Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
862/21.8T8OLH.E1
Relator: TOMÉ DE CARVALHO
Descritores: APENSAÇÃO DE PROCESSOS
INVENTÁRIO
ACÇÃO DE SIMPLES APRECIAÇÃO NEGATIVA
Data do Acordão: 07/13/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: 1 – Os requisitos da apensação são (i) terem sido propostas duas acções separadamente; (ii) verificarem-se os pressupostos de admissibilidade do litisconsórcio, da coligação, da oposição ou da reconvenção e (iii) poderem as acções ser reunidas num único processo.
2 – Na função negativa da figura do caso julgado deve o juiz abster-se de voltar a apreciar a matéria ou a questão que já se mostra jurisdicionalmente decidida, em termos definitivos.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: Processo n.º 862/21.8T8OLH.E1
Tribunal Judicial da Comarca de Faro – Juízo de Competência Genérica de Olhão – J2
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Acordam na secção cível do Tribunal da Relação de Évora:
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I – Relatório:
Na presente acção de simples apreciação proposta por (…) contra “(…) Insurance – Sucursal em Portugal”, “INEM – Instituto Nacional de Emergência Médica, IP”, “Banco (…), SA” e “(…) – Instituição Financeira de Crédito, SA”, o Réu Banco (…) interpôs recurso da decisão que ordenou a apensação da acção ao processo de inventário n.º 611/21.0T8OLH, que corre termos no Juízo de Competência Genérica de Olhão (J1).
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A Autora pedia que fosse declarado que a Autora, enquanto cabeça de casal da herança aberta por óbito de (…), nada devia a nenhum dos Réus, em virtude dos seguros contratados entre os mesmos e o falecido.
Subsidiariamente, pedia ainda que fosse determinado que a ora Autora nada devia aos Réus que não apresentaram documento justificativo bastante para efeitos de prova do seu crédito perante a Requerente.
Requereu ainda, ao abrigo do n.º 2 do artigo 429.º do Código de Processo Civil, que fosse ordenada a junção aos Réus da documentação referente aos seguros de vida contratados com o falecido.
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Em abono da sua tese, a Autora afirma que o seu falecido esposo contratou com o “Banco (…), SA” um crédito de montante que desconhece e que não sabe se deve alguma coisa a esta instituição bancária, uma vez que a mesma se recusou a prestar-lhe quaisquer esclarecimentos.
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Na sua contestação, a sociedade “Banco (…), SA” invocou a existência das excepções de ilegitimidade da Autora e falta de interesse em agir e de ineptidão da petição. A Ré disse que, além de os factos alegados estarem em contradição com o pedido, a Autora não sabe quanto deve aos Réus, que este é o elemento essencial para que o Tribunal viesse a declarar a inexistência de dívida.
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A Autora reconheceu que ainda não foi judicialmente demandada por qualquer destas entidades.
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A Autora desistiu do pedido formulado relativamente a “(…) Insurance – Sucursal em Portugal” e ao “INEM – Instituto Nacional de Emergência Médica, IP”, acto esse que foi homologado, tendo estas partes sido absolvidas do pedido.
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Os presentes autos foram inicialmente apensos ao processo de inventário n.º 611/21.0T8OLH (vide termo de apensação com a ref.ª 121247229, inserido nos autos a 24/08/2021) e que foram redistribuídos para prosseguirem como acção de simples apreciação.
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Em sede de despacho saneador, a Meritíssima Juíza de Direito decidiu que «ao abrigo do disposto no artigo 267.º, in fine, do CPC, defere-se a requerida apensação da ação dos presentes autos ao processo de inventário n.º 611/21.0T8OLH, que corre termos no Juiz 1 desta Competência Genérica de Olhão, correndo naqueles autos todas as questões que digam respeito ao reconhecimento de créditos sobre a herança de (…) e quem são os seus herdeiros, muito embora as ações não percam a sua autonomia, subsistindo a sua individualidade».
