex: se escolher baixa e sair uma carta de valor alto, perde todos os créditos que tinha ganho na jogada.
Se acertou na escolha, os créditos são dobrados e poderá optar por tentar efectuar dobras sucessivas dos créditos ganhos até decidir somá-los, ou perder, terminando assim, o jogo.
B) O jogo de rolos "HALLOWEEN"
O objectivo deste é obter sequências premiadas, sequências estas descritas num menu específico, acedido através de um toque numa determinada tecla do teclado. Este menu apresentará então as imagens contidas nos ficheiros "TABELA1" e "TABELA2".
Introduzindo-se créditos e accionando o jogo através do teclado, são colocados em movimento 5 rolos de figuras, os quais vão parando progressivamente um a um.
Dependendo da quantidade de linhas em que se aposte (1, 5, 9, 15, ou 20) assim as chances de ganho serão maiores ou menores, pois só serão consideradas as combinações que surgirem debaixo das referidas linhas de aposta.
Se a combinação de figuras for alguma que conste da Tabela de Prémios, o jogador ganha os créditos respectivos. Senão, nada ganhará.
X. Através dos procedimentos descritos no relatório pericial foi possível verificar que a máquina supra descrita permite o desenvolvimento, a prática e a exploração de, pelo menos, dois jogos, cujas características, descritas anteriormente, os classificam como jogos de fortuna ou azar.
2.ª Máquina
I -Uma máquina, de pequenas dimensões, com a designação "6 ELEMENTOS ".
1I- Máquina portátil, de várias cores e estrutura em madeira, apresentando nas suas laterais e na parte frontal a inscrição das palavras: "virilidade"; "negócio"; "amor"; "saúde"; "amizade" "finanças" e "6 Elementos".
III - Na parte frontal da máquina encontra-se instalado o mecanismo de introdução de moedas, ao lado do qual, se situa a ranhura através da qual são expelidos pequenos talões.
IV- Na parte traseira situa-se o botão on/off e o cofre.
V- No interior da máquina encontra-se um computador, o disco rígido do tipo SSD, de marca "Kingston", de 30Gb, que suporta o software para funcionamento da mesma e uma impressora
VI- Colocando-se o sistema horário da máquina na data da apreensão e reiniciando-se a mesma, após breves instantes, esta expele pela ranhura, situada na sua parte frontal, um talão de diagnóstico do seu estado funcional
VII- A máquina analisada se encontra em perfeito estado de funcionamento, uma vez que o indicador "PRM" assinala "OK".
VIII - Após esta operação, e depois de se introduzir uma moeda, a máquina expele um talão de jogo por cada 0,50€ que se introduzam.
IX -Desenvolvimento do Jogo:
O jogo baseia-se na combinação aleatória entre dois factores:
- Um número gerado aleatoriamente de entre 8 resultados possíveis: - 1, 2, 5, 10, 20, 50, 100 e 200 que fica inscrito numa frase que denominamos de "aconselhamento".
- Notações aleatórias de 1 a 5 pontos, que ficam inscritas em cada um dos campos denominados "Saúde", "Negócio", "Finanças", "Amor", "Amizade" e "Virilidade".
Assim, extraídos os talões, existem dois resultados possíveis:
- No quadro de notações existem duas notações consecutivas de 5 pontos. Neste caso, o jogador ganha o valor correspondente ao algarismo sorteado na frase de aconselhamento.
- No quadro de notações não existem duas notações consecutivas de 5 pontos. Neste caso, o jogador nada ganha, seja qual for o número presente no quadro de aconselhamento
X - O objetivo do jogo que este tipo de máquina desenvolve consiste em obter talões premiados que, dependentemente da conjugação aleatória de dois factores, também eles gerados aleatoriamente conforme explicado anteriormente, podem proporcionar um ganho de 1, 2, 5, 10, 20, 50, 100, ou 200€. Para o efeito, a intervenção do jogador limita-se à introdução de moedas na máquina.
XI - O jogo apresenta, portanto, como resultados, pontuações de conversão directa em dinheiro, sendo que estas são geradas e apresentadas de uma forma exclusivamente dependente da sorte, sem que o jogador possa, por sua intervenção, condicionar o resultado final. Assim sendo, estamos perante um jogo de fortuna ou azar.
A.2.) Processo 32/14.1EAEVR
4. No dia 7 de Março de 2014, pelas 11h00m, a arguida, estando o estabelecimento explorado pela arguida (…) e denominado (…), sito na Rua (…), em pleno funcionamento, tinha uma máquina electrónica denominada "quiosque de internet", ligadas à corrente eléctrica, sem qualquer valor monetário no interior do cofre.
5. A referida máquina tinha as características e os jogos desenvolvidos das quais se salienta as seguintes características:
1.ª Máquina "Kiosk de Internet"
I - Trata-se de uma máquina de cor cinzenta, do tipo vídeo (Foto 1), com a inscrição "Kiosk de Internet", sem referência a modelo, marca ou fabricante. A máquina também não possui qualquer referência quanto a número de fabrico ou de série.
II - É constituída por um móvel com estrutura de madeira de cor castanha, possuindo na parte frontal superior um moedeiro, seguido de um monitor táctil de vídeo embutido e numa gaveta situada debaixo do tampo do móvel, no qual se encontra um rato, está instalado um teclado. Na parte inferior situa-se um aceitador de notas e a portinhola do cofre.
III - Através da portinhola no painel traseiro, temos acesso ao computador interno, que possui um disco do tipo "SSD" de marca "Kingston" de 60G
IV- Ao ligar-se a máquina à corrente eléctrica aparece no ecrã a informação de inicialização do seu sistema operativo "Windows XP", acabando por colocar no ecrã a imagem estática de uma página de acesso ao "Facebook". No entanto, quando se introduzem moedas, ou notas, nada acontece. Estas máquinas são conhecidas por necessitarem de um código de toques em determinadas áreas do ecrã táctil, para a invocação de um teclado virtual no qual se digita um código para activação de jogos de fortuna ou azar. O código de toques inicial é desconhecido.
V- No entanto, mesmo que este fosse conhecido, devido ao facto de o dispositivo de bloqueio já ter desabilitado o referido código, torna-se impossível invocar o teclado virtual que permitiria o acesso ao menu de escolha dos jogos de fortuna ou azar.
VI- Recorreu-se à leitura do conteúdo do disco duro em busca de software especificamente dedicado ao desenvolvimento de jogos de fortuna ou azar.
VII- Assim, num ficheiro denominado "cimbalino.exe", encontram-se elementos indicadores da existência de software para o desenvolvimento de, pelo menos, 2 jogos de fortuna ou azar bem conhecidos, dos quais um denominado "JOLLY CARD" do tipo poker de cartas e o outro - "HALLOWEEN" do tipo rolos.
VIII- Os jogos desenvolvidos pelo software:
Os jogos desenvolvidos são o jogo de poker de cartas denominado "JOLLY CARD" e de um jogo de rolos, denominado "HALLOWEEN".
A) O jogo de poker "JOLLY CARD"
Este jogo baseia-se numa tabela de sequencias premiadas que aparece no próprio cenário de jogo - O jogador dispõe de duas tentativas para obter alguma das sequências premiadas. Para tal, aparecem no écran, de modo aleatório, 5 cartas dispostas em linha.
- Após a 1ª tentativa, duas situações podem ocorrer:
- 1ª situação:
- as cartas que apareceram não constituem uma das sequências premiadas.
O jogador poderá optar por "fixar" as que entender, na expectativa de que, na 2ª tentativa, as que não fixou, sejam substituídas por outras que, juntamente com as já fixadas, venham a constituir uma das sequências premiadas. O jogador também poderá optar por não "fixar" nenhuma das cartas, sendo estas todas substituídas na 2ª tentativa.
- 2ª situação:
- as cartas que apareceram constituem uma das sequências premiadas.
O jogador deverá "fixar" as cartas que constituem a sequência premiada, para que na 2ª tentativa estas não sejam substituídas.
Serão apenas substituídas as que, eventualmente, não tenham sido fixadas, havendo assim a hipótese de, nalguns casos, vir a obter uma sequência de maior pontuação.
- Após a 2ª tentativa, também 2 situações podem ocorrer:
- 1ª situação:
- Não se obteve uma sequência premiada - O jogo termina!
- 2ª situação:
- Obteve-se, ou melhorou-se uma sequência premiada - O jogador poderá optar, ou por somar (recolher) os créditos ganhos na jogada, aos que já tem, ou por tentar dobrar esses mesmos créditos.
A dobra dos créditos é a etapa final que o jogo proporciona, apresentando-se ao jogador a possibilidade de escolher entre uma carta de valor baixo (de 1 a 6), e uma de valor alto (de 8 a 13 (Rei)), sendo o 7 uma carta neutra (não se perde, nem se ganha).
Se o jogador escolher uma delas e sair a oposta (Ex: se escolher baixa e sair uma carta de valor alto, perde todos os créditos que tinha ganho na jogada.
Se acertou na escolha, os créditos são dobrados e poderá optar por tentar efectuar dobras sucessivas dos créditos ganhos até decidir somá-los, ou perder, terminando assim, o jogo.
B) O jogo de rolos "HALLOWEEN"
O objectivo deste é obter sequências premiadas, sequências estas descritas num menu específico, acedido através de um toque numa determinada tecla do teclado. Este menu apresentará então as imagens contidas nos ficheiros "TABELA1" e "TABELA2".
Introduzindo-se créditos e accionando o jogo através do teclado, são colocados em movimento 5 rolos de figuras, os quais vão parando progressivamente um a um. Dependendo da quantidade de linhas em que se aposte (1,5,9, 15, ou 20) assim as chances de ganho serão maiores ou menores, pois só serão consideradas as combinações que surgirem debaixo das referidas linhas de aposta.
Se a combinação de figuras for alguma que conste da Tabela de Prémios, o jogador ganha os créditos respectivos. Senão, nada ganhará.
VIII- O desenvolvimento dos jogos de fortuna ou azar instalados na máquina só pode ser despoletado através da invocação de um teclado virtual por intermédio de toques em determinados pontos do ecrã, no qual se digita um código alfanumérico que é do conhecimento do explorador e do proprietário da máquina. Tal procedimento encontra-se desabilitado por actuação de um dispositivo de bloqueio devido à expiração do prazo de validade dos códigos, não se podendo colocar em desenvolvimento os mencionados jogos.
IX- No entanto, é através dos procedimentos descritos, ora bloqueados, que se permite o desenvolvimento, a prática e a exploração de, pelo menos, dois jogos, cujas características, descritas anteriormente, os classificam como jogos de fortuna ou azar
A.3.) Processo 41/14.0EAL5B
6. No dia 10 de Abril de 2014, pelas 12h00m, no interior do estabelecimento comercial, denominado (…), explorado pela (…) e denominado (…) sito na (…), a arguida tinha em pleno funcionamento, tinha uma máquina electrónica tipo "Photoplay" ligada à corrente eléctrica, propriedade da empresa (…).
7. A referida máquina tinha as características e os jogos desenvolvidos, das quais se salienta as seguintes:
I - Trata-se de uma máquina de balcão, de cor preta, do tipo vídeo, sem qualquer inscrição, nem designação de modelo, marca ou fabricante. A máquina também não possui qualquer referência quanto a número de fabrico ou de série
II - O Móvel com estrutura de madeira, possuindo na parte frontal um monitor táctil de vídeo embutido. No painel lateral direito encontra-se instalado um aceitador de notas e, no painel lateral esquerdo, um moedeiro. No interior do móvel está o computador cujo disco duro, do tipo SSD de 64Gb, da marca "Kingston", serve de suporte informático a vários programas, entre os quais, software para o desenvolvimento de jogos de fortuna ou azar.
III - Ao ligar-se a máquina à corrente eléctrica aparece no ecrã a informação de inicialização do seu sistema operativo "Windows XP", acabando por colocar no ecrã a imagem estática de uma página de acesso ao "Facebook", a mensagem "Please wait" com uma contagem decrescente e a inscrição em rodapé "INSERT COIN"
IV- No entanto, quando se introduzem moedas, ou notas, nada acontece. Estas máquinas são conhecidas por necessitarem de um código de toques em determinadas áreas do ecrã táctil, para a invocação de um teclado virtual no qual se digita um código para activação de jogos de fortuna ou azar. Neste caso, o código de toques inicial é desconhecido. Todavia, mesmo que os procedimentos e códigos fossem conhecidos, expirado o prazo de validade destes, que é normalmente de 1 mês, torna-se impossível invocar o teclado virtual e, por conseguinte, colocarem-se em desenvolvimento os jogos de fortuna ou azar, pois os processos informáticos para tal são bloqueados por um dispositivo ligado à porta paralela do computador, pois é apenas para isso que o referido dispositivo serve. Dada a data da apreensão, o código de toques e o código que invoca os jogos já há muito que estariam expirados.
V- Recorreu-se à leitura do conteúdo do disco duro em busca de software especificamente dedicado ao desenvolvimento de jogos de fortuna ou azar.
VI- Assim, num ficheiro denominado "cimbalino.exe" encontram-se elementos indiciadores da existência de software para o desenvolvimento de, pelo menos, 2 jogos de fortuna ou azar bem conhecidos, dos quais um denominado "JOLLY CARD" do tipo poker de cartas e o outro - "HALLOWEEN" do tipo rolo
VII- Da análise de alguns dos ficheiros legíveis que lhes estão associados, como é o caso do ficheiro "dm32api.dll" e "wina20.dll", constata-se a existência de elementos pertencentes aos referidos jogos. No ficheiro "wina20.dll", por exemplo, são visíveis, no código de programação deste, os elementos pertencentes ao cenário gráfico de um jogo de poker de cartas denominado "Jolly Card", como se demonstra com imagens do próprio jogo, recolhidas de uma máquina funcional. No ficheiro "dm32api.dll" observa-se a denominação característica dos ficheiros das imagens que compõem o cenário de jogo do "HALLOWEEN", do tipo rolos.
VIII- OS JOGOS DESENVOLVIDOS PELO SOFTWARE:
Trata-se de, pelo menos, um jogo de poker de cartas denominado "JOLLY CARD" e de um jogo de rolos, denominado "HALLOWEEN".
A) O jogo de poker "JOLLY CARD"
Este jogo baseia-se numa tabela de sequências premiadas que aparece no próprio cenário de jogo.
- O jogador dispõe de duas tentativas para obter alguma das sequências premiadas. Para tal, aparecem no écran, de modo aleatório, 5 cartas dispostas em linha.
- Após a 1ª tentativa, duas situações podem ocorrer:
- 1ª situação:
- as cartas que apareceram não constituem uma das sequências premiadas.
O jogador poderá optar por "fixar" as que entender, na expectativa de que, na 2ª tentativa, as que não fixou, sejam substituídas por outras que, juntamente com as já fixadas, venham a constituir uma das sequências premiadas. O jogador também poderá optar por não "fixar" nenhuma das cartas, sendo estas todas substituídas na 2ª tentativa.
- 2ª situação:
- as cartas que apareceram constituem uma das sequências premiadas.
O jogador deverá "fixar" as cartas que constituem a sequência premiada, para que na 2ª tentativa estas não sejam substituídas.
Serão apenas substituídas as que, eventualmente, não tenham sido fixadas, havendo assim a hipótese de, nalguns casos, vir a obter uma sequência de maior pontuação.
- Após a 2ª tentativa, também 2 situações podem ocorrer:
- 1ª situação:
- Não se obteve uma sequência premiada - O jogo termina!
- 2ª situação:
- Obteve-se, ou melhorou-se uma sequência premiada - O jogador poderá optar, ou por somar (recolher) os créditos ganhos na jogada, aos que já tem, ou por tentar dobrar esses mesmos créditos.
A dobra dos créditos é a etapa final que o jogo proporciona, apresentando-se ao jogador a possibilidade de escolher entre uma carta de valor baixo (de 1 a 6), e uma de valor alto (de 8 a 13 (Rei)), sendo o 7 uma carta neutra (não se perde, nem se ganha).
Se o jogador escolher uma delas e sair a oposta (Ex: se escolher baixa e sair uma carta de valor alto, perde todos os créditos que tinha ganho na jogada.
Se acertou na escolha, os créditos são dobrados e poderá optar por tentar efectuar dobras sucessivas dos créditos ganhos até decidir somá-los, ou perder, terminando assim, o jogo.
B) O jogo de rolos "HALLOWEEN"
O objectivo deste é obter sequências premiadas, sequências estas descritas num menu específico, acedido através de um toque numa determinada tecla do teclado. Este menu apresentará então as imagens contidas nos ficheiros "TABELA1" e "TABELA2".
Introduzindo-se créditos e accionando o jogo através do teclado, são colocados em movimento 5 rolos de figuras, os quais vão parando progressivamente um a um. Dependendo da quantidade de linhas em que se aposte (1, 5, 9,15, ou 20) assim as chances de ganho serão maiores ou menores, pois só serão consideradas as combinações que surgirem debaixo das referidas linhas de aposta.
Se a combinação de figuras for alguma que conste da Tabela de Prémios, o jogador ganha os créditos respectivos. Senão, nada ganhará.
A.4.) Processo 16/15.2F1 EVR
8. No dia 18 de Março de 2015, pelas 17h00m, no interior do estabelecimento comercial, denominado (…), explorado pela arguida (…), sito na Rua (…), a arguida tinha em pleno funcionamento, uma máquina electrónica tipo "Slot Machine" ligada à corrente eléctrica.
9. A referida máquina tinha as características e os jogos desenvolvidos das quais se salienta as seguintes características:
Máquina electrónica tipo "Slot Machine"
I - Trata-se de uma máquina de sem qualquer designação e sem qualquer referência quanto ao fabricante ou número de fabrico, de cor cinzenta, com estrutura em madeira, na zona frontal visualiza-se um écran de vídeo e é acompanhada por um teclado e um rato. Na parte superior direita, visualiza-se o mecanismo de introdução de moedas e, na parte inferior, o mecanismo de introdução de notas.
II - Através do recurso a software específico, procedeu-se à leitura dos discos rígidos, e da análise efetuada, constou-se a existência de uma aplicação (programa informático), que contém ficheiros auxiliares ao funcionamento desta, e que fazem referência a quatro jogos de fortuna ou azar, nomeadamente, "JOLLY", "HALLOWEN", "NEWGAME" e "MUL TIGAME".
III - Identificado o software, a experiência diz-nos, que as máquinas com este tipo de software possuem um sistema de códigos de acesso ao jogo de fortuna ou azar variáveis, sendo estes programados para mudarem automaticamente, ao fim de determinado período de tempo.
IV- Apesar de não ter sido possível colocar em funcionamento a referida aplicação, dado que é necessário a introdução de um código de acesso, no entanto, nos ficheiros auxiliares conseguiu-se identificar elementos que são característicos no desenvolvimento de jogos de vídeo-póquer e do tipo slot-machine, nomeadamente, a tabela de prémios e palavras alusivas ao jogo de póquer
V- Além de se encontrar elementos que só são utilizados para o desenvolvimento de jogos de vídeo-poker, verificou-se, também, a presença de elementos utilizados no desenvolvimento de jogos de slot machine
VI- Comparando os elementos encontrados e utilizados no jogo de slot machine com a aplicação (programa informático) do jogo "HALLOWEN", verificou-se a existência de uma relação. Assim, podemos concluir que os ficheiros auxiliares, no caso em apreço imagens, são utilizadas no decorrer do aludido jogo.
VII-Desenvolvimento dos Jogos
Os jogos de vídeo-poker, com a denominação "JOL Y CARD", "NEWGAME" e "MULTIGAME", apresentam o mesmo desenvolvimento e resultados, apenas exibem um grafismo diferente.
A) Vídeo-poker
Assim, para aceder ao jogo de fortuna ou azar (vídeo-poker), temos de inserir o código alfanumérico no quadro que surge no écran.
O jogo inicia-se com o jogador a decidir o número de apostas com que pretende efetuar cada jogada (Bet).
Surgem então, de imediato, em simultâneo, de forma aleatória e dispostas em linha, na base do écran, cinco cartas. Cada uma destas cartas, pertence a um baralho, podendo portanto, aparecer qualquer uma das 52 cartas e ainda a figura de um Joker que substitui qualquer carta numa sequência premiada.
O jogador poderá optar por "fixar" as cartas que entender, na expectativa de que, as que não fixou, sejam substituídas por outras que, conjuntamente com as já fixadas, venham a constituir uma das sequências premiadas admitidas pela máquina e visualizadas no próprio écran no decorrer de todo o jogo.
A fixação das cartas é feita tocando a carta escolhida, aparecendo de imediato a informação de que a carta está fixa (através do aparecimento das palavras (HOLD) ou (STOP) ou (HELD CARDS)). Se o jogador mudar de ideias e não quiser fixar a carta, toca-a novamente, sendo de evidenciar que, quando surge, logo à partida, uma combinação suscetível de dar prémio, é a própria máquina que fixa tais combinações.
Então, duas situações podem acontecer:
- A combinação que saiu não é premiada, e neste caso o jogo termina;
- A combinação que saiu é premiada, e o jogador poderá optar por somar ("creditar") os créditos ganhos na jogada, aos que já tem, ou por tentar dobrar esses mesmos créditos, para tal, este terá de escolher entre uma carta alta ("High" ou "Alta"), ou, uma carta baixa ("Low" ou "BAIXA"), ou small ou big.
Caso decida recolher os pontos obtidos, a jogada acaba, podendo iniciar outra imediatamente.
Caso decida arriscar a dobra e sair uma carta do valor em que apostou, o jogador duplica os créditos apostados, caso contrário, perderá tudo e a jogada termina.
O objetivo dos jogos, tal como no VIDEO-POKER, é o de conseguir combinações premiadas tais como: SEQUÊNCIA REAL (ás, rei, dama, valete e 10 do mesmo naipe), SEQUÊNCIA NUMÉRICA, SEQUÊNCIA DE COR, FULLEN, TRIOS, PARES, etc.
De salientar que, o lançamento das cartas, tal como a substituição das não "fixadas", como ainda o sorteio da carta para a dobra, são processos totalmente aleatórios executados pela aplicação de jogo.
S) Jogo de tipo slot machine denominado "Halloween",
O menu de jogo é composto por cinco rolos de símbolos (colunas) e três linhas, perfazendo quinze quadrados com imagens. A ladear estes quadros encontram-se dispostos em coluna, números compreendidos entre 1 e 20, sendo que estes representam as várias linhas de apostas que o jogador poderá efetuar em cada jogada.
Os rolos são todos iguais, possuindo cada um 10 símbolos (imagens) os quais se encontram identificados na "Tabela de Prémios". No cenário de jogo estão apenas visíveis 3 símbolos de cada rolo (perfazendo um total de 15), os quais, no desenvolvimento do jogo, produzirão combinações aleatórias que poderão, ou não, coincidir com as combinações existentes na "Tabela de Prémios".
As "linhas" de aposta são linhas virtuais que atravessam a janela de jogo lado a lado. Estas podem ser simples retas, ou quebradas em várias configurações.
Só os símbolos que ficarem sob a mesma linha é que configuram uma combinação de jogo, sendo que todos os outros são ignorados.
Após decisão do número de créditos que se pretendem apostar numa jogada, o jogador pode acionar o "botão", que se encontra na base do écran e do lado direito com os dizeres "INICIAR", dando origem a que as 5 colunas que se encontram ao centro do écran comecem a deslizar, do sentido superior para o inferior, simulando o funcionamento de uma máquina de rolos dos casinos, até ao ponto em que automaticamente se imobilizam ficando em cada um dos quadrados um símbolo.
Se a combinação aleatória desses símbolos constar da relação das combinações consideradas premiadas, o jogador ganha, perdendo em caso contrário.
No caso de o jogador ter uma combinação premiada, os pontos/créditos ganhos, são de imediato incrementados na janela com a inscrição "Prémio".
Em suma, o sistema de funcionamento é igual ao das vulgares "SLOT MACHINES" dos casinos e consiste em tentar-se, mediante o arriscar de dinheiro, convertido em créditos, obter aleatoriamente combinações com direito a prémio, resultado esse que depende em tudo da sorte, independentemente da perícia do jogador, uma vez que o jogador não tem qualquer tipo de influência no resultado final do jogo analisado. ---
A.5.) Processo 60/15.0F1EVR
10. No dia 22 de Dezembro de 2015, pelas 16h40m, no interior do estabelecimento comercial, denominado (…), explorado pela arguida (…), sito na Rua (…), a arguida tinha em pleno funcionamento, uma máquina electrónica tipo "Kiosk de internet" ligada à corrente eléctrica, propriedade da empresa (…).
11. A máquina tinha as características e os jogos das quais se salienta as seguintes:
Máquina electrónica tipo "Kiosk Internet"
Máquina tipo vídeo, de média dimensão, com estrutura azul e sem designação constituída por monitor, teclado, rato e com mecanismo de introdução de notas e de moedas incorporados. Aberta a porta traseira de acesso ao interior da máquina visualiza-se um cpu.
Tendo em vista a preservação do conteúdo do disco, dado que existe software que pode efetuar o reset ao mesmo caso seja ligada a máquina e não seja introduzido um código de acesso, procedeu-se à análise forense do mesmo.
A leitura do disco permitiu aferir que tem apenas uma partição com o sistema operativo Windows e outro software. Pela análise imediata da estrutura do disco foi possível aferir que o executável cimbalino e os ficheiros DM32API.DLL E DM32API.SYS, foram executados nos dias 22.12.2015 e 21.12.2015, pelo que se afere que o jogo Halloween foi executado nessas datas.
Através de software específico foi possível visualizar e extrair ficheiros que invocam os jogos Newgame (vídeo poker), Jolly Card (vídeo poker), Multigame (vídeo poker), Halloween (slot machine), Pantanal (slot machine), Bucaneiros (slot machine) e Card (slot machine).
Nos ficheiros associados ao jogo de vídeo poker Newgame - Winavid.dll - foi possível verificar a existência de expressões utilizadas apenas no jogo de vídeo poker.
No caso dos ficheiros associados ao jogo de vídeo poker Jolly Card - Wina20. sys e Wina20.dl/ - ficheiros de imagem e ficheiros com expressões associadas ao jogo de poker.
No caso dos ficheiros associados ao jogo Mu/tigame - CP_870.NLS - referências à tabela de combinações premiadas.
Nos ficheiros associados aos jogos de slot machine Halloween (Om32apih.sys - Hallowen) e Pantanal (Om32apip.sys - Pant), Bucaneiros (Om32apib.sys) e Cards (Om32apic.sys) - Dm32.api.dll - foi efetuada a comparação da sua designação com ficheiros existentes em discos que desenvolvem o mesmo jogo e cuja máquina não se encontra bloqueada, tendo sido possível efetuar a correspondência entre os ficheiros pela sua designação e as correspondentes imagens que compõem o cenário gráfico do jogo.
Desenvolvimento dos Jogos:
A)Vídeo poker
Os jogos com a designação Newgame, Mu/tigame e Jolly Card são jogos de vídeo poker.
O objetivo do jogo de vídeo poker é o de conseguir combinações premiadas tais como: Sequência real, Sequência numérica, Sequência de cor, Fullen, Trios, Pares, tudo dependendo da sorte, independentemente da perícia do jogador.
O jogo inicia-se com a marcação de créditos que se pretende apostar na jogada. Surge então, em simultâneo, de forma aleatória e dispostas em linha na base do ecrã, cinco cartas de face voltada. Cada uma destas cartas pertence a um baralho convencional e mais cinco Joker's, podendo portanto aparecer qualquer uma das 52 cartas e os Joker's que para efeito de combinações substituem qualquer carta. O jogador pode, nesta fase do jogo e se assim o pretender, fixar alguma das cartas de modo a tentar obter uma sequência premiada. De seguida dá-se prosseguimento à jogada, aparecendo novas cartas em detrimento daquelas que não foram fixadas.
O utilizador tal como no jogo de poker pode apostar em diversas sequências, designadamente na sequência de 5 figuras da mesma cor (Cor), como na escolha de 3 (Trio) ou 4 (Poker) figuras com o mesmo número mas de cores diferentes, ou em qualquer outra combinação admitida neste tipo de jogo.
Quando tem uma combinação premiada, o jogador pode optar por fazer a colecta dos pontos - creditar (ficando registado os pontos ganhos no visor identificado por "prémio") ou "dobrar" os pontos obtidos.
B) Slot machine
Os jogos com a designação Halloween e Pantanal são jogos de slot machine.
Após a introdução de créditos, o jogador escolhe o número de créditos a apostar por jogada, que poderá variar de 1 a 200 créditos, e dá início ao jogo. De imediato começam a girar no sentido vertical as cinco colunas sendo que cada uma tem três símbolos e a jogada só acaba quando o movimento giratório termina, sendo logo assinalado pela máquina a existência ou não de uma das combinações premiadas.
Da análise efectuada à máquina de jogo verificou-se a existência de aplicações, ficheiros e expressões associadas exclusivamente aos jogos acima referenciados e descritos, pelo que é possível concluir que a máquina estava apta a possibilitar a prática de três jogos de vídeo poker e quatro de slot machine.
12. As máquinas supra descritas, apreendidas nos dias 10.04.2014 e 22.12.2015, foram colocadas no referido estabelecimento explorado pela arguida, à exploração, pela sociedade comercial denominada (…), de que o arguido (…) é o único gerente.
13. Nessa qualidade, o arguido (…) colocou as referidas máquinas à exploração no estabelecimento comercial acima identificado, repartindo o lucro obtido com tal exploração.
14. Assim, agiram os arguidos, com o propósito, concretizado, de explorar economicamente o funcionamento das máquinas que tinham e colocavam à exploração perante o público, num local legalmente não autorizado, bem sabendo que os resultados em nada dependiam da perícia e destreza dos jogadores que se disponibilizassem a nela jogar, apostando dinheiro, na esperança aleatória de ganhar um prémio maior - em dinheiro ou coisas com valor económico -, sendo o resultado contingente e dependente única e exclusivamente da sorte.
15. O arguido (…) é único gerente da referida sociedade, agindo em nome e no interesse da mesma.
16. A arguida (…) explorava em conjunto com o arguido (…) as referidas máquinas.
17. Os arguidos colocaram-nas em funcionamento no interior do estabelecimento comercial indicado, com vista ao lucro, proporcionando aos eventuais interessados a respectiva utilização, como sucedeu anteriormente à data dos factos.
18. Desde a data em que as referidas máquinas foram colocadas pelo arguido (…) no estabelecimento comercial explorado pela arguida (…) e até à data da sua apreensão à ordem dos presentes autos, que tais máquinas sempre estiveram acessíveis, disponíveis e em condições de serem utilizadas, proporcionando aos clientes do dito estabelecimento a prática dos jogos desenvolvidos pelas mesmas.
19. Era a arguida (…) quem permitia o acesso dos clientes às supra referidas máquinas, quem lhes entregava os prémios em dinheiro que ganhavam e quem dividia com os arguidos (…) as receitas provenientes dos jogos desenvolvidos.
20. Os arguidos sabiam que não possuíam autorização da Inspecção Geral de Jogos para explorarem as referidas máquinas, caracterizadas e inequivocamente destinadas à prática de jogos de fortuna ou azar no estabelecimento comercial referido.
21. Conheciam também todos os arguidos as características das máquinas de jogos de fortuna ou azar e o modo como os mesmos se desenvolviam e processavam.
22. Não obstante tal conhecimento, os arguidos procederam à respectiva exposição, exploração e manutenção de tais máquinas, todos visando a obtenção de lucros, cientes de que não tinham autorização ou licença para a exploração de jogos de fortuna ou azar naquele estabelecimento comercial e que tal só era permitido em zonas de jogo legalmente autorizadas e por entidades concessionárias.
23. Os arguidos (…) agiram em comunhão de esforços e de intentos, bem cientes da forma como os jogos acima descritos se processavam, bem sabendo que lhes estava vedada a sua exploração sem a mencionada autorização ou licença e que tais tipos de jogo só podiam ser explorados nas zonas de jogo legalmente autorizadas e por entidades concessionadas.
24. Agiram os arguidos de forma livre, voluntária e consciente, com intenção de obterem, com a exploração das referidas máquinas, proventos económicos.
25. Mais sabiam os arguidos que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei penal.
A.6.) Processo 30/16.EAEVR - Apenso A do proc. n.º 192/13.9EAEVR
26. Desde data não concretamente apurada mas certamente até ao dia 16 de Junho de 2016, a arguida (…) explorava, geria e dirigia o estabelecimento comercial denominado (…), sito na Rua (…), o que fazia tendo em vista a obtenção de lucro.
27. No dia 16 de Junho de 2016, pelas 12h10m, no interior desse estabelecimento comercial e estando o estabelecimento a funcionar, encontravam-se uma máquina de jogo, com factura da empresa instaladora (…).
28. A referida máquina continha as características e os jogos desenvolvidos que se salienta as seguintes:
"1- É uma máquina electrónica, tipo vídeo, com a inscrição "Kiosk de Internet", inserida numa estrutura de madeira, composta por CPU e monitor táctil, sem qualquer documento identificativo.
2- A máquina possui instalado dispositivo para introdução e eventual rejeição de moedas bem como mecanismo para a introdução de notas.
3- No interior da máquina encontra-se a CPU/componentes informáticos responsáveis pela execução das instruções e pelo controlo do sistema, assim como o componente de dados SSD (Intel de 40GB, S/N:CVPR140307BK04DAGN) que funciona como suporte dos jogos que a máquina poderá desenvolver.
II - FUNCIONAMENTO
1- Ligando a máquina à corrente elétrica aparece no ecrã a informação de inicialização do seu sistema operativo, arrancando de seguida com a imagem da página de internet do "Facebook" (Imagem estática) tendo sobreposta uma contagem de tempo decrescente bem como a mensagem "## IN5ERT COIN ##, bloqueando quando terminada a respetiva contagem.
2- Este tipo de máquina, através de toques em determinadas áreas do ecrã faz aparecer um teclado virtual no qual se digita um código para ativação de jogos de fortuna ou azar.
3- Depois de expirado o prazo de validade dos códigos (que é normalmente de um mês), torna-se impossível colocar em desenvolvimento os jogos de fortuna ou azar, tornando-se assim impossível invocar o teclado virtual anteriormente referido, e consequentemente, colocar os jogos em desenvolvimento.
4- Pelo exposto anteriormente, optou por retirar o respetivo suporte de dados e submeter o mesmo a uma análise no âmbito forense-digital, centrando-se esta na busca de ficheiros relacionados com jogos de fortuna ou azar ou evidências da sua existência.
III - ANÁLISE DO SUPORTE DE DADOS
1- A máquina inicia com o sistema operativo Windows XP, e juntamente com este, um programa de gestão de acesso "CIMBALlNO.EXE".
2- Na análise do suporte de dados, com recurso a software específico, no executável "CIMBALINO.EXE" (inicia juntamente com o sistema operativo), existente na diretoria "WINDOWSJSYSTEM32", encontram-se elementos indicadores do Software para o desenvolvimento de jogos de fortuna ou azar, tanto de vídeopoker como de vídeo-rolos.
3- Os elementos encontrados na análise à aplicação "Cimbalino.exe" dizem respeito aos jogos denominados "JOLLY" (Jolly Card) e "NEWGAME" (jogos de Vídeopóquer) e aos jogos "HALLOWI:::I:::N", "PANTANAL", "BUCANI:IROS" "CLEOPATRA" e "CARDS" (jogos tipo vídeo-rolos (slot machine).
4- Na análise das respetivas aplicações de jogo verificou-se que DM32API.DLL (responsável pela execução dos jogos tipo vídeo-rolos) foi executado 1414 vezes, verificando-se ainda a última execução em 15-06-2016 pelas 22h56. (Imagem 3D).
5- Para melhor compreensão, apresentam-se imagens de arquivo dos jogos em desenvolvimento, que estariam instalados na máquina em análise e prontos a serem executados, retiradas de máquinas onde foi possível visualizar os' mesmos em desenvolvimentos.
6- Foi ainda possível identificar vocábulos característicos das opções disponibilizadas Y pelos jogos de vídeopóquer, tais como: BET, CARDS, HOLO, ACCCREDITO, U OOPPIO/ BASSA etc., encontrados nos ficheiros (WINA20.DLL).
7- Constatou-se ainda que determinados ficheiros referenciam imagens que correspondem às imagens que se visualizam no desenvolvimento do jogo de vídeo-rolos com a designação de HALLOWEEN.
8- As imagens apresentadas dizem respeito ao jogo "Halloween", no entanto verifica-se que existem várias versões, sendo que as divergências entre elas se traduzem em diferenças subtis ao nível do cenário gráfico, em nada influenciando o seu desenrolar e desenvolvimento, uma vez que o jogo base é o mesmo.
9- De salientar que a máquina ora analisada está apta a desenvolver pelo menos oito jogos de fortuna ou azar, sendo que por norma estes não estão em exploração simultânea, recaindo a sua escolha no proprietário ou explorador.
IV - DESCRICÃO DOS JOGOS
IV. I - Jogos de vídeo-póquer JOLLY, NEWGAME e MULTIGAME
1- Estes jogos consistem em conseguir combinações premiadas tais como: Sequência Real, Sequência Numérica, Sequência de Cor, Trios, Pares, etc. previstas no poker.
2- Introduzidos os créditos, decidido o valor da aposta e dando início à jogada, surgem em simultâneo, de forma aleatória e dispostas em linha, cinco cartas de um baralho convencional podendo, portanto, aparecer qualquer uma das 52 cartas ou o Joker que, para efeito de combinações, substitui qualquer carta.
3- O jogador pode, nesta fase do jogo e se assim o pretender, fixar alguma das cartas de modo a tentar aumentar a probabilidade de obter uma sequência premiada ("STOP", "HOLD", "HELD"). De seguida dá-se prosseguimento à jogada, aparecendo novas cartas em detrimento daquelas que não foram fixadas. Assim, uma de duas situações pode ocorrer:
a. A combinação que saiu não é premiada e a jogada termina;
b. A combinação que saiu é premiada, sendo dada ao jogador a opção de decidir entre fazer a recolha dos pontos obtidos ou duplicar os créditos ganhos, ou seja fazer a dobra.
4- O jogador terá de apostar no maior "ALTA"/"BIG" - conjunto de cartas altas "Rei, Dama, Valete, Dez, Nove e Oito", ou no pequeno "BASSA"/"SMALL" - conjunto de cartas baixas "Seis; Cinco, Quatro, Três, Dóis e Às".
5- Após a escolha é visualizada a carta, sendo dobrado o valor do prémio no caso de a aposta ter sido acertada. Inversamente acaba a jogada, perdendo o jogador o valor do prémio obtido.
6- Nos jogos de VIDEO-POKER, como já mencionado anteriormente, o objetivo é conseguir combinações premiadas, elencadas na Tabela de Prémios, tais como:
SEQUÊNCIA REAL (Às - Rei - Valete - Dama - 10, do mesmo naipe), SEQUÊNCIA NUMÉRICA, SEQUÊNCIA DE COR, FULLEN, TRIOS, PARES, etc., dependentes fundamentalmente da sorte, independentemente da perícia e/ou destreza do jogador.
IV.2 - Jogos de vídeo-rolos HALLOWEEN, PANTANAL, BUCANEIROS, CARDS e CLEOPATRA
1- Neste tipo de jogos o sistema proporciona apostas em várias combinaçõesllinhas.
2- Após decisão do número de créditos que se pretende apostar numa jogada e accionado o "botão" correspondente ao "Iniciar/Start", as 5 colunas/rolos que se encontram ao centro do ecrã começam a deslizar, simulando o funcionamento de uma máquina do tipo slotmachíne, sem qualquer acção do jogador, imobilizando-se após alguns segundos, aleatoriamente, o que conduz a uma de duas situações:
a. Os símbolos formam uma determinada combinação premiada, prevista no Plano de Prémios, e o jogador tem direito aos respectivos pontos, que podem ser acumulados ou creditados, sendo-lhe paga a correspondente quantia em dinheiro, em regra, à razão de € 1,00 por cada ponto;
b. Os símbolos não formam uma combinação com direito a prémio e a jogada termina.
3- Os jogos de vídeo-rolos têm como objetivo obter combinações de símbolos premiados, previstos na respetiva Tabela de Prémios, sendo que estas combinações dependem exclusivamente da sorte, uma vez que o evoluir do jogo em nada é influenciado pela perícia ou habilidade do jogador, decorrendo, sim, de modo automático e incontrolável, estando o resultado dependente em exclusivo da sorte.
1- No exame pericial não foi possível colocar a máquina a desenvolver os jogos de fortuna ou azar anteriormente descritos, uma vez que os procedimentos necessários para colocar os mesmos em desenvolvimento se encontravam bloqueados.
2- Apesar de não ter sido possível visualizar os jogos desenvolvidos pelas aplicações existentes no suporte de dados da máquina, a sua análise permitiu verificar a existência de recursos (aplicações, extensões de aplicações, ficheiros e expressões) associados exclusivamente aos jogos acima referenciados, pelo que é possível concluir que a máquina possibilita a prática de pelo menos três jogo de poker e cinco de slotmachine a quem tiver na posse dos códigos de validação e conhecimento dos procedimentos necessários para o efeito.
3- De salientar ainda que na análise das respetivas aplicações de jogo verificou-se que o ficheiro responsável pela execução dos jogos de fortuna ou azar do tipo vídeo-rolos IDM32API.DLL", foi executado 1414 vezes, com última execução em 15-06-2016 pelas 22h56 (dia anterior à data da apreensão)."
29. A máquina supra referida foi colocada à exploração pela sociedade comercial denominada (…), representada pelo arguido (…).
B) Dos arguidos
30. A arguida (…) aufere mensalmente a quantia correspondente ao rendimento mínimo mensal garantido.
31. O arguido (…) aufere mensalmente a quantia de €1.150,00 (mil cento e cinquenta euros).
C) Dos antecedentes criminais
32. A arguida não regista no certificado de registo criminal qualquer condenação.
33. O arguido (…) regista no certificado de registo criminal as seguintes condenações anteriores:
- na pena de 10 meses de prisão substituída por 300 dias de multa e na pena de multa de 90 dias à razão de €7,00, por sentença transitada em 22/10/2012, pela prática, em 2014, de um crime de material de jogo sem autorização, apenas mencionando-se o Decreto-lei n.º 422/89, de 2/12.
- na pena de 7 meses de prisão substituída por 210 dias de multa e na multa de 80 dias à razão de €7,00, por sentença transitada em 04/01/2017, pela prática, em 04/08/2013, de um crime de exportação ilícita de jogo, p. e p. pelo art.º 115.º, do Decreto-lei n.º 422/89, de 2/12.