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O despacho recorrido contém a seguinte fundamentação:
«(…) A presente ação, proposta por (…) não tinha intenção de ser tramitada desligada do processo de inventário, nem os Réus a contestaram como se fosse a Autora, por si própria, que estivesse a litigar, mas sim a Autora na qualidade de indigitada herdeira ou, pelo menos, cônjuge do falecido (…) que teve relação com o 3.º Réu Banco (…), S.A. e com a 4.ª Réu (…).
Compulsados os autos, verifica-se que não é possível reconhecer a qualidade de herdeira da aqui Autora, uma vez que o incidente de habilitação de herdeiros a que alude o artigo 351.º do CPC está reservado à habilitação dos sucessores da parte falecida, não tendo o falecido (…) alguma vez sido parte nesta ação.
Por outro lado, nenhuma utilidade advém de se chamarem aos autos os filhos do falecido, ao abrigo do incidente de intervenção provocada, uma vez que a sua qualidade de filhos poderia ser provada por certidão de nascimento, mas a sua qualidade de herdeiros só pode ser demonstrada por habilitação judicial ou notarial, que enfrenta o problema elencado no parágrafo que antecede.
Ademais, verifica-se que o que se pretende com a presente ação é ver declarada a inexistência de dívida deixada pelo falecido (…), tendo os Réus interesse na demonstração do contrário, embora não tenham demandando judicialmente nenhum dos interessados na partilha dos bens deixados pelo falecido (…).
A solução que o Tribunal encontra para garantir a economia processual, bem como de uniformização de julgados é pois a que voltar a apensar estes autos ao inventário que corre termos no J1 desta Competência Genérica, de onde nunca deveriam ter saído, para que as partes que sejam consideradas interessadas na partilha da herança por óbito (…) discutam a questão da existência ou não de dívida deixada pelo de cujus e quem é responsável pelo seu pagamento.
(…)
Verifica-se que, para além da presente ação, existe o processo de inventário n.º 611/21.0T8OLH, que corre termos no Juiz 1 desta Competência Genérica de Olhão, aos quais os presentes autos tramitaram inicialmente apensos e que foi instaurado em primeiro lugar (proc. n.º 611/21.0T8OLH instaurado em 23.07.2021 – presente ação instaurada um mês depois, a 23.08.2021) e onde se discute quem são os herdeiros de (…) e qual o ativo e passivo da herança a partilhar, naturalmente sendo de lá discutir se o falecido deixou dívidas que mereçam ser reconhecidas ou não.
Nestes autos a pretensão da Autora era ver declarada a inexistência de dívidas sobre a herança aberta por óbito de (…), sendo que as Rés pretendem que seja declarado o contrário, o averbamento de um crédito no passivo da herança.
Por conseguinte, dúvidas não restam que existe entre estas duas ações um interesse atendível na sua apensação, tendo a mesma sido requerida pela Autora nestes autos e pela mesma parte nos autos de inventário, sendo também por iniciativa da Autora que se decide a presente apensação, não vindo de iniciativa oficiosa».
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A sociedade recorrente não se conformou com a referida decisão e as suas alegações continham as seguintes conclusões:
«1. Vem o presente recurso interposto do despacho que determinou a apensação destes autos a processo de inventário já em curso, proferido em sede de audiência prévia ocorrida em 28.03.2022.
2. Em tal diligência, a Recorrida, por via do seu mandatário confirmou que intervém nos presentes autos na qualidade de cônjuge e herdeira do seu falecido marido e que não tem disponibilidade para se habilitar como tal por via de escritura notarial, contando com a habilitação a efectuar nos autos de inventário já em curso.
3. Tendo o Tribunal recorrido concluído, e bem, que “não é possível reconhecer a qualidade de herdeira da aqui Autora”, tal deveria ter conduzido, sem mais, à procedência da invocada excepção de ilegitimidade e consequente decisão de absolvição dos Réus da instância.