2. Factos não provados:
Em 2) dos factos provados, era propriedade da empresa (…).
• Em 3) dos factos provados, era propriedade da empresa (…).
• Em 8) dos factos provados, era propriedade da empresa (…).
• As máquinas apreendidas nos dias 15.11.2013, 07.03.2014, 18.03.2015 foram colocadas no referido estabelecimento explorado pela arguida, à exploração, pela sociedade comercial denominada (…), de que o arguido (…) é o único gerente.
• Que ligada à corrente eléctrica.
• Que para ser utilizada pelo público
• A arguida (…) explorava em conjunto com o arguido (…) a máquina referida em 27) e colocaram-na em funcionamento no interior do estabelecimento comercial indicado, com vista ao lucro, proporcionando aos eventuais interessados a respectiva utilização, como sucedeu anteriormente à data dos factos.
• Até à data da sua apreensão à ordem dos presentes autos, que tal máquina sempre esteve acessível, disponível e em condições de serem utilizada, proporcionando aos clientes do dito estabelecimento a prática dos jogos desenvolvidos pela mesma.
• Era a arguida (…) quem permitia o acesso dos clientes à máquina referida em 27), quem lhes entregava os prémios em dinheiro que ganhavam e quem dividia com os arguidos (…) as receitas provenientes dos jogos desenvolvidos.
• Não obstante tal conhecimento, os arguidos procederam à respectiva exposição, exploração e manutenção da máquina referida em 27), todos visando a obtenção de lucros,

3. Motivação probatória:
A arguida não prestou declarações acerca dos factos narrados na acusação, após informação sobre o seu direito ao silêncio, exceptuando o valor por si auferido mensalmente.
A factualidade dada como provada e respeitante ao NUIPC 192/13. 9EAEVR decorre igual do teor do auto de notícia de fls. 161 e seguintes, que detalha as circunstâncias levadas ao conhecimento do agente autuante e o auto de apreensão incluso.
De igual modo, foi relevante o depoimento prestado pela testemunha (…), inspector da ASAE, em função dos supramencionados elementos, que relatou as diligências realizadas, dando conta da existência de diversas máquinas no estabelecimento (…).
A testemunha foi confrontada com fls. 161 a 170, 177, 133 e 135, correspondentes aos autos de apreensão, recordando as máquinas apreendidas.
Considerou-se, ainda, a seguinte prova documental: - autos de notícia e apreensão de fls. 161; - Talão de fls. 164; - reportagem fotográfica de fls.165 a 168; - facturas da (…), fls. 169/170; - auto de Abertura, fls. 177; - depósito, fls. 178 e 178 v.º; e bem assim a prova pericial, a fls. 132 a 138.
Valorou-se, quanto ao processo n.º 192/13.9EAEVR, como se disse o auto de apreensão supra melhor identificado, e os relatórios elaborados pelo Serviço de Inspecção de Jogo do Instituto de Turismo de Portugal.
Ao nível da intervenção da Sociedade (…), na pessoa do seu representante legal, aqui arguido, o tribunal valorou o depoimento da testemunha (…), inspector da ASAE, mas quando confrontado com o teor de fls. 169 e 170 foi dubitativo, ao não especificar qual das duas máquinas havia sido identificada pela arguida como fornecida pela sociedade (…).
Com efeito, atento o depoimento desta testemunha e da prova supra mencionada, o tribunal logrou em criar a convicção para afirmar como provados os factos n° 2.) a 3.).
Respeitante ao proc. n.º 32/14.1 EAEVR, o depoimento objectivo e sem reservas da testemunha (…), inspector da ASAE, em conjugação com a prova documental, designadamente, - auto de notícia de fls. 193; -autos de apreensão de fls. 199; - talão de fls 195 e 196; -reportagem fotográfica de fls.201 a 203; bem assim o teor do relatório pericial de fls. 127 a 131; permitiu ao tribunal em criar a convicção suficiente para considerar como demonstrados os factos n.º 4.) e 5). Não existe prova suficiente para afirmar, em relação ao arguido, a propriedade da máquina apreendida no dia 7 de Março de 2014, em função do depoimento da testemunha (…).
A factualidade dada como provada e respeitante ao NUIPC 41/14.0EALSB decorre igualmente do teor do auto de notícia de fls. 59 e seguintes, que detalha as circunstâncias levadas ao conhecimento do agente autuante (…) e a diligência efectuada pela ASAE, e o auto de apreensão a fls. 62. Considerou-se, ainda, a seguinte prova documental: - Auto de notícia de fls. 59 e 60; - Autos de apreensão de fls. 62 e 63
- factura n.º 22/89 e o recibo de fls 64 e 65; - Reportagem fotográfica de fls. 68 a 70.; - Certidão Permanente da sociedade (…), representada desde 03 de Julho de 2013, por (…), a fls. 682 bem assim o teor do relatório pericial de fls. 122 a 136.
O depoente (…) depôs de modo isento, seguro, lógico e concatenado, merecendo total credibilidade por parte do Tribunal, sendo que logrou em confirmar a identificação pela arguida da entidade fornecedora, anuindo que, através do confronto com fls. 64 e 62, tal documento foi utilizado para identificar a sociedade (…) gerida por (…). À luz das regras de experiência comum, nomeadamente, devido à apreensão singular de uma máquina, o tribunal considera demonstrada a propriedade da máquina pela sociedade (…), gerida pelo co-arguido, repare-se ser do conhecimento da testemunha a repartição de lucro entre arguidos. Com efeito, conjugado o depoimento objectivo e sem reservas da testemunha (…), à data inspector da ASAE e a prova documental e pericial supra mencionada, o tribunal logrou em criar a convicção para afirmar como provados os factos n° 6.) e 7.).
NUIPC 16/15.2F1EVR
A factualidade dada como provada e respeitante ao NUIPC 16/15.2F1EVR decorre igualmente do teor do auto de notícia de fls.366 e seguintes, que detalha as circunstâncias levadas ao conhecimento de (…), que acompanhou o aspirante, e a diligência efectuada pela G.N.R., e o auto de apreensão a fls. 370. Considerou-se, ainda, a seguinte prova documental: o Auto de notícia de fls. 366/367; - Autos de apreensão de fls. 370; - Talão de depósito fls. 378; - Reportagem fotográfica de fls. 375/376; bem assim o teor do relatório pericial de fls. 551 a 556.
O depoente (…) depôs de modo isento, seguro, lógico e concatenado, merecendo total credibilidade por parte do Tribunal apenas quanto às circunstâncias imputadas a (…), que soube identificar como exploradora do (…).
Não existe prova suficiente para afirmar, em relação ao arguido (…), a propriedade da máquina apreendida no dia 18 de Março de 2015, em função do depoimento da testemunha (…), que não logrou em precisar e demonstrar a sua razão de ciência, a qual não deixou de ser uma mera suspeita que foi valorada como tal. Com efeito, conjugado o depoimento da testemunha (…), à data tenente da G.N.R., e a prova documental e pericial supra mencionada, o tribunal logrou em criar a convicção para afirmar como provados os factos n° 8.) e 9.), com excepção da factualidade imputada a (…).
NUIPC 60/15.0F1 EVR
A factualidade dada como provada e respeitante ao NUIPC 60/15.0F1EVR decorre igualmente do teor do auto de notícia de fls. 411/413 e seguintes, que detalha as circunstâncias levadas ao conhecimento do agente autuante (…) e a diligência efectuada pela G.N.R., e o auto de apreensão a fls. 414.
Considerou-se, ainda, a seguinte prova documental: - auto de notícia de fls. 411/413; autos de apreensão de fls. 414; - talão de fls. 420; - reportagem fotográfica de fls. 421 a 424; Facturas da (…) a fls. 425; e - Talão de depósito, fls. 426/427 bem assim o teor do relatório pericial de fls. 617 a 621.
Apenas a testemunha (…) depôs de modo isento, seguro, lógico e concatenado, merecendo total credibilidade por parte do Tribunal, sendo que logrou em confirmar a identificação pela arguida da entidade fornecedora, anuindo que, através do confronto com fls. 425, tal documento foi utilizado para identificar a sociedade (…) gerida por (…).
De igual modo, à luz das regras de experiência comum, nomeadamente, devido à apreensão singular de uma máquina, o tribunal considera demonstrada a propriedade da máquina pela sociedade (…), gerida pelo co-arguido, repare-se ser do conhecimento da testemunha a repartição de lucro entre os arguidos.
O depoimento vago e remissivo para o auto de notícia da testemunha (…) não permitiu ao tribunal fundar a sua convicção probatória.
Com efeito, conjugado o depoimento objectivo e sem reservas da testemunha (…), guarda da G.N.R., e a prova documental e pericial supra mencionada, o tribunal logrou em criar a convicção para afirmar como provados os factos n° 10.) e 11.).
Considerando a convicção exposta, a factualidade indicada em 1.) é decorrência lógica do que se provou nos pontos 2.) a 11.) e 19.) dos factos provados. Todavia, no que respeita à colocação das máquinas no estabelecimento explorado por (…), considerando as regras de normal devir dos acontecimentos e os relatos das testemunhas (…) o tribunal considera provado a colocação das máquinas pelo arguido (…) o qual é gerente da sociedade (…) que titula facturas que a exploradora do (…) entregou para identificar a sociedade fornecedora, em função do teor da certidão permanente da mencionada sociedade, constante de fls. 682 a 690 dos presentes autos. E, nessa medida, o tribunal julga provada os factos descritos nos n.ºs 12.),13.) e 15.) da factualidade.
As mesmas regras de experiência comum e de normal devir de acontecimentos permitem assentar o propósito das máquinas, descrito em 14.), 16.), 17.) e 18) era atribuir prémios em dinheiro com a obtenção de sequencas premiadas, conforme a conclusão constante dos relatórios periciais, permitindo a firme conclusão de que, individual e/ou conjuntamente, os arguidos, mediante acordo mútuo, quando o justificava, predispuseram-se a pagar os prémios e a repartir o lucro provenientes das máquinas entregues a (…).
A matéria descrita em 20.) é decorrência lógica do facto de estarmos perante um estabelecimento comercial denominado (…), sito em (…).
A factualidade atinente ao elemento subjectivo e ilicitude das condutas, descritas em 21.) a 25.), derivou do depoimento das testemunhas, em confronto com as regras de experiência comum, que atestam positivamente que os arguidos quiseram praticar os factos com conhecimento do respectivo desvalor, porque estamos perante duas pessoas que detêm a exploração de estabelecimento comercial e de um empresa e são portanto conhecedores das regras que sobre si impedem, e que sabem não pode executar jogos de fortuna ou azar, adstritos a casinos e condicionados a autorizações administrativa de que não possuem. No caso particular de (…), existem condenações anteriores no registo criminal e referentes ao mesmo bem jurídico que se encontra em análise, que permitem inferir o conhecimento e vontade de atentar contra as regras estabelecidas, não sendo crível a realidade contrária, sendo o propósito lucrativo veiculado pela factura a determinar a existência de uma vontade esclarecida e deliberada para a prática do ilícito criminal.
NUIPC 60/15.0F1 EVR
Para prova da exploração do estabelecimento comercial pela arguida teve-se em conta os depoimentos das testemunhas, inspectoras da ASAE, que contaram o que observaram durante a inspecção, em correspondência com o auto de notícia de fls. 71 e seguintes, o que funda a convicção exposta em 26), 27) e 29) da factualidade provada.
Não obstante a assertividade dos depoimentos das inspectoras da ASAE, (…), certo é que em face do teor do auto de notícia, reportagem fotográfica e relatório pericial resulta evidente que a máquina apreendida no dia 16 de Junho de 2016, no
Proc. nº 192/13.9EAEVR
(…), não estava em funcionamento nem estava ligada à electricidade, mas sim encontrava-se na arrecadação e desligada. Acresce que, sabendo que a máquina não estava a funcionar e que a última vez que funcionou foi no dia 15 de Junho de 2016, conforme decorre do relatório pericial, apenas existe um indício (ainda que forte e não a certeza) de que aquela máquina e naquele estabelecimento funcionou. A prova testemunhal não primou por qualquer conhecimento directo do funcionamento em momento anterior ao e no próprio dia 16 de Junho de 2016, apto a dissipar dúvidas inultrapassáveis. A prova testemunha, no entender deste tribunal, com recurso a meras presunções, não permitem afastar a certeza da arrecadação da máquina no estabelecimento denominado o (…) e que desta forma a arguida não estava a explorar os jogos nela contidos.
Para prova da factualidade descrita em 26. e 27. na parte referente à (…) teve-se em conta a factura de fls. 79 e a certidão de fls. 682 a 690; e para prova das características da máquina, descrito em 28, teve-se em conta o relatório pericial junto aos autos, a fls. 56 a 62. O tribunal não responde ao ponto 4) narrado na acusação que constitui matéria de direito.
Os certificados de registo criminal junto fundam o exposto em 32.) e 33.).
Os factos não provados decorrem de prova não concludente e/ou suficiente para afirmar a convicção do tribunal, sendo que o tribunal não responde a matéria conclusiva ou contraditória com a factualidade provada.

4. Enquadramento Jurídico-Penal
Os arguidos estão acusados da prática de seis (6) crimes de exploração ilícita de jogo, previsto e punido pelo artigo 1080, na 1 do Decreto-Lei na 422/89 de 2 de Dezembro.
4.1. A responsabilidade penal
Dispõe este artigo o seguinte: "1. Quem, por qualquer forma, fizer a exploração de jogos de fortuna ou azar fora dos locais legalmente autorizados será punido com pena de prisão até dois anos e multa até duzentos dias".
Esta norma insere-se no capítulo IX do mencionado Decreto-Lei intitulado "Ilícitos e sanções" e é a primeira da Secção I do mesmo que trata "Dos crimes".
O bem jurídico protegido tem sido debatido, sendo que nas palavras de Rui Pinto Duarte (ín O Jogo e o Direito, Revista Themis da Faculdade de Direito da UNL, Ano II (2001), n° 3, páginas 87 a 89), "as respostas mais frequentes apontam, em consonância com as indicações dos legisladores, para a protecção do património e para a protecção dos bons costumes (…) Outra resposta possível é a de entender que o Estado protege os seus interesses de índole fiscal."
Assim, são pressupostos do tipo legal do artigo 108.°, n.º 1 da Lei do Jogo:
. a exploração de jogos de fortuna e azar;
. e a exploração essa efectuada fora dos locais legalmente autorizados.
Para determinarmos se o tipo objectivo foi ou não preenchido impõe-se que antes sejam determinados alguns conceitos como em que consiste a exploração, o que se consideram jogos de fortuna e azar e quais são os locais onde estes podem ser legalmente autorizados.
O conceito de "exploração" tem sido trabalhado pela jurisprudência, sendo que maioritariamente se entende que basta a colocação da máquina no estabelecimento para que se conclua pela exploração. Trata-se de uma presunção natural ou judicial que faz todo o sentido e que resultou, inclusivamente, provada.
Por outro lado, a noção de "jogos de fortuna e azar" consta do próprio Decreto-Lei em causa, logo no seu artigo 1°, que reza: "Jogos de fortuna e azar são aqueles cujo resultado é contingente por assentar exclusiva ou fundamentalmente na sorte.".
Nos termos do art.º 4.° do citado diploma,
"1 - Nos casinos é autorizada a exploração, nomeadamente, dos seguintes tipos de jogos de fortuna ou azar: a) Jogos bancados em bancas simples ou duplas: bacará ponto e banca, banca francesa, boule, cussec, écarté bancado, roleta francesa e roleta americana com um zero; b) Jogos bancados em bancas simples: black-jack/21, chukluck e trinta e quarenta; c) Jogos bancados em bancas duplas: bacará de banca limitada e craps; d) Jogo bancado: keno; e) Jogos não bancados: bacará chemin de fer, bacará de banca aberta, écarté e bingo; f) Jogos em máquinas pagando directamente prémios em fichas ou moedas; g) Jogos em máquinas que, não pagando directamente prémios em fichas ou moedas, desenvolvam temas próprios dos jogos de fortuna ou azar ou apresentem como resultado pontuações dependentes exclusiva ou fundamentalmente da sorte.".
De acordo com o art.º 159.º, da Lei do Jogo:
"Modalidades afins dos jogos de fortuna ou azar são as operações oferecidas ao público em que a esperança de ganho reside conjuntamente na sorte e perícia do jogador, ou somente na sorte, e que atribuem como prémios coisas com valor económico. 2 São abrangidos pelo disposto no número anterior, nomeadamente, rifas, tômbolas, sorteios, concursos publicitários, concursos de conhecimentos e passatempos.".
Nos termos do art.° 161.º, da Lei do Jogo:
"1 - Não é permitida a exploração de qualquer modalidade afim do jogo de fortuna ou azar e outras formas de jogo referidas no artigo 159.º por entidades com fins lucrativos, salvo os concursos de conhecimentos, passatempos ou outros, organizados por jornais, revistas, emissoras de rádio ou de televisão, e os concursos publicitários de promoção de bens ou serviços.
2 - Os concursos excepcionados no número anterior não poderão ocasionar qualquer dispêndio para o jogador que não seja o do custo normal de serviços públicos de correios e de telecomunicações, sem qualquer valor acrescentado, ou do custo do jornal ou revista, com comprovada publicação periódica há mais de um ano, cuja expansão se pretende promover, ou ainda do custo de aquisição dos produtos ou serviços que se pretende reclamar.
3 - As modalidades afins do jogo de fortuna ou azar e outras formas de jogo referidas no artigo 159.º não podem desenvolver temas característicos dos jogos de fortuna ou azar, nomeadamente o póquer, frutos, campainhas, roleta, dados, bingo, lotaria de números ou instantânea, totobola e totoloto, nem substituir por dinheiro ou fichas os prémios atribuídos."
O Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n° 4/2010, publicado no Diário da República, n° 46, Série I, de 8 de Março de 2008, fixou jurisprudência nos seguintes termos:
«Constitui modalidade afim, e não jogo de fortuna ou azar, nos termos dos artigos 159.°, n.º 1, 161.°, 162.° e 163.° do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de Dezembro, na redacção do Decreto-Lei n.º 10/95, de 19 de Janeiro, o jogo desenvolvido em máquina automática na qual o jogador introduz uma moeda e, rodando um manípulo, faz sair de forma aleatória uma cápsula contendo uma senha que dá direito a um prémio pecuniário no caso de o número nela inscrito coincidir com algum dos números constantes de um cartaz exposto ao público».
Existem três formas de jogo: o jogo de fortuna ou azar, ou afins e outras formas de jogo não enquadráveis em qualquer um dos outros tipos de jogo.
A estrutura subjectiva do crime encontra-se circunscrita à estrutura dolosa, nos termos dos arts. 13.° e 14.º, nas modalidades de actuação com intenção de realizar o facto típico (dolo directo); aceitação da realização dos elementos do tipo objectivo como consequência necessária da conduta (dolo necessário); e conformação ou indiferença pela realização do resultado previsto como possível (dolo eventual).
Concretizando:
Da matéria de facto está provado que foram apreendidas em 15.11.2013, 7.03.2014, 10.04.2014, 18.03.2015 e 22.12.2015 máquinas aptas a desenvolver aplicações de jogos de slot-machice e videopoker.
Com efeito, não estamos perante uma modalidade afim de jogos de fortuna ou azar à luz do art.° 159.º da Lei do Jogo, nem o funcionamento coincide com o exposto no Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 4/2010. Também em relação à descrição típica constante do n.º 1 e 2 da mencionada norma, não existe a atribuição de prémios correspondentes a coisas com valor económico nem a oferta ao público mediante a sua interpelação. No concerne à previsão do art.° 4.º, as máquinas não pagam directamente prémios em fichas ou em moedas; ao invés exploram temas próprios dos jogos de fortuna ou azar, mais concretamente slot machines que visa conseguir combinações premiadas de acordo com o plano de prémios apresentado pelo jogo, tudo dependendo exclusivamente da sorte, independentemente da perícia e destreza do jogador, bem assim poker que visa igualmente conseguir combinações premiadas, igualmente, dependentes da sorte. Dúvidas não restam que as condutas provadas qualificam-se como exploração ilícita de jogo por referência ao art.° 4.º, al. g) in fine da Lei do Jogo. Assim, tais máquinas deverão ser classificadas como desenvolvendo um jogo de fortuna ou azar, alicerçada na circunstância de a pontuação depender exclusivamente da sorte e não atribuir como prémio coisa de valor económico. Consequentemente, são jogos de fortuna ou azar à luz dos arts.º 4.º e 161.º, n.º 1 da Lei do Jogo.
Decorre da factualidade apurada que as máquinas estavam aptas a funcionar e a ser utilizadas por clientes do estabelecimento (…), gerido pela arguida (…), sendo que apenas ficou demonstrado que as máquinas apreendidas nos dias 10 de Abril de 2014 e 22 de Dezembro de 2015 foram lá colocadas pela sociedade (…), representada por (…). Verifica-se, que fora dos locais estabelecidos no decreto-lei, a exploração, de forma acessível ao público, máquinas que permitem ao potencial jogador obter, ou não, pontuação não convertível, prémios em dinheiro.
No que concerne aos factos imputados em 16 de Junho de 2016, provou-se apenas que estava uma máquina sem estar a funcionar no interior do estabelecimento explorado pela arguida.
Estamos, no entender do tribunal, ao abrigo do disposto nos arts. 108.°, n.º 1, 22.°, n.º 1 e 2 al. a) e 23.°, n.º 1 do Cód. Penal, na presença de uma tentativa não punível considerada a medida da pena aplicável.
Neste caso, não é possível afirmar com a certeza necessária a derrogar o princípio da presunção de inocência que no mencionado dia ou em momento anterior a exploradora do estabelecimento e o seu fornecedor "fizeram exploração de jogos de fortuna ou azar".
Ao nível do elemento subjectivo, apurou-se que os arguidos conheciam o funcionamento e características dos jogos descritos, não ignorando que a exploração do mesmo apenas é possível em determinados locais, devidamente autorizados pelas entidades competentes.
Não ficou provada qualquer circunstância que permite afirmar a existência de erro sobre os elementos típicos do crime em questão ou de proibições cujo conhecimento for razoavelmente indispensável para que o agente tome conhecimento da ilicitude ou que o agente estivesse em erro, censurável, ou não, sobre a ilicitude da conduta – art.º 16.º e 17.º do Cód. Penal.
Aliás, a conduta demonstrada não se encontra, por qualquer via, justificada ou desculpada.
Estão provados os elementos objectivos e subjectivo do tipo legal imputado a cada um dos arguidos.
No que tange à responsabilidade imputada ao arguido (…), provou-se que duas das máquinas pertenciam à sociedade comercial denominada (…), de que o arguido (…) era o único gerente; e as referidas máquinas foram colocaram à exploração no estabelecimento comercial pela mencionada sociedade, repartindo o lucro obtido com a arguida (…).
Ao abrigo do disposto no art.° 26.º do Cód. Penal, estamos perante a co-autoria, com os arguidos a executar a exploração de jogos de fortuna ou azar mediante acordo celebrado entre ambos.
Segundo Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código Penal, à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, pág. 121:
«A co-autoria consiste na execução conjunta do facto por uma ou mais pessoas ('quem executar o facto ... por acordo ou juntamente com outro ou outros)" com base num acordo dos agentes sobre a divisão de tarefas com vista à realização do facto (teoria do domínio do facto funcional, de CLAUS ROXIN e FIGUEIREDO DIAS)».
Provou-se que (…) e (…) colocou e deixou colocar no estabelecimento duas máquinas das quais retiraram lucros através do desenvolvimento de jogos de fortuna e azar e repartiam o lucro delas adveniente.
Os arguidos juntamente entre si executaram a exploração de jogos de fortuna e azar sem autorização, por duas vezes.
Pelo exposto, os arguidos constituíram-se co-autores materiais de dois crimes de exploração ilícita de jogo, p. e p. pelo artigo 108.º, n.º 1 do Decreto-Lei na 422/89 de 2 de Dezembro, relativamente aos factos ocorridos em 10 de Abril de 2014 e 22 de Dezembro de 2015.
A arguida (…) constituiu-se como autora material de três crimes de exploração ilícita de jogo p. e p. pelo artigo 108.º, n.º 1 do Decreto-Lei na 422/89 de 2 de Dezembro, relativamente aos factos ocorridos em 15 de Novembro de 2013, 07 de Março de 2014 e 18 de Março de 2015.
Em suma, a arguida (…) cometeu cinco crimes de exploração ilícita de jogo e o arguido (…) cometeu dois crimes de exploração ilícita de jogo.