4. Ao invés, determinou o Tribunal recorrido a apensação dos presentes autos ao processo de inventário alegando que “verifica-se que o que se pretende com a presente ação é ver declarada a inexistência de dívida deixada pelo falecido (…), tendo os Réus interesse na demonstração do contrário, embora não tenham demandando judicialmente nenhum dos interessados na partilha dos bens deixados pelo falecido (…)”.
5. Não poderia o Tribunal recorrido ter concluído que a pretensão da Autora é a de ver declarada a inexistência de dívida deixada pelo falecido pois tal não resulta da P.I., onde é manifesta a contradição entre o pedido e a causa de pedir (o que gera a ineptidão da P.I.).
6. Ainda que o pedido principal e o pedido subsidiário formulados a final vão no sentido de ser declarada a inexistência de dívida, o que é alegado no articulado são factos que demonstram a dificuldade da Autora em obter informações, junto dos Réus, sobre as responsabilidades do falecido, recorrendo à presente acção para obter tal informação.
7. Os pedidos apresentados – o principal e o subsidiário – não revelam qualquer coincidência com os factos alegados, sendo mesmo contraditórios: por um lado, alegou a Recorrida que “o viúvo da falecida” contratou com o ora Recorrente um crédito de montante que se desconhece (artigo 3.º da P.I.), assim como desconhece se deve alguma coisa ao Recorrente; por outro lado, peticionou que seja declarado que nada deve aos Réus, desde logo, em virtude dos seguros contratados entre os mesmos e o falecido (sendo certo que o ora Recorrente, enquanto entidade bancária, não contratou qualquer seguro nem com o falecido, nem com ninguém, porque não o está autorizado a fazer), e, depois, porque não apresentaram documento justificativo bastante para efeitos de prova do seu crédito perante a Autora / Requerente.
8. Face ao exposto, esta notória contrariedade era motivo bastante para impedir este Tribunal de concluir que o que se pretende com esta acção é ver declarada a inexistência de dívida deixada pelo falecido (…), tanto mais que a Recorrida não alegou qualquer facto no sentido de inexistir dívida do falecido.
9. De igual modo, não poderia o Tribunal recorrido ter concluído pelo interesse dos Réus na partilha da herança do falecido.
10. Não decorre da contestação oportunamente apresentada pelo ora Recorrente qualquer facto que conduza àquela conclusão, tendo o Recorrente alegado que (i) não prestou à Recorrida qualquer informação sobre as responsabilidades do falecido pelo simples facto de nunca ter recebido daquela qualquer pedido nesse sentido, (ii) prestou aquela informação a (…) que, indiciariamente, provou a sua qualidade de herdeira junto do Recorrente, o que lhe permitiu abrir o respectivo processo interno de habilitação de herdeiros e prestar-lhe informação sobre os saldos actuais da herança, conforme doc. 01 junto à contestação do Recorrente.
11. O Recorrente não apresentou qualquer defesa quanto à invocada inexistência de responsabilidades do falecido porque tal não foi alegado pela Recorrida.
12. À Recorrida já foi prestada, por via da contestação apresentada pelo Recorrente e em concreto do doc. 01, a informação que a mesma alegou desconhecer, o que conduziria a uma evidente inutilidade superveniente da lide.
13. Em suma, não é verdade que as Rés pretendem que seja declarado o contrário, o averbamento de um crédito no passivo da herança, na medida em que a contestação do Recorrente não foi no sentido de provar a existência, ou exigência, de determinadas responsabilidades do falecido, visto que nada foi alegado a esse respeito na petição inicial e o Recorrente não poderia defender-se daquilo que a Recorrida não disse.
14. A apensação destes autos aos autos de inventário foi o mecanismo de salvação que o Tribunal recorrido encontrou para evitar a improcedência da acção por manifesta falta de legitimidade da Recorrida, derivada do reconhecimento de que não se encontra habilitada como herdeira do falecido, alegando o Tribunal recorrido que é nos autos de inventário onde se discute quem são os herdeiros de (…).