4.2. Escolha e Medida Da Pena
Em abstracto, a pena gradua-se nos seguintes termos:
Crime de exploração ilícita de jogo: prisão de 1 mês até 2 anos e multa de 10 dias até 200 dias.
Prevendo o crime a aplicação cumulativa de uma pena de prisão e de multa importa atender ao disposto no art.° 6.º, n.º 1 do Decreto-lei 48/95 que estatui "Enquanto vigorarem normas que prevejam penas cumulativas de prisão e multa, sempre que a pena de prisão for substituída por multa será aplicada uma só pena equivalente à soma da multa directamente imposta e da que resultar da substituição da prisão.".
Na determinação da medida concreta da pena, deverão ser consideradas todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo legal convocado, deponham quer a favor quer contra o agente (cf. art. 71.°, n° 2 do Código Penal).
No caso concreto, a ilicitude é a típica e comum a este tipo de crime e o dolo directo assume a gravidade do comportamento.
As necessidades de prevenção geral são também média-elevadas, existindo nesta comarca especiais precauções ao nível deste ilícito, atento o n.º de ilícitos detectados o que é visível pelos inúmeros julgamentos realizados apenas neste ano.
Porém, a penalidade a determinar deverá ser adequada a restaurar o sentimento de confiança na sociedade posto em crise com a conduta dos agentes.
No contexto pessoal, releva negativamente a existência de condenações anteriores apenas em relação ao arguido (…), sendo que a arguida (…) é primária.
O tribunal considera ainda a condição profissional provada de cada um dos arguidos, que lhes permite gerar rendimento suficiente para a sua subsistência.
Pesado o juízo de reprovação das condutas objecto dos presentes autos e os elementos atinentes às respectivas personalidades, entende-se por adequada e proporcional a condenação:
- da arguida (…) nas penas de prisão de 06 (seis), 09 (nove), 12 (doze), 15 (quinze) e 18 (dezoito) meses e nas penas de multa de 60 (sessenta), 90 (noventa), 120 (cento e vinte), 150 (cento e cinquenta) e 180 (cento e cinquenta) dias, para os factos ocorridos em 15.11.2013, 07.03.2014, 10.04.2014, 18.03.2015 e 22.12.2015, respectivamente.
- do arguido (…) nas penas de prisão de 14 (catorze) e 16 (dezasseis) meses e na pena de multa de 140 (cento e quarenta) e 160 (cento e sessenta) dias, para os factos ocorrido em 11.04.2014 e 22.12.2015, respectivamente;
Importa, então, fixar o quantitativo diário à pena de multa aplicada.
Estabelece o art.º 47.° n.º 2 do Código Penal que o mínimo legal se fixa em 5€ e o máximo em 500€.
Em conta com os rendimentos de cada um dos arguidos, ambos detentores de estabelecimentos comerciais, fixa-se o quantitativo diário em €6,00 (seis euros) para a arguida (…) e em €12,00 (doze euros) para o arguido (…).

4.3. Concurso de crimes:
Atento o disposto no artigo 77°, n.º 1 do Código Penal "quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa pena única." E ainda o seu n° 3 "Se as penas aplicadas aos crimes em concurso forem umas de prisão, outras de multa, a diferente natureza destas mantêm-se na pena única resultante da aplicação dos critérios estabelecidos nos números anteriores". O pressuposto essencial para a efectuação do cúmulo jurídico de penas parcelares é a prática de diversas infracções antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles. Ora, é precisamente esta situação que se verifica nos presentes autos, pelo que importa, portanto, apurar a pena única a aplicar, tomando em consideração para a medida da pena os factos e as personalidades.
Importante na determinação concreta da pena conjunta será, pois, a averiguação sobre se ocorre ou não ligação ou conexão entre os factos em concurso, a existência ou não de qualquer relação entre uns e outros, bem como a indagação da natureza ou tipo de relação entre os factos, sem esquecer o número, a natureza e gravidade dos crimes praticados e das penas aplicadas, tudo ponderando em conjunto com a personalidade do agente referenciada aos factos, tendo em vista a obtenção de uma visão unitária do conjunto dos factos, que permita aferir se o ilícito global é ou não produto de tendência criminosa do agente, bem como fixar a medida concreta da pena dentro da moldura penal do concurso (neste sentido FIGUEIREDO DIAS, As consequências Jurídicas do Crime, pág. 290 a 292).
A fixação da moldura penal do concurso, de acordo com as regras doutrinarias e jurisprudenciais, no caso subjudice e a considerar, deve assim, ter como limite mínimo a pena parcelar mais grave e por limite máximo a soma aritmética das penas.
Assim, para a arguida (…), a moldura do concurso de crimes tem os seguintes limites:
- no limite mínimo: 18 meses de prisão e 180 dias de multa.
- no limite máximo: 60 meses de prisão e 600 dias de multa
E, para o arguido (…), a moldura do concurso de crimes tem os seguintes limites:
- no limite mínimo: 16 meses de prisão e 160 dias de multa.
- no limite máximo: 30 meses de prisão e 300 dias de multa
Os crimes em concurso real e efectivo preenchem o mesmo tipo objectivo e afectam o mesmo bem jurídico, sendo que todos foram cometidos no mesmo contexto e enquadramento, derivados da existência do mesmo estabelecimento comercial e vontade de maximizar o lucro. Noutra perspectiva, a reiteração destes comportamentos não revela uma mera ocasionalidade no cometimento dos crimes, mas antes um quadro global de ilicitude, que se manifesta em diversas actuações criminógenas, como o evidenciam a multiplicidade dos factos típicos que são objecto da presente apreciação jurídica, denotadoras de personalidades avessas a cumprir os comandos legais vigentes.
Como tal, o efeito expansivo sobre a pena parcelar mais grave é superior ao efeito repulsivo do limite do simples cúmulo material, pelo que se decide aplicar, em cúmulo jurídico dos crimes,
- À arguida a pena única de 36 (trinta e seis) meses de prisão e 360 (trezentos e sessenta) dias de multa à taxa diária de €6,00 (seis euros).
- Ao arguido a pena única de 27 (vinte e sete) meses de prisão e 270 (duzentos e setenta) dias de multa à taxa diária de €12,00 (doze euros).

4.4. Das penas de substituição
As penas em concreto aplicadas permitem a suspensão da execução e a execução em regime de permanência na habitação.
Nos dois casos, entende-se que a execução da pena privativa da liberdade não serve por ora - as finalidades de prevenção geral e especial, pela falta de condenações anteriores no que respeita a (…) e na desnecessidade e desproporcionalidade da reclusão no caso de (…) para a condução de vida sem o cometimento de crimes.
Assim, consequentemente, apenas a suspensão da execução da pena de prisão, na perspectiva da ameaça da privação da liberdade, satisfaz de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
Como se referiu tem-se ainda em consideração que estamos perante pessoas profissionalmente inseridas na nossa sociedade mas que ainda não compreenderam as consequências que a prática destes factos podem provocar na sua vida se não corrigirem as condutas a tempo.
Nos termos do art.º 50.º n.º 1 e 5, do Cód. Penal, na redacção anterior à Lei 94/2017, por via do art.º 2.°, n.º 4 do Cód. Penal, as penas de prisão deverão ser suspensas na execução por idêntico período ao da duração
Com vista a afastar os arguidos da prática de novos crimes prevê-se a imposição de regras e deveres de conduta, nos arts. 51.º e 52.º do Cód. Penal.
Estipula o art.º 51.º do Cód. Penal:
"1 - A suspensão da execução da pena de prisão pode ser subordinada ao cumprimento de deveres impostos ao condenado e destinados a reparar o mal do crime, nomeadamente:
a) Pagar dentro de certo prazo, no todo ou na parte que o tribunal considerar possível, a indemnização devida ao lesado, ou garantir o seu pagamento por meio de caução idónea;
b) Dar ao lesado satisfação moral adequada;
c) Entregar a instituições, públicas ou privadas, de solidariedade social ou ao Estado, uma contribuição monetária ou prestação de valor equivalente.
2 - Os deveres impostos não podem em caso algum representar para o condenado obrigações cujo cumprimento não seja razoavelmente de lhe exigir.
3 - Os deveres impostos podem ser modificados até ao termo do período de suspensão sempre que ocorrerem circunstâncias relevantes supervenientes ou de que o tribunal só posteriormente tiver tido conhecimento.
4 - O tribunal pode determinar que os serviços de reinserção social apoiem e fiscalizem o condenado no cumprimento dos deveres impostos."
Determina o art.º 52.º do Cód. Penal:
"1 - O tribunal pode impor ao condenado o cumprimento, pelo tempo de duração da suspensão, de regras de conduta de conteúdo positivo, susceptíveis de fiscalização e destinadas a promover a sua reintegração na sociedade, nomeadamente:
a) Residir em determinado lugar;
b) Frequentar certos programas ou actividades;
c) Cumprir determinadas obrigações.
2 - O tribunal pode, complementarmente, impor ao condenado o cumprimento de outras regras de conduta, designadamente:
a) Não exercer determinadas profissões;
b) Não frequentar certos meios ou lugares;
c) Não residir em certos lugares ou regiões;
d) Não acompanhar, alojar ou receber determinadas pessoas;
e) Não frequentar certas associações ou não participar em determinadas reuniões;
f) Não ter em seu poder objectos capazes de facilitar a prática de crimes.
3 - O tribunal pode ainda, obtido o consentimento prévio do condenado, determinar a sua sujeição a tratamento médico ou a cura em instituição adequada.
4 - É correspondentemente aplicável o disposto nos n.ºs 2, 3 e 4 do artigo anterior."
No caso em apreço, atenta a tipologia do crime e o bem jurídico colectivo afectado entendendo que a suspensão da execução da pena de prisão deverá ser condicionada à obrigação de não terem em seu poder, em nome próprio e/ou em representação legal, objectos capazes de facilitar ou constituir a prática de crimes previstos no Decreto-Lei n.º 422/89, de forma a evitar a reiteração da conduta e à obrigação dos arguidos (…), respectivamente, entregarem €600,00 (seiscentos) e €2000,00 (dois mil euros) à Associação (…), em prestações mensais sucessivas de €50,00 (cinquenta euros) e €1 00,00 (cem euros), respectivamente, a título de conduta judicial, após o trânsito em julgado da decisão condenatória, mediante comprovação nos autos.
Pelo exposto, deverá o tribunal suspender a execução das penas de prisão impondo as aludidas regras de conduta, para ambos os arguidos, nos termos conjugados dos art.º 50.°, n.º 1 e 5 do Cód. Penal, na redacção introduzida pela Lei 59/2007, de 4 de Setembro, conjugado com o art.° 2.°, n° 4 do Cód. Penal, e art.º 52.° do mesmo diploma legal.

4.5. Destino de objectos e produto:
Importa ainda decidir do destino dos objectos apreendidos e inventariados nos autos.
Sobre o destino a dar aos objectos apreendidos em virtude da prática dos crimes previstos na Lei do Jogo, encontram-se nesta mesma Lei, normas para o efeito, nos artigos 116° e 117°.
Estatui O artigo 116°: "O material e utensílios de jogo serão apreendidos quando sejam cometidos crimes previstos nesta secção e destruídos, a mandado do tribunal, pela autoridade apreensora, que lavrará o competente auto de destruição".
Por sua vez, dispõe o artigo 117°: "Todo o dinheiro e valores destinados ao jogo, bem como os móveis do local em que sejam cometidos os crimes previstos nesta secção, serão apreendidos e declarados pelo tribunal perdidos a favor do Fundo de Turismo".
Destarte, de acordo com estes critérios legais, haverá que ordenar a destruição pela entidade apreensora das máquinas apreendidas e declarar perdido a favor do Estado dos valores apreendidos com entrega ao Instituto de Turismo de Portugal lP. «(…)

4.6. Responsabilidade processual:
Nos termos dos art.º 513.º, n.º 1 e 514.º, ambos do C.P.P., “Só há lugar ao pagamento da taxa de justiça quando ocorra condenação em 1.ª instância e decaimento total em qualquer recurso”. e “Salvo quando haja apoio judiciário, o arguido condenado é responsável pelo pagamento, a final, dos encargos a que a sua actividade houver dado lugar.”
A condenação em taxa de justiça é sempre individual e o respectivo qualtitativo é fixado pelo juiz, a final, nos termos previstos no Regulamento das Custas Processuais. – art.º 513.º, n.º 4 do C.P.P.
Face à complexidade da causa – silêncio dos arguidos e ausência de contestação – decido, nos termos do art,º 8.º, do RCP ex vi art.º 513.º, n.º 4 do C.P.P., fixar a taxa de justiça individual a cada um dos arguidos em 3 (três) unidades de conta.
(…).»

2.3. Conhecimento dos recursos
2.3.1. Recurso do despacho interlocutório interposto pela arguida (…):
(…) considerando que o despacho interlocutório recorrido se reporta, como do respetivo teor resulta, a alterações à acusação constante do Apenso A, concretamente aos artigos 2, 6, 8, 12, 14 e 15 dessa mesma acusação, sendo que o Apenso A respeita ao processo n.º 30/16.EAVR e tendo a arguida sido absolvida do crime de exploração ilícita de jogo, p. e p. pelo artigo 108º, n.º 1, com referência aos artigos 1º, 3º e 4º, n.º 1, al. g), todos do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de dezembro, mostra-se prejudicada a apreciação do recurso, tendo deixado de subsistir, atenta a aludida absolvição, o interesse em agir da arguida/recorrente, nessa parte.
(…)
2.3.2. Recurso da sentença interposto pela arguida (…):
2.3.2.1. Da nulidade da sentença, por falta de fundamentação
Manifesta a arguida/recorrente, em ordem a fundamentar a existência da invocada nulidade, que o Tribunal a quo não fez o exame crítico das provas, tendo-se baseado nas regras da experiência comum, as quais não podem servir de critério relativamente ao tipo de ilícito de que se trata, já que as máquinas de diversão/jogo têm de passar obrigatoriamente por uma avaliação e perícia técnica e tanto mais quando o Tribunal a quo não explicou a concreta valoração dessa regras e em que medida contribuíram para que alicerçasse a convicção que o levou a dar como provados os factos que a ora recorrnte impugna (constantes dos pontos 2 a 14 e 16 a 29), existindo, por isso, na ótica da recorrente, falta de fundamentação da sentença, o que determina a sua nulidade, nos termos do artigo 379º, n.º 1, al. a), com referência ao artigo 374º, n.º 2, ambos do CPP.
O Ministério Público pronuncia-se no sentido de não se verificar o invocado fundamento de nulidade da sentença.
Vejamos:
De harmonia com o disposto no artigo 379º, n.º 1, al. a), do Código de Processo Penal, a sentença é nula quando, não contenha as menções previstas no n.º 2 e na alínea b) do n.º 3 do artigo 374º.
Sob a epígrafe “Requisitos da sentença”, estatui o artigo 374º do CPP, no seu n.º 2: Ao relatório segue-se a fundamentação, que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal.
Decorre da citada disposição legal, que a fundamentação da sentença penal, em relação à exposição dos motivos de facto e de direito que fundamentam a decisão, ainda que concisa, deve ser completa, contendo e enunciação das provas que serviram para fundar a convicção alcançada pelo tribunal, bem como o exame crítico de tais provas.
O exame crítico da prova, como se refere no Acórdão da R.L. de 18/01/2011[1], «deve consistir na explicitação do processo de formação da convicção do julgador, concretizada na indicação das razões pelas quais, e em que medida, determinado meio de prova ou determinados meios de prova, foram valorados num certo sentido e outros não o foram ou seja, a explicação dos motivos que levaram o tribunal a considerar certos meios de prova como idóneos e/ou credíveis e a considerar outros meios de prova como inidóneos e/ou não credíveis, e ainda na exposição e explicação dos critérios, lógicos e racionais, utilizados na apreciação efectuada.
A obrigatoriedade de fundamentação da decisão de facto em conformidade com o que se deixa exposto e citando o que se escreve no Acórdão do STJ de 29/06/1995[2], «destina-se a garantir que o julgador seguiu um procedimento de convicção lógico e racional na apreciação das provas, e que a decisão sobre a matéria de facto não é arbitrária, dominada pelas impressões, ou afastada do sentido determinado pelas regras da experiência.
A razão de ser da exigência da exposição, ainda que concisa, dos meios de prova, é não só permitir aos sujeitos processuais e ao tribunal de recurso o exame do processo lógico ou racional que subjaz à formação da convicção do julgador, como assegura como assegurar a inexistência de violação do princípio da inadmissibilidade das proibições de prova; é necessário revelar o processo racional que conduziu à expressão da convicção. E a indicação das provas que serviram para formar a convicção apenas é obrigatória na medida do que é necessário.»
Tendo presentes estas considerações e baixando ao caso dos autos:
Lida a motivação da decisão de facto consignada na sentença recorrida e aqui objeto de apreciação, entendemos que o Tribunal a quo fundamentou devidamente a decisão tomada, no referente à convicção alicerçada e que o levou a dar como assentes os factos que agora são impugnados pela arguida/recorrente, enunciando as provas que serviram de suporte a essa convicção e procedendo ao respetivo exame crítico, designadamente, da prova testemunhal produzida, sendo que no referente ao funcionamento e caraterísticas das máquinas apreendidas no estabelecimento explorado pela arguida/recorrente e ao tipo de jogos nelas desenvolvidos, foi valorada a prova pericial e os respetivos relatórios juntos aos autos e atendendo o Tribunal a quo às regras da experiência comum e da normalidade da vida, ante os factos objetivos que deu como assentes reportados à conduta empreendida pela arguida, para inferir os elementos subjetivos.
A fundamentação explicitada pelo Tribunal a quo evidencia o raciocínio seguido para atingir a convicção que formou, observando a exigência prevista no artigo 374º, n.º 2, do CPP, permitindo à arguida/recorrente exercer, plenamente, o contraditório e o direito de defesa (cf. artigo 32º, n.º 1, da CRP).
Questão diferente é que será objeto de apreciação infra é a de saber se as provas a que o Tribunal a quo atendeu e respetiva valoração são ou não suficientes para permitirem ao Tribunal a quo, no exercício do poder de livre apreciação da prova e para além da dúvida razoável, concluir no sentido em que o fez, dando como provados os factos que são objeto de impugnação pela arguida, ora recorrente.
Nesta conformidade, conclui-se pela inexistência do apontado fundamento de nulidade da sentença, pelo que, nesta vertente, improcede o recurso.

2.3.2.2. Da nulidade da sentença por omissão de pronúncia
Invoca a recorrente que a sentença recorrida enferma da nulidade prevista na al. c), do n.º 1 do artigo 379º do CPP, por existir omissão de pronúncia em relação à apreciação sobre a existência ou não, da ligação das “máquinas” à internet. Na perspetiva da recorrente, esse facto é essencial para a análise da conduta do agente e a qualificação jurídica da sua atuação, em termos de se poder aferir da respetiva subsunção à previsão do artigo 159º do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de dezembro – modalidades afins do jogo de fortuna ou azar e outras formas de jogo –, que constitui ilícito contraordenacional.
O Ministério Público pronunciou-se no sentido da inexistência da apontada nulidade da sentença recorrida, defendendo que a ligação ou não à internet das máquinas apreendidas não se trata de uma questão essencial, pois que, com ou sem aquela ligação, em face da factualidade provada, sempre as condutas imputadas aos arguidos integrariam a prática de ilícito criminal.
Apreciando:
Decorre do disposto na al. c), do n.º 1, do CPP, que a nulidade da sentença por omissão de pronúncia ocorre quando o tribunal deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar.
E essas questões, como refere o Cons. Oliveira Mendes[3], são as «(…) questões de conhecimento oficioso e questões cuja apreciação é solicitada pelos sujeitos processuais e sobre as quais o tribunal não está impedido de se pronunciar – artigo 608º, nº. 2, do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 4º, do CPP. (…).
A falta de pronúncia que determina a nulidade da sentença incide, pois, sobre as questões (…), entendendo-se por questão o dissídio ou problema concreto a decidir (…).»
Revertendo ao caso dos autos:
Como mais desenvolvidamente se exporá infra, em sede de apreciação da qualificação jurídica dos factos, tal como faz notar o Ministério Público, a ligação ou não à internet dos computadores instalados nas máquinas que estão em causa nos autos, não se mostra essencial ou relevante para que se possa aferir da eventual subsunção da conduta da arguida, ora recorrente, à previsão normativa do artigo 159º do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de dezembro e para que se possa afastar o respetivo enquadramento na previsão do artigo 108º do mesmo diploma legal.
Na verdade, conforme vem sendo entendimento da jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores «não é o facto das instruções que permitiam o funcionamento do jogo não estarem residentes no interior da máquina (mas sim acedíveis via internet a partir de um servidor remoto), que tornam, ou não, ilícita a sua exploração, já que tal circunstância não é elemento do tipo de crime de exploração ou exposição ilícita de jogo»[4].
O que releva para esse efeito e para a delimitação dos tipos penal e contraordenacional de jogo, tendo em conta a definição de jogo de fortuna ou azar que consta do artigo 1º do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de dezembro e de acordo com o entendimento que perfilhamos e que infra melhor se explicitará, é saber se o resultado do jogo “é contingente por assentar exclusiva ou fundamentalmente na sorte” e a natureza (tema) do jogo desenvolvido na máquina (estando alguns jogos de fortuna ou azar exemplificativamente tipificados no artigo 4º do DL 422/89) e, ainda, na delimitação do conceito das modalidades afins (com referência ao artigo 159º do mesmo diploma legal), a natureza do prémio atribuído ou atribuível.
O Decreto-Lei n.º 66/2015, de 29 de abril, que aprovou o Regime Jurídico dos Jogos e Apostas Online, não afastou a definição de jogo de fortuna e azar estabelecida no Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de dezembro, sendo que conforme se faz notar no enunciado Ac. da RL de 08/03/2014, proferido no referenciado proc. n.º 142/14.5T9ALQ.L1-5 «O “vazio legal existente” mencionado no preâmbulo do DL n.º 66/2015, de 29 de abril[5], que entre nós veio disciplinar o jogo online, deverá ser entendido como reportando-se primacialmente à regulamentação da exploração e prática dessa modalidade de jogo, e não, como uma manifestação do Legislador concernente a uma eventual não punibilidade de condutas que devessem ser consideradas como típicas à luz do DL n.º 422/89, de 2 de Dezembro». Como igualmente se salienta no mesmo Acórdão, no caso de as condutas abrangidas pela previsão do artigo 108º do DL n.º 422/89, serem «posteriores à entrada em vigor do citado DL n.º 66/2015, e o jogo dever ser considerado online, a moldura da punição passa a ser diferente: a pena de prisão aumenta de dois para cinco anos, desaparece a pena de multa cumulativa, embora surja de forma adversativa, acrescentada agora para os quinhentos dias.».
Pelo exposto, entendemos que a sentença recorrida, ao não abordar a questão da ligação ou não das máquinas à internet – não sendo esse facto relevante, para aferir da qualificação jurídica da(s) conduta(s) assumidas pela arguida, ora recorrente, que estão em causa nos autos –, não enferma de omissão de pronúncia e, logo, da nulidade invocada pela arguida, ora recorrente.

2.3.2.3. Da valoração de prova proibida
Sustenta a recorrente que o Tribunal a quo alicerçou a sua convicção no tocante aos factos que deu como assentes e com base nos quais considerou verificados os elementos objetivos e subjetivos dos crimes por que foi condenada, nas declarações que prestou, perante as testemunhas, militares da GNR e Inspetores da ASAE, aquando das ações de fiscalização realizadas, quando já tinha a qualidade de arguida, tirando o Tribunal a quo conclusões de meras “presunções” apresentadas por essas testemunhas, que reproduziram o que ouviram da arguida.
Entende a recorrente que essa prova testemunhal não pode ser valorada, por constituir uma violação do disposto no artigo 356º n.º 7 do CPP, já que a arguida se remeteu ao silêncio em audiência de julgamento.
O Ministério Público pronuncia-se no sentido de não assistir razão à recorrente, defendendo que a valoração da prova testemunhal obedeceu aos critérios legais, tendo os depoimentos prestados pelas testemunhas agentes fiscalizadores sido considerados pelo Tribunal a quo, na estreita medida em que se tratam de depoimentos diretos, ou seja, na parte em que relataram as diligências e os atos cautelares efetuados e as conversas tidas nesse contexto, sendo essa prova válida.
Apreciando:
Dispõe o artigo 356º, n.º 7, do CPP, que: «Os órgãos de polícia criminal que tiverem recebido declarações cuja leitura não for permitida, bem como quaisquer pessoas que, a qualquer título, tiverem participado na sua recolha, não podem ser inquiridos como testemunhas sobre o conteúdo daquelas.
Neste domínio, independentemente da posição mais restrita ou mais ampla que se possa defender, sobre se proibição de “conversas informais” havidas com os órgãos de polícia criminal, concretamente, se essa proibição só deve abranger as conversas posteriores à constituição de arguido e ou se deve abranger também as conversas que tiveram lugar antes dessa constituição, tal como faz notar o Ministério Público, constitui entendimento consolidado da jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores e que se perfilha, o de que os agentes policiais não estão impedidos de depor sobre os factos que constataram, no âmbito das diligências efetuadas, durante a fase investigatória ou de inquérito e ainda antes destas fases, na recolha de indícios de uma infração de que acabam de ter conhecimento, competindo-lhes “praticar os actos necessários e urgentes para assegurar os meios de prova”, nomeadamente, “colher informações das pessoas que facilitem a descoberta dos agentes do crime” (cf. artigo 250º, n.º 1 e n.º 2, al. b) e artigo 250º, n.º 8, ambos do CPP), podendo, nesse contexto, as conversas tidas entre os órgãos de polícia criminal e essa(s) pessoa(s), mesmo que, posteriormente esta(s) última(s), venha(m) a ser assumir a qualidade de arguido(s) e desde que não consubstanciem «declarações obtidas à margem das formalidades e das garantias que a lei processual impõe», ser reproduzidas em audiência de julgamento.
Nesta conformidade, nada impede que os órgãos de polícia criminal, arrolados como testemunhas, possam relatar, em audiência de julgamento, designadamente, se, naquela fase, houve ou não colaboração por parte da pessoa que viria a ser constituída na qualidade de arguido(s), v.g. se esta forneceu ou não elementos, tais como documentos, que lhe hajam sido solicitados[6] e as circunstâncias em que o fez.
No caso dos autos, como resulta da motivação da decisão de facto exarada na sentença recorrida, as testemunhas, militares da GNR e inspetores da ASAE, que realizaram as ações de fiscalização, que estão aqui em causa, cujos depoimentos foram valorados pelo Tribunal a quo, relataram os factos por si detetados aquando da fiscalização, designadamente, no referente às condições em que se encontravam as “máquinas” que vieram a ser apreendidas e à atitude da pessoa com quem contataram no estabelecimento em causa, que viria a ser constituída arguida, tratando-se da ora recorrente, a quem solicitaram elementos, tais como, a chave para abrir o moedeiro máquinas, o código que permitia desbloquear e pôr a(s) máquina(s) em funcionamento, a documentação referente à exploração dessa(s) máquina(s), etc., descrevendo a conduta que, em cada uma das situações e em resposta a tal solicitação, foi assumida pela arguida, ora recorrente, aludindo aos documentos que foram apresentados/facultados pela ora arguida, ora recorrente.
As testemunhas, militares da GNR e inspetores da ASAE, que prestaram depoimento, na audiência de julgamento, e a que o Tribunal a quo atendeu, em conjugação com a demais prova produzida, para formar a sua convicção, relataram o modo como decorreu a ação ou as ações de fiscalização em que, respetivamente, intervieram, os factos que, então, constataram/percecionaram, como chegaram até à identificação da arguida como sendo a pessoa que explorava o estabelecimento comercial onde se encontravam as máquinas em questão, o exato local onde estas estavam e as condições em que se encontravam, e ainda, como, nas situações a que aludiram, adquiriram a informação de que tinha sido a sociedade (…) - de que o arguido é o único gerente - a colocar, naquele estabelecimento comercial, essas máquinas.
Não estamos, por isso, e ao contrário do que afirma a recorrente, perante uma situação em que as testemunhas, militares da GNR e inspetores da ASAE, órgãos de polícia criminal, reproduzissem, em audiência de julgamento, declarações prestadas pela arguida, em momento em que já deveria ter assumido esta última qualidade e em violação do disposto no n.º 7 do artigo 356º do CPP, posto que, tais testemunhas descreveram ao tribunal, em audiência de julgamento, os factos que presenciaram no local, o modo como se desenrolaram as ações de fiscalização em que respetivamente participaram e os elementos de prova recolhidos, nesse âmbito.
Assim sendo, nada impedia que o Tribunal a quo pudesse valorar, como valorou, os depoimentos das testemunhas, órgãos de polícia criminal, militares da GNR e inspetores da ASE, em conjugação com a demais prova produzida, não se estando, em qualquer dos casos, perante depoimento indireto (de “ouvir dizer”), nos termos do disposto no artigo 129º do CPP, nem perante a aquisição de prova em violação da proibição legal prevista no n.º 7 do artigo 356º do CPP, sendo certo que a tal não obstava, a circunstância de a arguida não ter prestado declarações, em audiência de julgamento, no legítimo exercício do direito ao silêncio que lhe assiste.
Pelo exposto e, em conformidade, concluímos não existir qualquer impedimento legal à valoração, como prova, dos depoimentos das testemunhas, militares da GNR e inspetores da ASAE, na parte em que o foram pelo Tribunal a quo, não estando abrangidos pela proibição de prova, prevista no n.º 7 do artigo 356º do CPP.
O recurso, é, pois, também nesta vertente, improcedente.

2.3.2.4. Da impugnação da matéria de facto provada
A recorrente impugna a matéria de facto dada como provada nos pontos 2 a 14 e 16 a 29.
Invoca a existência de erro notório na apreciação da prova produzida, sustentando, em síntese, que:
- O conhecimento revelado pelas testemunhas inquiridas, na audiência de julgamento, (…) e cujos depoimentos foram valorados pelo Tribunal a quo, foi resultado de conversas que as mesmas tiveram, no âmbito das ações de fiscalização realizadas em que a ora recorrente era já arguida, não podendo essas conversas ser reproduzidas, em julgamento, uma vez que a arguida exerceu o direito ao silêncio, além de que consubstanciam depoimentos indiretos;
- Não tendo sido esclarecida, na sentença recorrida, a questão da ligação à internet, não ficou demonstrado que arguida tivesse conhecimento da existência dos jogos de que se trata nos computadores/máquinas apreendidos(as), limitando-se o tribunal a presumir esse conhecimento, com base nas regras da experiência comum, o que, na ótica da recorrente, não se mostra suficiente para fazer prova desse facto, dado existirem jogos disponíveis para os utilizadores da internet, designadamente, no Facebook, sendo os jogos explicados e jogados com créditos e por ter havido necessidade de recurso à prova pericial para apurar o funcionamento do equipamento apreendido, sendo, nessa situação, impossível à arguida, ora recorrente, conhecer previamente ou controlar os sites acedidos pelos clientes do estabelecimento.
- O Tribunal a quo limitou-se a presumir que os “prémios” são “pecuniários”, já que nenhuma prova foi produzida de que resultasse confirmado esse facto, atendendo também aqui o Tribunal a quo às “regras da experiência comum e de norma devir de acontecimentos …”.
Invoca, por outro lado, a recorrente existir erro de julgamento ao dar-se como provada a matéria factual vertida nos pontos 12 a 25, sustentando que:
- Não estando esclarecido se existia ligação à internet, não se pode saber se os ficheiros que pudesse existir no equipamento são temporários ou não e quando foram descarregados para os Pc´s analisados e que estavam no estabelecimento aquando das fiscalizações, salientando a recorrente que ficheiros como “... windows xp, dm32api.dll ...” não são jogos, tratando-se de ficheiros e ferramentas de executáveis e que pode resultar de um download de internet, o que não resulta esclarecido, na sentença, existindo, violação do princípio da livre apreciação da prova, previsto no artigo 127º do CPP e constituindo a matéria vertida nos pontos 2 a 11 e 27 e 28 meras conclusões e não factos, propriamente ditos;
- Da análise/perícia às máquinas não se logrou a visualização de quaisquer jogos, pelo que, se instala a dúvida se “aqueles computadores apreendidos” teriam no seu interior qualquer elemento físico que permitisse o desenvolvimento de jogos ilícitos e um ponto de acesso à internet não permite dar a conhecer à recorrente (ou a quem quer que seja) que sites ou conteúdos são visitados pelos utilizadores desses mesmos computadores.
Assim e, na ótica da recorrente, por existir uma total ausência de prova, a matéria factual dada como provada no referente ao elemento subjetivo do “crime de exploração ilícita de jogo”, devia ser dada como não provada, com a sua consequente absolvição dos crimes por que foi condenada.
O Ministério Público considera que o Tribunal a quo apreciou corretamente as provas produzidas, relacionando-as entre si, de acordo com as regras da lógica e da experiência comum, com recurso a critérios objetivos e suscetíveis de motivação e controlo, não merecendo qualquer censura, pelo que, deve ser mantida a decisão.
Vejamos:
Antes de passarmos a apreciar a questão referenciada, importa tecer algumas considerações teóricas sobre a impugnação da matéria de facto em sede recursiva:
A impugnação da matéria de facto pode ser feita por duas vias, uma de âmbito mais restrito, invocando os vícios previstos no artigo 410º, n.º 2, do CPP – a) A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada; b) A contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão; c) O erro notório na apreciação da prova; e a outra através da impugnação ampla da matéria de facto, a que se refere o artigo 412º, n.ºs 3, 4 e 6, do C.P.P.
Os vícios previstos no n.º 2 do artigo 410º terão de ser evidentes e passíveis de deteção através da leitura do mero exame do texto da decisão recorrida (sem possibilidade de recurso a outros elementos constantes do processo, mesmo que resultem do julgamento), por si só ou conjugada com as regras da experiência comum.
Relativamente ao erro notório na apreciação da prova – que é invocado pela recorrente – este vício verifica-se quando no texto da decisão recorrida se dá por provado, ou não provado, um facto que contraria com toda a evidência, segundo o ponto de vista de um homem de formação média, a lógica mais elementar, arbitrária, de todo insustentável, e as regras da experiência comum.
Conforme referem os Cons. Simas Santos e Leal-Henriques[7], existe erro notório na apreciação da prova quando ocorre «falha grosseira e ostensiva na análise da prova, percetível pelo cidadão comum, denunciadora de que se deram provados factos inconciliáveis entre si, isto é, que o que se teve como provado ou não provado está em desconformidade com o que realmente se provou ou não provou (…).
Ou, dito de outro modo, há um tal erro quando um homem médio, perante o que consta do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com o senso comum, facilmente se dá conta de que o tribunal violou as regras da experiência ou se baseou em juízos ilógicos, arbitrários ou mesmo contraditórios, ou se desrespeitaram regras sobre o valor da prova vinculada ou das legis artis
A impugnação ampla da matéria de facto a que alude o artigo 412º, n.º 3, do CPP, visa a correção do erro de julgamento, que ocorre quando o tribunal considere provado um determinado facto, sem que dele tivesse sido feita prova, pelo que deveria ter sido considerado não provado, ou quando dá como não provado um facto que, face à prova que foi produzida, deveria ter sido considerado provado.
Diversamente do que sucede quando são invocados os vícios do artigo 410º, n.º 2, do CPP, essa reapreciação não se restringe ao texto da decisão recorrida, alargando-se à análise do que se contém e pode extrair da prova (documentada/gravada) produzida em audiência, dentro dos limites fornecidos pelo recorrente, no cumprimento do ónus de especificação imposto pelos n.ºs 3 e 4 do artigo 412º do CPP, sem prejuízo de poder ouvir outras passagens que não as indicadas no recurso (n.º 6 do artigo 412º do CPP).
Todavia, conforme jurisprudência uniforme dos nossos Tribunais Superiores, o recurso da matéria de facto, não visa a realização de um segundo e novo julgamento sobre aquela matéria, com base na audição de gravações e na apreciação total do acervo dos elementos de prova produzidos e que serviram de fundamento à decisão recorrida, como se esta não existisse. O que se visa é uma reapreciação autónoma sobre a razoabilidade da decisão do tribunal a quo quanto aos pontos de facto que o recorrente especifique como incorretamente julgados.
Daí que a delimitação desses pontos de facto seja determinante na definição do objeto do recurso, cabendo ao tribunal da Relação confrontar o juízo sobre eles que foi realizado pelo tribunal a quo com a sua própria convicção, determinada pela valoração autónoma das provas que o recorrente identifique nas conclusões da motivação.
Para esse efeito, deve o tribunal de recurso verificar se os pontos de facto questionados têm suporte na fundamentação da decisão recorrida, avaliando e comparando especificadamente os meios de prova indicados nessa decisão e os meios de prova indicados pelo recorrente e que este considera imporem decisão diversa.
A ausência de imediação determina que o tribunal de 2ª instância, no recurso da matéria de facto, só possa alterar o decidido pela 1ª instância se as provas indicadas pelo recorrente impuserem decisão diversa da proferida e não apenas se a permitirem (cf. al. b) do n.º 3 do referenciado artigo 412º)
É que a decisão do recurso sobre a matéria de facto não pode ignorar, antes tem de respeitar o princípio da livre apreciação da prova do julgador, estabelecido no artigo 127º do Código de Processo Penal e a sua relação com os princípios da imediação e a oralidade, sobretudo quando tem de se debruçar sobre a valoração efetuada na 1ª instância da prova testemunhal.
O princípio da livre apreciação da prova, consagrado no artigo 127º do CPP, estabelece que, salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente.
A livre apreciação da prova, conforme bem refere o Prof. Germano Marques da Silva[8] deve ser entendida como “valoração racional e crítica, de acordo com as regras comuns da lógica, da razão, das máximas da experiência e dos conhecimentos científicos, que permita objetivar a apreciação, requisito necessário para uma efetiva motivação da decisão”.
Esta valoração da prova, que vai ser obrigatoriamente expressa na fundamentação da sentença (cf. artigo 374º, nº. 2, do CPP e artigo 205º, nº. 1, da CRP), é importante porque constituiu “um verdadeiro factor de legitimação do poder jurisdicional, contribuindo para a congruência entre o exercício desse poder e a base sobre a qual repousa: o dever de dizer o direito no caso concreto (iuris dicere). E, nessa medida, é a garantia de respeito pelos princípios da legalidade, da independência do juiz e da imparcialidade das suas decisões[9].
Existirá violação do princípio da livre apreciação da prova se, na apreciação da prova e nas ilações extraídas, o julgador não respeitar os princípios em que se consubstancia o direito probatório e as regras da experiência comum, da lógica e de natureza científica que se devem incluir no âmbito do direito probatório.
Do exposto decorre, por um lado, uma «intima conexão existente entre o princípio da livre apreciação da prova, o princípio da presunção de inocência, o dever de fundamentação das sentenças, o direito ao recurso, e o direito à tutela efectiva.»[10]
Tendo presentes as considerações que se deixam expendidas e baixando ao caso concreto:
No referente ao invocado erro notório na apreciação da prova:
Tendo presentes os contornos deste vício, que se deixaram definidos supra – fazendo-se notar que a recorrente evidencia confundir tal vício decisório com o erro de julgamento, na apreciação/valoração da prova –, entendemos ser inequívoco, analisada a sentença recorrida, designadamente, considerando os factos provados e que são impugnados pela ora recorrente e a respetiva fundamentação, que a decisão não enferma de tal vício, enquanto erro grosseiro, ostensivo e apreensível pela generalidade das pessoas, mediante a simples leitura da sentença.
Relativamente ao apontado erro de julgamento:
Conforme supra se referiu a recorrente impugna os factos dados como provados nos pontos 2 a 14 e 16 a 29, invocando a ausência de prova para que assim se decidisse, mormente que a arguida tivesse conhecimento do funcionamento e dos jogos desenvolvidos nos equipamentos apreendidos no estabelecimento, manifestando que a prova desse facto, não pode basear-se em meras presunções, tendo por base as regras da experiência comum.
Vejamos:
No que diz respeito aos depoimentos das testemunhas (…) – cuja transcrição na integra foi feita pela recorrente, na motivação de recurso –, que participaram nas ações de fiscalização, em resultado das quais foram apreendidas as máquinas que estão em causa nos autos, como se deixou supra exposto em 2.3.2.3., as mesmas relataram, na audiência de julgamento, os factos por si constatados, naquele âmbito, designadamente, no referente às condições em que se encontravam as ditas “máquinas” e à atitude da pessoa com quem contataram, no local/estabelecimento em questão, que viria a ser constituída arguida, tratando-se da ora recorrente, com quem conversaram e a quem solicitaram elementos, tais como, a chave para abrir o moedeiro das máquinas, o código que permitia desbloquear e pôr a(s) máquina(s) em funcionamento, a documentação referente à exploração dessa(s) máquina(s), etc., descrevendo a conduta que, em cada uma das situações e em resposta ao que lhe foi solicitado, foi assumida pela arguida, ora recorrente.
Tal como se deixou exposto em 2.3.2.3, os depoimentos das indicadas testemunhas, produzidos em audiência de julgamento, não constituem a reprodução de declarações prestadas pela arguida, em momento em que já deveria ter assumido esta última qualidade, em violação do disposto no n.º 7 do artigo 356º do CPP, sendo que tais testemunhas relataram ao tribunal os factos que percecionaram e o que ouviram.
Assim e como acima se concluiu, nada impedia que o Tribunal a quo pudesse valorar, como valorou, os depoimentos das testemunhas, órgãos de polícia criminal, militares da GNR e inspetores da ASE, não se estando, em qualquer dos casos, perante depoimento indireto, nos termos do disposto no artigo 129º do CPP, nem perante a aquisição de prova em violação da proibição legal prevista no n.º 7 do artigo 356º do CPP, sendo certo que a essa valoração não obstava, a circunstância de a arguida não ter prestado declarações, em audiência de julgamento, no legítimo exercício do direito ao silêncio que lhe assiste.
E não assiste razão à recorrente, quando defende que não tendo as máquinas apreendidas sido postas em funcionamento e não sendo visualizado, pelos militares da GNR e inspetores da ASAE e, bem assim, como os senhores “peritos”, qualquer jogo, não era possível concluir que aquelas máquinas permitiram o desenvolvimento de jogos com as caraterísticas daqueles que foram dados como provados.
Com efeito:
As máquinas referenciadas, apreendidas em resultado de ações de fiscalização realizadas ao estabelecimento comercial explorado pela arguida, ora recorrente, foram sujeitas a exame pericial realizado pelo Serviço de Regulação e Inspeção de Jogos – Departamento, sendo elaborados os correspondentes relatórios, que se mostram juntos aos autos, nos quais são descritas as caraterísticas externas de cada uma das ditas máquinas e o seu modo de funcionamento e, ainda, no referente às máquinas “tipo vídeo”, o software instalado e os ficheiros armazenados no disco rígido do computador nelas existente, permitindo o acesso a determinados jogos, caraterísticas destes últimos e modo de desenvolvimento dos mesmos.
Como resulta dos relatórios periciais juntos aos autos, para que se possa aceder aos jogos que essas máquinas, referenciadas como de “tipo vídeo”, permitem desenvolver, torna-se necessário um código de toques em determinadas áreas do ecrã tátil, para a invocação de um teclado virtual no qual se digita um código para ativação dos jogos e sendo o código de toques inicial desconhecido, como foi o caso, mostrando-se impossível invocar o teclado virtual e, por conseguinte, colocarem-se em desenvolvimento os jogos em questão, pelo que, o exame pericial foi efetuado mediante a leitura do conteúdo do disco rígido do computador existente em cada uma dessas máquinas, do que resultou comprovada a existência de ficheiros com software para o desenvolvimento dos jogos indicados nos ditos relatórios, entre os quais, os jogos denominados “Halloween” e “Jolly Card”.
Ainda que não fosse possível, pelas razões enunciadas, pôr os ditos jogos em desenvolvimento, verificada a existência no disco rígido do computador instalado em cada uma das máquinas em causa, de software para desenvolver os referenciados jogos, as características destes e a forma como os mesmos se desenvolvem, que vêm descritas nos relatórios, é do conhecimento dos senhores peritos que, enquanto inspetores do Serviço de Regulação e Inspeção de Jogos, têm conhecimentos especiais, nessa matéria.
Assim sendo, é absolutamente irrelevante, para a validade e consistência da prova relativa ao modo de funcionamento das máquinas de jogo em apreço, que as testemunhas, militares da GNR e inspetores da ASAE e, bem assim, como os senhores “peritos”, não tenham percecionado, diretamente, o funcionamento e as características dos jogos desenvolvidos por tais máquinas.
Conforme se decidiu no Acórdão deste Tribunal da Relação de Évora, de 18/04/2017[11], a propósito de idêntica questão suscitada no recurso que foi objeto de apreciação/decisão: «A descrição que os “relatórios periciais” fazem das máquinas em questão e do seu modo de funcionamento resulta, por conseguinte, do conhecimento especializado dos “peritos” sobre o tipo de máquinas em causa, sendo certo que nenhum elemento de prova foi apresentado ao tribunal a quo (nem a este tribunal ad quem) que, legitimamente, permita uma qualquer divergência relativamente ao juízo contido em tais “relatórios periciais”.»
As caraterísticas e modo de desenvolvimento dos jogos em referência, que foram dados como provados na sentença recorrida, não se tratam, pois, ao invés do que defende a recorrente de “meras conclusões”, não assentam em meras ilações ou presunções, nem desrespeitam as regras sobre o modo de produção e o valor da prova pericial.
No referente à invocação pela recorrente, com referência aos factos provados constantes dos pontos 14, 16, 17 e 18, de que o Tribunal a quo se limitou a presumir que os “prémios” são “pecuniários” e de que as “regras da experiência comum e de norma devir de acontecimentos …”, a que o Tribunal a quo atendeu, não são suficientes para prova desse facto, diremos o seguinte:
Desde logo, contrariamente ao que é alegado pela recorrente, exceto no que se refere à máquina portátil com a denominação “seis elementos”, não consta da matéria de facto dada como provada nos pontos 14, 16, 17 e 18, que os prémios atribuíveis em resultado do jogo desenvolvido nas demais máquinas em apreço fossem “pecuniários”.
A menção feita no ponto 14 da matéria factual provada, no segmento “… apostando dinheiro, na esperança aleatória de ganhar um prémio maior – em dinheiro ou coisas com valor económico – …, para além de não constituir asserção sobre a natureza dos prémios passíveis de serem ganhos pelo jogador em resultado do jogo desenvolvido nas máquinas de que se trata, sempre haverá que considerar que mesmo, na hipótese, de a obtenção de créditos apenas permitir ao jogador o desenvolvimento de novas jogadas, sem ter de despender qualquer quantia nas mesmas, tal representa a obtenção de um ganho económico, posto que, com a quantia paga para efetuar uma jogada, o jogador, se o resultado for favorável pode realizar outra(s) jogada(s) sucessiva(s) sem ter despender mais dinheiro.
Independentemente da natureza do prémio passível de ser obtido, na execução dos jogos “instalados” nas ditas máquinas, para que aos mesmos se pudesse aceder e pô-los em desenvolvimento, a pessoa teria de pagar, resultando das regras da experiência comum e da normalidade da vida, que a exploração deste tipo de máquinas, nas quais são desenvolvidos jogos com as caraterísticas daqueles que o podiam ser nas máquinas que estão aqui em causa, tem sempre em vista a obtenção de lucro económico, não existindo outra justificação para que aqueles que exploram tal tipo de máquinas e que as têm em estabelecimentos comerciais, onde não é permitida a sua existência ou, sendo-o, sem disponham de autorização para o efeito e sabendo ser ilícita essa sua conduta, incorrendo na prática de crime e/ou de contraordenação, consoante os casos, persistam nessa atuação, como se verificou, no caso da arguida, ora recorrente, que tendo o estabelecimento comercial pela mesma explorado, denominado (…), sido alvo de ação de fiscalização realizada, nesse âmbito, em 15/11/2013, em resultado do que foram apreendidas duas máquinas que aí se encontravam, uma delas do “tipo vídeo”, com software para desenvolver os jogos denominados “Jolly Card” e “Halloween”, não se absteve de continuar a ter, no mesmo estabelecimento, esse tipo de máquina, com aqueles mesmos jogos e outros, com características idênticas, que foram apreendidas, em novas ações de fiscalização, realizadas em 07/03/2014, 10/04/2014, 18/03/2015 e 22/12/2015. Se não fosse a intenção de obtenção de lucro económico, qual a explicação que existiria para que a arguida, ora recorrente, persistisse na descrita atuação? E a resposta, clara e evidente, só pode ser a de que não existe outra explicação para que a arguida, ora recorrente, reiterasse a sua descrita atuação.
No que respeita à alegada falta de prova de que resulte demonstrado que a arguida/recorrente tinha conhecimento da existência dos jogos em questão nas ditas máquinas, as regras da experiência comum, a que atendeu o Tribunal a quo, para alicerçar a sua convicção, dando como provado esse conhecimento, foram determinantes, ante a atuação desenvolvida pela arguida/recorrente, que resultou apurada, não merecendo qualquer censura a inferência extraída pelo Tribunal a quo, nesse domínio.
Com efeito, como vem sendo reiteradamente afirmado pela jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores, na ausência de confissão, a prova do dolo, enquanto elemento quer pertence ao foro intimo do agente, não pode ser feita diretamente, designadamente, através de prova testemunhal e terá de o ser por inferência, isto é, terá de extrair-se da conjugação dos factos objetivos com as regras da experiência comum e da normalidade da vida.
Assim, alguém que como a arguida, ora recorrente, explora um estabelecimento comercial de Café, sendo aí colocadas máquinas aptas a desenvolver jogos, não pode deixar de estar inteirado sobre o tipo de jogos que em tais máquinas podiam ser executados/desenvolvidos e de conhecer a ilicitude da conduta[12], da exploração de jogos com as caraterísticas daqueles de que se trata nos autos, em tal tipo de estabelecimento, sendo esse conhecimento, por parte da arguida, evidenciado, com particular acuidade, a partir do momento em que ocorreu a primeira apreensão desse tipo de máquinas, no seu estabelecimento e tendo em conta as razões que estiveram na base dessa apreensão, que lhe foram comunicadas.
Não assiste, por isso, razão à arguida/recorrente quando defende que as regras da experiência comum não se mostram suficientes para que possa extrair a inferência de que tinha conhecimento do tipo de jogos que podiam ser desenvolvidos nas máquinas em apreço, sendo que a prova pericial, que foi valorada pelo Tribunal a quo – nos termos do disposto no artigo 163º, n.º 1, do CPP – serviu para alicerçar a convicção no referente às caraterísticas das máquinas em apreço e dos jogos nelas instalados, não para sedimentar o convencimento, que sedimentou, no que diz respeito ao conhecimento dessas caraterísticas por parte dos arguidos.
E, ao invés do que sustenta a recorrente, para prova desse conhecimento é irrelevante, a forma como os utilizadores dessas máquinas, clientes do estabelecimento, acediam a esses jogos e, designadamente, se existia ou não ligação à internet, desde logo, porque, tal como resulta dos relatórios periciais juntos aos autos e foi dado como provado, para pôr as máquinas em funcionamento era necessário um código de toques em determinadas áreas do ecrã tátil, para a invocação de um teclado virtual no qual se digita um código para ativação dos jogos, só podendo esse código – até porque tem um curto prazo de validade – ser fornecido por quem “controla as máquinas” e sendo a arguida, ora recorrente, a pessoa que dirigia o estabelecimento comercial onde as máquinas se encontravam, para que fossem utilizadas por quem o quisesse fazer, não podia a mesma deixar de conhecer esse código, facultando-o aos clientes, utilizadores de tais máquinas.
Ora, nesta situação, não podia a arguida, ora recorrente, ter conhecimento do tipo de jogos que eram desenvolvidos nas ditas máquinas, através do software de que dispunham e da ilicitude da exploração de tais máquinas, no estabelecimento comercial que explorava, sendo isento de dúvida que, com as mesmas, a arguida visava a obtenção de lucro económico, posto que, se assim não fosse não existiria justificação para que depois da apreensão de tal tipo de máquina, pelas autoridades e considerando as razões que determinaram essa medida cautelar, a arguida, repetidamente, insistisse em continuar a ter no seu estabelecimento máquinas com as mesmas caraterísticas e que permitiam desenvolver jogos da natureza daqueles que resultaram apurados.
Refira-se que a recorrente não invoca desconhecer que a exploração de jogos com as caraterísticas daqueles que as máquinas em apreço permitiam desenvolver, em estabelecimento comercial do tipo daquele que explorava, era proibido, o que a recorrente alega é que desconhecia o tipo de jogos que podiam ser executados nas ditas máquinas, sendo que, neste contexto, a questão que se poderia colocar seria a da qualificação jurídica da exploração de tal tipo de jogos e da eventual falta de consciência da ilicitude da conduta, que não são suscitadas pela recorrente.
Não existe, por conseguinte, contrariamente ao que defende a recorrente, violação do principio da livre apreciação da prova, previsto no artigo 127º do CPP, por parte do Tribunal a quo, ao socorrer-se das regras da experiência comum e dos princípios da normalidade da vida, para inferir que a arguida tinha conhecimento do tipo de jogos a que as máquinas em apreço davam acesso e que nas mesmas podiam ser desenvolvidos e da ilicitude da respetiva exploração, nas circunstâncias em que o fazia, nos termos sobreditos.
Concluímos, assim, que o Tribunal a quo valorou a prova produzida, segundo critérios de objetividade e em consentaneidade com as regras da experiência comum e da normalidade, no pleno uso do princípio da livre apreciação da prova, consagrado no artigo 127º do Código Processo Penal, não existindo violação deste princípio, nem de qualquer prova vinculada ou legal, nem tendo havido utilização de meio de prova proibido ou de qualquer regra que imponha a valoração da prova de acordo com a pretensão da recorrente, em oposição à apreciação/valoração da produzida feita pelo Tribunal.
Improcede, pois, o recurso, também nesta parte.