15. Salvo o devido respeito, tendo a ilegitimidade processual da Autora sido oportunamente invocada pelo ora Recorrente na contestação apresentada, e tendo o mandatário daquela reconhecido que a mesma ainda não se encontrava habilitada como herdeira por ter optado não o fazer por via de escritura de habilitação notarial, não podia tal questão ter sido deixada por decidir e menos ainda relegar-se o seu conhecimento (ou saneamento) para um apenso do processo de inventário, esperando que a questão da habilitação da Autora como herdeira ali seja resolvida.
16. Nem os autos de inventário servem para habilitar os herdeiros do falecido, nem ao Recorrente é exigido que a excepção de ilegitimidade por si invocada em devido tempo seja decidida ou sanada no âmbito de um processo sobre o qual não tem qualquer conhecimento.
17. Não se verificam os pressupostos da apensação de acções decorrentes do artigo 267.º do CPC, sendo de ter em conta todas as razões supra invocadas e que conduzem à conclusão de que a apensação não é conveniente.
18. Ademais, estamos perante acções que seguem diferentes formas de processo, sendo a presente uma acção de simples apreciação.
19. Ainda que os presentes autos não percam a sua autonomia e individualidade, é manifesto que nada justifica a sua tramitação por apenso a um processo de inventário, tendo o Tribunal recorrido incorrido em manifesta violação do disposto no artigo 267.º do Código de Processo Civil.
Por todo o exposto, requer-se que seja revogado o despacho recorrida e substituído por decisão que:
(i) Declare a Autora parte ilegítima para os presentes autos, na medida em que não se encontra habilitada como herdeira do falecido,
ou, caso assim, não se entenda,
(ii) Declare a inutilidade superveniente da lide em relação ao ora Recorrente, na medida em que este já prestou à Recorrida a informação que esta alegou desconhecer.
Com o que se fará a costumada Justiça».
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Não houve lugar a resposta.
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Admitido o recurso e observados os vistos legais, cumpre decidir.
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II – Objecto do recurso:
É entendimento uniforme que é pelas conclusões das alegações de recurso que se define o seu objecto e se delimita o âmbito de intervenção do Tribunal ad quem (artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608.º, n.º 2, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do Código de Processo Civil).
Analisadas as alegações de recurso, o thema decidendum está circunscrito à apreciação da possibilidade de apensação da acção aos autos de inventário.
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III – Factos com interesse para a decisão da causa:
Os factos com interesse para a justa resolução da causa são os que constam do relatório inicial.
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IV – Fundamentação:
A sociedade recorrente afirma que existe a dúvida se a Autora vem aos autos na qualidade de pessoa singular a quem foi exigido algum pagamento que pretende que seja declarado inexistente ou se vem aos autos na qualidade de indigitada herdeira de (…).
A sociedade recorrente defende que ocorreu inutilidade superveniente da lide. Contudo, a prestação de uma informação nos autos não permite concluir que a nada é devido à Ré, que é objecto da acção.
Na realidade, a questão judicanda não é essa e aquilo que se visa apurar é se existe motivo válido para determinar a apensação da acção aos autos de inventário.
A justa solução do recurso reclama a interpretação do normativo inscrito no artigo 267.º[1] do Código de Processo Civil e os requisitos precipitados na letra da lei são: (i) terem sido propostas duas acções separadamente; (ii) verificarem-se os pressupostos de admissibilidade do litisconsórcio, da coligação, da oposição ou da reconvenção e (iii) poderem as acções ser reunidas num único processo. Além disso, para alguns sectores a apensação não deve ser decretada se o estado do processo ou outra razão especial torne inconveniente a apensação.