2.3.2.5. Da violação do princípio in dúbio pro reo
Invoca a recorrente que, os meios de prova que foram considerados pelo Tribunal a quo, dando como provados os factos impugnados, não permitem, com segurança, para além da dúvida razoável, formar a convicção no sentido de dar esses factos como assentes, pelo que, ao assim decidir, o Tribunal a quo violou o princípio in dúbio pro reo e da presunção da inocência, constitucionalmente consagrado no artigo 32º, n.º 2, da CRP.
O Ministério Público pronuncia-se no sentido de não assistir razão ao recorrente.
Apreciando:
O princípio in dúbio pro reo, que é decorrência do princípio constitucional da presunção da inocência consagrado no artigo 32º, n.º 2 da CRP, constitui um limite normativo do princípio da livre apreciação da prova, na medida em que impõe orientação vinculativa para os casos de dúvida sobre a veracidade dos factos, ou seja, impõe ao julgador que, quando confrontado com a dúvida, razoável e fundada, em matéria de prova, resolva tal dúvida em sentido favorável ao arguido.
E vem sendo entendimento jurisprudencial pacificamente aceite, que o tribunal de recurso apenas pode censurar o não uso do princípio in dúbio pro reo se da decisão recorrida resultar que o tribunal a quo chegou a um estado de dúvida insanável e que, perante essa dúvida, optou por decidir em sentido desfavorável ao arguido[13]ou se, apreciando a impugnação ampla da matéria de facto, por erro de julgamento, for levado a considerar que, em face da prova produzida, essa dúvida – razoável e fundada – deveria suscitar-se no espirito do julgador, impondo-se que a resolvesse em sentido favorável ao arguido.
No caso vertente, lida a sentença recorrida e, designadamente, a motivação da decisão de facto nela exarada, é inequívoco que da mesma não resulta que o julgador se tivesse confrontado com qualquer dúvida sobre os factos que deu como provados e, designadamente, em relação àqueles que são impugnados pela recorrente, sendo que o Tribunal a quo fez uso do principio in dúbio pro reo, dando como não provado que a máquina apreendida no dia 16/06/2016 (com referência ao Processo n.º 30/16.EAEVR), no estabelecimento explorado pela arguida, ora recorrente, concretamente, na arrecadação aí existente, estivesse em funcionamento, consignando, na motivação da decisão de facto: «(…). A prova testemunhal não primou por qualquer conhecimento directo do funcionamento em momento anterior ao e no próprio dia 16 de junho de 2016, apto a dissipar dúvidas inultrapassáveis. A prova testemunhal, no entender deste tribunal, com recurso a meras presunções, não permitem afastar a certeza da arrecadação da máquina no estabelecimento denominado o Café Fialho e que desta forma a arguida não estava a explorar os jogos nela contidos
E atentando-se nas razões que presidiram à valoração da prova produzida, enunciadas na motivação da decisão de facto, que se revelam consentâneas com a regras da experiência comum e não se descortinando a violação de quaisquer normativos ou princípios relativos ao direito probatório, decidindo o Tribunal a quo, de acordo com a livre convicção, nos termos do disposto no artigo 127º do CPP, fica afastada a possibilidade de a prova produzida determinar que o Tribunal a quo, devesse ter sido confrontado com dúvida razoável e fundada, em termos de valoração da prova, que devesse resolver em sentido favorável à arguida/recorrente.
Nesta conformidade, impõe-se concluir não existir violação, por parte do Tribunal a quo, do princípio da presunção da inocência e in dúbio pro reo.
Improcede, pois, também, este fundamento do recurso.

*
Na improcedência da impugnação da matéria de facto, mantém-se inalterada a factualidade dada como provada, na sentença recorrida, no que à arguida, ora recorrente, se refere.

2.3.2.6. Relativamente à qualificação jurídica dos factos:
A recorrente sem que ponha diretamente em causa a qualificação jurídica dos factos feita na sentença recorrida, invoca que nesta não é tratada a questão da eventual inclusão da sua conduta nos artigos 159º e seguintes do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de dezembro e que essa omissão constitui causa de nulidade da sentença.
Ora, analisada a sentença recorrida, constata-se que nela foi tratada a questão apontada pela recorrente e fê-lo nos seguintes termos:
«Da matéria de facto está provado que foram apreendidas em 15.11.2013, 7.03.2014, 10.04.2014, 18.03.2015 e 22.12.2015 máquinas aptas a desenvolver aplicações de jogos de slot-machice e videopoker.
Com efeito, não estamos perante uma modalidade afim de jogos de fortuna ou azar à luz do art.° 159.º da Lei do Jogo, nem o funcionamento coincide com o exposto no Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 4/2010. Também em relação à descrição típica constante do n.º 1 e 2 da mencionada norma, não existe a atribuição de prémios correspondentes a coisas com valor económico nem a oferta ao público mediante a sua interpelação. No concerne à previsão do art.° 4.º, as máquinas não pagam directamente prémios em fichas ou em moedas; ao invés exploram temas próprios dos jogos de fortuna ou azar, mais concretamente slot machines que visa conseguir combinações premiadas de acordo com o plano de prémios apresentado pelo jogo, tudo dependendo exclusivamente da sorte, independentemente da perícia e destreza do jogador, bem assim poker que visa igualmente conseguir combinações premiadas, igualmente, dependentes da sorte. Dúvidas não restam que as condutas provadas qualificam-se como exploração ilícita de jogo por referência ao art.° 4.º, al. g) in fine da Lei do Jogo. Assim, tais máquinas deverão ser classificadas como desenvolvendo um jogo de fortuna ou azar, alicerçada na circunstância de a pontuação depender exclusivamente da sorte e não atribuir como prémio coisa de valor económico. Consequentemente, são jogos de fortuna ou azar à luz dos arts.º 4.º e 161.º, n.º 1 da Lei do Jogo.
(…).»
E, pese embora, a qualificação jurídica dos factos [a qual tem subjacente a delimitação do conceito de jogos de fortuna ou azar e o de modalidades afins, sendo que só a exploração dos primeiros, fora nos locais legalmente autorizados, é suscetível de integrar o crime previsto no artigo 108º, n.º 1[14], do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de Dezembro, enquanto que as modalidades afins poderão integrar apenas ilícito contraordenacional, nos termos previstos no artigo 159º e ss. do mesmo diploma legal], se trate de questão que não vem reunindo consenso na jurisprudência, muito longe disso, desde já se adianta que perfilhamos o entendimento que foi acolhido pelo Tribunal a quo, no sentido de que os jogos desenvolvidos nas máquinas que estão em causa nos autos [sendo nas máquinas “tipo vídeo”, os jogos denominados “Jolly Card”, “Halloween”, “Pantanal”, “Newgame”, “Multigame”, “Bucaneiros”, “Cleopatra” e “Cards”], tendo em conta as suas caraterísticas e modo de desenvolvimento, são enquadráveis na definição de jogos de fortuna ou azar, nos termos do disposto nos artigos 1º, 3º, 4º, n.º 1, al. g), do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de dezembro, integrando a sua exploração, fora dos casinos (sendo que o Estado quis chamar a si o monopólio sobre os mesmos, permitindo a sua exploração apenas a casinos licenciados para esse fim), a prática do crime previsto no artigo 108º, n.º 1, do mesmo diploma legal.
Em nosso entender a distinção entre os jogos de fortuna ou azar e as modalidades afins, no âmbito da aplicação do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de dezembro, deverá fazer-se tendo por base o conceito de jogo de fortuna ou azar estabelecido no artigo 1º[15], conjugado com os exemplos de “tipos de jogos que de fortuna ou azar” previstos no artigo 4º[16], por um lado, e o conceito de modalidades afins, estabelecido no n.º 1 do artigo 159º, conjugado com os exemplos padrão do n.º 2 do mesmo artigo[17], por outro lado[18]. Ou seja, e citando Carlos Alberto Batista Correia[19] «para que um jogo de enquadre nas modalidades de jogo de fortuna ou azar é necessário que, positivamente, detenha todas as caraterísticas (…) do jogo de fortuna ou azar, de acordo com o art. 1.º, e a estrutura dos conceitos tipo do art. 4.º, e, negativamente, não se enquadre no conceito das modalidades afins e estrutura dos respetivos conceito-tipo do art. 159.º».
Assim e como se refere no Acórdão deste Tribunal da Relação de Évora, de 24/01/2017[20], «da conjugação dos art.ºs 1º e 4º do DL 422/89, de 2.12, com o princípio da legalidade (…), retira-se:
1) Que são jogos de fortuna ou azar “aqueles cujo resultado é contingente, por assentar exclusiva ou fundamentalmente na sorte”, como, por exemplo, os “jogos em máquinas que, não pagando diretamente prémios em fichas ou moedas, desenvolvem temas próprios dos jogos de fortuna ou azar ou apresentem como resultado pontuações dependentes exclusiva ou fundamentalmente da sorte (jogos cuja exploração e prática só são permitidas nos casinos existentes em zonas de jogo permanente ou temporário criadas por decreto-lei ou, fora daqueles, nos casos excecionados nos art.ºs 6º a 8º do DL 422/89);
2) Que, tendencialmente, os jogos de fortuna ou azar, de resultado contingente, por assentar exclusiva ou fundamentalmente na sorte (na definição do art.º 1), são os especificados no artigo 4º (jogos de fortuna ou azar cuja exploração é autorizada nos casinos (…), ou seja, jogos em máquinas pagando diretamente prémios em fichas ou moedas e os jogos em máquinas que, não pagando diretamente prémios em fichas ou moedas, desenvolvem temas próprios dos jogos de fortuna ou azar ou apresentem como resultado pontuações dependentes exclusiva ou fundamentalmente da sorte);
3) Que as demais modalidades de jogos que não correspondam às caraterísticas descritas e especificadas nos art.ºs 1º e 4º do DL 422/89, de 2.12, embora os seus resultados dependam exclusiva ou fundamentalmente da sorte, revertem para as modalidades afins», previstas no artigos 159º do mesmo diploma legal.
O Supremo Tribunal de justiça, no AFJ n.º 4/2010[21]que fixou a jurisprudência no sentido de que: «Constitui modalidade afim e não jogo de fortuna ou azar, nos termos dos artigos 159.º, n.º 1, 161.º, 162.º e 163.º do Decreto-Lei nº 422/89, de 2 de Dezembro, na redação do Decreto-Lei nº 10/95, de 19 de Janeiro, o jogo desenvolvido em máquina automática na qual o jogador introduz uma moeda e, rodando um manípulo, faz sair de forma aleatória uma cápsula contendo uma senha que dá direito a um prémio pecuniário, no caso de o número nela inscrito coincidir com algum dos números constantes de um cartaz exposto ao público» –, deu um contributo de enorme relevância para o recorte da distinção entre os jogos de fortuna ou azar e as modalidades afins.
O enunciado AFJ versou sobre a qualificação de jogos desenvolvidos por máquinas automáticas, «nas quais o jogador introduz moeda no manípulo fazendo sair, de forma aleatória, cápsula contendo senhas, ficando o jogador na expectativa de receber um prémio em dinheiro, ou em coisas com valor económico, caso as senhas contidas no interior da cápsula uma, ou mais, tenha escrito um número que seja coincidente com outro inscrito no cartaz, não pagando tais máquinas, directamente, fichas ou moedas», tendo entendido[22] que se tratam de jogos equiparáveis a sorteios, rifas ou tômbolas, constituindo uma modalidade afim, e não um jogo de fortuna ou azar.
Entendeu o STJ que a ratio que preside à proibição genérica de jogos de fortuna ou azar, reservando-os ao regime de concessão em estabelecimentos devidamente licenciados, é a prevenção da compulsão do jogo e tendo considerado que «Tal [compulsão] não sucede relativamente aos jogos em máquinas automáticas que funcionam como espécies de rifas ou tômbolas mecânicas, em que o que se arrisca assume dimensão pouco significativa, pois a expectativa é limitada ou predefinida e o impulso para o jogo tem de ser renovado em cada operação, ao contrário do que sucede com os jogos de casino, mesmo em máquinas, possibilitando uma série praticamente ilimitada de jogadas, numa espécie de encadeamento mecânico e compulsivo, em que o jogador corre o risco de se envolver emocionalmente.»
Em nosso entender, as máquinas que foram apreendidas no estabelecimento comercial explorado pela arguida, ora recorrente, nos dias 15/11/2015, 07/03/2014, 10/04/2014, 18/03/2015 e 22/12/2015, atento o seu modo de funcionamento e as caraterísticas dos jogos nelas desenvolvidos, descritos nos pontos 3., 5., 7., 9. e 11. da matéria factual provada, são totalmente distintas das máquinas sobre as quais versou o enunciado Acórdão de Fixação de Jurisprudência.
Com efeito e de acordo com a posição que perfilhamos e que supra se deixou expressa acerca da delimitação do conceito de jogos de fortuna ou azar, as máquinas em causa nos presentes autos, não pagando diretamente prémios em fichas ou em moedas, desenvolviam jogos que apresentavam resultado e/ou a pontuação final exclusivamente dependente da sorte (em nada contribuindo para esse resultado, a perícia ou a destreza do jogador), sendo o objetivo dos jogos conseguir as combinações ou sequências premiadas, situação em que:
- Relativamente ao jogo desenvolvido na máquina apreendida em 15/11/2013, designada “6 elementos”, referenciada no ponto 3. da matéria de facto provada, apresentava pontuações de conversão direta em dinheiro, em valores que variavam entre 1, 2, 5, 10, 20, 50, 100 ou 200 euros;
- Em relação aos jogos do tipo “poker” (“Jolly Card”, “Newgame”) e do tipo “slot machine” (“Halloween”, “Pantanal”, “Bucaneiros”, “Cleópatra” e “Cards”), os pontos ou créditos ganhos/acumulados pelo jogador poderiam ser utilizados em novas jogadas, não tendo resultado provado que em relação a estes jogos os pontos ou créditos acumulados pudessem ser convertidos em dinheiro ou trocados por prémios com valor económico[23], sendo certo, em todo o caso, não se estar perante uma situação em que o prémio atribuível ao jogador fossem «coisas com valor económico predeterminado à partida», constituindo este último um dos requisitos essenciais para que um jogo possa ser classificado como integrando modalidade afim do jogo de fortuna ou azar (cf. artigo 159.º, n.º 1, in fine do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de dezembro).
Se o jogador não conseguisse as combinações ou as sequências premiadas, teria de pagar para continuar a jogar.
Refira-se que perfilhamos do entendimento de que, para o preenchimento do crime de exploração ilícita de jogo previsto no artigo 108º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de dezembro, não se exige que o prémio retribuível seja pecuniário ou que a pontuação/créditos obtida(os) nas máquinas possa(m) ser convertida(os) em dinheiro (ainda que, como é sabido, neste tipo de jogos, normalmente, sejam atribuídos prémios pecuniários)[24], pelo que, a circunstância invocada pela recorrente, de não estar demonstrada a natureza pecuniária dos prémios atribuídos, é irrelevante em termos de poder afastar o preenchimento do crime.
Por outro lado, salvo o devido respeito pela opinião contrária, entendemos que o maior ou menor valor da quantia pecuniária que o jogador tem de despender para poder jogar nas máquinas, não constitui critério a que se deva atender para aferir se a conduta do agente que explora essas máquinas integra o crime de exploração ilícita de jogo previsto no artigo 108º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 422/89, ou a contraordenação prevista no artigo 159º do mesmo diploma legal[25].
Por último, mesmo a considerar-se que a ratio legis que preside à proibição genérica de jogos de fortuna e azar, fora dos locais autorizados para o efeito, é aquela que foi considerada pelo STJ, no AFJ n.º 4/2010, ou seja, a prevenção da compulsão do jogo, afigura-se-nos que as máquinas de aqui se trata e o tipo de jogos nelas desenvolvidos, seriam potenciadores de risco para os jogadores de desenvolverem aquela compulsão[26], ainda que não se olvide que esta é uma realidade em constante mudança, sendo hoje em dia a compulsão do jogo em muito fomentada pelos jogos online.
Por todo o exposto, considerando o modo de funcionamento das máquinas de que aqui se trata e as caraterísticas dos jogos nelas desenvolvidos, acima referidas, entendemos, bem andou o Tribunal a quo, ao decidir que tais máquinas se encontram abrangidas pela previsão da alínea g), do n.º 1, do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de dezembro e que os jogos nelas desenvolvidos devem classificar-se como jogos de fortuna ou azar, integrando a exploração dessas máquinas, fora dos casinos ou zonas de jogo autorizadas, o crime de exploração ilícita de jogo, p. e p. pelo artigo 108º, n.º 1, do enunciado Decreto-Lei.
Neste sentido e relativamente a máquinas que desenvolviam os jogos “Jolly Card” e/ou “Halloween” e “Pantanal”, vide, entre outros, Ac.s desta Relação de 13/02/2019, proc. 201/13.1EAEVR.E2 e de 21/05/2019, proc. n.º 61/15.8EAEVR.E1; Ac. da RG de 11/03/2019, proc. n.º 10/17.9GEGMR.G1: Ac.s da RP de 29/04/2015, proc. n.º 109/13.0EAPRT.P1, de 13/05/2015, proc. n.º 7/11.2GCFLG.P1 e de 21/02/2018, proc. n.º 280/15.7EAPRT.P1; Ac. da RL de 11/01/2018, proc. n.º 96/16.3ECLSB.L1-9 e Ac. da RC de 20/05/2015, proc. n.º 149/12.7EACBR.C1, todos acessíveis no endereço ww.dgsi.pt.
Pelo exposto, atenta a matéria de facto provada, há que concluir que a arguida ora recorrente, através das suas descritas condutas, preencheu todos os elementos típicos, objetivos e subjetivos, do crime de exploração ilícita de jogo, p. e p. pelo artigo 108°, n.º 1, do Decreto-Lei n° 422/89 de 2 de dezembro, com referência aos artigos 1°, 3º e 4° n.º 1 al. g) do mesmo diploma, na redação dada pelo Decreto-Lei n.°114/2011, de 30 de novembro, pelo que, se mantém a condenação da arguida, ora recorrente, pela prática, em concurso efetivo, de cinco crimes p. e p. pelas enunciadas disposições legais, conforme decidido na sentença recorrida.

2.3.2.7. Da medida da pena
A arguida/recorrente insurge-se contra a medida concreta da pena – sem fazer destrinça entre as penas parcelares e a pena única – que foi fixada na 1ª instância, reputando-a de excessiva, desadequada e desproporcionada e desprovida de qualquer finalidade ressocializadora, violando o princípio da culpa e da razoabilidade.
(…)
Sopesando todas estas circunstâncias, entendemos que as penas parcelares de prisão e de multa fixadas pelo Tribunal a quo e em que a arguida, ora recorrente, foi condenada, revelam-se ajustadas, não excedendo a medida da culpa da arguida, ora recorrente e adequadas a assegurar as necessidades de prevenção geral e especial, que o caso concreto exige, pelo que, se mantêm.
No atinente à pena única:
(…)

O recurso é, pois, também nesta vertente improcedente.

2.3.2.8. Do valor das custas processuais
(…)
Consequentemente, improcede, também este segmento do recurso.

*
O recurso interposto pela arguida (…) é, pois, totalmente improcedente.

2.3.3. Recurso interposto pelo arguido (…)
2.3.3.1. Da nulidade da sentença, por falta de fundamentação
(…)
Nesta conformidade, conclui-se pela inexistência do apontado fundamento de nulidade da sentença, pelo que, nesta vertente, improcede o recurso.

2.3.3.2. Da nulidade da sentença por omissão de pronúncia
(…)
Apreciando:
A questão da nulidade da sentença, por omissão de pronúncia, com o fundamento invocado pelo arguido/recorrente foi igualmente suscitada pela arguida/recorrente e foi apreciada e decidida supra em 2.3.2.2., tendo aqui inteira aplicação, pelo que, se dá por reproduzido tudo o que ali se expôs, concluindo-se do mesmo modo, que a sentença recorrida, ao não abordar a questão da ligação ou não das máquinas à internet, não se tratando essa de matéria relevante, para aferir da qualificação jurídica da(s) conduta(s) assumida(s) pelo arguido, ora recorrente, em causa nos autos, não enferma de omissão de pronúncia e, logo, da nulidade invocada pelo arguido, ora recorrente.
Improcede, assim, este fundamento do recurso.

2.3.3.3. Da valoração de prova proibida
(…)
O recurso, é, pois, também nesta vertente, improcedente.

2.3.3.4. Da impugnação da matéria de facto provada
O recorrente impugna a matéria de facto dada como provada nos pontos 6, 7 e 10 a 28.
(…)
Vejamos:
No que diz respeito aos depoimentos das testemunhas (…) – cuja transcrição integral foi feita pelo recorrente, na motivação de recurso –, que realizaram as ações de fiscalização, em resultado das quais foram apreendidas as máquinas descritas nos pontos 6 e 7 e 10 e 11, as mesmas relataram, na audiência de julgamento, os factos por si detetados, naquele âmbito, designadamente, no referente às condições em que se encontravam as ditas “máquinas” e à atitude da pessoa com quem contataram, no local/estabelecimento em questão, que viria a ser constituída arguida, a quem solicitaram elementos, tais como, a chave para abrir o moedeiro máquinas, o código que permitia desbloquear e pôr a(s) máquina(s) em funcionamento, a documentação referente à exploração dessa(s) máquina(s), etc., descrevendo a conduta que, em cada uma das situações e em resposta ao que lhe foi solicitado, foi assumida pela ora arguida, afirmando que estas lhes facultou as faturas que vieram a ser apreendidas e que se mostram juntas aos autos, a fls. 64 e 425, referentes à empresa que empresa que conjuntamente com a própria, explorava as máquinas de jogo que foram apreendidas, nas duas ações de fiscalização, que tiveram lugar, respetivamente, em 10/04/2014 e 22/12/2015.
Tal como acima se deixou exposto, os depoimentos das indicadas testemunhas, produzidos em audiência de julgamento, não constituem a reprodução de declarações prestadas pela arguida, em momento em que já deveria ter assumido esta última qualidade, em violação do disposto no n.º 7 do artigo 356º do CPP, posto que, tais testemunhas relataram ao tribunal os factos que presenciaram e o modo como se desenrolou a ação de fiscalização em cuja realização tiveram participação e os elementos de prova recolhidos, nesse âmbito, sendo alguns, concretamente, as faturas emitidas pela (…), fornecidos pela arguida, ora recorrente, na sequência de solicitação de documentação relativa à exploração das máquinas em questão.
Assim e como acima se concluiu, nada impedia que o Tribunal a quo pudesse valorar, como valorou, os depoimentos das testemunhas, órgãos de polícia criminal, militares da GNR e inspetores da ASAE, não se estando perante depoimento indireto, nos termos do disposto no artigo 129º do CPP, nem perante a aquisição de prova em violação da proibição legal prevista no n.º 7 do artigo 356º do CPP.
Porém, entendemos que o depoimento das identificadas testemunhas (…), na parte em que se referiram ao que lhes foi transmitido pela ora arguida, no decurso da ação de fiscalização em que, respetivamente, participaram, relativamente à exploração pela sociedade (…) das máquinas que foram apreendidas, nas referenciadas datas e às condições em que essa exploração era feita e à percentagem da repartição dos lucros entre aquela sociedade e a própria, por que constituem factos incriminatórios daquela sociedade e do arguido, enquanto gerente da mesma, só poderão ser valoradas se forem corroboradas por outro(s) meio(s) de prova, designadamente, pelas faturas (prova documental) facultadas pela ora arguida, às testemunhas (…), na ação de fiscalização, como referentes à exploração das máquinas que vieram a ser apreendidas.
Dito de outro modo, preconizamos o entendimento de que o que foi transmitido pela ora arguida, às testemunhas (…), no decurso das ações de fiscalização em que, respetivamente, participaram, na parte que que diz respeito à sociedade (…) e que não resulte suportado pelo teor dos documentos, então apresentados, pela ora arguida, concretamente, as faturas emitidas pela (…), não poderá ser valorado contra o arguido, ora recorrente, gerente da sociedade (…), por este não ter a possibilidade de poder contraditar, em julgamento, “a testemunha fonte” que seria a arguida, constituída nessa qualidade, em momento posterior, acerca do que relatou às testemunhas (…), por a mesma se ter remetido ao silêncio, em julgamento, o mesmo não acontecendo, no referente aos documentos (faturas) que se mostram juntos aos autos, a fls. 64 e 425, emitidos pela sociedade (…), podendo o arguido, ora recorrente, exercer plenamente o contraditório e direito de defesa, mesmo tendo a coarguida exercido o direito ao silêncio, em julgamento.
Neste quadro, se no atinente à fatura junta a fls. 425 dos autos, apresentada pela ora arguida, aos militares da GNR, um deles a testemunha (…), no âmbito da ação de fiscalização realizada no dia 22/12/2015, como referente à exploração da máquina de jogos que veio a ser apreendida no estabelecimento comercial denominado (…), nas circunstâncias e com as caraterísticas descritas nos pontos 10. e 11. dos factos provados, resulta do teor da mesma fatura, emitida pela (…) à ora arguida (…), com data de vencimento de 28/10/2015, no campo “Designação”: “V/ receita S/ Equip.(s) em Exploração no V/ Estabelecimento”, no campo “V/Comissão”: 40%, total: 152,00 e totalizando a fatura o valor de 152,00 (descriminado da seguinte forma: Total 123,58; Desconto comercial: 185.36; Base de incidência do I.V.A. 123,58; Total do I.V.A.:28,42), sendo que tais elementos corroboram a existência de máquina(s) da (…) em exploração no estabelecimento da ora arguida, sendo a comissão recebida por esta última de 40% e na ausência de outras máquinas de jogo no dito estabelecimento a que pudesse respeitar a dita fatura, como foi confirmado pelo depoimento da testemunha (…), tem sustentação na prova produzida a asserção de que a dita fatura respeitava à exploração da máquina de jogo que foi apreendida, em 22/12/2015.
Diferente é a conclusão a que chegamos, no que tange à fatura inserta a fls. 64 dos autos, apresentada pela ora arguida, aos inspetores da ASAE, um deles a testemunha (…), no âmbito da ação de fiscalização realizada no dia 10/04/2014, como referente à exploração da máquina de jogos que veio a ser apreendida no estabelecimento comercial de que se trata, nas circunstâncias e com as caraterísticas descritas nos pontos 6. e 7. dos factos provados. Na verdade, resulta do teor da mesma fatura, emitida pela (…) à ora arguida (…), com data de emissão de 07/03/2014, no campo “Designação”: “Prestação de Serviços Referente ao n/ Contrato de Assistência Publicitária nº 033/2013, no campo “Quantid.”: 1,00, no campo “Preço Unitário”: 100,00, Total: 100,00. Ora, se é certo que consta da dita fatura itens que não são congruentes com a prestação de serviços, como a referência ao Local de Carga e ao Local de Descarga e a Hora da Carga (11:35), o que inculca que foi efetuado o transporte de material, carregado na sede da sociedade (…) e descarregado no estabelecimento comercial da ora arguida (…), tendo sido emitido um recibo pela (…) à ora arguida, com data de 07/03/2014, no qual consta o recebimento, mediante pagamento em numerário, daquela fatura, no valor de 123,00, o certo é que não pode extrair-se de tal documento que o mesmo respeite à exploração da máquina de jogo que foi apreendida no (…), no dia 10/04/2014, tendo a testemunha (…), questionado pelo Tribunal sobre se pediu à arguida o contrato de assistência publicitária, referido na fatura de que se trata, respondido negativamente.
Assim sendo, impõe-se modificar a matéria de facto, no referente ao ponto 12., no segmento que diz respeito à máquina aprendida no dia 10/04/2014, que passará a constar do elenco dos factos não provados.
Relativamente aos demais pontos da matéria de facto impugnados pelo recorrente, temos que:
A qualidade do arguido, ora recorrente, de único gerente da sociedade (…) resultou provada com base no teor da certidão do registo comercial junta a fls. 682 a 689 dos autos e na ausência de prova de que a gerência de facto da mesma sociedade era exercida por outra(s) pessoa(s) que não o arguido/recorrente, tendo a sociedade (…) emitido faturas à ora arguida, designadamente, a fatura junta a fls. 425 dos autos, que não foi objeto de impugnação, essa prova é bastante para que o Tribunal a quo sedimentasse a convicção, para além da dúvida razoável, de que o arguido, agindo em nome e no interesse da sociedade (…), colocou a máquina descrita nos pontos 10 e 11, à exploração, no estabelecimento comercial da arguida, repartindo o lucro obtido com essa exploração.
No referente à alegada ausência de prova sobre a natureza pecuniária dos prémios, valem aqui e dão-se por integralmente reproduzidos, os fundamentos expendidos supra, em sede de apreciação desta mesma questão suscitada no recurso interposto pela arguida/recorrente.
Relativamente à máquina apreendida em 22/12/2015, que resultou provado ter sido colocada à exploração, pela sociedade cuja gerência é exercida pelo arguido, ora recorrente, no estabelecimento comercial da arguida/recorrente, cujas caraterísticas e jogos nela desenvolvidos são descritos nos pontos 10. e 11., não consta da matéria de facto dada como provada que os prémios atribuídos em resultado do jogo desenvolvido por essa máquina fossem “pecuniários”. E, tal como se referiu, em sede de apreciação desta mesma questão, suscitada pela arguida/recorrente, a menção feita no ponto 14 da matéria factual provada, no segmento “… apostando dinheiro, na esperança aleatória de ganhar um prémio maior – em dinheiro ou coisas com valor económico – …, para além de não constituir asserção sobre a natureza dos prémios passíveis de serem ganhos pelo jogador em resultado do jogo desenvolvido nas máquinas em apreço, havendo que considerar que mesmo, na hipótese, de a obtenção de créditos apenas permitir ao jogador o desenvolvimento de novas jogadas, sem ter de despender qualquer quantia nas mesmas, tal representa a obtenção de um ganho económico, posto que, com a quantia paga para efetuar uma jogada, o jogador, se o resultado for favorável pode realizar outra(s) jogada(s) sucessiva(s) sem ter despender mais dinheiro.
Independentemente da natureza do prémio passível de ser obtido, na execução dos jogos “instalados” na máquina apreendida em 22/12/2015, que resultou provado ter sido colocada à exploração, pela sociedade cuja gerência é exercida pelo arguido, ora recorrente, no estabelecimento comercial da arguida/recorrente, para que aos mesmos se pudesse aceder e pô-los em desenvolvimento, a pessoa teria de pagar, resultando das regras da experiência comum e da normalidade da vida, que a exploração deste tipo de máquinas, nas quais são desenvolvidos jogos com as caraterísticas daqueles que o podiam ser na máquina apreendida no dia 22/12/2015, tem sempre em vista a obtenção de lucro económico, não existindo outra justificação para que aqueles que exploram tal tipo de máquinas e que as têm em estabelecimentos comerciais, onde não é permitida a sua existência ou, sendo-o, sem disponham de autorização para o efeito e sabendo ser ilícita essa sua conduta, incorrendo na prática de crime e/ou de contraordenação, consoante os casos, arrisquem em explorar tal tipo de máquinas, nessa situação, sabendo que, poderão ser apreendidas e declarado o seu perdimento a favor do Estado, com o prejuízo daí decorrente.
No concernente à alegada falta de prova de que resulte demonstrado que o arguido/recorrente tinha conhecimento da existência dos jogos mencionados no ponto 11. da matéria de facto provada, na máquina que foi apreendida no dia 22/12/2015, são inteiramente válidas as considerações acima expendidas na apreciação desta mesma questão suscitada pela arguida/recorrente.
Reitera-se que a prova do dolo, na ausência de confissão, enquanto elemento que pertence ao foro intimo do agente, não pode ser feita diretamente, designadamente, através de prova testemunhal e terá de o ser por inferência, isto é, terá de extrair-se da conjugação dos factos objetivos com as regras da experiência comum e da normalidade da vida.
Assim, alguém que como o arguido, ora recorrente, exercendo a gerência de uma sociedade que tem por objeto, além do mais, a representação e comercialização de videojogos, software e equipamentos para a mesma área, abrangendo, portanto, máquinas de jogos, não pode deixar de estar inteirado sobre o tipo de jogos que em tais máquinas podiam ser executados/desenvolvidos e de conhecer a ilicitude da conduta, da exploração de jogos com as caraterísticas daqueles que podiam ser desenvolvidos na máquina apreendida no dia 22/12/2015.
Não assiste, por isso, razão ao arguido/recorrente quando defende que as regras da experiência comum não se mostram suficientes para que possa extrair a inferência de que tinha conhecimento do tipo de jogos que podiam ser desenvolvidos na máquina em questão, sendo que a prova pericial, que foi valorada pelo Tribunal a quo – nos termos do disposto no artigo 163º, n.º 1, do CPP – serviu para alicerçar a convicção no referente às caraterísticas dessa máquina e dos jogos nela instalados, não para sedimentar o convencimento, que sedimentou, no que diz respeito ao conhecimento dessas caraterísticas por parte dos arguidos.
E, ao invés do que sustenta o recorrente, para prova desse conhecimento é irrelevante, a forma como os utilizadores dessas máquinas, clientes do estabelecimento, acediam a esses jogos e, designadamente, se existia ou não ligação à internet, desde logo, porque, tal como resulta dos relatórios periciais juntos aos autos e foi dado como provado, para pôr as máquinas em funcionamento, designadamente, a máquina que foi apreendida no dia 22/12/2015 e para ativação dos jogos, era necessário um código de acesso, só podendo esse código ser fornecido por quem “controla as máquinas” que, no caso da máquina apreendida no dia 22/12/2015, eram os arguidos, ora recorrentes, o arguido, em nome e no interesse da sociedade “Finegames, Ld.ª”, que exploravam, em conjunto, a dita máquina.
Ora, nesta situação, não podia o arguido, ora recorrente, ter conhecimento do tipo de jogos que eram desenvolvidos na referenciada máquina, através do software de que dispunham e da ilicitude da exploração de tal máquina, no estabelecimento comercial onde foi instalada e veio a ser apreendida, sendo isento de dúvida e pelas razões sobreditas, que, com a mesma, os arguidos visavam a obtenção de lucro económico.
Não existe, por conseguinte, contrariamente ao que defende o recorrente, violação do principio da livre apreciação da prova, previsto no artigo 127º do CPP, por parte do Tribunal a quo, ao socorrer-se das regras da experiência comum e dos princípios da normalidade da vida, para inferir que o arguido tinha conhecimento do tipo de jogos a que a máquina em apreço dava acesso e que na mesma podiam ser desenvolvidos e da ilicitude da respetiva exploração, nas circunstâncias em que estava a ser feita.
Por todo o exposto, julga-se parcialmente procedente a impugnação da matéria de facto, no referente ao ponto 12, no segmento que diz respeito à máquina aprendida no dia 10/04/2014 e, consequentemente:
- Passará a constar do elenco dos factos não provados que:
A máquina apreendida no dia 10.04.2014, nas circunstâncias descritas nos pontos 6. e 7., fosse colocada no referido estabelecimento explorado pela arguida, à exploração, pela sociedade comercial denominada Finegames – Exploração & Exibição de Vídeogramas, Ld.ª.
- Na decorrência da enunciada modificação da decisão de facto, altera-se a redação dos pontos 12, 13, 16, 17 e 18 e 19 e 23, nos seguintes termos:
12. A máquina supra descrita, em 10. e 11. apreendida no dia 22.12.2015, foi colocada no referido estabelecimento explorado pela arguida, à exploração, pela sociedade comercial denominada (…), de que o arguido (…) é o único gerente.
13. Nessa qualidade, o arguido (…) colocou a referida máquina à exploração no estabelecimento comercial acima identificado, repartindo o lucro obtido com tal exploração.
16. A arguida (…) explorava em conjunto com o arguido (…) a supra referida máquina, apreendida no dia 22.12.2015.
17. Os arguidos colocaram as ditas máquinas, sendo, no caso do arguido a máquina apreendida no dia 22.12.2015, em funcionamento no interior do estabelecimento comercial indicado, com vista ao lucro, proporcionando aos eventuais interessados a respectiva utilização, como sucedeu anteriormente à data dos factos.
18. Desde a data em que as referidas máquinas foram colocadas no estabelecimento comercial explorado pela arguida (…) e até à data da sua apreensão à ordem dos presentes autos, que tais máquinas sempre estiveram acessíveis, disponíveis e em condições de serem utilizadas, proporcionando aos clientes do dito estabelecimento a prática dos jogos desenvolvidos pelas mesmas.
19. Era a arguida (…) quem permitia o acesso dos clientes às supra referidas máquinas, quem lhes entregava os prémios em dinheiro que ganhavam e quem, em relação à máquina apreendida no dia 22.12.2015, dividia com o arguido (…) as receitas provenientes dos jogos desenvolvidos.
23. Os arguidos (…) agiram em comunhão de esforços e de intentos, relativamente à conduta desenvolvida respeitante à máquina apreendida no dia 22.12.2015, estando, em qualquer das situações, os arguidos bem cientes da forma como os jogos acima descritos se processavam, bem sabendo que lhes estava vedada a sua exploração sem a mencionada autorização ou licença e que tais tipos de jogo só podiam ser explorados nas zonas de jogo legalmente autorizadas e por entidades concessionadas.