A junção de causas produz dois benefícios: economia da actividade e uniformidade de julgamento. De acordo com a posição doutrinária de Lebre de Freitas, constitui manifestação do princípio da economia processual facultar-se a apensação de acções que, embora tenham sido propostas separadamente, podiam ter sido reunidas no mesmo processo. Trata-se de permitir que no mesmo processo se resolva o maior número possível de litígios, impedindo a multiplicação evitável de processos judiciais[2] [3].
Vejamos se existe essa relação de dependência entre as acções em discussão.
A acção declarativa de simples apreciação negativa é um procedimento que procura obter unicamente a declaração da inexistência de um direito ou de um facto, tal como decorre da alínea a) do n.º 3 do artigo 10.º do Código de Processo Civil[4].
A causa de pedir nas acções de simples apreciação negativa consubstancia-se na inexistência do direito e na descrição dos factos materiais pretensamente cometidos pelo demandado que determinaram o estado de incerteza[5] [6] [7].
As funções principais do processo de inventário por morte são fazer cessar a comunhão hereditária e proceder à partilha de bens, relacionar os bens que constituem objecto de sucessão e servir de base à eventual liquidação da herança.
Neste conspecto o inventário comporta a relação dos créditos e das dívidas da herança, acompanhada das provas que possam ser juntas. Se as dívidas existirem e forem reclamadas devem ser relacionadas e sujeitas à operação de partilha. No entanto, no âmbito do inventário não cabe a declaração da inexistência de dívida.
Mais, a Recorrida deu entrada da petição inicial como o apenso A dos autos de inventário n.º 611/21.0T8OLH e no âmbito daquele processo foi proferido despacho no sentido de os autos serem redistribuídos como acção declarativa de simples apreciação, sob a forma de processo comum.
Este despacho transitou em julgado, não foi objecto de impugnação para os Tribunais Superiores, não existe qualquer acto superveniente que permita alterar as características de imutabilidade da decisão anterior e não foi deduzido qualquer conflito de competências fundado na situação em apreço.
Consabidamente, os Tribunais de Primeira Instância não podem avaliar o mérito de decisões proferidas pelos seus pares e tomar qualquer decisão antagónica em caso de discordância com a bondade das mesmas.
O instituto do caso julgado material é analisado numa dupla perspectiva: como excepção de caso julgado e como autoridade de caso julgado. O caso julgado da decisão anterior releva como autoridade de caso julgado material no processo posterior quando o objecto processual anterior (pedido e causa de pedir) é condição para a apreciação do objecto processual posterior[8].
Essa imutabilidade ou indiscutibilidade da decisão judicial definitiva impede que a questão que foi objecto da decisão proferida e inimpugnável (ou não tempestiva e adequadamente impugnada) possa voltar a ser, ela própria, na sua essencial identidade, recolocada à apreciação do Tribunal: se tal ocorrer, por força da figura da excepção de caso julgado – que reflecte a chamada função negativa da figura do caso julgado – deve o juiz abster-se de voltar a apreciar a matéria ou a questão que já se mostra jurisdicionalmente decidida, em termos definitivos, como objecto de uma anterior acção[9]. A matéria é de conhecimento oficioso[10].
Nestes termos, para além de não existir o referido interesse atendível e de não se verificarem todos os requisitos enunciados na lei, face às funções da acção de simples apreciação negativa, o despacho que ordenou a desapensação da presente acção mostra-se consolidado e não ocorreu qualquer facto superveniente que viabilize uma decisão diferente.
Na prolação da decisão recorrida releva apenas uma interpretação distinta da Meritíssima Juíza de Direito que, ao contrário da decisão antecedente, entende que existe um interesse atendível na apensação.
No mais, existem formas de garantir a habilitação de herdeiros ou de modificação subjectiva da instância pela intervenção de novas partes que possam eventualmente garantir a sanação de uma hipotética ilegitimidade activa. O conhecimento desta não é viabilizado no presente recurso por força da delimitação objectiva do despacho recorrido.
Nestes termos, decide-se julgar procedente o recurso interposto e revoga-se o despacho que ordenou a apensação aqui em debate.
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V – Sumário:
(…)
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VI – Decisão:
Nestes termos e pelo exposto, tendo em atenção o quadro legal aplicável e o enquadramento fáctico envolvente, decide-se julgar procedente o recurso interposto, revogando a decisão recorrida, devendo os autos regressar à fase de saneamento para apreciação das demais questões suscitadas.
Custas a cargo da apelada nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 527.º do Código de Processo Civil.
Notifique.
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Processei e revi.
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Évora, 13/07/2022
José Manuel Costa Galo Tomé de Carvalho
Mário Branco Coelho
Isabel de Matos Peixoto Imaginário


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[1] Artigo 267.º (Apensação de acções):
1 - Se forem propostas separadamente acções que, por se verificarem os pressupostos de admissibilidade do litisconsórcio, da coligação, da oposição ou da reconvenção, pudessem ser reunidas num único processo, é ordenada a junção delas, a requerimento de qualquer das partes com interesse atendível na junção, ainda que pendam em tribunais diferentes, a não ser que o estado do processo ou outra razão especial torne inconveniente a apensação.
2 - Os processos são apensados ao que tiver sido instaurado em primeiro lugar, salvo se os pedidos forem dependentes uns dos outros, caso em que a apensação é feita na ordem da dependência, ou se alguma das causas pender em instância central, a ela se apensando as que corram em instância local.
3 - A junção deve ser requerida ao tribunal perante o qual penda o processo a que os outros tenham de ser apensados.
4 - Quando se trate de processos que pendam perante o mesmo juiz, pode este determinar, mesmo oficiosamente, ouvidas as partes, a apensação.
5 - Tendo sido penhorados, em execuções distintas, quinhões no mesmo património autónomo ou direitos relativos ao mesmo bem indiviso, pode o juiz, oficiosamente ou a requerimento da parte, ordenar a apensação ao processo em que tenha sido feita a primeira penhora desde que não ocorra nenhuma das circunstâncias previstas no n.º 1 do artigo 709.º.
[2] José Lebre de Freitas, Introdução ao Processo Civil, Coimbra Editora, Coimbra, 2013, n.º II.10.2.1.
[3] José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, vol. I, 3ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2014, pág. 525.
[4] Artigo 10.º (Espécies de ações, consoante o seu fim):
1 - As ações são declarativas ou executivas.
2 - As ações declarativas podem ser de simples apreciação, de condenação ou constitutivas.
3 - As ações referidas no número anterior têm por fim:
a) As de simples apreciação, obter unicamente a declaração da existência ou inexistência de um direito ou de um facto;
b) As de condenação, exigir a prestação de uma coisa ou de um facto, pressupondo ou prevendo a violação de um direito;
c) As constitutivas, autorizar uma mudança na ordem jurídica existente.
4 - Dizem-se «ações executivas» aquelas em que o credor requer as providências adequadas à realização coativa de uma obrigação que lhe é devida.
5 - Toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da ação executiva.
6 - O fim da execução, para o efeito do processo aplicável, pode consistir no pagamento de quantia certa, na entrega de coisa certa ou na prestação de um facto, quer positivo quer negativo.
[5] Antunes Varela, Manual de Processo Civil, 2ª edição, Coimbra, 1985, pág. 187.
[6] Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, vol. I, Coimbra, 1981, pág. 115.
[7] Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, Vol. I, 2.ª edição, Coimbra, 1999, pág. 204.
[8] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19/02/1998, in www.dgsi.pt.
[9] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24/04/2013, in www.dgsi.pt.
[10] Artigo 578.º (Conhecimento das exceções dilatórias):
O tribunal deve conhecer oficiosamente das exceções dilatórias, salvo da incompetência absoluta decorrente da violação de pacto privativo de jurisdição ou da preterição de tribunal arbitral voluntário e da incompetência relativa nos casos não abrangidos pelo disposto no artigo 104.º.