2.3.3.5. Da violação do princípio in dúbio pro reo
(…)
Nesta conformidade, impõe-se concluir não existir violação, por parte do Tribunal a quo, do princípio da presunção da inocência e in dúbio pro reo, no referente aos factos dados como provados, com referência à máquina apreendida em 22/12/2015 [Processo 60/15.0F1EVR] e no que ao arguido/recorrente se refere.

*
A impugnação da matéria de facto, é, assim, parcialmente procedente, nos termos sobreditos.

2.3.3.6. Das consequências jurídicas da modificação da matéria de facto a que se procedeu
Na decorrência da modificação da decisão de facto a que se procedeu, nos termos sobreditos, relativamente ao arguido, ora recorrente e, no respeitante à maquina apreendida no dia 10/04/2014, nas circunstâncias descritas no ponto 6. da matéria factual provada [Processo 41/14.0EALSB], tivesse sido colocada, à exploração, no estabelecimento comercial da arguida, pela sociedade comercial denominada (…), impõe-se a absolvição do arguido/recorrente – único gerente daquela sociedade – da prática do crime de exploração ilícita da prática do crime de exploração ilícita de jogo, p. e p. pelo artigo 108°, n.º 1, do Decreto-Lei n° 422/89 de 2 de dezembro, com referência aos artigos 1°, 3º e 4° n.º 1 al. g) do mesmo diploma, por que vinha acusado e foi condenado na 1ª instância, com referência a essa máquina [Processo 41/14.0EALSB], o que se decide.

2.3.3.7. Da qualificação jurídica dos factos dados como provados com referência à máquina apreendida no dia 22/12/2015, nas circunstâncias descritas no ponto 10. da matéria factual provada [Processo 60/15.0F1EVR]:
Pelos fundamentos supra aduzidos, em 2.3.2.6., em sede de apreciação do recurso da arguida e que aqui se dão por reproduzidos, considerando os factos dados como provados nos pontos 10. a 25., há que concluir que o arguido, ora recorrente, único gerente da sociedade (…) e agindo em nome e no interesse da mesma, preencheu todos os elementos típicos, objetivos e subjetivos, do crime de exploração ilícita de jogo, p. e p. pelo artigo 108° n.º 1, do Decreto-Lei n° 422/89 de 2 de dezembro, com referência aos artigos 1°, 3º e 4° n.º 1 al. g) do mesmo diploma, na redação dada pelo Decreto-Lei n.°114/2011, de 30 de novembro.
Assim, mantém-se a condenação do arguido, ora recorrente, pela prática, em coautoria, de um crime de exploração ilícita de jogo, previsto e punível pelas referenciadas disposições legais.

2.3.3.8. Da medida da pena
Neste âmbito, em face da absolvição do arguido/recorrente em relação a um do crime de exploração ilícita de jogo, por que foi por que foi condenado na 1ª instância, referente à máquina apreendida em 10/04/2014 [Processo 41/14.0EALSB], a apreciação da enunciada questão cinge-se à medida da pena em que foi cominado pela prática do crime referente à máquina apreendida no dia 22/05/2015 [Processo 60/15.0F1EVR].
Sustenta o arguido/recorrente que a pena que lhe foi aplicada é excessiva, inadequada, desproporcionada e desprovida de qualquer finalidade ressocializadora, violando o princípio da culpa e da razoabilidade e as normas ínsitas nos artigos 40º, n.º 1 e 70º, n.º 1, ambos do CP.
Pugna o recorrente para que a pena seja fixada “dentro dos valores mínimos”.
O Ministério Público pronuncia-se no sentido de dever manter-se a pena em que o arguido foi condenado na sentença recorrida.
Apreciando:
Ao crime de exploração ilícita de jogo praticado pelo arguido/recorrente corresponde a moldura penal abstrata de prisão de 1 mês a 2 anos e, cumulativamente, multa, de 10 a 200 dias (cf. artigo 108º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de dezembro e artigos 41º, n.º 1 e 47º, n.º 1, ambos do CP).
O arguido/recorrente foi condenado na pena de 16 (dezasseis) meses de prisão e 160 (cento e sessenta) dias de multa, pela prática do crime referente à máquina apreendida no dia 22/05/2015 [Processo 60/15.0F1EVR].
E o Tribunal a quo fundamentou seguinte forma a determinação da medida concreta das penas:
«(…)
No caso concreto, a ilicitude é a típica e comum a este tipo de crime e o dolo directo assume a gravidade do comportamento.
As necessidades de prevenção geral são também média-elevadas, existindo nesta comarca especiais precauções ao nível deste ilícito, atento o n.º de ilícitos detectados o que é visível pelos inúmeros julgamentos realizados apenas neste ano.
Porém, a penalidade a determinar deverá ser adequada a restaurar o sentimento de confiança na sociedade posto em crise com a conduta dos agentes.
No contexto pessoal, releva negativamente a existência de condenações anteriores apenas em relação ao arguido (…), sendo que a arguida (…) é primária.
O tribunal considera ainda a condição profissional provada de cada um dos arguidos, que lhes permite gerar rendimento suficiente para a sua subsistência.
Pesado o juízo de reprovação das condutas objecto dos presentes autos e os elementos atinentes às respectivas personalidades, entende-se por adequada e proporcional a condenação:
(…)
- do arguido (…) nas penas de prisão de 14 (catorze) e 16 (dezasseis) meses e na pena de multa de 140 (cento e quarenta) e 160 (cento e sessenta) dias, para os factos ocorrido em 11.04.2014 e 22.12.2015, respectivamente.»
Vejamos, então, se a pena de 16 (dezasseis) meses de prisão e 160 (cento e sessenta) dias de multa se revela desajustada ou desproporcionada, como considera o recorrente:
Dão-se aqui por reproduzidas as considerações teóricas expendidas em 2.3.2.7, a propósito dos critérios a atender na determinação da medida concreta da pena.
No caso concreto e fazendo-se a ponderação destas circunstâncias, temos que:
- O grau de ilicitude dos factos, mostra-se mediano, correspondendo à normalidade dos casos;
- O dolo com que o arguido atuou, que reveste a modalidade de dolo direto, cuja intensidade se apresenta como medianamente acentuada;
- As condições pessoais do arguido e a sua situação ecomómica, tendo, neste âmbito, sido dado como provado apenas que aufere mensalmente a quantia de €1.150,00.
- Milita contra o arguido/recorrente as duas condenações sofridas pela prática de crimes relacionados com o jogo (crime de material de jogo sem autorização e crime de exportação ilícita de jogo), por factos cometidos em datas (respetivamente, em 2004 e em 04/08/2013) anteriores aquela em que o foram os factos/crime por que vai condenado nos presentes autos, sendo que a última dessas condenações a sentença transitou em julgado em data posterior (04/01/2017) à prática dos factos/crime por que agora é condenado.
- As exigências de prevenção geral, são elevadas, considerando a crescente prática de crimes de exploração ilícita de jogo, acentuando a necessidade de, através da pena aplicada, repor a confiança dos cidadãos na norma violada e nos valores que lhe estão subjacentes.
- No tocante às exigências de prevenção especial, revelam-se já acentuadas, tendo em conta as condenações já sofridas pelo arguido, por crimes relacionados com o jogo e exercendo funções de gerência de uma sociedade cujo objeto social é a comercialização e exploração de máquinas de diversão, o que constitui um factor de risco para a reiteração pelo arguido de crimes relacionados com o jogo.
Neste quadro, tendo o Tribunal a quo, na determinação da medida concreta da pena aplicada ao arguido, ora recorrente, pela prática do crime de que se trata, levando em linha de conta a prática pelo arguido em data anterior (em 10/04/2014) de outro crime de exploração ilícita de jogo, tendo fixado a pena a aplicar em 14 (catorze) meses de prisão e 140 (cento e quarenta) dias de multa e tendo esta Relação absolvido o arguido/recorrente da prática desse crime, nos termos sobreditos, entendemos que a ausência dessa circunstância, a que o Tribunal a quo atendeu, deve refletir-se na medida concreta da pena.
Assim e sopesando todas as circunstâncias supra enunciadas, decide-se fixar a medida concreta da pena a aplicar ao arguido/recorrente, pela prática do crime por que vai condenado, em 14 (catorze) meses de prisão e 140 (cento e quarenta) dias de multa, entendendo-se que se mostra ajustada à culpa do arguido/recorrente e se revela adequada a assegurar as exigências de prevenção geral que, no caso, se fazem sentir.
Quanto ao valor da taxa diária da multa, que o Tribunal a quo fixou em €12,00 (doze euros), consideramos que a situação económica do arguido/recorrente, tendo resultado provado que aufere o rendimento mensal de €1.150,00, considera-se adequada e proporcional a fixação naquele montante da taxa diária da multa, sendo que o patamar mínimo previsto na lei é de €5,00 e o máximo de €500,00 (cf. artigo 47º, n.º 2, do CP) e não podendo deixar de se ter presente que o montante da taxa diária da multa deve ser fixado em termos de constituir um sacrifício real para o condenado (ainda que não possa ser tão elevado que possa colocar em risco as necessidades inerentes à subsistência do condenado e do respetivo agregado familiar), sendo que a fixação da taxa diária da multa no seu patamar mínimo só deve ocorrer quando a situação sócio económica do condenado seja de precariedade ou mesmo de indigência, o que não é o caso do arguido, ora recorrente.
Mantém-se, pois, o valor da taxa diária da multa fixado pelo Tribunal a quo.
E de igual modo se mantém a suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido/recorrente, mas pelo período de 14 (catorze) meses, ou seja, 2 (dois) anos e 2 (dois) meses (n.º 5 do artigo 50º do CP, na redação introduzida pela Lei n.º 59/2007, de 4 de setembro), sendo a suspensão subordinada aos deveres impostos na sentença recorrida, reduzindo-se, no entanto, para metade – tendo em conta a absolvição do arguido/recorrente da prática de um dos crimes de exploração ilícita de jogo, por que foi condenado na 1.ª instância –, a quantia a entregar pelo arguido à (…), fixando-a em €1.000,00 (mil euros), em prestações mensais, nos termos estabelecidos na sentença recorrida.
O recurso interposto pelo arguido (…) é, pois, parcialmente procedente.

3. DISPOSITIVO
Nestes termos, em face do exposto, acordam os Juízes que compõem a Secção Criminal deste Tribunal da Relação de Évora, em:

a) - Não conhecer do mérito do recurso de despacho interlocutório interposto pela arguida (…), por se mostrar prejudicado, em face da absolvição proferida na sentença, relativamente ao crime de exploração ilícita de jogo p. e p. pelo artigo 108º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de dezembro, por que a arguida vinha acusada, com referência ao Apenso A, Processo n.º 30/16.EAVR;

b) - Negar provimento ao recurso da sentença, interposto pela arguida (…) e, em consequência, confirmar, na íntegra, a sentença, no que à arguida/recorrente diz respeito;

c) - Conceder parcial provimento ao recurso interposto pelo arguido (…) e, em consequência:

1. Modificar a decisão proferida sobre a matéria de facto nos termos supra indicados, em 2.3.3.4., designadamente, passando a constar do elenco dos factos não provados que:
(…)
2. Na decorrência da enunciada modificação da decisão de facto, revogar o acórdão recorrido, na parte em que condenou o arguido (…), pela prática, em coautoria, de um crime de um crime de exploração ilícita de jogo, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 108º, n.º 1, 1º, 3º, 4º e n.º 1, al. g), todos do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de dezembro, na redação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 114/2011 de 30 de novembro, com referência à máquina apreendida no dia 10/04/2014 (Proc. n.º 41/14.0EALSB) e, em substituição, absolver o arguido (…) da prática de tal crime;

3. Mantendo-se a condenação do arguido (…), pela prática, em coautoria, de um crime de um crime de exploração ilícita de jogo, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 108º, n.º 1, 1º, 3º, 4º e n.º 1, al. g), todos do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de dezembro, na redação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 114/2011 de 30 de novembro, com referência à máquina apreendida no dia 22/12/2015 (Proc. n.º 60/15.0F1EVR), reduzir a pena a aplicar-lhe, fixando-a em 14 (catorze) meses de prisão e 140 (cento e quarenta) dias de multa, à taxa diária de €12,00 (doze euros), perfazendo a multa global €1.680.00 (mil seiscentos e oitenta euros).

4. Suspender, na sua execução, a pena de prisão aplicada ao arguido (…), pelo período de 1 (um) ano e 2 (dois) meses, sendo a suspensão subordinada aos deveres impostos ao arguido, na sentença recorrida, fixando-se em €1.000,00 (mil euros) a quantia a entregar, pelo arguido, à (…) [em vez de €2.000,00 fixados na sentença recorrida], em prestações, nos termos decididos na sentença recorrida;

5. No mais e relativamente ao arguido (…), confirmar a sentença recorrida.

Sem tributação, o recurso do despacho interlocutório interposto pela arguida e o recurso da sentença interposto pelo arguido (cfr. artigo 513º, n.º 1, do CPP, à contrario sensu).

Quanto ao recurso da sentença interposto pela arguida/recorrente, custas por esta última, fixando-se a taxa de justiça em 3 (três) UC´s (art. 513º, n.ºs 1 e 3, do C. P.P. e art. 8º, n.º 9, do Regulamento das Custas Processuais e Tabela III, anexa).

Notifique.

__________________________________________________
[1] Proferido no processo n.º 1670/07.4TAFUN-A.L1-5, acessível no endereço www.dgsi.pt
[2] In CJ-STJ, Ano III, tomo 2, pág. 254.
[3] In Código de Processo Penal Comentado, 2016, 2ª edição, págs. 1132 e 1133
[4] Cf. entre outros, Ac. da RE de 03/06/2008, proc. n.º 421/08-1, Ac. da RL de 08/03/2014, proc. n.º 142/14.5T9ALQ.L1-5 e Ac. da RC de 31/01/2018, proc. n.º 287/14.1EAPRT.P1, todos acessíveis no endereço www.dgsi.pt
[5] Como resulta do contexto que tal menção é feita e que se passa a citar:
«(…) desde a aprovação do mencionado Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de dezembro, a exploração e a prática desta atividade sofreram grandes alterações, sendo que o quadro normativo que atualmente a rege não acompanhou essa evolução. Para além da própria evolução tecnológica dos sistemas e equipamentos de jogo, surgiu igualmente uma nova realidade não abrangida por aquela regulamentação, que assumiu, nos últimos anos, uma relevância crescente e incontornável - o jogo online.
O quadro normativo atual regulador dos jogos de fortuna ou azar revela-se incapaz de dar resposta à atual dimensão desta atividade, sendo necessário regular novas formas de exploração que permitam responder às evoluções verificadas no mercado.
O modelo de exploração dos jogos de fortuna ou azar em Portugal carece, pois, de ser repensado e, tratando-se de uma atividade reservada ao Estado, esse exercício tem de envolver primacialmente uma alteração do quadro normativo atual que a regula, de molde a permitir acompanhar os desenvolvimentos e a evolução verificada nos últimos 25 anos. Essa alteração revela-se determinante, por um lado, como meio de combater a prática de jogo ilegal e, por outro, para assegurar uma exploração de jogo equilibrada e transparente.
Emerge, assim, a premente necessidade de criar um novo modelo de exploração e prática do jogo online, pensado à luz desta realidade e do vazio legal existente. (sublinhado nosso)
É, neste contexto, que assume especial acuidade a regulação do jogo online em Portugal, impondo-se o seu enquadramento normativo em diploma próprio, de molde a trazer para a legalidade operadores e jogadores que atualmente jogam no mercado ilegal sem qualquer proteção, e assegurando, simultaneamente, o são funcionamento do mercado. Pretende-se, por esta via, estimular a cidadania e o jogo responsável e reforçar o combate à economia informal.
(…).»
[6] Neste sentido, cf., entre outros, Ac.s da RC de 15/02/2012, proc. n.º 41/07.7FDCBR.C1 e de 16/06/2015, proc. n.º 360/10.5EACBR.C1 e Ac. RL de 22/06/2017, proc. n.º 320/14.7GCMTJ.L1-9, todos acessíveis no endereço www.dgsi.pt.
[7] In Recursos em Processo Penal, 7ª edição, 2008, Editora Rei dos Livros, pág. 77.
[8] In Curso de Processo Penal, II, Lisboa, Verbo, 1993, pág. 111.
[9] Ac. do TC nº. 281/2005, DR II Série de 6/7/2005, pág. 9844.
[10] Paulo Saragoça da Matta, A livre apreciação da prova e o dever de fundamentação da sentença, in Jornadas de Direito Processual Penal e Direitos Fundamentais, Almedina, junho de 2004, pág. 251.
[11] Proferido no processo n.º 471/12.2EAPRT.E1, acessível no endereço www.dgsi.pt.
[12] Cf., entre outros, Ac. da RC de 04/03/2015, proc. n.º 4/13.3TBSAT.C1, Ac. da RE de 21/03/2007, proc. n.º 33/15.2GBBNV.E1 e Ac. da RG de 11/03/2019, proc. n. 10/17.9GEGMR.G1, acessíveis em www.dgsi.pt.
[13] - Cfr. entre outros, Ac. da RE de 02/02/2016, proc. 114/13.7TARMR.E1 e Ac. da R.C. de 03/06/2015, proc. 12/14.7GBRST.C1, acessíveis no endereço www.dgsi.pt.
[14] Que dispõe:
«Jogos de fortuna ou azar são aqueles cujo resultado é contingente por assentar exclusiva ou fundamentalmente na sorte».
[15] Que estatui:
«Jogos de fortuna ou azar são aqueles cujo resultado é contingente por assentar exclusiva ou fundamentalmente na sorte.»
[16] Que dispõe:
1 - Nos casinos é autorizada a exploração, nomeadamente, dos seguintes tipos de jogos de fortuna ou azar:
a) Jogos bancados em bancas simples ou duplas: bacará ponto e banca, banca francesa, boule, cussec, écarté bancado, roleta francesa e roleta americana com um zero;
b) Jogos bancados em bancas simples: black jack/21, chukluck e trinta e quarenta;
c) Jogos bancados em bancas duplas: bacará de banca limitada e craps;
d) Jogo bancado: keno;
e) Jogos não bancados: bacará chemin de fer, bacará de banca aberta, écarté e bingo;
f) Jogos em máquinas pagando directamente prémios em fichas ou moedas;
g) Jogos em máquinas que, não pagando directamente prémios em fichas ou moedas, desenvolvam temas próprios dos jogos de fortuna ou azar ou apresentem como resultado pontuações dependentes exclusiva ou fundamentalmente da sorte.
2 - (…).
3 - (…).»

[17] O referenciado artigo 159º, que tem por epígrafe “Modalidades afins do jogo de fortuna ou azar e outras formas de jogo”, estatui:
«1 - Modalidades afins dos jogos de fortuna ou azar são as operações oferecidas ao público em que a esperança de ganho reside conjuntamente na sorte e perícia do jogador, ou somente na sorte, e que atribuem como prémios coisas com valor económico predeterminado à partida.
2 - São abrangidos pelo disposto no número anterior, nomeadamente, rifas, tômbolas, sorteios, concursos publicitários, concursos de conhecimentos e passatempos.
3 - (…).»

[18] Neste sentido, cf. Carlos Alberto Batista Correia, “Dos Jogos de Fortuna ou Azar – O Atual Paradigma na Exploração Ilícita”, Dissertação de Mestrado, julho de 2015, Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, página 22, acessível em https://run.unl.pt/bitstream/10362/16177/1/BatistaCorreia_2015.pdf
[19] In ob. cit., pág. 24.
[20] Proferido no proc. n.º 57/13.4EAEVR.E1, disponível em www.dgsi.pt
[21] Publicado no DR 1ª Série, n.º 46, de 08/03/2010.
[22] Por maioria, com seis votos de vencido.
[23] Sendo um dos elementos essenciais para que um jogo possa ser classificado como modalidades afins que os prémios consistam «em coisas com valor económico» (cf. artigo 159.º, n.º 1, in fine do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de dezembro).
[24] Neste sentido, Carlos Alberto Batista Correia, in ob. cit., páginas 16 a 24.
[25] Neste sentido, entre outros, Ac. da RP de 13/05/2015, proc. n.º 7/11.2GCFLG.P1, acessível em www.dgsi.pt.
[26] Neste sentido, vide, entre outros, Ac. da RP de 21/02/2108, proc. n.º 280/15.7EAPRT.P1 e Ac. da RG de 11/03/2019, proc. n.º 10/17.9GEGMR.G1, ambos acessíveis no endereço www.dgsi.pt.



Évora, 23 de junho de 2020